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DIREITO REAL DE HABITAÇÃO PERIÓDICA
OBRAS
ENCERRAMENTO DO EMPREENDIMENTO
INDEMNIZAÇÃO
Sumário
I - No regime jurídico da habitação periódica é ao proprietário do empreendimento que compete a administração do mesmo (não obstante, poder ceder a sua exploração) e zelar pela conservação e limpeza das unidades de alojamento, devendo fazer reparações indispensáveis ao exercício normal do direito, mas as obras que constituam inovações nas aludidas unidades, ainda que por sua conta, estão sujeitas e dependentes de consentimento dos titulares do Direito Real de Habitação Periódica (DRHP) a prestar em assembleia-geral. II - Havendo necessidade de realização de inovações nas unidades de alojamento e, não tendo a assembleia-geral dos titulares de DRHP dado consentimento para a realização de tais obras, não pode o proprietário/administrador das aludidas unidades proceder à sua realização, face ao disposto no artigo 28º do Decreto-Lei n.º 275/93, de 5 de Agosto. III - Porém, este preceito legal deve ser interpretado restritivamente, no sentido de não abranger no seu âmbito de aplicação a realização de obras que resultem do cumprimento de uma imposição legal. IV - Sendo tais obras necessárias para a manutenção em funcionamento do empreendimento onde se mostram constituídos os DRHP, é ao proprietário, administrador do empreendimento, que compete executar e custear a realização das obras, por ser ao mesmo que incumbe dotar o empreendimento das condições necessárias de modo a permitir aos titulares dos DRHP o direito de gozo, uso e fruição dos imóveis, nas semanas de férias que adquiriram. V - Não é lícito, sob pena de abuso de direito, aos titulares de DRHP exigirem indemnização, com fundamento na impossibilidade de exercício do direito de usar a unidade habitacional, contra a proprietária e administradora, quando antes deliberaram maioritariamente contra a realização das obras cuja falta esteve na base do encerramento do empreendimento. (Sumário elaborado pelo Relator)
Texto Integral
Acórdão na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
1. BB, CC e Outros autores, todosmelhor identificados a fls. 2 a 29, intentaram acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra DD, EE, e FF, pedindo a condenação da 1ª Réna execução e pagamento das obras legalmente exigidas, enquanto proprietária e entidade exploradora do empreendimento turístico “TT” bem como no pagamento de uma indemnização aos autores, pelo não gozo das semanas e prejuízos patrimoniais e não patrimoniais daí resultantes, enquanto mantiver o encerramento do referido empreendimento, a fixar em execução de sentença.
Pedem ainda, a título subsidiário, que a lª Ré seja condenada na realização das obras enquanto acto urgente de boa administração, caso se entenda serem os titulares de direitos reais de habitação periódica os responsáveis pelo pagamento das obras legalmente exigíveis, e a condenação de todas as rés no pagamento de uma indemnização aos autores, pelo não gozo das semanas e prejuízos patrimoniais e não patrimoniais daí resultantes, enquanto se mantiver o encerramento do empreendimento “TT”, a fixar em execução de sentença.
2. Para tanto, alegam, em síntese, que: - os autores e a 2.ª e 3.a rés são titulares de direitos reais de habitação periódica (adiante DRHP) no empreendimento turístico construído no prédio denominado “Apartamentos Turísticos TT”, sito em (...), em Portimão, sendo, actualmente, a ré DD., a proprietária, gestora e exploradora da totalidade do empreendimento; - desde 11 de Dezembro de 2006, a l.ª ré procedeu unilateralmente ao encerramento do empreendimento, impossibilitando o gozo de todos os DRHP aos respectivos titulares, nos quais se incluem os autores; - nessa data, alguns dos titulares de DRHP receberam uma carta da l.ª ré dando conhecimento desse encerramento, o qual foi justificado com a falta de certificado contra o risco de incêndio, pois nunca foram realizadas as obras legalmente obrigatórias; e – nem a 1ª ré nem a 2ª ré, que também foi proprietária do empreendimento, realizaram as obras exigidas por lei, apesar de essa obrigação lhes caber e de ter existido um projecto de obras para tal desiderato.
Sustentam que a lei atribui a responsabilidade pela execução de obras atinentes à conservação do empreendimento ao respectivo proprietário, nas quais se incluem as obras necessárias à emissão de certificado contra o risco de incêndio, sendo clara a intenção da lei em retirar da esfera dos titulares de DRHP qualquer responsabilidade no pagamento de quaisquer encargos a esse respeito.
Acrescentam que ainda que os titulares de DRHP estivessem obrigados ao pagamento dessas obras, estas têm que ser consideradas urgentes, cabendo ao administrador do empreendimento obviar pela rápida resolução dos problemas que se colocam à conservação do empreendimento, executando as obras em causa.
Alegam ainda existir má gestão do empreendimento, não sendo prestada a caução de boa administração exigida por lei, não se cobrando as taxas de manutenção, o que origina défice nas contas, e que a 1.ª ré deixou de promover qualquer tido de animação recreativo-cultural, não renovou o mobiliário das fracções deixando de explorar áreas comerciais do empreendimento, retirando a publicidade existente ao empreendimento e não presta a devida informação aos titulares de DRHP.
Mais alegam que a 2.a e 3.a rés votaram contra a realização das obras, dando azo ao encerramento do empreendimento, sabendo que, com o seu voto, desrespeitavam a lei e não obstante terem procedido, ao longo dos anos, à venda de DRHP aos autores e a outros, mesmo sabendo que tinham que efectuar as obras.
Por fim, invocam que o encerramento provocado pelas rés causou danos aos autores, que se viram privados do exercício dos seus direitos, enquanto titulares de DRHP, causando-lhes sofrimento, revolta e desilusão, pelo que devem ser indemnizados dos respectivos danos patrimoniais e não patrimoniais.
3. GG e HH deduziram incidente de intervenção principal espontânea como associados dos autores, alegando serem igualmente titulares de DRHP, tendo um interesse semelhante ao dos autores, apresentando articulado próprio, em que alegam os mesmos factos e os mesmos argumentos constantes da petição inicial e formulam pedido idêntico ao dos autores, mas quantificam a indemnização peticionada, referindo que, actualmente, os danos patrimoniais ascendem a € 2.730,00 e os não patrimoniais a € 3.500,00.
4. Citada, a ré EE, contestou com os fundamentos constantes de fls. 1486 e segs., impugnando a maior parte dos factos alegados pelos autores, referindo que alienou o seu direito de propriedade sobre o empreendimento turístico em apreço em Setembro de 2005, assumindo desde então apenas a posição de titular de DRHP, tal como a totalidade dos autores, e que nunca foi exploradora do empreendimento turístico, tendo essa função ficado a cargo da 1.ª ré.
Alega ainda, que ela própria e a 1.ª ré diligenciaram no sentido da regularização da situação em que se encontrava o empreendimento e contrataram os serviços de técnicos especializados, com vista à elaboração do projecto de segurança contra riscos de incêndio, o qual foi apresentado em 2004, que ascendia ao montante aproximado de € 1.200.000,00.
Acrescenta que tal matéria foi colocada à consideração dos titulares de DRHP, uma vez que a obra em apreço deveria ser por eles suportada e não pelo proprietário do empreendimento turístico, pois não constitui uma normal obra de conservação, mas sim uma obra com carácter estrutural e extraordinário, resultante de uma imposição legal superveniente, sendo que nenhum diploma legal obriga o proprietário do empreendimento aqui em causa a suportar essas obras, as quais não assumem a natureza de benfeitoria necessária ou de um normal acto de gestão ordinária.
Refere também que não se verificam, em relação a si os pressupostos da responsabilidade civil que justifiquem a sua condenação no pagamento de qualquer indemnização aos autores, concluindo pela improcedência da acção.
5. A ré FF., também contestou, como conta de fls. 1528 e segs., impugnando a maior parte dos factos alegados pelos autores, alegando também que o proprietário do empreendimento não é responsável pelo pagamento integral das obras com vista à obtenção de condições de segurança contra o risco de incêndio, cabendo tal responsabilidade aos titulares de DRHP, entre os quais se encontra ela própria, pois no caso dos autos não está em causa a realização de uma qualquer obra ordinária ou de conservação, nem uma benfeitoria necessária, mas antes o pagamento de um encargo único e de carácter extraordinário, resultante de uma imposição legal superveniente à constituição do empreendimento e dos respectivos DRHP e referente à concretização de uma obra de carácter estrutural, que apresenta proporções consideravelmente elevadas, seguindo a linha de argumentação da contestação da co-ré EE.
Refere igualmente que não se verificam, em relação a si, os pressupostos da responsabilidade civil que justifiquem a sua condenação no pagamento de qualquer indemnização aos autores, concluindo pela improcedência da acção.
6. Citada, a ré DD., contestou a fls. 1918 e segs., impugnando parcialmente os factos alegados pelos autores, alegando, em síntese, que enviou um projecto de segurança contra incêndios ao Serviço Nacional de Bombeiros para que este emitisse o certificado de conformidade e que, seguidamente ao início do processo de adaptação do empreendimento turístico às condições legalmente impostas, decorreu um largo período de tempo com correspondência trocada entre si, o Serviço Nacional de Bombeiros e a Direcção Geral de Turismo, mas, apesar de todas as suas tentativas em ultrapassar os obstáculos existentes para a não emissão do referido certificado de conformidade, não foi possível obter essa emissão, em virtude da recusa da assembleia geral de titulares de DRHP de realizar as necessárias obras extraordinárias, para cuja obrigatoriedade de realização, a 1ª ré sempre alertou em diversas assembleias gerais de titulares de DRHP, tendentes à resolução desse problema.
Alega a ré que as obras em causa necessárias para a concretização do projecto de segurança contra riscos de incêndio têm natureza estrutural, estão orçadas em € 1.200.000,00, pelo que não estão inseridas no âmbito da administração e conservação do equipamento e recheio das instalações. Ou seja, uma obra dessa envergadura, diz a ré, tem necessariamente que ser suportada pelos titulares de DRHP, precedendo a sua aprovação em assembleia-geral pelos mesmos, e que a obrigação de implementação do projecto de segurança contra riscos de incêndio, implementada legalmente em 1997, constitui uma obrigação superveniente à constituição do empreendimento turístico em apreço e dos respectivos DRHP, que teve lugar em 1989, pelo que a imposição dessa obrigação constitui uma alteração anormal das circunstâncias em que o proprietário do empreendimento turístico sujeito ao regime de DRHP, fundou a sua decisão de assumir essa mesma posição de proprietário, pelo que não poderiam os custos dessa obrigação recair integralmente sobre o proprietário.
Alega ainda, que as prestações periódicas a cargo dos titulares de DRHP devem ser equivalentes ao esforço financeiro efectuado pelo proprietário das unidades de alojamento, de modo a permitir uma gestão equilibrada, sendo que o respectivo valor é definido por maioria dos votos dos titulares presentes em assembleia-geral convocada para o efeito, que a forma que tinha de obter os fundos necessários para fazer face às despesas que teria de efectuar com vista à emissão do Certificado de Conformidade estaria sempre dependente dos titulares de DRHP, sendo absurdo comparar o caso dos autos com o regime previsto para o arrendamento urbano, e que, caso a realização dessas obras estivesse exclusivamente a cargo do proprietário do empreendimento, tal implicaria a insolvência da ré e o consequente fim dos DRHP de que os autores são titulares.
Os autores deduziram réplica a fls. 2079 e segs., alegando, nomeadamente, que não existiu qualquer alteração anormal das circunstâncias, sendo que a ré DD, quando comprou as fracções constituídas em DRHP, em 2005, já sabia da necessidade de realização de obras contra o risco de incêndio, sustentando a mesma posição já assumida na petição inicial.
7. Os autores formulam ainda na réplica uma alteração do pedido, no sentido das obras peticionadas serem realizadas no prazo de 180 dias, bem como a condenação da ré DD, em sanção pecuniária compulsória, em quantia diária de € 1000,00 por cada dia de atraso na realização das obras, após o referido prazo, ou caso o Tribunal entenda condenar pelo pedido subsidiário, fixar a sanção pecuniária contra todas as rés.
As rés EE, e FF, apresentaram tréplica, respectivamente, a fls. 2094 e segs, e fls. 2102 e segs., sustentando que os autores responderam a matéria que não é de excepção, devendo considerar-se essa parte da réplica como não escrita, pugnando ainda pela inadmissibilidade da alteração e da ampliação do pedido, ou, caso assim não se entenda, pela sua improcedência.
Também a ré DD, S.A., apresentou tréplica a fls. 2212 e segs, invocando que a réplica é legalmente inadmissível, impugnando, no entanto, o seu teor e pugnando pela improcedência da alteração e da ampliação do pedido.
8. JJ e Outros requerentes (…), deduziram incidente de intervenção principal espontânea como associados dos autores, alegando serem igualmente titulares de DRHP, tendo um interesse semelhante ao dos autores, deduzindo articulado próprio, em que alegam os mesmos factos e os mesmos argumentos constantes da petição inicial e formulam pedido idêntico ao dos autores.
As rés apresentaram resposta aos incidentes de intervenção principal espontânea referidos no parágrafo anterior, reiterando a posição assumida nas suas contestações em relação a todos os requerimentos de intervenção.
Por despacho de fls. 2289 e segs., foi admitida a intervenção principal espontânea dos intervenientes acima referidos.
9. KK e Outros requerentes identificados a fls. 2530deduziram incidente de intervenção principal espontânea como associados dos autores, alegando serem igualmente titulares de DRHP, tendo um interesse semelhante ao dos autores, deduzindo articulado próprio, em que alegam os mesmos factos e os mesmos argumentos constantes da petição inicial e formulam pedido idêntico ao dos autores.
As rés apresentaram resposta a esse incidente de intervenção principal espontânea, reiterando a posição assumida nas suas contestações em relação a todos os requerimentos de intervenção.
Por despacho de fls. 2730 e segs., foi admitida a intervenção principal espontânea do requerente KK e dos demais intervenientes identificados a fls. 2530.
10. Em virtude do falecimento de vários autores na pendência da causa, foram intentados incidentes de habilitação de herdeiros, os quais foram decididos como consta de fls. 2728 e segs., de fls. 2819 e segs., e de fls. 3104 e 3105.
11. Na audiência preliminar foi admitido o articulado de réplica apenas no que respeita ao contraditório exercido em relação aos documentos e requerimento de alteração do pedido, tendo sido admitida a ampliação do pedido, quer no que respeita à inclusão do prazo de 180 dias, quer no que respeita ao pedido de aplicação de sanção pecuniária compulsória.
Foi proferido despacho saneador, com selecção dos factos assentes e fixação da base instrutória, não tendo sido deduzida qualquer reclamação.
12. Instruídos os autos, realizou-se o julgamento, findo o qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto, que não foi objecto de qualquer reclamação.
Os autores apresentaram alegações de direito, nos termos e com os fundamentos de fls. 3255 e segs., concluindo pela procedência da acção.
A ré DD, também alegou, como consta de fls. 3268 e segs., concluindo pela improcedência total da acção.
Após, foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a acção, absolvendo, em consequência, as rés do pedido.
13. Inconformados com esta decisão vieram os Autores BB e Outros interpor recurso, o qual foi admitido como apelação, com subida imediata e feito meramente devolutivo.
Pugnam os Autores, nas suas alegações, pela revogação da sentença com a prolação de acórdão que condene as Rés como peticionam, condensando os fundamentos da sua pretensão nas seguintes conclusões:
A) A Ré “DD” é actual proprietária das 108 fracções, constituídas em regime de DRHP, no empreendimento turístico a que os autos se reportam, sendo também a gestora e administradora desse empreendimento que, desde o dia 11 de Dezembro de 2006, unilateralmente encerrou, com todos os seus serviços, consequentemente impossibilitando o gozo de todos os DRHP a todos os titulares, entre os quais todos os Apelantes.
B) Fê-lo por falta de certificado contra o risco de incêndio no empreendimento, já que nunca realizou as obras legalmente obrigatórias.
C) A entrada em vigor em 5 de Julho de 1997 do Decreto-Lei n.º 167/97 de 4 de Julho, tornou-se obrigatória, por força do disposto no seu art.º 78.º, a apresentação, pela entidade exploradora do empreendimento turístico, na Direcção-Geral do Turismo de certificado de conformidade das instalações, com as regras contidas no anexo II do Regulamento aprovado, pelo Decreto Regulamentar n.º 8/89 de 21 de Março.
D) Quer a 1.ª, quer a 2.ª Rés – sucessivas proprietárias do empreendimento – nunca realizaram as obras exigidas.
E) A lei considera da responsabilidade do proprietário do empreendimento a execução de obras atinentes à conservação deste, de modo a serem assegurados a prossecução dos fins a que se destina e a sua classificação, obras estas que no caso dos autos, são obras obrigatórias por força da lei, desta decorrendo (Decreto-Lei n.º 167/97 de 4 de Julho).
F) O legislador, no art.º 29.º do Decreto-Lei n.º 275/93, de 5 de Agosto, retira aos titulares/utentes de DRHP quaisquer responsabilidades, até no que concerne ao pagamento das obras legalmente obrigatórias, sendo clara essa intenção de os eximir da responsabilidade pelo pagamento de quaisquer encargos.
G) Tendo como base o conceito de benfeitorias necessárias ou, de acordo com a terminologia usada no regime jurídico de DRHP, obras de conservação, encaixa-se perfeitamente no sentido e âmbito dados pela expressão final do art.º 29.º: “nem pelo cumprimento das respectivas obrigações acessórias.”, uma vez que estas “respectivas obrigações acessórias”, integradas na esfera de responsabilidades do proprietário do empreendimento, respeitam, entre outras coisas, à conservação deste empreendimento, na qual seinclui o cumprimento das normas legais vigentes e, em consequência, a execução de obras legalmente determinadas.
H) Tais obras jamais se podem considerar como inovações já que se tratam de requisitos de manutenção do licenciamento do empreendimento turístico, e não de novos equipamentos que alterem ou transformem, por qualquer forma, as características dos apartamentos constituídos em DRHP.
I) Tais obras são da exclusiva responsabilidade do proprietário (a 1ª Ré).
J) Aliás como dos próprios títulos e das folhas anexas a todos os contractos de transmissão do DRHP entregues pelas Rés a cada titular consta que quem teria de prover pela conservação e necessidade de reparações sempre seria o proprietário dos apartamentos ou a entidade cessionária do empreendimento.
K) Saliente-se ainda as disposições constantes dos art.º 48.º, 49.º e 50.º do Decreto-Lei n.º 167/97 de 4 de Julho (o Diploma legal que obriga à execução das obras), disposições, essas, nas quais o legislador, uma vez mais, atribui as responsabilidades pela conservação do empreendimento à entidade exploradora ou, em sua substituição, aos proprietários (neste caso, a 1.ª Ré reúne as duas qualidades).
L) Esta é a solução mais adequada, porque quem procura fruir numa zona turística uma habitação por curto período de tempo, não deseja ter sobre si os encargos emergentes de uma administração que se prolongue para além daquele período e por essa razão “...o proprietário do imóvel de que fazem parte as fracções sujeitas ao direito de habitação periódica, deve manter estas em estado de conservação e limpeza condizentes com os fins a que se destinam.” (in DIREITO DAS COISAS, José Pinto Carneiro, Porto, 1990, pág. 186).
M) Por fim, compare-se a questão sub judicio com situações análogas no sistema jurídico português, quiçá à luz do art.º 10.º do Código Civil, como no caso do arrendamento urbano.
N) De acordo o n.º 1 do art.º 1074.º do Código Civil “cabe ao senhorio executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias, requeridas pelas leis vigentes ou pelo fim do contrato” o que se enquadra na obrigação geral de assegurar o gozo da coisa, prevista no art.º 1031.º, al. b) do mesmo código.
O) A qual, mutatis mutandis, é igual, quando confrontados, em planos paralelos, o proprietário do empreendimento (ali senhorio) e os titulares/utentes do DRHP (arrendatário), pois o primeiro tem a obrigação de assegurar o gozo da semana ao segundo, promovendo nesse sentido a realização de obras legalmente obrigatórias.
P) Até nos termos desta anologia, a execução e pagamento das obras será da responsabilidade da entidade exploradora do empreendimento ou proprietário deste (1ª Ré, “DD”).
Q) Tais obras envolvem apenas a adaptação do empreendimento às exigências da lei, implementando os requisitos que esta prescreve, sem implicar quaisquer modificações estruturais.
R) Relativamente ao enquadramento nas regras de propriedade horizontal será de concluir, aliás como o próprio legislador concluiu que não existem quaisquer semelhanças entre um regime em que o interessado é proprietário de uma fracção (condómino) e outro em que o interessado tem um direito que, embora tendo natureza real, se mostra muito diminuto face à nua propriedade.
S) O próprio legislador cuidou de retirar esse regime de subsidiariedade, e, nem tão pouco o deixando como elemento interpretativo de qualquer omissão.
T) O Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de Julho, obriga à realização das obras, dado que o empreendimento sem as mesmas não obterá o certificado de conformidade, pelo que tais obras têm de ser consideradas urgentes.
U) Sendo dever elementar de um administrador obviar pela rápida resolução dos problemas que se colocam na administração e/ou conservação do empreendimento, resolução essa, desde sempre, mal dirigida e colocada à apreciação e aprovação dos titulares do DRHP.
V) Má gestão do empreendimento pelas Rés “DD” e “EE” que não se resume a este problema, mas também a toda uma série acções e omissões que estão provadas e documentadas nos autos (bem como outras não documentadas por a própria Ré não querer juntar os documentos que só ela própria poderia dispor e intencionalmente não o fez, no que não pode sair premiada por este Tribunal).
W) Violação pelas mesmas Rés, de forma clara e gravosa, de uma média e normal administração, com sujeição ao decorrente do exposto nas alíneas e) e f) do art.º 36º do Decreto-Lei n.º 275/93, de 5 de Agosto.
X) Que se deve considerar como demonstrado pois, face à inversão do ónus da prova, a Ré “DD”, não logrou provar a sua boa administração (pois ela não ocorreu).
Y) Inversão decorrente da falta de colaboração processual e da ausência de cumprimento das decisões judiciais que lhe foram impostas nestes mesmos autos (douto despacho nestes autos proferido em 25/06/2013; refª 7016603) – artigos 529º e 519º, nº 2 do CPC, e do artigo 344º, nº 2 do Código Civil.
Z) Com o encerramento do empreendimento turístico as Rés mais não visam do que criarem condições, no fundo, coagirem e levarem os titulares de DRHP – entre os quais os AA. – à venda das semanas de que são proprietários por baixos preços, inclusivamente, com propostas concretas e quase igualitárias para as quatro épocas (baixa, média, alta e altíssima).
AA) De molde a extinguir o DRHP, pela reunião desses mesmos DRHP com o direito de propriedade plena, precisamente titulado pela 1.ª Ré.
BB) Esta acção da 1.ª Ré, de enquanto proprietária “cuidar de deteriorar o empreendimento”, para assim atingir os objectivos supra descritos foi concretizada em Outubro de 2007, através do envio a alguns dos titulares de DRHP duma proposta, consubstanciada num possível contrato-promessa de alienação das respectivas semanas, para atingirem a extinção dos DRHP constituídos.
CC) A 2.ª Ré é titular de 1209 (mil, duzentas e nove) semanas (21,95%) e a 3.ª Ré é titular de 1485 (mil, quatrocentas e oitenta e cinco) semanas (26,96%), do total das 5.508 (cinco mil, quinhentas e oito) semanas.
DD) Na Assembleia Geral de Titulares de DRHP de 4 de Novembro de 2006, 2.ª e 3.ª Ré votaram contra a realização de obras com vista à não obtenção de condições de segurança contra o risco de incêndios, de modo a que se não obtivesse a emissão pelo Serviço Nacional de Bombeiros do respectivo certificado de conformidade do empreendimento “Apartamentos TT”, para cumprimento do disposto no Decreto-Lei n.º 167/97 de 4 de Julho, Decreto Regulamentar n.º 34/97 de 17 de Fevereiro e Portaria n.º 1063/97 de 21 de Outubro.
EE) Logrando impedir a realização dessas obras e no fundo alcançaram o que realmente pretendiam, provocando o necessário encerramento do empreendimento turístico “Apartamentos TT”.
FF) Sabiam que com este seu voto provocavam o desrespeito de uma imposição legal, contra a lei, a criarem condições para extinguir os DRHP constituídos, para levar os titulares a aceitarem o que as Rés queriam: encerrar o empreendimento, extinguir o constituído direito real de habitação periódica.
GG) Sabiam que estavam a votar de modo a extinguir um direito que sabiam ter criado como vitalício, para atingirem um resultado que a lei não permite.
HH) Sabiam que tal extinção nunca seria aceite pela forma que a lei prevê, pois sabem que os outros titulares a isso se oporiam.
II) Um resultado contrário à natureza do DRHP que criaram como vitalício e não com um prazo de duração determinado.
JJ) Fazendo um uso abusivo dos seus direitos de votos maioritários.
KK) Actuaram por isso de forma ilícita, em claro abuso de direito, em confronto com os ditames da boa-fé e do respeito pelos princípios de ordem pública portuguesa (artigo 334º do Código Civil).
LL) Com esta actuação, pretenderam acautelar os seus próprios interesses, prejudicando quer os dos seus contitulares de DRHP quer o próprio empreendimento que ficaria inevitavelmente vetado ao encerramento.
MM) Actuando da forma descrita, no exercício, admite-se, de um direito que é válido em tese geral, foi este exercitado todavia, no caso concreto, em termos que são clamorosamente ofensivos da justiça, que configurará abuso do direito (v. Acórdão n.º 2049/2007-7 do Tribunal da Relação de Lisboa, 10 de Fevereiro de 2009).
NN) Exercitando posições jurídicas que contrariam os valores fundamentais do sistema, como a boa-fé a confiança (v. Acórdão n.º 96A003 do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Abril de 1996).
OO) Actuando as Rés com intenção de prejudicar ou de comprometer o gozo do direito de outrem e de criar uma desproporção objectiva entre a utilidade do exercício do direito por parte do seu titular e as consequências a suportar por aquele contra o qual é invocado (v. Acórdãon.º 203/08.0TTSNT.P1.S1, do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Novembro de 2011).
PP) O encerramento provocado pelas Rés priva os Apelantes de usarem, gozarem e fruírem das suas semanas.
QQ) Bem como se viram impossibilitados de acederem ao sistema de trocas internacionais através da associação deste empreendimento à “Interval International”.
RR) Tiveram e terão de procurar outros empreendimentos e outros locais para poderem usar, gozar e fruir do que faziam no empreendimento da 1.ª Ré.
SS) Isto enquanto perdurar o encerramento efectuado pela 1.ª Ré e a que a 2.ª e 3.ª Rés colaboraram e provocaram de forma ilícita e intencional.
TT) Causando as Rés, aos Apelantes, prejuízos patrimoniais e não patrimoniais avultadíssimos.
UU) Os quais se irão continuando a verificar e a agravar enquanto perdurar o encerramento do empreendimento e os Apelantes se virem impedidos de fazer uso de todos os direitos decorrentes de serem nela titulares de DRHP.
VV) Desrespeitou e não interpretou da melhor forma a douta sentença proferida no Tribunal “a quo” todas as disposições legais constantes destas Alegações.
WW) Devendo a mesma douta sentença “sub judice” ser revogada e proferido Venerando Acórdão que, julgando a presente acção como provada e procedente e, em consequência:
1) Condene a 1.ª Ré na execução e pagamento das obras legalmente exigidas, enquanto entidade exploradora do empreendimento e, outrossim, proprietária deste;
2) Condene a 1.ª Ré no pagamento de indemnização aos Apelantes, pelo não gozo das semanas e prejuízos patrimoniais e não patrimoniais daí resultantes, enquanto mantiver o encerramento do empreendimento “TT”, relegando-se a fixação dos seus concretos montantes para execução de sentença (já que, neste momento, é impossível aos Apelantes precisarem todos os prejuízos, os quais crescem semanalmente); Sem prescindir e apenas subsidiariamente,
3) Condene a 1.ª Ré na realização imediata das obras enquanto acto urgente de boa administração caso se entenda serem os titulares de DRHP os responsáveis pelo pagamento das obras legalmente exigíveis, que estão por realizar e nesta p.i. se deixaram descritas;
4) Condene as Rés no pagamento de indemnização aos Apelantes, pelo não gozo das semanas e prejuízos patrimoniais e não patrimoniais daí resultantes, enquanto se mantiver o encerramento do empreendimento “TT”, relegando-se a fixação dos seus concretos montantes para execução de sentença (já que, neste momento, é impossível aos Apelantes precisarem todos os prejuízos, os quais crescem semanalmente).
14. A Ré DD, contra-alegou pedindo a manutenção da sentença recorrida, como os seguintes fundamentos:
1.ª Ficou provado que as obras em discussão nos presentes autos são classificadas como obras de inovação.
2.ª De acordo com o art. 28.º do DL n.º 278/93, de 5 de Agosto (na redacção dada pelo DL n.º 180/99, de 22 de Maio), que revogou o DL n.º 130/89, de 18 de Abril, o proprietário das unidades de alojamento sujeitas ao regime dos DRHP só pode realizar obras que constituam inovações nas unidades de alojamento com o consentimento dos titulares, a prestar em Assembleia Geral.
3.ª É patente que a realização de obras de instalação de um sistema de prevenção contra incêndios, cujo orçamento ascende a € 1.200.000,00, não podem ser consideradas obras de conservação ou de reparação nem constituem benfeitorias necessárias, mas sim obras de carácter estrutural e extraordinário, resultantes de uma imposição legal, que alteram a substância do empreendimento turístico aqui em discussão.
4.ª Ficou provado que o facto de as obras serem exigíveis por lei não dispensava o consentimento.
5.ª A Ré carecia do consentimento da Assembleia Geral, onde se incluem os recorrentes, enquanto entidade exploradora para realizar as obras em causa.
6.ª Na realidade e conforme consta da acta n.º 18, o ponto único da ordem de trabalhos foi a Discussão e deliberação sobre a realização das obras extraordinárias (Cf. doc. 23 junto com a contestação).
7.ª Não tendo os titulares de DRHP autorizado a realização das obras, serão estes e apenas estes os responsáveis por essa conduta e suas consequências.
8.ª Estamos sim perante um acto consciente e deliberado dos titulares de DRHP que foi a deliberação de não realização das obras de segurança que originaram a impossibilidade de fruição dos apartamentos em virtude de estarem em situação violadora de normas de segurança.
9.ª Caso a Ré realizasse as obras, estaria a violar uma deliberação da assembleia-geral (órgão com competência para deliberar sobre tais obras) e uma regra contratual, estabelecida no ponto 7.2 do Anexo I constante de fls. 19, onde se estabelece que (…) as obras nos apartamentos que constituem inovações, só podem ser realizadas pelo proprietário, ainda que por sua conta, desde que os titulares dos Direitos de Habitação Periódica que sobre eles incidam, dêem o seu consentimento. (…).
10.ª Sendo o impedimento de fruição totalmente imputável aos titulares de DRHP, onde se incluem os recorridos, não pode ser imputada à Ré qualquer responsabilidade no pagamento de indemnização.
11.ª Foram os próprios titulares de DRHP a rejeitar, por maioria, a realização das obras, pelo que, nunca poderia a Ré, realizar essas obras violando expressamente essa deliberação da maioria, sob pena de praticarem um acto ilegal.
15. Cumpre apreciar e decidir.
* II – Objecto do recurso
Como é sabido, o objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, pelo que, no caso, importa decidir:
(i) Se compete à 1ª R. a execução e pagamento das obras inerentes a possibilitar a emissão do certificado de conformidade no âmbito da segurança contra incêndios, cuja não execução determinou o encerramento do empreendimento turístico “Apartamentos TT”, independentemente da deliberação da assembleia-geral dos titulares de DRHP, que não aprovou a realização das obras; e
(ii) Se os AA. têm direito a ser indemnizados pela 1ª R. pelos prejuízos resultantes da impossibilidade de utilização das unidades de alojamento sobre os quais detinham DRHP, nos períodos temporais contratualizados; ou,
(iii) Se a 1ª R. deve ser condenada na realização imediata das ditas obras enquanto “acto urgente de boa administração”, caso se entenda serem os titulares de DRHP os responsáveis pelo pagamento das obras legalmente exigidas e, ainda,
(iv) Se devem as RR. ser condenadas no pagamento de indemnização aos AA. apelantes pelos prejuízos acima referidos, enquanto se mantiver o encerramento do empreendimento.
* III – Fundamentação
A) - Os Factos
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
[Dos pontos 1 a 240 da matéria de facto provada consta a identificação dos autores e dos respectivos direitos reais de habitação periódica de que são titulares].
241. Os referidos direitos reais de habitação periódica foram constituídos por escritura pública realizada no dia 11/08/1989, no Cartório Notarial de Portimão.
242. Nessa altura, o empreendimento turístico objecto dos DRHP encontrava-se inscrito na conservatória do registo predial de Portimão pela apresentação 08/231089, sobe a inscrição F2, sobre o prédio descrito (...)a favor da Ré EE.
243. Quando em Setembro de 2005, a EE, declarou vender 108 fracções constituídas em regime de DRHP à Ré DD, SA, a qual declarou comprar.
244. Encontra-se inscrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão, pela apresentação 39/290905, a favor da ré DD, o prédio referido em 242.
245. A ré DD SA, é também a administradora desse empreendimento.
246. No dia 04 de Novembro de 2006, realizou-se uma assembleia geral extraordinária de titulares de DRHP, a qual teve como ponto único da ordem de trabalhos "Discussão e deliberação sobre a realização das obras extraordinária (segurança contra incêndios) na TT, para cumprimento do disposto no Decreto - Lei n.º 368/99, de 18 de Setembro e na Portaria n.º 1299/01, de 21 de Novembro quanto as zonas Comerciais e do disposto no Regulamento de Empreendimento Turístico, Decreto-Regulamentar n.º 8/99 , de 21 de Fevereiro, entretanto revogado pelo Decreto-lei n.º 167/97, de 4 de Julho ( com as alterações introduzidas pelos Decretos - Lei n.º 305/99, de 06 de Agosto e n.º 55/2002 , de 11 de Março) e regulamentada pelo Decreto -Regulamentar na 34/97, de 17 de Fevereiro (com as alterações introduzidas pelos Decretos -Regulamentares n.º 14/99 , de 14 de Agosto e n.º 6/00, de 27 de Maio) e pela portaria n.º 1063/97 , de 21 de Outubro, com vista à emissão pelo Serviço Nacional de Bombeiros do respectivo Certificado de Conformidade, na parte que diz respeito ao Direito Real de habitação periódica e sobre as consequências derivadas para o empreendimento turístico da sua eventual não aprovação".
247. Na assembleia-geral referida no ponto anterior foi sujeito a deliberação o ponto único aí referido e este foi rejeitado por maioria.
248. Na assembleia-geral de 04 de Novembro de 2006, a segunda e terceira Rés votaram contra a realização de obras com vista à obtenção de condições de segurança contra o risco de incêndio.
249. Desde o dia 11 de Dezembro de 2006 que a l.ª Ré procedeu ao encerramento do empreendimento turístico com todos os seus serviços, ficando os autores sem possibilidade de aí acederam.
250. Em 11 de Dezembro de 2006 os autores receberam carta da administração do proprietário do empreendimento turístico, dando conhecimento do encerramento referido no ponto anterior.
251. A primeira Ré justificou o encerramento com a falta de certificado contra o risco de incêndio.
252. À data da constituição do empreendimento TT, este tinha classificação de 4 estrelas.
253. À data do encerramento, o empreendimento TT tinha classificação de 3 estrelas.
254. Os Autores, com o encerramento, viram-se impossibilitados de acederem ao sistema de trocas internacionais através da associação deste empreendimento à " Interval International".
255. O empreendimento TT tinha uma piscina aberta todo o ano e com acesso gratuito aos titulares de direito real de habitação periódica.
256. O referido empreendimento está situado na Praia da Rocha com acesso e perto de praias, restaurantes, bares, lojas e diversões.
257. A Praia da Rocha e uma zona do país com muita procura nacional e estrangeira nas épocas da Passagem de ano, Carnaval, Páscoa e Primavera a Verão.
258. A Ré EE é uma sociedade comercial que exerce a sua actividade na área da compra, venda, revenda e administração de bens móveis, gestão e administração de sociedades, participações financeiras, empreendimentos turísticos e imobiliários próprios ou alheios.
259. A ré FF é uma sociedade comercial que exerce a sua actividade na área do estudo projecto, desenvolvimento e execução e comercialização de empreendimentos imobiliários, aquisição para revenda e administração de imóveis.
260. Em Março de 2006, os valores respeitantes à prestação periódica devida pelos titulares do direito real de habitação periódica variava entre € 135,65 e €215,45 consoante se tratasse de tipologias 1 / 2 ou 3 e o tipo de semana em causa.
261. No ano de 2004, as obras tendentes a possibilitar a emissão do certificado pelo serviço nacional de bombeiros foram orçamentadas, a pedido da ré DD, em cerca de € 1.200.000,00.
262. A ré DD na sequência do encerramento do empreendimento turístico, propôs a extinção do regime de direito real de habitação periódica e posterior alienação das fracções autónomas e distribuição da produção da venda da seguinte forma : a) atribuição e 20% do valor da venda de cada fracção ao detentor da nua propriedade DD; b) atribuição dos restantes 80% de cada fracção aos titulares de direitos reais de habitação periódica, com sua divisão por 52 semanas e ponderação consoante a receptiva época.
263. A proposta referida no ponto anterior foi aceite pela rés EE e FF, as quais pretendiam que tal solução lhes permitisse resolver o impasse económico em que se encontravam, tendo sido com esse propósito que votaram negativamente na assembleia acima referida.
264. Com data de 30 de Outubro de 1997, a DGT informou a ré DD da necessidade daquela apresentar no prazo de 6 meses o certificado de segurança.
265. No dia 19 de Dezembro de 1997, a ré DD informa a Direcção Geral de Turismo, que o projecto de segurança contra riscos de incêndio se encontra em apreciação no serviço nacional de bombeiros desde 09 de Dezembro de 2006, não tendo esta ultima entidade dado qualquer resposta ao mesmo.
266. Em 28 de Janeiro de 1998 a DD informou a Direcção Geral do Turismo da recepção do parecer do Serviço Nacional de Bombeiros e da necessidade de ser feito um estudo técnico/económico para que a ré DD pudesse apresentar solução ao Serviço Nacional de Bombeiros.
267. Em 19 de Abril de 2002, a ré DD informou a Inspecção Distrital de Bombeiros, das soluções que está disposta a contemplar para adequação do empreendimento às regras respeitantes à segurança contra incêndios.
268. Por iniciativa da ré DD, desde 2001, foram realizadas 12 assembleias gerais de titulares de direitos reais de habitação periódica, nas quais foi abordado o tema respeitante à necessidade de realização de obras de adequação do equipamento turístico do projecto para execução de um sistema automático para atenção de incêndios e da necessidade e a sua entrega no serviço nacional bombeiros para aprovação.
269. As obras não foram realizadas.
270. A Sociedade de Revisores Oficiais de Contas LL & Associados elaborou três pareceres sobre o exame efectuado às contas respeitantes à utilização das prestações periódicas pagas pelos titulares dos direitos de habitação periódica do empreendimento "Apartamentos TT", contas que compreendem as receitas e os gastos referentes, respectivamente, aos anos de 2003, 2004 e 2005, com o teor de fls. 340 a 342 dos autos apensos de providência cautelar, pareceres cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
271. A ré DD não procedeu, ao longo dos anos, à renovação do mobiliário, como cortinados, sofás, talheres, os quais revelam sinais de degradação.
272. A ré DD retirou toda a sinalética e placares que convidavam a frequentar o Restaurante, com parque de estacionamento, o snack-bar, o empreendimento na sua globalidade, tendo a l.ª Ré, em meados de 2004, retirado a identificação existente no topo do edifício com placar luminoso do próprio empreendimento.
273. Encerrou o bar e restaurante em dias de grande procura do empreendimento, nomeadamente nos dias de passagem de ano, como aconteceu no dia 1 de Janeiro de 2006, quando decorria a prova automobilística Lisboa-Portimão-Dakar 2006, o que se voltou a verificar na edição de 2007.
274. O mesmo sucedeu na Páscoa, verificando-se ainda a abertura tardia do bar para pequenos-almoços, com excepção do mês de Agosto, o que levava os utentes a procurar outros empreendimentos.
275. Existia falta de informação aos titulares do Direito Real de Habitação Periódica, nomeadamente para apresentação nas assembleias-gerais de titulares de direitos reais de habitação periódica.
276. Existia falta de informações sobre a utilização e trocas internacionais de semanas de DRHP, na "Interval Internacional".
277. Os autores tiveram de procurar outros empreendimentos e outros locais para poderem usar tal qual faziam no empreendimento turístico TT.
278. A ré DD solicitou ao Serviço Nacional de Bombeiros a aprovação de projecto de segurança contra riscos de incêndio.
*
B) – O Direito 1. Não subsistem dúvidas de que o empreendimento em causa nestes autos encontra-se submetido ao regime jurídico dos direitos reais de habitação periódica (DRHP), sendo os AA. titulares de direitos reais desse tipo, os quais não foram postos em causa, mas cujo exercício lhes foi impossibilitado em virtude do encerramento do empreendimento turístico, motivado pela desconformidade em matéria de segurança contra incêndios, por falta de realização de obras para o efeito (instalação de um sistema de prevenção contra incêndios), o que impediu os AA. de usufruirem da utilização das referidas unidades nos períodos temporais contratados.
Efectivamente, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 167/97 de 4 de Julho (diploma que estabeleceu o novo regime jurídico da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos), tornou-se obrigatória, por força do disposto no seu artigo 78.°, a apresentação, pela entidade exploradora do empreendimento turístico, na Direcção-Geral do Turismo, de certificado de conformidade das instalações com as regras de segurança contra riscos de incêndio constantes do anexo II ao regulamento aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 8/89, de 21 de Março.
No que respeita às obras que são necessárias à emissão do certificado de conformidade das instalações contra riscos de incêndio, legalmente exigido, a primeira questão que se coloca consiste em saber se a 1ª Ré está obrigada à sua realização e se o pode fazer sem estar autorizada pela assembleia de titulares dos DRHP.
Vejamos:
2. À data da constituição dos referidos direitos reais de habitação periódica em causa nos autos, em 11 de Agosto de 1989, o empreendimento turístico objecto dos DRHP encontrava-se inscrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão a favor da Ré EE (2ª R.), a qual, em Setembro de 2005, declarou vender 108 fracções constituídas em regime de DRHP à Ré DD, SA. (1ª R.), que as declarou comprar, encontrando-se o registo de aquisição a favor desta inscrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão, pela apresentação 39/290905.
Deste modo, a 1ª R. é simultaneamente proprietária e administradora do empreendimento em causa nos autos (cf. pontos 241 a 245 da matéria de facto provada).
3. O regime jurídico dos direitos reais de habitação periódica aplicável à situação em apreço é o previsto no Decreto-Lei n.º 275/93, de 5 de Agosto (que revogou o anterior regime constante do Decreto-Lei n.º 130/89, de 18 de Abril), com as alterações resultantes do Decreto-Lei n.º 180/99, de 22 de Maio, do Decreto-Lei n.º 22/2002, de 31 de Janeiro, e do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março [actualmente este regime ainda sofreu as alterações impostas pelo Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho, e pelo Decreto-Lei n.º 37/2001, de 10 de Março, este último que procedeu à republicação do texto consolidado].
Como se sabe, o direito real de habitação periódica consiste num direito sobre um imóvel destinado a fins turísticos, cujo conteúdo essencial é a faculdade de gozo do mesmo para fins habitacionais, de modo temporário e cíclico (cf. artigos. 1º e 3º, n.º 2, e 21º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 275/93).
Trata-se, pois, de um direito real de gozo, que coexiste com o direito de propriedade sobre os imóveis a que se reportam, como resulta, entre outros, dos artigos 2º, 21º, n.º1, alínea b), in fine, 25º, 31º e 36º, do Decreto-Lei n.º 275/93.
Do regime jurídico regulado neste diploma resultam direitos e deveres diversos e específicos para os titulares dos DRHP e para os proprietários dos imóveis a eles sujeitos.
No que para o caso em apreço releva, estabelece-se no artigo 25º que: “1 - A administração e conservação das unidades de alojamento sujeitas ao regime do direito real de habitação periódica, do seu equipamento e recheio e das instalações e equipamentos de uso comum do empreendimento incumbem ao respectivo proprietário.”
Por sua vez, prescreve-se no n.º 1 do artigo 26º do mesmo diploma, que: “As unidades de alojamento sujeitas ao regime do direito real de habitação periódica, bem como os respectivos equipamentos e mobiliário, devem ser mantidos pela entidade responsável em estado de conservação e limpeza compatível com os fins a que se destinam e com a classificação do empreendimento.”
Destes preceitos resulta, pois, que é ao proprietário do empreendimento que compete a administração do mesmo (não obstante, poder ceder a sua exploração) e zelar pela conservação e limpeza das unidades de alojamento, devendo fazer as reparações indispensáveis ao exercício normal do direito.
4. Porém, o proprietário tem o seu direito de propriedade limitado pelo facto de não poder executar por sua livre iniciativa todo o tipo de obras, ainda que por sua conta, posto que está impedido de realizar obras que constituam inovações nas unidades de alojamento, sem o consentimento dos titulares dos DRHP, prestado em assembleia.
Efectivamente, com se estipula no artigo 28º, “[o] proprietário das unidades de alojamento sujeitas ao regime de direitos reais de habitação periódica só pode realizar obras que constituam inovações nas unidades de alojamento, ainda que por sua conta, com o consentimento dos titulares, a prestar em assembleia geral” [o mesmo já sucedia no âmbito da anterior legislação (cf. artigo 17º do Decreto-Lei n.º 130/89, de 18 de Abril)].
Não nos diz o Decreto-Lei n.º 275/93 o que se entende por “obras de inovação”, mas este conceito não pode ter um alcance diferente do previsto no artigo 1425º do Código Civil, relativo às “obras que constituem inovações” em sede propriedade horizontal, no qual, como referem Pires de Lima e Antunes Varela, “… cabem tanto as alterações introduzidas na substância ou na forma da coisa, como as modificações estabelecidas na afectação ou destino da coisa. Tanto constitui inovação a construção de uma nova garagem, como a instalação de um pára-raios, de um sistema de ar condicionado, de um ascensor, de uma piscina, ou a afectação de um pátio a lugar de acesso ao cinema instalado numa das fracções autónomas” (Código Civil Anotado, Volume 3º, nota 3 ao artigo 1425º).
Neste contexto, e estando em causa a realização de obras de instalação de um sistema de prevenção contra riscos de incêndio no aldeamento, cujo orçamento ascende a € 1.200.000, não podem tais obras ser consideradas obras como de conservação ou de reparação, nem constituem benfeitorias necessárias, mas sim obras de carácter estrutural e extraordinário, que alteram a substância do empreendimento turístico aqui em discussão. Trata-se, aqui, de acrescentar algo de novo à coisa, dotando-a de um equipamento que a mesma não possuía.
Deste modo, a realização destas obras (de inovação), ainda que por conta do proprietário do empreendimento ou da entidade gestora, em princípio, só poderiam ser levadas a cabo pelo proprietário ou pela entidade gestora do aldeamento com o consentimento dos titulares dos DRHP, a prestar em assembleia geral por maioria simples (cf. n.º 7 do artigo 35º do Decreto-Lei n.º 275/93), ao contrário do que sucede no âmbito da propriedade horizontal em que se exige maioria qualificada (cf. artigo 1425º do Código Civil).
5. Ora, como resulta dos factos provados, no dia 4 de Novembro de 2006, realizou-se uma assembleia-geral extraordinária de titulares de direitos reais de habitação periódica, (DRHP's), a qual teve como ponto único da ordem de trabalhos: “Discussão e deliberação sobre a realização das obras extraordinárias (segurança contra incêndios) na TT, para cumprimento do disposto no Decreto-Lei nº 368/99, de 18 de Setembro e na Portaria n.º 1299/01, de 21 de Novembro quanto às zonas Comerciais e do disposto no Regulamento de Empreendimento Turístico, Decreto-Regulamentar n.º 8/99, de 21 de Fevereiro, entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de Julho (com as alterações introduzidas pelos Decretos-Lei nº 305/99, de 06 Agosto e nº 55/2002, de 11 de Março) e regulamentado pelo Decreto-Regulamentar nº 34/97, de 17 de Fevereiro (com as alterações introduzidas pelos Decretos-Regulamentares n.º 14/99, de 14 de Agosto e nº 6/00, de 27 de Maio) e pela portaria nº 1063/97, de 21 de Outubro, com vista à emissão pelo Serviço Nacional de Bombeiros do respectivo Certificado de Conformidade, na parte que diz respeito ao Direito Real de Habitação Periódica e sobre as consequências derivadas para o empreendimento turístico da sua eventual não aprovação.” (cf. ponto 246 dos factos provados)
Este ponto único em discussão mereceu rejeição por maioria (cf. ponto 247 dos factos provados), pelo que não existiu consentimento dos titulares dos DRHP para que a proprietária e administradora das unidades de alojamento, sujeitas a tal regime, procedesse às obras necessárias e essenciais, para que pudesse ser conferido, pela entidade competente, o certificado de conformidade no que se refere à segurança contra riscos de incêndio de molde a possibilitar a utilização dos apartamentos.
Nessa assembleia-geral, o que foi discutido e sujeito a deliberação foi a própria realização das obras, e não apenas o respectivo pagamento.
Neste contexto, e na esteira do Acórdão desta Relação de 15/09/2010 (proc. n.º 1592/08.1TBPTM.E1, disponível em www.dgsi.pt), proferido num processo referente ao mesmo empreendimento turístico que está em causa nestes autos e sobre a mesma questão aqui em apreciação - onde se entendeu que as obras em apreço, respeitantes genericamente à instalação de um sistema de prevenção contra incêndios nos “apartamentos turísticos”, não podem deixar de considerar-se inovações perante o nosso quadro legal, já que são “alterações na substância e na forma da coisa”, e, como tal, a sua realização necessita da aprovação em assembleia-geral -, concluiu-se na decisão recorrida, tal como no citado aresto, que, sem o consentimento expresso da Assembleia de Titulares dos DRHP, não podia a 1ª R., enquanto proprietária e administradora do empreendimento, proceder à realização das obras em causa.
6. Porém, com o devido respeito por opinião contrária, apesar de se concordar com o entendimento de que as obras em causa constituem obras de inovação, como acima se deixou expresso, não se aceita que no caso específico dos autos, a realização destas obras deva ficar sujeita ao regime de autorização pelos titulares dos DRHP, previsto no artigo 28º do citado Decreto-Lei n.º 275/93, devendo ser feita uma interpretação restritiva deste preceito no sentido de não abranger a realização de obras que resultem do cumprimento de uma imposição legal.
De facto, só faz sentido que os titulares dos DRHP deliberem sobre a realização das obras se estiver na titularidade dos mesmos a disponibilidade desse direito (de fazer ou não as obras), caso contrário estar-se-ia a permitir que aqueles titulares decidissem em sentido contrário à lei.
Com tal norma pretendeu o legislador obstar a que, por iniciativa do proprietário ou do cessionário da exploração, os titulares dos DRHP pudessem ver os seus direitos de gozo sobre o imóvel ou complexo turístico em que este se integra alterados, na sua forma ou substância, em função de obras que unilateralmente aqueles entendam realizar e que estes considerem ser prejudiciais ou onerosas para os seus direitos. Daí a submissão da sua realização à autorização da assembleia-geral dos titulares dos DRHP. Mas, está-se a pensar em obras facultativas, que por conveniência dos proprietários ou dos cessionários devam ser realizadas.
Ora, essa autorização não faz sentido quando as obras resultam de uma imposição legal e são essenciais e imprescindíveis ao gozo dos direitos dos titulares dos DRHP. Aliás, não se compreenderia que pudesse estar na disponibilidade de uma maioria a faculdade de realização ou não de tais obras, quando da sua não realização resulta o encerramento do aldeamento e o consequente impedimento de gozo dos direitos que os titulares dos DRHP possuem. Se assim fosse, e independentemente das razões que levaram, no caso, ao apuramento de uma maioria desfavorável à realização das obras, os restantes titulares (minoritários) ficariam reféns de tal deliberação e impedidos de gozar os direitos que legalmente adquiriram, e os proprietários ou aqueles a quem estes tivessem cedido a exploração do aldeamento teriam que cessar esta sua actividade.
Deste modo, resultando do artigo 78º do Decreto-Lei n.º 167/97 (diploma que estabelece o regime jurídico da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos) que “[a]s entidades exploradoras dos empreendimentos turísticos existentes e em funcionamento à data da entrada deste diploma, cujo projecto de segurança contra riscos de incêndio esteja em apreciação no Serviço Nacional de Bombeiros, ou em que se estejam a proceder às obras determinadas por aquele Serviço destinadas a dar cumprimento às regras de segurança contra riscos de incêndio constantes do anexo II ao regulamento aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 8/89, de 21 de Março, devem apresentar na Direcção-Geral do Turismo o certificado de conformidade das instalações com aquelas regras de segurança …”, não pode a entidade exploradora do empreendimento, seja a proprietária ou terceiro a quem aquela haja cedido a exploração do mesmo, ficar dependente da autorização dos titulares de DRHP para a realização das obras necessárias à obtenção e apresentação do dito certificado, que constitui condição para a manutenção em funcionamento do empreendimento, sob pena de se frustrarem os direitos dos titulares que não votaram contra essa autorização e do proprietário e/ou explorador do empreendimento, que face à não obtenção da referida autorização teria que cessar esta sua actividade em consequência do encerramento do empreendimento, por não cumprir os requisitos legais de funcionamento.
Neste contexto interpretativo que se perfilha é, pois, ao proprietário, ao qual compete a administração das unidades de alojamento objecto do direito real de habitação, que cabe promover a realização das obras necessárias à obtenção do certificado de conformidade das instalações com aquelas regras de segurança, independentemente da autorização dos titulares de DRHP.
7. Aqui chegados, a questão que, agora, com pertinência se coloca consiste em saber quem deve ser onerado com o custo das referidas obras.
É que, como se disse, estas obras não são simples obras de conservação ou manutenção, que, nos termos dos artigos 25º e 27º do Decreto-Lei n.º 275/93, incumbe ao proprietário ou ao cessionário realizar e para as quais os titulares de DRHP tem o dever contratual e legal de contribuir com o pagamento anual da prestação periódica a que se reportam os artigos 22º a 24º do citado diploma.
Porém, o pagamento destas obras inovatórias decorrentes de imposição legal e imprescindíveis à obtenção da certificação se segurança necessária à manutenção do aldeamento em funcionamento, não pode deixar de pertencer ao proprietário do empreendimento.
Efectivamente, embora não resulte expressamente, nem do regime jurídico dos DRHP, nem do diploma que regula a instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos, os citados Decreto-Lei n.º 275/93 e Decreto-Lei n.º 167/97, o custo com as obras, que não constituindo meras obras de conservação ou de reparação do empreendimento turístico, são, no entanto, necessárias para a sua manutenção em funcionamento, incumbe necessariamente ao proprietário, por ser a este que compete, salvo disposição em contrário, dotar o empreendimento das condições necessárias para o prosseguimento da sua finalidade, ou seja, permitir aos titulares dos DRHP o gozo, uso e fruição dos imóveis, nas semanas de férias que adquiriram.
Por outro lado, não resulta do Decreto-Lei n.º 275/93, que, como já salientado, estabelece o regime jurídico dos DRHP, que os titulares destes direitos tenham de pagar para gozo dos direitos que adquiriam quaisquer outras quantias para além da prevista no artigo 22º, indicada no título constitutivo, a qual pode ser alterada nos termos previstos no artigo 24º, que se destina-se exclusivamente a compensar o proprietário das unidades de alojamento sujeitas ao regime dos direitos reais de habitação periódica das despesas com os serviços de utilização e exploração turística a que as mesmas estão sujeitas, contribuições e impostos e quaisquer outras previstas no título de constituição, e a remunerá-lo pela sua gestão, não podendo ser-lhe dada diferente utilização, a qual, podendo variar de valor consoante a época do ano a que se reporta o direito real de habitação periódica, deve ser proporcional à fruição do empreendimento pelo titular do direito (cf. n.ºs 2 e 3 do artigo 22º).
8. Argumenta-se que o proprietário não pode ser onerado com tal pagamento, porque a obrigação de implementação do projecto de segurança contra riscos de incêndio, que surgiu legalmente em 1997, com o Decreto-Lei n.º 167/97, é uma obrigação superveniente à constituição do empreendimento turístico em apreço e dos respectivos DRHP, que teve lugar em 1989, e, como tal, constitui uma alteração anormal das circunstâncias em que o proprietário do empreendimento turístico sujeito ao regime de DRHP fundou a sua decisão de assumir a posição de proprietário, não podendo por isso os custos dessa obrigação recair integralmente sobre ele.
Embora seja verdade que a imposição da obtenção do referido certificado de prevenção contra incêndios é posterior à constituição dos DRHP, e se afigurar líquido que o então proprietário, como não teve que executar as obras inerentes à obtenção desse certificado, não fez reflectir esses custos no valor de aquisição dos referidos direitos, certo é que a 1ª R., actual proprietária do empreendimento, à data da aquisição já sabia da necessidade de realização das obras necessárias à obtenção do dito certificado, pois, quando adquiriu o imóvel em 2005, essa obrigação legal já existia e a 1ª R. tinha disso conhecimento, o que ocorria, pelo menos desde Outubro de 1997 (basta atentar nos factos provados descritos nos pontos 264 a 268 e 261).
Deste modo, ainda que tenha havido “alteração das circunstâncias”, tal alteração ainda que fosse relevante, não podia aproveitar à ora proprietária do empreendimento.
9. Em conclusão, dever a 1ª R., enquanto proprietária e exploradora do empreendimento em causa, executar e pagar as obras estritamente necessárias à obtenção do certificado de conformidade do aldeamento com as regras de prevenção contra riscos de incêndio, legalmente exigido no artigo 78º do Decreto-Lei n.º167/97.
10. Pretendem ainda os AA. a condenação da 1ª R., no pagamento de uma indemnização pelo não gozo das semanas a que tinham direito e pelos prejuízos patrimoniais e não patrimoniais daí resultantes, enquanto se mantiver o encerramento do referido empreendimento, a fixar em execução de sentença.
Porém, aqui não lhes assiste razão.
Senão, vejamos:
É verdade que a 1ª R. não realizou as obras a que, como vimos, estava obrigada e que devia ter feito apesar da deliberação negativa da assembleia-geral dos titulares dos DRHP, e que foi a falta de realização das ditas obras que originou o encerramento do empreendimento em Dezembro de 2006, privando os AA. do gozo das suas férias no empreendimento, ou noutros empreendimentos associados, a que podiam aceder através do “sistema de trocas internacionais”, como se refere no ponto 254 da matéria de facto, o que, em princípio, constituiria a 1ª R. na obrigação de indemnizar os AA. pelos prejuízos decorrentes do incumprimento da obrigação contratualmente assumida.
Contudo, não obstante a deliberação da assembleia-geral dos titulares dos DRHB não ser necessária para a realização das obras em causa, da mesma resulta clara a intenção dos titulares dos DRHP no sentido de rejeitarem a realização das obras.
Deste modo, assumindo os titulares dos DRHP posição no sentido da não realização das obras, não podem, sob pena de abuso de direito, previsto no artigo 343º do Código Civil, vir reclamar da 1ª R. os prejuízos resultantes da sua não realização, quando sabiam quais as consequências que daí decorriam.
Nos termos do disposto no artigo 334.° do Código Civil, é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
O legislador sufragou a concepção objectivista do abuso de direito - que proclama que não é preciso que o agente tenha consciência da contrariedade do seu acto à boa fé, aos bons costumes ou ao fim social ou económico, exigindo-se, contudo, que o titular do direito tenha excedido manifestamente esses limites impostos ao seu exercício.
Como sustenta Coutinho de Abreu (Do Abuso de Direito, 1983, pág. 55), “as pessoas devem ter um certo comportamento honesto, correcto, leal, nomeadamente no exercício dos direitos e deveres, não defraudando a legitima confiança ou expectativa nos
outros”.
Com o instituto do abuso de direito, está em causa, nomeadamente, a tutela da confiança, pois, “poder confiar é uma condição básica de toda a convivência pacífica e da cooperação entre os homens” (Batista Machado, Obra Dispersa, VoI. I, pág. 352).
Ora, na situação dos autos, não é aceitável que, tendo os titulares dos DRHP deliberado por maioria rejeitar a realização das obras, venham agora invocar a não realização dessas obras para sustentar o direito a serem indemnizados pelos prejuízos decorrentes do encerramento do empreendimento, por via da não realização dessas mesmas obras, sob pena de “venire contra factum proprium”.
Na sua estrutura, o venire pressupõe duas condutas da mesma pessoa, ambas lícitas, mas assumidas em momentos distintos e distanciadas no tempo, em que a primeira (o factum proprium) é contraditada pela segunda (o venire), de modo que essa relação de oposição entre as duas justifique a invocação do princípio do abuso de direito.
O venire tem a sua razão de ser no princípio da confiança enquanto exigência de que as pessoas sejam protegidas quando, em termos justificados, tenham sido conduzidas a acreditar na manutenção de determinados comportamentos da comunidade humana, que se encontra organizada na base de relacionamentos estáveis, em que cada um deve ser congruente, não mudando constante e arbitrariamente de condutas, mormente que sejam nocivas ao seu semelhante.
Ora, tendo os titulares dos DRHP deliberado contra a realização das obras, tal conduta, independentemente da eficácia da deliberação, é incompatível com a posição agora assumida de indemnização pelos prejuízos ocasionados por via da não realização dessas mesmas obras, e é susceptível de inculcar na proprietária e administradora do empreendimento a convicção de que sem aquela autorização não podia executar as obras, pelo que não pode ser condenada pelos prejuízos relacionados por tal situação.
E, não se diga que os AA. não participaram na deliberação, ou que foram a 2ª e 3ª RR. que maioritariamente impuseram a sua vontade em manifesto abuso do direito de voto, porquanto, a deliberação foi aprovada por maioria e não foi impugnada, pelo que não poderá deixar de vincular os AA. ainda que nela não tenham participado.
11. De resto, como se diz na sentença recorrida, não ocorre a prática de qualquer acto ilícito por parte das RR., que implique a sua condenação no pagamento da peticionada indemnização, nomeadamente em consequência do exercício do direito de voto na aludida assembleia-geral.
Na verdade, não obstante ter ficado provado que a 2ª e 3ª RR., na assembleia-geral de 4 de Novembro de 2006, votaram contra a realização das obras com vista à obtenção de condições de segurança contra o risco de incêndio, e que a 1ª R., na sequência do encerramento do empreendimento turístico, propôs a extinção do regime de direito real de habitação periódica e posterior alienação das fracções autónomas e distribuição do produto da venda pela forma indicada no ponto 262 dos factos provados [a) atribuição de 20% do valor da venda de cada fracção ao detentor da nua propriedade DD; b) atribuição dos restantes 80% de cada fracção aos titulares de direitos reais de habitação periódica com sua divisão por 52 semanas e ponderação consoante a receptiva época], tendo esta proposta sido aceite pela 2ª e 3ª RR. (EE e FF), as quais pretendiam que tal solução lhes permitisse resolver o impasse económico em que se encontravam, tendo sido com esse propósito que votaram negativamente na assembleia acima referida (cf. ponto 263 dos factos provados), tais factos não permitem concluir, que o exercício do direito de voto por estas RR. “exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé”, de modo a tornar ilegítimo o exercício do direito de voto, nos termos em que foi exercido, ou que tal acto consubstancie uma actuação ilícita, pois as RR. limitaram-se a agir de acordo com os seus interesses e a defendê-los na referida assembleia-geral, no exercício dos seus direitos reais de habitação periódica. E, tal deliberação nem era necessária para a realização das obras em causa, como acima se concluiu.
Quanto aos demais actos praticados pela 1ª R. no que toca à administração, gestão e conservação do empreendimento, designadamente os referidos nos pontos 271 a 276 dos factos provados, tais actos não relevam para a sorte da acção, pois não foram eles que ditaram a decisão de encerramento do empreendimento, que está na base da pretensão da indemnização pedida pelos AA..
12. Em face do exposto, procede parcialmente a apelação, devendo, em consequência ser a 1ª R. condenada, enquanto proprietária e exploradora do empreendimento em causa, a executar e pagar as obras estritamente necessárias à obtenção do certificado de conformidade do aldeamento com as regras de prevenção contra riscos de incêndio, legalmente exigido no artigo 78º do Decreto-Lei n.º167/97.
No mais improcede a apelação.
Porque parcialmente vencidas ambas as partes na acção e no recurso, as custas nas duas instâncias ficam a cargo dos AA. e das RR. na propor de ½ para cada.
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C) - Sumário
I - No regime jurídico da habitação periódica é ao proprietário do empreendimento que compete a administração do mesmo (não obstante, poder ceder a sua exploração) e zelar pela conservação e limpeza das unidades de alojamento, devendo fazer reparações indispensáveis ao exercício normal do direito, mas as obras que constituam inovações nas aludidas unidades, ainda que por sua conta, estão sujeitas e dependentes de consentimento dos titulares do Direito Real de Habitação Periódica (DRHP) a prestar em assembleia-geral.
II - Havendo necessidade de realização de inovações nas unidades de alojamento e, não tendo a assembleia-geral dos titulares de DRHP dado consentimento para a realização de tais obras, não pode o proprietário/administrador das aludidas unidades proceder à sua realização, face ao disposto no artigo 28º do Decreto-Lei n.º 275/93, de 5 de Agosto.
III - Porém, este preceito legal deve ser interpretado restritivamente, no sentido de não abranger no seu âmbito de aplicação a realização de obras que resultem do cumprimento de uma imposição legal.
IV - Sendo tais obras necessárias para a manutenção em funcionamento do empreendimento onde se mostram constituídos os DRHP, é ao proprietário, administrador do empreendimento, que compete executar e custear a realização das obras, por ser ao mesmo que incumbe dotar o empreendimento das condições necessárias de modo a permitir aos titulares dos DRHP o direito de gozo, uso e fruição dos imóveis, nas semanas de férias que adquiriram.
V - Não é lícito, sob pena de abuso de direito, aos titulares de DRHP exigirem indemnização, com fundamento na impossibilidade de exercício do direito de usar a unidade habitacional, contra a proprietária e administradora, quando antes deliberaram maioritariamente contra a realização das obras cuja falta esteve na base do encerramento do empreendimento.
* V – Decisão
Nestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência:
a) Condenar a 1ª R. a executar e a pagar as obras estritamente necessárias à obtenção do certificado de conformidade do empreendimento em causa nos autos com as regras de prevenção contra riscos de incêndio legalmente exigido;
b) Absolver as RR. do demais peticionado; e
c) Condenar AA. e RR. nas custas em 1ª e 2ª instância, na proporção de ½ para cada.
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Évora, 29 de Janeiro de 2015
(Francisco Xavier)
(Elisabete Valente)
(Maria Alexandra Santos)