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CONTRATO A TERMO
FORMALIDADES AD SUBSTANTIAM
FORMA ESCRITA
NULIDADE DE ESTIPULAÇÃO DE PRAZO
Sumário
I- A menção escrita do motivo, no contrato de trabalho a termo, configura uma formalidade ad substantiam e não uma mera formalidade ad probationem, sendo a observância da forma essencial à validade da declaração negocial e não se destinando apenas a facilitar a prova. II- Se não for observada a forma escrita ou se do contrato escrito não constarem os elementos mencionados na lei, é o próprio termo que é nulo, sem que haja possibilidade de provar os elementos em falta por qualquer outro meio de prova, fora do documento e/ou em momento posterior, nomeadamente, na contestação ou em audiência de julgamento. III- A invocação da invalidade da cláusula a termo pelo trabalhador, com as consequências daí decorrentes, não configura por si só abuso de direito. IV- A nulidade do termo determina que o contrato de trabalho seja considerado como um contrato de trabalho por tempo indeterminado, face ao disposto no artigo 131.º, n.º 4, do Código do Trabalho/2003 [artigo 147.º, n.º 1, alínea c) do Código do Trabalho/2009]; em face disso, a carta do empregador ao trabalhador, a informar que não pretendia renovar o contrato estabelecido, invocando a caducidade do contrato de trabalho e pondo desse modo termo ao mesmo, equivale a um despedimento ilícito, com as consequências daí decorrentes.
Sumário do relator
Texto Integral
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I) Relatório 1.S…, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, no Tribunal do Trabalho de Abrantes, contra Banco…., S.A.. 1.1 A autora alega, em síntese, ter sido admitida ao serviço do réu, em 26 de Junho de 2008, para lhe prestar a actividade profissional de empregada bancária sob as suas ordens, direcção e autoridade e mediante retribuição, tendo as partes outorgado um contrato de trabalho a termo certo, pelo período de um ano, o qual se veio a renovar, por duas vezes, por iguais períodos.
Por carta de 4 de Maio de 2011, o réu comunicou à autora a intenção de não o renovar, pelo que caducaria em 22 de Junho de 2011. As funções por si exercidas correspondiam a necessidades permanentes, sendo agora asseguradas por outra colaboradora admitida para o efeito.
Defende que o contrato a termo certo celebrado com o réu era inválido por não indicar o motivo justificativo da aposição do termo com a menção expressa dos factos que o integram, pelo que se converteu em contrato por tempo indeterminado; deste modo, a denúncia do contrato constitui um despedimento sem justa causa.
Conclui que o seu despedimento foi ilícito e reclama as prestações a que julga ter direito.
Pede então que se declare que foi despedida sem justa causa e que, por isso, é nulo o seu despedimento, condenando-se o réu a assim o reconhecer e a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas, desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença, tudo acrescido de juros calculados à taxa legal e a liquidar mensalmente até integral pagamento e ainda a reintegrar a autora na empresa ou a indemnizá-la conforme a opção que esta fizer e a indemnizá-la por danos não patrimoniais em valor nunca inferior a € 15.000,00 acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até ao pagamento.
Pede ainda a condenação do réu a suportar uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 250,00 por cada dia decorrido após a exequibilidade da sentença sem que o mesmo reintegre efectivamente a autora nas suas funções. 1.2 Frustrada a obtenção de acordo na audiência de partes, o réu contestou, impugnando parte dos factos alegados e refutando ser devedor de qualquer quantia à autora.
Conclui sustentando a improcedência da presente acção e a respectiva absolvição de todos os pedidos efectuados pela autora. 1.3 Realizado audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual a autora afirmou optar pela reintegração, o tribunal respondeu à matéria de facto, sem que tenha havido reclamação, e foi proferida sentença que concluiu nos seguintes termos:
“DECISÃO
Nos termos de facto e de direito expostos julgo a presente acção procedente, por provada declarando de ilícito o despedimento de que a Autora S… foi alvo e consequentemente condeno o Réu, BANCO…, S.A., a pagar à Autora as retribuições vencidas e vincendas desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença, deduzidas da importância recebida a título de compensação pela cessação do contrato de trabalho (€1.750,78), tudo acrescido de juros à taxa legal a liquidar mensalmente até integral pagamento e ainda a reintegrá-la na empresa.
Mais condeno o Réu a pagar a título de sanção pecuniária compulsória no valor diário de €250,00, por cada dia decorrido após o trânsito em julgado da sentença sem que o Réu reintegre a Autora nas suas funções.
Quanto ao mais absolvo o Réu do pedido.
Custas (…).” 2.1 O réu, não se conformando com a decisão, veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
1.ª A sentença padece de erro na decisão fazendo uma errónea aplicação do direito ao vertente caso, contrariando assim a Lei, o Direito e a Justiça.
2.ª O Recorrente defende que os factos assentes e provados impunham decisão diversa, conforme especificadamente se alega ao longo deste recurso.
3.ª Embora a validade da cláusula do contrato a termo, seja questão de direito, haveria aspectos que a A. teria de demonstrar em sede de audiência de discussão e julgamento, designadamente, o do uso abusivo e fraudulento do seu contrato de trabalho a termo, que manifestamente não demonstrou.
4.ª Tal não só não foi demonstrado pela A., como o Recorrente logrou provar o contrário que existia efectivamente uma situação excepcional de acréscimo da sua actividade que motivavam e justificavam a utilização da contratação a termo certo, porquanto, desconheciam de tal situação iria perdurar no tempo.
5.ª Com o devido respeito, o Tribunal a quo não deveria ter decidido a questão de direito como fez, pois em nossa opinião a concretização do termo constitui uma formalidade ad probationem e não ad substantiam, o Recorrente provou a sua necessidade temporária e a reestruturação invocada na cláusula do contrato de trabalho a termo certo celebrado com a Recorrida.
6.ª Como supra-alegado inexistiu qualquer despedimento ilícito ou ad nutum. A causa de cessação do contrato de trabalho entre A./Recorrida e o R./Recorrente foi a caducidade do contrato a termo certo, que era justificado.
7.ª A estipulação do prazo não foi abusiva nem teve como fim iludir as disposições do regime de celebração de contratos a termo.
8.ª Entendendo-se que a referência à relação entre a justificação invocada e o termo pode ser feita nos termos em que o Recorrente o fez, não se exigindo uma clareza de redacção e o rigor na concretização de factos e circunstâncias, nos mesmos termos anteriormente previstos na Lei n.º 38/96 de 31 de Agosto que foi expressamente revogada com a entrada do Código do Trabalho, conforme dispõe o art. 21.º, n.º 1, alínea u) da Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto que aprovou o CT.
9.ª A Recorrida alegando que tinha um vínculo duradouro, quando sabia perfeitamente que tinha um vínculo precário age com abuso de direito e má fé.
10.ª Não se justifica qualquer pedido de reintegração, nem tampouco a aplicação de uma qualquer sanção pecuniária compulsória.
11.ª Em suma, no caso sub judice, a sentença é errónea, porque conflitua com os valores da segurança, certeza jurídica, imanentes à exigência da forma escrita dos contratos a termo que foi verificada; com a verificação da relação de facto existente entre as partes que foi demonstrada e com o princípio de justiça, ou ideia de direito, por causa do abuso de direito com que a A./Recorrida alegou.
12.ª Na verdade, é incongruente um direito seguro, mas injusto. Daí que a cláusula geral de abuso de direito, tenha a função de colmatar estas situações de injustiça, fazendo prevalecer a ideia de justiça, mesmo sacrificando o valor da segurança, devendo ser este o sentido com que, no entender do Recorrente, a decisão devia ter sido interpretada e aplicada.
13.ª Pelo exposto, a sentença traduziu-se num resultado ética e juridicamente injusto, entendendo o apelante que a decisão sob recurso fez uma inexacta interpretação e aplicação da lei, violando, entre outros, o disposto nos artigos 496.º do Código Civil e 515.º e 659.º n.º 3 do Código de Processo Civil.
14.ª Concluindo, a sentença traduziu-se num resultado ética e juridicamente injusto, pelo que se pede aos Venerandos Desembargadores que apreciem a matéria de direito e de facto do aresto em crise, elegendo, interpretando e aplicando a lei e julgando procedente a presente apelação.
Termina sustentando que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença, e consequentemente, substituir-se por outra que julgue procedente o presente recurso e absolva o recorrente do pedido. 2.2 A autora/recorrida apresentou contra-alegações, sustentando que as funções por si exercidas eram permanentes e não meramente ocasionais; após a cessação do contrato, tais funções foram asseguradas por outra colaboradora que foi admitida para o efeito; o réu limitou-se a usar as expressões da lei sem lhes dar qualquer conteúdo concreto e de facto, de modo a poder justificar a contratação a termo, pela menção expressa dos factos que integram a justificação para a reestruturação e consequente aumento temporário de actividade que alegou, pelo que o contrato de trabalho se converteu em contrato por tempo indeterminado, sendo as insuficiências apontadas insusceptíveis de suprimento por quaisquer explicações ou acordos verbais, na certeza de que, apesar de ter alegado a sua existência, os mesmos não se verificaram e o réu não os provou.
Conclui que a sentença recorrida deve manter-se inalterada. 3.1 O Ministério Público, afirmando que a decisão recorrida se acha bem fundamentada e fez correcta e adequada apreciação do direito, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, confirmando-se a decisão que dele é objecto. 3.2 As partes, notificadas, não se pronunciaram. 4. O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação – artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, do Código de Processo Civil, e artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho – sem prejuízo da apreciação por iniciativa própria de questões de conhecimento oficioso.
No caso dos autos, analisadas as conclusões formuladas pelo recorrente, extrai-se que o objecto do presente recurso se consubstancia na apreciação das seguintes questões:
§ A pretensa validade da cláusula de contrato a termo.
§ Abuso de direito e má fé, por parte da autora.
§ A verificação dos pressupostos da reintegração e das prestações atribuídas. II) Fundamentação 1. Factos relevantes.
Com interesse para a decisão a proferir, importa considerar os factos que o tribunal de primeira instância julgou provados.
“Fundamentação de facto:
1 - A Autora foi admitida ao serviço do Réu em 23.06.08, para lhe prestar a sua actividade profissional de empregada bancária sob as suas ordens, direcção e autoridade e mediante retribuição (alínea A) dos factos assentes).
2 - O contrato de trabalho celebrado com o Réu foi a termo certo pelo período de um ano, com termo a 22.06.2009, tendo-se renovado, por duas vezes, por iguais períodos (alínea B) dos factos assentes).
3 - Desde a data da admissão da A. até 21.03.2009, o seu local de trabalho foi na agência do Réu, sita em Tomar e a partir de 22.03.2009, na Agência do Réu que este abriu em Abrantes (alínea C) dos factos assentes).
4 - A Autora iniciou funções na agência do Banco Réu, sita em Abrantes, desde o dia da abertura desta Agência, tendo-lhe, aliás, sido referido, na data da sua admissão, que era admitida, precisamente, para a Agência de Abrantes, cuja abertura iria ocorrer (alínea D) dos factos assentes).
5 - Nas referidas agências do Réu, a Autora desempenhou funções administrativas, nomeadamente funções de assistente comercial, atendendo os clientes das agências e funções de caixa (alínea E) dos factos assentes).
6 - Inclusive em 31.12.2010 era a assistente comercial do Banco Réu com melhor classificação (a nº 1 do ranking das assistentes comerciais de todo o Banco) (alínea F) dos factos assentes).
7 - Na data da admissão no Réu, a Autora foi colocada no nível de retribuição 4 do ACT do Sector Bancário acrescido de um subsídio de almoço e de um subsídio de falhas (alínea G) dos factos assentes).
8 - Por carta de 04.05.2011 o R. comunicou à A. que não pretendia renovar o seu contrato de trabalho a termo certo e que, por isso, o mesmo caducaria em 22.06.2011 como, na realidade, veio a acontecer (alínea H) dos factos assentes).
9 - O motivo justificativo da contratação a termo consta da cláusula sétima do contrato celebrado entre Autora e Réu, a qual prevê o seguinte: “O prazo estabelecido justifica-se pelo facto de o primeiro se encontrar numa fase de profunda reestruturação, com consequente aumento temporário de actividade” (alínea I) dos factos assentes).
10 - À data da cessação do contrato de trabalho a Autora auferia a retribuição mensal no valor de €729,49 acrescido de um subsídio de almoço no valor de € 9,03 por cada dia de trabalho efectivamente prestado e de um acréscimo a titulo de subsidio de falhas no valor de 133,30€ (alínea J) dos factos assentes).
11 - A Autora é sócia do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, com o nº 81392, desde 29.07.08 (alínea L) dos factos assentes).
12 - As funções que a Autora exercia correspondiam a necessidades permanentes do Banco Réu e foram asseguradas durante alguns meses por uma outra colaboradora que foi admitida para o efeito (resposta positiva ao artigo 1º da base instrutória).
13 - A autora veio abrir a agência de Abrantes e aí permaneceu dado que reside em Abrantes (resposta positiva ao artigo 2º da base instrutória).
14 - O desempenho da Autora no Banco foi dos melhores, tendo inclusive alcançado os melhores resultados na classificação do Banco (resposta positiva ao artigo 4º da base instrutória).
15 - A Autora encontra-se num quadro de ansiedade causado pelo despedimento e pelo receio de não encontrar emprego tendo até em conta a fase de profunda crise no emprego que atravessamos (resposta positiva ao artigo 5º da base instrutória).
16 - Autora tem de pagar mensalmente um empréstimo para habitação e todas as demais despesas normais de uma casa e de subsistência (resposta positiva ao artigo 6º da base instrutória).
17 - Toda esta situação causa à Autora angústia (resposta positiva ao artigo 7º da base instrutória).
18 - Foi solicitado aos Recursos Humanos da Ré que procedessem à contratação de um colaborador para a zona que abrangia Tomar e Abrantes (resposta positiva ao artigo 9º da base instrutória).
19 - A conjuntura económico-financeira em que a Autora foi contratada alterou-se radicalmente (resposta positiva ao artigo 17º da base instrutória).” 2. Enquadramento legal.
O recorrente, afirmando (na conclusão 14.ª) pretender que se aprecie “a matéria de direito e de facto do aresto em crise”, não questiona verdadeiramente a matéria de facto que o tribunal a quo julgou provada e não provada, na certeza de que não se mostra cumprida a exigência do artigo 685.º-B do Código de Processo Civil. O que o réu questiona é a leitura que é feita na sentença recorrida em relação aos factos que se julgaram provados.
No essencial, discute-se nos presentes autos a validade do contrato de trabalho a termo certo, outorgado por autora e réu, com as consequências daí decorrentes.
O aludido contrato foi outorgado em Junho de 2008, na vigência do Código do Trabalho/2003, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto.
O artigo 10.º deste diploma legal caracteriza o contrato de trabalho como aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, sob a autoridade e direcção destas.
Além do contrato de trabalho por tempo indeterminado, estabelecido como padrão, a lei admite o contrato de trabalho a termo, com natureza excepcional, condicionado aos pressupostos de admissibilidade enunciados no artigo 129.º do mesmo diploma legal. De acordo com esta norma, o contrato de trabalho a termo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades [n.º 1], considerando-se, nomeadamente, necessidades temporárias da empresa a substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer razão, se encontre temporariamente impedido de prestar serviço [n.º 2, alínea a)], actividades sazonais ou outras actividades cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matérias-primas [n.º 2, alínea e)] ou acréscimo excepcional de actividade da empresa [n.º 2, alínea f)]. Além de tais situações, pode ser celebrado um contrato a termo no lançamento de uma nova actividade de duração incerta, bem como início de laboração de uma empresa ou estabelecimento [n.º 3, alínea a)] ou na contratação de trabalhadores à procura de primeiro emprego ou de desempregados de longa duração ou noutras situações previstas em legislação especial de política de emprego [n.º 3, alínea b)].
A norma em causa – que, com algumas alterações, corresponde ao artigo 140.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, actualmente em vigor – deixa de conter uma enumeração taxativa, que caracterizava a legislação anterior que regulava a celebração de contratos a termo (cf. artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro), passando a considerar uma enumeração exemplificativa, mas sem que isso se traduza numa admissibilidade genérica do contrato de trabalho a termo. Na verdade, sem prejuízo de se admitir a contratação a termo em situações que vão além das que estão explicitamente enunciadas na norma em referência, o contrato de trabalho a termo continua a ter natureza restrita, quanto à sua admissibilidade, pressupondo sempre a existência de necessidades temporárias da empresa e uma duração pelo período estritamente necessário à satisfação de tais necessidades.
Daí que, além da exigência de forma escrita [artigo 103.º, n.º 1, alínea c), do Código do Trabalho de 2003], o artigo 131.º do mesmo diploma legal estabeleça que do contrato de trabalho a termo devam constar, o nome ou denominação e domicílio ou sede dos contraentes [n.º 1, alínea a)], a actividade contratada e retribuição do trabalhador [n.º 1, alínea b)], o local e período normal de trabalho [n.º 1, alínea c)], a data de início do trabalho [n.º 1, alínea d)], a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo [n.º 1, alínea e)], bem como a data da celebração do contrato e, sendo a termo certo, da respectiva cessação [n.º 1, alínea f)], na certeza de que, para efeitos da alínea e) do n.º 1, a indicação do motivo justificativo da aposição do termo deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado [n.º 3], considerando-se contrato sem termo aquele em que falte a redução a escrito, bem como as referências exigidas na alínea e) do n.º 1 [n.º 4 do aludido artigo 131.º do Código do Trabalho de 2003].
Assim, a justificação deverá constar do contrato escrito e não pode restringir-se à transcrição dos fundamentos enunciados na referida norma, devendo antes enunciar os factos concretos que a integram, estabelecendo a relação entre a justificação que é alegada e o termo estabelecido, na certeza de que só assim se pode verificar se está ou não justificado o recurso ao contrato de trabalho a termo.
A menção escrita do motivo, no contrato de trabalho, configura uma formalidade ad substantiam e não uma mera formalidade ad probationem, que tenha apenas em vista facilitar a prova dos factos correspondentes. Perante as exigências antes mencionadas, com referência aos artigos 103.º e 131.º do Código do Trabalho de 2003, a observância da forma é essencial à validade da declaração negocial e não se destina apenas a facilitar a prova; se não for observada a forma escrita ou se do contrato escrito não constarem os elementos mencionados na lei, é o próprio termo que é nulo, sem que haja possibilidade de provar os elementos em falta por qualquer outro meio de prova, fora do documento e/ou em momento posterior, nomeadamente, na contestação ou em audiência de julgamento.
A falta de concretização do motivo justificativo, seja pela mera transcrição de qualquer uma das expressões que constam das várias alíneas do n.º 2 do artigo 129.º do Código do Trabalho de 2003, seja pelo recurso a expressões genéricas ou imprecisas, não pode ser suprida pela alegação dos factos pertinentes na contestação da acção em que o tema se suscite ou pela junção de documentos apenas no curso dos autos, maxime, em audiência de discussão e julgamento, o que constitui mais uma manifestação do carácter ad substantiam da formalidade.
Este entendimento não é contrariado pelo facto de se estabelecer no artigo 130.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2003 que a prova dos factos que justificam a celebração do contrato a termo cabe ao empregador (actualmente, artigo 140.º, n.º 5, do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro). Na verdade, interferindo esta norma com a repartição do ónus da prova, não prejudica a exigência da explicitação no contrato do motivo justificativo da contratação a termo; decorre da norma que, sendo questionada a efectiva existência do fundamento enunciado para a contratação do trabalhador a termo, cabe ao empregador provar que o mesmo se verifica; a mesma não legitima que se prove na acção judicial o fundamento cuja enunciação se omitiu ou se fez constar com mera referência aos fundamentos enunciados no artigo 129.º do Código do Trabalho de 2003.
Importa confrontar o quadro legal que se deixa sumariado com a concreta situação a que se reportam os autos e com os fundamentos de oposição suscitados pelo réu/recorrente. 3. A pretensa validade da cláusula de contrato a termo. 3.1 É incontroverso que, por escrito datado de 18 de Junho de 2008, a autora foi admitida ao serviço do réu, a fim de prestar a sua actividade profissional de empregada administrativa, constando do escrito que o contrato seria válido pelo período de um ano, com início no dia 23 de Junho de 2008 e termo no dia 22 de Junho de 2009, renovável por período igual ao inicialmente celebrado.
Impunha-se que se fizesse constar do contrato de trabalho e, especificamente, da cláusula do termo, os factos e circunstâncias relativos à profunda reestruturação do réu e ao aumento temporário de actividade, de modo que se pudesse verificar se se justificava ou não o recurso ao contrato de trabalho a termo e com a duração indicada, atenta a natureza excepcional deste tipo de contratação.
Analisado o teor do contrato outorgado entre autora e réu e, especificamente, a sua cláusula 7.ª (cf. documento de fls. 14 e parágrafo 9 dos factos provados), verifica-se que aí consta que “o prazo estabelecido justifica-se pelo facto de o primeiro se encontrar numa fase de profunda reestruturação, com consequente aumento temporário de actividade".
Na sentença recorrida afirma-se a este propósito:
“Com efeito, no caso dos autos importava que se tivesse feito constar da cláusula do termo do contrato de trabalho escrito os concretos factos e circunstâncias relativos à reestruturação do Réu e ao aumento temporário de actividade por forma a que se pudesse verificar se se justificava ou não o recurso ao contrato de trabalho a termo e com a duração indicada.
O motivo justificativo da contratação a termo consta da cláusula sétima do contrato celebrado entre Autora e Réu (…).
Do teor da citada cláusula apenas resulta que o motivo justificativo é genérico, não descrevendo quaisquer factos concretos, pelo que teremos de concluir que o Réu não cumpriu o seu ónus.
O teor da citada cláusula não passa de uma generalidade insusceptível de ser compreendida pela trabalhadora na altura da assinatura do contrato e também insusceptível de aferição em concreto dos motivos do recurso à contratação a termo por parte do julgador.
Em nossa opinião estamos perante um cláusula que não justifica o termo aposto no contrato.
Assim, não constando da cláusula 7ª do contrato de trabalho da Autora os concretos factos e circunstâncias que integram o termo e o motivo justificativo do contrato, dado o carácter genérico do indicado, a inobservância da formalidade ad substantiam afecta a validade da declaração, atento o disposto no art. 220º do Cód. Civil e dita a invalidade do termo, sem que a prova possa ser efectuada por outro meio ou em outro lugar, teremos assim de concluir pela nulidade do termo aposto.
Em face da nulidade do termo aposto é evidente a conclusão de que o contrato dos autos tem de ser considerado um contrato de trabalho sem termo, atento o disposto no art. 131º n.º 4 do CT2003 e actual art. 147º n.º 1 al. c) do CT2009”.
Perante o quadro legal que se deixou enunciado, não se vê fundamento para questionar este entendimento.
O recorrente pretende que a menção do motivo, por escrito, no contrato de trabalho e à luz da legislação que aqui releva (Código do Trabalho de 2003), traduz uma mera formalidade ad probationem, destinada a facilitar a prova dos factos correspondentes.
Não lhe assiste razão, pelos motivos que em momento anterior se deixaram enunciados, com referência ao artigo 131.º do aludido diploma e de onde decorre que a validade da declaração negocial pressupõe que se observem as exigências legais, sob pena de nulidade e sem que haja a possibilidade de provar por qualquer outra forma os elementos em falta.
Também não assiste razão ao recorrente quando pretende que não se exige actualmente uma clareza de redacção e o rigor na concretização de factos e circunstâncias, nos termos anteriormente previstos na Lei n.º 38/96 de 31 de Agosto, expressamente revogada com a entrada do Código do Trabalho de 2003, conforme dispõe o artigo 21.º, n.º 1, alínea u), da Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto que aprovou este código.
As conclusões não se alteram à luz do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, nos termos antes enunciados. 3.2 O recorrente alega que a autora não provou o uso abusivo e fraudulento do contrato em questão e que, ao invés, o réu provou que havia efectivamente uma situação excepcional de acréscimo da sua actividade e que motivava a contratação a termo.
Quanto ao primeiro ponto, decorre do que antes se deixou exposto que não recaía sobre a autora o ónus da prova de tais factos; de qualquer modo, não deixa de ter relevância, em prejuízo do entendimento do réu/recorrente, o facto que consta no parágrafo 12 (as funções que a autora exercia correspondiam a necessidades permanentes do réu e foram asseguradas durante alguns meses por uma outra colaboradora que foi admitida para o efeito).
Quanto ao segundo ponto, importa começar por salientar que, face ao quadro legal que antes se deixou enunciado, a inobservância da formalidade ad substantiam determina a invalidade do termo, sem que possam provar-se por outros meios os factos que então se omitiram.
De qualquer modo, os factos provados não permitem sustentar a conclusão afirmada pelo recorrente.
A este propósito, provou-se que a “conjuntura económico-financeira em que a Autora foi contratada alterou-se radicalmente” – cf. parágrafo 19 dos factos provados.
Perante estes factos, não se vê que esteja demonstrada a relação entre a reestruturação do réu e a contratação da autora.
Conclui-se então que, no caso dos autos e perante a formulação genérica do motivo apontado para justificar a estipulação de termo, o contrato outorgado entre autora e réu considera-se necessariamente um contrato de trabalho sem termo, face ao disposto no artigo 131.º, n.º 4, do Código do Trabalho de 2003.
Daí que improceda nesta parte o recurso interposto pelo réu. 4. A alegada existência de abuso de direito e má fé, por parte da autora. 4.1 No âmbito do exercício e tutela dos direitos, o artigo 334.º do Código Civil estabelece que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
Para a configuração do abuso de direito, segundo a concepção objectiva aceite na citada norma, “não é necessária a consciência, por parte do agente, de se excederem com o exercício do direito os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito; basta que, objectivamente, se excedam tais limites.
Mas também não basta que o exercício do direito cause prejuízos a outrem. (…) Para que o exercício do direito seja abusivo, é preciso que o titular, observando embora a estrutura formal do poder que a lei lhe confere, exceda manifestamente os limites que lhe cumpre observar. É preciso, como acentuava M. Andrade (…), que o direito seja excedido «em termos clamorosamente ofensivos da justiça»” – Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, volume I, 4.ª edição, páginas 465 e 466.
O abuso de direito pressupõe a existência do direito; actuando a parte a coberto de um poder formal, visa resultados que violam de forma gritante os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes, ou pelo fim económico ou social do direito. 4.2 A este propósito, o recorrente afirma que a autora, ao alegar a existência de um vínculo duradouro, quando sabia perfeitamente que tinha um vínculo precário, age com abuso de direito e má fé. Não se vê que se verifiquem tais vícios.
Dos factos provados resulta que a autora foi admitida ao serviço do réu a fim de exercer funções administrativas, nomeadamente como assistente comercial, atendendo os clientes das agências e funções de caixa, tendo sido colocada desde a admissão e até 21 de Março de 2009 na agência do réu sita em Tomar e, a partir de 22 de Março de 2009, na agência que entretanto abriu em Abrantes, onde sempre se manteve.
Pretende o recorrente que, quando escolheu a autora como candidata ao lugar que veio a ocupar, lhe foi explicado que iria assinar um contrato de trabalho a termo certo, porque entendia o réu que houve um aumento de volume de negócio e trabalho e que o mesmo seria um acréscimo temporário e excepcional da sua actividade, tendo a autora perfeita consciência dos motivos que levaram à sua contratação, detalhadamente explicados aquando do seu recrutamento. Não se provaram tais factos. Segundo juízos de normalidade, é natural que quando a autora foi contratada pelo réu, pela simples leitura do contrato escrito celebrado, tenha percebido que tinha sido contratada a termo. Daqui decorre que, relativamente à autora, não se pode afirmar mais do que a assinatura do contrato, nos termos que dele constam, sem que possa ser-lhe atribuída a autoria das cláusulas dele constantes, particularmente, da cláusula sétima.
A autora, ao demandar o réu, não oculta a existência de tal cláusula e o conhecimento da mesma quando procedeu à assinatura do contrato, não podendo afirmar-se que tenha alegado nesse enquadramento a existência de vínculo duradouro; o que a autora suscita é a invalidade da cláusula em questão, com as consequências que daí resultam.
Recaindo sobre o empregador o ónus da prova do motivo justificativo do termo, a ele cabe diligenciar pela inclusão da efectiva descrição do mesmo no contrato.
Relativamente ao trabalhador, a existência e validade do termo certo tornam precário o contrato que, no interesse do trabalhador, poderia ter sido celebrado por tempo indeterminado; a invocação da nulidade do contrato, na ausência de menção válida de motivo justificativo da contratação a termo, corresponde ao exercício normal do seu direito ao trabalho, não configurando abuso do direito ou má fé.
Conclui-se por isso que, também aqui, improcede a argumentação do recorrente. 5. A verificação dos pressupostos da reintegração e das prestações atribuídas.
A este propósito, o réu pretende que, não tendo havido despedimento ilícito, tendo antes operado a caducidade do contrato de trabalho a termo certo, não se justifica qualquer pedido de indemnização ou de reintegração por parte do trabalhador, tal como não se justifica a aplicação de sanção pecuniária compulsória. 5.1 Conforme decorre dos fundamentos que antes se deixaram enunciados, a nulidade do termo determina que o contrato de trabalho dos autos seja considerado como um contrato de trabalho por tempo indeterminado, face ao disposto no artigo 131.º, n.º 4, do Código do Trabalho de 2003 [artigo 147.º, n.º 1, alínea c) do Código do Trabalho de 2009]; em face disso, a carta do réu à autora, datada de 4 de Maio de 2011, a informar que não pretendia renovar o contrato estabelecido, a partir de 22 de Junho de 2011, invocando a caducidade do contrato de trabalho e pondo desse modo termo ao mesmo, equivale a um despedimento ilícito.
O Tribunal a quo extraiu daí as legais consequências, determinando a reintegração na empresa [de acordo com a opção feita pela própria trabalhadora, em audiência de julgamento, nos termos documentados a fls. 55 dos autos e de acordo com o disposto no artigo 389.º, n.º 1, alínea b), do Código do Trabalho de 2009, idêntico ao que consta no artigo 436.º do Código do Trabalho de 2003] e o pagamento das remunerações que a mesma deixou de auferir, com as legais deduções (nos termos do disposto no artigo 390.º do Código do Trabalho de 2009, idênticos ao do artigo 437.º do Código do Trabalho de 2003).
A sanção pecuniária compulsória requerida pela autora tem inteiro cabimento, face à obrigação que está em causa – obrigação de prestação de facto infungível, positivo, a satisfazer pelo réu – e ao disposto no artigo 829.º-A, n.ºs 1 a 3, do Código Civil. 5.2 Na respectiva motivação de recurso, o réu/recorrente pretende ainda que, na decisão sob recurso, houve violação do disposto no artigo 496.º do Código Civil, na medida em que não se terão verificado danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Esta arguição resulta de erro na leitura da sentença sob recurso.
É certo que, na petição inicial (artigos 25.º a 31.º), a autora invoca a existência de danos não patrimoniais e reclama o pagamento de indemnização relativamente aos mesmos, em quantia “nunca inferior” a € 15.000,00.
Nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho de 2009 [correspondendo ao artigo 436.º, n.º 1, alínea a), do Código do Trabalho de 2003], sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, causados; especificamente no que diz respeito aos danos não patrimoniais e como salienta o recorrente, devem considerar-se aqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito – artigo 496.º do Código Civil.
Contudo, a simples leitura da sentença evidencia que aí se julgou improcedente a pretensão da autora, nesta parte. Depois de se salientarem os factos com relevância nesta parte, afirma-se:
“Estes factos são manifestamente insuficientes para podermos concluir que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, não sendo por isso devida à autora qualquer indemnização por danos morais.
(…) À Autora incumbia a prova da ocorrência de quaisquer factos materiais e concretos os quais assumissem tal gravidade que justificasse a atribuição de indemnização por dano moral, não tendo logrado obter tal prova, mais não resta do que deixar consignado que nesta parte improcederá o seu pedido”.
Consequentemente, na parte decisória, o réu é absolvido do pedido nesta parte, o que prejudica a existência de fundamento de recurso em relação à mesma.
Conclui-se então que, não ocorrendo violação do disposto nos artigos 496.º do Código Civil e 515.º e 659.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, e não conflituando a sentença recorrida com a verificação da relação de facto existente entre as partes, improcede o recurso. 6. Vencido no recurso, o recorrente suportará o pagamento das custas respectivas (artigo 446.º do Código de Processo Civil). III) Decisão: 1. Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar improcedente o recurso interposto pelo réu, Banco…, S.A., e, em consequência, manter na íntegra a sentença recorrida. 2. Custas a cargo do réu.
Évora, 17 de Abril de 2012. (Joaquim Manuel de Almeida Correia Pinto) (João Luís Nunes) (Acácio André Proença)