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DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
FALECIMENTO DE ADVOGADO
Sumário
1 – No processo declarativo a deserção só ocorre quando o processo estiver parado há mais de seis meses, por negligência das partes em impulsionarem o seu andamento. 2 – No caso de falecimento do mandatário das rés, tal negligência por parte da autora, não se verifica, se por ela foi, oportunamente, dado conhecimento ao tribunal do facto e ao mesmo tempo requereu, desde logo, caso tal falecimento fosse confirmado, a notificação dos réus para constituírem novo mandatário, não tendo o tribunal tido em consideração tal solicitação, deixando correr o prazo, sem providenciar pela notificação. Sumário do Relator
Texto Integral
Apelação n.º 257/03.5TBCTX-C.E1 (2ª Secção Cível)
ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
No âmbito do processo n.ºs 257/03.5TBCTX-C a correr termos na Comarca de Santarém (Santarém – Instância Central – Secção de Comércio – J1) em que Massa Falida de Cerâmica Central da (…), Lda., demanda (…) – Indústria de Cerâmica, S. A. e (…) – Construções Civis, S. A., tendo em 07/01/2014, sido proferida decisão do seguinte teor:
“Nos presentes autos, por despacho de 21-11-2011 foi determinada a suspensão da instância em virtude do falecimento do Il. Mandatário dos réus, ao abrigo do disposto no artigo 276º, n.º1, al. b), do CPC (actual artigo 269º, n.º1, al. b), do NCPC).
Até à presente data, tendo decorrido mais de dois anos, não foi constituído novo mandatário pelos réus, e nada foi requerido pela autora, nomeadamente para efeitos do previsto no artigo 276º, n.º 3, do NCPC.
Em 01-09-2013, entrou em vigor o NCPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho.
Nos termos do artigo 281º, n.º1, do NCPC, a instância considera-se deserta quando o processo se encontre a aguardar o seu impulso processual há mais de 6 meses.
No caso, por negligência da autora, uma vez que poderia ter feito uso do disposto no aludido artigo 276º, n.º 3, do NCPC, os autos encontram-se sem qualquer impulso processual há mais de dois anos, tendo já decorrido o prazo de 6 meses desde a entrada em vigor do NCPC.
Em face do exposto, declaro deserta e consequentemente extinta a instância, ao abrigo do disposto no artigo 277º, al. c), do NCPC.
Custas pela autora.”
Irresignada, com tal decisão, veio a autora interpor o presente recurso, terminando, nas suas alegações, por formular as seguintes «conclusões» [1] que se transcrevem: “A. Vem o presente recurso interposto da decisão que declara deserta e, consequentemente, extinta a instância, ao abrigo do disposto no art.º 277.º, al. c), do NCPC.
B. Porquanto, por despacho de 21/11/2012 foi determinada a suspensão da instância em virtude do falecimento do I. Mandatário dos réus,
C. Tendo decorrido mais de dois anos sem que os Réus tenham constituído novo mandatário e sem nada ter sido requerido pela Autora, nomeadamente para efeitos do disposto no art.º 276.º, n.º 3, do NCPC.
D. Determinando a sentença que, por negligência da Autora, uma vez que poderia ter feito uso do disposto no aludido art.º 276.º, n.º 3, do NCPC, os autos encontram-se sem impulso processual há mais de dois anos.
E. A Autora não se conforma com tal decisão, designadamente porque, em requerimento datado de 23/10/2012, a Patrona ora signatária requer que, caso seja confirmado pela OA o óbito do I. Colega, sejam notificados os Réus para constituírem novo mandatário!
F. Em face do requerimento da signatária, foi aberta conclusão em 29/10/2012 e determinado pela Mm.ª Juiz "a quo”: "Oficie a Ordem dos Advogados para que prestem a informação referida e, em caso afirmativo solicite e junte aos autos certidão do assento de óbito." G. Nada sendo determinado ou ordenado, pela Mm.ª Juiz "a quo", relativamente à parte final do requerimento da ora signatária, designadamente, quanto à notificação dos Réus para constituírem novo mandatário.
H. Tal configura uma omissão de pronúncia pelo Tribunal "a quo", o qual, em face da requerida notificação dos Réus para constituição de novo mandatário, nada disse nem ordenou!
I. Sendo certo que, a notificação dos Réus requerida pela Autora constitui uma questão essencial ao regular andamento processual da instância.
J. Assim sendo, os presentes autos não se encontravam a aguardar qualquer impulso processual das partes, nomeadamente da Autora, mas sim impulso processual por parte do douto tribunal "a quo", o qual deveria ter-se pronunciado quanto à requerida notificação dos Réus para constituição de mandatário!
K. A omissão de pronúncia sobre o requerimento da signatária constitui uma omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreve, pelo que caí na previsão do art.º 195.º do NCPC e, por isso, configura uma irregularidade que determina a nulidade do processado subsequente àquela omissão,
L. Ou seja, a nulidade do despacho datado de 21/11/2012 em que a Mm.ª juiz "a quo" determina a suspensão da instância e também a nulidade da Douta sentença sob recurso.
M. Sendo nulos, o referido despacho e a sentença em apreço, deverá ser determinado que o Mm.º Juiz do Tribunal "a quo" se pronuncie sobre o requerimento da signatária em que requer a notificação dos Réus para constituírem novo mandatário, ordenando-se o cumprimentos de tal notificação, o que se requer a V. Exas..”
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Apreciando e decidindo
O objecto do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso.
Assim, a questão a apreciar cinge-se em saber se o despacho impugnado deve ser revogado, por não se verificarem os pressupostos previstos na lei para que ocorra a deserção da instância.
Com vista a apreciar a questão há que ter em conta, atenta a sua relevância, seguinte matéria factual:
- Por requerimento de 23/10/2012 a ilustre patrona oficiosa da autora veio dar conhecimento ao tribunal que terá falecido o ilustre mandatário das rés, requerendo que o tribunal confirmasse tal realidade e ordenasse o que tivesse por conveniente “nomeadamente, caso seja confirmado o óbito do mandatário das rés, sejam estas notificadas para constituírem novo mandatário”.
Foi solicitada pelo Tribunal o envio de certidão de óbito pela qual se comprovou ter o Ilustre mandatário das rés falecido no dia 02/01/2012.
Por despacho de 21/11/2012 foi declarada suspensa a instância e foi dada sem efeito a realização da audiência de julgamento, tendo tal despacho sido notificado aos legais representantes de ambas a rés, por cartas registadas de 23/11/2012, com a informação que a instância tinha sido suspensa “em virtude do conhecimento nos autos do falecimento do Ilustre Mandatário das rés…”.
- Em 07/01/2014 foi proferida decisão, ora impugnada.
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Conhecendo da questão
Desde já diremos que a decisão recorrida, quanto a nós, não se mostra ajustada, pelo que haverá que reconhecer a razão à recorrente.
Nos termos do disposto no artigo 281º do CPC, disposição que regula a deserção da instância, a mesma considera-se deserta “quando por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar o impulso processual há mais de seis meses.”
Assim, para além do prazo de seis meses é necessário, para que se possa aproveitar a previsão legal da norma, que exista negligência das partes em promover o andamento do processo.
No caso dos autos a situação de eventual negligência a apurar respeita à autora, uma vez que o fundamento da deserção, no que respeita à negligência, decorre de, no entender do tribunal, a autora não ter feito uso do disposto no artº 276º, n.º 3, do CPC, ou seja, não ter requerido que a parte contrária fosse notificada para dentro de um prazo que for fixado constituir novo advogado.
Mas quanto à autora, não podemos reconhecer, que da sua parte, existiu a negligência que lhe é apontada no despacho recorrido, uma vez que até se mostrou bastante diligente vindo ao tribunal prestar a informação sobre o falecimento do mandatário das rés e requerendo logo, ab initio, que estas fossem notificadas para constituírem novo mandatário, certamente no prazo que o tribunal tivesse por oportuno.
Dos factos dados como assentes, o que resulta não é uma situação de negligência da autora, mas sim uma omissão do tribunal na tramitação processual decorrente do que foi requerido pela autora.
Pois, como se pode verificar o tribunal nem sequer ordenou, na notificação que fez aos legais representantes das rés, que as mesmas constituíssem novo advogado, mesmo que não lhe tivesse fixado qualquer prazo para o efeito.
Decorre de tal circunstancialismo factual que não se verifica inércia ou negligência da autora em promover o andamento processual, pois, quanto a nós requereu atempadamente ao tribunal que as rés fossem notificadas para constituírem novo advogado e isso basta para que o tribunal diligencie nesse sentido, não impondo a lei, à parte, o ónus de indicar o prazo para a constituição de novo advogado, já que tal é da competência do juiz que “deve fixar o prazo que lhe parecer razoável e ordenar a notificação”. [2]
Não se verifica, assim, a negligência da autora que lhe é imputada na decisão recorrida, pelo que, impõe-se a procedência da apelação e a revogação da decisão impugnada.
DECISÂO
Pelo exposto, decide-se julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogar decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra que possibilite a adequada tramitação processual dos autos.
Sem custas.
Évora, 03 de Dezembro de 2015
Mata Ribeiro
Sílvio Teixeira de Sousa
Rui Machado e Moura
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[1] - Consignámos conclusões entre aspas, porque o ilustre patrona da autora limita-se a fazer um mero decalque da matéria explanada nas alegações (trocando apenas os números por letras), sem apresentar umas verdadeiras conclusões tal como a lei prevê, as quais devem ser sintéticas, concisas, claras e precisas - v. Ac. STJ de 06/04/2000 in Sumários, 40º, 25 e Cardona Ferreira in Guia de Recursos em Processo Civil, Coimbra Editora, 3ª edição, 73; Abrantes Geraldes in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 124.
[2] - v. Alberto dos Reis in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 3º, 1946, 397.