CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL
TITULO DE CONDUÇÃO ESTRANGEIRO CADUCADO
Sumário


I – O título de condução emitido por Estado estrangeiro, que tenha habilitado o seu portador à condução de veículos em Portugal, ao abrigo do disposto nas als. c) e d) do nº 1 do art. 125.º do Código da Estrada, uma vez ultrapassado o respetivo prazo de validade, deixa irremediavelmente de ser passível de substituição por carta de condução portuguesa ou sequer, a emissão a partir dele de um documento desta natureza, sem necessidade de aguardar o prazo de 5 anos previsto, referido na al. d) do nº 3 do art. 130º do referido diploma legal.

II – O regime de caducidade e cancelamento previsto nos n.ºs 1 a 6 do artigo 130.º do Código da Estrada só se aplica aos títulos de condução emitidos pelo Estado Português, pelo que a coima cominada no n.º7 do mesmo artigo é também privativa dessa categoria de títulos.

III - A detenção pelo arguido, aquando da prática dos factos por que responde, de um título de condução brasileiro, caducado há menos de cinco anos, é inócua para o efeito de afastar a tipicidade do art. 3.º do DL nº.º2/98, de 3 de Janeiro.

Texto Integral


ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

I - Relatório

No Processo Comum nº 651/13.3PAPTM, que correu termos no Tribunal da Comarca de Faro, Instância Local de Portimão, Secção Criminal, foi proferida, em 28/3/14, sentença em que se decidiu:

Alterar a qualificação jurídica dos factos imputados ao Arguido A. e condená-lo pela prática, como autor material, de um crime de Condução Sem Habilitação Legal previsto e punido pelo artigo 3º, nº 1 do Decreto-Lei nº 02/98, de 3 de Janeiro na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à razão diária de e 5,00 (cinco euros), o que perfaz o total de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), a que correspondem 33 (trinta e três) dias de prisão subsidiária;

Com base nos seguintes factos, que então se deram como provados:

1.No dia 16 de Maio de 2013, pelas 00h30m, no Largo Sárrea Prado, em Portimão, o Arguido conduzia o ciclomotor de matrícula --FO--, sem ser titular de título de condução válido ou de documento equivalente que o habilitasse a tal.

2. O Arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que não possuía título de condução válido para conduzir aquele veículo na via pública.

3. Mais sabia que a sua conduta é proibida e punida por lei.

Mais se apurou que

4. O Arguido é titular de carta de condução emitida pela República Federativa do Brasil, com validade até 16.01.2013.

5. Do Certificado de Registo Criminal do Arguido consta uma condenação, por decisão de 03.06.2013, transitada em 03.07.2013 e proferida no âmbito do Processo Sumário nº 755/13.2PAPTM, do 1º Juízo Criminal deste Tribunal Judicial de Portimão, pela prática, em 03.06.2013, de um crime de Condução Sem Habilitação Legal, na pena de 50 dias de multa.

Da referida sentença o MP veio interpor recurso devidamente motivado, formulando as seguintes conclusões:

1.A definição do conceito normativo “falta de habilitação legal” para efeitos do tipo objectivo previsto no artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, emerge directamente do artigo 130.º do Código da Estrada: título cancelado por decorrido mais de 5 anos do prazo de renovação - crime; título caducado há menos de 5 anos - contra-ordenação.

2. Independentente da forma, requisitos, procedimento administrativo para a sua substituição, definidos no RHLC, se o título de condução emitido por um país aderente à Convenção Internacional de Viena, de 8 de Novembro de 1968, como é o caso da República Federativa do Brasil, à dita Convenção é reconhecido em Portugal por efeito de convenção internacional vinculativa de ambos os Estados, daí tem de ser retiradas todas as consequências inerentes a tal reconhecimento.

3. O artigo 130.º, em particular o disposto no seu n.º 7, aplica-se quer aos títulos de condução emitidos em Portugal, de que sejam portadores cidadãos nacionais ou estrangeiros, residentes em Portugal, bem como aos títulos de condução emitidos noutros países, de que sejam portadores cidadãos nacionais e estrangeiros, residentes em Portugal.

4. A letra do preceito em causa (130.º, n.º 7 do Código da Estrada) é clara e se a lei não distingue (nem o poderia fazer, atento o principio da igualdade vertido na CRP no artigo 13.º, subjacente na sua elaboração e aplicação/interpretação) não cabe ao intérprete fazê-lo.

5. Assim, no caso concreto, o título de condução do arguido não é válido, por ter caducado quatro meses antes dos factos descritos no auto de notícia.

6. Pelo que, a conduta cometida pelo arguido - condução de veículo a motor por portador de um título de condução caducado há menos de 5 anos - constituí contra-ordenação, prevista e punida pelo artigo 130.º, nº 7, do Código da Estrada, com coima de € 120 a € 600.

7. Ao condenar o arguido A. em pena de multa pela prática de um crime de condução sem habilitação, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, a Mma. Juiz violou, por interpretação errónea, o disposto no aludido artigo, bem como o vertido no artigo 130.º, n.º 7, do Código da Estrada.

8. Deste modo, deve a sentença proferida pelo Mma Juiz a quo ser revogada, devendo ser proferida decisão que absolva o arguido A. da prática do crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro e o condene pela prática da contra-ordenação, p. e p. pelo artigo 130.º, n.º 7, do Código da Estrada.

O recurso interposto foi admitido com subida imediata, nos próprios autos, e efeito suspensivo.

O arguido foi notificado da motivação do recurso, mas não exerceu o seu direito de resposta.

O Digno Procurador-Geral Adjunto em funções junto desta Relação emitiu parecer sobre o recurso admitido, em que pugnou pela procedência deste.

O parecer emitido foi notificado ao arguido, para se pronunciar, o qual, uma vez mais, nada disse.

Foram colhidos os vistos legais e procedeu-se à conferência.

II - Fundamentação
Nos recursos penais, o «thema decidendum» é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, as quais deixámos enunciadas supra.

A sindicância da sentença recorrida, expressa pelo MP nas suas conclusões, versa exclusivamente sobre matéria jurídica e resume-se à questão de saber se a factualidade apurada em julgamento é de molde a integrar a prática pelo arguido de um crime p. e p. pelo art. 3º nº 1 do DL nº 2/98 de 3 /1, pelo qual o arguido foi condenado em primeira instância, ou, pelo contrário, de uma contra-ordenação prevista no nº 7 do art. 130º do CE, conforme propugnado pelo Digno Recorrente.

A questão suscitada foi já expressamente discutida no segmento da fundamentação da sentença recorrida dedicado ao enquadramento jurídico-penal dos factos, que a seguir reproduzimos (transcrição com diferente tipo de letra):

D. Enquadramento Jurídico-Penal

Nos termos do artigo 3º, nºs 1 e 2 do Decreto-Lei nº 02/98, de 3 de Janeiro da Estrada é punido com prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.

"1 - Quem conduzir veiculo a motor na via pública ou equiparada sem para tal estar habilitado nos termos do Código

2 - Se o agente conduzir, nos termos do número anterior, motociclo ou automóvel a pena é de prisão até 2 anos ou
multa até 240 dias".

O crime de Condução Sem Habilitação Legal apresenta-se como um crime de perigo abstracto, que tutela a segurança rodoviária.

Os elementos constitutivos do crime em análise são, pois:
- A condução na via pública ou equiparada;
- A inexistência de título legítimo que habilite o condutor a exercer a condução de veículo (artigos 121º e 122º, nº 1 do Código da Estrada); e
- O dolo (elemento subjectivo do tipo).

In casu, constata-se que o Arguido conduzia um ciclomotor na via pública (cfr, artigo 1º, a. a), do Código da Estrada).

Quanto à habilitação legal, diz o artigo 121º, nº 1 do referido diploma legal que

"Só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver legalmente habilitado para o efeito".

Ora, verificou-se que o Arguido não era detentor de título legal válido que o habilitasse a conduzir.

Provou-se, contudo, que o Arguido é titular de carta de condução emitida pela República Federativa do Brasil, cuja validade terminou em 16.01.2013.

Efectivamente, o Despacho n.º 10942/2000, publicado na 2ª série do Diário da República, em 27.05.2000 (invocado pela Defesa), veio reconhecer que "As carteiras nacionais de habilitação brasileiras (CNH) que se apresentem dentro do seu prazo de validade habilitam à condução de veiculas em território nacional, ao abrigo da alínea e) do nº 1 do artigo 125º do Código da Estrada".

Tal norma remete expressamente para o disposto no artigo 125.º do Código da Estrada, o qual se refere a "Outros títulos", designadamente:

a) Títulos de condução emitidos pelos serviços competentes pela administração portuguesa do território de Macau;

b) Títulos de condução emitidas por outros Estados membros da União Europeia ou do espaço económico europeu;

c) Títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro em conformidade com o anexo nº 9 da Convenção Internacional de Genebra, de 19 de setembro de 1949, sobre circulação rodoviária, ou com o anexo nº 6 da Convenção Internacional de Viena, de 8 de novembro de 1968, sobre circulação rodoviária;

d) Títulos de condução emitidas por Estado estrangeiro, desde que este reconheça idêntica validade aos títulos nacionais;

e) Licenças internacionais de condução, desde que apresentadas com o titulo nacional que as suporta;

f) Licenças especiais de condução de ciclomotores;

g) Licenças especiais de condução;

h) Autorizações especiais de condução; e

i) Autorizações temporárias de condução.

E, na mesma sequência, decorre dos nºs 3 e 5 do mesmo artigo que os titulares dos titulos de condução referidos em c), d) e e) apenas podem conduzir em Portugal nos primeiros 185 dias subsequentes à fixação da sua residência, sendo que, caso o faça para além disso e sendo titular de licença válida, incorrerá na prática de uma contra-ordenação punível com coima de € 300,00 a e 1.500,00.

Como se vê, a lei prevê expressamente a sanção a aplicar em caso de violação do disposto do artigo 125º, mas desde que o condutor seja detentor de título de condução válido.

Por seu turno, o artigo 130º do Código da Estrada prevê que a caducidade do título de condução (nº 1) e que o título de condução é cancelado quando tenha caducado há mais de 5 anos sem que seja revalidado (nº 3, al. d), sendo que apenas os titulares de título de condução cancelado é que se consideram não habilitados a conduzir (nº 5).

Contudo, ao contrário do douto entendimento seguido no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 15.05.2013, disponível na Internet, in www.dgsi.pt, entende-se que o referido artigo 130º não se aplica aos títulos de condução previstos no artigo 125º.

Com efeito, o artigo 130º, nº 1 do Código da Estrada refere-se à caducidade de título de condução nos seguintes casos:

a)Título não revalidado nos termos fixados no Regulamento da Habilitação Legal Para Conduzir; e

b) Decisão do tribunal nos termos do artigo 129º, nº 5 do Código da Estrada e que determine a submissão do condutor a avaliação médica, psicológica, exame de condução ou a qualquer das suas provas sem que o titular se submeta às mesmas ou reprove.

E é a tais situações de caducidade que se deve aplicar o previsto no nº 3, al. d) e o nº7 do mesmo artigo, onde não cabe a eventual revalidação de carta de condução emitida por Estado estrangeiro.

Aliás, relativamente a esta, o Regulamento da Habilitação Legal Para Conduzir apenas prevê a sua substituição, nos termos constantes do artigo 37º e, também neste caso, se exige que o condutor seja detentor de título de condução válido.

E, quer o artigo 125º quer o artigo 128º, também pressupõem a existência de um título de condução válido (condição da troca por carta de condução portuguesa).

No caso em apreço, encontrando-se já o título de condução fora da sua validade desde Janeiro de 2013, não será possível a sua troca, nos termos do referido artigo 128º, pelo que não se poderá considerar o ora Arguido habilitado a conduzir.

Mal se compreenderia, aliás, que, ao titular de carta de condução estrangeira válida fosse aplicada uma coima entre € 300,00 e 1.500,00 e ao titular de carta de condução caducada (até ao prazo de 5 anos) fosse aplicada apenas uma coima fixada entre € 120.000 a € 600,00, com fundamento na mera eventualidade do mesmo, poder, nesse prazo (bastante alargado e muito além dos 185 dias previsto nos artigo 125º do Código da Estrada), vir a revalidá-la (desconhecendo-se, no entanto, as condições de tal revalidação no país emissor do título de condução estrangeiro e sequer se tal revalidação é possível).

Estar-se-ia a favorecer o condutor titular de carta de condução estrangeira que, não só negligenciou a sua troca por título de condução português, como a deixou caducar e, ainda assim, procedeu ao exercício da condução de veículo a motor.

Entende-se, deste modo e em suma, que o artigo 130.º do Código da Estrada não se aplica aos títulos de condução emitidos por Estados Estrangeiros, pelo que a situação dos autos não consubstancia a contra-ordenação prevista no nº 7 do mesmo artigo.

Por outro lado e não sendo o Arguido detentor de título de condução válido, também não poderemos enquadrar a sua conduta no artigo 125º, nº 5 do Código da Estrada, concluindo-se, pois, que, nas circunstâncias dos autos, o mesmo não se encontrava legalmente habilitado a conduzir o ciclomotor, como o fez.

Assim e tendo o Arguido agido de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que não podia conduzir o referido ciclomotor na via pública sem estar munido do competente título de condução válido, a sua conduta preenche os elementos típicos do crime de Condução Sem Habilitação Legal previsto e punido pelo artigo 3º, nº 1 do Decreto-Lei nº 02/98, de 3 de Janeiro (e não do nº 2, uma vez que o Arguido conduzia um ciclomotor), devendo ser condenado pelo mesmo.

O Digno Recorrente fez basear a sua pretensão numa argumentação centrada na interpretação do normativo do art. 130º do CE.

Contudo, uma correcta interpretação do referido normativo implicará que se tome na devida consideração outros preceitos do mesmo diploma legal e mesmo com origem noutras fontes, que possam de uma forma ou de outra condicionar o sentido da norma interpretanda.

É nisso que consiste, no fundo, o elemento sistemático da interpretação, a que se alude também na motivação do recurso.

O art. 130º do CE é do seguinte teor:

1 - O título de condução caduca se:

a) Não for revalidado, nos termos fixados no RHLC, quanto às categorias abrangidas pela necessidade de revalidação, salvo se o respetivo titular demonstrar ter sido titular de documento idêntico e válido durante esse período;

b) O seu titular não se submeter ou reprovar na avaliação médica ou psicológica, no exame de condução ou em qualquer das suas provas, determinados ao abrigo dos n.ºs 1 e 5 do artigo anterior.

2- A revalidação de título de condução caducado fica sujeita à aprovação do seu titular em exame especial de condução, cujo conteúdo e características são fixados no RHLC, sempre que:

a) A causa de caducidade prevista na alínea a) do número anterior tenha ocorrido há mais de dois anos, com exceção da revalidação dos títulos das categorias AM, A1, A2, A, B1, B e BE cujos titulares não tenham completado 50 anos;

b) O título se encontre caducado há mais de um ano, nos termos da alínea b) do número anterior.

3- O título de condução é cancelado quando:

a) Se encontrar em regime probatório e o seu titular for condenado, por sentença judicial ou decisão administrativa transitadas em julgado, pela prática de crime ligado ao exercício da condução, de uma contraordenação muito grave ou de segunda contraordenação grave;

b) For cassado nos termos do artigo 148.º do presente Código ou do artigo 101.º do Código Penal;

c) O titular reprove, pela segunda vez, no exame especial de condução a que for submetido nos termos do n.º 2;

d) Tenha caducado há mais de cinco anos sem que tenha sido revalidado e o titular não seja portador de idêntico documento de condução válido.

4 - São ainda sujeitos ao exame especial previsto no n.º 2 os titulares de títulos de condução cancelados ao abrigo das alíneas a) e b) do número anterior que queiram obter novo título de condução.

5 - Os titulares de título de condução cancelados consideram-se, para todos os efeitos legais, não habilitados a conduzir os veículos para os quais o título fora emitido.

6 - Ao novo título de condução obtido após cancelamento de um anterior é aplicável o regime probatório previsto no artigo 122.º

7 - Quem conduzir veículo com título caducado é sancionado com coima de € 120 a € 600.

Em matéria de títulos de condução emitidos por entidades diversas do Estado Português, o art. 125º do CE estatui:

1 - Além dos títulos referidos nos n.ºs 4 e 5 do artigo 121.º são ainda títulos habilitantes para a condução de veículos a motor os seguintes:

a) Títulos de condução emitidos pelos serviços competentes pela administração portuguesa do território de Macau;

b) Títulos de condução emitidas por outros Estados membros da União Europeia ou do espaço económico europeu;

c) Títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro em conformidade com o anexo n.º 9 da Convenção Internacional de Genebra, de 19 de setembro de 1949, sobre circulação rodoviária, ou com o anexo n.º 6 da Convenção Internacional de Viena, de 8 de novembro de 1968, sobre circulação rodoviária;

d) Títulos de condução emitidas por Estado estrangeiro, desde que este reconheça idêntica validade aos títulos nacionais;

e) Licenças internacionais de condução, desde que apresentadas com o título nacional que as suporta;

f) Licenças especiais de condução de ciclomotores;

g) Licenças especiais de condução;

h) Autorizações especiais de condução;

i) Autorizações temporárias de condução.

2 - A emissão das licenças e das autorizações especiais de condução bem como as condições em que os títulos estrangeiros habilitam a conduzir em território nacional são fixadas no RHLC.

3 - Os titulares das licenças referidas nas alíneas c), d) e e) do n.º 1 só estão autorizados a conduzir veículos a motor em Portugal durante os primeiros 185 dias subsequentes à fixação da sua residência.

4 - Os títulos referidos no n.º 1 só permitem conduzir em território nacional se os seus titulares tiverem a idade mínima exigida pela lei portuguesa para a respetiva habilitação.

5 - Quem infringir o disposto nos n.os 3 e 4, sendo titular de licença válida, é sancionado com coima de € 300 a € 1500.

Por seu turno, o art. 128º regula a substituição de títulos de condução estrangeiros por cartas de condução portuguesas:

1 - A carta de condução pode ser obtida por troca de título estrangeiro válido, que não se encontre apreendido ou tenha sido cassado ou cancelado por determinação de um outro Estado.

2 - Se o título estrangeiro apresentado for um dos referidos nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 125.º, a troca está condicionada ao cumprimento pelo titular de todos os requisitos fixados no RHLC para obtenção de carta de condução, com exceção da submissão a exame de condução.

3 - Na carta de condução portuguesa concedida por troca de título estrangeiro apenas são averbadas as categorias de veículos que tenham sido obtidas mediante exame de condução ou que sejam previstas no RHLC como extensão de habilitação de outra categoria de veículos.

4 -É obrigatoriamente trocado por idêntico título nacional o título de condução pertencente a cidadão residente e emitido por outro Estado membro da União Europeia ou do espaço económico europeu:

a) Apreendido em Portugal para cumprimento de proibição ou inibição de conduzir, após o cumprimento da pena;

b) Em que seja necessário proceder a qualquer alteração.

5 - Os títulos de condução referidos nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 125.º não são trocados por idêntico título nacional quando deles conste terem sido obtidos por troca por idêntico título emitido por Estado não membro da União Europeia, ou do espaço económico europeu, a não ser que entre esse Estado e o Estado Português tenha sido celebrada convenção ou tratado internacional que obrigue ao reconhecimento mútuo dos títulos de condução.

6 - Os titulares de títulos de condução estrangeiros não enumerados no n.º 1 do artigo 125.º podem obter carta de condução por troca dos seus títulos desde que comprovem, através de certidão da entidade emissora do título, que os mesmos foram obtidos mediante aprovação em exame de condução com grau de exigência idêntico ao previsto na lei portuguesa.

7 - A troca de título de condução estrangeiro pode ser condicionada à aprovação do requerente a uma prova prática componente do exame de condução quando:

a) Não for possível comprovar o requisito exigido no número anterior; ou

b) Existam dúvidas justificadas sobre a autenticidade do título cuja troca é requerida.

Tanto a República Federativa do Brasil como a República Portuguesa subscreveram a Convenção de Viena de 1968 sobre circulação rodoviária.

O Despacho nº 10942/2000 (publicado em DR, 2ª série, 27/5/00), citado no trecho da sentença recorrida acima transcrito, pelo qual o Estado Português reconheceu os documentos brasileiros equivalentes às cartas de condução («carteira nacional de habilitação»), remete para a al. e) do nº 1 do 125º do CE, mas tal remissão deve ser reportada à redacção do CE vigente ao tempo da publicação do identificado Despacho, que era a introduzida pelo DL nº 2/98 de 3/1.

O conteúdo normativo da al. e) do nº 1 do 125º do CE, na antiga redacção, corresponde, no essencial ao da al. d) do texto actualmente em vigor.

Nesta conformidade, podemos concluir que o documento emitido pelo Estado Brasileiro, de que o arguido era portador ao tempo dos factos por que responde, integra o universo de títulos de condução definido pelas als. c) e d) do nº 1 do art. 125º do CE.

Resulta indubitável do disposto no nº 3 do art. 125º do CE que os títulos de condução estrangeiros englobados na previsão das als. c) e d) do nº 1 do mesmo normativo apenas são idóneos a habilitar o respectivo portador a conduzir veículos em território português, sem restrições, durante os primeiros 185 dias depois de ter fixado residência neste país (aparentemente, a questão não se coloca para os não residentes).

Na verdade, aquilo a que poderemos chamar o «destino normal» dos referidos títulos de condução reside na sua troca por cartas de condução nacionais, nos termos regulados pelo art. 128º do CE, operação que tem como pressuposto impreterível, de acordo com o prescrito no nº 1 deste artigo, que o documento trocado se encontre válido, designadamente, não tenha ultrapassado o seu prazo de caducidade.

O detentor de um título de condução abrangido na previsão das als. c) e d) do nº 1 do art. 125º do CE, que, depois de findo o prazo de 185 dias fixado pelo nº 3, não tenha providenciado pela sua substituição por um título nacional e tenha, ainda assim, continuado a conduzir veículos em Portugal, incorre numa contra-ordenação, a que corresponde uma coima de € 300 a € 1.500.

Conforme o Tribunal «a quo» não deixou de salientar, na fundamentação da decisão recorrida, a entender-se, como defende o Digno Recorrente, que a apurada conduta do arguido – conduzir um veículo em território português munido de um título de condução brasileiro caducado há menos de cinco anos – deve ser reconduzida à contra-ordenação prevista pelo nº 7 do art. 130º da CE, o sistema jurídico entra em grave incoerência pois estará a sancionar esta actuação menos gravemente do que a daquele que conduza sendo portador de um título estrangeiro válido, depois de esgotado o prazo de 185 dias subsequentemente a ter estabelecido residência em Portugal.

O nº 3 do art. 9º do CC dispõe que, na operação intelectual de determinação do sentido e alcance da lei, o intérprete terá de presumir que o legislador consagrou a as soluções mais acertadas, pelo que deverá abster-se de optar por entendimentos que conduzam a resultados incoerentes, incongruentes ou irrazoáveis.

Neste contexto, não vislumbramos outra conclusão lógica possível senão que o regime de caducidade e cancelamento previsto nos nºs 1 a 6 do art. 130º do CE só se aplica aos títulos de condução emitidos pelo Estado Português, pelo que a coima cominada no nº 7 do mesmo artigo é também privativa dessa categoria de títulos.

Pelo contrário, o título de condução emitido por Estado estrangeiro, que tenha habilitado o seu portador à condução de veículos em Portugal, ao abrigo do disposto nas als. c) e d) do nº 1 do art. 125º do CE, uma vez ultrapassado o respectivo prazo de validade, deixa irremediavelmente de ser passível de substituição por carta de condução portuguesa ou sequer, a emissão a partir dele de um documento desta natureza, sem necessidade de aguardar o prazo de 5 anos previsto, referido na al. d) do nº 3 do art. 130º do CE.

Nesta ordem de ideias, a detenção pelo arguido, aquando da prática dos factos por que responde, de um título de condução brasileiro, caducado há menos de cinco anos, é inócua para o efeito de afastar a tipicidade do art. 3º do DL nº 2/98 de 3/1.

Argumentou o Digno Recorrente que o entendimento interpretativo, segundo o qual os títulos de condução emitidos por Estados estrangeiros não se encontram abrangidos no regime definido pelo art. 130º do CE, seria atentatório do princípio da igualdade consagrado pelo art. 13º da CRP.

A este respeito, apenas se nos oferece dizer que a emissão dos documentos que habilitam à condução de veículos e a definição dos pressupostos da sua atribuição ou denegação, no território em que se exerce a soberania de determinado Estado, tem sido, de um modo geral, apanágio desse mesmo Estado.

É verdade a lei do Estado Português, tal como sucede seguramente com as leis emitidas por muitos outros Estados, reconhecem uma certa margem de validade, no seu território, aos títulos de conduções emitidos por Estados diversos.

Contudo, daí não se segue uma equiparação por natureza entre os documentos habilitantes à condução emitidos pelas autoridades nacionais de acordo com a lei nacional e aqueles que provêm de Estados estrangeiros, pelo que um maior ou menor grau de aproximação do estatuto dos segundos ao dos primeiros permanece, de um modo geral, na margem de livre apreciação do legislador ordinário.

Nesse sentido, não se vislumbra que a tese interpretativa sufragada pelo Tribunal «a quo» e por nós também possa de alguma forma colidir com o princípio constitucional da igualdade.

Como tal, teremos de concluir que a sentença recorrida, no único aspecto questionado pelo Digno Recorrente, não merce censura, improcedendo o recurso.

III - Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Sem custas.

Notifique.

Évora, 7/1/16 (processado e revisto pelo relator)

Sérgio Bruno Povoas Corvacho
João Manuel Monteiro Amaro