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JUSTO IMPEDIMENTO
Sumário
I - Se a mandatária que invocou o justo impedimento, alegou no seu requerimento que: - só ela foi notificada para a apresentação do requerimento probatório e não os restantes mandatários; - e que a doença súbita de que foi vítima, a impossibilitou não só de praticar o acto no prazo, como de informar os restantes colegas do escritório da iminência de apresentar o requerimento probatório. II – O primeiro facto está demonstrado no processo. O segundo carece de demonstração e o tribunal não poderia ter decidido pelo indeferimento sem permitir à requerente a prova deste facto. III - A existência de vários mandatários a representar os AA. não é por si só motivo de exclusão de uma situação de justo impedimento para a prática de determinado actos, maxime, quando se invoca que, a causa do impedimento também impediu a mandatária afectada, de informar os restantes co-mandatários.
Texto Integral
Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
Proc.º N.º 78/08.9TBMCQ-A.E1
Apelação
2ª Secção
Tribunal Judicial da Comarca de Monchique.
Recorrente:
F…………… e outros.
Recorrido:
Ca………… e M………………….
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O presente recurso de apelação, visa impugnar o despacho que indeferiu o requerimento do recorrente onde, alegando justo impedimento, pedia que fosse admitida a apresentar o requerimento probatório fora do prazo legal. O teor desse despacho é o seguinte:
« Por requerimento de fls. 282, apresentado em Juízo em 24 de Outubro de 2011, e aquando da apresentação do respectivo requerimento probatório, vieram os AA. alegar que a respectiva Ilustre Mandatária, Dr.ª Maria Manuel Montesino, no dia 14/10/2011 (último dia do prazo para apresentação do requerimento probatório), foi vítima de doença súbita e imprevisível que a deixou impossibilitada de exercer a sua actividade profissional até 24/10/2011 e mesmo de informar os demais colegas/advogados do escritório desse prazo para apresentação de prova. Mais alegou que um dos colegas em causa assumiu a representação em Tribunal dos processos que a mandatária tinha agendados para efectuar no período compreendido entre 17 e 21 de Outubro de 2011. Juntou declaração médica, datada de 24 de Outubro de 2011, da qual resulta que se encontrou doente desde o dia 14 de Outubro de 2011, tendo ficado impedida do exercício das suas funções profissionais durante um período de oito dias (fls. 285). Juntou também cópia da acta da audiência de discussão e julgamento realizada no dia 19 de Outubro de 2011 no âmbito do processo n.º 797/10.0TBALM, da qual resulta que a Ilustre Mandatária foi substituída no acto pelo Sr. Dr. José Milhano (fls. 289 e 290).
Compulsados os autos, verifico que a Ilustre mandatária foi notificada para apresentar prova em 29 de Setembro de 2011.
Mais verifico que os AA. passaram procuração não só a favor da Exma. Sr.ª Dr.ª Maria Manuel Montesino, mas também dos Exmos. Srs. Drs. José Milhano e Cláudia Sousa Reis.
Cumpre apreciar e decidir.
Dispõe o artigo 146.º, n.º 1 e 2, do CPC que
“1 - Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto.
2 - A parte que alegar o justo impedimento oferecerá logo a respectiva prova;
o juiz, ouvida a parte contrária, admitirá o requerente a praticar o acto fora do prazo, se julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou.”
Do exposto supra resulta que a Ilustre mandatária veio apresentar o requerimento probatório dos AA. quando já havia decorrido integralmente o prazo legalmente previsto, bem como o prazo para a prática do acto com multa, nos termos do artigo 145.º, n.º 5, do CPC.
Nesta conformidade, apenas se poderá considerar que o acto foi tempestivamente apresentado caso se conclua pela existência do justo impedimento invocado pela Ilustre mandatária.
Ora, no presente caso, verifica-se que os AA. constituíram, para além da Sr.ª Dr.ª Maria Manuel Montesino, outros dois mandatários, os quais não comunicaram qualquer impedimento ao Tribunal e, nessa conformidade, sempre poderiam ter praticado tempestivamente o acto em apreço.
Ainda que se concluísse que a Sr.ª Dr.ª Maria Manuel Montesino se encontrou impossibilitada de comunicar no dia 14 de Outubro o seu estado de saúde e consequente impossibilidade de praticar o acto aos restantes mandatários dos AA., a verdade é que mais dez dias decorreram sem que o acto fosse praticado, quando decorre do próprio requerimento apresentado que o Exmo. Sr. Dr. José Milhano participou em julgamentos em substituição daquela durante o aludido período. Por outras palavras, ainda que se pudesse entender que os outros dois Ilustres Mandatários não puderam praticar o acto em apreço no dia 14 de Outubro, por desconhecerem o estado de saúde da Sr.ª Dr.ª Maria Manuel Montesino, a verdade é que sempre o poderiam ter feito no período compreendido entre 15 e 23 de Outubro, o que igualmente não sucedeu.
Nesta conformidade, tendo os AA. passado procuração nestes autos a favor de três mandatários e porque dois deles não comunicaram qualquer impedimento para a prática do acto em data anterior a 24 de Outubro de 2011, nunca se poderá concluir que o acto não foi praticado por facto não imputável aos mandatários nem que o mesmo foi praticado logo que o impedimento cessou.
Inexistindo, pois, qualquer justo impedimento, forçoso é concluir pela apresentação intempestiva do requerimento probatório, sendo o mesmo de se ter por não escrito.
Face ao exposto, julgo improcedente o incidente de justo impedimento invocado pelos AA. e, em consequência, intempestivo o requerimento probatório apresentado, mais determinando que se tenha o mesmo por não escrito.
Custas do incidente pelos AA., fixando-se a taxa de justiça em 1UC – artigo 7.º, n.º 3, e Anexo II do RCP».
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Inconformado, veio o A. interpor recurso de apelação, tendo nas suas alegações formulado as seguintes conclusões:
1) A douta decisão em causa não teve em conta que actualmente o instituto do justo impedimento não se confina às situações absolutamente incapacitantes para a prática do acto, mas a todo e qualquer evento que obste à prática atempada do mesmo, desde que não imputável à parte, nem aos seus representantes ou mandatários
2) a douta decisão em causa, não teve em conta o facto de, como consta os autos, apenas e só a mandatária, Dra. Maria Manuel Montesino, ter sido notificada para apresentar prova - por via electrónica através do Citius, sendo que, nenhum dos outros mandatários foi notificado para a prática desse acto.
3) Os outros Ilustres Mandatários não tiveram conhecimento, nem tinham obrigação de conhecer, da notificação para a prática do acto em causa e, muito menos, do prazo para a efectivação do mesmo.
4) Era a mandatária, Dra. Manuel Montesino, quem acompanhava o processo em causa, sendo que, a elaboração do requerimento probatório tem subjacente um esforço - nomeadamente a nível intelectual)-de actuação profissional no exercício da advocacia em defesa do caso.
5) Resulta manifesto da situação concreta uma relação adequada de causalidade, entre a verificação da referida doença e a impossibilidade efectiva da apresentação atempada do rol de testemunhas, pois, nesse período, a advogada Dra. Maria Manuel Montesino, não tinha condições de saúde que lhe permitissem executar as tarefas próprias da sua actividade profissional.
6) Como os ora Recorrentes alegaram no requerimento de fls. 282, apresentado em Juízo em 24 de Outubro de 2011, e aquando da apresentação do respectivo requerimento probatório, a Ilustre Mandatária, Dr.ª Maria Manuel Montesino, no dia 14/10/2011 (último dia do prazo para apresentação do requerimento probatório, correspondente a uma sexta-feira), foi vítima de doença súbita e imprevisível que a deixou impossibilitada de exercer a sua actividade profissional até 24/10/2011 e mesmo de informar os demais colegas/advogados do escritório desse prazo para apresentação de prova.
7) Não se tratou, assim, de qualquer violação do dever de diligência e organização por parte da mandatária Dra. Maria Manuel Montesino ou dos outros mandatários que não foram notificados nem sabiam que o prazo para a apresentação do requerimento probatório estava em curso.
8) O douto despacho em causa violou assim o art.º 146º nº 1 e 2º do C.P.Civil, ao julgar inexistente o justo impedimento.
Nestes termos tendo ocorrido justo impedimento para a prática atempada do acto de apresentação do rol de testemunhas dos AA., ora, Recorrentes, há que admitir o requerimento em causa datado de 24/10/2011, revogando-se o douto despacho que o julgou improcedente…»
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Não houve contra-alegações.
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Na perspectiva da delimitação pelo recorrente[1], os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 685-A e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil)[2], salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Das conclusões acabadas de transcrever, decorre que a questão a decidir consiste em saber se havia motivo para o indeferimento imediato do requerimento de invocação de justo impedimento para a prática do acto processual.
Vejamos.
Nos termos do disposto no art.° 146º n.º 1 do Cód. Proc. Civil, considera--se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto.
Com as alterações introduzidas à referida norma, pelo Dec. Lei 329-A/95 de 12/12, ficou mais flexibilizada a caracterização do justo impedimento. Porém a admissão e validação do acto praticado fora de prazo, por alegada existência de uma situação de justo impedimento, continua a pressupor, antes do mais, a realização do acto que não foi praticado no decurso do prazo normal. Ou seja, é necessário que a parte alegue o justo impedimento e ofereça a respectiva prova no momento em que se apresenta a praticar o acto. É isso que decorre do n.º 2 do artº 146º do CPC e já assim era na redacção originária. Como salientava A. Reis, a propósito do § 2.º do art. 146.º do CPC/39 que corresponde ao n.º 2 do art. 146.º do CPC actual, a leitura do n.º 2 do art. 146.º mostra claramente que a parte não deve ser admitida a praticar o acto fora de prazo enquanto não alegar e provar o justo impedimento e que a alegação e prova do justo impedimento deve ser feita no preciso momento em que o interessado se apresenta para praticar o acto intempestivo[3]. É que o efeito do justo impedimento, tal como foi concebido e está consagrado na norma citada, não é nem o de impedir o início do curso de prazo peremptório, nem o de interromper tal prazo, quando em curso, no momento em que ocorre o facto que se deva considerar como justo impedimento, inutilizando o tempo já decorrido, mas tão somente o de suspender o termo de um prazo peremptório, deferindo-o para o dia imediato aquele que tenha sido o último de duração do impedimento[4]. Ou seja, através do justo impedimento não se pode pretender, a concessão de novo prazo para a prática do acto. No normativo em causa, apenas se concede ao requerente, a possibilidade de praticar o acto no momento (dia) imediatamente posterior, ao fim da cessação do impedimento. Assim a parte que invoque, em seu benefício, o instituto do justo impedimento, tem, simultaneamente, de proceder à prática do acto, indicando os fundamentos factuais e apresentando as provas respectivas, a fim do julgador, após audição da parte contrária, aferir das circunstancias em que tal ocorreu e da existência, ou não, de culpa da parte ou do respectivo mandatário, na prática tardia do acto»[5].
No caso dos autos, foi isso que fez o recorrente.
Porém a Sr.ª juíza entendeu que pelo facto dos AA. terem outorgado procuração nos autos, não só à mandatária que invocou o justo impedimento, mas a mais dois Advogados, nunca se poderia verificar uma situação de justo impedimento e consequentemente indeferiu o pedido, sem admitir a requerente a produzir a prova testemunhal que arrolara no incidente.
Acontece que a Exmº mandatária que invocou o justo impedimento, alegou no seu requerimento que:
- só ela foi notificada para a apresentação do requerimento probatório e não os restantes mandatários;
- e que a doença súbita de que foi vítima, a impossibilitou não só de praticar o acto no prazo, como de informar os restantes colegas do escritório da iminência de apresentar o requerimento probatório.
O primeiro facto está demonstrado no processo. O segundo carece de demonstração e o tribunal não poderia ter decidido pelo indeferimento sem permitir à requerente a prova deste facto, pois a existência de vários mandatários a representar os AA. não é por si só motivo de exclusão de uma situação de justo impedimento para a prática de determinado actos, maxime, quando se invoca que, causa do impedimento também impediu a mandatária afectada, de informar os restantes co-mandatários.
A requerente deve pois, ser admitida a fazer a prova de tal facto.
Produzidas as provas e demonstrando-se que a doença impossibilitou a requerente não só de praticar o acto como de avisar os colegas para o fazerem em sua substituição e que essa impossibilidade só cessou no dia 24/10/11, então estará verificada uma situação de justo impedimento. Caso não prove esse circunstancialismo, naturalmente improcederá o incidente.
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Concluindo
Pelo exposto, acorda-se em revogar o despacho recorrido, que deve ser substituído por outro que ordene a produção da prova testemunhal oferecida, seguindo-se os ulteriores termos do incidente.
Custas pela parte vencida a final.
Notifique.
Évora, em 22 de Março de 2012.
I - Se a mandatária que invocou o justo impedimento, alegou no seu requerimento que:
- só ela foi notificada para a apresentação do requerimento probatório e não os restantes mandatários;
- e que a doença súbita de que foi vítima, a impossibilitou não só de praticar o acto no prazo, como de informar os restantes colegas do escritório da iminência de apresentar o requerimento probatório.
II – O primeiro facto está demonstrado no processo. O segundo carece de demonstração e o tribunal não poderia ter decidido pelo indeferimento sem permitir à requerente a prova deste facto.
III - A existência de vários mandatários a representar os AA. não é por si só motivo de exclusão de uma situação de justo impedimento para a prática de determinado actos, maxime, quando se invoca que, a causa do impedimento também impediu a mandatária afectada, de informar os restantes co-mandatários.
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[1] O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 684º, n.º 2 2ª parte do Cód. Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 684º-A, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo recorrente. Vd. Sobre esta matéria Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa –1997, págs. 460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos, Liv. Almedina, Coimbra – 2000, págs. 103 e segs.
[2] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56.
[3] Cfr. neste sentido, Ac. do STJ de 4/05/05, proc. n.º 04S4329, in http://www.dgsi.pt/jstj.
[4] Cfr. Ac. da RC de 18/7/06, proc. n.º 1887/06, relatado pelo Des. Garcia Calejo e disponível in http://www.dgsi.pt/.
[5] Ac. da RE de 21/5/09, proc. 785/05.6TBABT.E1, Relatado pelo Des. Mata Ribeiro e disponível in http://www.dgsi.pt/.