CONTRA-ORDENAÇÃO
VENDA COM PREJUÍZO
DESCONTO PROMOCIONAL
Sumário


I - Para efeito da determinação do preço de compra efectivo, não pode ser considerado como desconto promocional, ainda que identificável quanto ao produto, respectiva quantidade e período em que vai vigorar, aquele que não esteja sujeito a um período de tempo limitado, esporádico, excepcional.
II – Como tal, a sua indexação à duração de um contrato, para vigora durante certo período, renovável automaticamente por outro período, não reflecte essa caracterização.

Texto Integral


Processo nº 19/12.9YUSTR.E1


ACÓRDÃO


Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
1 – Relatório
Em processo de contra-ordenação instaurado pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, por decisão de 2/8/2012 do Conselho da Autoridade da Concorrência foi a arguida A condenada pela prática de duas contra-ordenações p. e p. nos arts. 3º, nº 1 e 5º, nº 2, al. a) do DL 370/93, de 29-10, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo DL 140/98, de 16/5 nas coimas de € 10.911,12 e € 14.963,94 e em cúmulo jurídico, na coima única de € 20.000,00.
Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso de impugnação judicial que oportunamente foi remetido para o 1º Juízo do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão de Santarém, onde após a competente audiência de julgamento, foi proferida sentença que, julgando parcialmente procedente o recurso, alterou aquelas condenações para € 10.000,00 e € 14.000,00, fixando em € 18.000,00 a coima única.

De novo inconformada, dela interpôs recurso a arguida para esta Relação, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões:
«A.O tipo legal de venda com prejuízo, previsto e punido nos termos do DL 370/93, não foi preenchido com a conduta da Recorrente ora em análise.
B. Na verdade, o Café foi vendido ao público a um preço inferior ao seus respetivo preços de compra efetivo.
C. O Café encontrava-se exposto para venda ao público ao preço unitário de €2,19, com IVA incluído à taxa de 12%.
D. Recorrente beneficiou, na aquisição do Café, de: (i) um desconto comercial de 20%; e (ii) um desconto promocional, traduzido na aplicação de um desconto percentual de 40,6%.
E. Esse desconto promocional respeitou todas as exigências contidas no artigo 3.º do DL 370/93, pois: (i) traduzindo-se em redução percentual, é determinável no momento de emissão da Fatura Café; (ii) é identificado na própria Fatura Café e, por remissão desta, nas Condições de Compra Café; e (iii) é identificável quanto ao produto (i.e., o Café), respetiva quantidade (i.e., 1.800 sacos de Café), e período pelo qual vigora (i.e., entre 28 de maio de 2008 e 31 de março de 2009); pelo que não haverá qualquer motivo que justifique que tal desconto não seja considerado para efeitos do cálculo do preço de compra efetivo do Café.
F. Assim, o preço de compra efetivo do Café, após a dedução do desconto de que a Recorrente beneficiou, foi então de €2,00 (dois euros), com IVA incluído à taxa de 12%, pelo que a Recorrente não praticou uma venda com prejuízo relativamente a este produto.
G. Antes pelo contrário, terá a ora Recorrente beneficiado de uma margem lícita de €0,19 (dezanove cêntimos) em cada unidade de Café vendida.
H. Este desconto promocional respeitou todas as exigências referidas no artigo 3.º do DL n.º 370/93.
I. Ainda que se admitisse que o tipo objetivo de venda com prejuízo foi preenchido, o tipo subjetivo não foi claramente preenchido, já que não existiu dolo nem negligência na conduta da Recorrente, necessário nos termos do artigo 8.º, n.º 1, do RGCO, e do artigo 5.º, n.º 4, do DL 370/93.
J. E, mesmo que tivesse existido dolo ou negligência, estes seriam necessariamente excluídos pelo facto de ter existido erro sobre “um estado de coisas” que, a existir, afastaria a ilicitude, nos termos do artigo 8.º, n.º 2, do RGCO.
K. De qualquer forma, não se verificou o elemento “culpa”, uma vez que não deve haver um juízo de censurabilidade acerca da conduta da Arguida, conforme determina o artigo 9.º, n.º 1, do RGCO.
Nestes termos, deve a Recorrente ser absolvida da prática das contra-ordenações em causa, ordenando-se o consequente arquivamento do presente processo contra-ordenacional, sem aplicação à Recorrente de qualquer sanção».
O Ministério Público respondeu ao recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.


Nesta Relação, o Exmo. Procuradora Geral Adjunto emitiu parecer, aderindo à resposta à motivação apresentada pelo Digno Magistrado do Ministério Público do Tribunal da 1ª instância.
Observado o disposto no art. 417º nº 2 do CPPenal, a arguida respondeu, pugnando pela posição já assumida nos autos.
Procedeu-se a exame preliminar.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir

II – Fundamentação
.1. Matéria de facto provada
Mostram-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão da causa:
1.Na ação de fiscalização levada a cabo pela ASAE, foi constatado que no dia 21 de janeiro de 2009, no estabelecimento denominado “A”, situado na (…), Matosinhos, pertencente à arguida, estavam expostos produtos para venda ao público, dos quais, foram selecionados 4 (quatro) para análise de eventuais vendas com prejuízo:
· "Café Delta Torrado Moído p/saco, 250g";
· "Óleo Alimentar Fula, 1,5l";
-“Shampoo HS Anti-caspa, 2 em 1, Classic, 300ml; e
-"Bolachas Triunfo Pro-Alimentar Integral, 200g”.
2.A ASAE adquiriu um exemplar dos artigos acima identificados, tendo solicitado, no momento da sua compra, o respetivo talão (fls. 8).
3. Em 22 de novembro de 2011, foi a arguida notificada que se encontrava em fase de instrução o presente processo, tendo sido solicitados, concomitantemente, o envio das cópias das faturas de compras emitidas pelo respetivo fornecedor à loja objeto de fiscalização, bem como de outros documentos comprovativos do preço de compra efetivo (fls. 12).
4. O “Café Delta Torrado Moído p/saco, 250g” encontrava-se exposto para venda ao público ao preço de € 2,19 (com IVA incluído).
5. Para a determinação do preço de compra efetivo foi apresentado como justificativo a fatura n.º 1380019816, de 22 de dezembro de 2008 (fls. 15) emitida pela empresa “B”.
6. O preço unitário do “Café Delta Torrado Moído p/saco, 250g” constante da fatura é de € 3,00 (s/ IVA).
7. Da fatura consta a seguinte nota remissiva: “Sobre estes produtos incidem ainda os descontos e outras contrapartidas decorrentes de todos os contratos e acordos celebrados entre as partes, nos termos do Art.3.º do Dec-Lei 370/93 de 29/10.”.
8. Da fatura referida relativa à aquisição do café consta um desconto comercial de 20% e um desconto promocional de 40,6%, sendo que de acordo com contrato celebrado entre a arguida e o seu fornecedor este último vigorará entre 28/5/08 e 31/3/09, com possibilidade de renovação automática por um ano.
9. O “Óleo Alimentar Fula, 1,5l” encontrava-se exposto para venda ao público ao preço de € 2,34 (com IVA incluído).
10. Para a determinação do preço de compra efetivo foi apresentado como justificativo a fatura n.º 7100079035, de 12 de janeiro de 2009 (fls. 18) emitida pela empresa “C”.
11. O preço unitário do “Óleo Alimentar Fula, 1,5l” constante da fatura é de € 4,45 (s/ IVA).
12. Da fatura consta a seguinte nota remissiva: “Sobre estes produtos incidem ainda os descontos e outras contrapartidas decorrentes de todos os contratos e acordos celebrados entre as partes nos termos do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 370/93 de 29 de Outubro.
13. Da fatura referida relativa à aquisição do óleo consta um item com a referência “DescOp.Esp.E/L” de € 963,72, sem que da fatura ou de acordo entre a arguida e o seu fornecedor resulte a referência à quantidade a partir da qual o desconto de operações especiais é concedido.
14. Resulta do exposto que a Arguida quis colocar e colocou à venda os produtos “Café Delta Torrado Moído p/saco, 250g” e “Óleo Alimentar Fula, 1,5l”, pelos preços por que o fez, bem sabendo ser a sua conduta punida por lei.
15. Assim, a arguida agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos que lhe são imputados, ciente da proibição e conformada com o prejuízo ilícito que resultou da sua ação.
16. De acordo com o seu Relatório e Contas (fls. 82 a 106), a sociedade foi constituída em 1994 e tem como objeto social, desde o dia 17 de Março de 1998, o comércio de produtos alimentares e de consumo, bem como na prospecção, compra, venda, arrendamento, gestão de imóveis próprios, construção, remodelação e gestão de propriedades e ainda edição, publicação e distribuição de jornais e outros produtos de imprensa.
17. Em 28 de Fevereiro de 2011, a sociedade tinha 227 lojas alimentares a funcionar em Portugal Continental.
18. De acordo com o Relatório e Contas de 2011, esta empresa apresentou, em 28-Fev-2010, um volume de vendas de €1.147.533.512,17 e em 28-Fev-2009 um valor de 1.139.648.977,3.
19. Quanto aos resultados líquidos, em 28-Fev-2010 os mesmos foram de €54.978.099,44, enquanto no período homólogo apresentaram um valor de €42.067.929,50.
20. A arguida já foi condenada por vendas com prejuízo nos Processos 1186/10.1TYLSB (3.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa), e 1185/10.3TYLSB (9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa).
***
2. Matéria de facto não provada
Não se provou que:
A arguida agiu convencida de que todos os descontos referidos nos factos provados seriam aceites para efeitos de cálculo do preço de custo efetivo e de que o seu comportamento era lícito.
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3. Motivação da decisão de facto
O recurso de impugnação judicial, enquanto recurso, apresenta particularidades em relação ao processo por crime. Estando em causa, nesta sede, um recurso, o objecto do processo é fixado em função do conteúdo do articulado de impugnação, mais especificamente pelas suas conclusões.
Daqui resulta que não há que produzir prova sobre os factos aceites pelo arguido. Não se trata de prova por confissão no sentido que esta pode ter no direito civil, isto é, não se consideram os factos provados por o arguido os não ter especificadamente impugnado. Em processo contraordenacional vale o princípio da presunção de inocência e o consequente ónus de prova pela acusação. No entanto, só deve ser produzida prova e apreciada a factualidade posta em causa pelo arguido. Os factos constantes da decisão recorrida que o arguido não questione ficam fora do objeto do recurso.
In casu, a arguida admitiu, no essencial, a generalidade dos factos provados relativos ao elemento objetivo, não pondo em causa a venda dos produtos aos preços referidos, nem os preços de aquisição constantes das faturas, nem os descontos mencionados nas faturas e teor do acordado contratualmente. A questão controvertida neste processo prende-se essencialmente com a questão jurídica de apurar a relevância ou irrelevância dos descontos para efeitos de cálculo do preço de compra efetivo, matéria que adiante analisaremos.
Não obstante, refira-se, de qualquer modo, que a convicção do tribunal relativamente à matéria de facto dada como provada sempre resultaria pacífica em face da análise do teor dos documentos juntos aos autos, sobretudo os mencionados nos próprios factos provados.
Quanto à menção aos descontos e ao prazo de vigência, chama-se a atenção para o teor de fls. 15, 18, 61 e 63. Os factos objeto de alteração não substancial comunicada resultaram da análise da documentação constante dos autos.
A convicção do Tribunal assim formada foi reforçada pelos depoimentos das testemunhas ouvidas, as quais, por coerentes, se reputaram credíveis, e que não abalaram a convicção assente no teor dos documentos. Saliente-se que nenhuma testemunha conseguiu explicar de modo claro em que consiste o desconto de operações especiais e esclarecer qual a quantidade a partir da qual é concedido tal desconto.
A convicção do Tribunal quanto aos factos relativos ao elemento subjetivo resultou da análise crítica da área de atividade da arguida e bem assim do seu historial e experiência no ramo, o que nos permite concluir que a arguida tem perfeito conhecimento da legislação vigente nesta área e quis praticar os comportamentos provados.
Não se provou, como alegado pela Recorrente, que a arguida estivesse convencida de que tais descontos seriam aceites para efeitos de cálculo do preço de custo efetivo, dada a vasta experiência e conhecimentos da arguida no sector.

III – Apreciação do Recurso
O âmbito do recurso é delimitado pelo teor das conclusões que a recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo do dever de conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, designadamente dos vícios indicados no art. 410º, nº 2 do CPPenal. Tais conclusões visam permitir ou habilitar o tribunal ad quem a conhecer as razões de discordância da recorrente em relação à decisão recorrida.
Em processo contra-ordenacional a Relação apenas conhece de direito, sem prejuízo de o fazer oficiosamente em matéria de questões prévias e vícios (art. 75º do RGCO).
Perante as conclusões do recurso, as questões a decidir consiste em saber se estão preenchidos os elementos objectivos da contra-ordenação relativa ao café e dos subjectivos em relação às duas contra-ordenações pelas quais a arguida foi condenada.
A arguida foi condenada pela prática de duas contra-ordenações de “Venda com prejuízo”, p. e p. no art. 3º nº 1 e 5ª, nº 2 al. a) do DL nº 370/93, de 20-10, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 140/98, de 16 de Maio.
Estabelece aquele art. 3º sob a epígrafe, “Venda com prejuízo”:
1-É proibido oferecer para venda ou vender um bem a um agente económico ou a um consumidor por um preço inferior ao seu preço de compra efectivo, acrescido dos impostos aplicáveis a essa venda, e se for caso disso, dos encargos relacionados com o transporte.
2- Entende-se por preço de compra efectivo o preço constante da factura de compra, após a dedução dos descontos directamente relacionados com a transacção em causa que se encontrem identificados na própria factura ou, por remissão desta, em contratos de fornecimento ou tabelas de preços e que sejam determináveis no momento da respectiva emissão.
3- Entende-se por descontos directamente relacionados com a transacção em causa os descontos de quantidade, os descontos financeiros e os descontos promocionais desde que identificáveis quanto ao produto, respectiva quantidade e período por que vão vigorar.
No nº 4, definem-se algumas situações de excepção à disciplina ora referida, situações que não importam para o caso em análise.
5- Incumbe ao vendedor a prova documental do preço de compra efectivo, bem como das justificações previstas no número anterior.
Subjacente a este preceito como consta do preâmbulo do DL nº 140/98, está a necessidade de obstar a práticas “ que impeçam uma concorrência leal entre as empresas, impondo-se o ajustamento do diploma primitivo “face á profundas alterações que o relacionamento entre estas tem vindo a registar nos últimos anos em resultado do peso cada vez maior da chamada «grande distribuição» nos circuitos económicos”.
Assim, uma das principais preocupações do novo diploma dirigiu-se à reformulação do art. 3º, referente à “venda com prejuízo”, “tendo em vista, por um lado, eliminar as incertezas geradas pela redacção anterior no que respeita ao cálculo do chamado «preço de compra efectivo», como também, por outro, nela incluir a venda com prejuízo ao consumidor…”.
Na verdade, “a venda com prejuízo” é um poderoso mecanismo de enfraquecimento dos concorrentes mais débeis, pelos que são, economicamente os mais poderosos e que por isso, estão em condições de suportar a prática dos preços “com prejuízo” por tempo suficiente para arruinar e afastar os demais.
Na vigência do DL nº 370/93, de 29 de Outubro para o cálculo do preço de compra efectivo era considerado “o preço constante da factura de compra, após a dedução dos descontos nela contidos”. Portanto, não eram considerados os descontos de qualquer natureza concedidos pelo fornecedor, mas apenas os descontos contidos na factura de venda.
O DL nº 140/98, que veio dar nova redacção ao DL nº 370/93, de 29 de Outubro que, nos nºs 2 e 3 do art. 3º delimita com mais rigor o leque dos descontos para o cálculo do preço de compra efectivo. Tais descontos terão de reunir cumulativamente as seguintes características:
Em primeiro lugar, exige-se uma expressa identificação no documento. Só são considerados os descontos “ que se encontrem identificados na própria factura de compra ou, por remissão desta, em contratos de fornecimento ou tabelas de preço.
Em segundo lugar, os descontos terão de pertencer a uma de três categorias: os descontos de quantidade, os descontos financeiros e os descontos promocionais desde que, quanto a estes últimos, seja possível a identificação do produto, respectiva quantidade e período de vigência:
Em terceiro, apenas serão considerados os descontos em que seja possível estabelecer uma relação directa com a transacção em causa.
Em quarto lugar, os descontos terão de ser determináveis no momento da emissão da factura de compra.
Tecidas estas considerações, vejamos o caso concreto:
Como consta da matéria provada a recorrente tinha, no dia 21 de Janeiro de 2009, no seu estabelecimento denominado “A”, situado na (…), Matosinhos, expostos para venda ao público, entre outros produtos, “Café Delta Torrado Moído p/saco, 250g” ao preço de € 2,19 (com IVA incluído).
Invoca a recorrente que beneficiou na aquisição do café de um desconto comercial de 20% e de um desconto promocional, traduzido na aplicação de um desconto percentual de 40,6%, desconto este que respeitou todas as exigências do art. 3º do DL nº 370/93, pelo que inexiste motivo para que tal desconto não seja considerado para efeitos do cálculo do preço de compra efectivo do café.
Não assiste razão à recorrente.
Quanto ao desconto comercial de 20% não foi considerado para o cálculo do preço de compra efectivo do café, o que também não foi impugnado pela recorrente, porque como consta da decisão recorrida “é um desconto incondicional, aplicável a toda a gama, pelo que não pode ser qualificado como desconto de quantidade (pois é aplicável mesmo que se adquira apenas uma unidade), não pode ser qualificado como desconto financeiro (pois é aplicável independentemente das condições de pagamento) nem promocional (uma vez que é aplicável a toda a gama)”.
Relativamente ao desconto promocional de 40,6% alega a recorrente que respeitou todas as exigências do art. 3º do DL nº 370/93 nomeadamente: (i) traduz-se numa redução percentual que é determinável no momento de emissão da factura de café; (ii) é identificado na própria factura de café e, por remissão desta, nas condições de compra de café; (iii) é identificável quanto ao produto (café) e respectiva quantidade (1800 sacos de café), e período pelo qual vigora (entre 28 de Maio de 2008 e 31 de Março de 2009).
Os descontos promocionais são concedidos pelo fornecedor como forma de incentivar a venda do seu produto ou de o promover.
Os descontos promocionais para serem atendíveis, no cálculo do preço de compra efectivo, devem ser identificáveis quanto ao produto, respectiva quantidade e período por que vão vigorar (nº 3 do art. 3 do DL nº 370/93, de 29-10).
No caso em apreço, o desconto é identificável na factura quanto ao produto e respectiva quantidade.
Quanto ao período durante o qual vigorou o desconto promocional em causa de 40,6% provou-se que “de acordo com o contrato celebrado entre a arguida o seu fornecedor este vigorará entre 28/5/08 e 31/3/09, com possibilidade de renovação automática por um ano”.
O que caracteriza o conceito de desconto promocional, é o facto de estar sujeito a um período de tempo limitado, esporádico, excepcional, não podendo o mesmo ter um carácter permanente, isto é, indexado à duração de um contrato.
Ora, o desconto em causa vigorou durante dez meses, período longo, com possibilidade de renovação automática, o que não existe em caso de promoções, pelo que não tem a natureza de esporádico, excepcional passando antes a fazer parte do preço do produto.
Assim, o dito desconto promocional não tem esta natureza, pelo que não pode ser tido em conta para o cálculo do preço de compra efectivo.
A arguida expunha para venda ao público o produto Café ao preço unitário de € 2,19 (com IVA).
O preço unitário de aquisição constante da factura era de 3 € (sem IVA) o que adicionado o IVA de 12%, perfaz o preço de compra efectivo pela arguida de 3,36 €.
Ora, dado que inexistem quaisquer outros descontos relevantes a ter em consideração e que o preço de venda ao público era de 2,19 € (com IVA incluído), então, estamos perante uma venda com prejuízo, pelo que estão preenchidos os elementos objectivos relativos à contra-ordenação de venda do café.
Quanto ao elemento subjectivo a arguida nega que tenha existido dolo na sua actuação, e que se limitou a interpretar os factos de tal forma que concluiu que os descontos de que beneficiou eram aceites, nos termos do art. 3º do DL nº 370/93, para efeitos do cálculo dos preços de compra efectivos dos produtos.
A matéria relativa ao elemento subjectivo da infracção constitui matéria de facto e esta é insusceptível de ser alterada, uma vez que o recurso para o Tribunal da Relação só pode versar sobre matéria de direito.
Ora, da matéria provada consta que a arguida quis colocar e colocou à venda o “Café delta Torrado Moído p/saco, 250g” e “Óleo Alimentar Fula, 1,5l”, pelos preços por que o fez, bem sabendo ser a sua conduta punida por lei. (facto 14)
Assim, a arguida agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos que lhe são imputados, ciente da proibição e conformada com o prejuízo ilícito que resultou da sua acção (facto 15).
Destes factos infere-se que as condutas da arguida lhe são assacadas a título de dolo directo.
Alega ainda, a arguida que estava em erro quanto a “(…) um estado de coisas que a existir, afastaria a ilicitude do facto (…), art. 8º nº 2 do RGCO e que não se verificou o elemento “culpa”, uma vez que não deve haver um juízo de censurabilidade acerca da sua conduta (art. 9º nº 1do mesmo diploma).
Não consta da matéria provada qualquer facto donde se possa concluir que a arguida ao actuar do modo referido agiu convicta de que estava a exercer um direito que erroneamente julgou existir, isto é, de que podia incluir nos preços de compra efectivo os descontos de que beneficiou, pelo que inexiste qualquer causa que exclua a ilicitude dos factos ou a sua culpa, atento o teor dos factos da matéria provada nºs 14 e 15.
Mesmo que se tivesse provado que a arguida agiu convicta de que estava a exercer um direito que erroneamente julgou existir, tal erro não seria desculpável, uma vez que se lhe impunha actuar com o cuidado a que uma pessoa portadora de uma recta consciência ético jurídica teria informando-se convenientemente sobre a proibição legal junto das autoridades competentes.
Improcede, assim, também este segmento do recurso.

IV- Decisão
Termos em que acordam os Juízes desta Relação em negar provimento ao recurso mantendo a decisão recorrida.
Custas pela arguida com taxa de justiça que fixamos em 4 UCS.
Notifique.
Évora, 7 de Maio de 2013
José Maria Martins Simão
Maria Onélia Vicente Neves Madaleno