MOTIVO FÚTIL
Sumário

1 - O conceito de “motivo fútil” assenta numa ideia de desproporcionalidade flagrante entre a conduta da vítima e a atitude do agente, que choca frontalmente com o sentimento comunitário de justiça, com os padrões éticos geralmente aceites na comunidade.
2 - Não será motivo fútil a ausência (ou o desconhecimento) da motivação do agente.

Texto Integral





Recurso n.º 320/13.4GCBNV.E1

Acordam, em Conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.
Nos autos de Processo Comum Colectivo, com o n.º 320/13.4 GCBNV, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de B, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido:
ACC, solteiro, vendedor ambulante, nascido em 02/05/1968, natural de Vila …, actualmente preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de Lisboa;
Imputando-lhe a prática, em autoria material e concurso real, de um crime de homicídio qualificado na forma consumada, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 1 e 2, al. e), do Código Penal e um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, al. c) e n.º 2, da Lei das Armas e suas munições.

APSP, por si e em representação do filho menor MAPP, AMPC, MDPCe IMPC, companheira e filhos do falecido SCCB, requereram a sua intervenção na qualidade de assistentes nestes autos, a qual foi admitida quanto a AMPC, MDPC, IMPCe MAPP.

APSP, por si e em representação do filho menor MAPP, AMPC, MDPCe IMPC, companheira e filhos do falecido SCCBdeduziram pedido de indemnização civil contra o arguido, peticionando a condenação do mesmo no pagamento de uma indemnização de € 250.000,00 à companheira do falecido, 150.000,00 ao filho menor do falecido e de € 100.000,00 a cada uma das outras filhas do falecido, tudo a título de danos morais pela perda do companheiro e pai, respectivamente, acrescidas tais quantias de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, alegando, para o efeito, que foi a conduta do arguido que exclusivamente determinou a morte de SCCB, que originou danos indemnizáveis.

O arguido ACC requereu a abertura de instrução pugnando pela desqualificação do crime de homicídio que lhe é imputado. O arguido suscitou, ainda, a nulidade das intercepções telefónicas constantes dos autos por requeridas a pessoa diferente do na altura suspeito.
Por inadmissibilidade legal foi rejeitado o requerimento de abertura de instrução.

O arguido apresentou contestação e indicou testemunhas abonatórias.

Realizou-se a audiência de julgamento com observância das formalidades legais, vindo-se, no seu seguimento, a prolatar pertinente Acórdão, onde se Decidiu:
1. Condenar o arguido ACC, pela prática, em autoria material e concurso efectivo ideal, de:
a) Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts. 131.º e 132.º, n.º 1 e 2, al. e), do Cód. Penal, na pena de 17 (dezassete) anos de prisão;
b) Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. c) e 2, da Lei n.º 5/2006, de 23.02, na redacção introduzida pela Lei n.º 12/2011, de 27.04, na pena de 2 (dois) anos de prisão;
c) Em cúmulo jurídico das referidas penas de prisão parcelares, condenar o arguido na pena única, na pena de 18 (dezoito) anos de prisão.
2. Julgar parcialmente procedente, porque provado apenas em parte, o pedido de indemnização civil formulado pelos demandantes APSP, por si e em representação do filho menor MAPP, AMPC, MDPCe IMPC e, em consequência, condenam o demandado ACC, a pagar:
i) Aos demandantes, a quantia total de € 70.000,00 (setenta mil euros), a título de danos não patrimoniais por dano morte pela perca do direito à vida de SCCB, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal a contar da data do presente acórdão, cabendo € 14.000,00 (catorze mil euros) a cada um dos demandantes;
ii) À demandante APSP, a quantia de € 40.000,00 (quarenta mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos por esta demandante, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal a contar da data do presente acórdão;
iii) Ao demandante MAPP, representado pela sua mãe, a quantia de € 35.000,00 (trinta e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos por este demandante, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal a contar da data do presente acórdão;
iv) À demandante AMPC, a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos por esta demandante, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal a contar da data do presente acórdão;
v) À demandante MDPC, a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos por esta demandante, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal a contar da data do presente acórdão;
vi) À demandante IMPC, a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos por esta demandante, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal a contar da data do presente acórdão;
3. Declarar perdidos a favor do Estado as bens apreendidos nos autos, de harmonia com o disposto no art. 109.º, n.º 1, do C.P., sendo que a espingarda caçadeira deve ser posteriormente entregues ao Comando Distrital da PSP e os demais serão destruídos.

Inconformado com o assim decidido traz o arguido ACC o presente recurso, onde formula as seguintes conclusões:

O Ministério Público, aquando da acusação e relativamente às escutas telefónicas, indica como prova “suportes digitais juntos aos autos e relatórios de fls. 328, 329, 331, 332, 358-360, 372, 375 e 377”.
O Ministério Público não indicou como prova as transcrições das conversações telefónicas que quis ver valoradas como meio de prova. E nem o poderia fazer pela simples razão de que não mandou transcrever essas conversações ao órgão de polícia criminal que efectuou a respectiva intercepção e gravação.
O Ministério Público não mandou transcrever ao órgão de polícia criminal que realizou a respectiva intercepção e gravação as conversações telefónicas interceptadas.

Não consta dos autos qualquer transcrição de conversações telefónicas interceptadas, apenas constando os respectivos suportes digitais e resumos constantes de relatórios elaborados pela Policia Judiciária.
O Acórdão recorrido, aquando da sua motivação da decisão de facto, valora vários autos de intercepção de comunicações (nomeadamente os de fls. 73, 74, 106, 108, 121, 122, 149, 206 a 211, 259 e 260, 279 a 282, 338 a 343, 354 e 355, 357 a 362), autos de audição de intercepção telefónica (nomeadamente os de fls. 84 e 85, 107, 109, 148, 157, 158, 184 e 213), autos intercalares de intercepção e gravação de conversações ou comunicações (nomeadamente os de fls. 325 a 332), autos de fim de intercepção telefónica (nomeadamente de fls. 262 a 267, 361 a 377, 382 e 383).
Fundamenta o Acórdão recorrido a decisão proferida no teor das conversações interceptadas constantes dos suportes digitais e relatórios que acompanham os autos intercalares de intercepção e gravação de conversações ou comunicações, fazendo referência expressa a inúmeras conversas concretas interceptadas.
Atento o disposto no artigo 190º, do Código de Processo Penal, a prova constituída por quaisquer conversações telefónicas constantes dos autos, bem como daí resultante, é nula, nulidade esta que aqui, para todos os devidos e legais efeitos, se argui, devendo ser, consequentemente, expressamente declarada, não podendo, por isso, ser valorada tal como foi pelo Acórdão recorrido.
Temos, consequentemente, que o Acórdão recorrido fundamenta a decisão proferida, entre o mais, em prova nula, violando frontalmente a alínea a), do n.º 9, do artigo 188º, do Código de Processo Penal, estando, por isso, ele próprio ferido de nulidade, o que aqui, para todos os devidos e legais efeitos, expressamente se argúi.
É manifesta a influência que o teor das conversas interceptadas teve na produção de prova durante todo o julgamento, condicionando manifestamente quer o Tribunal a quo (e daí a sua valoração para fundamentar a decisão de facto), quer para o arguido ora recorrente, quer mesmo para as testemunhas de acusação, nomeadamente o sogro do arguido, Sr. JME.
10ª
Na esteira da chamada Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, a referida nulidade projectou-se à distância, abrangendo as outras provas ulteriormente produzidas, nomeadamente em audiência de discussão e julgamento.
11ª
Nesse sentido, a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, incluindo a testemunhal, não poderá ser valorada, devendo os factos constantes da acusação e dados como provados pelo Acórdão recorrido ser dados como não provados, com todas as devidas e legais consequências.
12ª
Mesmo que assim não se entenda, sempre se deverá considerar que, tendo a referida prova sido produzida em julgamento (tal como foi), atento o disposto no artigo 122º, n.º 1, do Código de Processo Penal, este deverá ser tido por inválido, devendo ser, consequentemente, integralmente repetido, o que aqui, para todos os devidos e legais efeitos, igualmente se requer.
13ª
Resulta do próprio texto da decisão recorrida que o Acórdão incorre no vício de contradição insanável da fundamentação e entre a fundamentação e a decisão relativa aos pontos da matéria de facto acima assinalados em 9. e 10. da motivação do presente recurso.
14ª
A assim ser, violou o Acórdão recorrido o disposto na alínea b), do n.º 2, do artigo 410º, do Código de Processo Penal, o que aqui, expressamente e para todos os devidos e legais efeitos, se invoca.
15ª
Consequentemente, nos termos do disposto no artigo 426º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e porque, para além de se tratar de matéria fundamental para a boa decisão da causa, de outra forma não é possível decidir da causa, deverá o Tribunal ad quem determinar o reenvio do processo para novo julgamento relativamente à totalidade do objecto do processo, o que expressamente se requer.

Ainda que assim não se entenda, subsidiariamente.
16ª
Salvo o devido e merecido respeito por entendimento diverso, entendemos que o Tribunal a quo incorreu no erro político-criminal grosseiro de arvorar o homicídio qualificado em forma-regra do homicídio doloso.
17ª
O arguido ora recorrente reagiu no âmbito de uma violenta discussão, precedida de uma primeira discussão em local diferente tendo sido perseguido pela vítima.
18ª
Actuou o arguido ora recorrente por temer sofrer agressões que o ferissem gravemente ou o fizessem mesmo perder a vida, dada até a diferença de complexão física entre si e a vitima, justificando-se tal receio, e fazendo nossas as palavras do Acórdão recorrido, pelas “desavenças familiares motivadas por casas, invejas, ciúmes, assaltos, traições que estas famílias foram construindo”.
19ª
Pelo exposto, somos do entendimento que não actuou o arguido ora recorrente determinado por qualquer motivo torpe ou fútil, não se encontrando, por isso, preenchida a agravante da alínea e), do n.º 2, do artigo 132º, do Código Penal.
20ª
Por isso, a ser condenado, deverá o arguido sê-lo pela prática do tipo legal de crime do artigo 131º, do Código Penal (homicídio simples).
21ª
Pelo exposto, sempre deverá ser operada a convolação do tipo legal de crime do artigo 132°, nºs 1 e 2, alínea e), do Código Penal, para o tipo legal de crime do artigo 131º, do mesmo diploma legal, com todas as devidas e legais consequências, mormente a de ser aplicada ao arguido pena de prisão não superior a 11 anos.
22ª
Sem prescindir ou de alguma forma conceder, sempre se considerará ter o Acórdão recorrido violado os artigos 40° e 71° do Código Penal. Atentas todas as circunstâncias discriminadas na motivação, e favoráveis ao arguido, e no que ao crime de homicídio qualificado concerne, deveria ter sido fixada pena parcelar substancialmente inferior, tangencial ao limite mínimo previsto por lei, não excedendo esta os treze (13) anos de prisão.
23ª
Consequentemente, a pena única aplicada ao arguido em sede de cúmulo Jurídico jamais deverá exceder os catorze (14) anos de prisão, sendo esta perfeitamente justa, adequada e proporcional.
24ª
Violados foram assim os critérios dosimétricos do artigo 71° do Código de Processo Penal, bem como os princípios da adequação e da proporcionalidade.

Termos em que, deve o presente Recurso ser considerado provido nos termos enunciados nas conclusões, como é de Direito e Justiça!

Respondeu ao recurso a Sra. Magistrada do Ministério Público, dizendo:
1. O arguido/recorrente ACC foi condenado, por Acórdão datado de 28 de Julho de 2014, proferido no âmbito dos presentes autos, em autoria material e concurso efectivo ideal, de:
a) Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts.º 131.º e 132.º, nsº 1 e 2, al. e) do Código Penal, na pena de 17 (dezassete) anos de prisão;
b) Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, nsº 1, al. c) e 2 da Lei nº 5/2006, de 23.02, na redacção introduzida pela Lei nº 12/2011, de 27.04, na pena de 2 (dois) anos de prisão;
c) Em cúmulo jurídico das referidas penas parcelares, na pena única de 18 (dezoito) anos de prisão;
2. Compulsados os autos constata-se que não foram ordenadas e realizadas as transcrições das conversações objecto de escutas telefónicas;
3. A violação do preceituado no n.º 7 do artigo 188.º do Código de Processo Penal, acarreta a nulidade da prova obtida por seu intermédio conforme decorre do disposto nos arts.º 190.º e 126.º, n.º 3, do Código de Processo Penal;
4. Esta norma constitui afloramento do chamado “efeito à distância”. Isto é, quando se indaga da comunicabilidade ou não da proibição de valoração aos meios secundários de prova tornados possíveis à custa dos meios ou métodos proibidos de prova» – ou seja, da transmissão da proibição de valoração do método proibido de obtenção de prova a todos os meios de prova que através dele são obtidos;
5. No presente caso, a convicção do Tribunal quanto a matéria de facto provada assentou nas declarações do arguido, conjugadas com o depoimento das testemunhas que depuseram em audiência, bem como com a prova documental e pericial junta aos autos;
6. No que respeita ao depoimento do arguido, que admitiu ter sido ele que efectuou os disparos, mas alegando que o fez em legitima defesa, a convicção do tribunal baseou-se na falta de credibilidade da versão por si apresentada, tendo entrado frequentemente em contradição;
7. Porém, o depoimento do sogro do arguido, JME foi considerado pelo Tribunal como sendo “claro, isento e absolutamente credível”;
8. O mesmo sucedendo com o depoimentos das testemunhas APP, companheira da vítima, PD que se encontrava no parque de estacionamento no momento em que os factos ocorreram, JF, inspector da Policia Judiciária que investigou o caso juntamente com uma colega e que procedeu ao exame ao local e á vitima, AG, Guarda da GNR e primeira pessoa a chegar ao local e BC, esposa do arguido;
9. Daqui resulta que a convicção do tribunal se fundamentou no depoimento das testemunhas e da prova documental junta aos autos, designadamente, como já foi referido, em fotos que mostram o local onde se encontrava o carro do falecido e o do sogro do arguido, Declaração de óbito, Termo de entrega de cadáver, Participação de óbito, Autos de Apreensão, Relatório de inspecção judiciária, Informações e ofícios juntos aos autos, Remessa de amostras biológicas, Relatório de exame pericial, Relatório de autópsia médico-legal, Relatórios de exame pericial;
10. Diligências estas que, em sede de inquérito, nada tiveram a ver com o conteúdo das escutas telefónicas efectuadas;
11. Assim sendo, a prova em que o Tribunal “a quo” fundamentou a decisão recorrida não se encontra afectada pela declaração de nulidade das escutas telefónicas ordenadas, por não transcritas;
12. Podendo e devendo, por isso, ser utilizada;
13. Pelo que tal declaração de nulidade não tem consequências, quer nos factos dados como provados, quer na decisão recorrida;
14. Qualquer dos vícios tipificados no nº 2 do art. 410.º do Código de Processo Penal terá de ser inferido do próprio texto da sentença, por si ou conjugado com as regras de experiência comum, não podendo ser tomados em consideração elementos exteriores, nomeadamente, meios de prova cujo conteúdo não esteja de alguma forma reflectido no texto da decisão;
15. Por seu lado, o art. 426.º, nº 1 do Código de Processo Penal estatui:
“Sempre que, por existirem os vícios referidos nas alíneas do nº 2 do artigo 410.º, não for possível decidir da causa, o tribunal de recurso determina o reenvio do processo para novo julgamento relativamente à totalidade do objecto do processo ou a questões concretamente identificadas na decisão de reenvio”;
16. Desde logo diga-se não se verificar, no Acórdão recorrido, qualquer contradição entre a fundamentação e a decisão;
17. Efectivamente, o Tribunal recorrido condenou o arguido/recorrente pela prática de um crime de homicídio qualificado e de um crime de detenção de arma proibida;
18. Tendo sido dados como provados os factos já supra mencionados, que aqui se dão por reproduzidos, a decorrência lógica dos mesmos é concluir pela prática dos crimes em causa. Não se verificando qualquer oposição lógica entre a prova e a decisão;
19. Não se verificando, igualmente, contradição na fundamentação;
20. De facto, não obstante o Tribunal recorrido ter dado como provado que “No decurso da discussão mantida com SCCB, o arguido empunhou a referida arma e, quando se encontrava a cerca de um metro de distância de SCCB, desferiu quatro disparos na direcção deste, atingindo-o na zona esquerda do tórax, região dorsal esquerda, pulso direito e junto ao nariz (facto d) da matéria de facto dada como provada” e na motivação probatória ter considerado que “O único motivo que levou a que o arguido praticasse os factos foi uma discussão familiar que tinha ocorrido momentos antes num outro local”, “…a discussão foi entre as mulheres dos dois casais”, “…execução por parte do arguido que se aproximou do ofendido quando este nem sequer tinha acabado de sair do carro…”, tais factos não se excluem mutuamente;
21. Não se tratando de uma contradição insanável;
22. Mas apenas de um manifesto “lapso”;
23. Sendo que tal “lapso” pode ser corrigido pelo Tribunal da Relação;
24. Pelo que o Acórdão recorrido não violou o disposto no art.º 410.º, nº 2, al. b) do Código Penal;
25. O crime de homicídio é qualificado quando a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, sendo susceptível de o revelarem quando se verifique algumas das situações previstas no nº 2 do art.º 132.º do Código Penal;
26. Como ensina Figueiredo Dias (Prof. Eduardo Correia, autor do Projecto, expressa in Direito Criminal, II, 1965, págs. 301/3) a especial censurabilidade verifica-se quando circunstâncias "são de tal modo graves que reflectem uma atitude profundamente distanciada do agente em relação a uma determinação normal de acordo com os valores. Nesta medida, pode afirmar-se que a especial censurabilidade se refere às componentes da culpa relativas ao facto, ou seja, funda-se naquelas circunstâncias que podem revelar um maior grau de culpa como consequência de um maior grau de ilicitude;
27. In casu verifica-se que foi imputada ao arguido a circunstância prevista na alínea e) do nº 2 do art.º 132.º, a qual se refere a ser o agente determinado por “…motivo torpe ou fútil”;
28. O Prof. Figueiredo Dias (“Comentário Conimbricense…”, I, 32) define o motivo torpe ou fútil como aquele que, “avaliado segundo as concepções éticas e morais ancoradas na comunidade, deve ser considerado pesadamente repugnante, baixo ou gratuito”;
29. Para aferir da futilidade do motivo deve ter-se em conta a desproporção entre a conduta da vítima e a reacção do agente e a responsabilidade deste pela situação criada;
30. De acordo com a motivação expressa no Acórdão em causa, estiveram na base da convicção do Tribunal recorrido, o facto de o arguido ter agido na sequência de desavenças familiares por as suas famílias não aceitarem o respectivo modo de vida. Sendo que o único motivo que levou a que o arguido praticasse os factos foi uma discussão familiar que tinha ocorrido momentos antes num outro local e mesmo assim o arguido muniu-se da arma e efectuou 4 disparos a curta distância que atingiram mortalmente a vítima. Na realidade, não se está perante uma discussão relevante que alterasse psicologicamente o arguido a ponto de o motivar à prática dos factos tanto mais que a discussão foi entre as mulheres dos dois casais. Deste modo, o motivo pelo qual o arguido actuou tem de se considerar fútil por irrelevante;
31. Assim a conduta do arguido é subsumível na alínea e) do artigo 132.º do Código Penal, devendo ser punido pelo crime de homicídio qualificado, tal como foi;
32. Pelo que não se verificou qualquer violação dos arts.º 131.º e 132.º, ns.º 1 e 2, al. e) do Código Penal;
33. O crime de homicídio qualificado é abstractamente punível com pena de prisão de 12 a 25 anos;
34. O nº 1 do art.º 40.º do Código Penal estabelece como finalidades da aplicação das penas a protecção de bens jurídicos, que se reconduz, essencialmente, à prevenção geral e especial da prática de crimes, e a reintegração do agente na sociedade, dispondo o nº 2 do mesmo artigo que a pena não pode exceder a medida da culpa.
35. O art.º 71.º do mesmo diploma legal, sob a epígrafe «Determinação da medida da pena», estatui:
1 – A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos pela lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
2 – Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do arguido ou contra ele, considerando, nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
3 – Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da penal;
36. Os termos da punição do concurso de crimes são definidos pelo art.º 77.º do Código Penal:
1 – Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
2 – A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
37. A sentença recorrida fundamentou a escolha e a determinação da medida das penas, parcelares e única, em que o arguido foi condenado;
38. E ponderando todos os factores ali mencionados, entendeu o Tribunal recorrido por adequada a aplicar ao arguido a pena de prisão de 17 (dezassete) anos;
39. Pena esta que se mostra equilibrada e justa, não merecendo censura;

Assim, deve o Acórdão recorrido ser confirmado.

Nesta Instância, a Sra. Procuradora Geral-Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Em sede de decisão recorrida foram considerados os seguintes Factos:
Factos provados

Da acusação:
a) No dia 16 de Junho de 2013, ao final da manhã, o arguido deslocou-se ao Supermercado “Modelo”, no PA, juntamente com a sua companheira;
b) Nesse mesmo local, estava também SCCB, seu primo e de etnia cigana, tal como o arguido, e acompanhado da respectiva companheira;
c) Iniciou-se uma discussão entre as mulheres dos dois casais no interior do supermercado e de modo não concretamente apurado a mulher do arguido saiu do estabelecimento e o casal saiu do local;
d) Alguns minutos depois, cerca das 13 horas desse mesmo dia, no exterior do supermercado “Pingo Doce”, na zona do respectivo parque de estacionamento o arguido, acompanhado da esposa e uma filha, e SCCB voltaram a encontrar-se;
e) O arguido fazia-se acompanhar de uma pistola de calibre 6,35 mm, de sua propriedade, e que havia obtido em data e condições não apuradas, e que se encontrava municiada e pronta a disparar;
f) O arguido não é titular de qualquer licença de uso e porte de arma nomeadamente para a arma de que se fazia acompanhar;
g) No decurso da discussão mantida com SCCB, o arguido empunhou a referida arma e, quando se encontrava a cerca de um metro de distância de SCCB, desferiu quatro disparos na direcção deste, atingindo-o na zona esquerda do tórax, região dorsal esquerda, pulso direito e junto ao nariz;
h) Tais ferimentos constituíram causa directa e necessária da morte imediata de SCCB;
i) O arguido conhecia as características da arma que decidiu manter na sua posse, bem sabendo que tal detenção não lhe era permitida, em função de não dispor da respectiva autorização legal;
j) O arguido decidiu efectuar quatro disparos no corpo de SCCB, quando se encontrava a curta distância do mesmo, querendo e conseguindo atingir zonas do seu corpo que alojam órgãos vitais;
k) O arguido agiu da forma descrita, querendo e conseguindo provocar a morte de SCCB, o que conseguiu;
l) O arguido agiu dessa forma, motivado por desavenças familiares em virtude das duas famílias não aceitarem e não concordarem com o modo de vida da outra, e decorrente de uma mera discussão entre familiares;
m) O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo serem os seus comportamentos proibidos e punidos por lei, com o que se conformou;

Do pedido de indemnização civil:
Com interesse para a decisão da causa provou-se que:
n) (.....)
Provou-se ainda que:
u) Os demandantes AMPC, MDPC, IMPC e MAPP, filhos de SCCB, são únicos herdeiros deste, conforme certidão de habilitação de herdeiros de fls. 910 a 912;
v) SCCB nasceu em 07.02.1966 como consta da declaração de óbito de fls. 7;
w) Consta do relatório social do arguido que:
• Não frequentou a escola, e actualmente ainda não sabe ler ou escrever;
• Era visto como um jovem calmo, colaborante e dinâmico a nível do desempenho das suas funções;
• Aos 21 anos passou a viver com a companheira em casa dos sogros e mais tarde em casa camarária no Bairro de Santo António em C;
• Tem 4 filhos e passou a trabalhar por conta própria na venda de roupas em mercados e feiras, na zona de Lisboa, juntamente com a companheira, retirando entre 100 a 300 euros por feira, o que lhe permitia assegurar sem dificuldade o quotidiano da família e as despesas básicas da habitação;
• Na sequência do abandono da residência da família pelo arguido pra manter um relacionamento afectivo com outra pessoa que não a companheira, esta fixou residência numa morada arrendada no Porto Alto, para onde o arguido veio viver quando reatou relacionamento com a mãe dos seus filhos e deu continuidade ao modo de vida ligado à venda ambulante;
• Revela dificuldade em ter uma atitude autocrítica quanto à assumpção de condutas menos normativas e revela, relativamente as factos em apreço nos autos, dificuldade para assumir as suas fragilidades pessoais;
x) O arguido tem antecedentes criminais, tendo sido condenado:
• Por sentença proferida em 18.02.1997, no proc. comum singular n.º 544/94.1 TAVFX, do 1.º Juízo Criminal de Vila, na pena de sete meses de prisão suspensa por dois anos, pela prática, em 14.11.1994, de um crime de detenção de arma proibida;
• Por acórdão proferido em 11.06.1997, no proc. comum colectivo n.º 104/96.2 GEVFX, do 1.º Juízo Criminal de Vila, na pena de quinze meses de prisão, pela prática, em 28.03.1996, de um crime de receptação;
• Por sentença proferida em 03.10.2008, no proc. comum singular n.º 70/05.5 F2LSB, do 1.º Juízo Criminal de Vila, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 5,00, pela prática, em 19.11.2005, de um crime de contrafacção.
Factos não provados
Com interesse para a discussão da causa não se provou que:
Da acusação:
1. (...) ;
Do pedido de indemnização civil:
2. (...)
Em sede de fundamentação da decisão de facto consignou-se o seguinte:
(---)
(…)

Como consabido, são as conclusões retiradas pelo recorrente da sua motivação que definem o objecto do recurso e bem assim os poderes de cognição do Tribunal ad quem.
Desde logo entende o recorrente que a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, incluindo a testemunhal, não poderá ser valorada, devendo os factos constantes da acusação e dados como provados pelo Acórdão recorrido ser dados como não provados, com todas as devidas e legais consequências.
Porquanto, o Acórdão recorrido, aquando da sua motivação da decisão de facto, valora vários autos de intercepção de comunicações (nomeadamente os de fls. 73, 74, 106, 108, 121, 122, 149, 206 a 211, 259 e 260, 279 a 282, 338 a 343, 354 e 355, 357 a 362), autos de audição de intercepção telefónica (nomeadamente os de fls. 84 e 85, 107, 109, 148, 157, 158, 184 e 213), autos intercalares de intercepção e gravação de conversações ou comunicações (nomeadamente os de fls. 325 a 332), autos de fim de intercepção telefónica (nomeadamente de fls. 262 a 267, 361 a 377, 382 e 383).
Sendo certo que o Ministério Público não indicou como prova as transcrições das conversações telefónicas que quis ver valoradas como meio de prova. E nem o poderia fazer pela simples razão de que não mandou transcrever essas conversações ao órgão de polícia criminal que efectuou a respectiva intercepção e gravação; nem mandou transcrever ao órgão de polícia criminal que realizou a respectiva intercepção e gravação as conversações telefónicas interceptadas.
E não consta dos autos qualquer transcrição de conversações telefónicas interceptadas, apenas constando os respectivos suportes digitais e resumos constantes de relatórios elaborados pela Policia Judiciária.
Cumpre apreciar e decidir.
Para dilucidar a questão em apreço, importa chamar a intervir o que se dispõe no art.º 32.º, n.º 8, da C.R.P., onde se estatui que são nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.
Por sua vez, o art.º 34.º, n.º 1, da mesma Constituição, vem postular que o domicílio e o sigilo de correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis.
Com essas garantias constitucionais relaciona-se o art. 126.º do CPP, que se refere aos métodos proibidos de prova. Normativo onde se plasmou o princípio constitucional das proibições de prova constante do n.º 8, do art.º 32.º, da C.R.P.
De acordo com tal inciso normativo, são nulas as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral, não podendo tais provas ser utilizadas (n.º 1).
Precisando-se no n.º 2 o conceito de provas consideradas ofensivas da integridade física ou moral, que são as obtidas por qualquer dos meios enumerados nas suas várias alíneas, não sendo o consentimento do lesado relevante para afastar a sua proibição.
Estabelecendo-se no seu n.º 3 que ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular.
No capítulo dos meios de obtenção da prova, e para o que aos autos importa, temos o disposto no art.º 188.º, n.º 7, do Cód. Proc. Pen., onde se dispõe que só podem valer como prova as conversações ou comunicações que:
a) O Ministério Público mandar transcrever ao órgão de polícia criminal que tiver efectuado a intercepção e a gravação e indicar como meio de prova na acusação;
Dizendo-se no art.º 190.º, do mesmo compêndio adjectivo que os requisitos e condições referidos nos arts. 187.º, 188.º e 189.º são estabelecidos sob pena de nulidade.
Retornando ao art.º 126.º, do Cód. Proc. Pen., e como referido, nele se consagra um regime de proibições de prova –e, consequentemente, de proibições de valoração com alcance diverso em situações diferenciadas, consoante atinjam a integridade física e moral da pessoa humana ou a sua privacidade.
Na lição de Paulo Pinto Albuquerque a nulidade da prova proibida que atinge o direito à integridade física e moral, previsto no artigo 126, nº 1 e 2 do CPP, é insanável; a nulidade da prova proibida que atinge os direitos à privacidade previstos no artigo 126, nº 3 é sanável pelo consentimento do titular do direito. A legitimidade para o consentimento depende da titularidade do direito em relação ao qual se verificou a intromissão ilegal. O consentimento pode ser dado ex ante ou ex post facto. Se o titular do direito pode consentir na intromissão na esfera jurídica do seu direito, ele também pode renunciar expressamente à arguição da nulidade, ou aceitar expressamente os efeitos do acto, tudo com a consequência da sanação da nulidade da prova proibida. Em síntese, o artigo 126, nº 1 e 2, prevê nulidades absolutas de prova e o nº 3 prevê nulidades relativas de prova.[1]
O mesmo é dizer que a interdição de prova é absoluta no caso do direito à integridade da pessoa e relativa nos restantes casos, devendo ter-se por abusiva a intromissão quando efectuada fora dos casos previstos na lei e sem intervenção judicial (art. 34°-2 e 4); quando desnecessária, ou desproporcionada, ou quando aniquiladora dos próprios direitos (art. 18°-2 e 3).[2]
Face ao explanado e tendo em conta o caso dos autos, a inobservância dos preditos requisitos e condições decorrentes do que se dispõe no art.º 188.º, n.º 9, do Cód. Proc. Pen., não pode deixar de ser tida como constituindo nulidade relativa de prova proibida que atinge os direitos à privacidade previstos no art.º 126.º, n.º 3, do Cód. Proc. Pen.
Não podendo ser valorada no contexto dos autos a prova resultante das escutas telefónicas e no Acórdão referidas.
Cabe descortinar quais as consequências da utilização das ditas escutas telefónicas para a decisão do caso em apreço, ao nivel da factualidade tida como provada.
Compulsados os autos e tendo por referência o relato de uso das escutas telefónicas constantes da fundamentação da decisão de facto constata-se o seguinte:
- Os autos de intercepção de comunicações telefónicas referidos limitam-se a dar nota de que deram início à intercepção de conversações telefónicas, sem mais;
- Dos autos de audição de intercepção telefónica a que se alude consta que deles “não resultou qualquer elemento de interesse para a investigação ou para a prova”.
- Dos autos de intercepção de comunicações referidos, e utilizados pelo Tribunal recorrido - a fls. 354, 355 e 357 a 359, decorre que familiares do arguido falam de uma pistola que estaria na mão da vítima mas que nunca apareceu e que ninguém sabia onde estaria.
Dos restantes nada de relevante em termos probatórios, mesmo inócuo, a saber em que a mulher do arguido refere o encontro com a vítima e que esta veio atrás deles até ao “Pingo Doce”, e que tinha uma arma.
Depois, a mulher do arguido diz para seu Pai que ele é uma das testemunhas e que foi dizer que o “Deira, arguido, foi o autor dos disparos, ao que o José Estevam respondeu ”o que fazia eu minha filha”, tendo Balbina respondido que devia ter dito que não vira quem foi.
E bem assim, a mulher do arguido, em conversa com a Lídia, diz que no dia dos factos se encontrou com a mulher da vítima, no “Modelo”, que discutiram e que ele veio atrás deles até ao “Pingo Doce”. Diz também que ele tinha muita mania, referindo-se à vítima, mas a gente tirou-lha, foi pena ela não ter aparecido também, referindo-se à mulher da vítima.
Para dirimir tal questão, importa chamar a intervir o art.º 122.º, do Cód. Proc. Pen., onde se dispõe que as nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dela dependerem e aquelas puderem afectar.
Como se vem entendendo, neste normativo aflora-se a problemática denominada de “efeito à distância”, ou seja, da indagação da comunicabilidade ou não da valoração aos meios secundários da prova tornados possíveis à custa de meios ou métodos proibidos de prova.
Como refere Paulo Pinto de Albuquerque, in ob. cit., págs. 321, a prova proibida contamina a restante prova se houver um nexo de dependência cronológica, lógica e valorativa entre a prova proibida e a restante prova (artº 122º nº 1 do CPP lido à luz da jurisprudência do Ac. do TC nº 198/2004). O apuramento do “efeito à distância” da produção de prova ou, dito de outro modo, dos “frutos da árvore envenenada” há-de pois resultar de uma necessária ponderação do nexo que liga a prova proibida e a prova mediata dela resultante, de acordo com o princípio de que o efeito à distância da produção de prova é tanto maior quanto mais grave for a proibição de prova violada, sendo de excluir esse efeito à distância quando o fim de protecção da norma processual penal que prescreve a proibição de prova se possa conciliar com a utilização processual das provas mediatamente conseguidas por intermédio da prova proibida.
Pelo que, só caso a caso e perante a análise dos interesses em jogo se poderá avaliar a extensão dos efeitos da prova inquinada. Importando apurar um nexo de dependência não só cronológica, como lógica e valorativa, entre a prova inquinada e a que se lhe seguiu.
Não descortinamos, face ao modo como se mostra efectuada a fundamentação da decisão de facto e sem necessidade de se esmiuçar a mesma, em que medida se mostra contaminada a restante prova utilizada para fundamentar a condenação do aqui recorrente, quando toda a restante prova se mostra autónoma face a esta prova.
Para dissipar qualquer mácula que pudesse aportar aos autos, em termos probatórios, o uso das escutas telefónicas, sempre se poderia recorrer à confissão do arguido e aqui recorrente. Que, no essencial, veio atribuir a si a autoria do crime, embora alegando legítima defesa.
Sem curar de outros considerandos, por despiciendos, se conclui pela sem razão do pretendido pelo aqui recorrente.

Da leitura das conclusões formuladas pelo recorrente decorre que se pretende quer o reexame da matéria de facto, quer o reexame da matéria de direito. Conhecendo este Tribunal, como conhece, de facto e de direito, nos termos do que se diz no art.º 428.º, do Cód. Proc. Pen., nada obsta a que se venha conhecer do presente recurso e com a amplitude cognitiva pretendida.
Ao nivel do reexame da matéria de facto, importa referir que por duas vias se pode vir questionar a matéria de facto acolhida pelo tribunal recorrido, a saber:
-uma, pelo deitar mão dos vícios compaginados no art.º410.º, n.º2, do Cód. Proc. Pen., a que se convencionou chamar de revista alargada;
-outra, através da impugnação ampla da matéria de facto, de harmonia com o que se dispõe no art.º 412.º, n.ºs 3 e 4, do mesmo diploma adjectivo.
Na primeira situação, estamos perante a arguição dos vícios previstos nas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, que, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento.[3]
Na segunda situação, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do C.P. Penal.
Analisamos o pretendido pelo recorrente com recurso à invocação dos vícios compaginados no art.º 410.º, n.º2, do Cód. Proc. Pen., a chamada revista alargada. Mais concretamente, pela invocação da existência na decisão recorrida do vício da contradição insanável da fundamentação.
O vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão- art.º 410.º, n.º, al.ª b), do Cód. Proc. Pen.-, ocorre quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada, ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face á colisão entre os fundamentos invocados; Há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos, quando os factos provados e os não provados se contradigam entre si de forma a excluírem-se mutuamente.
Ainda segundo os mesmos autores, só existe contradição insanável da fundamentação quando, de acordo com um raciocínio lógico, for de concluir que essa fundamentação justifica uma decisão precisamente oposta ou quando, segundo o mesmo tipo de raciocínio, se possa concluir que a decisão não fica esclarecida de forma suficiente, dada a colisão entre os fundamentos invocados[4].
Existe contradição insanável da fundamentação quando seja de concluir que não é perfeita a compatibilidade entre /de todos os factos provados.
Sendo que o predito vício só é de relevar quando seja insanável e cumulativamente resulte to texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.
Trata-se, no fundo de um vício ao nível das premissas, determinando a formação defeituosa da conclusão.
Funda, como segue, o predito vício- na vertente contradição entre a fundamentação e a decisão -:
(…) que o Acórdão recorrido dá como provada a existência de uma discussão, directa e no local dos factos, entre arguido e ofendido, para mais tarde, aquando da fundamentação da decisão relativa à matéria de facto e enquadramento jurídico, afirmar, clara e inequivocamente, que essa discussão não ocorreu, fazendo apenas referência a uma primeira discussão, também dada como provada sob a alínea c) – “Iniciou-se uma discussão entre as mulheres dos dois casais no interior do supermercado e de modo não concretamente apurado a mulher do arguido saiu do estabelecimento e o casal saiu do local”.
Na óptica da Magistrada recorrida os factos em causa não se excluem mutuamente, não se tratando de uma contradição insanável, antes e apenas de um manifesto “lapso”, a ser corrigido por este Tribunal.
Analisando, a respeito, o Acórdão Sindicado, damos nota de que consta da fundamentação da decisão de facto - para se entender a o que motivou a actuação do arguido, de disparar sobre a vítima - o seguinte:
O motivo de toda esta situação foi claramente um ajuste de contas por desavenças familiares que o arguido tentou ocultar mas que resultaram do depoimento de todas as testemunhas. Havia claramente desavenças familiares motivadas por casas, invejas, ciúmes, assaltos, traições que estas famílias foram construindo e que culminaram nesta execução por parte do arguido que se aproximou do ofendido quando este nem sequer tinha ainda acabado de sair do carro e a uma distância mínima em que falhar era impossível desfere pelo menos 4 disparos na direcção da vítima vindo este a falecer.
Da fundamentação de direito, e para a mesma situação, consta como segue:
No caso concreto, o arguido agiu na sequência de desavenças familiares por as suas famílias não aceitarem o respectivo modo de vida. O único motivo que levou a que o arguido praticasse os factos foi uma discussão familiar que tinha ocorrido momentos antes num outro local e mesmo assim o arguido muniu-se da arma e efectuou 4 disparos a curta distância que atingiram mortalmente a vítima. Na realidade, não estamos perante uma discussão relevante que alterasse psicologicamente o arguido a ponto de o motivar à prática dos factos tanto mais que a discussão foi entre as mulheres dos dois casais. Deste modo, o motivo pelo qual o arguido actuou tem de se considerar fútil, por irrelevante.
Existe, de facto, contradição entre o acabado de mencionar, sendo certo que a explicação dada para a actuação do arguido a podemos colher da facticidade tida como assente, sua alínea l), onde se diz que “O arguido agiu dessa forma, motivado por desavenças familiares em virtude das duas famílias não aceitarem e não concordarem com o modo de vida da outra, e decorrente de uma mera discussão entre familiares ”.
Daí que se tenha de conformar o que se afirma ao nivel da fundamentação de direito com o tecido na alínea l) dos factos tidos como provados, com o que se mostra conforme o tecido ao nível da fundamentação da decisão de facto.
Destarte se corrigindo a contradição- sanável - apontada no Acórdão sob censura.

Mais entende o recorrente que o crime de homicídio em presença nos autos não poder ser qualificado, por não ter actuado determinado por qualquer motivo torpe ou fútil.
Porquanto, e sempre em seu entender, reagiu no âmbito de uma violenta discussão, precedida de uma primeira discussão em local diferente tendo sido perseguido pela vítima.
E actuou (…) por temer sofrer agressões que o ferissem gravemente ou o fizessem mesmo perder a vida, dada até a diferença de complexão física entre si e a vitima, justificando-se tal receio, e fazendo nossas as palavras do Acórdão recorrido, pelas “desavenças familiares motivadas por casas, invejas, ciúmes, assaltos, traições que estas famílias foram construindo”.
Desde logo importa referir que com excepção da factualidade citada em último lugar, e entre aspas, nenhuma outra se mostra contemplada na decisão sob censura, ao nivel dos factos provados, daí à mesma se não atender.
Depois, importa fazer apelo ao que se escreveu no Acórdão sindicado:
No caso concreto, o arguido agiu na sequência de desavenças familiares por as suas famílias não aceitarem o respectivo modo de vida. O único motivo que levou a que o arguido praticasse os factos foi uma discussão familiar que tinha ocorrido momentos antes num outro local e mesmo assim o arguido muniu-se da arma e efectuou 4 disparos a curta distância que atingiram mortalmente a vítima. Na realidade, não estamos perante uma discussão relevante que alterasse psicologicamente o arguido a ponto de o motivar à prática dos factos tanto mais que a discussão foi entre as mulheres dos dois casais. Deste modo, o motivo pelo qual o arguido actuou tem de se considerar fútil, por irrelevante.
Note-se que de qualquer modo, a conduta do arguido integra os conceitos de especial censurabilidade e/ou perversidade porquanto por motivo que reputamos de fútil o mesmo se aproximou da vítima e disparou 4 tiros a curta distância da vítima, não tendo este qualquer arma e não se tendo demonstrado qualquer atitude agressiva por parte da vítima, pelo que a actuação do arguido é a de uma verdadeira execução e de um ajuste de contas que é das situações que mais repulsa gera na nossa sociedade e que como tal sempre se teria de considerar com especial censurabilidade ou perversidade.
O crime de homicídio qualificado, previsto no artigo 132º do Código Penal, constitui uma forma agravada de homicídio, em que a qualificação decorre da verificação de um tipo de culpa agravado, definido pela orientação de um critério generalizador enunciado no nº 1 da disposição, moldado pelos vários exemplos-padrão constantes das diversas alíneas do nº 2 do artigo 132º.
Como consabido, não é pela verificação, ocorrência, in casu, de alguma dessas circunstâncias referidas nos exemplos-padrão que, desde logo, se impõe a qualificação do delito, antes, e tão só, quando se deduza da sua verificação, em concreto, a especial censurabilidade ou perversidade.
Como inversamente, não se poderá fazer apelo directo à cláusula geral contida no n.º 1, a pretexto da ocorrência de um maior desvalor da conduta do agente ou da personalidade documentada no facto para o preenchimento do tipo de culpa agravado, sendo necessário que essa conduta ou aspectos da personalidade mais desvaliosos se concretizem em qualquer dos exemplos-padrão ou em qualquer circunstância substancialmente análoga[5].
Como ensina o Prof.º Figueiredo Dias, a qualificação supõe a imputação de um especial e qualificado tipo de culpa, reflectido, no plano da atitude do agente, por uma conduta em que se revelam «formas de realização do facto especialmente desvaliosas (especial censurabilidade), ou aquelas em que o especial juízo de culpa se fundamenta directamente na documentação no facto de qualidades da personalidade do agente especialmente desvaliosas.
O modelo de construção do tipo qualificado - qualificado pelo especial tipo de culpa - através da enunciação do critério geral, moldado pela densificação através dos exemplos-padrão, não permitirá, por seu lado, salvo afectação do princípio da legalidade, «fazer um apelo directo à cláusula de especial censurabilidade ou perversidade, sem primeiramente a fazer passar pelo crivo dos exemplos-padrão e de, por isso, comprovar a existência de um caso expressamente previsto [...] ou de uma situação valorativamente análoga[6].
A qualificativa da alínea e), do n.º2, do art.º 132.º, ocorre pela circunstância de o agente ser determinado por qualquer motivo torpe ou fútil.
Como se vem entendendo, por motivo fútil se deve ter o motivo gratuito, frívolo, despropositado ou leviano, avaliado segundo os padrões éticos geralmente aceites na comunidade. Ele assenta, pois, numa ideia de desproporcionalidade flagrante entre a conduta da vítima e a atitude do agente, que choca frontalmente com o sentimento comunitário de justiça.
Não será, porém, motivo fútil a ausência (ou o desconhecimento) de motivação do agente. A imputação de motivo fútil ao agente implica o apuramento prévio do motivo, ou seja, sem se conhecer o motivo, não se pode qualificar o mesmo como “fútil”, como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10.12.2008, Processo n.º 3703/08.
Motivo fútil é o motivo de importância mínima. Será também o motivo frívolo, leviano, a ninharia que leva o agente à prática desse grave crime, na inteira desproporção entre o motivo e a extrema reacção homicida, o que se apresenta notoriamente inadequado do ponto de vista do homem médio em relação ao crime de que se trate, o que traduz uma desconformidade manifesta entre a gravidade e as consequências da acção cometida e o que impeliu o agente a essa comissão, que acentua o desvalor da conduta por via do desvalor daquilo que impulsionou a sua prática.[7]
Motivo fútil é aquele que não tem relevo, que não chega a ser motivo, que não pode razoavelmente explicar (e muito menos justificar) a conduta do agente. É fútil o motivo quando notoriamente, notavelmente desproporcionado ou inadequado para ser sequer um começo de explicação da conduta, do ponto de vista do homem médio[8].
Concordando-se, in tottum, com o Acórdão sindicado quando conclui pela verificação da analisada circunstância e nos moldes que os autos patenteiam, sem curar de outros considerando, por inúteis, atenta a clareza do caso em apreço.
Para lá de que toda a factualidade trazida a pretório pelo aqui recorrente ser da sua lavra e sem qualquer suporte na facticidade acolhida pelo Tribunal recorrido.

Dissente, ainda, o aqui impetrante da pena encontrada para o crime de homicídio, que reputa de exagerada, pretendendo que a mesma não exceda os (13) treze anos de prisão.
No que tange à dosimetria penal, pugna o aqui recorrente pela aplicação de pena inferior à decretada no Acórdão sindicado, propondo que esta se fixe em medida não superior a 4 (quatro) anos de prisão.
No que tange à dosimetria da pena valem os critérios fixados no art.º71.º, do Cód. Pen., onde se diz que a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. Visando-se com a aplicação das penas a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente-cfr. Art.º 40.º, n.º1, do Cód. Pen.
Sendo que em caso em algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, de acordo com o estatuído no n.º2, do art.º40.º, do diploma legal citado.
Decorrendo de tais normativos que a culpa e a prevenção constituem os parâmetros que importa ter em conta na determinação da medida da pena.
Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele-art.º71.º, n.º2, do Cód. Pen.
Assentando o art.º40.º, do Cód. Pen., numa concepção ético-preventiva da pena: ética, porque a sua aplicação está condicionada e limitada pela culpa do infractor; preventiva, na medida em que o fim legitimador da pena é a prevenção geral e especial.
O fim do direito penal é o da protecção dos bens jurídico/penais e a pena é o meio de realização dessa tutela, havendo de estabelecer-se uma correlação entre a medida da pena e a necessidade de prevenir a prática de futuros crimes, nesta entrando as considerações de prevenção geral e especial.
Pela prevenção geral (positiva) faz-se apelo à consciencialização geral da importância social do bem jurídico tutelado e pelo outro no restabelecimento ou revigoramento da confiança da comunidade na efectiva tutela penal dos bens tutelados.
Pela prevenção especial pretende-se a ressocialização do delinquente (prevenção especial positiva) e a dissuasão da prática de futuros crimes (prevenção especial negativa).
A prevenção especial não é um valor absoluto mas duplamente limitado pela culpa e pela prevenção geral: pela culpa já que o limite máximo da pena não pode ser superior à medida da culpa; pela prevenção geral que dita o limite máximo correspondente à garantia da manutenção da confiança da comunidade na efectiva tutela do bem violado e na dissuasão dos potenciais prevaricadores[9].
No Acórdão sindicado, para o efeito, considerou-se o seguinte:
O crime de homicídio qualificado, praticado pelo arguido é abstractamente punível com pena de prisão de 12 a 25 anos (cfr. os arts. 131.º e 132.º, n.º 1 e 2, al. b) do Cód. Penal).
Importa, pois, determinar a medida concreta da pena a aplicar ao arguido, pena essa que é limitada pela sua culpa revelada nos factos e terá de se mostrar adequada a assegurar as exigências de prevenção geral e especial, nos termos do disposto nos arts. 40°, ns 1 e 2, 70.º e 71°, n° 1, todos do Cód. Penal.
Na determinação da medida concreta da pena, e atento o disposto no art°. 71°, n° 2, do Cód. Penal, importa considerar:
- O grau de ilicitude do facto, que se nos afigura elevado, atendendo, designadamente, ao modo como o arguido actuou e ao motivo pelo qual agiu, ao local onde praticou os factos;
O dolo do arguido, que reveste a modalidade de dolo directo;
As condições pessoais e a situação económica do arguido, supra descritas.
Milita a favor do arguido a circunstância de não ter antecedentes criminais pela prática de crime de igual natureza.
O arguido apenas admitiu os factos que lhe era impossível negar, adoptando uma atitude desculpabilizante e invocando uma versão de defesa que não só não faz sentido, face às circunstâncias em que os factos ocorreram, como foi integralmente negada pela demais prova produzida nos autos.
Há que ponderar, ainda, as exigências de prevenção geral e especial, sendo as necessidades de prevenção geral, elevadas, numa sociedade em que se assiste a um constante aumento da criminalidade, em especial de homicídios do tipo do praticado pelo arguido, que conduz, necessariamente a um incremento da insegurança que se verifica actualmente, com todas as consequências e sequelas, daí decorrentes. As necessidades de prevenção especial afiguram-se medianas.
Ponderando todos estes factores, entendemos por adequada a aplicar ao arguido a pena de prisão de 17 (dezassete) anos.
Elenca o aqui recorrente uma série de circunstâncias que, em seu entender, serão aptas a ver atenuada a pena aplicada ao crime de homicídio qualificado- ver ponto 20 da sua motivação de recurso.
De todas essas circunstâncias o Tribunal recorrido só não atendeu a uma delas, a saber:
- O arguido demonstrou arrependimento, entendendo-se como tal, para além da sua declaração expressa, a confissão, ainda que parcial, dos factos.
Bem andou o tribunal recorrido em não atender a tal circunstancialismo, porquanto não se lobriga a existência nos autos de factualidade de onde decorra, ou possa decorrer.
Face ao exposto, e por se mostrar bem doseada a moldura pena concreta aplicada ao crime de homicídio, a situar-se um tanto aquém do limite médio da moldura penal, a mesma é de manter.

Ao nível da pena do concurso, entendeu o Tribunal recorrido fixá-la em 18 anos de prisão.
O recorrente, sobre tal tema, limita-se a referir, sem mais, que a pena única aplicada ao arguido em sede de cúmulo jurídico jamais deverá exceder os catorze anos de prisão, sendo esta perfeitamente justa, adequada e proporcional- cfr. ponto 24.da motivação.
Importa reter que as penas em concurso são de 17 anos de prisão aplicada ao crime de homicídio qualificado e de 2 anos de prisão, aplicada ao crime de detenção de arma proibida.
E que de harmonia com o disposto no art.º 77.º, n.º 2, do Cód. Pen., a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas, ou seja, 19 anos e limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas, ou seja, 17 anos.
Pelo que tendo em conta a personalidade do agente revelada nos factos -, bem andou o Tribunal recorrido em fixar em 18 (dezoito) anos a pena única; que, por bem doseada, é de manter.
Termos são em que Acordam em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar o Acórdão recorrido.
Custas pelo arguido, fixando-se em 4 Ucs, a taxa de justiça devida.
(texto elaborado e revisto pelo relator).
Évora, 20 de Janeiro de 2015.
(José Proença da Costa)
(Gilberto Cunha)

_________________________________________________
[1] Ver, Comentário ao Código de Processo Penal, págs. 326
[2] Ver, Acórdão do S.T.J., de 30.06.2011, no Processo n.º 83/08.5JAFUN.L1.S1, 5ª Secção
[3] Ver, Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado, págs. 729 e Simas Santos e Leal Henriques, in Recursos em Processo Penal, págs. 72.
[4] Cfr. Simas Santos e Leal Henriques, in ob.cit., pags.72-73.
[5] Ver, Ac. S.T.J., de 15-11-2012, no Processo n.º 858/11. 8PBSNT.L1.S1, 5.ª Secção.
[6] Ver, Prof.º Figueiredo Dias, in Comentário Conimbricense do Código Penal", vol. I, págs. 27-28.
[7] Ver, Ac. S.T.J., de 27.05.2010, no Processo n.º 58/08.4JAGRD.C1.S1, 3ª Secção.
[8] Ver, Ac. S.T.J., de 5.02.1997, no Processo n.º 96P1026.
[9] Ver. Ac. Relação de Coimbra, de 10.03.2010, no Processo n.º1452/09.9PCCBR.C1.