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CONTRA-ORDENAÇÃO AMBIENTAL
DEPÓSITO DE RESÍDUOS DE ESCAVAÇÃO
Sumário
I – Incorre na prática de contra-ordenação ambiental, p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos artigos 18.º, n.º1 e 4 do DL 46/2008, de 12 de Março, e 22.º, n.º4, al. b) da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, aquele que depositar em prédio rústico, não licenciado para o efeito, rochas e solos (terras limpas) provenientes de uma escavação (para canalização de gás natural) efetuada noutro local.
Texto Integral
Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I - RELATÓRIO
No recurso de contraordenação nº 360/12.0TBCTX, que corre termos no 1º Juízo do Tribunal Judicial do Cartaxo, em que é arguida “A…, Ldª”, por sentença, datada de 10 de Julho de 2013, o tribunal decidiu nos seguintes termos:
“A. Condenar A…,LDA., pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 18º, nºs 1 e 4 do DL 46/2008, de 12 de Março e 22º, nº 4, alínea b) da Lei 50/2006, de 29.08, na redação da Lei 89/2009, de 31.08, na coima de € 19.250,00 (dezanove mil duzentos e cinquenta euros).
B. Condenar a recorrente nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) UC (artigo 8º, nº 7, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III Anexa)”.
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Desta decisão foi interposto pela arguida o presente recurso, extraindo a arguida da motivação do recurso as seguintes (transcritas) conclusões:
“1º- A sentença ora sob escrutínio acha-se enfermada do vício constante da alínea c) do nº 2 do artº 410º do C. P. Penal – erro notório na apreciação da prova – norma aplicada subsidiariamente nos termos do artº 41º do Dec. Lei nº 433/82, de 27 de Outubro.
2º- Do acervo factual dado como provado, com relevância para a aferição da prática da infração pela qual foi condenada, o Tribunal a quo, salvo o devido respeito, à semelhança do que sucedeu com a autoridade administrativa, apreciou com demasiada ligeireza os factos que são imputados à ora recorrente, considerando-os como integradores de uma infração muito grave, quando o grau de perigosidade que dos mesmos poderia eventualmente resultar para a saúde pública e para o ambiente, era, em termos absolutos, igual a zero.
3º- No que diz respeito ao facto que deu causa ao auto de noticia – o alegado abandono de resíduos de construção e demolição (RCD) em local não licenciado ou autorizado para o efeito – o Tribunal a quo limitou-se a reproduzir o que a autoridade administrativa transmitiu, não tomando em consideração a natureza das terras que foram objeto desse alegado abandono.
4º- Atenta a especificidade dessas terras, das quais não emergia, direta ou indiretamente, qualquer perigo para o cidadão comum, a recorrente entende que o seu comportamento não é merecedor da censura ético-jurídica que determinou a condenação que ora se impugna.
5º- O Tribunal a quo não avaliou corretamente as circunstâncias que motivaram as descargas dos alegados resíduos e a não nocividade destes sob o ponto de vista da saúde pública.
6º- Torna-se necessário saber se terras, como as que foram depositadas pela recorrente, consideradas limpas pelos agentes de fiscalização e sem qualquer grau de perigosidade, integram o elenco dos resíduos de construção e demolição plasmados o nº 1 do artº 18º do Dec. Lei 46/2008, de 12 de Março.
7º- Nos termos da alínea x) do artº 3º do Dec. Lei 178/2006, de 5 de Setembro, resíduo de construção e demolição (RCD) é definido como: “resíduo proveniente de obras de construção, reconstrução, ampliação, alteração, conservação e demolição e da derrocada de edificações.”
8º- Só com manifesta boa vontade, com propósitos inconfessos, podemos incluir nesse elenco as referidas terras.
9º- A recorrente nunca considerou aquelas terras como sendo resíduos de construção e, muito menos, que se enquadrassem no âmbito dos previstos nos termos e para os efeitos do artº 18º do diploma acima citado.
10º- A esses resíduos, a recorrente, bem como o vulgo, chamam “entulho”, cuja composição, não raras vezes, é feita de materiais com elevado nível de perigosidade.
11º- São esses resíduos e, em particular os seus efeitos – não as terras sob apreciação – muitos deles sobremaneira nocivos para a saúde pública e para o ambiente, que os diplomas acima mencionados, através dos mecanismos que contemplam, pretendem reduzir ou eliminar.
12º- Da análise do teor do artº 1º do Dec. Lei 46/2008, de 12 de Março, que define o objeto desse diploma, verificamos que as operações de gestão aí invocadas, dizem respeito a resíduos resultantes de obras ou demolições de edifícios ou de derrocadas.
13º- De tais resíduos, “entulho”, fazem parte não raras vezes, diversos detritos, nomeadamente, caliça, cascalho, tijolos partidos e estruturas em ferro totalmente destruídas.
14º- Os trabalhos que a recorrente executava no âmbito do seu contrato de subempreitada, aquando da fiscalização, não se traduziam na reposição/reparação de canalizações, o que, a ser verdade, que não era, poderia criar a ideia da existência de resíduos passíveis de alguma preocupação.
15º- A recorrente executou os trabalhos de escavação em terras que nunca antes tinham sido mexidas, não existindo nelas quaisquer indícios de que alguma vez tivessem sido objeto de utilização.
16º- Das valas que aí abriu para efeitos de instalação de canalizações de gás natural, o recorrente retirou terras limpas – consideradas como tal pelos agentes de fiscalização – puras, sem qualquer contaminação, próprias para serem utilizadas em jardins ou no âmbito de outra exploração agrícola.
17º- Dado tais terras, atenta a sua qualidade e composição, não constituírem resíduos de construção face ao que atrás se aduziu, a recorrente, na convicção disso mesmo, reforçada no facto de, por estes motivos, nunca ter sido arguida em processos de contraordenação de natureza ambiental, decidiu aceitar o convite que lhe foi formulado pelo proprietário do prédio depositário, AP, melhor identificado no auto de noticia, no sentido de nesse prédio descarregar as referidas terras.
18º- Encontrando-se no prédio, onde o depósito foi efetuado, pequenos montes de terras com as mesmas características, também elas limpas, dispostos em fila, a recorrente, seguindo a mesma linha de pensamento – não considerava aquelas terras resíduos de construção – não interpelou o proprietário, nem isso lhe passou pela mente, no sentido de saber se aquele espaço estava licenciado ou autorizado para o efeito.
19º- A recorrente estava na boa-fé, sem propósitos inconfessos, apenas se preocupou em satisfazer o pedido que lhe foi feito por AP, não tendo obtido qualquer ganho com tal depósito.
20º- O depósito dessas terras, atentas as circunstâncias que o rodearam e motivaram, não pode ser considerado um abandono nos termos da alínea a) do artº 3º do Dec. Lei 178/2006, de 5 de Setembro.
21º- A recorrente na esteira do que já aduziu relativamente às terras que foram depositadas, defendendo, convictamente, que tais não são consideradas resíduos, com o seu comportamento não preencheu os pressupostos em que assenta o abandono, nos termos em que está plasmado.
22º- As terras em causa, não sendo resíduos no entender da recorrente, não tinham que se sujeitar a operações de gestão e, para além disso, aquando do depósito, tinha destinatário devidamente identificado, o referido AP, que delas beneficiou.
23º- Entende a recorrente que a matéria constante dos Pontos 1, 3, 4 e 7 dos factos dados como provados (pág. 1) deve ser reapreciada de modo a verificar-se se a sua atuação, objetiva e subjetivamente considerada, preencheu inequivocamente os elementos constitutivos do normativo previsto no nº 1 do artº 18º do Dec. Lei 46/2008, de 12 de Março.
24º- Face à matéria que fundamentada e justificadamente aduziu, a recorrente entende não ter cometido a infração que lhe é imputada.
25º- Os elementos constitutivos dessa contraordenação não foram preenchidos, pelo menos nos termos que a decisão recorrida pretende fazer crer.
26º- O Tribunal a quo não apreciou as circunstâncias que atrás se alegaram e que motivaram a recorrente a descarregar as terras da forma e pela razão que o fez.
27º- Atenta a inexistência do elemento subjetivo, essencial para a aferição do grau de eventual culpabilidade, a recorrente deverá ser absolvida, mesmo a título de negligência.
28º- Quanto muito, a considerar-se que a recorrente deveria ter feito uma análise, mais ponderada, relativamente ao destino a dar às referidas terras, limpas e sem qualquer grau de perigosidade, reitera-se, então, que a decisão a proferir, atenta a inexistência de consequências nocivas dessa insuficiente análise, seja uma admoestação, aplicada nos termos e para os efeitos previstos no artº 51º do Dec. Lei 433/82, de 27 de Outubro.
29º- Sendo a recorrente uma pequena empresa, quase familiar, a manter-se a decisão recorrida, tal irá obrigatoriamente provocar-lhe um manifesto desequilíbrio na sua situação económico-financeira, já de si bastante frágil, com profundos reflexos negativos naqueles que nela laboram.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, em consequência:
- Determinar-se a absolvição da recorrente da prática da contraordenação ambiental prevista no nº 1 do artº 18º do Dec. Lei 46/2008, de 12 de Março.
- Se assim não for entendido, apela-se a V. Excelências que a decisão a proferir seja uma admoestação, aplicada nos termos previstos no artº 51º do Dec. Lei 433/82, de 27 de Outubro”.
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Notificada da interposição do recurso, a Exmª Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância apresentou resposta, pugnando para que seja negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida.
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Neste Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, louvando-se, no essencial, na resposta ao recurso oferecida na primeira instância pelo Ministério Público, e concluindo que o recurso deve ser julgado improcedente.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, a recorrente apresentou resposta, reafirmando, em síntese, o que já havia alegado na motivação do recurso.
Efetuado o exame preliminar, determinou-se que fosse o presente recurso julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
1 - Delimitação do objecto do recurso.
Como é jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva motivação (artigo 412º, nº1, do C. P. Penal).
Assim, e seguindo literalmente as conclusões extraídas pela recorrente da motivação do recurso, as questões a apreciar por este tribunal são as seguintes:
1ª - Impugnação da decisão fática (a recorrente discorda da valoração da prova que foi feita pelo tribunal a quo - entendendo até que ocorre o vício do “erro notório na apreciação da prova”).
2ª - Qualificação jurídica dos factos (na opinião da recorrente não se configura in casu a prática de qualquer contraordenação, pois estão em causa apenas depósitos de terras limpas - sem qualquer grau de perigosidade ou de nocividade -, em terreno não licenciado para o efeito, mas depósitos esses autorizados pelo proprietário do terreno).
3ª - Aplicação da pena de admoestação
2 - A decisão recorrida.
É do seguinte teor (integral) a sentença recorrida:
“1. RELATÓRIO
Nos presentes autos de recurso de contraordenação A…, LDA, pessoa coletiva nº , com sede na Rua…, Alcobaça, impugnou judicialmente a decisão Administrativa proferida pela Inspeção Geral da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território em 19.12.2011 nos termos da qual foi o mesmo condenado pela prática da contra ordenação prevista e punida pelo artigo 18º, nº 1 do DL 46/2008, na coima de € 38.500,00.
Para tanto, invoca, que efetivamente a recorrente vinha depositando num prédio rústico terras limpas provenientes de escavações que no âmbito da sua atividade estava a realizar, o que lhe foi solicitado pelo proprietário de tal terreno a fim de serem criadas condições para uma futura terraplanagem.
Presumindo que o terreno em causa estava licenciado para o efeito, atenta a quantidade de terras lá existentes acedeu ao pedido pelo que, e não constituindo a sua conduta um abandono de resíduos nos termos da lei, pugna pela absolvição.
Admitido o recurso interposto pelo arguido, por tempestivo e respeitar as exigências legais de forma previstas no artigo 63.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, foi designada data para a realização da audiência de discussão e julgamento, a qual foi realizada com observância do formalismo legal aplicável, não ocorrendo nulidades, exceções ou questões prévias que obstem à apreciação do mérito da causa.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS PROVADOS
Com relevância para a decisão a proferir resultou demonstrada a seguinte factualidade:
1. No dia 1 de Fevereiro de 2010 pelas 09:25 horas, no interior do prédio rústico sito na Rua …, Azambuja, ocupado essencialmente pelo estrado herbáceo e arbustivo o veículo pesado de mercadorias de matrícula ---AM, propriedade da recorrente, procedia à descarga de cerca de 10 m3 de resíduos inertes compostos por solos e rochas (terras limpas), junto de outros montes com as mesmas características, dispostos numa fileira horizontal de modo a facilitar o seu posterior espalhamento e terraplanagem.
2. O motorista do veículo referido em 1. era funcionário da sociedade recorrente, cuja atividade principal é a realização de trabalhos no âmbito da construção civil.
3. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 1. aquele motorista procedia à descarga de terras de escavação provenientes de uma obra de reposição/reparação de canalizações de gás natural da rede pública que a sociedade recorrente se encontrava a realizar na localidade de Castanheira do Ribatejo, Vila Franca de Xira.
4. A sociedade recorrente tinha autorização do proprietário do prédio referido em 1. para ali depositar todas as terras limpas provenientes da sua atividade com vista a futura terraplanagem do terreno para ser usado para edificação.
5. O proprietário do prédio referido em 1. não tinha licença administrativa para realização de obras de construção civil ou licenciamento para ações que impliquem a destruição do revestimento vegetal, alteração do relevo natural e das camadas de solo arável, de modo a permitir a deposição/descarga de solos e rochas provenientes da atividade comercial da sociedade recorrente.
6. A sociedade recorrente declarou em sede de IRC, relativamente ao exercício de 2008 um lucro tributável de €9.871,28.
7. Ao proceder à descarga dos resíduos de construção em local não licenciado para o efeito a sociedade recorrente não agiu com o cuidado a que estava obrigada por se encontrar a laborar e de que era capaz.
2.2. FACTOS NÃO PROVADOS
Não resultaram factos não provados
3. MOTIVAÇÃO
Relativamente à factualidade dada como provada de 1. a 6. assim a mesma resultou por não ter sido impugnada pelo recorrente.
Relativamente à demais factualidade, a mesma assim resultou por apelo a regras de experiência e normalidade de vida posto que, apesar de lhe ter sido solicitado o depósito de terras limpas naquele terreno pelo proprietário do mesmo, a verdade é que sendo a sociedade recorrente responsável por tais solos e rochas, a verdade é que lhe incumbe assegurar-se de que o pode fazer naquele local sob pena de não o fazendo, e atento o seu ramo de atividade, não atuar com os cuidados e diligência que se lhe impõe, atuando, pois, caso não se informe, de forma negligente, como sucedeu neste caso.
4. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Vem a recorrente acusada da prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 18º, nº 1 do DL 46/2008, de 12.03.
Posteriormente à data da alegada prática da contraordenação o referido diploma legal foi alterado pelo DL 73/2011, de 17.06, sem que, no entanto, as normas aplicáveis e relevantes para os autos alterem a posição da recorrente no sentido de ser de ponderar as normas concretamente mais favoráveis.
Assim, e nos termos da lei, aplica-se a lei vigente à data da prática dos factos.
De acordo com o disposto no artigo 3º, alínea a), do Decreto-Lei nº 178/2006, de 05.09, por “abandono” entende-se “a renúncia ao controlo de resíduo sem qualquer beneficiário determinado, impedindo a sua gestão”.
Por descarga, nos termos da alínea g) do mesmo preceito legal por descarga entende-se a operação de deposição de resíduos.
Finalmente nos termos da alínea x) do referido artigo 3º Resíduo de construção e demolição entende-se o resíduo proveniente de obras de construção, reconstrução, ampliação, alteração, conservação e demolição e da derrocada de edificações.
Nos termos do disposto no nº 3, do artigo 9º, é também proibida a descarga de resíduos em locais não licenciados para realização de operações de gestão de resíduos.
De acordo com o disposto no artigo 6º do DL 46/2008, de 12.03 1 — Os solos e as rochas que não contenham substâncias perigosas provenientes de atividades de construção devem ser reutilizados no trabalho de origem de construção, reconstrução, ampliação, alteração, reparação, conservação, reabilitação, limpeza e restauro, bem como em qualquer outro trabalho de origem que envolva processo construtivo, abreviadamente designado por obra de origem. 2 — Os solos e as rochas referidos no número anterior que não sejam reutilizados na respetiva obra de origem podem ser utilizados noutra obra sujeita a licenciamento ou comunicação prévia, na recuperação ambiental e paisagística de explorações mineiras e de pedreiras, na cobertura de aterros destinados a resíduos ou, ainda, em local licenciado pela câmara municipal, nos termos do artigo 1.º do Decreto -Lei n.º 139/89, de 28 de Abril.
Dispõe, finalmente o artigo 18º, nº 1 do DL 46/2008 que 1 — Constitui contra -ordenação ambiental muito grave o abandono e a descarga de RCD em local não licenciado ou autorizado para o efeito.
Ora, considerando as definições legais acabadas de transcrever, com facilidade se apreende que os solos e rochas, terras limpas, depositados pela sociedade recorrente são considerados, para efeitos legais, como resíduos de construção.
O aproveitamento de tais resíduos é possível, nos termos do disposto no artigo 6º do DL 46/2008 mas desde que o terreno onde os mesmos são depositados esteja licenciado para o efeito, o que não acontecia nos autos.
De acordo com a previsão do artigo 3º, nº1 do DL 46/2008, 1 — A gestão dos RCD é da responsabilidade de todos os intervenientes no seu ciclo de vida, desde o produto original até ao resíduo produzido, na medida da respetiva intervenção no mesmo, nos termos do disposto no presente decreto -lei.
Nesta conformidade, a verdade é que sendo tais resíduos suscetíveis de reaproveitamento a verdade é que apenas o podem ser em obra (como flui do artigo 7º do DL 46/2008) ou fora da obra mas desde que respeitados os requisitos previstos no artigo 6º citado.
Daqui resulta que sendo a gestão dos resíduos da responsabilidade do produtor, neste caso concreto, a verdade é que lhe incumbe averiguar sobre o terreno onde pretende depositar os resíduos, solos e rochas, decorrentes da sua atividade, em terreno devidamente licenciado, porque a si incumbe assegurar-se que aquele resíduo, que é de sua responsabilidade é tratado, gerido e encaminhado nos termos da lei.
Não o fazendo atua de forma negligente, por não atuar com os cuidados a que está obrigada em função da atividade exercida e de que é capaz, precisamente por decorrência dessa atividade exercida.
Mais estabelece o artigo 9º da Lei 50/2006, de 29.08, 1 - As contraordenações são puníveis a título de dolo ou de negligência. 2 - Salvo disposição expressa em contrário, as contraordenações ambientais são sempre puníveis a título de negligência (resultando a punibilidade da negligência neste caso do artigo 18º, nº 4 do DL 46/2008).
Não restam dúvidas ante a factualidade apurada, que a mesma se subsume à contra ordenação pela qual foi administrativamente acoimado, sendo portanto, de manter tal condenação.
4.1. MEDIDA DA COIMA
Nos termos conjugados do disposto no artigo 18º, nº 1 do DL 46/2008 e do artigo 22º, nº 4, alínea b) da Lei 50/2006, de 29.08, na redação da Lei 89/2009, de 31.08, a contraordenação praticada pelo recorrente é punida com coima € 38 500 a € 70 000 porque praticada por pessoa coletiva e imputada a título de conduta negligente.
Foi o recorrente condenado no valor mínimo da coima.
Estamos no entanto em crer que os factos provados apontam para a existência de circunstâncias anteriores e posteriores aos factos que diminuem acentuadamente a ilicitude do facto e a culpa do agente
Com efeito, não existe notícia da prática pelo recorrente de condutas anteriores similares sendo relevante essencialmente a natureza dos resíduos em causa que sendo efetivamente resíduos, precisamente por não terem perigosidade, podem, em determinadas condições, ser reutilizados.
Também não resulta dos autos a prática pela recorrente de outras contraordenações ambientais, tendo-se este comportamento por isolado e apesar de classificado pela lei como contraordenação muito grave, a verdade é que em termos comparativos não estamos num patamar muito elevado de ilicitude como se disse.
Assim, e nos termos do disposto no artigo 18º, nº 3 Regime Geral das Contraordenações, os limites mínimo e máximo da coima são reduzidos a metade, sendo então a moldura legal de € 19.250 a € 35.000.
De acordo com o disposto no artigo 20º do mesmo diploma legal A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contraordenação, da culpa do agente, da sua situação económica e dos benefícios obtidos com a prática do facto devendo, ainda, ser tomadas em conta a conduta anterior e posterior do agente e as exigências de prevenção.
A contraordenação praticada é, como já se deixou dito, classificada como muito grave e, nessa medida, não passível de substituição por admoestação (a admoestação encontra-se reservada para contraordenações leves ou simples como o impõe a lei e como resulta do bom senso e não para contraordenações que apesar de praticadas de forma negligente são classificadas como graves (vd. neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11.09.2012, relatado por Ana Barata Brito, disponível para consulta in www.dgsi.pt e Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, Contraordenações, Anotações ao Regime Geral, 4ª edição, 2007, Vislis Editores, pág. 392).
Considerando que não obstante muito grave, a culpa e a ilicitude se mostram acentuadamente atenuadas, não obstante as elevadíssimas necessidades de prevenção geral, as necessidades de prevenção especial não se afiguram ser de monta, e ainda tendo em conta as condições económicas do recorrente, entendemos ser de graduar a coima no mínimo resultante da atenuação especial ou seja € 19.250 (dezanove mil duzentos e cinquenta euros).
5. DECISÃO
Nestes termos e pelo exposto decide-se:
A. Condenar A…, LDA., pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 18º, nºs 1 e 4 do DL 46/2008, de 12 de Março e 22º, nº 4, alínea b) da Lei 50/2006, de 29.08, na redação da Lei 89/2009, de 31.08, na coima de € 19.250,00 (dezanove mil duzentos e cinquenta euros).
B. Condenar a recorrente nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) UC (artigo 8º, nº 7, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III Anexa).
Nos termos do disposto no artigo 75º da Lei 50/2006, de 29.08, na redação da Lei 89/2009, de 31.08, não é aplicável aos processos de contraordenação ambiental a proibição de reformatio in pejus.
Notifique e deposite.
Cumpra-se o disposto no artigo 70.º n.º 4 do Regime Geral das Contraordenações”.
3 -Apreciação do mérito do recurso.
a) Da impugnação da decisão fática.
O regime dos recursos de decisões proferidas em primeira instância, em processo de contraordenação, está definido nos artigos 73ºa 75ºdo Regime Geral das Contraordenações (doravante designado de RGCO), aprovado pelo Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, com as sucessivas alterações - pelo Decreto-Lei nº 356/89,de 17 de Outubro, pelo Decreto-Lei nº 244/95, de 14 de Setembro, pelo Decreto-Lei nº 323/2001, de 17 de Dezembro, e pela Lei nº 109/2001, de 24 de Dezembro -, mormente seguindo a tramitação dos recursos em processo penal - cfr. nº 4 do seu artigo 74º-, decorrente do princípio da subsidiariedade a que alude o seu artigo 41º.
No âmbito dos recursos em apreço, constituindo desvio ao princípio geral que as relações conhecem de facto e de direito - cfr. artigo 428º do Código de Processo Penal -, apenas se conhece, em regra, da matéria de direito, sem prejuízo de alteração da decisão do tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido da decisão recorrida ou de anulação e devolução do processo ao mesmo tribunal, conforme preceituado no artigo 75º do RGCO.
Na verdade, dispõe o nº 1 de tal artigo 75º do RGCO, que, “se o contrário não resultar deste diploma, a 2ª instância apenas conhecerá da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões”.
Ou seja, face aos poderes conferidos pelo artigo 75º, nº 1, do RGCO, nos processos de contra-ordenação, como é o caso destes autos, o Tribunal da Relação (a segunda instância) apenas conhece da matéria de direito, funcionando como tribunal de revista, perante os factos que foram apurados em primeira instância.
Por outras palavras: os factos que ficaram assentes na sentença proferida em primeira instância têm de considerar-se fixados, salvo se do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, resultar a ocorrência de algum dos vícios a que alude o artigo 410º, nº 2, do C. P. Penal.
Como bem se escreve, a este propósito, no Ac. do T.R.P. de 18-05-2005 (inwww.trp.pt), “o Tribunal da Relação, em regra e no âmbito dos recursos de contra-ordenação, apenas conhece de direito. Constituem excepções a esta regra as que constam do art.º 410º, nº 2, do C.P.P.: A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; e o erro notório na apreciação da prova. Tais vícios da matéria de facto têm de resultar do texto da decisão recorrida e sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, não sendo admissível, designadamente, o recurso a declarações ou depoimentos exarados no processo, e não podendo basear-se em documentos juntos ao processo”.
Ora, à luz do que fica exposto, verificamos, no caso destes autos:
- A decisão que foi proferida em matéria de facto pelo tribunal a quo é inalterável.
- O vício do “erro notório na apreciação da prova” não é configurável nos termos que estão invocadospela recorrente. Com efeito, aquilo que a recorrente alega são, na sua opinião, vicissitudes quanto à apreciação da prova efetuada pelo tribunal a quo, concluindo a recorrente que mal andou tal tribunalno tocante à decisão fática proferida (sobretudo ao considerar que os resíduos em causa não são “terras limpas”).
- Analisada a matéria de facto dada como assente na sentença revidenda, nem sequer é compreensível (com o devido respeito) a alegação da recorrente neste ponto (impugnação da decisão fáctica). Na verdade, na sentença sub judice, tal como é pretendido na motivação do recurso, ficou provado (tão-só) que a recorrente procedeu à descarga de cerca de 10 m3 de resíduos inertes compostos por solos e rochas (terras limpas), junto de outros montes com as mesmas características, dispostos numa fileira horizontal de modo a facilitar o seu posterior espalhamento e terraplanagem (facto nº 1), estando em causa terras de escavação provenientes de uma obra de reposição/reparação de canalizações de gás natural da rede pública que a sociedade recorrente se encontrava a realizar na localidade de Castanheira do Ribatejo, Vila Franca de Xira (facto nº 3), e sendo que a recorrente tinha autorização do proprietário do prédio para ali depositar todas as terras limpas provenientes da sua atividade com vista a futura terraplanagem do terreno para ser usado para edificação (facto nº 4).
Ou seja: ficou assente na sentença recorrida que foram depositadas “terras limpas” (solos e rochas), das quais, obviamente, não emerge, direta ou indiretamente, qualquer perigo para o cidadão comum ou para a saúde pública.
Perante tal constatação, e com o devido respeito, carece totalmente de sentido o que, nesta vertente, está alegado na motivação do recurso.
Em resumo: a discussão sobre a decisão fáctica, tal como nos é trazida pela recorrente, não só não é aqui possível (pois que, por um lado, no âmbito do presente recurso apenas se pode conhecer da matéria de direito - artigo 75º, nº 1, do RGCO -, e, por outro lado, não se configura a ocorrência de algum dos vícios prevenidos no artigo 410º, nº 2, do C. P. Penal, nomeadamente o invocado “erro notório na apreciação da prova”), como também é totalmente inócua (e até incompreensível), já que, conforme alega e pretende a recorrente, o que ficou provado na sentença revidenda foi apenas o depósito de “terras limpas”.
Termos em que é de improceder, manifestamente, esta primeira vertente do recurso.
b) Da qualificação jurídica dos factos.
Alega a recorrente, em breve síntese, que, estando em causa “terras limpas” (provenientes de um trabalho de escavação para canalização de gás natural, ou seja, terras nunca antes removidas, terras puras, terras sem contaminação), as mesmas não podem ser consideradas “resíduos de construção”, nem o seu depósito num terreno agrícola (com autorização do respetivo proprietário) pode ser configurado como um “abandono”.
Assim, tais “terras limpas” não estão sujeitas a operações de gestão, nem é aplicável às mesmas a legislação ao abrigo da qual a recorrente se mostra condenada.
Há que decidir.
O que ficou provado pode resumir-se do seguinte modo:
- A recorrente descarregou, num prédio rústico, resíduos inertes compostos por solos e rochas.
- Trata-se de “terras limpas”, provenientes de uma escavação levada a efeito no âmbito da canalização de gás natural da rede pública.
- A recorrente descarregou essas “terras limpas” com autorização do proprietário do prédio (com vista à futura terraplanagem do terreno para ser usado para edificação).
- O proprietário do prédio não tinha qualquer licenciamento para realização de obras no local, nomeadamente para ações que impliquem destruição do revestimento vegetal, alteração do relevo natural e/ou das camadas de solo arável.
- A recorrente procedeu, pois, à descarga das “terras limpas” em causa num local que não tinha qualquer licenciamento para o efeito.
Assim resumidos os factos, cumpre analisar a legislação aplicável, de modo a podermos concluir se a recorrente praticou uma contraordenação (como decidido na sentença sub judice), ou se, pelo contrário, a conduta da recorrente não possui qualquer relevo contraordenacional (como se entende na motivação do recurso).
A recorrente vem condenada pela prática de uma contraordenação p. e p. pelo artigo 18º, nºs 1 e 4, do D.L. nº 46/2008, de 12/03 (posteriormente à data da prática da contraordenação em causa, tal diploma legal foi alterado pelo D.L. nº 73/2011, de 17/06, verificando-se, no entanto, que as normas com relevo no caso dos autos não são mais favoráveis à recorrente, pelo que, e tal nem sequer é discutido na motivação do recurso, será aplicável a lei vigente à data da prática dos factos).
Dispõe o referido artigo 18º, nº 1, do D.L. nº 46/2008, de 12/03, que “constitui contraordenação ambiental muito grave o abandono e a descarga de RCD em local não licenciado ou autorizado para o efeito”.
Por sua vez, estabelece o artigo 9º da Lei nº 50/2006, de 29/08:
“1 - As contraordenações são puníveis a título de dolo ou de negligência.
2 - Salvo disposição expressa em contrário, as contraordenações ambientais são sempre puníveis a título de negligência” (resultando até a punibilidade da negligência, no caso destes autos, do disposto no artigo 18º, nº 4, do citado D.L. nº 46/2008, de 12/03).
A definição do que constituem resíduos de construção e demolição (RCD) resulta do disposto no artigo 3º do D.L. nº 178/2006, de 05/09: são resíduos provenientes de obras de construção, reconstrução, ampliação, alteração, conservação e demolição e da derrocada de edificações.
Assim, neles se incluem tijolos, blocos cerâmicos, betão em geral, solos, rochas, metais, resinas, colas, tintas, madeiras, argamassa, gesso, telhas, pavimento asfáltico, vidros, plásticos, tubagens, fios elétricos, etc..
Como resultam dos desperdícios provenientes de obras, apresentam uma composição muito diversificada e heterogénea, pois podem ser constituídos por qualquer um dos materiais que fazem parte de um edifício ou de uma infraestrutura, e ainda por restos de embalagens e outros materiais utilizados durante a realização de uma obra.
A esta luz, dificilmente as “terras limpas” em questão nestes autos podem ser subsumidas à definição legal de resíduos de construção e demolição (RCD).
Na verdade, o que está aqui em causa são terras provenientes de uma escavação (para canalização de gás natural), ou seja, são solos puros (melhor: solos e rochas naturais, sem misturas anteriores e sem restos de obra).
Trata-se, em suma, de solos e rochas sem substâncias perigosas, provenientes de uma escavação levada a efeito num outro local.
Preceitua o artigo 6º do D.L. nº 46/2008, de 12/03:
“1 - Os solos e as rochas que não contenham substâncias perigosas provenientes de atividades de construção devem ser reutilizados no trabalho de origem de construção, reconstrução, ampliação, alteração, reparação, conservação, reabilitação, limpeza e restauro, bem como em qualquer outro trabalho de origem que envolva processo construtivo, abreviadamente designado por obra de origem.
2 - Os solos e as rochas referidos no número anterior que não sejam reutilizados na respetiva obra de origem podem ser utilizados noutra obra sujeita a licenciamento ou comunicação prévia, na recuperação ambiental e paisagística de explorações mineiras e de pedreiras, na cobertura de aterros destinados a resíduos ou, ainda, em local licenciado pela câmara municipal, nos termos do artigo 1º do Decreto -Lei nº 139/89, de 28 de Abril”.
Ora, as “terras limpas” em discussão nestes autos (solos e rochas provenientes de uma escavação em outro local) foram depositados pela recorrente num prédio rústico (num terreno ocupado essencialmente por estrado herbáceo e arbustivo), não licenciado para o efeito, pelo que de forma ilegal.
É certo que tais “terras limpas” podem ser aproveitadas, nos termos do disposto no artigo 6º do D.L. nº 46/2008, de 12/03, mas desde que o terreno onde forem depositadas esteja licenciado para esse efeito, o que não acontece no caso destes autos.
A autorização do proprietário do terreno para o depósito de tais “terras limpas” é, assim, totalmente inócua.
Tais “terras limpas” podem ser aproveitadas em obra ou fora de obra, mas, neste último caso, desde que respeitados os pressupostos enunciados no transcrito artigo 6º do D.L. nº 46/2008, de 12/03.
Incumbia, pois, à recorrente averiguar se o proprietário do terreno onde a mesma depositou as “terras limpas” em questão possuía ou não licença para esse efeito.
Isto é: a recorrente (“produtora” das “terras limpas” em causa) só as podia depositar nos termos em que o fez se, previamente, se tivesse assegurado que o terreno estava devidamente licenciado para o efeito.
Não o tendo feito, como podia e devia, atuou com falta de cuidado (cuidado esse a que estava obrigada e de que era capaz), ou seja, atuou de forma negligente (como decidido, e muito bem, na sentença revidenda).
Em conclusão: a factualidade apurada subsume-se à contraordenação pela qual a recorrente foi administrativamente acoimada (e pela qual se mostra também condenada pelo tribunal a quo).
Nos termos expostos, improcede toda esta segunda vertente do recurso.
c) Da aplicação da pena de admoestação.
Consta da decisão recorrida: “nos termos conjugados do disposto no artigo 18º, nº 1 do DL 46/2008 e do artigo 22º, nº 4, alínea b) da Lei 50/2006, de 29.08, na redação da Lei 89/2009, de 31.08, a contraordenação praticada pela recorrente é punida com coima € 38 500 a € 70 000 porque praticada por pessoa coletiva e imputada a título de conduta negligente. Foi a recorrente condenada no valor mínimo da coima. Estamos no entanto em crer que os factos provados apontam para a existência de circunstâncias anteriores e posteriores aos factos que diminuem acentuadamente a ilicitude do facto e a culpa do agente. Com efeito, não existe notícia da prática pelo recorrente de condutas anteriores similares sendo relevante essencialmente a natureza dos resíduos em causa que, sendo efetivamente resíduos, precisamente por não terem perigosidade, podem, em determinadas condições, ser reutilizados. Também não resulta dos autos a prática pela recorrente de outras contraordenações ambientais, tendo-se este comportamento por isolado e apesar de classificado pela lei como contraordenação muito grave, a verdade é que em termos comparativos não estamos num patamar muito elevado de ilicitude como se disse. Assim, e nos termos do disposto no artigo 18º, nº 3 Regime Geral das Contraordenações, os limites mínimo e máximo da coima são reduzidos a metade, sendo então a moldura legal de € 19.250 a € 35.000”.
O tribunal a quo entendeu, pois, aplicar uma coima no mínimo resultante da atenuação especial da punição (€ 19.250).
Ou seja, e a recorrente nem sequer questiona directamente esse ponto na motivação do seu recurso: a coima aplicada pelo tribunal recorrido foi fixada no seu limite mínimo, e limite esse decorrente de uma atenuação especial da punição (artigo 18º, nº 3, do RGCO).
Do ponto de vista dos interesses da ora recorrente, a coima não podia ser mais adequadamente doseada: foi estabelecida no seu limite mínimo (havendo lugar a uma “atenuação especial da punição”).
Pugna a recorrente pela aplicação de uma admoestação.
No tocante à pretendida admoestação, e com o devido respeito pela pretensão da recorrente, a sua aplicação in casu carece, em absoluto, de qualquer pertinência e de fundamento legal.
Com efeito, estabelece o artigo 51º, nº 1, do RGCO, que, “quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação”.
A nosso ver, não é esta a situação da infracção em análise nos autos.
No caso dos autos ficou provado que a ora recorrente procedeu ao depósito de terras (rochas e solos), num prédio rústico (num terreno ocupado essencialmente por estrado herbáceo e arbustivo), sem cuidar de saber se o proprietário desse prédio possuía ou não licença para o efeito (licenciamento esse que, como é óbvio, tem como escopo principal a proteção do ambiente).
Ora, perante tais factos, não se pode considerar, com o devido respeito pela opinião contrária, que a infração praticada pela ora recorrente seja de “reduzida gravidade”.
Conforme muito bem escreve Sérgio Passos (in “Contra-Ordenações”, Almedina, 2ª edição, 2006, pág. 365), “a admoestação só será de aplicar às infrações qualificadas como leves ou simples, em que o grau de culpa seja reduzido”.
Não é esse o caso posto nestes autos, já que, manifestamente, não está aqui em discussão a prática de qualquer infração que possa ser qualificada como leve ou simples.
Como bem se assinala na sentença revidenda, “a contraordenação praticada é, como já se deixou dito, classificada como muito grave e, nessa medida, não passível de substituição por admoestação (a admoestação encontra-se reservada para contraordenações leves ou simples, como o impõe a lei e como resulta do bom senso, e não para contraordenações que, apesar de praticadas de forma negligente, são classificadas como graves)”.
Em face do exposto, considera-se que não estão verificados os pressupostos da admoestação previstos no artigo 51º, nº 1, do D.L. nº 433/82, de 27 de Outubro (RGCO).
Atento tudo o que fica dito, também nesta parte (aplicação de admoestação) nenhuma censura merece a decisão da primeira instância.
Improcede, assim, na sua totalidade, o presente recurso.
III - DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça de 4 (quatro) UCs..
* Texto processado e integralmente revisto pelo relator.
Évora, 30 de Setembro de 2014.
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(João Manuel Monteiro Amaro)
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(Maria Filomena de Paula Soares)