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TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
AUTORIA
CUMPLICIDADE
Sumário
I- Age como cúmplice a arguida que acompanhou o marido e outro co-arguido numa viagem a Marrocos com vista à aquisição e transporte de bolotas de haxixe, cuja actividade consistiu em conferir uma aparência de normalidade familiar ou de passeio à viagem que os co-arguidos empreenderam e, ainda, para no regresso após a ingestão das "bolotas" pelos outros arguidos, os revezar na condução do veículo em que seguiam.
Texto Integral
Em conferência, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I. Relatório
1. – Nos presentes autos que correm termos no 1º juízo do Tribunal Judicial de Elvas foram acusados para julgamento em processo comum com intervenção do tribunal coletivo, A, solteiro, mecânico de automóveis desempregado (desde finais de 2010), nascido em 17-01-1975, natural de Lisboa, residente em Lisboa e, actualmente, preventivamente preso no EPR de xxx, à ordem dos presentes autos e desde 6 de Julho de 2011, tendo sido detido em 5 de Julho de 2011, B, casado, ajudante de padeiro, nascido em 09-08-1983, natural de Lisboa, residente em Lisboa e, actualmente, preventivamente preso no EPR de xxx, à ordem dos presentes autos e desde 6 de Julho de 2011, tendo sido detido em 5 de Julho de 2011 e C, casada, massagista desportiva e auxiliar de fisioterapia (desempregada), nascida em 16-07-1985, natural de Lisboa, e, actualmente, preventivamente presa no EPR de xxx, à ordem dos presentes autos e desde 6 de Julho de 2011, tendo sido detida em 5 de Julho de 2011. a quem o MP imputara a prática, em co-autoria material e na sua forma consumada, de um crime p. e p. pelos artsº. 21º., 1 e 24º., al. c), do DL 15/93, de 22.1, com referência à Tabela I-C, anexa ao mesmo diploma legal.
2. – Realizada a audiência de julgamento, o tribunal coletivo decidiu julgar parcialmente procedente, por provada, a acusação Ministério Público e, em consequência, condenou:
- O arguido B pela prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, previsto e punível, pelo art.º 21º, nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22/01, com referência à Tabela I-C anexa àquele diploma e ao disposto no art.º 26º, do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- O arguido A pela prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, previsto e punível, pelo art.º 21º, nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22/01, com referência à Tabela I-C anexa àquele diploma e ao disposto no art.º 26º, do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- A arguida C pela prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, previsto e punível, pelo art.º 21º, nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22/01, com referência à Tabela I-C anexa àquele diploma e ao disposto no art.º 26º, do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.
3. – Inconformados, vêm os arguidos recorrer conjuntamente, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões:
III – Conclusões
• Conclui-se pois que, em relação à autoria de que os arguidos vêm acusados, ficou provado em sede de audiência de discussão e julgamento de que, não houve conjugação de esforços para a prática do crime de tráfico de estupefacientes.
• Na verdade, quem organizou toda a operação foi o arguido B e o mandante desta.
• Na verdade, ficou provado que o referido B é que conhecia o mandante, sendo que pelo mesmo lhe foi dito que convinha levar a sua mulher, para criar uma atmosfera de normalidade, para passarem despercebidos sendo um casal em férias em Marrocos.
• Que a participação da arguida C se limitava à criação de uma atmosfera de normalidade e, para o ajudar, caso o transporte corresse mal e durante esse percurso, o seu co-arguido se sentisse mal.
• No que diz respeito ao arguido A, o seu co-arguido declarou que o convidou para ir “engolir bolotas” a Marrocos em troco de dinheiro, não lhe tendo indicado quando, aonde e como, apenas afirmando que dois ou três dias antes, o informou que era necessário ir alugar um veículo automóvel, uma vez que o mandante desta vez, não tinha conseguido arranjar um carro e, só nesta altura é que o referido A sabe que irá a Marrocos, só tendo tomado conhecimento de que a arguida C também ia, no próprio dia.
• Pelo que se torna difícil que houvesse um estratagema montando pelos co-arguidos para irem a Marrocos a fim de transportarem haxixe no interior do seu organismo.
• Daí que seja nosso entendimento que estaremos perante uma situação de cumplicidade e não de co-autoria.
• No que diz respeito à medida da pena, veio o MP, na sua qualidade de garante da acção punitiva do Estado, requerer que ao arguido B, fosse aplicada uma pena nunca superior a seis anos, sendo que as penas a aplicar aos outros dois arguidos, deveria ser de quatro anos.
• Ora, no presente caso, o tribunal a quo chegou à conclusão que “ o grau de ilicitude do facto é extremamente significativo e relevante” mas “ A culpa dos arguidos (…) situa-se no seu nível médio, sendo mais elevada a do arguido B, atenta a sua idade e o papel que detinha na acção empreendida pelos arguidos”, continuando “ o dolo com que agiram revelou-se intenso (…) sendo menor o revelado pela arguida C ”.
• Todavia, o tribunal a quo foi além do pedido de condenação efectuado pelo Ministério Público, garante da acção punitiva do Estado, que pediu a condenação dos arguidos em pena de prisão mas, no caso do arguido B, numa pena mais elevada que os outros arguidos mas, não superior a seis anos, sendo que no que diz respeito aos demais arguidos, a aplicação de uma pena de quatro anos de prisão.
• No que respeita à arguida C e tendo em conta a prova produzida em audiência e a sua diminuta actuação conforme foi reconhecido pelo próprio tribunal a quo, a sua pena, não deveria ter ido (quatro anos) além do limite mínimo, sendo que em relação ao arguido A, tendo em conta a sua atuação, poderia ir a uma pena entre o limite mínimo e um pouco abaixo do médio (quatro anos e seis meses) e, no que diz respeito ao arguido B, a pena não deveria ir mais do que seis anos, pena essa pedida pelo MP que é a instituição estatal, no âmbito da administração da justiça, essencial á prestação jurisdicional, possuidora da titularidade da promoção da acção penal pública.
• Tendo o MP requerido a condenação dos arguidos em penas muito próximas dos limites mínimos, no caso dos arguidos C e A, no caso do arguido B, não deveria ir mais do que o limite médio.
• Não nos podemos esquecer que o facto pelo qual os arguidos foram condenados, foi por tráfico de haxixe que, sendo grave, não se compara com o tráfico de outro tipo de estupefaciente, como é o caso da heroína e cocaína.
• Pelo que deverá obrigatoriamente ser revista a pena aplicada a cada um dos arguidos, devendo as penas de prisão, em concreto, se fixarem entre os limites mínimos – para os arguidos C e A– e no limite médio, para o arguido B, sendo que a diferenciação de tais penas no seu quantum, deverá resultar da culpa de cada arguido, do grau de ilicitude dos factos por aqueles praticados, do seu passado criminal.
• Por fim, no que toca à suspensão da pena, a mesma efectuasse por recurso a uma prognose favorável assenta na análise das circunstâncias do caso em correlação com a personalidade do agente, visando obter em toda a linha possível a socialização em liberdade, em consonância com a finalidade político-criminal do instituto, que é o afastamento do condenado da prática de novos crimespor meio da simples ameaça da pena, eventualmente com sujeição a deveres e regras de conduta, se tal se revelar adequado a tal objectivo e desde que as exigências mínimas de prevenção geral fiquem também satisfeitas com a aplicação da pena de substituição.
• Ora, no caso da arguida C nada na personalidade desta pode levar a concluir que a mesma tem predisposição para a prática de factos delituosos.
• É verdade que esta é a segunda condenação que a mesma sofre relativo ao mesmo tipo de crime, (sendo que a anterior foi punida ao abrigo do art. 25 do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro, mas, seguramente, também não nos podemos esquecer que a mesma só há relativamente pouco tempo é que se viu envolvida nesta situação.
• Em abono da verdade, só após ter conhecido o seu marido e co-arguido, é que a C se viu envolvida nestas situações, sendo que foi a própria mãe desta, que afirmou que não tem qualquer dúvida que a C se envolveu nesta situação por causa do seu marido, casamento contraído por esta que nem sequer a sua mãe sabia, pois esta não aceitava aquela relação.
• Portanto, encontrando-se este detido em cumprimento de pena, dificilmente a arguida C se envolverá em qualquer facto criminoso, nem mesmo quando este sair, pois tudo o que esta está a viver, a privação da sua liberdade, a ausência do seu meio familiar, tudo isto serviu de castigo para que a C não volte a delinquir.
• Este será um dos casos em que o tribunal pode quase garantir que dificilmente a mesma irá novamente delinquir.
• Além disso, conta com o apoio familiar, está socialmente bem inserida, sendo que só as pessoas mais próximas do seu círculo familiar, são conhecedoras da sua situação de reclusão.
• É evidente que a arguida C errou mas, fê-lo porque foi influenciada pelo seu marido.
• Poderia ter dito que não, ter analisado bem a sua conduta antes de a praticar mas todos nós sabemos quanto a imaturidade nos pode levar a ter comportamentos e condutas que mais tarde nos arrependemos.
• A C é uma jovem mãe que já está a perder e já perdeu parte do crescimento dos seus filhos.
• Já interiorizou o desvalor da sua conduta, tendo tomado consciência de que se pudesse voltar a trás, não iria seguramente “embarcar” nesta situação, por mais amor que tivesse ao seu marido.
• O tribunal a quo, apesar de ter analisado toda a prova produzida bem como tendo analisado os relatórios sociais elaborados relativamente a cada um dos arguidos, veio considerar que a pena da arguida C, não deveria ser suspensa.
• Todavia, não estava tão certo da sua decisão, pois sempre acabou por afirmar que havia sempre possibilidade de recurso.
• Aqui não se trata de recorrermos mas tão-somente de pedir uma oportunidade ao Tribunal Superior para uma jovem mulher que por razões que a própria razão desconhece e em nome de uma relação afectiva, se viu envolvida nos meandros da criminalidade.
• Já a sua mãe a tinha avisado, lhe tinha dito certamente que talvez aquele não fosse o marido certo mas quem é que dá razão à Mãe quando o coração não quer?.
• Portanto, tendo em conta que a arguida C poderá ainda ser um elemento válido nesta nossa sociedade, que poderá criar os seus filhos no caminho da rectidão, o que não aconteceu com o seu marido e, a este, não lhe foi só dada uma oportunidade, a aqui C vem apelar à compreensão e bondade dos Meritíssimos Conselheiro e pedir que lhe seja dada pela última vez, uma nova e segunda oportunidade.
• No que diz respeito ao arguido A, se for entendimento desse Douto Tribunal Superior baixar a pena conforme peticionado, deverão equacionar a hipótese de lhe dar mais uma oportunidade, ainda que seja a última.
• Por fim em relação ao arguido B, tendo em conta o pedido pelo MP, o qual veio solicitar a pena de seis anos de prisão efectiva, deverá a mesma ser reformulada, não ultrapassando o limite mínimo e médio da moldura penal.
Nestes termos e nos melhores de direito, e sempre com o mui suprimento de V. Exas., Venerandos Desembargadores, deverá ser dado provimento ao presente Recurso relativamente à prova gravada (Artº. 411º, nº 4 do CPP) e em consequência ser reformulada a pena aplicada a cada um dos arguidos, devendo no caso da arguida C, suspensa a mesma na sua execução.»
4. – Notificado, o MP apresentou a sua resposta em 1ª instância pugnando pela total improcedência do recurso.
5. - Nesta Relação, o senhor magistrado do MP apresentou parecer no mesmo sentido.
6. – Notificados da junção daquele parecer, os arguidos vieram reafirmar o essencial do entendimento que expressaram na sua motivação de recurso.
7. - A decisão recorrida (transcrição parcial):
« 2.1. Matéria de facto provada
Da instrução e discussão da causa, resultaram provados os seguintes factos:
1º. Em data não concretamente apurada, mas entre meados de Junho de 2011 e antes do dia 05 de Julho de 2011, os arguidos B e C (casados um com o outro) e A, combinaram previamente entre si dirigirem-se a Marrocos para obter produto estupefaciente (canabis resina), com seu posterior transporte e introdução do mesmo em Portugal.
Fizeram-no na sequência do que foi pedido aos arguidos B e A por um indivíduo conhecido pelo “Cigano”, residente na zona J, em Chelas, mas que costuma frequentar o Bairro da Ajuda, o qual lhes propôs tal ida, nos seguintes termos:
Os arguidos deslocar-se-iam em veículo automóvel previamente alugado para tal efeito e receberiam, cada um, € 1 000,00, por cada quilo de canabis resina que conseguissem transportar consigo através do método de ingestão de bolotas de tal produto, de modo a propiciar a sua deglutição e, consequentemente, o seu transporte no interior do organismo (tubo digestivo), facilitando deste modo a sua ocultação e deslocação de Marrocos até Portugal, atravessando Espanha, sendo que, tal pagamento seria feito pelo aludido “Cigano” após recepcionar as bolotas em causa.
2º. Assim, uma semana antes de partirem para Marrocos, o arguido B falou sozinho com o “Cigano” e este entregou-lhe a quantia de € 2 600,00 (dois mil e seiscentos euros), sendo € 2 000,00 para pagar a droga, € 500,00 para as despesas de alimentação, gasóleo e portagens e o restante para proceder ao pagamento do aluguer do veículo automóvel.
3º. Nestes termos, o arguido B alugou tal veículo automóvel através da Internet, tendo sido o arguido A quem levantou o mesmo e quem procedeu ao pagamento do aluguer do veículo ligeiro de passageiros de marca Ford, modelo Fiesta, matrícula xxx, à empresa Guerin, Rent a Car Dois, Lda., com sede na ...Prior Velho e pelo período temporal de 30 de Junho a 5 de Julho de 2011, após o arguido B lhe ter entregue o dinheiro para tal.
4º. Foi assim que, em concretização do referido plano, no dia 30 de Junho de 2011 (5ª feira), à noite, viajaram os três arguidos até Marrocos, utilizando como meio de transporte o supra referido veículo automóvel, sendo que, a arguida C acompanhou o seu marido B e o arguido A a Marrocos também para conferir uma aparência de normalidade familiar ou de passeio à viagem que empreenderam e, ainda, para no regresso após a ingestão das "bolotas" pelos outros arguidos, os revezar na condução do veículo em que seguiam (o arguido B não é titular de carta de condução) o que efectivamente veio a acontecer, na viagem de regresso e por um curto período de tempo.
5º. Chegados a Marrocos, conhecendo previamente o local concreto ao qual se deviam deslocar para obtenção do produto, ao mesmo se dirigiram, aí adquirindo os arguidos, pelo menos, 400 “bolotas” de um produto vegetal prensado – vulgo haxixe – a indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, pelo preço de € 2 000,00, “bolotas” essas que os arguidos A (191) e B (209) engoliram, por forma a armazená-las no tubo digestivo, passando a transportá-las no interior do organismo, visando a sua introdução em Portugal assim dissimuladas, para as ocultarem a hipotéticas acções de fiscalização pelas autoridades policiais.
6º. Posteriormente, no dia 05 de Julho de 2011, cerca das 01h 45m, pretendendo concluir a viagem nos termos planeados, apresentaram-se os arguidos A, B e C, vindos de Espanha, na A6, pela fronteira do Caia-Elvas, no sentido Badajoz-Elvas, transportando-se no veículo xxx, conduzido então pelo arguido A.
7º. Foram nessas circunstâncias os arguidos e o veículo interceptados por elementos do Destacamento Territorial de Elvas da GNR e sujeitos a fiscalização tendo, então, sido detectados, escondidos entre o forro e o tejadilho do veículo:
a) – um passaporte da União Europeia – Portugal, com o nº. L742528, em nome do arguido A, emitido em 07 de Junho de 2011, onde consta a fls. 28 um carimbo datado de 01 de Julho de 2011, de entrada em Tânger-Marrocos e um carimbo datado de 04 de Julho de 2011 de saída de Tânger-Marrocos;
b) – um passaporte da União Europeia – Portugal, com o nº. L097473, em nome do arguido B, emitido em 28.09.2009, onde constam a fls. 24/29 sete carimbos de entrada em Tânger-Marrocos, datados de 31 de Outubro de 2009, 04 de Dezembro de 2009, 31 de Dezembro de 2009, 07 de Maio de 2010, 26 de Agosto de 2010, 21 de Abril de 2011 e 01 de Julho de 2011 e sete carimbos de saída de Tânger-Marrocos, datados de 02 de Novembro de 2009, 06 de Dezembro de 2009, 02 de Janeiro de 2010, 09 de Maio de 2010, 30 de Agosto de 2010, 24 de Abril de 2011 e 04 de Julho de 2011;
c) - um passaporte da União Europeia – Portugal, com o nº. L098066, em nome da arguida C, emitido em 25.09.2009, onde constam a fls. 24/29 sete carimbos de entrada em Tânger-Marrocos, datados de 31 de Outubro de 2009, 04 de Dezembro de 2009, 31 de Dezembro de 2009, 07 de Maio de 2010, 26 de Agosto de 2010, 21 de Abril de 2011 e 01 de Julho de 2011 e sete carimbos de saída de Tânger-Marrocos, datados de 02 de Novembro de 2009, 06 de Dezembro de 2009, 02 de Janeiro de 2010, 09 de Maio de 2010, 30 de Agosto de 2010, 24 de Abril de 2011 e 04 de Julho de 2011;
8º. Foi, ainda, encontrado no interior de uma bolsa preta pertencente à arguida C um pedaço de um maço de tabaco da marca L&M, no qual se encontra escrito o nº. de telefone 21266xxxxx.
9º. Efectuada pesquisa no site www.indicativo-do-país, constatou-se pertencer o indicativo 212 ao Reino de Marrocos.
10º. Foi ainda encontrado no porta-luvas do veículo um telemóvel marca Samsung, modelo GT-S5230 de cor branca, pertencente à arguida C, com o IMEI xxx e cartão SIM da TMN, o qual lhe foi apreendido.
11º. O facto de tudo indicar que os arguidos eram provenientes de Marrocos, levou os agentes policiais a suspeitar que os mesmos pudessem transportar o produto referido em 5 supra, no interior do organismo, razão pela qual os conduziram ao Hospital de Santa Luzia de Elvas, a fim de serem sujeitos a exame radiológico, revelando-se este positivamente conclusivo, relativamente aos arguidos A e B.
12º. Foram, então, os arguidos sujeitos a tratamento, na referida unidade hospitalar, com vista a expelirem todas as bolotas que transportavam no organismo.
13º. Viriam, assim, os arguidos A e B a expelir em um total de 400 “bolotas”, com o peso bruto de 1.844,4gr e o peso líquido de 1.560,527 gramas de um produto vegetal prensado que, sujeito a exame laboratorial no Laboratório de Polícia Científica, da Polícia Judiciária, revelou ser canabis (resina), substância abrangida pela Tabela I-C anexa ao DL 15/93.
14º. Tal substância revelou um grau de pureza que oscila entre os 13,4% e os 13,9% (THC), sendo que permitia ela a confecção de, pelo menos, 4.285 doses aptas ao consumo público, nos termos da Tabela constante da Portaria nº 94/96.
15º. Todos os arguidos sabiam que os produtos estupefacientes apreendidos e que haviam transportado ocultos no organismo de dois deles, se destinavam à sua venda e comercialização a um conjunto indeterminado de toxicodependentes.
16º. Todos eles tinham ainda perfeito conhecimento que os produtos em causa são considerados, pela sua composição, natureza, características e efeitos, substâncias estupefacientes e, como tal, toda a actividade com elas relacionadas, designadamente, posse, transporte, consumo, oferta ou cedência a qualquer título a terceiros, por eles levada a cabo, lhes estava vedada.
17º. Os arguidos não desempenham qualquer actividade profissional regular, desconhecendo-se quaisquer rendimentos declarados.
18º. Agiram os arguidos deliberada, livre e conscientemente, previamente concertados e actuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas, sendo conhecedores da características e da natureza estupefaciente do produto que lhes foi apreendido.
Mais sabiam que estavam a adquirir, transportar e a introduzir em Portugal tal produto estupefaciente, com a finalidade de ser procedida a sua venda a terceiros.
Sabiam, igualmente, serem proibidas e legalmente punidas tais condutas.
Mais se apurou que:
19º. A arguida C, nascida a 16-Jul-1985, é natural de Lisboa, sendo a única filha do casal, apesar de ter outros irmãos uterinos e consanguíneos, com os quais nunca conviveu. Quando contava cerca de 6 meses de idade e na sequência da morte do progenitor, a progenitora foi viver para o estrangeiro, entregando a filha a um casal, seus padrinhos de baptismo, que a criaram e que aquela considera como seus pais verdadeiros. Os pais adoptivos tinham uma filha mais velha, à data já com vida própria. Assim, a arguida foi criada em ambiente familiar detentor de boas condições económicas, caracterizado por sentimentos de afectividade e entreajuda.
Iniciou a escolaridade em idade normal, tendo concluído o 9º ano. Abandonou os estudos com cerca de 15 anos de idade, por se encontrar grávida, fruto de um relacionamento ocasional.
Posteriormente integrou o programa “Novas Oportunidades” e concluiu o 12º ano; refere ainda que tirou o curso profissional “Massagista desportiva e auxiliar de fisioterapia”.
A nível laboral são referidas experiências pontuais em atividades diversificadas, como telefonista, empregada de mesa e bar entre outras, sempre de forma irregular e por curtos períodos de tempo.
Quando tinha cerca de 14 anos de idade ocorreu a separação dos pais adoptivos, situação que vivenciou com muita angústia e revolta, assumindo a partir daí comportamentos de rebeldia. Nesta fase, decidiu ir viver com a mãe biológica que, entretanto, já tinha regressado a Portugal e constituído família, situação que abandonou passado pouco tempo devido a maus tratos.
Esta sua decisão causou grande sofrimento à mãe adoptiva, que cortou relações com a arguida durante um período de tempo. Posteriormente reataram a relação, não voltando a arguida a abandonar o lar de D, onde permanecem igualmente, e desde sempre, os seus dois filhos.
Em 2008 iniciou relacionamento afectivo com o pai do seu segundo filho, B, mas permaneceram ambos a viver junto dos seus familiares; planeavam casar em Agosto de 2011, situação que não veio a ocorrer devido à detenção de ambos, à ordem do presente processo.
A arguida C refere que o relacionamento com B se mantém; estabelece contactos regulares por telefone com o companheiro, que ao longo da detenção também tem beneficiado do apoio da mãe adoptiva da arguida.
Assim, a arguida C continua a beneficiar do apoio de D, que tem a seu cargo os seus dois filhos, presentemente com onze e dois anos de idade, que a visitam periodicamente no Estabelecimento Prisional, estando esta familiar disponível para a apoiar igualmente em meio livre.
À data dos factos, a arguida C integrava o agregado familiar da mãe adoptiva, constituído por esta e por os seus dois filhos. Mantinha um relacionamento afectivo com o pai do seu segundo filho, sendo este seu co-arguido no presente processo.
O respectivo agregado ocupa moradia própria, de tipologia quatro, com boas condições de habitabilidade, inserida em bairro sem problemáticas sociais.
A arguida, nos tempos que antecederam à detenção, deslocava-se frequentemente para a zona de residência do companheiro, onde permanecia por períodos de tempo, sendo este bairro caracterizado por uma população com problemas de índole social, o que, segundo a mãe adoptiva, terá estado na origem do seu envolvimento com o sistema judicial.
Posteriormente, a arguida C vivenciou sempre uma situação económica estável, que se mantém presentemente, contando o agregado com os rendimentos que D aufere decorrentes da sua pensão de reforma e de rendas de imóveis, num total mensal de cerca de € 1 300,00, valor que considera suficiente para apoiar a filha ao longo da detenção e aquando do seu regresso a meio livre.
Apesar de beneficiar de algum apoio económico da mãe adoptiva, à data da detenção, quer ela, quer o companheiro, encontravam-se desempregados, auferindo do Rendimento Social de Inserção; refere que procurava autonomizar-se a este nível, procurando sobreviver sozinha, recorrendo ao apoio da mãe apenas quando indispensável, e no que concerne às questões relacionadas com a subsistência dos menores.
Presentemente, as perspectivas de C passam por reintegrar o agregado da mãe adoptiva, onde se encontram os seus dois filhos, sendo referido que mantém com esta familiar fortes laços afectivos.
Relativamente aos filhos, demonstra sentimentos de afecto, embora não tenha mantido, ao longo dos últimos anos, uma relação próxima com os mesmos, sendo a avó que assegura a educação e todas necessidades dos menores.
Uma vez em liberdade, a arguida projecta retomar os estudos, e ingressar no ensino superior para se licenciar em “Relações internacionais”, contando o apoio da mãe para este efeito.
A arguida C encontra-se detida preventivamente no Estabelecimento Prisional de xxx desde 06/07/2011.
No Estabelecimento Prisional tem mantido uma conduta ajustada, encontrando-se laboralmente inactiva; refere que já solicitou colocação, mas até ao momento não obteve uma resposta positiva neste sentido.
A arguida revela capacidade de relacionamento interpessoal, sem manifestações aparentes de conflituosidade, apresentando face aos fatos uma atitude de reconhecimento pelas práticas delituosas, nomeadamente por parte do companheiro, verificando-se tendencialmente uma postura de desculpabilização face à sua prática que contextualiza em questões económicas.
A sua detenção não teve impacto na vida dos seus familiares directos, nomeadamente dos filhos, que sempre viveram a cargo da avó. No entanto, verifica-se, por parte de D, um sentimento de tristeza e vergonha face a esta situação, que lhe tem causado forte constrangimento social.
Assim, a actual situação de detenção de C é apenas conhecida de alguns elementos familiares e amigos muito próximos; o filho mais velho da arguida sabe da sua detenção, mas desconhece os motivos e os factos que estão na sua origem; o filho mais novo, apenas com dois anos, nunca manteve contactos frequentes com a mãe, pelo que não questiona a sua ausência.
Relativamente ao meio sócio-residencial, a arguida detém uma imagem favorável, mantendo desde sempre boas relações de vizinhança, sendo a sua actual situação de detenção desconhecida no meio, principalmente por vergonha da mãe adoptiva em assumir os comportamentos protagonizados pela filha.
A filha biológica dos pais adoptivos da arguida, apesar de manter um bom relacionamento com esta, não aceitou a sua actual situação de reclusão, manifestando total desagrado pelo envolvimento da mãe nesta situação.
Concluindo verifica-se que a arguida C apresenta um percurso vivencial marcado pela precoce “perda” da família de origem e consequente integração em família alternativa que a acolheu e permitiu um crescimento dentro de padrões sociais normativos.
Refere como situação traumática a separação dos pais adoptivos, episódio que relata com sofrimento, considerando que influenciou atitudes de rebeldia que entretanto assumiu.
No exterior mantém o apoio incondicional de D, mãe adoptiva que a criou desde os 6 meses de idade e com quem mantém fortes laços afectivos. Esta familiar tem a seu cargo os dois filhos menores da arguida e encontra-se igualmente disponível para a receber e apoiar a todos os níveis.
A arguida demonstra motivação para alterar o seu anterior modo de vida, perspectivando, quando em meio livre, retomar os estudos e integrar o ensino superior.
Em julgamento, não prestou declarações.
A arguida tem os antecedentes criminais que constam da cópia actualizada do seu certificado de registo criminal junto a fls. 570 a 573 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, ressalvando-se do seu teor a condenação daquela em 7-01-2008, na pena de 15 meses de prisão cuja execução foi suspensa por igual período e pela prática em 7-5-2005 de um crime de tráfico de produtos estupefacientes de menor gravidade, previsto e punível, pelo art.º 25º, alínea a) do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01, cuja pena foi declara extinta em 31-01-2011.
20º. O arguido B, nascido a 09-Ago-1983, natural de São Sebastião da Pedreira é o mais novo de quatro filhos de um casal de toxicodependentes, ambos falecidos, tendo perdido a mãe, vítima de doença súbita, quando contava apenas 2 meses. Em consequência do falecimento da progenitora a fratria foi separada, ficado o arguido aos cuidados da família paterna, cujos elementos também estavam envolvidos com universo da droga. O progenitor, falecido há 15 anos, vivenciou percurso prisional, assim como alguns tios e irmãos do arguido.
Posteriormente ficou confiado judicialmente a uma tia paterna, com quem estabeleceu marcados laços de afectividade e a quem atribui as funções parentais. Esta tia é viúva há mais de 25 anos e tem problemas de saúde congénitos a nível dos membros inferiores com dificuldades de locomoção.
O arguido B esteve sempre inserido em comunidade de vizinhança conotada com a desviância e a marginalidade social. Abandonou o percurso escolar aos 12 anos, por desmotivação e absentismo, quando frequentava o 5º ano. Ainda iniciou preparação profissional, mas protagonizou diversas interrupções sem efectivar qualquer acreditação. Já muito recentemente, com 28 anos obteve a equivalência ao 9º ano, através do programa Novas Oportunidades.
Iniciou o seu percurso laboral com 16 anos, no sector da restauração, cujo percurso é residual, instável e inconsistente. Também com esta idade fez a aproximação ao grupo de pares de risco, iniciando-se nos consumos de bebidas alcoólicas e de estupefacientes. Relativamente ao consumo de substâncias psicotrópicas, referiu fumar “haxixe”, cocaína inalada e “esctasy”. Nunca foi submetido a qualquer acompanhamento terapêutico sobre esta problemática aditiva.
Conheceu a sua cônjuge com 20 anos (e co-arguida no presente processo), vindo a contrair matrimónio aos 26 anos, após gravidez não planeada, tendo nascido um filho, que hoje tem 2 anos. Apesar do casamento, mantiveram-se ambos nos respectivos agregados de origem por razões de ordem económica.
O arguido B tem uma forte vinculação afectiva à tia paterna que o educou, ao cônjuge, ao filho de ambos e ao primeiro filho da cônjuge (11 anos), sobre o qual assume responsabilidades parentais.
Em termos de actividades de lazer ou de tempos livres não lhe é conhecida ocupação estruturada ou organizada.
O arguido B, à data dos factos que deram origem ao presente processo, residia com a tia paterna, a quem chama mãe, num apartamento inserido em bairro social com problemáticas sociais e propício a actividades ilícitas, composto por dois quartos, sala, cozinha e casa de banho. Trata-se de um imóvel com limitadas condições de habitabilidade.
Relativamente à ocupação laboral, tinha iniciado recentemente actividade profissional em regime de part time como empregado de mesa num restaurante onde iria receber, aproximadamente, € 300,00 mensais.
A cônjuge foi funcionária da Universidade Aberta onde auferia um salário de aproximadamente € 900,00 tendo sido despedida recentemente, executando posteriormente alguns trabalhos como auxiliar de fisioterapeuta.
A situação económica de B é muito precária, uma vez que o agregado onde se encontra integrado possui como único rendimento as reformas da tia paterna, no valor de € 300,00. O arguido, relativamente aos filhos, era apoiado pela sogra (a nível económico e logístico).
Recebe visitas dos filhos e da sogra no Estabelecimento Prisional, limitadas na frequência pela distância geográfica a que se encontram os familiares, bem como, pelas despesas que tais deslocações implicam.
O arguido B encontra-se preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de xxx desde 6 de Julho de 2011 e à ordem do presente processo.
O arguido está a viver a sua situação jurídico-penal com alguma ansiedade e preocupação. Revela atitude desculpabilizante pela conduta desviante, que relaciona com a sua dependência de produtos estupefacientes e dificuldades económicas.
A actual situação jurídico-penal, provocou o afastamento dos familiares, nomeadamente da cônjuge e filhos.
No Estabelecimento Prisional tem tido comportamento adequado às normas da instituição.
Concluindo verifica-se que estamos perante um arguido cujo processo de socialização decorreu num meio familiar instável marcado pela toxicodependência dos pais e por sucessivos elementos da família a quem estava ligado afectivamente.
Viveu desde sempre em ambiente social degradado e com ausência de figuras parentais contentoras e de referência.
Apenas o suporte familiar por parte da tia paterna (a quem chama mãe) e a vinculação aos filhos, poderão constituir-se como factores de protecção.
As dificuldades económicas e as limitadas competências pessoais e sociais que possui, não têm permitido a construção de um projecto de vida integrado dentro do normativo social. Acresce a este factores de risco a problemática aditiva de que padece, toxicodependência, bem como, o percurso criminal diversificado e com reincidência na sua tipologia.
Em julgamento, confessou a essencialidade dos factos que foram apurados.
O arguido tem os antecedentes criminais que constam da cópia actualizada do seu certificado de registo criminal junta aos autos a fls. 558 a 569 e cujo teor aqui se dá por reproduzido e para todos os efeitos legais, ressalvando-se do mesmo o facto de já anteriormente ter sido condenado em penas privativas e não privativas da liberdade, nomeadamente, em suspensão de execução da pena de prisão, cujas medidas tiveram intervenção da DGRS, e as quais não produziram os efeitos desejados. Saliente-se, ainda, que entre essas condenações encontram-se, uma em 19-11-2003, na pena de 7 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 3 anos e pela prática em 4-02-2002 de um crime de tráfico de produtos estupefacientes de menor gravidade, previsto e punível, pelo art.º 25º, alínea a) do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01; uma outra, em 10-05-2004 na pena de 8 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 2 anos e pela prática em 24-09-2001 de um crime de tráfico de produtos estupefacientes de menor gravidade, previsto e punível, pelo art.º 25º, alínea a) do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01; uma terceira, em 30-11-2005 na pena de 2 anos de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 4 anos e pela prática em 10-03-2003 de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, previsto e punível, pelo art.º 21º, com referência ao art.º 26º, ambos do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01; uma quarta, em 19-04-2006 na pena de 1 ano e 2 meses de prisão, pela prática em 13-07-2005 de um crime de tráfico de produtos estupefacientes de menor gravidade, previsto e punível, pelo art.º 25º, alínea a) do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01 e pela prática de um crime de falsa declarações, pena esta que efectivamente cumpriu, tendo sido declara extinta em 9-07-2008; uma quinta, em 21-09-2006, na pena de 24 meses de prisão, pela prática em 18-01-2006 de um crime de tráfico de produtos estupefacientes de menor gravidade, previsto e punível, pelo art.º 25º, alínea a) do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01, cuja execução lhe foi suspensa e pelo período de 3 anos. Além de registar vários outras condenações pela prática de crimes de condução ilegal.
21º. O arguido A, nascido a 17-Jan-1975, é o mais novo de dois filhos. O pai era mecânico de automóveis e a mãe doméstica. O arguido A cresceu em ambiente familiar com grandes carências económicas e sem uma supervisão parental adequada e contentora. Os progenitores separaram-se quando o arguido tinha 12 anos. O arguido esteve sempre inserido em bairro social com problemáticas sociais, mas sem referências criminais.
Iniciou a escolaridade na idade própria tendo abandonando a escola aos 14 anos, por falta de interesse, com diversas retenções tendo completado o 5º ano. Seguidamente e por imposição do progenitor foi aprender a profissão de mecânico de automóveis junto deste, onde desde sempre se ocupou laboralmente, excepção feita a um curto período de emigração na Holanda.
Iniciou os consumos de estupefacientes aos 16 anos de idade com o grupo de pares, com comportamentos de risco. Já foi submetido a acompanhamento da problemática aditiva com terapia de substituição (metadona), no CRI de Lisboa, cuja dependência refere ter abandonado há aproximadamente 5 anos.
Aos 18 anos iniciou relação em união de facto, tendo dois filhos (com 17 e 5 anos de idade) desta relação. Este casal nunca se autonomizou, coabitando no agregado da progenitora.
O arguido A verbaliza vinculação afectiva à progenitora, companheira e filhos.
Nunca ocupou os seus tempos livres ou de lazer de forma estruturada ou organizada.
O arguido A, à data dos factos que deram origem ao presente processo, residia com a companheira e filhos no agregado da progenitora, numa pequena moradia. Como encargo por este imóvel suportam a renda de € 85,00.
Tanto o arguido como a companheira estavam inactivos laboralmente, executando A ocasionalmente uns biscates no sector da mecânica automóvel.
A situação económica deste agregado é sentida pelo arguido como deficitária, sendo a companheira apoiada pelo Rendimento Social de Inserção no montante mensal de € 360,00. Além deste subsídio, acresce a reforma da progenitora, no valor mensal de € 199,00 e a bolsa de estudo atribuída à filha mais velha que frequenta um curso de formação profissional, no valor de € 80,00, por mês.
O arguido A é um indivíduo que não desenvolveu competências pessoais e escolares, cuja lacuna foi agravada pela problemática da toxicodependência. É facilmente influenciável pelo grupo de pares e revela preocupação na assunção das suas responsabilidades parentais.
No Estabelecimento Prisional tem tido comportamento adequado às normas da instituição.
Não recebe – frequentemente – visitas no Estabelecimento Prisional, devido à distância geográfica a que se encontram os seus familiares, cujas deslocações implicam despesas que não podem suportar.
O arguido Ricardo Machado encontra-se preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de xx, desde 6 de Julho de 2011, e à ordem do presente processo.
A actual situação jurídico-penal, provocou o afastamento dos familiares, designadamente, da companheira e filhos e progenitora, impedindo de os auxiliar economicamente.
Concluindo, verifica-se que estamos perante um arguido que provém de meio sócio-familiar desestruturado e que manteve um percurso de vida que não lhe permitiu desenvolver adequadamente competências pessoais e escolares, com o agravamento intrínseco pela problemática da toxicodependência, que afirma estar ultrapassado.
O suporte familiar por parte da progenitora e companheira, com vinculação aos filhos, poderão constituir-se como factores de alguma protecção face à reincidência.
As dificuldades económicas e as limitadas competências pessoais e sociais que possui, não têm permitido a construção de um projecto de vida integrado dentro do normativo social. Acresce a estes factores de risco o contacto anterior com o sistema de Justiça.
O arguido tem os antecedentes criminais que constam da cópia actualizada do seu certificado de registo criminal junta aos autos a fls. 554 a 557 e cujo teor aqui se dá por reproduzido e para todos os efeitos legais, ressalvando-se do mesmo um percurso delinquencial de alguma persistência com reincidência na tipologia do crime. Assim, o referido arguido regista uma condenação em 03-07-2007 na pena de 15 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de 2 anos e pela prática em 03-06-2005 de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, previsto e punível, pelo art.º 21º do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01 e uma outra, em 28-06-2010, na pena unitária de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e pela prática em 01-03-2005 de um crime de detenção de arma proibida, um crime de ameaça, um crime de dano simples e de um crime de ofensa à integridade física simples, tendo sido tal pena proferida no processo comum colectivo nº ---/05.3SFLSB da 7ª Vara Criminal de Lisboa e transitado em julgado no dia 14-09-2010.
Em julgamento, não prestou declarações.
2.2. Factos não provados
Para além dos que ficaram descritos não se provaram quaisquer outros factos, nomeadamente, não se provou que:
1º
Os arguidos destinassem a droga que lhes foi apreendida exclusivamente ao seu consumo pessoal.
2º
Fossem os arguidos quem, posteriormente, iria vender a droga que consigo transportavam ou que os arguidos em causa vivessem da comercialização de produtos estupefacientes e/ou que era com os lucros obtidos com tal que faziam face às suas despesas diárias ou, finalmente, que com as suas supra descritas condutas (mencionadas em 2.1. supra) visassem alcançar um muito elevado diferencial pecuniário relativamente ao dinheiro que tinham entregue para aquisição da referida canabis.
3º
Ao agir, como agiram, os arguidos tivessem como propósito exclusivo conseguir meios para sustentar o seu consumo de tal produto estupefaciente (haxixe).
*
Para além dos factos referenciados em 2.1. (factos provados) e em 2.2. (factos não provados) não se mostra necessário referir quaisquer outros, nomeadamente, por já estarem compreendidos em tais itens, por pelos mesmos se encontrarem prejudicados, por serem conclusivos ou tratarem-se de matéria probatória ou ainda por não revestirem qualquer importância para a boa decisão da causa.
2.3. Motivação da decisão de facto
Quanto ao apuramento da matéria fáctica supra vertida o Tribunal Colectivo formou a sua convicção:
Nas declarações prestadas pelo arguido B, o qual em julgamento explicitou o modo como se deslocou a Marrocos, o que lá foi fazer (adquirir canabis) e todas as demais circunstâncias de tempo e lugar em que se desenvolveu a acção que levou a cabo, conjuntamente com os restantes arguidos, as quais também descreveu pelo modo como ficou apurado em 2.1 supra.
Contudo, no decurso de tais declarações, quando cotejadas com as que o mesmo prestou aquando do seu primeiro interrogatório judicial e constantes a fls. 152 a 156 dos autos verificaram-se algumas contradições e/ou discrepâncias entre ambas, razão pela qual e ao abrigo do disposto nos artigos 356.º, n.º 3, alínea b) e 357º, nº 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal procedeu-se à leitura das segundas, isto é, das declarações prestadas pelo arguido atrás identificado perante a Mmª Juiz de Instrução e aquando do primeiro interrogatório judicial que, assim, foram igualmente consideradas e cotejadas com a demais prova produzida. Acresce dizer que o referido arguido não apresentou qualquer explicação cabal ou verosímil que permitisse compreender tais contradições e/ou discrepâncias, pelo que, foi no conjunto do pelo arguido declarado (aquando do seu 1º interrogatório judicial e em audiência de discussão e julgamento) e apelando às regras da experiência comum e da lógica que este Tribunal Colectivo deu como apurado todo o circunstancialismo fáctico constante em 2.1 supra.
Ainda nesta sede e relativamente ao afirmado pelo dito arguido quanto à conduta tida pelos restantes arguidos importa dizer que embora as declarações do co-arguido possam servir como meio de prova em relação aos demais co-arguidos (seguindo-se a tal propósito o entendimento constante no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/03/2002, in, CJ, Ano XXVII, tomo II, págs. 45 a 50), importa não esquecer que as mesmas têm que se nos afigurarem coerentes, plausíveis, lógicas e conformes às regras da experiência comum a fim de obterem credibilidade, o que sucedeu no caso em apreço e a tal propósito, quanto às declarações prestadas pelo co-arguido B.
Conforme se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/01/2003, proc. nº 02P4213 - retirado da Internet, em www.djsi.pt – “problema relevante é o de se saber qual a valoração a dar ao conhecimento probatório revelado pelo co-arguido no que tange aos factos imputados ao outro co-arguido.
Como é evidente, o conhecimento revelado pelo co-arguido surge perante o julgador numa dupla vertente. Por um lado, não podemos esquecer o facto de estar mais próximo dos acontecimentos e em face disso possuir um conhecimento privilegiado dos mesmos; por outro lado, não podemos ignorar o facto de atenta a qualidade do sujeito processual em causa se encontrar em posição de falsear ou omitir a verdade dos factos”.
Assim, a possibilidade de valoração do conhecimento probatório do co-arguido apesar de não estar prevista expressamente no nosso Código de Processo Penal como um meio de prova não significa que a mesma não seja permitida. Na verdade, a lei não proíbe essa valoração como em alguns preceitos a ela se refere (cfr. art. 146º e 343º n.º 4 do Código de Processo Penal). A este respeito cfr. Ac. do STJ de 97-10-30 in CPP anotado Simas Santos e Leal Henriques, II V. Pág 368): “as declarações sobre o objecto do processo prestadas por um arguido constituem um meio de prova a apreciar livremente pelo tribunal”.
A admissibilidade do depoimento do arguido como meio de prova em relação aos demais co-arguidos (mesmo que estes não prestem declarações, como sucedeu no caso em apreço) não colide minimamente com o catálogo dos direitos que integram o estatuto inerente àquela situação e está adequada à prossecução de legítimos e relevantes objectivos de política criminal nomeadamente no que toca à luta da criminalidade organizada.
Como refere o Prof. Costa Andrade (in, Sobre as Proibições de Meios de Prova em Processo Penal) é evidente que ninguém coloca em causa o princípio nemo tenetur se ipsum accusare” que deriva desde logo da tutela jurídico-constitucional de valores ou direito fundamentais como a dignidade humana, a liberdade de acção e a presunção de inocência em geral, referenciados como a matriz jurídica constitucional do princípio. A lei processual penal portuguesa contém uma malha desenvolvida e articulada de normas através das quais se assegura acolhimento expresso às mais significativas exigências do princípio nemo tenetur. A começar em se tratando de factos pertinentes à culpabilidade ou medida da pena, o Código de Processo Penal garante ao arguido um total e absoluto direito ao silêncio (artº 61º, nº 1, al. c)).
Um direito em relação ao qual o legislador quis deliberadamente prevenir a possibilidade de se converter num indesejável e perverso privilegium odiosum, proibindo a sua valoração contra o arguido. E tanto em se tratando de silêncio total (artº 343º, nº 1) como de silêncio parcial (artº 345º, nº 2).
Para garantir a eficácia e reforçar a consistência do conteúdo material do princípio nemo tenetur, a lei impõe às autoridades judiciárias ou órgãos de polícia criminal, perante os quais o arguido é chamado a prestar declarações, o dever de esclarecimento ou advertência sobre os direitos decorrentes daquele princípio (artsº 58º, nº 2, 61º, nº 1, al. a), 141º, nº 4 e 343º, nº 1).
A eficácia de tais normas é contrafacticamente assegurada através da sanção da proibição de valoração. Porém, a proibição de valoração incide sobre o silêncio que o arguido adoptou como a melhor estratégia processual e, como é evidente, não poderá repercutir-se na prova produzida por qualquer meio legal e que venha a precisar demonstrar e responsabilizar criminalmente o arguido.
Seria necessário uma visão fundamentalista e unilateral do processo penal defender que o exercício do direito ao silêncio tivesse potencialidade para inquinar todo o meio de prova, que não obstante a sua regularidade, viesse demonstrar a falência de tal estratégia de silêncio.
O facto do depoimento incriminatório estar sujeito às mesmas regras de outro e qualquer meio de prova, ou seja, a sua sujeição à regra da investigação, de livre apreciação e do princípio in dubio pro reo, assegurado que esteja o funcionamento de tais princípios e o exercício do contraditório, nos termos preconizados pelo artº 32º da Constituição da República Portuguesa, nenhum argumento contraria a validade de tal meio de prova.
Aliás, a partir do momento em que o arguido depõe no exercício do seu direito de defesa é evidente que as suas palavras têm uma dupla conotação – sendo emergentes de um inviolável direito de defesa elas são também um meio de prova. Não é possível, em termos práticos, separar aquela realidade concreta que é o depoimento do arguido considerando-o ora como um exercício legítimo de um direito, ora como meio de prova. Tal visão, para além de um inequívoco maniqueísmo, esquece que o processo penal visa a descoberta da verdade material e não de tantas realidades quanto aquelas que interessam aos diversos sujeitos processuais (neste sentido, conf. o já citado Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13/03/2002, in, CJ, Ano XXVII, tomo II, págs. 45 a 50, o qual seguimos de perto).
Por último, a par do teor do relatório social elaborado pela DGRS e junto a fls. 549 a 553 dos autos as declarações do arguido B assumiram algum relevo para aferir da sua situação socioeconómica e familiar, assim como, da situação socioeconómica e familiar da arguida C, sua mulher (conf., quanto a esta e a tal título, também o teor do relatório social elaborado pela DGRS e junto aos autos a fls. 587 a 591 dos autos.
Relativamente à situação socioeconómica e familiar do arguido A e uma vez que este, em julgamento, não prestou declarações relevaram para apurar da mesma, o teor do relatório social elaborado pela DGRS e junto a fls. 545 a 548 dos autos.
O Tribunal Colectivo considerou, ainda, os depoimentos das testemunhas NB, 35 anos, militar da GNR desde 1998 e a exercer funções no NIC em Elvas desde 2007 e AP, 45 anos, militar da GNR há vinte e três anos e a exercer funções no NIC em Elvas há quatro anos, os quais procederam à intercepção do veículo automóvel onde os arguidos seguiam no dia 5 de Julho de 2011 e descreveram o que no mesmo encontraram (v.g. a localização dos passaportes). Depuseram de forma séria, com isenção e coerência.
Cotejada com a prova supra referenciada o Tribunal Colectivo considerou o teor do relatório de exame de toxicologia, elaborado pelo LPC e junto a fls. 325 a 327 dos autos e a prova documental aos autos junta, nomeadamente, fls. 15 a 19; 25 a 37; 43 a 50; 56 a 74; 79 a 85, 89 a 133; 226 e 227; os cd’s contidos em envelope agrafado na contracapa do processo e as cópias actualizadas dos certificados de registo criminal dos arguidos já supra mencionadas.
2.3.2. Os factos não provados assim foram considerados por, na convicção do Tribunal Colectivo, a prova produzida não ter conduzido a diversa qualificação dos mesmos, evitando-se aqui repetir o por nós atrás expendido, a tal propósito.
Relativamente à fundamentação de facto entendemos que o que se deixa dito basta para dar cumprimento integral ao disposto no artº 374º, nº 2 do Código de Processo Penal, já que como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/01/1997, in, CJSTJ, tomo I, pág. 172 e segs. “o artº 372º do Código de Processo Penal não exige a explicitação e valoração de cada meio de prova perante cada facto, mas tão-só uma exposição concisa dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação das provas serviram para formar a convicção do Tribunal, não impondo a lei a menção das inferências injuntivas levadas a cabo pelo Tribunal ou dos critérios de valoração das provas e contra provas”, o que ainda assim foi feito por este Tribunal quanto ao núcleo essencial dos factos em apreciação.
2.4. Enquadramento Jurídico-penal
(…)
Relativamente à co-autoria, o art.º 26º do Código Penal, prevê que:
“É punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução”.
Assim, para a verificação de co-autoria o citado art.º 26º exige dois requisitos:
a) Acordo com outro ou outros, que tanto pode ser expresso como tácito, mas exigindo sempre uma consciência de colaboração, com carácter bilateral;
b) Participação directa na execução do facto, conjuntamente com outro ou outros, num exercício conjunto no domínio do facto, numa contribuição objectiva para a realização, que tem a ver com a causalidade, embora possa não fazer parte da execução, como por exemplo a conduta do motorista do veículo onde se deslocam os assaltantes ao banco.
Para a verificação do acordo basta a existência da consciência e vontade de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime, basta provar a adesão da vontade de cada um à execução do crime (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/06/1995, in, CJ, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, ano III, tomo II, pág. 230).
Para que exista co-autoria “não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos a praticar para a obtenção do resultado desejado e pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo e indispensável à produção do resultado” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03/10/1990, in, BMJ, 400º-284).
Na jurisprudência, ainda, “há co-autoria material quando, embora não tenha havido acordo expresso, as circunstâncias em que os arguidos actuaram indiciam um acordo tácito, assente na existência da consciência e vontade de colaboração, aferida aquela à luz das regras da experiência comum” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/01/1990; proc. 40.378/3ª).
E “o acordo pode ser tácito, bastando-se com a consciência/vontade de colaboração dos vários agentes na realização de determinado crime. No que respeita à execução, não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos ou tarefas tendentes a atingir o resultado final; o que importa é que a actuação de cada um, embora parcial, se integre no todo e conduza à produção do objectivo em vista” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/11/1995, in, CJ, Acs. do STJ, III, tomo III, pág. 197).
A propósito, ainda, da co-autoria, escrevem:
- Johannes Wessels, “Direito Penal, Parte Geral (Aspectos Fundamentais) ”, Porto Alegre, 1976, págs. 121 e 129:
“A co-autoria baseia-se no princípio do actuar em divisão de trabalho e na distribuição funcional dos papéis. Todo o colaborador é aqui, como parceiro dos mesmos direitos, co-titular da resolução comum para o facto e da realização comunitária do tipo, de forma que as contribuições individuais completam-se em um todo unitário e o resultado total deve ser imputado a todos os participantes.”
- Francisco Muñoz Conde e Mercedes García Arán, “Derecho Penal, Parte Geral”, 4ª ed., tirant lo blanch, Valéncia, 2000:
“Lo decisivo en la coautoria es que lo dominio del hecho lo tienen varias personas que, en virtud del principio del reparto funcional de roles, asumen por igual la responsabilidad de su realización. Las distintas contribuciones deben considerarse, por tanto, como un todo y el resultado total debe atribuirse a cada coautor, independientemente de la entidad material de su intervención... El simple acuerdo de voluntades no basta. Es necesario, además, que se contribuya de algún modo en la realización del delito (no necesariamente con actos ejecutivos), de tal modo que dicha contribución pueda estimarse como un eslabón importante de todo el acontecer delictivo”.
- Faria Costa “Formas do crime, Jornadas de Direito Criminal, O Novo Código Penal Português e Legislação Complementar”, pág. 170:
“Desde que se verifique uma decisão conjunta (“por acordo ou juntamente com outro ou outros”) e uma execução também conjunta estaremos caídos na figura jurídica da co-autoria (“toma parte directa na sua execução”).
Todavia para definir uma decisão conjunta parece bastar a existência da consciência e vontade de colaboração de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime (“juntamente com outro ou outros). É evidente que na sua forma mais nítida tem de existir um verdadeiro acordo prévio – podendo mesmo ser tácito – que tem igualmente que se traduzir numa contribuição objectiva conjunta para a realização típica. Do mesmo modo que, em princípio, cada co-autor é responsável como se fosse autor singular da respectiva realização típica”.
- Eduardo Correia, “Direito Criminal”, Col. Studium, 1953, pág. 136-7, citado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/03/2001, Proc. nº 473/01 – 5ª Secção:
“A co-autoria, ou, na forma em que se desdobra, a autoria mediata, supõe, sempre, um acordo realizado antes, durante ou depois de se consumarem alguns dos actos de execução. Nesta última hipótese, porém, a co-autoria só pode referir-se àquela actividade que se praticou posteriormente ao acordo. Se, por exemplo, o acordo só teve lugar depois de um arrombamento e só a respeito da subtracção, apenas se poderá pôr relativamente a este o problema da co-autoria”.
- Germano Marques da Silva, “Direito Penal Português”, II, págs. 282-283:
“É co-autor material quem, em caso de comparticipação, toma parte directa na execução, por acordo ou juntamente com outro ou com outros. Esta cooperação na execução do crime pode resultar de acordo ou não, mas neste caso importa ainda que os comparticipantes tenham consciência de cooperaram na acção comum”.
Tendo em conta os princípios atrás expostos, conexionados com a matéria fáctica que nos autos ficou demonstrada, maxime, a vertida em 2.1. supra e que aqui se evita de repetir, verifica-se que relativamente à prática do crime em causa, os arguidos agiram em co-autoria.
Os arguidos agiram com dolo directo, ou seja, representaram os factos praticados e quiseram levá-los a efeito (vd. artº. 14º, nº 1 do Código Penal).
Não se verificam quaisquer causas que excluam a ilicitude do facto ou a culpa dos arguidos.
Inexistem, in casu, circunstâncias modificativas, comuns ou especiais, agravantes ou atenuantes que alterem a moldura penal abstracta supra mencionada.
2.4.2 Quanto à medida das penas dentro dos limites legais supra referenciados (pena de prisão de 4 anos a 12 anos), a sua fixação faz-se por referência à culpa do arguido – nº 1 do artº. 71º do Código Penal – tendo em atenção os elementos que não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o agente considerando, nomeadamente, os enumerados no nº 2 do citado artº. 71º do Código Penal.
A culpa – traduzindo-se na criação de uma actividade interior desconforme com o Direito e revelada na prática de factos – é o juízo pelo qual se torna o arguido responsável pelo comportamento que escolheu porquanto, podia e devia, ter agido de outro modo o que evitaria a violação da lei.
Consequentemente, a pena a aplicar não deve ir além da culpa do agente, nem ficar aquém das exigências mínimas da prevenção geral positiva devendo ser dominada pelas exigências da ressocialização – prevenção especial – do arguido.
São considerações a fazer nesta ordem – medida concreta da pena – as que se referem ao grau do desvalor objectivo do facto (ilicitude) contando, aqui a menção à dignidade dos interesses justificados pela norma violada e sua importância no contexto de outros bens jurídicos penalmente tutelados.
A qualificação do crime de tráfico de estupefacientes como crime de perigo pressupõe a identificação do bem jurídico tutelado pela respectiva norma incriminadora.
Nesta matéria é pertinente e particularmente esclarecedor o preâmbulo do D.L. nº 430/83, ao citar um relatório da Organização das Nações Unidas:
“A luta contra o abuso de drogas é antes do mais e sobretudo um combate contra a degradação e destruição de seres humanos. A toxicomania priva ainda a sociedade do contributo que os consumidores de drogas poderiam trazer à comunidade de que fazem parte. O custo social e económico do abuso de drogas é, pois, exorbitante, em particular se se atentar nos crimes e violências que origina e na erosão de valores que provoca”
Desta passagem e também do que decorre do preâmbulo e da actual Lei da Droga (D.L. nº 15/93 de 22/01) deduz-se que o escopo do legislador é evitar a degradação e a destruição de seres humanos provocadas pelo consumo de estupefacientes, que o respectivo tráfico indiscutivelmente potencia. Assim, o tráfico põe em causa uma pluralidade de bens jurídicos: a vida; a integridade física e a liberdade dos virtuais consumidores de estupefacientes; e, demais, afecta a vida em sociedade na medida em que dificulta a inserção social dos consumidores e possui comprovados efeitos criminógenos.
Pode qualificar-se, pois, o tráfico de estupefacientes, em todas as suas modalidades de cometimento, como um crime de perigo: o legislador não exige, para a respectiva consumação, a efectiva lesão dos bens jurídicos tutelados.
E trata-se, outrossim, de um crime de perigo comum, visto que a norma protege uma multiplicidade de bens jurídicos, designadamente de carácter pessoal – embora todos eles possam ser reconduzidos a um mais geral: a saúde pública.
Finalmente, o crime, é de perigo abstracto, porque não pressupõe nem o dano, nem o perigo de um dos concretos bens jurídicos protegidos pela incriminação, mas apenas a perigosidade da acção para as espécies de bens jurídicos protegidos, abstraindo de algumas das outras circunstâncias necessárias para causar um perigo para um desses bens jurídicos (vd. Ac. do Tribunal Constitucional nº 426/91 de 6/11, 2ª secção, cit., in, Sub Judice, nº 3, 1992, Maio/Agosto, págs. 155 a 162).
Assim, face ao exposto e também o que já se deixou dito em 2.4.1 supra, atenta a matéria fáctica apurada a este título chegamos à conclusão que o grau de ilicitude do facto é extremamente significativo e relevante.
A culpa dos arguidos – entendido este conceito como supra se deixou expendido – situa-se no seu nível médio, sendo mais elevada a do arguido B, atenta a sua idade e o papel que detinha na acção empreendida pelos arguidos.
O dolo com que agiram revelou-se intenso (veja-se a energia criminosa posta na acção que levaram cabo (distância percorrida e o próprio risco para a integridade física dos arguidos A e B ao engolirem as bolotas), sendo menor o revelado pela arguida C.
Os arguidos possuem a personalidade e a condição familiar e socioeconómica que se mostra retratada, respectivamente, em 2.1. 19º a 21º supra e que aqui se evita repetir.
Os arguidos têm os antecedentes criminais que supra se deixaram referenciados, sendo que, todos eles, já tiveram condenações pela prática de crime de tráfico de produtos estupefacientes.
Em julgamento, o arguido B confessou a essencialidade dos factos que foram apurados.
Assim, de modo justo, equilibrado e proporcional as penas a aplicar devem censurar os arguidos e adverti-los a, pelo menos, de futuro não repetirem a realização de comportamentos semelhantes o que, em nosso entender, só se verificará com a aplicação aos mesmos de penas de prisão que, em concreto, se situem entre os limites mínimo e médio da moldura penal abstractamente aplicável diferenciando-se tais penas no seu quantum, quer por via da culpa de cada um dos arguidos, do grau de ilicitude dos factos por aqueles praticados, do seu passado criminal ou da atitude que tiveram em julgamento, pelo que se fixa em seis anos e seis meses de prisão a pena concreta a aplicar ao arguido B; em cinco anos e seis meses de prisão a pena concreta a aplicar ao arguido A e em quatro anos e seis meses de prisão a pena de prisão concretamente aplicável à arguida C.
2.4.3 Na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 59/2007 de 04/09 o art.º 50º, nº 1 do Código Penal dispõe que:
"O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".
Este preceito consagra um poder-dever, ou seja um poder vinculado do julgador, que terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os necessários pressupostos (Maia Gonçalves, Código Penal Anotado, 14ª edição, pág. 191).
Conforme se escreveu no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/06/2003, in, CJ, ano XI, tomo II, pág. 223, “a suspensão da execução da pena de prisão constitui uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, de forte exigência no plano individual, particularmente adequada para, em certas circunstâncias e satisfazendo as exigências de prevenção geral, responder eficazmente a imposições de prevenção especial de socialização, ao permitir responder simultaneamente à satisfação das expectativas da comunidade na validade jurídica das normas violadas, e à socialização e integração do agente no respeito pelos valores do direito, através da advertência da condenação e da injunção que esta impõe para que o agente conduza a vida de acordo com os valores inscritos nas normas”.
Assim, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, o juiz tem o dever de suspender a execução da pena: esta é uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico (cfr. Ac. do STJ, de 27 de Junho de 1996; in CJ, Acs do STJ, IV, tomo 2, 204).
Para este efeito, é necessário que o julgador, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição (cfr. Ac. do STJ, de 11/05/1995, in proc. n.º 4777/3ª).
Este juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido pode assentar numa expectativa razoável de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocialização (em liberdade) do arguido (cfr. Acs do STJ, de 17/09/1997, proc. n.º 423/97-3 e de 29/03/2001, proc. n.º 261/01-5).
Ou dito de outro modo: a suspensão da execução da pena "deverá ter na sua base uma prognose social favorável ao réu, a esperança de que o réu sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime (Ac. do STJ, proc. n.º 1092/01-5)".
"O tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem dúvidas sobre a capacidade do réu para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa" (Leal-Henriques e Simas Santos, Código Penal, em anotação ao artigo 50º do Código Penal) – cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/02/2005, processo nº 05P333, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Simas Santos, retirado da Internet e do sítio www.dgsi.pt).
Conforme se escreveu no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/09/2007, processo 07P2587, relatado pelo Juiz Conselheiro Raul Borges, in, www.dgsi.pt a propósito do instituto de suspensão da execução da pena de prisão:
“Não são considerações de culpa que interferem nesta abordagem, mas apenas razões ligadas às finalidades preventivas da punição, sejam as de prevenção geral positiva ou de integração, sejam as de prevenção especial de socialização, estas acentuadamente tidas em conta no instituto em questão, desde que satisfeitas as exigências de prevenção geral, ligadas à necessidade de correspondência às expectativas da comunidade na manutenção da validade das normas violadas. É pelas exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico que se limita, mas por elas se limita sempre, o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto.
Para sua aplicação, no âmbito de um poder-dever, o julgador deve ter a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser lograda, correndo-se um risco calculado sobre a manutenção do agente em liberdade.
A aplicação do instituto nada tem a ver com o princípio in dubio pro reo, o que significa que em caso de dúvida sobre o carácter favorável da prognose não tem de funcionar desde logo a suspensão. A medida será aplicada na perspectiva de que o arguido assumirá uma vida futura ordenada e conforme à lei e demonstrará merecer a confiança nele depositada, impendendo sobre ele a ameaça da concretização do facto consumado com o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença se sobrevier revogação, nos termos do art. 56.º do CP. Como esclarece Figueiredo Dias, havendo razões sérias para duvidar da capacidade do agente de não repetir crimes, se for deixado em liberdade, o juízo de prognose deve ser desfavorável e a suspensão negada” (nosso o destaque a negrito).
No caso em apreço, não pode olvidar-se que o crime cometido pela arguida C reveste especial e relevante gravidade objectiva.
Finalmente, sobre esta matéria (suspensão da execução da pena), mas versando sobre outro tipo de crime (art.º 172º, nº 2 do Código Penal) há que atender aos recentes Acórdãos do nosso mais Alto Tribunal, onde se escreveu que:
“Há uma antinomia entre, por um lado, a fortíssima exigência de prevenção geral do crime de abuso sexual de crianças, principalmente nos casos em que há penetrações reiteradas durante anos e em que a vítima ainda nem atingiu a puberdade e, por outro, as menores exigências de ressocialização do arguido, aparentemente reintegrado pelo ambiente familiar e pelo trabalho. Essa contradição resolve-se com a aplicação de uma pena curta de prisão, mas efectiva, pois a pena substitutiva não iria satisfazer a finalidade primordial de restabelecer a confiança colectiva na validade da norma violada e na eficácia do sistema jurídico-penal” (conf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/01/2008, relatado pelo Juiz Conselheiro Arménio Sottomayor, processo 07P2592, sumariado in www.dgsi.pt).
“São sobretudo razões de prevenção especial (e não considerações de culpa) as que lhe estão na base, como, aliás, em toda a operação de escolha de penas alternativas ou penas de substituição, sendo esse o critério geral ou denominador comum que preside a tal operação, não obstante a diversidade de critérios específicos que a lei prevê para cada caso. Esse critério geral vem a traduzir-se na preferência manifestada pelo legislador pela aplicação de uma pena alternativa ou por uma pena de substituição, sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa ou a de substituição se revelem adequadas e suficientes à realização das finalidades da punição (Cf. Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial de Notícias, p. 331 e Robalo Cordeiro, “A Determinação da Pena”, Jornadas de Direito Criminal – Revisão do Código Penal, CEJ, vol. 2.º, p. 48).
São, portanto, como dissemos, razões fundamentalmente de prevenção especial e não de culpa (esta intervindo, todavia, na determinação da medida concreta da pena de substituição), que permitem substituir uma pena institucional ou detentiva, por outra não detentiva, isoladamente aplicada ou associada à subordinação de deveres, destinados a reparar o mal do crime e (ou) de regras de conduta, estabelecidas estas com o fim de melhor reinserir socialmente o condenado em ordem ao acatamento dos valores comunitários, cujo respeito, pelo afastamento do condenado da criminalidade (e não pela sua regeneração) se pretende obter. Com este fim, pode ainda submeter-se o condenado a regime de prova, associando-se aspectos da probation anglo-americana ao instituto da suspensão da pena, não tendo o regime de prova actualmente carácter autónomo em relação a esta, visto que integrado no seu regime após a revisão operada pelo DL n.º 48/95, de 15 de Março.
O acima referido juízo de prognose favorável assenta na análise das circunstâncias do caso em correlação com a personalidade do agente, visando obter em toda a linha possível a socialização em liberdade, em consonância com a finalidade politico-criminal do instituto, que é o afastamento do condenado da prática de novos crimes por meio da simples ameaça da pena, eventualmente com sujeição a deveres e regras de conduta, se tal se revelar adequado a tal objectivo e desde que as exigências mínimas de prevenção geral fiquem também satisfeitas com a aplicação da pena de substituição. O sentido destas é, aliás, nesta sede, o de se imporem como limite às exigências de prevenção especial, constituindo então o conteúdo mínimo de prevenção geral de integração de que se não pode prescindir para que não sejam, em último recurso, defraudadas as expectativas comunitárias relativamente à tutela dos bens jurídicos (FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., p. 333).
Ora, o arguido, não obstante a ausência de antecedentes criminais, agiu com bastante intensidade dolosa, prolongando a sua actuação no tempo e, ao mesmo tempo, mostrou-se insensível aos valores que fundamentam o crescimento saudável de uma personalidade em formação, nomeadamente na área tão delicada da autodeterminação sexual. Por outro lado, agiu com particular insensibilidade em relação à confiança que nele foi depositada pelos pais do menor e até por este, traindo a sua boa-fé e minando o plano construtivo pactuado entre todos para uma ocupação sadia e responsável dos tempos livres do menor, durante as férias de Verão.
Este circunstancialismo revela uma personalidade em relação à qual não é possível fazer um juízo de prognose favorável, no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para afastar o recorrente da criminalidade, particularmente deste tipo de criminalidade, que tem frequentemente como agentes indivíduos sem antecedentes criminais e até gozando de alguma consideração social.
A acrescer a estas considerações e de forma decisiva, a suspensão da execução da pena não é de molde a satisfazer, por tudo quanto se disse, o conteúdo mínimo de prevenção geral, que se impõe como limite das considerações de prevenção especial que estão na base do instituto.
Assim, a pena de prisão efectiva impõe-se, ao menos, em nome destas últimas exigências” (conf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/01/2008, relatado pelo Juiz Conselheiro Rodrigues da Costa, processo 07P3985, sumariado in www.dgsi.pt) (nosso o destaque a negrito).
Por outro lado, a actual situação da aludida arguida não evidencia que esta, em liberdade, estará aparentemente reintegrada pelo ambiente familiar (conf. os factos vertidos em 2.1.19º supra que aqui se evitam de repetir) – de forma a poder satisfazer as exigências de ressocialização da mesma, a que acresce a circunstância daquela já ter sido condenada em 7-01-2008, na pena de 15 meses de prisão cuja execução foi suspensa por igual período e pela prática em 7-5-2005 de um crime de idêntica natureza, isto é, um crime de tráfico de produtos estupefacientes de menor gravidade, previsto e punível, pelo art.º 25º, alínea a) do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01 – certo é que é preciso – e nunca será demais repeti-lo – não descaracterizar o papel da prevenção geral como princípio integrante do critério geral de substituição, a funcionar aqui sob a forma de conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico e como limite à actuação das exigências de prevenção especial de ressocialização.
E daí que a pena de substituição, não seja de aplicar se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável – como é o caso – para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias (neste sentido, vd., Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/12/2002, relatado pelo Juiz Conselheiro Carmona da Mota, processo 03P875, sumariado in www.dgsi.pt) , pelo que, in casu, não se suspende a execução da pena de prisão que nos presentes autos irá ser aplicada à arguida C.
Sublinhe-se, por último, que nos mais recentes Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça e em situações de “correios de droga” aquele Alto Tribunal tem aplicado penas de prisão entre os quatro anos e seis meses e os cinco anos, mas não suspende a execução de tais penas de prisão (veja-se, v.g., o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Dezembro de 2010, relatado por Maia Costa, processo nº 100/10.9JELSB.S1 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Janeiro de 2011, relatado por Henriques Gaspar, processo nº 369/09.1JELSB.L1.S1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).»
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
1. Delimitação do objecto do recurso.
É pacífico o entendimento de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
a) No caso presente, apesar da falta de assertividade da sua motivação nessa parte, resulta suficientemente da mesma que os arguidos vêm impugnar a decisão do tribunal a quo que julgou provados os factos em que aquele tribunal fundamentou a condenação dos arguidos A e C como co-autores entre si e com o arguido B, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º do Dec-lei 15/93 de 22 de Janeiro, com base nas declarações deste último arguido, único que depôs em audiência.
Apesar de os arguidos não nomearem expressamente os pontos de facto impugnados como deviam, estes resultam inequivocamente do confronto entre o conjunto da motivação de recurso e a descrição dos factos julgados provados (relativamente simples no que respeita à factualidade típica), não se mostrando necessário convite aos arguidos com tal fim nos termos do art. 417º nº3 do CPP.
Em consequência da pretendia modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto, entendem os recorrentes que os arguidos A e C apenas podem ser punidos como cúmplices do arguido Jorge Ferreira e não como coautores.
Impõe-se, pois, decidir a impugnação da decisão que julgou provados os factos descritos sob os nºs 1 e 18º da factualidade julgada provada no acórdão recorrido e, caso proceda, decidir se os arguidos A e C apenas devem ser condenados como cúmplices.
b) Por último e independentemente da procedência da impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto, os recorrentes pretendem ver alterada a medida das penas de prisão aplicadas, que entendem não dever ir além de 6 anos para o arguido B e 4 anos para os arguidos A e C, optando ainda pela suspensão da pena da arguida e ponderando igualmente a suspensão da pena do arguido A, uma e outa eventualmente sujeitas a condições.
São, pois, estas as questões a decidir.
2. Decidindo
2.1. Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.
Como aludido, os arguidos consideram que o tribunal a quo errou na apreciação e valoração da prova ao julgar provados os factos descritos sob os nºs 1 e 18 da factualidade provada na parte respeitante à conduta dos arguidos A e C.
No seu entender, resulta das declarações do arguido B – único arguido que prestou declarações em audiência – que não foram os três arguidos que “...combinaram previamente entre si dirigirem-se a Marrocos para obter produto estupefaciente (canabis resina), com seu posterior transporte e introdução do mesmo em Portugal na sequência do que foi pedido aos arguidos B e A por um indivíduo conhecido pelo “Cigano”, residente na zona J, em Chelas, mas que costuma frequentar o Bairro da Ajuda, o qual lhes propôs tal ida, nos seguintes termos...) – cfr art. 1º dos factos provados” .
De igual modo, entendem que, contrariamente ao descrito sob o nº 18 dos factos provados, não resultou provado que os três arguidos agiram “... previamente concertados e actuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas ...” – cfr art. 18º dos factos provados.
Conforme consideram resultar provado das declarações do arguido B, “...foi a esse arguido que foi efetuada a proposta de se deslocar a Marrocos, a fim de trazer no interior do seu organismo, produto estupefaciente (canábis resina), tendo para o efeito, sido contactado por um indivíduo de raça cigana que lhe propôs tal negócio” .
Concluem, pois, na sua motivação que “ 25. A arguida C, não conheceu nem nunca contactou com o referido indivíduo de raça cigana nem combinou previamente com os seus co-arguidos, incluindo o seu marido, a prática de tal facto.
26. O mesmo acontecendo em relação ao co-arguido A que surge nesta situação por convite efetuado pelo cunhado, o aqui arguido B. “
Vindo a proceder a impugnação da decisão proferida sobre aquela matéria de facto com a consequente modificação da mesma, pretendem os recorrentes que os arguidos A e C sejam condenados como cúmplices e não como coautores do crime de tráfico de estupefaciente, conforme referido.
Vejamos então.
2.1.1. - Da respetiva audição, decorre que, efetivamente, o arguido B prestou declarações em audiência no sentido indicado na motivação de recurso, ou seja, afirmando que a arguida para além de não transportar produto estupefaciente contrariamente aos restantes arguidos, não conheceu nem contactou o indivíduo conhecido pelo “Cigano” referido sob o nº 1 dos factos provados, tal como não combinou previamente com os coarguidos a prática do facto, limitando-se a participação da arguida a contribuir para criar uma atmosfera de normalidade, para passarem despercebidos sendo um casal em férias em Marrocos e para o ajudar, caso o transporte corresse mal e durante esse percurso, o seu coarguido se sentisse mal. Afirma ainda queo arguido A foi por ele convidado, não tendo sequer contactado com o referido Cigano.
Todavia, conforme se refere na apreciação crítica da prova, o tribunal a quo julgou provado que a proposta do indivíduo conhecido por “Cigano” foi dirigida igualmente ao arguido A com base nas declarações efetivamente prestadas pelo arguido B em 1º interrogatório judicial de arguido detido (cfr fls 152 a 156, máxime fls 154), as quais foram legalmente valoradas nos termos do art. 357º nº 1 b) do CPP conforme se explica na apreciação crítica da prova, sendo certo que os recorrentes não indicam quaisquer razões que justificassem a prevalência do teor das declarações prestadas em audiência sobre as anteriores, nem tal conclusão se impõe a partir da audição daquelas mesmas declarações. Não merece, pois, qualquer reparo o julgamento de facto no que respeita aos contactos prévios entre o dito “Cigano” e o arguido A, improcedendo a impugnação nesta parte.
No que respeita à arguida, não consta entre a factualidade provada no acórdão condenatório recorrido que a mesma conheceu o referido “Cigano” (nem tão pouco o contrário), pelo que carece de objeto a impugnação nesta parte, sendo certo que tal matéria sempre é irrelevante no que lhe concerne, pelo que improcede a impugnação no que lhe respeita.
2.1.2. - A questão de saber se os arguidos A e C combinaram previamente entre si dirigirem-se a Marrocos para obter produto estupefaciente (canabis resina), com seu posterior transporte e introdução do mesmo em Portugal, agindo “... previamente concertados e actuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas ...” com esse objetivo, é determinante para decidir se no plano da qualificação jurídico-penal estes arguidos agiram como coautores do arguido B na prática do ilícito típico ou se apenas participaram no crime daquele, como cúmplices, pelo que os termos do enunciado fáctico ora impugnado terão que ser interpretados à luz da sua relevância jurídico-penal, como não pode deixar de ser.
2.1.2.1. - Independentemente de outros considerandos a desenvolver a propósito da arguida C mas aplicáveis a ambos, começamos por adiantar que relativamente ao arguido A é manifesta a improcedência da impugnação dos recorrentes.
Do confronto das declarações do arguido B em audiência e em 1º interrogatório judicial, por um lado, com o quadro factual objetivo espelhado na factualidade provada, impõe-se a conclusão de que na sequência do contacto com o referido “Cigano” o arguido A combinou previamente com, pelo menos, o arguido B, dirigirem-se a Marrocos para adquirirem e transportarem produto estupefaciente (canabis resina), conjugando entre si esforços e dividindo tarefas na medida do necessário para levarem a cabo tal empreendimento.O arguido A trazia produto estupefaciente no tubo digestivo em termos idênticos ao arguido B, foi ele quem formalizou o aluguer do veículo automóvel, que conduziu em boa parte da viagem (situação que se verificava no momento da detenção), e tinha mesmo carta de condução contrariamente ao que sucede com o arguido B, com as vantagens daí decorrentes para o desenrolar do transporte ilícito.
É, pois, insustentável a tese dos recorrentes quanto à forma como o arguido A participou nos factos, nomeadamente em face do transporte do produto estupefaciente, que integra diretamente o ilícito típico previsto no art. 21º do Dec-lei 15/93, verificado em flagrante, pelo que improcede a impugnação nesta parte sem que se justifiquem outras considerações.
2.1.2.2. - Porém, tal como referido na resposta do MP em 1ª instância, a questão é bem menos linear no que concerne à arguida, encontrando-se aqui o ponto nevrálgico da presente impugnação.
O que se afirma nos nºs 1 e 18 dos factos provados relativamente à arguida, é que na sequência do pedido feito pelo referido “Cigano” aos arguidos B e A, aquela combinou, isto é, decidiu em conjunto, com os dois outros arguidos, que todos se deslocariam a Marrocos para adquirirem e transportarem cannabis até Portugal e que ela participou na execução desse plano cumprindo as tarefas que lhe caberiam de acordo com a divisão entre eles acordada. Daí que o tribunal a quo tivesse punido a arguida, tal como os demais, como coautora do crime, pois era essa a conclusão a tirar com base no conceito de autor vertido no art. 26º do C.Penal.
Na verdade, de acordo com o disposto no art. 26º do C. Penal, é coautor quem tome parte na execução do facto, por acordo ou juntamente com outro ou outros, o que significa que a coautoria pressupõe um elemento objetivo que se traduz na participação dos agentes em atos de execução da conduta típica e um elemento subjetivo que se traduz na existência de um acordo entre agentes, no sentido de decisão conjunta para a sua execução, o qual pode ser expresso - prévio ou posterior ao início da prática do facto -, ou tácito, aqui se englobando os casos em que apenas existe consciência recíproca de colaboração entre os executores do facto. - Vd, por todos, Maria da Conceição Valdágua, Início da Tentativa do co-autor, 2ª ed., 1993, p. 124 e sgs.
No entanto, conforme é entendimento pacífico, a execução conjunta não exige que todos os agentes intervenham em todos os actos, mais ou menos complexos, organizados ou planeados, que se destinem a produzir o resultado típico pretendido, bastando que a actuação de cada um dos agentes seja elemento componente do conjunto da acção, mas indispensável à produção da finalidade e do resultado a que o acordo se destina, pelo que em face da factualidade julgada provada pelo tribunal a quo sob os nºs 1 e 18, não oferece dúvidas a condenação da arguida como coautora.
Já não é assim, porém, no caso de proceder a presente impugnação em matéria de facto, pois, como vimos, os recorrentes põem em causa que a arguida tenha decidido juntamente com os demais arguidos dirigirem-se a Marrocos para adquirir e transportar até Portugal produto estupefaciente e que a mesma tenha participado na execução daquela aquisição e transporte ilícitos, limitando-se a colaborar no empreendimento daqueles.
2.1.2.2.1. - Vejamos então se em face da prova produzida e examinada em audiência, os recorrentes têm razão quando afirmam que não resulta dessa prova, maxime das declarações do arguido B (único que prestou declarações em audiência), a participação da arguida nos termos em que a mesma é descrita sob os nºs 1 e 18 dos factos provados, particularmente no que concerne à sua participação na combinação e concertação prévias aí aludidas, para obterem e transportarem "canabis resina" de Marrocos para Portugal, que constitui, lembremo-lo, a conduta típica do ponto de vista objetivo.
A respeito das declarações do arguido B relativamente à conduta dos coarguidos, o acórdão recorrido limita-se a tecer considerações genéricas sobre a admissibilidade das declarações incriminatórias de coarguido, sobre o princípio da não auto-incriminação e o direito ao silêncio, citando doutrina e jurisprudência a propósito, mas nada diz sobre a relevância concreta dessas mesmas considerações no caso presente, nem tão pouco sobre as ilações a retirar dos elementos objetivos apurados para a conclusão que enuncia sobre a participação da arguida, não esclarecendo sequer em que passos das declarações do arguido Jorge o tribunal coletivo fundamentou a sua convicção de que a arguida combinou com os demais a realização do empreendimento ilícito aqui em causa.
Ora, a responsabilidade penal da arguida que, tal como a dos demais, é pessoal, deve ser escrupulosamente apreciada individualmente, tanto mais quanto é certo que a mesma não trazia produto estupefaciente consigo, contrariamente aos demais arguidos, e do teor das declarações do arguido B, quer aquando do 1º interrogatório judicial quer em audiência, não resulta a participação da arguida nos termos que o tribunal a quo julgou provados. Como aludido, aquele arguido declarou que a arguida não participou em quaisquer encontros para preparação da viagem e tão pouco conhecia o referido "Cigano", limitando-se a presença daquela na viagem a contribuir para criar uma atmosfera de normalidade, para passarem despercebidos como um casal em férias em Marrocos e para o ajudar, caso o transporte corresse mal e durante esse percurso, o seu coarguido se sentisse mal.
Uma vez queos arguidos A e C não prestaram declarações em audiência e que das declarações dos elementos da GNR ali inquiridos (N e AP), não resulta prova direta ou mesmo indireta sobre eventuais combinações prévias em que a arguida tivesse participado ou em que, de outro modo, fosse patente a comunhão de esforços e intentos entre a arguida e os demais na aquisição e transporte de droga, impõe-se concluir que a decisão do tribunal recorrido apenas poderá ter-se baseado no quadro objetivo julgado provado (e não impugnado), bem como nas provas de natureza não pessoal que genericamente indica na apreciação crítica da prova, que agora cumpre reapreciar.
Antes de mais, porém, importa deixar claro que, conforme desenvolve Conceição Valdágua (ob. cit. p. 128), o acordo exigido pelo art. 26º do C.Penal não pressupõe a participação de todos os coautores na elaboração do plano comum de execução do facto, podendo um ou mais coautores dar o seu assentimento a um plano que outro ou outros comparticipantes tenham congeminado em todos os detalhes e que tal assentimento pode manifestar-se através de qualquer conduta donde ele se infira (qualquer comportamento concludente), nomeadamente através do meter ombros à (s) tarefa(s) que o plano destina ao(s) co-autor(es) em causa.
Daí ser irrelevante que a arguida não participasse nos contactos com o referido "Cigano" ou que o não conhecesse e, ainda, que entre os três arguidos a iniciativa pertencesse ao arguido B e que fosse este a convidar os demais, bem como que fosse ele a congeminar ou combinar com o referido Cigano os detalhes da viagem.
Relevante será apurar se, como terá concluído o tribunal a quo, dos elementos objetivos considerados nos autos se infere que a arguida aderiu à realização do empreendimento ilícito em causa tomando-o como projeto igualmente seu, comprometendo-se com a realização de tarefas que lhe fossem destinadas com vista à prossecução das finalidades comuns. Isto é, se a arguida efetivamente decidiu conjuntamente com os demais arguidos levar a cabo a operação de aquisição e transporte de canabis espelhada nos autos e se, no plano objetivo, a arguida praticou atos que preencham os elementos constitutivos do tipo de crime em causa, isto é, tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º do Dec-lei 15/93, na modalidade de aquisição e transporte do produto estupefaciente apreendido.
Com pertinência para esta questão, podem convocar-se os seguintes elementos probatórios não controvertidos: a arguida sabia quais os objetivos e os traços principais da viagem em que se dispôs a participar, sendo certo que segundo o arguido B a mesma o acompanhara anteriormente em viagens em tudo semelhantes a esta, o que é confirmado pelos carimbos de entrada e saída constantes do seu passaporte. A arguida acompanhou o seu marido B e o arguido A a Marrocos também para conferir uma aparência de normalidade familiar ou de passeio à viagem que empreenderam e, ainda, para no regresso após a ingestão das "bolotas" pelos outros arguidos, os revezar na condução do veículo em que seguiam (o arguido B não é titular de carta de condução) o que efectivamente veio a acontecer, na viagem de regresso e por um curto período de tempo. - Cfr nº 4 dos factos provados.
Aquando da detenção dos arguidos pela brigada da GNR foram encontrados escondidos entre o forro e o tejadilho do veículo três passaportes, pertencendo cada um deles a um dos arguidos, constando do passaporte de que a arguida é titular, emitido em 25.09.2009, sete carimbos de entrada em Tânger-Marrocos, datados de 31 de Outubro de 2009, 04 de Dezembro de 2009, 31 de Dezembro de 2009, 07 de Maio de 2010, 26 de Agosto de 2010, 21 de Abril de 2011 e 01 de Julho de 2011 e sete carimbos de saída de Tânger-Marrocos, datados de 02 de Novembro de 2009, 06 de Dezembro de 2009, 02 de Janeiro de 2010, 09 de Maio de 2010, 30 de Agosto de 2010, 24 de Abril de 2011 e 04 de Julho de 2011 (nº 7 dos factos provados). Foi, ainda, encontrado no interior de uma bolsa preta pertencente à arguida C um pedaço de um maço de tabaco da marca L&M, no qual se encontra escrito o nº. de telefone 212662xxxx (nº 8 dos factos provados), pertencendo o respetivo indicativo (212), ao Reino de Marrocos (nº 9 dos factos provados) e foi ainda encontrado no porta-luvas do veículo um telemóvel marca Samsung, modelo GT-S5230 de cor branca, pertencente à arguida C, com o IMEI --- e cartão SIM da TMN, o qual lhe foi apreendido (nº 10 dos facto provados).
Uma vez que na factualidade provada nada mais se diz sobre o número de telefone encontrado numa bolsa pertencente à arguida e sobre o telemóvel que igualmente lhe pertencia (nºs 9 e 10 da factualidade provada), nada pode concluir-se de tais factos com interesse para a questão que nos ocupa.
Também quanto a eventual participação da arguida na fase ou momento da aquisição do produto estupefaciente (ainda que para terceiro, conforme resulta da factualidade provada) no reino de Marrocos, nada resulta dos factos provados, pelo que está em causa sobretudo a eventual participação da arguida no transporte do produto estupefaciente entre Marrocos e Portugal.
Ora, no que concerne à aparência de normalidade familiar que todos os arguidos pretendiam com a presença da arguida durante a viagem, poderia chegar-se a conclusões diferentes caso aquele papel fosse determinante no acordo ou plano de execução dos arguidos que nele participaram, nomeadamente, como forma minimamente consistente de tentar escapar à intervenção policial em qualquer dos países abrangidos (Marrocos, Espanha e Portugal). Todavia, a factualidade provada não permite tal conclusão, pois não se encontram provados quaisquer outros factos de onde decorresse que a mera presença da arguida durante a viagem tinha as apontadas virtualidades, limitando-se aquela presença a constituir um contributo meramente eventual e secundário para que a viagem eventualmente decorresse sem intervenção policial, tanto menos significativo e consistente quanto vai sendo maior e mais diversificada a experiência das autoridades policiais de Portugal e Espanha na deteção de tráfico com estas caraterísticas. Assim, concluímos que a presença da arguida ao longo da viagem não constitui sequer acto de participação na execução do concreto ilícito típico.
Já a condução dolosa de veículo automóvel no qual se carrega produto estupefaciente, quer escondido em qualquer parte do automóvel, quer escondido na pessoa de algum dos seus ocupantes, constitui ato típico do crime de tráfico de estupefacientes na modalidade de transporte de produto daquela natureza, pois esta conduta consiste precisamente na deslocação de produto estupefaciente de um lugar para outro.
Embora deva reputar-se ato de execução do crime, a condução do veículo durante curto período de tempo, conforme se descreve sob o nº4 dos factos provados, pode reputar-se suficiente para que a arguida deva ser punida como coautora, conforme chega a referir-se no acórdão recorrido, ou tal conclusão não é válida por faltarem outros requisitos de que depende a coautoria?
2.1.2.2.2. -Como é bom de ver, a questão respeita a um aspeto nuclear do conceito de coautoria e da sua distinção da cumplicidade.
Tal como refere Conceição Valdágua, de cuja síntese nos valemos aqui, embora seja essencial à coautoria um acordo entre os coautores e a execução conjunta do facto, estes elementos também podem verificar-se relativamente ao cúmplice (art. 27º do C.Penal). Também este pode tomar parte no acordo (embora não tenha necessariamente de participar nele contrariamente ao que sucede com o coautor) e pode intervir na fase de execução do delito (apesar de não ter que intervir necessariamente nesta fase ao contrário do coautor), pelo que é forçoso que para além daqueles elementos constitutivos essenciais da coautoria (acordo e execução conjunta), exista algo mais essencial à coautoria capaz de justificar a distinção entre aquela e a cumplicidade. - Cfr ob. cit. p. 134.
Ora, de acordo com a chamada teoria do domínio do facto, dominante também entre nós, é o domínio funcional do facto, que cabe ao autor e falta ao cúmplice, o critério de distinção entre estas duas formas de comparticipação.
Para que se entenda que tem o domínio funcional do facto, basta que o comparticipante actue segundo a divisão de tarefas previamente acordada ou conjuntamente executada (nos casos em que não há acordo prévio mas há consciência recíproca de colaboração), detendo o domínio da sua função tal como a mesma é definida no plano ou resulta da atuação conjunta, colaborante.
Como diz Roxin[1], “O domínio de cada participante aqui não se apoia na execução pela sua própria mão (…) mas sim na divisão do trabalho, sem a qual a realização do tipo escolhido seria irrealizável. (…) cada um tem nas suas mãos [o domínio do facto] através da sua função específica na execução do acontecimento total, porque se recusasse a sua colaboração faria fracassar o facto.” Isto é, o domínio funcional do facto próprio da autoria significa que a actividade, mesmo parcelar, do co-autor na realização do objectivo acordado se tem de revelar indispensável à realização desse objectivo[2].
Ora, quer as declarações do arguido B em audiência, quer os dados objetivos integrados na factualidade provada e não impugnada a que vimos fazendo referência, não permitem concluir que a condução do veículo automóvel durante o curto período de tempo em que se verificou (cfr parte final do nº 4 dos factos provado) constituía tarefa a desempenhar pela arguida em concretização de um plano que integrava essa mesma tarefa como elemento determinante ou essencial, de tal modo que sem essa colaboração fracassaria o facto tal como os seus agentes se propunham executá-lo.
Das declarações do arguido B e dos termos concretos da participação da arguida na viagem em causa, tal como resulta da factualidade não impugnada, não resulta mais que a mera participação da mesma na operação de transporte do produto estupefaciente em causa, decidida e planeada pelos arguidos B e A, ainda que com níveis de iniciativa e participação na execução global do facto diferentes entre si, conforme resulta da factualidade impugnada. Como vimos, dos factos relativos à posse de um número de telefone marroquino e de um telemóvel não ativo nada se conclui nos factos provados, nem as regras da experiência o permitem face à multiplicidade de explicações possíveis e plausíveis para os mesmos, sendo certo que dos factos provados nada consta sobre eventuais proventos que da viagem pudessem resultar para a arguida, o que constitui aspeto essencial na apreciação do grau de envolvimento da arguida no empreendimento em causa e na caraterização do seu papel nesse mesmo empreendimento – cfr nº 1 da factualidade aprovada, onde apenas se refere que os arguidos B e A aufeririam 1000 € por cada quilo de canábis que conseguissem transportar.
Estamos, pois, em condições de concluir pela procedência da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto no que respeita à parte da factualidade descrita sob os nºs 1 e 18 que se reporta à intervenção da arguida na combinação e concertação aí referidas, impondo-se a consequente modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto, de acordo com o disposto no art. 431º al. b) do CPP, eliminando-se a referência à arguida C do nº1 e diferenciando o que a ela respeita no nº 18, de tal modo que a redação daqueles factos passa a ser a seguinte, assinalando-se a negrito as alterações verificadas:
- «1º. Em data não concretamente apurada, mas entre meados de Junho de 2011 e antes do dia 05 de Julho de 2011, os arguidos B e A, combinaram previamente entre si dirigirem-se a Marrocos para obter produto estupefaciente (canabis resina), com seu posterior transporte e introdução do mesmo em Portugal.
Fizeram-no na sequência do que foi pedido aos arguidos B e A por um indivíduo conhecido pelo “Cigano”, residente na zona J, em Chelas, mas que costuma frequentar o Bairro da Ajuda, o qual lhes propôs tal ida, nos seguintes termos:
Os arguidos deslocar-se-iam em veículo automóvel previamente alugado para tal efeito e receberiam, cada um, € 1 000,00, por cada quilo de canabis resina que conseguissem transportar consigo através do método de ingestão de bolotas de tal produto, de modo a propiciar a sua deglutição e, consequentemente, o seu transporte no interior do organismo (tubo digestivo), facilitando deste modo a sua ocultação e deslocação de Marrocos até Portugal, atravessando Espanha, sendo que, tal pagamento seria feito pelo aludido “Cigano” após recepcionar as bolotas em causa.».
«18º. Agiram os arguidos deliberada, livre e conscientemente, fazendo-o os arguidos B e A previamente concertados e actuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas, sendo todos os arguidos conhecedores das características e da natureza estupefaciente do produto que lhes foi apreendido.
Mais sabiam os arguidos B e A que estavam a adquirir, transportar e a introduzir em Portugal tal produto estupefaciente, com a finalidade de ser procedida a sua venda a terceiros e a arguida C que ao agir como descrito sob os nºs 4.) e 6.), auxiliava os demais arguidos na referida aquisição e transporte de produto estupefaciente. Sabiam, igualmente, serem proibidas e legalmente punidas tais condutas.»
Consequentemente, impõe-se aditar à factualidade não provada um nº 4º, do seguinte teor:
« (Não se provou que )
Em data não concretamente apurada, mas entre meados de Junho de 2011 e antes do dia 05 de Julho de 2011,a arguida C participou com os arguidos B e A na combinação descrita sob o nº1 dos factos provados»
«A arguida C agiu previamente concertada e atuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas com os arguidos B e A e que aquela arguida sabia estar a adquirir, transportar e a introduzir em Portugal tal produto estupefaciente, com a finalidade de ser procedida a sua venda a terceiros».
2.1.2.3. - Da factualidade provada resulta, pois, que a arguida é mera participante no facto de outrem a que se refere o art. 27º do C. Penal e que corresponde à ideia de acessoriedade que, doutrinariamente, caracteriza a participação do cúmplice[3].
Conforme resulta do exposto e se diz, por todos, no citado acórdão do STJ de 6.10.2004, a cumplicidade diferencia-se da coautoria pela ausência do domínio do facto; o cúmplice limita-se a facilitar o facto principal, através de auxílio físico (material) ou psíquico (moral), situando-se esta prestação de auxílio em toda a contribuição que tenha possibilitado ou facilitado o facto principal ou fortalecido a lesão do bem jurídico cometida pelo autor, pelo que têm os recorrentes razão ao pretender que em consequência da procedência da impugnação da em matéria de facto, a arguida apenas pode ser condenada como cúmplice, impondo-se revogar nessa parte o acórdão recorrido.
2.3. – Da medida concreta das penas.
2.3.1. – Dos arguidos B e A.
Uma vez que a impugnação em matéria de facto improcedeu quanto a estes arguidos, apenas está em causa saber se em face da matéria de facto tal como o tribunal a quo a julgou provada é excessiva a pena de seis anos e seis meses de prisão aplicada ao arguido B e a pena de cinco anos e seis meses de prisão aplicada ao arguido A, e se aquela deve ser fixada em medida não superior a 6 anos e esta em medida não superior a 4 anos, suspensa na sua execução.
Não procede, porém a pretensão dos arguidos também nesta parte, essencialmente pelas seguintes razões.
Por um lado, é elevada a ilicitude do concreto ilícito perpetrado pelos arguidos. É elevado o desvalor do resultado, pois apesar de se tratar de cannabis e não de alguma das chamadas drogas duras mais lesivas da saúde, os arguidos transportavam consigo mais de 1,5 kg, em conjunto, que, em atenção ao nível de pureza do produto estupefaciente, permitia preparar mais de 4 000 doses aptas ao consumo público, conforme se descreve sob os nºs 13 e 14 dos factos provados, sendo certo que entre condutas previstas no tipo legal do art. 21º do Dec-lei 15/93, a concreta modalidade da conduta punível (transporte) é igualmente grave, visto que é essencial à deslocação do produto estupefaciente dos locais onde é produzida (ou preparada em larga escala) para os centros de difusão e revenda massificada, lesando a saúde pública, enquanto bem jurídico protegido, de forma mais intensa. Também do ponto de vista do desvalor da ação, a concreta conduta destes arguidos apresenta-se de gravidade considerável.
Ao ingerirem a droga os arguidos colocam em risco sério a sua própria saúde e ao transportarem-na daquele modo os arguidos revelam empenho considerável na dissimulação da sua atividade ilícita, tornando mais difícil a sua deteção pelas autoridades policiais.
Por outro lado, a situação pessoal do arguido B, incluindo os seus antecedentes criminais, que incluem condenações em pena de prisão por tráfico de estupefacientes, com pena de prisão efetivamente cumprida, traduz fortes exigências de prevenção especial a acrescer às necessidades de prevenção geral manifestas em casos como o presente, pelo que sendo o mínimo legal de 4 anos e o máximo de 12 anos, de prisão, não se verificam quaisquer razões para diminuir a pena de seis anos e meio para seis anos de prisão, sendo certo que não se encontra sequer provada a existência de qualquer dívida que o arguido visasse satisfazer com o dinheiro que auferiria com o transporte ilícito, pelo que sempre se impõe manter a pena de 6 anos e seis meses de prisão concretamente determinada para este arguido.
Também a situação pessoal do arguido A revela consideráveis necessidades de prevenção especial, a acrescer às de prevenção geral comuns a ambos os coarguidos. Apesar de não ter antecedentes criminais tão graves como o arguido B, o arguido A foi condenado anteriormente por crime de tráfico de estupefacientes em pena de prisão suspensa na sua execução e tem um percurso de vida marcado pela falta de desenvolvimento de competências escolares e profissionais, problemas de toxicodependência e relações familiares pouco consistentes, incapazes de constituir suporte para eventuais estratégias de resistência a delinquir de novo.
Não há, pois, que diminuir as penas aplicadas a ambos os arguidos, justificando-se a pena mais elevada aplicada ao arguido B por serem maiores as necessidades de prevenção especial face aos seus antecedentes criminais, mas também pela sua proeminência no desencadear e desenvolvimento do empreendimento ilícito levado a cabo por ambos os arguidos.
2.3.2. – Da medida concreta da pena aplicada à arguida, C.
Independentemente do mérito do seu recurso quanto à questão estrita da medida e escolha da pena, em face da factualidade provada no acórdão recorrido sempre se impõe alterar a medida concreta da pena aplicada à arguida em função da procedência da impugnação em matéria de facto e da consequente modificação da qualificação jurídica dos factos, de que resulta a sua condenação como cúmplice pelo crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º do Dec-lei 15/93, punível com a pena mínima de 9 meses e 6 dias e máxima de 8 anos, de prisão – cfr art- 73º do C. Penal.
Assim, reapreciando os fatores contra e a favor da arguida, que nos termos art. 71º presidem à determinação da pena, é decisiva a gravidade do ilícito perpetrado, com destaque para a quantidade de droga transportada, a modalidade concreta usada para dissimular aquela mesma droga, bem como os contornos da respetiva organização, que revela já alguma dimensão e o envolvimento de todos os arguidos, incluindo a arguida, com outras pessoas que procedem ao transporte e venda de canábis a grande número de consumidores. A arguida tinha ainda conhecimento de toda a operação de aquisição e transporte de droga (cfr, em especial, nºs 1, 4, 6, 7, 8, 9 e 10, dos factos provados) e resulta dos contornos da sua participação, particularmente no que respeita à sua efetiva e direta participação no transporte do produto estupefaciente conduzindo o automóvel, disponibilidade para contribuir de modo ativo para o sucesso do empreendimento ilícito, em termos que vão além de um mero e acidental contributo em ato completamente alheio. Contribuiu, pois, com culpa elevada para ilícito de gravidade concreta já com relevo assinalável, a exigir reação penal contrafática que possa restabelecer a confiança geral na validade e eficácia das normas penais violadas, nomeadamente no que respeita à danosidade social do contributo de condutas acessórias como a da arguida para o sucesso de empreendimentos ilícitos como a aquisição, transporte e posterior venda por terceiros a grande número de consumidores.
Do ponto de vista pessoal, impõe-se ter presente que a arguida foi condenada em 2008 em pena de prisão suspenda na sua execução pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 25º do Dec.-lei 15/93 e que alguma precariedade da sua situação económica, bem como a manutenção de relação próxima com o arguido B são de molde a fazer recear a prática pela arguida de futuros crimes da mesma natureza. A favor da arguida, conta o apoio da sua mãe, bem como a existência dos seus dois filhos menores, encontrando-se no estreitamento da relação com eles a melhor hipótese de a arguida vir a motivar-se positivamente para organizar a sua vida à margem da prática de ilícitos esta natureza.
Ponderando todos estes fatores e lembrando os limites mínimos e máximo da pena de prisão aplicável, entende-se ser adequada a pena de 2 anos de prisão para punir a conduta da arguida como cúmplice do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º nº1 do Dec-lei 15/93 em causa nos autos.
2.3.3. - Considerando as necessidades de prevenção geral e as necessidades de prevenção especial, supra referidas a propósito da medida concreta da pena, em particular a gravidade do ilícito concretamente perpetrado e os antecedentes criminais da arguida, bem como a fraca estabilidade económica e familiar que os factos provados evidenciam, entendemos que no caso presente tais necessidades não poderão ser satisfeitas através de pena não privativa da liberdade, tanto mais que foi anteriormente aplicada à arguida pena de prisão suspensa por crime da mesma natureza, pelo que não se procede à sua substituição por pena suspensa ou por prestação de trabalho a favor da comunidade – cfr arts 50º e 58º, do C. Penal.
III. Dispositivo
Nesta conformidade, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I. Em negar provimento ao recurso no que concerne aos arguidos B e A.
II. Em conceder parcial provimento ao recurso no que respeita à arguida, C, decidindo:
A. - Julgar parcialmente procedente a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto relativamente a ela, em resultado do que se modifica esta mesma matéria de facto (art. 431º b) do CPP), alterando a redação dos nºs 1 e 18 dos factos provados, nos seguintes termos:
- «1º. Em data não concretamente apurada, mas entre meados de Junho de 2011 e antes do dia 05 de Julho de 2011, os arguidos B e A, combinaram previamente entre si dirigirem-se a Marrocos para obter produto estupefaciente (canabis resina), com seu posterior transporte e introdução do mesmo em Portugal.
Fizeram-no na sequência do que foi pedido aos arguidos B e A por um indivíduo conhecido pelo “Cigano”, residente na zona J, em Chelas, mas que costuma frequentar o Bairro da Ajuda, o qual lhes propôs tal ida, nos seguintes termos:
Os arguidos deslocar-se-iam em veículo automóvel previamente alugado para tal efeito e receberiam, cada um, € 1 000,00, por cada quilo de canabis resina que conseguissem transportar consigo através do método de ingestão de bolotas de tal produto, de modo a propiciar a sua deglutição e, consequentemente, o seu transporte no interior do organismo (tubo digestivo), facilitando deste modo a sua ocultação e deslocação de Marrocos até Portugal, atravessando Espanha, sendo que, tal pagamento seria feito pelo aludido “Cigano” após recepcionar as bolotas em causa.».
«18º. Agiram os arguidos deliberada, livre e conscientemente, fazendo-o os arguidos B e A previamente concertados e actuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas, sendo todos os arguidos conhecedores das características e da natureza estupefaciente do produto que lhes foi apreendido.
Mais sabiam os arguidos B e A que estavam a adquirir, transportar e a introduzir em Portugal tal produto estupefaciente, com a finalidade de ser procedida a sua venda a terceiros e a arguida C que ao agir como descrito sob os nºs 4.) e 6.), auxiliava os demais arguidos na referida aquisição e transporte de produto estupefaciente. Sabiam, igualmente, serem proibidas e legalmente punidas tais condutas.»
Consequentemente, impõe-se aditar à factualidade não provada um nº 4º, do seguinte teor:
(Não se provou que)
«Em data não concretamente apurada, mas entre meados de Junho de 2011 e antes do dia 05 de Julho de 2011,a arguida C participou com os arguidos B e A na combinação descrita sob o nº1 dos factos provados.
A arguida C agiu previamente concertada e atuando em conjugação de esforços e divisão de tarefascom os arguidos B e A e que aquela arguida sabia estar a adquirir, transportar e a introduzir em Portugal tal produto estupefaciente, com a finalidade de ser procedida a sua venda a terceiros».
B. – Revogar o acórdão condenatório na parte em que condenou a arguida como coautora de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º do Dec.-lei 15/93, de 2 de janeiro, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, decidindo em substituição condenar a mesma arguida como cúmplice de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º do dec-lei 15/93 de 2 de janeiro, na pena de 2 anos de prisão.
Custas pelos arguidos B e A que decaíram totalmente no recurso, fixando-se em 5 UC a taxa de justiça a pagar por cada um deles - cfr arts. 513º nº1 do CPP, na atual versão, introduzida pelo Dec-lei 34/2008 de 26 fevereiro e art 8º nº5 do Regulamento das Custas Processuais (RCP) aprovado pelo citado Dec-lei 34/2008, conjugado com a tabela III a que se refere este último preceito.
Évora, 6 de novembro de 2012
(Processado em computador. Revisto pelo relator.)
(António João Latas)
(Carlos Jorge Berguete)
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[1] Roxin, Sobre la autoria e participación en el derecho penal in Textos de Direito Penal II, AAFDL, 1983-4 p. 373-4