Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
CITAÇÃO
SOCIEDADE COMERCIAL
Sumário
Deve considerar-se como regularmente efectuada a citação de sociedade comercial, feita na pessoa do seu gerente, que à data da citação havia cessado funções de gerência por renúncia, e que só posteriormente à data da citação promoveu o registo e publicação da cessação das suas funções.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
“A….. Sociedade Imobiliária, SA” intentou a presente acção ordinária contra “B…., Lda” e outros.
A fls. 28 vem a R. “B… Lda”., invocar a sua falta de citação.
Na sequência deste requerimento veio a ser proferida decisão judicial do seguinte teor:
“Veio a ré arguir, nos termos do art. 195º, do CPC, a sua falta de citação por ter havido erro de identidade do citando.
Devidamente notificada, a parte contrária não se pronunciou.
Apreciando e decidindo
Não obstante os documentos juntos pela ré arguente atestarem que, na data em que ocorreu a citação, a pessoa que foi, pelo solicitador, citada como legal representante já não tinha essa qualidade, a verdade é que, cremos, não pode obter procedência o peticionado.
Com efeito, compulsado o teor da certidão de registo comercial da ré, verificação que a cessação de funções do cargo de gerente por parte de F……., ocorrida em 6 de Agosto de 2006, apenas foi levada ao registo em 25.02.2009, portanto em data posterior à operada citação.
De harmonia com as disposições combinadas dos arts. 166º, do CSC, 3º, nº1, al.m), 14º, nº2, 15º e 70º, do C. Registo Comercial, estão sujeitos a registo e publicação obrigatórios, além do mais, a cessação de funções de gerência por renúncia, facto esse que só produz efeitos contra terceiros depois da data da publicação do registo.
Desta forma, a obrigatoriedade do registo e a necessidade do mesmo para produzir efeitos quanto a terceiros tem aplicação na situação vertente nos autos, uma vez que não pode entender-se que a cessação de funções de gerente é oponível à contraparte - e ao agente de execução - terceira em relação ao acto praticado pela própria sociedade que do qual não foi atempadamente dado conhecimento público registal.
Assim é que "uma sociedade deve ter-se como regularmente citada se tal ocorrer na pessoa que, apesar de ter cessado funções de administrador, continuava, no momento, a ter a posição de representante legal da sociedade perante terceiros, por ainda figurar no registo comercial como sendo administrador dessa sociedade" (Ac. R.C. de 12.02.2008, proc. nº 598/07.2TBLRA.C1, in http://www.dgsi.pt).
Nos termos e pelos invocados fundamentos, cremos que a citação efectuada o foi de forma regular, pelo que se indefere a arguida falta de citação”.
Não se tendo conformado com tal decisão, a demandada dela interpôs recurso, o qual foi recebido como apelação, com subida imediata, em separado dos autos principais e com efeito devolutivo.
Na alegação de recurso que apresentou, a requerida/apelante tece as seguintes considerações:
Considera o douto despacho agravado que a sociedade, ora agravante se considerava ter sido citada na pessoa do anterior representante legal da sociedade.
Contudo, impõe-se concluir que o que define a vida de uma sociedade não é o que consta no Registo Comercial mas aquilo que relativamente ao objecto do contrato de sociedade foram deliberando os seus sócios.
Ora, é verdade que, nos termos do artigo 14º do Código de Registo Comercial, os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros após o respectivo registo, nomeadamente os actos dos administradores, quando praticados em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhe confere.
No caso concreto, não estamos perante um acto negocial de um administrador que pratica actos em nome da sociedade quando de facto e de direito já não o é.
O que está em causa na presente acção é a definição concreta de quem é o representante legal da sociedade, ora demandada, para a poder representar em juízo.
Em segundo lugar, o Tribunal a quo teve conhecimento, para além dos documentos juntos aos autos e referidos no despacho de que ora se recorre, através do requerimento de falta de citação apresentado pela ora sociedade apelante, de que o representante legal da sociedade era outro diferente do constante no Registo Comercial.
A função da citação é permitir a defesa do réu contra o pedido formulado pelo autor o que só pode ser efectivamente praticado se à acção for chamada a Ré, na pessoa do seu representante legal.
Não estando o representante legal completamente definido, sendo certo que é o ora representante da apelante e não a pessoa que se intitulou como tal no acto de citação da ora apelante para a presente acção, pelo menos com fundamento nos documentos juntos aos autos, não pode a ré ser considerada devidamente citada.
Porquanto não será possível a defesa apropriada da ré porquanto a citação se verificou na pessoa que, à data, já não era o representante legal da sociedade.
Termina, pedindo, que na procedência do recurso se anule o douto despacho em recurso, e se ordene, para os devidos e legais efeitos, a falta de citação e consequente nulidade de todo o processado após a petição inicial.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
Matéria de facto com interesse para a decisão de direito, para além da constante do Relatório:
Da certidão de citação pessoal, consta que no dia 01-08-2008 foi efectuada a citação de F……., na pessoa de representante legal de “B….. Lda.”.
Esta citação foi efectuada pelo Solicitador de Execução.
Compulsado o teor da certidão de registo comercial da ré, verifica-se que a cessação de funções do cargo de gerente por parte de F………, ocorreu em 6 de Agosto de 2006, mas apenas foi levada ao registo em 25.02.2009, portanto, em data posterior à operada citação.
O Direito
É pelas conclusões das alegações de recurso que se fixa e delimita o objecto dos recursos (cfr. artºs 684, nº 3, e 690, nº 1, do CPC).
A única questão que importa aqui apreciar e decidir traduz-se em saber se a requerida/apelante se deve ou não considerar como tendo sido regularmente citada para o presente processo.
Vejamos.
Como se sabe, as sociedades são citadas na pessoa de um representante legal –artº 231º, nº1 do CPC.
As sociedades são representadas por quem a lei, os estatutos ou o seu pacto social designarem – artº21º nº1 do CPC -.
Nos termos do estatuído no artº166º do Código das SociedadesComerciais/CSC, os actos relativos às sociedades estão sujeitos a registo e publicação nos termos da lei respectiva.
Resulta do disposto nas disposições conjugadas dos artºs 3, nº 1 al m), 15, nº 1, e 70, nº 1, do Código do Registo Comercial (CRC) que quer a designação, quer a cessação de funções, por qualquer causa que não tenha a ver com o decurso do tempo, dos órgãos de administração das sociedades, são factos que estão sujeitos a registo e publicação obrigatórios (o mesmo podendo, inclusive, também dizer-se em relação à mudança da sede da sociedade, no termos da al. o) do nº 1 daquele primeiro normativo legal e demais preceitos legais citados).
Factos esses que, por força do estatuído no artº 14, nº 2, daquele mesmo diploma legal, só produzem efeitos contra terceiros depois da data da publicação do registo dos mesmos, isto é, tais factos só são oponíveis a terceiros depois da data em que o seu registo for publicado.
O nº 3 do citado artº14º do CRC dispõe que, a falta de registo não pode ser oposta aos interessados pelos representantes legais das sociedades, a quem incumbe a obrigação de o promover, sem prejuízo do estabelecido no Código das Sociedades Comerciais.
Por outro lado, o artº 168, nº 2, do Código das Sociedades Comerciais (CSC), dispõe que “a sociedade não pode opor a terceiros actos cuja publicação seja obrigatória sem que esta esteja efectuada, salvo se a sociedade provar que o acto está registado e que o terceiro tem conhecimento deles”.
Decorre daí que a responsabilidade da falta do registo da sua renúncia da gerência é imputável à requerida sociedade em geral e também à recorrente face ao que antes se disse sobre a especificidade das regras registrais em matéria comercial.
As enunciadas regras têm a ver com a necessidade de proteger os muitos intervenientes no comércio jurídico, os quais, pelas notórias razões que presidem ao comércio em geral, não podem conhecer como interlocutores comerciais senão aqueles que estão publicitados através do respectivo registo.
Reportando-nos ao caso em apreço, verifica-se que quando foi levada a efeito a citação da requerida/apelante na pessoa de F……, este ainda figurava no registo comercial como sendo o gerente daquela, não tendo ainda sido promovido o registo e publicação da cessação das suas funções (registo esse que só veio a ocorrer mais tarde, ou seja, em 25/02/2009).
Assim e face nomeadamente às normas registrais supra citadas, na altura em que foi citado F…………, este, apesar de ter cessado funções de gerência por renúncia, continuava, todavia, a ter a posição de representante legal da sociedade requerida, perante terceiros.
E desse modo é de considerar como regulamente efectuada a citação da ré, na pessoa de F…….
No sentido defendido, vidé Ac.do STJ de 25/06/1996, in “BMJ 458 – 354”(abordando uma situação muito idêntica à destes autos);Ac. do STJ de 17/12/1997, in “BMJ 472 – 521”; Ac. RP de 02/12/1999, in “JTRP000276287/ITIJ/Net” e o prof. Seabra Lopes, in “Ob. cit., págs. 215/216 e 260”.
Pelo que fica exposto, não nos merece qualquer reparo, o impugnado despacho que julgou válida a citação da requerida na pessoa do mencionado F………, por este constar no respectivo registo como sendo seu gerente.
DECISÃO
Assim e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente o presente recurso e consequentemente, mantêm o decidido pelo Tribunal a quo.
Custas pela recorrente.