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IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
VÍCIOS DO ART. 410.º DO CPP
PROIBIÇÃO DE VALORAÇÃO DE PROVAS
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
MEDIDA DA PENA
Sumário
I - Não existe obstáculo legal a que seja atendida em julgamento prova documental (auto elaborado pela PSP e aditamento ao mesmo), ainda que também subscrito pelo arguido, não se reconduzindo a declarações prestadas por este, mas sim a comprovação de diligência efetuada, com a sua cooperação.
II - E não se tratando de declarações prestadas pelo ora recorrente, nem mesmo como arguido (só foi constituído como tal posteriormente) e, mormente, esse aditamento mais não reflete senão recolha de indícios por órgão de polícia criminal, ainda que com a colaboração daquele, tudo se reconduzindo a prova documental, não se impunha a sua leitura em audiência, seja por via do art. 356.º, seja por referência ao art. 357.º, ambos do CPP.
III – A valoração dessa sua colaboração não se reconduz a conversas informais, nada obstando a que o tribunal tivesse valorado a prova daí decorrente.
IV - Sem perder de vista exigências de prevenção geral, são sobretudo exigências de prevenção especial que presidem à aplicação, ou não, do regime penal especial para jovens delinquentes, ou seja, através da aferição das circunstâncias atinentes à pessoa do agente, que redundarão, ou não, em que o julgador conclua pela existência de “sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”.
V - Tudo dependerá, pois, do juízo de prognose, assente nas condições de vida do jovem, bem como na análise global da sua personalidade, que permitam perceber se o seu desenvolvimento sócio-psicológico ainda consente uma qualquer intervenção de ajustamento e de consolidação da personalidade que funcione como uma vantagem para a sua reinserção social ou, ao invés, se qualquer intervenção desse tipo já é tardia, perante o quadro de desenvolvimento da sua personalidade, revelando claro discernimento.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora
1. RELATÓRIO
Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, com o número em epígrafe, que correu termos na Instância Central de Portimão da Comarca de Faro, o Ministério Público deduziu acusação contra os arguidos I, S, D e A, imputando, ao primeiro, em concurso real e efectivo:
- três crimes de roubo, em co-autoria e na forma consumada, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Código Penal (CP);
- um crime de roubo, em co-autoria e na forma tentada, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, em conjugação com os arts. 22.º e 23.º, todos do CP;
- um crime de furto qualificado, em autoria material e na forma consumada, p. e p. pelos arts. 204.º, n.º 1, alínea f), e 203.º, n.º 1, ambos do CP;
- dois crimes de furto qualificado, em co-autoria e na forma consumada, p. e p. pelos arts. 204.º, n.º 1, alínea f), e 203.º, n.º 1, ambos do CP;
- dois crimes de furto simples, p. e p. pelo art. 203.º, n.º 1, do CP.
Realizado o julgamento (na ausência dos arguidos D e A) e proferido acórdão, decidiu-se quanto ao arguido I:
a) absolvê-lo da prática de 2 (dois) crimes de roubo em co-autoria e na forma consumada (NUIPC´s ---/14.0PALGS e ---/14.9PALGS) e de 1 (um) crime de roubo em co-autoria e na forma tentada (NUIPC --/14.3PALGS);
b) condená-lo pela prática, como autor material de 1 (um) crime de roubo, na forma consumada, do art. 210º/1 do CP, na pena de 3 (três) anos de prisão (NUIPC ---/14.4PALGS);
c) condená-lo pela prática como autor material de 3 (três) crimes de furto qualificado do art. 204º/1-f) do CP, nas penas de 2 (dois) anos de prisão, por cada um deles (NUIPC´s 413/14.0PALGS, 578/14.1PALGS e 592/14.7PALGS);
d) condená-lo pela prática como autor material de 2 (dois) crimes de furto, do art. 203º/1 do CP, nas penas de 8 (oito) meses de prisão por cada um deles (NUIPC --/15.0PALGS);
e) operar o cúmulo jurídico das penas parcelares e condená-lo na pena única de 6 (seis) anos e 9 (nove) meses de prisão.
Inconformado com tal decisão, o arguido I. interpôs recurso, formulando as conclusões:
1. No acórdão recorrido, limitou-se o tribunal a quo a fazer uma súmula de depoimentos prestados em audiência e de elementos do inquérito, sem qualquer referência à credibilidade que cada um deles tenha merecido e às razões do respectivo merecimento, faltando o exame crítico das provas que contribuíram para a formação da convicção do tribunal.
2. O tribunal a quo não efectuou um exame crítico do auto de notícia a fls. 433 a 434 e aditamento de fls. 443 do NUIPC --/14.4PALGS (incorporado no NUIPC ---/14), não esclarecendo em que medida é que o reconhecimento que a queixosa Zhu fez de JJ, contribuiu para formar a convicção no tribunal, de que foi o arguido I que praticou o roubo a Zhu.
3. Inexistindo, pois, uma insuficiente fundamentação do acórdão, o que determina a sua nulidade, nos termos do art. 379.º, nº 1, alínea a), com referência ao art. 374.º, n.º 2, ambos do CPP;
4. Não efectuou um exame crítico dos depoimentos das testemunhas, K e PJ, ao não esclarecer em que medida é que os mesmos permitiram julgar provados os factos respeitantes à autoria do crime de furto ao arguido I, no NUIPC ---/14.1PALGS;
5. No NUIPC ---/14.7PALGS, o tribunal a quo não efectuou um exame crítico do depoimento da testemunha ML que, no essencial, declarou apenas que os arguidos D, I e S, compareceram no seu estabelecimento para a venda das peças furtadas referidas na acusação. Ficando por esclarecer em que medida é que esse depoimento permite julgar provados os factos respeitantes à autoria do crime de furto ao arguido I.
6. Relativamente ao crime de roubo (NUIPC --/14.4PALGS), crime de furto qualificado (NUIPC ---/14.0PALGS) e crime de furto simples (NUIPC --/15.0PALGS) o tribunal formou a sua convicção com base em valoração de prova proibida.
7. A valoração de declarações prestadas pelo arguido no inquérito exige a reprodução ou leitura das mesmas em audiência de julgamento, para cumprimento dos princípios do contraditório, da imediação e da oralidade.
8. Não tendo sido lidas em audiência de julgamento as referidas provas, nomeadamente os autos que fazem referência a declarações prestadas pelo arguido no inquérito, a valoração das mesmas para efeito de formação da convicção do tribunal, constitui valoração proibida de prova, nos termos do art. 355.º, conjugado com os arts. 356.º e 357 .º, todos do Código de Processo Penal.
9. As chamadas «conversas informais» são declarações prestadas pelo arguido a órgãos de polícia criminal à margem do processo, sem redução a auto e, portanto, sem respeitarem o princípio da legalidade processual decorrente dos artigos 2.º, 57.º e segs., 262.º e segs., 275.º, 355.º a 357.º do CPP e art. 29.º da Constituição (nulla pena sine judicio), não podendo as declarações assim produzidas serem valoradas como meio de prova e concorrerem para a formação da convicção do tribunal.
10. Relativamente aos restantes crimes (NUIPC --/14.1PALGS e NUIPC ---/14.7PALGS), o tribunal formou a sua convicção para condenar o arguido com base em prova indiciária.
11. A prova indiciária requer uma pluralidade de dados indiciários plenamente provados ou absolutamente credíveis.
12. Essa exigência não se mostra cumprida, porquanto os demais elementos de prova não podiam ter sido valorados pelo tribunal para efeito de formação da sua convicção.
13. O tribunal recorrido incorreu em erro notório na apreciação da prova ao ter dado como provados os factos respeitantes aos crimes de roubo (NUIPC ---/14.4PALGS), crime de furto qualificado (NUIPC ---/14.0PALGS) e crime de furto simples (NUIPC ---/15.0PALGS), por ter postergado a regra fundamental em matéria de prova contida no art. 355.º do CPP.
14. Impunha-se a absolvição do arguido I de todos os crimes pelos quais vinha acusado.
15. Sem prescindir, sempre se dirá que as penas parcelares aplicadas ao arguido são manifestamente excessivas e inadequadas aos fins a que as mesmas se propõem, entre os quais, a ressocialização e reabilitação do arguido, sobretudo quando este se encontra ainda no limiar da sua maturidade.
16. Assim sendo, existe neste ponto violação do princípio da necessidade e proporcionalidade das penas.
17. Na pena global a aplicar ao arguido deveria o tribunal ter optado por uma pena inferior a 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução, atendendo à idade do recorrente, actualmente com 18 anos de idade (16 e 17 à data dos factos) e à ausência de antecedente criminais e à sua integração familiar.
18. Pena que deveria ter sido especialmente atenuada por aplicação do Regime Especial para Jovens.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente, assim se fazendo Justiça!
O recurso foi admitido.
O Ministério Público apresentou resposta, concluindo:
1- O âmbito do recurso retira-se das respectivas conclusões as quais por seu turno são extraídas da motivação da referida peça legal, veja-se por favor a título de exemplo o sumário do douto Acórdão do STJ de 15-4-2010, in www.dgsi.pt,Proc.18/05.7IDSTR.E1.S1.
2- “Como decorre do artigo 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso.
3- São assim, as conclusões quem fixam o objecto do recurso, artigo 417º, nº3, do Código de Processo Penal.
4-Não contém a douta decisão impugnada qualquer erro de julgamento da matéria de facto, ou outro vício que a inquine.
5- As provas produzidas e analisadas em audiência de julgamento foram avaliadas pelo Tribunal “a quo” no seu todo e segundo o que preceituam os arts.124º a 127º, do Código de Processo Penal, entre outros preceitos legais.
6- O Arguido não tem antecedentes criminais.
7- A nulidade do Acórdão por falta de fundamentação/ omissão de pronúncia invocada pelo recorrente: a este propósito veja-se por favor entre outros o sumário do Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 20-01-2010, Proc. 388/07.2PATNV.C1, em www.dgsi.pt:
Sumário: 1.A fundamentação e motivação dos actos decisórios destina-se a conferir força pública e inequívoca aos mesmos e a permitir a sua impugnação quando esta for legalmente admissível, ou, como refere Germano Marques da Silva " Permite o controlo da legalidade do acto, por uma parte, e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando por isso como meio de autocontrolo”.
2.O exame crítico das provas deve indicar no mínimo, e não necessariamente por forma exaustiva, as razões de ciência e demais elementos que tenham, na perspectiva do tribunal sido relevantes, para assim se poder conhecer o processo de formação da convicção do tribunal…”
8- Analisado o Douto Acórdão, nomeadamente a Motivação da decisão de facto, não pode deixar de retirar-se que fez o elenco das provas, examinou-as criticamente e ponderou os motivos de facto e de direito, sendo transparentes as razões que levaram à condenação do recorrente, não padecendo o Douto Acórdão de falta de fundamentação/omissão de pronúncia nem de qualquer outro vício ou nulidade invocados pelo arguido.
9- É verdade que o arguido tem uma leitura distinta da prova produzida e examinada em audiência de julgamento, o que é compreensível, mas no caso concreto não é pertinente, pois as provas foram analisadas na sua totalidade e livremente apreciadas pelo Tribunal “a quo”, embora temperadas pelas regras da experiência, aliás como o impõe o artigo 127º, do Código de Processo Penal.
10- Veja-se também por favor a título exemplificativo o que se diz em nota de rodapé no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto: “Como se refere no Ac. STJ de 20/9/2005, proc. nº 05A2007, “a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e das lacunas, das contradições, hesitações, inflexões de voz, (im)parcialidade, serenidade, olhares, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura, transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos". Elementos que a transcrição não fornece e de que a reapreciação em sede de recurso não dispõe”. In www.dgsi.pt, Acórdão do TRP, de 26-3-2014, proc.201/08.3TASJM.P1.
11- Ao contrário do que afirma o recorrente, analisado o Douto Acórdão recorrido, nomeadamente a partir de fls.1328 e seguintes, verifica-se que o Tribunal “ a quo”, procedeu ao exame crítico da prova de modo exaustivo, lógico, objectivo e norteado pela Lei e Doutrina Criminais, concluindo-se que não contém qualquer falta de fundamentação/omissão de pronúncia nem padece de qualquer vício ou nulidade de que cumpra conhecer.
12- Respeitou o Tribunal “a quo” o princípio do contraditório, tendo o arguido através do seu Ilustre Defensor tido a oportunidade de questionar, impugnar, reclamar ou recorrer de todas as decisões do Tribunal recorrido e de aconselhar o arguido, à medida que o inquérito/processo ia evoluindo, não procedendo nesta como nas restantes matérias a argumentação do arguido.
13- Não violou o Douto Acórdão recorrido o disposto nos artigos 374º, nº2 ou 379º, nº1, alíneas a) e c), do Código de Processo Penal.
14- No que concerne ao "erro notório na apreciação da prova”, também invocado pelo recorrente, vem sendo entendimento unânime da doutrina e jurisprudência que ele apenas se terá como verificado em apertadas circunstâncias”. Erro notório na apreciação da prova é aquele que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta (Simas Santos e Leal Henriques, C.P.P. Anotado, I, 554) e traduz uma desconformidade do facto apurado com a prova.
E, não se confunda este alegado vício com a discordância acerca da forma como o tribunal fixou a matéria de facto pois, no campo da apreciação das provas, é livre a forma como o Tribunal forma a sua convicção.
15- Trata-se de emanação do princípio que vigora no nosso sistema processual penal, o princípio da livre apreciação da prova ou da livre convicção, consagrado no art. 127º, do C.P.P., de acordo com o qual e, ressalvados os casos em que a lei dispuser diferentemente, "a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente".
16- Não se olvida que “ao contrário do que se passa no processo civil, em que basta a existência de uma «probabilidade prevalecente», em processo penal deve adoptar-se um padrão mais exigente, nomeadamente o de origem anglo-saxónica, da «prova para além de qualquer dúvida razoável”.
17-O Tribunal “a quo” fez um exame crítico da prova, explicando de modo detalhado as provas que considerou, como e porquê as valorou, não procedendo os argumentos do recorrente.
18- Focar-se em pequenas passagens da prova produzida para deduzir e afirmar que determinados factos dados como provados no Douto Acórdão não deveriam ter sido considerados provados, ou que deveriam ter sido dados como provados outros, é compreensível, mas é argumento que se soçobra perante o acervo de provas legais que existem nos autos e apontam sem margem de dúvida, para o cometimento pelos recorrentes dos crimes pelos quais foram condenados, embora o Douto Acórdão ainda não tenha transitado em julgado.
19- Não foi violado pelo Douto Acórdão que o arguido impugna o disposto no art.32º, ou outro preceito da Constituição da República Portuguesa, tendo o arguido sido condenado com base em provas legalmente produzidas, bastantes e adequadas, embora o Douto Acórdão ainda não tenha transitado em julgado e esteja a ser impugnado, tudo em conformidade com as normas legais em vigor.
20- O arguido não prestou declarações em audiência de julgamento.
21- O arguido questiona a medida da pena: diz a propósito da medida da pena:o Prof. Germano Marques da Silva [Direito Penal Português, 3, pág. 130], que a pena será estabelecida com base na intensidade ou grau de culpabilidade (...). Mas, para além da função repressiva medida pela culpabilidade, a pena deverá também cumprir finalidades preventivas de protecção do bem jurídico e de integração do agente na sociedade. Vale dizer que a pena deverá desencorajar ou intimidar aqueles que pretendem iniciar-se na prática delituosa e deverá ressocializar o delinquente”.
22- Ou ainda como se diz no Douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça:” II - Culpa e prevenção constituem o binómio que preside à determinação da medida da pena, art. 71.º, n.º 1, do CP. A culpa como expressão da responsabilidade individual do agente pelo facto, fundada na existência de liberdade de decisão do ser humano e na vinculação da pessoa aos valores juridicamente protegidos (dever de observância da norma jurídica), é o fundamento ético da pena e, como tal, seu limite inultrapassável – art. 40.º, n.º 2, do CP.
III - Dentro deste limite, a pena é determinada dentro de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico, só então entrando considerações de prevenção especial, in www.dgsi.pt, Proc. nº 315/11.2JELSB.E1.S1, 1-7-2015.
23- O Tribunal “a quo” teve em consideração para a escolha e medida da penaaplicada ao arguido todos os critérios referidos nos arts.40º, 41º, 71º e seguintes do Código Penal, conjugados com os factos que se provaram em audiência de julgamento, mostrando-se a pena única de 6 anos e 9 meses de prisão, pela prática de diversos crimes, em sintonia com a culpa do arguido, e sem ter olvidado a sua ressocialização, devendo manter-se nos precisos termos que constam do Douto Acórdão.
24- Pretende o recorrente que lhe seja suspensa na execução a pena de prisão que lhe venha a ser aplicada, todavia o Tribunal “ a quo” não poderá suspender na execução a pena de prisão aplicada ao arguido, desde logo pelo limite dos cinco anos previsto no artigo 50º, nº1, do Código Penal, e, ainda que a pena coubesse nesse preceito, a gravidade e multiplicidade dos crimes cometidos pelo recorrente, a não admissão da sua prática e os imperativos da prevenção geral e especial, não é possível “concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, artigo 50º,nº1, do Código Penal.
25- Por outro lado, o Tribunal “a quo” explicou as razões de não ter aplicado ao Iúri Matos o regime especial para jovens, previsto no DL 401/82, de 2 de Setembro, “por ter concluído que a eventual atenuação especial da pena em nada contribuiria para a sua reinserção”, pelas razões mencionadas no Douto Acórdão com as quais concordamos no seu todo, salvo o respeito devido.
26- Não enferma o Douto Acórdão de nenhum vício ou nulidade, dos previstos nos artigos 57º, 127º, 262, 275º, 355º, 357º e 410º, nº2, do Código de Processo Penal, nem o consignado no artigo 50º e, do Código Penal e nem sequer o previsto nos artigos 32º, nº 2 e 205º da Constituição da República Portuguesa, tendo sido respeitados os preceitos legais aplicáveis atinentes à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e ao Direito Constitucional e Criminal.
27- Em suma, deve o Douto Acórdão recorrido manter-se, na íntegra.
Neste Tribunal da Relação, o Digno Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, manifestando adesão aos fundamentos constantes da decisão recorrida e à argumentação expendida na referida resposta, no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.
Observado o disposto no n.º 2 do art. 417.º do Código de Processo Penal (CPP), nada foi apresentado.
Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
O objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da motivação, como decorre do art. 412.º, n.º 1, do CPP, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como sejam, as de nulidade do acórdão, nos termos do art. 379.º do CPP, e as previstas no art. 410.º, n.ºs 2 e 3, do CPP, designadamente de acordo com a jurisprudência fixada pelo acórdão do Plenário da Secção Criminal do STJ n.º 7/95, de 19.10 (publicado in D.R. I-A Série de 28.12.1995).
Delimitando-o, reside em apreciar: A) - da nulidade do acórdão; B) - da proibição de valoração de provas; C) - do erro notório na apreciação de provas; D) - da insuficiência de provas; E) - da atenuação especial da medida das penas; F) - da escolha e da medida das penas.
Ao nível da matéria de facto, resulta do acórdãorecorrido:
Factos provados: I. NUIPC ---/14.4PALGS
1.1 No dia 15/02/2014, cerca das 16h00m, o arguido I e outro indivíduo encontravam-se na Rua Crisógono dos Santos, em Lagos.
1.2 Naquele local também se encontrava Zhu, transportando uma mala a tiracolo.
1.3 O arguido I e o outro indivíduo agarraram e puxaram a mala de Zhu.
1.4 A mala em causa continha no seu interior a quantia de 450,00€ (quatrocentos e cinquenta euros) em notas do BCE, a quantia de 5.000,00 rublos (correspondente a cento e trinta euros), um passaporte, um visto de trabalho válido para a Federação Russa, chaves do hotel “Via Dona Ana”, um chapéu-de-chuva, maquilhagem, bilhete de autocarro (Lagos-Porto), cartão de transporte de C.P., um cartão Vogue, um documento em língua russa n.º 007139, todos pertencentes à ofendida.
1.5. Seguidamente, o arguido I e o outro indivíduo colocaram-se em fuga para parte incerta, na posse de todos os referidos bens, valores e documentos, que integraram no respectivo património, como se fossem seus, apesar de saberem que os mesmos não lhes pertenciam e que actuavam contra a vontade da sua proprietária.
1.6 Foram recuperados os seguintes objectos, pertencentes a Zhu:
- A mala, o documento em língua russa n.º 007139, as chaves do hotel “Via Dona Ana” que foram abandonados na Travessa do Cemitério, em Lagos; e
- O passaporte G36--- emitido em nome de Zhu, na posse do arguido I.
1.7 O arguido I e o outro indivíduo actuaram como descrito, para se apoderarem dos bens e valores existentes na posse da ofendida Zhu, designadamente, da mala desta e do respectivo conteúdo.
II. NUIPC 81/14.0PALGS
1.8 No dia 14/02/2014, cerca das 12h20m, dois indivíduos encontravam-se num acesso aberto ao público do hotel Tivoli, em Lagos.
1.9 Delyth caminhava naquele local, sozinha, transportando uma carteira na mão direita,
1-10 Esses indivíduos aproximaram-se de Delythe, agarraram e puxaram, com força, a carteira que esta transportava.
1.11 A carteira em causa continha no seu interior a quantia de 100,00€ (cem euros) em diversas notas do BCE, cartões de débito, carta de condução, duas chaves do hotel Tivoli, pertencentes à ofendida.
1.12 Seguidamente, os indivíduoscolocaram-se em fuga para parte incerta, na posse de todos os referidos bens, valores e documentos, que integraram no respectivo património, como se fossem seus, apesar de saberem que não lhes pertenciam e que actuavam contra a vontade da sua proprietária.
1.13 Nenhum dos objectos foi recuperado.
III. NUIPC 90/14.9PALGS
1.14 No dia 18/02/2014, cerca das 20h45m, dois indivíduos encontravam-se na Rua Dom Vasco da Gama, em Lagos.
1.15 Annette caminhava naquele local, sozinha, com uma mala a tiracolo.
1.16 Os dois indivíduos agarraram e puxaram a mala a tiracolo de Annette.
1.17 A mala em causa continha a quantia de 100,00€ (cem euros) em notas de cinco euros, chaves da residência, dois cartões de débito do Millennium BCP, um passaporte, um telemóvel de marca “Nokia” no valor estimado de 40,00€ (quarenta euros), uma carteira de cor preta em pele, um anel de noivado de ouro com nove diamantes no valor estimado de 750,00£ (setecentos e cinquenta libras), um anel de ouro com uma safira azul e vários diamantes no valor estimado de 1.425£ (mil e quatrocentos e vinte e cinco libras) e um colar em pérolas brancas, pertencentes à ofendida.
1.18 Seguidamente, os indivíduos colocaram-se em fuga para parte incerta, na posse de todos os referidos bens, valores e documentos, que integraram no respectivo património, como se fossem seus, apesar de saberem que os mesmos não lhes pertenciam e que actuavam contra a vontade da sua proprietária.
1.19 Com excepção do dinheiro e das jóias, Annette veio a recuperar aqueles bens.
V. NUIPC ---/14.0PALGS
1.20 No período compreendido entre as 19h00m e as 22h30m do dia 27/07/2014, o arguido I dirigiu-se à residência de Filip e de Carl, sita na Rua…, em Lagos, com o propósito de se apoderar de bens que ali viesse a encontrar.
1.21 Na execução do desígnio que formulou, aí chegado o arguido I, de forma não concretamente apurada, acedeu ao interior dessa residência.
1.22 Do interior da habitação o arguido I retirou e levou consigo, fazendo-os seus, os seguintes objectos:
- Pertencente a Filip:
Um computador portátil, marca “Apple”, modelo Macbook Pro, serie C02GHSZWDRJ7, cor prateado, no valor de 1.300,00€;
- Pertencente a Carl:
Um Iphone, marca “Apple”, modelo 5, Imei 013406006701779, cor preto, no valor de 500,00€ e o respectivo carregador.
1.23 Na posse desses objectos, o arguido I abandonou o local para parte incerta.
1.24 Em data não apurada, entre 27/07/2014 e 31/08/2014, na habitação situada na Praceta Ilha da Madeira..., em Lagos, o arguido I vendeu o computador portátil, descrito supra a JF pelo preço de 200,00€ (duzentos euros).
1.25 Este computador portátil foi recuperado pela P.S.P de Lagos, na posse de JF e entregue ao seu proprietário.
1.26 O I-phone, pertencente a Carl, não foi recuperado.
1.27 O arguido I sabia que aqueles bens de que se apoderou não lhe pertenciam, e mesmo assim quis fazê-los coisas suas, como aliás veio a conseguir, apesar de saber que agia contra a vontade e sem o consentimento dos seus legítimos proprietários, F e C.
VI. NUIPC 578/14.1PALGS
1.28 No dia 06/09/2014, cerca das 18h15m, o arguido I dirigiu-se à residência de Christian, sita na Rua Estevão Afonso…, em Lagos, com o propósito de se apoderar de bens que ali viesse a encontrar.
1.29 Na execução do desígnio que formulou, aí chegado, o arguido I, por método não apurado, acedeu ao interior dessa residência.
1.30 Do interior da habitação o arguido I retirou e levou consigo, fazendo-os seus, os seguintes objectos:
- Pertencente a Christian:
Um computador portátil, marca “Sony”, modelo Vaio, serie P538563L, cor laranja, no valor de 650,00€, com cabo de alimentação;
Três consolas de jogos, “Nintendo DSI branco” n.º 1870090, “Nintendo DS lite tue turquesa” n.º 1806466 e “Nintendo DS preto” n.º UEF20563015, no valor total de 540,00€;
Sete jogos da consola “Nintendo”, no valor total de 140,00€;
Bolsa para consola “Nintendo” com auscultadores brancos;
Uma mochila, marca “Jako”, no valor de 50,00€;
A quantia de 100,00€ em numerário;
Duas carteiras;
- Pertencente a Johana:
Bilhete de identidade, cartão de saúde e cartão de débito do VG-Bank eG;
- Pertencente a Benedict:
Bilhete de identidade, cartão de saúde e cartão de débito do VG-Bank eG;
- Pertencente a Christian:
Cartão de débito do Reiffeisenbank.
1.31 Na posse desses objectos, o arguido I abandonou o local para parte incerta.
1.32 Em data não apurada, mas posteriormente aos factos supra praticados em 06/09/2014, o arguido I entregou a mochila descrita supra que havia subtraído daquela residência mencionada supra ao arguido D, na residência deste sita na Rua de Santo Amaro…, em Lagos, para que a guardasse.
1.33 Ao que o arguido D anuiu, apesar de saber que a mochila não pertencia ao arguido I, e a forma como este a obteve.
1.34 A mochila “Jako” foi recuperada pela P.S.P. de Lagos, na posse do arguido D.
1.35 Em data não apurada mas posteriormente aos factos supra praticados em 06/09/2014, em local não apurado, o arguido I cedeu a título gratuito a Kleyton a consola “Nintendo DS”, cor preto, com o n.º UEF20563015, com bolsa de transporte e quatro jogos da “Nintendo DS”, descritos supra.
1.36 A consola “Nintendo DS”, cor preto, com o n.º UEF20563015, com bolsa de transporte, e quatro jogos da “Nintendo DS” foram recuperados pela P.S.P. de Lagos, na posse de Kleyton.
1.37 Em data não apurada, mas posteriormente aos factos supra praticados em 06/09/2014, em local não apurado, o arguido I vendeu, por 100,00€ (cem euros), a PJ o computador portátil, marca “Sony”, descrito supra.
1.38 Este computador portátil foi recuperado pela P.S.P. de Lagos, na posse de PJ.
1.39 Os documentos pessoais de Johana e Benedict, descritos supra foram recuperados pela P.S.P. de Lagos, no interior de uma moradia em construção localizada na Rua Estevão Afonso, em Lagos.
1.40 As consolas “Nintendo DSI branco” n.º 1870090, “Nintendo DS lite tue turquesa” n.º 1806466, a quantia de 100,00€ em numerário e o cartão de débito do Reiffeisenbank de Christian não foram recuperados.
1.41 O arguido I sabia que os bens de que se apoderou não lhe pertenciam, e mesmo assim quis fazê-los coisa sua, como aliás veio a conseguir, apesar de saber que agia contra a vontade e sem o consentimento do seu legítimo proprietário.
1.42 Ao actuar do modo descrito supra, o arguido D agiu com o propósito de receber a mochila ilicitamente subtraída ao legítimo proprietário pelo arguido I e detê-la no interior da sua residência de modo a ocultá-la das autoridades policiais.
1.43 Agiu ainda com o propósito de obter benefício patrimonial, sabendo que actuava contra a vontade e em prejuízo do legítimo proprietário.
VII. NUIPC ---/14.7PALGS
1.44 No dia 12/09/2014, cerca das 16h00m, o arguido Idirigiu-se à residência de Anabela, sita na Rua …, em Lagos, com o propósito de se apoderar de bens que ali viesse a encontrar.
1.45 Aí chegado, o arguido I introduziu-se no interior de um quarto situado no 1.º andar da habitação, através da portada que se encontrava aberta.
1.46 Do interior do quarto dessa habitação o arguido I retirou e levou consigo os seguintes objectos, pertencentes a Anabela:
- Um anel em ouro amarelo com brilhantes no topo, no valor de 200,00€,
- Um par de brincos (argolas ovais) em ouro amarelo, no valor de 187,00€;
- Um anel em ouro amarelo com uma pedra designada “olho de tigre” em tom castanho/amarelo, no valor de 125,00€;
- Um fio em ouro amarelo com malha grossa e entrelaçada, no valor de 620,00€;
- Uma caixa de jóias em plástico com espelho na tampa e várias divisórias no interior;
- Uma mala em pele de cor castanho com uma asa.
1.47 Após, o arguido I abandonou a residência, em fuga.
1.48 Na posse dos objectos descritos supra, o arguido I dirigiu-se à residência do arguido D, localizada na Rua de Santo Amaro---, em Lagos.
1.49. Aí chegado, o arguido I pediu ao arguido D que procedesse à venda das jóias que havia subtraído da residência.
1.50 Na sequência de tal solicitação, acordaram os arguidos I, S e D que iriam os três a uma loja de compra de ouro, ficando o arguido D, o único com mais de 18 anos de idade, com a tarefa de proceder à venda das jóias.
1.51 Após as 16h30 do referido dia 12/09/2014, o arguido I, S e D, actuando em conjugação de esforços e mediante o plano previamente gizado entre eles, dirigiram-se ao estabelecimento comercial denominado “X”, localizado na Rua Infante Sagres, em Lagos.
1.52 Na execução do plano delineado, o arguido D, na presença dos arguidos I e S, procedeu à venda de algumas das jóias enunciadas supra, pelo preço total de 570,00€ (quinhentos e setenta euros), e que se passam a descrever:
- Um anel em ouro amarelo com brilhantes no topo;
- Um par de brincos (argolas ovais) em ouro amarelo;
- Um anel em ouro amarelo com uma pedra designada “olho de tigre” em tom castanho/amarelo;
- Um fio em ouro amarelo com malha grossa e entrelaçada.
1.53 Nessa ocasião, ML, funcionária do estabelecimento “X”, entregou ao arguido D, para pagamento do preço, a quantia de 205,00€ (duzentos e cinco euros), ficando acordado que no dia seguinte, 13/09/2014, seria entregue ao arguido o remanescente em falta no valor de 365,00€ (trezentos e sessenta e cinco euros).
1.54 Na posse dessa quantia de 205,00€ (duzentos e cinco euros), os arguidos I, S e D abandonaram o local para parte incerta.
1.55 No dia seguinte, 13/09/2014, pelas 09h45m, os arguidos I, S e D, actuando em conjugação de esforços e mediante o plano previamente gizado entre eles, regressaram ao estabelecimento comercial “X”.
1.56 Chegados ao local, os arguidos I, S e D não lograram receber o remanescente do preço da venda das jóias, ascendendo à quantia de 365,00€ (trezentos e sessenta e cinco euros), por terem sido interceptados por elementos da P.S.P. de Lagos.
1.57 Os objectos pertencentes a Anabela, descritos supra à excepção da caixa de jóias e a mala em pele de cor castanho, foram recuperados pela P.S.P. de Lagos na posse do estabelecimento comercial “X” e entregues à respectiva proprietária.
1.58 Ao actuar da forma descrita, o arguido I agiu na execução do plano que antes havia traçado, tendo como propósito fazer seus os objectos e valores que encontrasse no interior da residência de Anabela supra referida.
1.59 O arguido I sabia que todos os bens de que se apoderou não lhe pertenciam, e mesmo assim quis fazê-los coisa sua, como aliás veio a conseguir, apesar de saber que agia contra a vontade e sem o consentimento do seu legítimo proprietário.
1.60 Ao actuarem do modo descrito, o arguido D e S sabiam que os objectos entregues pelo arguido I provinham de apropriação indevida a outrem e, mesmo assim, o arguido D aceitou detê-los com vista à realização da sua venda ao estabelecimento “X”, que veio a realizar, para obter benefício de natureza patrimonial para si e para os arguidos I e S, mesmo sabendo todos que actuavam contra a vontade e em prejuízo do legítimo proprietário.
VIII. NUIPC ---/15.0PALGS
1.61 No dia 05/02/2015, cerca das 10h25m, o arguido I dirigiu-se ao Ginásio denominado “Pilates”, no lote 5 da Rua Fernão Vilarinho, em Lagos, com o intuito de se apoderar de quaisquer bens ou valores que ali encontrasse à sua mercê, fazendo-os seus contra a vontade dos respectivos proprietários.
1.62 Aí chegado, o arguido I introduziu-se no interior do Ginásio “Pilates” através da porta de entrada, que se encontrava aberta ao público, e uma vez no seu interior, retirou de um cabide colocado junto à referida porta e levou consigo, fazendo-os seus os seguintes objectos:
- Pertencente a Theresa:
Um cachecol de cor azul com bolas brancas no valor de 15,00€;
Um casaco desportivo impermeável de cor azul, de marca “the north face”, no valor de 120,00€;
Um par de luvas em lã de cor cinzenta no valor de 15,00€;
Um porta-chaves em pele com cinco exemplares de chaves da residência, no valor de 17,00€.
- Pertencente a Antony:
Um casaco de marca “craghoppers” no valor de 30,00€;
Um porta-chaves com uma fita branca com a inscrição “room lagos pilates”, com as chaves da residência e do veículo automóvel no valor total de 400,00€;
Um telemóvel no valor de 55,00€.
1.63 Na posse desses objectos, o arguido I abandonou o local.
1.64 Os objectos pertencentes a Theresa e Antony, descritos supra, à excepção das chaves pertencente à primeira e o telemóvel pertencente ao segundo, foram recuperados pela P.S.P. de Lagos nas traseiras do posto de abastecimento da Repsol localizado na antiga ciclovia paralela à Meia Praia e entregues aos respectivos proprietários.
1.65 O local onde se encontravam os bens recuperados foi indicado pelo arguido I.
1.66 Aquando da sua detenção, o arguido I trajava o casaco desportivo impermeável de cor azul, de marca “the north face”, pertencente à ofendida Theresa.
1.67 O arguido sabia que todos os bens de que se apoderou não lhe pertenciam, e mesmo assim, quis fazê-los coisas suas, como veio a conseguir, apesar de saber que agia contra a vontade e sem o consentimento dos seus legítimos proprietários.
IX. NUIPC ---/14.2PALGS
1.68 No dia 24/08/2014, pelas 17h40m, na residência localizada na Rua Estevão Afonso…, em Lagos, desconhecidos apropriaram-se indevidamente de um computador portátil, marca “Lacer”, no valor estimado de 500,00€, um telemóvel de marca “Samsung”, modelo S4 mini, no valor estimado de 450,00€, um telemóvel de marca “Samsung”, modelo S3, com IMEI 351941065182990, no valor estimado de 300,00€, um relógio de marca “Bernard Piot”, no valor estimado de 3.500,00€, pertencentes a Willem e Hendrica.
1.69 Em data não apurada, mas posteriormente aos factos praticados supra em 24/08/2014, em local não apurado, o telemóvel de marca “Samsung”, modelo S3, com IMEI 351941065182990, entrou na posse do arguido I em circunstâncias não apuradas.
1.70 Em data não concretamente apurada, mas posteriormente aos factos supra praticados em 24/08/2014, em local não apurado, o arguido I entregou, a título desconhecido, o referenciado telemóvel ao arguido A.
1.71 Até ao final do ano de 2014, o arguido A fez uso, como coisa sua, do referido telemóvel, associado ao cartão telefónico n.º 917----.
1.72 No final do ano de 2014, em local não apurado, o arguido A. vendeu o mesmo telemóvel a LM, pelo preço de 140,00€ (cento e quarenta euros).
1.73 Com a conduta descrita supra o arguido A adquiriu o telemóvel em apreço, sem nada ter feito para se certificar previamente da sua legítima proveniência e, uma vez que o arguido I não dispunha de rendimentos, e atento o valor desse telemóvel, tais circunstâncias faziam razoavelmente suspeitar que o mesmo tinha proveniência ilícita.
1.74 O arguido A violou o dever de cuidado e diligência a que, segundo as referidas circunstâncias, estava obrigado e de que era capaz sabendo que, ao actuar da forma descrita, podia estar a adquirir objecto proveniente de um crime contra o património, aceitando adquiri-lo.
1.75 O arguido A. sabia que a sua conduta era proibida e punível por lei.
1.76 Em todas as condutas acima descritas, os arguidos I, S e D agiram de forma livre, voluntária e consciente e sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
1.77 O arguido I foi detido em 5/2/2015, e foi sujeito à medida de obrigação de permanência na habitação em 6/2/2015, medida que foi agravada com vigilância electrónica, por incumprimentos sucessivos, por despacho judicial de fls. 582, em 19/6/2015, e, por novos incumprimentos, novamente agravada para prisão preventiva, por despacho judicial de fls. 724, em 3/8/2015.
1.78 O arguido I não tem antecedentes criminais.
1.79 O arguido S. não tem antecedentes criminais,
1.80 O arguido D. já foi condenado: - no proc. comum singular ---/12.8GAMTA da instância local criminal do Barreiro J1,comarca de Lisboa, por decisão de 22/5/2014, transitada em 27/5/2015, pela prática, em 17/7/2012, de um crime de dano, simples, na pena de 160 dias de multa à taxa diária de €5,00 perfazendo o total de €800,00.
1.81 O arguido A. não tem antecedentes criminais.
1.82 O arguido I tem actualmente 18 anos, à data dos factos residia ora na Meia – Praia com o grupo familiar materno reconstituído, ora em casa da avó, em Lagos. No primeiro caso o espaço dispunha de insuficientes condições de habitabilidade, e o casal – mãe e padrasto viriam a separar-se. A família mudou-se para casa da avó, onde o arguido se encontrava à data em que foi preso. Neste apartamento de tipologia T2, I partilhava o mesmo quarto com a mãe e dois irmãos, utilizando por vezes o piso superior para dormir (terraço, semi fechado, usado para lazer pelos residentes). Apesar de sobrelotado o espaço habitacional estava organizado e com condições minimamente adequadas. Existindo uma vinculação afectiva de relevo entre o arguido e as figuras de referência – avó e mãe, destacando-se I na capacidade de se responsabilizar pelos cuidados ao irmão. I nasceu prematuro, filho de mãe toxicodependente, não tendo sido mantido o relacionamento dos progenitores, o jovem foi criado desde então pela avó materna, num contexto monoparental. A avó manteve sempre actividade laboral regular assegurando de forma suficiente as necessidades de subsistência deste neto. Paralelamente ajudava as duas filhas no apoio aos restantes seis netos. O processo de socialização do arguido foi avaliado como adequado até ao início da adolescência, onde foram identificados comportamentos disruptivos. Entre as suas condutas desadequadas foi persistindo o desafio a conceitos de autoridade, uso de tabaco e drogas em contextos de grupo e foi sinalizado a entidades sociais e de apoio à infância. O arguido viria a ser entregue provisoriamente ao pai, com quem viveu em Loulé, cerca de dois anos, mas, não se adaptando às regras familiares, regressou para junto da mãe, preservando o contacto com a avó. No ano lectivo passado, I estava a frequentar um curso na Escola Júlio Dantas, com vista a concluir o 9º ano, inserido no Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF), abandonou os estudos. Não mantinha qualquer ocupação, desinvestido igualmente da prática de desporto. Convivia com pares com práticas delituosas, associadas ao consumo de substâncias estupefacientes e a condutas ilícitas para obtenção de proventos. I reconhece efectuar consumos de haxixe junto de pares de faixa etária superior, no entanto nunca efectuou acompanhamento psicoterapêutico especializado, desvalorizando a necessidade de tratamento médico. Viria a ser referenciado pelas OPC’s em várias ocorrências que determinaram a aplicação de medidas de coacção cada vez mais gravosas, inclusive Obrigação de Permanência na Habitação com recurso a Vigilância Eletrónica. O reduzido auto-controlo e respeito pelas medidas coactivas aplicadas, culminou na prisão preventiva em 03-08-2015 por incumprimento das medidas anteriores de confinamento na habitação. Em meio prisional o jovem tem visitas da família e apoio. Foi punido em Outubro com 15 dias em cela disciplinar por não cumprir as regras internas de forma gravosa. Apresenta em abstracto capacidade de avaliar o prejuízo dos comportamentos socialmente ilegítimos sem que efectivamente revele preocupação quanto ao que a si diz respeito, posicionando-se de modo pouco crítico e contido no discurso.
1.83 O arguido S tem actualmente 19 anos, e é descendente de imigrantes Ucranianos, vive no nosso país desde o início da idade escolar. Tem residência regular, mas não chegou a obter nacionalidade portuguesa. Os pais mostram-se bem integrados, com uma vida organizada, proporcionadora da satisfação das necessidades básicas dos elementos do agregado. O pai é pedreiro e a mãe é auxiliar num lar de deficientes motores, a par de serviços particulares de massagista. O arguido tem um único irmão, que também integra o agregado, tem 20 anos e trabalha num restaurante. Se frequentou o sistema de ensino oficial em Portugal, sem problemas de maior até à adolescência. Depois de terminar o 2º ciclo começaram a surgir problemas de desinteresse, absentismo e associação a pares igualmente desmotivados pela escola. Ainda assim, entre a sucessão de anos lectivos marcados pelo desinteresse e reprovações, concluiu o 9º ano. No presente mostra-se apostado em retomar a escolaridade, pela via da formação profissional, tendo-se inscrito num curso de técnicas comerciais promovido pelo IEFP, que lhe conferirá equivalência de 12º ano. Ainda que agradado com a inserção sócio-comunitária no país de acolhimento, onde considera ter sentido de pertença, fazendo menção a hábitos de convivência e facilidade de relacionamento com pares, assim como um suporte familiar assinalado como positivo, tem sido notória por parte do arguido na fase final da adolescência a emergência de comportamentos disruptivos, muito para além dos característicos da fase, …, sendo ainda recorrentemente sinalizado junto dos OPC por delitos de natureza apropriativa. A família mostra-se preocupada com a situação, assumindo maiores dificuldades na contenção e monitorização deste filho. Revelam uma postura de reprovação destes comportamentos, que atribuem à permeabilidade à influência de pares desviantes e necessidades apropriativas do arguido, habitualmente reactivo a contrariedades e privações. S admite a negatividade dos factos por que se encontra acusado e a oportunidade da intervenção do sistema de justiça. Aparentemente este confronto e o receio das consequências condenatórias tem surtido um impacto relativamente dissuasor, e alguma inversão nos factores de risco, designadamente o afastamento de pares e ambientes pró-criminais e um melhor uso de tempo, agora aparentemente mais empenhado em prosseguir estudos. Mantém uma relação de namoro há 3 anos, com uma jovem da mesma faixa etária e que é tida como uma figura de referência positiva.
Factos não provados: I. NUIPC ---/14.4PALGS
2.1 Que o arguido S. era o indivíduo que acompanhava o arguido I.
2.2 Em consequência da descrita actuação, a ofendida sofreu dores ligeiras, não lhe tendo sido causada qualquer lesão visível. II. NUIPC ---/14.0PALGS
2.3 Que foram os arguidos I e S os indivíduos que praticaram os factos referidos nos factos provados.
2.4 Em consequência da descrita actuação, a ofendida sofreu dores ligeiras, não lhe tendo sido causada qualquer lesão visível.
2.5 Os arguidos I e S actuaram como descrito, sempre em conjugação de esforços e comunhão de intentos, na execução de plano por ambos engendrado, com o intuito, concretizado, de se apoderarem dos bens e valores existentes na posse da ofendida Delyth, designadamente da carteira desta e do respectivo conteúdo, não se coibindo, para o efeito, de a molestar fisicamente, usando de violência e provocando-lhe dores.
III. NUIPC --/14.9PALGS
2.6 Que eram os arguidos I e S os indivíduos referidos nos factos provados.
2.7 Em consequência da descrita actuação, a ofendida sofreu dores ligeiras, não lhe tendo sido causada qualquer lesão visível.
2.8 Os arguidos I e S actuaram como descrito, sempre em conjugação de esforços e comunhão de intentos, na execução de plano por ambos engendrado, com o intuito, concretizado, de se apoderarem dos bens e valores existentes na posse da ofendida Annette, designadamente da mala desta e do respectivo conteúdo, não se coibindo, para o efeito, de a molestar fisicamente, usando de violência e provocando-lhe dores.
IV. NUIPC ---/14.3PALGS
2.9 No dia 22/02/2014, cerca das 21h35m, os arguidos I e S caminhavam apeados na Rua Portas de Portugal, em Lagos.
2.10 Ao avistarem Sheila que caminhava naquele local, sozinha, transportando uma mala a tiracolo, os arguidos I e S formularam o propósito de se apoderarem de objectos e valores que a mesma transportava, por recurso à força.
2.11 Na execução do referido propósito, os arguidos I e S aproximaram-se de Sheila e, de forma imprevista e sem nada mais dizer, agarraram e puxaram, com o uso da força, a mala que esta transportava a tiracolo.
2.12 Sheila agarrou com o uso da força a sua mala, evitando que os arguidos se apoderassem da mesma.
2.13 Em acto contínuo, os arguidos I e S colocaram-se em fuga para parte incerta, deixando no local a mala.
2.14 Actuaram os arguidos I e S como descrito, sempre em conjugação de esforços e comunhão de intentos, na execução de plano por ambos engendrado, com o propósito de se apoderarem dos bens e valores existentes na posse da ofendida.
2.15 Para conseguir esse objectivo os arguidos I e S utilizaram a força física contra a ofendida e tentaram colocá-la na impossibilidade de reagir perante a surpresa da sua actuação.
2.16 Os arguidos I e S bem sabiam que tal objecto não lhes pertencia e que agiam contra a vontade do legítimo e respectivo dono, não logrando concretizar tais intentos por circunstâncias alheias à sua vontade.
VI. NUIPC ---/14.1PALGS
2.17 Que o arguido S. praticou os factos referidos nos factos provados.
2.18 Na prática dos quais o arguido S. calçou um par de luvas de látex, de cor azul.
2.19 O arguido S. sabia que os bens de que se apoderou não lhe pertenciam, e mesmo assim quis fazê-los coisa sua, como aliás veio a conseguir, apesar de saber que agia contra a vontade e sem o consentimento do seu legítimo proprietário.
2.20 Ao actuar do modo descrito nos factos provados o arguido D agiu com o propósito de em momento posterior, restituir a mochila aos arguidos I e S para futura transmissão.
VII. NUIPC ---/14.7PALGS
2.21 Que o arguido S participou nos factos provados supra.
2.22 Que os arguidos I e S acordaram entre si que um dos arguidos permanecia no exterior da residência enquanto o outro se introduzia no interior da mesma.
2.23 No exterior, o arguido I foi ao encontro do arguido S que o aguardava nas imediações junto à residência de Anabela.
2.24 Na posse dos objectos descritos nos factos provados, o arguido S abandonou o local em direcção à residência do arguido D, localizada na Rua de Santo Amaro…, em Lagos.
2.25 Aí chegado, o arguido S pediu ao arguido D que procedesse à venda das jóias descritas nos factos provados que havia subtraído da residência.
Motivação da decisão de facto: Exame Crítico da prova
Quanto à questão da culpabilidade,
Não tendo comparecido em julgamento os arguidos D e A, e tendo os arguidos presentes I e S optado pelo silêncio, a convicção do Tribunal quanto aos factos provados e não provados fundamentou-se nos seguintes elementos de prova:
no NUIPC --/14.4PALGS (incorporado no NUIPC ---/14.7PALGS)
apesar de não ter sido possível inquirir a ofendida Zhu, a convicção estabeleceu-se com fundamento –
no auto de notícia de fls. 433 a 434, quanto à hora e local dos factos, descrição dos bens subtraídos, e identificação da ofendida Zhu na participação da mesma ao agente autuante da PSP,
no aditamento ao auto de notícia a fls. 443, a que se seguiu o auto de apreensão dos bens indicados por Zhu, a fls. 445, tendo tais bens sido recuperados pela PSP com a cooperação do arguido Iúri, que subscreveu o referido auto e foi quem indicou às autoridades o local onde deixara parte dos bens (passaporte, cartão Vogue e um bilhete de autocarro),
e, bem assim, no aditamento a fls. 455, donde consta a entrega à PSP, por um transeunte, de bens que achou na via publica (a mala, contendo bilhetes de avião em nome da participante Zhu, chaves e um cartão do Hotel Via Don Ana), elementos de prova que, interpretados conjugadamente, após a detenção do arguido nas circunstâncias apuradas no NUIPC ---/14.7 PALGS, foram bastantes para alicerçar a convicção do Colectivo quanto à autoria do arguido I, tendo os respectivos factos sido julgados provados.
Já não assim, quanto à co-autoria do arguido S, por, quanto a este, nada ter sido encontrado na sua posse, e não haver elementos de prova atendível, designadamente, prova documental, que fossem susceptíveis de permitir o estabelecimento de relações entre este arguido e os factos que lhe foram imputados na acusação, razão porque foram os atinentes factos julgados não provados quanto a ele.
no NUIPC ---/14.0PALGS (incorporado no NUIPC ---/14.7PALGS)
a convicção do Colectivo fundou-se no auto de notícia de fls. 358,
e no depoimento da testemunha/ofendida Delyth prestado em sede de audiência de julgamento, e que, tendo descrito as circunstâncias do roubo de que foi vitima, designadamente, data, hora e local, e modo de actuação, e bens de que foi desapropriada, e que não recuperou,
todavia, não reconheceu nenhum dos arguidos presentes como sendo qualquer dos assaltantes, designadamente, quanto ao arguido I, tendo referido, apenas, a possibilidade de alguns traços físicos semelhantes, mas sendo a descrição tão vaga, que não permitiu estabelecer nenhuma ligação ao arguido, pelo que foram os factos respeitantes à (co)autoria dos arguidos julgados não provados, em conformidade.
no NUIPC ---/14.9PALGS (incorporado no NUIPC ---/14.7PALGS)
Apesar de não ter sido possível inquirir a testemunha em audiência de julgamento, a convicção do Colectivo fundou-se no auto de notícia de fls. 373 e no aditamento de fls. 374, quanto aos factos da data, hora e local dos factos de que a participante foi vítima e dos bens de que se viu desapropriada, e nos aditamentos de fls. 377 e 382, quanto aos bens recuperados, factos que foram julgados provados,
todavia, nenhuma prova se tendo produzido quanto à (co)autoria dos arguidos I e S desses factos, foram os factos respeitantes ao arguido S julgados não provados.
no NUIPC --/14.3PALGS (incorporado no NUIPC ---/14.7PALGS)
também não tendo sido possível ouvir em audiência a testemunha/ofendida, nem constando do auto de notícia qualquer indicação da identidade dos autores suspeitos, nem indicação de bens subtraídos, dada a forma tentada do crime, nem sequer indicação dos bens e/ou valores que podiam ter sido objecto de apropriação, os demais factos referidos no auto de notícia não mereceram relevância para serem valorados positivamente pelo colectivo, pelo que foram todos os factos julgados não provados.
no NUIPC ---/14.0PALGS, (incorporado no NUIPC ---/14.7PALGS)
Apesar de não ter sido possível inquirir em audiência de julgamento a testemunha JF, e as testemunhas/ofendidos Filip e Carl, a convicção do Colectivo encontrou fundamento bastante no auto de denúncia, a fls. 181, quanto à data, hora e local dos factos e identidade dos ofendidos/participantes e indicação dos bens subtraídos em conjugação com o relato de diligência externa da PSP, RDE, a fls. 12, onde, com a cooperação do arguido I, documentada a fls. 13 e 15, foi encontrado e apreendido o computador Apple, conforme resulta do auto de apreensão a fls. 28 e fotos de fls. 29 e 190, que se encontrava na posse de JF, e tendo também ficado documentada a entrega do dito computador ao respectivo dono, Filip, e o respectivo valor, nos termos consignados nos autos de entrega e de avaliação a fls. 78 e 77, em conformidade com o que foram os factos relevantes julgados provados, inclusive quanto ao I-phone, apesar de não ter sido recuperado, por ter sido subtraído da mesma residência e na mesma ocasião.
no NUIPC ---/14.1PALGS (incorporado no NUIPC ---/14.7PALGS)
a convicção do Colectivo fundou-se no auto de notícia de fls. 313 e 314,
nos depoimentos das testemunhas,
Balthasar,
de nacionalidade alemã, que, em Setembro de 2014, estava de férias em Lagos, em casa de Christian, que relatou que quando a residência foi alvo de furto, estava na varanda e viu alguém, que não sabe quem era, levaram um computador portátil, uma mala, e um aparelho fotográfico, cujos valores não soube precisar, e que não levaram qualquer objecto seu, e que quando tinha acabado de chegar e subiu ao 2º andar tinha ouvido barulho, e do balcão da varanda do quarto viu uma pessoa no quintal sentado ou deitado com luvas azuis, e gritou a perguntar o que estava ali a fazer e a pessoa saltou para os quintais das casas vizinhas e fugiu, seriam entre as 17h e as 18h, e viu uma segunda pessoa a fugir, mas não conseguiu identificar nada dessa pessoa, e que referiu ainda que a porta da varanda facilmente se abria, porque não tinha muita segurança.
Christian,
ofendido, de nacionalidade alemã, que não conhece os arguidos, mas relatou que, no início de Setembro de 2014, tinha uma residência arrendada em Lagos, e essa casa foi assaltada, nesse momento encontravam-se na residência a família dele e o casal amigo, seriam aproximadamente 17 horas, levaram-lhe do andar de cima objectos no valor de 1.700 euros, bens cuja lista forneceu aos autos - um computador portátil cor de laranja, três consolas de jogos Nintendo, vários jogos das mesmas consolas, uma bolsa, onde estavam guardadas, uma mochila marca Jako, e 100 euros que estavam no porta-moedas das crianças e os documentos das crianças, e cartões de crédito – tendo recuperado depois os documentos e os cartões e a carteira, mas não o dinheiro nem os objectos,
acrescentou ainda que os assaltantes entraram através da varanda, mas não viu nenhum deles nem sabe identificá-los,
Kleyton,
empregado do Mc Donalds de Lagos, que, à excepção do arguido A conhece todos os outros, e que declarou que o arguido I ofereceu ao seu irmão, que tem 8 anos, uma consola Nintendo, que disse que era sua, consola que mais tarde foi apreendida pela PSP quando o I foi detido,
PJ
mecânico, que conhece os arguidos I, S e D, e declarou que comprou ao arguido I um computador portátil Sony Vaio, cor de laranja, por 150 euros, que já conhecia o I antes, mas nunca lhe tinha comprado nada, que o I tinha pedido pelo computador um preço superior, mas só podia dar-lhe 150 euros, e, mais tarde, quando foi chamado à PSP, soube que o computador era furtado e entregou-o às autoridades, elementos de prova confirmados/reforçados pelo auto de busca e apreensão da mochila Jako em casa do arguido D, a fls. 18 e 18 verso, e fotos a fls. 19, e, pelo auto de apreensão da consola Nintendo e respectiva bolsa, 4 videojogos e uns auscultadores, apreendidos a Kleyton, a fls. 33, e respectivas fotos de fls. 34 a 35, e 333 a 336, e, ainda, pelo auto de apreensão do computador Sony Vaio, a fls. 36, apreendido a PJ, e respectivas fotos a fls. 37, e ainda, quanto aos documentos furtados, no auto de apreensão de fls. 319, e no auto de entrega de fls. 320, documentos encontrados pela PSP, no âmbito de investigação de furtos, que se encontravam numa casa em construção nas imediações do local do furto, como se encontra documentado a fls. 66 e seguintes, provas em conformidade com as quais se julgaram provados os factos respeitantes à autoria do furto ao arguido Iúri .
Já quanto à comparticipação do arguido S nos mesmos factos, que constava da acusação pública expressa no facto de um dos assaltantes usar luvas azuis, pormenor referido em audiência pela testemunha Balthasar, coincidente com a circunstância constante do auto de busca a casa do arguido S, em que foi apreendido um par de luvas azuis, auto de fls. 28, todavia, tal pormenor/circunstância foi considerada insuficiente pelo colectivo para dar como provada a intervenção do arguido S, pelo que, havendo dúvidas fundadas sobre a sua comparticipação foram os atinentes factos julgados não provados.
no NUIPC ---/14.7PALGS
a convicção do Colectivo fundou-se no auto de notícia de fls. 2 a 3, do qual resultou a investigação da PSP no estabelecimento “X”, consignada no aditamento de fls. 5 e no RDE de fls. 12, investigação da qual resultou a apreensão das peças de ouro compradas pelo referido estabelecimento a D, conforme se encontra documentado a fls. 6 e 7, nas fotos a fls. 8, no auto de avaliação a fls. 9 e no termo de entrega a fls. 10, prova documental que consigna as diligências desenvolvidas pela PSP de Lagos, na oportunidade da deslocação dos três arguidos, D, S e I, ao estabelecimento X em dois dias seguidos para receberem em duas parcelas o produto da venda das jóias furtadas, e das quais decorreu a detenção deles, e a que se seguiram as buscas e apreensões, tudo sustentado nos depoimentos das seguintes testemunhas -
Anabela ,
ofendida, técnica de medicina nuclear, que não conhecia nenhum dos arguidos, mas descreveu as circunstâncias em que lhe assaltaram a casa, cerca das 15h-16h em Setembro de 2014, quando estava a almoçar no piso térreo e lhe entraram pela janela do 1º andar, que estava aberta, tendo a empregada encontrado o assaltante, que fugiu, mas que já ia de costas e por isso ela não conseguiu identificar, e descreveu também os objectos subtraídos e respectivo valor, com a rectificação que depois efectuou e consta do aditamento de fls. 673, e quais os objectos que recuperou, e os que não recuperou,
ML
empregada do estabelecimento X,
cujo depoimento em audiência apresentou algumas desconformidades com os relatos da RDE de fls. 5 e 12, que o colectivo face ao tempo decorrido, entendeu como não essenciais, em face da prova documental existente, designadamente, do documento de fls. 7, cuja consistência aponta para a versão vertida na acusação, testemunha que, no essencial, confirmou que os três arguidos D, I e S, compareceram no estabelecimento para a venda das referidas peças, e em dois dias seguidos porque lhes pagou o preço em duas parcelas, tendo sido essa a circunstância que propiciou a intervenção da PSP no segundo dia e subsequente detenção dos três arguidos, provas em conformidade com as quais o Colectivo julgou provados os factos respeitantes à autoria dos factos respeitantes ao crime de furto ao arguido I, mas não provados os respeitantes à co-autoria dos mesmos factos quanto ao arguido S, que na parte respeitante ao furto julgou como não provados, por inexistir qualquer prova dessa comparticipação, não se tendo, contudo, suscitado qualquer dúvida quanto à comparticipação dos arguidos S e D na venda e recebimento do preço dos objectos no estabelecimento X, pelo que foram esses factos apurados, típicos do crime de receptação, julgados provados quanto a ambos.
no NUIPC ---/15.0PALGS
a convicção do Colectivo fundou-se no auto de notícia de fls. 11,
e nos depoimentos das testemunhas -
Teresa,
ofendida, de nacionalidade Britânica, que manifestou vontade de procedimento criminal a fls. 11 vº, que não conhece os arguidos, e relatou que quando estava a sair pelas traseiras do ginásio que frequentava, viu um indivíduo a sair também para o exterior e reparou que o seu casaco e os de outras pessoas que frequentavam o estúdio e estavam penduradas num cabide perto da porta já lá não estavam, pelo que chamaram a polícia, e foi com os agentes à procura da pessoa que tinha visto a sair do estúdio, tendo visto então um homem vestido com o seu casaco e, por isso, o identificou, e que esse indivíduo que foi detido, mostrou à polícia o lugar onde tinha guardado as coisas que tinha furtado, em consequência do que recuperou o casaco, um cachecol e as luvas, mas não as chaves que estavam dentro do bolso do casaco, esclarecendo ainda que o assaltante também tinha levado o casaco de outra pessoa, que os factos aconteceram em Fevereiro de 2015, e que desde que viu a pessoa a sair do ginásio até o identificar na rua com o seu casaco decorreu menos de uma hora, tendo estimado o valor dos seus bens furtados em 150 euros,
Anthony ,
ofendido, de nacionalidade Inglesa, que apresentou queixa a fls. 11 vº, e declarou não conhecer os arguidos, e quando estava no estúdio de Pilates, em Lagos, e ouviu a Srª Kerr dizer que os casacos tinham sido levados, viu que o dele também tinha sido levado com as chaves do carro, e outras chaves, e o telemóvel, que as chaves do carro valiam 400 libras, e o telemóvel, que era antigo, devia valer umas 10 libras, e o casaco valia 5 a 10 libras, tendo recuperado tudo excepto o telemóvel que não conseguiram encontrar, testemunhas cujos depoimentos se encontram devidamente suportados pela detenção do arguido Iúri a fls. 3, que cooperou na recuperação dos objectos furtados conduzindo a PSP aos locais onde os deixara, o que tudo se encontra documentado no auto de fls. 3 a 4 e na reportagem fotográfica de fls. 21 a 23, e nos autos de apreensão de fls. 18 e 19, e reportagem fotográfica de fls. 110, prova em face da qual não se suscitaram quaisquer dúvidas quanto à prática pelo arguido I dos factos integrantes dos crimes de furto em questão, que foram julgados provados.
no NUIPC --/14.2PALGS (incorporado no NUIPC ---/14.7PALGS)
a convicção do Colectivo fundou-se no auto de notícia de fls. 254, donde consta a lista de objectos furtados, aditamentos a fls. 98 e 99, foto de fls. 292, fotos a fls. 100, tiradas com o telemóvel furtado interceptadas pelo queixoso no seu computador conectado ao telemóvel, e identificação do IMEI utilizado nessas fotos pelo arguido I , e, posterior aditamento de fls. 245 e 244, e informações da Vodafone a fls. 249, quanto à identificação do utilizador do mesmo telemóvel pelo arguido A, (que se encontra processualmente adquirido ter sido o padrasto do arguido I, facto igualmente mencionado no relatório social do arguido I, e, ipso facto, também conhecedor da ausência de rendimentos lícitos do arguido I, bem como informação da operadora MEO, a fls. 250, respeitante à utilização do mesmo aparelho pela testemunha L, elementos coincidentes com informações de números de contacto telefónico das pessoas em questão nas páginas do facebook reproduzidas a fls. 251 e 252, e no auto de apreensão do dito aparelho a L, a fls. 261, e fotos a fls. 265, e respectivo auto de avaliação a fls. 277, auto de reconhecimento do telemóvel a fls. 277 e 288 e termo de entrega a fls. 289, auto de apreensão do telemóvel à testemunha L, a fls. 261 (do I vol. do NUIPC ---/15.0PALGS) e ainda nos depoimentos das testemunhas -
Luís
empregado de mesa, que declarou não conhecer os arguidos presentes, I e S, mas esclareceu ter comprado um telemóvel, no final de 2014, através do contacto de uma pessoa que um amigo seu viu no facebook, pessoa com quem se encontrou ao pé da estação de Lagos e só conheceu por Tó-Zé, pessoa que não mais voltou a ver, tendo pago 150 euros pelo telemóvel, Samsung Galaxy S3, o qual passou a utilizar com o seu cartão e número de telemóvel, 961----, e que mais tarde lhe foi apreendido pela PSP de Lagos, que lhe disse que o telemóvel tinha sido furtado de uma residência,
quanto ao preço pago tendo referido que lhe pareceu razoável, porque já tinham saído modelos posteriores daquele telemóvel,
Wilhelm
ofendido, de nacionalidade Holandesa, não conhece os arguidos, e declarou que a sua residência foi assaltada em 14 de Agosto de 2014, quando ele estava em casa, entre as 15h e as 16h, saltaram pela varanda do jardim, a mulher e uma amiga estavam deitadas junto à piscina e ele e um amigo estavam no interior da residência, levaram um computador portátil, no valor de 700 euros novo, um telemóvel, entre 300 e 400 euros, um relógio de ouro que era dos amigos e que ele pensa que tinha o valor de 1.000 euros, não sabe dizer a marca, e anéis, e que só foi recuperado o telemóvel,
Quanto à situação pessoal dos arguidos
A convicção fundou-se nos CRC´s e nos relatórios sociais juntos aos autos dos arguidos I e S, não tendo comparecido na DGRS os arguidos D e A.
Analisando:
A) - da nulidade do acórdão:
O recorrente invoca insuficiente fundamentação do acórdão, geradora da nulidade deste, nos termos do art. 379.º, n.º 1, alínea a), por referência ao art. 374.º, n.º 2, ambos do CPP.
Alude a que No acórdão recorrido, limitou-se o tribunal a quo a fazer uma súmula de depoimentos prestados em audiência e de elementos do inquérito, sem qualquer referência à credibilidade que cada um deles tenha merecido e às razões do respectivo merecimento, faltando o exame crítico das provas. O tribunal a quo não procedeu à completa indicação das provas, na medida em que não efectuou um exame crítico de tais provas.
Ora, a fundamentação da sentença constitui requisito da validade desta, pois, conforme ao disposto naquele art. 374.º, n.º 2, dela deve constar a“enumeração dos factos provados e não provados, bem como (…)uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”, sob pena de nulidade, nos termos da alínea a) do n.º 1 desse art. 379.º, questão que, dada a redacção do seu n.º 2, é, aliás, de conhecimento oficioso.
Insere-se em exigência do moderno processo penal, com dupla finalidade: extraprocessualmente, constituir condição de legitimação externa da decisão, pela possibilidade que permite de verificação dos pressupostos, critérios, juízos de racionalidade e de valor e motivos que a determinaram; intraprocessualmente, realizar o objectivo de reapreciação da decisão por via do sistema de recursos.
Acompanhando Paulo Saragoça da Matta, in “A livre apreciação da prova e o dever de fundamentação da sentença”, em Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, coorden. científica de Maria Fernanda Palma, Almedina, 2004, pág. 255, a exigência de motivação acaba por ter uma função dupla, pré e pós judicatória – naquela primeira fase permite ao julgador exercer um auto-controle do acerto dos seus próprios juízos; na segunda fase permite à comunidade, e ao destinatário das medidas a tomar pelo sistema penal, compreender os critérios seguidos pelo julgador e aferir da respectiva legitimidade, razoabilidade e aceitabilidade.
Identicamente, conforme Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1993, vol. II, págs. 112 e seg.:
Quando tratámos dos actos decisórios referimos a finalidade da sua fundamentação: lograr uma maior confiança do cidadão na Justiça, o autocontrolo das autoridades judiciárias e o direito de defesa a exercer através dos recursos.
A primeira das finalidades indicadas ajuda à compreensão da decisão e, consequentemente, à sua aceitação, facilitando a necessária confiança dos cidadãos nas autoridades judiciárias.
O autocontrolo que a exigência de motivação representa manifesta-se a níveis diferentes: por um lado, obsta à comissão de possíveis erros judiciários, evitáveis precisamente pela necessidade de justificar a decisão; por outro lado, implica a necessidade de utilização por parte das autoridades judiciárias de um critério racional de valoração da prova, já que se a convicção se formou através de meras conjecturas ou suspeitas, a fundamentação será impossível. Assim, a motivação actua como garantia de apreciação racional da prova.
Finalmente, a motivação é absolutamente imprescindível para efeitos de recurso, sobretudo quando tenha por fundamento o erro na valoração da prova; o conhecimento dos meios de prova e do processo dedutivo são absolutamente necessários para poder avaliar-se da correcção da decisão sobre a prova dos factos, pois só conhecendo o processo de formação da convicção do julgador se poderá avaliar da sua legalidade.
Concretiza o desiderato constitucional do art. 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), que impõe a fundamentação “na forma prevista na lei”, em sintonia e como parte integrante do conceito de Estado de Direito democrático e da legitimação da decisão judicial e da garantia do direito ao recurso, por respeito às garantias de defesa do condenado (art. 32.º, n.º 1, da CRP) e de acesso à tutela jurisdicional efectiva (art. 20.º, n.º 4, da CRP), no sentido de que se assegure um julgamento equitativo, como vem sendo reconhecido pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e se apresenta consagrado, em termos amplos, no art. 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Só desse modo, essa garantia de tutela judicial se efectiva à luz da livre apreciação da prova do art. 127.º do CPP, em adequação à previsão do art. 18.º, n.º 2, da CRP, sendo indispensável para que fique preservado o real respeito pelo princípio da legalidade da decisão judicial, dando corpo à imparcialidade, à independência e à isenção que lhe devem ser reconhecidas.
Ainda, segundo Germano Marques da Silva, ob. cit., Editorial Verbo, 1994, vol. III, pág. 288, Na fundamentação há que distinguir três partes: a enumeração dos factos provados e não provados, a exposição de motivos que fundamentam a decisão e a indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
No que concerne à suscitada vertente da fundamentação - indicação e exame crítico das provas -, é inequívoco que às mesmas correspondem, em concreto, determinadas exigências, sem as quais não é viável atingir as referidas finalidades, cumprindo, então, adequá-las à medida necessária para que, no fim de contas, a decisão seja compreensível e, por isso, deva conter, para além da indicação dos meios de prova, a explicitação dos elementos que, em razão das regras da experiência e/ou de critérios lógicos, constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção se formou em determinado sentido ou foram valorados os diversos meios (acórdão do STJ de 13.02.1992, in CJ ano XVII, tomo I, pág. 36), sem que, no entanto, deixe de ser tão completa quanto possível, ainda que sucinta.
A compatibilização com a livre apreciação da prova assim o exige, já que, esta, se não confunde com apreciação judicial arbitrária, em que a livre convicção do juiz seja meramente subjectiva, emocional e, portanto, imotivável.
Conforme Figueiredo Dias, in “Direito Processual Penal”, Coimbra Editora, 1974, págs. 204 e seg., Se a verdade que se procura é (…) uma verdade prático-jurídica, e se, por outro lado, uma das funções primaciais de toda a sentença (maxime da penal) é a de convencer os interessados do bom fundamento da decisão, a convicção do juiz há-de ser, é certo, uma convicção pessoal – até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (…) -, mas, em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros (…) Não se tratará, pois, na «convicção», de uma mera opção «voluntarista» pela certeza de um facto e contra toda a dúvida, ou operada em virtude da alta verosimilhança ou probabilidade do facto, mas sim de um processo que só se completará quando o tribunal, por uma via racionalizável ao menos a posteriori, tenha logrado afastar qualquer dúvida para a qual pudessem ser dadas razões, por pouco verosímil ou provável que ela se apresentasse.
Também, segundo Germano Marques da Silva, ob. cit., vol. III, pág. 111, A livre apreciação da prova não deve, pois, ser entendida como uma operação puramente subjectiva pela qual se chega a uma conclusão unicamente por meio de impressões ou conjecturas de difícil ou impossível objectivação, mas valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objectivar a apreciação, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão.
Sem prejuízo, essa indicação dos meios de prova só tem de reportar-se àqueles que forem tidos por relevantes, seja em que sentido for, para motivar os factos provados e não provados a cuja enumeração se procedeu.
Como, também, o seu exame crítico não equivale a um repositório pormenorizado de todo o julgamento, já que isso consubstanciaria como que um substitutivo da audiência e dos princípios da imediação e da oralidade que a regem, não se impondo que, em relação a cada facto, se autonomize e substancie a razão de decidir e que, em relação a cada fonte de prova, se descreva como a sua dinamização se desenvolveu em audiência (acórdão do STJ de 30.06.1999, no proc. n.º 285/99-3.ª, in Sum. Acs. STJ n.º 32, pág. 92).
Não se impõe, pois, que sobre cada meio de prova seja feita uma individualizada e exaustiva valoração, de tal modo minuciosa, que acabaria por tornar-se tarefa impraticável e sem utilidade, além do mais, destinando-se os recursos a servir de remédios jurídicos contra decisões erradas e injustas e não a meios de entorpecimento da justiça.
A densificação desse exame crítico, que a lei não explicita, tem de ser aferido com critérios de razoabilidade, que permita avaliar cabalmente o porquê da decisão e o processo que serviu de suporte ao seu conteúdo – v. g. acórdãos do STJ de 12.04.2000, no proc. n.º 141/2000-3.ª, in Sum. Acs. STJ, n.º 40, pág. 48, e de 03.10.2007, no proc. n.º 07P1779, inwww.dgsi.pt., referindo este último:
O “exame crítico” das provas constitui uma noção com dimensão normativa, com saliente projecção no campo que pretende regular - a fundamentação em matéria de facto -, mas cuja densificação e integração faz apelo a uma complexidade de elementos que se retiram, não da interpretação de princípios jurídicos ou de normas legais, mas da realidade das coisas, da mundividência dos homens e das regras da experiência; a noção de “exame crítico” apresenta-se, nesta perspectiva fundamental, como categoria complexa, em que são salientes espaços prudenciais fora do âmbito de apreciação próprio das questões de direito.
Só assim não será quando se trate de decidir questões que têm a ver com a legalidade das provas ou de decisão sobre a nulidade, e consequente exclusão, de algum meio de prova.
O exame crítico consiste na enunciação das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou outro dos meios de prova, os motivos da credibilidade dos depoimentos, o valor de documentos e exames, que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pelo ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção (cfr., v. g., acórdão do Supremo Tribunal de 30 de Janeiro de 2002, proc. 3063/01).
O rigor e a suficiência do exame crítico têm de ser aferidos por critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita exteriorizar as razões da decisão e o processo lógico, racional e intelectual que lhe serviu de suporte (acórdãos do Supremo Tribunal de 17 de Março de 2004, proc. 4026/03; de 7 de Fevereiro de 2002, proc. 3998/00 e de 12 de Abril de 2000, proc. 141/00).
Em síntese, sem que, é certo, a mera indicação dos meios de prova que fundamentam a decisão satisfaça as finalidades que à mesma presidem (acórdão do Tribunal Constitucional n.º 680/98, de 02.12, in www.dgsi.pt), haverá de concluir-se que, se a motivação explicar o porquê da decisão e o processo lógico-formal que serviu de suporte ao respectivo conteúdo, de forma bastante e inteligível, inexiste falta ou insuficiência de fundamentação para a decisão, que consubstancie preterição do referido art. 374.º, n.º 2.
Postas estas considerações, atente-se então na argumentação do recorrente:
Nomeadamente, o tribunal não efectuou um exame crítico do auto de notícia a fls. 433 a 434 e aditamento de fls. 443 do NUIPC ---/14.4PALGS (incorporado no NUIPC ---/14), não esclarecendo em que medida é que o reconhecimento que a queixosa Zhu fez de JJ, contribuiu para formar a convicção no tribunal, de que foi o arguido I que praticou o roubo a Zhu. Inexistindo, pois, uma insuficiente fundamentação do acórdão, o que determina a sua nulidade, nos termos do art. 379.º, nº 1, alínea a), com referência ao art. 374.º, n.º 2, ambos do CPP;
Não efectuou um exame crítico dos depoimentos das testemunhas, Kleyton e PJ, ao não esclarecer em que medida é que os mesmos permitiram julgar provados os factos respeitantes à autoria do crime de furto ao arguido I, no NUIPC ---/14.1PALGS;
No NUIPC ---/14.7PALGS, o tribunal a quo não efectuou um exame crítico do depoimento da testemunha ML que, no essencial, declarou apenas que os arguidos D, I e S, compareceram no seu estabelecimento para a venda das peças furtadas referidas na acusação. Ficando por esclarecer em que medida é que esse depoimento permite julgar provados os factos respeitantes à autoria do crime de furto ao arguido I .
Vejamos.
Quanto aos factos do NUIPC ---/14.4PALGS, o tribunal a quo fez menção aos autos indicados e reportou-se ao que retirou de cada um deles, não se detectando necessidade de acrescida explicitação, uma vez que se mostra bem inteligível o alcance probatório que foi disponibilizado por esses elementos, além do mais, como refere o acórdão, “interpretados conjugadamente, após a detenção do arguido nas circunstâncias apuradas no NUIPC ---/14.7 PALGS”, sem descurar, como também alude, à “cooperação do arguido”.
Por seu lado, a alegação reportada a reconhecimento que a queixosa Zhu fez de JJ não consta da motivação decisória, pelo que não haverá de trazê-la à colação, ficando por explicar a razão por que o recorrente procede a essa referência, apenas nas suas conclusões de recurso, sem prejuízo do que adiante se afigurar pertinente aquando da análise da concreta questão da valoração das provas nesse âmbito factual.
Acerca dos factos do NUIPC ---/14.1PALGS, é manifesto que o recorrente descura a resenha que o acórdão contém quanto aos invocados depoimentos, mormente que, como aí consta, quanto a Kleyton, “declarou que o arguido I ofereceu ao seu irmão, que tem 8 anos, uma consola Nintendo, que disse que era sua, consola que mais tarde foi apreendida pela PSP quando o Iúri foi detido”e, relativamente a PJ, “declarou que comprou ao arguido Iúri um computador portátil Sony Vaio, cor de laranja, por 150 euros, que já conhecia o Iúri antes, (…) e, mais tarde, quando foi chamado à PSP, soube que o computador era furtado e entregou-o às autoridades”.
Por seu lado, tais depoimentos, que se mostram explicitados, foram “confirmados/reforçados” pelas buscas e apreensões que são referidas no acórdão.
O relacionamento de todos esses elementos à pessoa do recorrente resulta reflectido de forma suficiente.
A propósito dos factos do NUIPC ---/14.7PALGS, o invocado depoimento de ML está devidamente retratado na motivação do tribunal, aferido na sua credibilidade, não podendo, inevitavelmente, como decorre também do acórdão, ser analisado isoladamente, mormente para se ter concluído pela participação do aqui recorrente.
Não se aceita, pois, que a decisão deva ser cominada de insuficiência relevante para o efeito das legais exigências de fundamentação, uma vez que o tribunal cuidou, de modo transparente e quanto baste, de transmitir as razões por que alcançou a factualidade que fixou, tendo valorado, em medida consentânea, os elementos de prova de que se socorreu, permitindo aquilatar do raciocínio que o guiou.
Ainda que a admissibilidade dessa valoração possa ser, como é, questionada pelo recorrente e, eventualmente com influência na matéria de facto, tal problemática não serve para afirmar a pretendida nulidade do acórdão.
B)- da proibição de valoração de provas:
Reportando-se a valoração de provas proibida, o recorrente alega:
- quanto ao elenco de factos do NUIPC ---/14.4PALGS, à circunstância do tribunal ter sustentado a sua convicção num auto elaborado pela PSP e por si subscrito, no qual consta que o mesmo indicou às autoridades policiais onde deixou parte dos bens da ofendida Zhu , sem que, para o efeito, esse auto tivesse sido lido em audiência, por referência ao disposto nos arts. 357.º e 355.º do CPP;
- acerca dos factos do NUIPC ---/14.0PALGS, à valorada cooperação da sua parte com a PSP, em que, segundo refere, confessapor meio de conversa informal com os agentes da PSP, ter sido o autor do furto à residência dos ofendidos/testemunhas Filip e Carl ;
- quanto aos factos do NUIPC ---/15.0PALGS, ao ter remetido “para a detenção do arguido I a fls. 3, que cooperou na recuperação dos objectos furtados, conduzindo a PSP aos locais onde os deixara”;na sua perspectiva, trata-se, pois, de um auto de detenção no qual se refere que o arguido disse aos agentes da PSP onde se encontravam os objectos e os conduziu ao local. Acresce que o referido auto nem sequer se encontra subscrito pelo arguido e não foi reproduzido em audiência.
A questão situa-se, então, em matéria de legalidade das provas convocadas, inserindo-se como autónoma relativamente ao tratamento processual das nulidades, em sintonia com o disposto no art. 118.º, n.º 3, do CPP, merecendo, por isso, apreciação, ainda que em sede de recurso de decisão final, como aqui sucede.
Conforme Costa Andrade, in “Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal”, Coimbra Editora, 1992, págs. 11/12, as proibições de prova estão hoje legalmente consagradas com a autonomia, generalidade e consistência que permitem perspectivá-las como uma das construções basilares da dogmática processual penal. É o que revela o disposto no art. 118º nº 3, do Código de Processo Penal (CPP). Por outro lado e complementarmente, a lei positiva portuguesa prescreve e regulamenta expressamente um vasto espectro de expressões concretas de proibição de prova.
Em sentido idêntico, João Conde Correia, in “Contributo para a Análise da Inexistência e das Nulidades Processuais Penais”, Boletim da Faculdade de Direito, Studia Ivridica, 44, Coimbra Editora, 1999, págs. 156/161, Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código de Processo Penal”, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2008, pág. 299, e Paulo Sousa Mendes, in “As Proibições de Prova no Processo Penal”, em Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, 2004, pág. 147.
Das proibições de prova se distingue, em rigor, a violação das regras de produção da prova, esta, cominada de nulidade, de acordo com terminologia usada em muitos preceitos, embora, nem sempre, de forma esclarecedora e correcta (João Conde Correia, ob. cit., págs. 27/28).
Em concreto, decorre do acórdão que o tribunal a quo, no âmbito em análise, valorou prova produzida em inquérito, sendo que, não obstante o princípio da imediação, consagrado no aludido art. 355.º do CPP, no sentido de que só valem as provas que tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência, se admite a valoração de provas contidas em actos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas, remetendo, no que ora interessa, para as regras a que essa leitura tem de obedecer, em sintonia com os arts. 356.º e 357.º do CPP.
Implicando limitação relevante da imediação, a utilização dessa prova na convicção do tribunal, se em desrespeito dos legais procedimentos, tornar-se-á verdadeira proibição de prova, com o efeito de não poder valer para sustentar aquela (n.º 1 desse art. 355.º do CPP).
Acompanhando João Conde Correia, in “A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa perspectiva essencialmente jurisprudencial”, Revista do CEJ n.º 4 (2006), pág. 189, as proibições de prova derivam fundamentalmente das opções constitucionais em matéria de investigação criminal e de protecção dos direitos, liberdades e garantias individuais, não será difícil defender que – pelo menos nesses casos – também a delimitação da área proibida deverá encontrar-se na Constituição: seja na identificação das provas absolutamente proibidas (…), seja, sobretudo, na identificação das provas relativamente proibidas (que a constituição autoriza, mas sujeita, como vimos, a uma série de apertados pressupostos materiais sem os quais a prova é considerada abusiva e, como tal, proibida).
Ainda, sublinha que serão proibidas todas as provas obtidas mediante uma compressão dos direitos fundamentais em termos não consentâneos com a autorização constitucional, ainda que aparentemente a prova seja admissível e apenas tenham sido violadas as formalidades processuais necessárias para a levar a cabo. (...) O que interessa é saber se essa formalidade ainda é uma condição constitucional para a admissibilidade da prova. (…) Nesta perspectiva, as proibições de prova são portanto – mesmo que o legislador as repute de nulidades – o reflexo processual do seu regime constitucional e só nesse contexto podem ser identificadas, lidas e compreendidas. Só um critério substancial, que esqueça a fisiologia da norma para se centrar na sua essência, poderá ser útil e ter suficiente capacidade distintiva entre ambos os mecanismos.
Haverá, pois, que atentar nos diversos direitos abrangidos pelo art. 32.º, n.º 8, da CRP, numa interpretação que compatibilize a produção e a valoração das provas com a devida protecção dos mesmos, averiguando-se se a formalidade omitida se deve, ou não, considerar, em si mesma, como condição da sua admissibilidade.
Assim, quanto à fundamentação respeitante ao NUIPC ---/14.4PALGS, não existe obstáculo legal a que seja atendida em julgamento prova documental (auto elaborado pela PSP e aditamento ao mesmo), ainda que também subscrito pelo aqui recorrente, não se reconduzindo a declarações prestadas por este, mas sim a comprovação de diligência efectuada, com a sua cooperação, não se descurando que a investigação em apreço se desenvolveu na sequência da sua “detenção”, “nas circunstâncias apuradas no NUIPC ---/14.7PALGS”.
Nada se retira donde possa resultar que o ora recorrente tivesse sido perturbado na sua liberdade de acção quando procedeu à indicação do local onde deixara parte dos bens da ofendida.
Contrariamente, pois, à perspectiva do recorrente, a invocada leitura em audiência não se impunha, seja por via do art. 356.º, seja por referência ao art. 357.º, ambos do CPP, uma vez que não se tratou de declarações prestadas pelo recorrente, nem mesmo como arguido (só foi constituído como tal posteriormente) e, mormente, esse aditamento mais não reflecte senão recolha de indícios por órgão de polícia criminal, ainda que com a colaboração daquele, tudo se reconduzindo a prova documental.
Na vertente da motivação relativa ao NUIPC ---/14.0PALGS e ao NUIPC ---/15.0PALGS, idêntica cooperação do recorrente é trazida à colação, documentada pela forma que aí consta, cuja leitura, por se tratar também de prova documental, não era necessária para valer como prova.
Aliás, não se tratando de recolha formal de declarações do aqui recorrente, o depoimento de órgão de polícia criminal que procedeu à diligência externa (que não ocorreu) não estaria inibido de se reportar à recolha dos contributos que lhe tivessem sido então, por aquele, transmitidos.
Não, todavia, com o sentido que o recorrente pretende conferir de que tal constituiu conversa informal de valoração proibida, embora a alusão a esse tipo de contacto não decorra expressamente do acórdão.
A problemática entronca em saber se o relatado pelo recorrente na circunstância deve ser visto como atentatório das suas garantias de defesa e, se assim for, não dever valer como prova, se bem que, note-se, não tenha sido a única prova considerada no âmbito dos factos em causa.
Coloca-se, desde logo, no plano da perspectiva de eventual violação do aludido princípio da imediação, mas, aqui, uma vez que se mostra retratado em prova documental, não está vedado o seu aproveitamento.
De forma diversa e, afinal no que propriamente releva, outro poderá ser o entendimento quando atendidas as referidas garantias de defesa, enquanto limitações decorrentes do direito constitucional do arguido ao silêncio, sendo que, no caso, o ora recorrente optou, em audiência, por assumir essa escolha.
Ora, citando o acórdão desta Relação de Évora de 04.06.2013, proc n.º 40/11-4GTPTG.E1, rel. agora Adjunto, in www.dgsi:
«Não há conversas informais quando as forças policiais se limitam a cumprir os preceitos legais, quer pela necessidade de “documentar” a prática do ilícito e suas sequelas, designadamente providenciar os actos cautelares que se imponham (v. g. artigos 243º, 248 a 250º do C.P.P.), quer quando actuam por imposição legal ao detectarem a prática de um ilícito e o arguido decide – por sua iniciativa e sem actuação criticável das forças policiais – fazer afirmações não sugeridas, provocadas ou imaginadas por aqueles OPC.
Não só as forças policiais estão a cumprir preceitos legais que lhes impõem uma actuação, como o arguido fez afirmações unilaterais (a “conversa informal” exige bilateralidade, comunicação mútua, uma provocação para a “confissão por ouvir dizer” ou, mesmo, o “relatar” fraudulento de uma “conversa” inexistente).
Ao invés (…) a “comunicação” reduziu-se à eventual verbalização voluntária de um “estado de alma” por parte do arguido antes de ter essa qualidade.
Ou seja, as forças policiais não estão proibidas de falar com os cidadãos que podem vir a ser arguidos ou com os suspeitos, ou com quem se encontra numa “cena de crime”, que a tal resultado conduz o excesso, o radicalismo, na análise destas situações e na fase inicial do processo.».
Sem prejuízo das reconhecidas formalidades e garantias atinentes à recolha de declarações de arguido (arts. 140.º, 141.º, 143.º e 144.º do CPP), estas têm ser interpretadas como implícitas a essa qualidade ou, pelo menos, à de suspeito nos termos do art. 1.º, alínea e), do CPP, verificando-se pendência de inquérito.
O entendimento do Supremo Tribunal de Justiça vem manifestando posição idêntica.
Segundo o sumário do acórdão de 15.02.2007, no proc. n.º 06P4593, rel. Conselheiro Maia Costa, in www.dgsi.pt:
I - Relativamente ao alcance da proibição do testemunho de “ouvir dizer”, pode considerar-se adquirido, por um lado, que os agentes policiais não estão impedidos de depor sobre factos por eles detectados e constatados durante a investigação e, por outro lado, que são irrelevantes as provas extraídas de “conversas informais” mantidas entre esses mesmos agentes e os arguidos, ou seja, declarações obtidas à margem das formalidades e das garantias que a lei processual impõe.
II - Pretenderá, assim, a lei impedir, com a proibição destas “conversas”, que se frustre o direito do arguido ao silêncio, silêncio esse que seria “colmatado” ilegitimamente através da “confissão por ouvir dizer” relatada pelas testemunhas.
III - Pressuposto desse direito ao silêncio é, no entanto, a existência de um inquérito e a condição de arguido: a partir de então, as suas declarações só podem ser recolhidas e valoradas nos estritos termos indicados na lei, sendo irrelevantes todas as conversas ou quaisquer outras provas recolhidas informalmente.
IV - De forma diferente se passam as coisas quando se está no plano da recolha de indícios de uma infracção de que a autoridade policial acaba de ter notícia: compete-lhe praticar “os actos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova”, entre os quais, “colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime” (art. 249.º do CPP).
V - Esta é uma fase de pura recolha informal de indícios, que não é dirigida contra ninguém em concreto; as informações que então forem recolhidas pelas autoridades policiais são necessariamente informais, dada a inexistência de inquérito. Ainda que provenham de eventual suspeito, essas informações não são declarações em sentido processual, precisamente porque não há ainda processo.
VI - Completamente diferente é o que se passa com as ditas “conversas informais” ocorridas já durante o inquérito, quando já há arguido constituído, e se pretende “suprir” o seu silêncio, mantido em auto de declarações, por depoimentos de agentes policiais testemunhando a “confissão” informal ou qualquer outro tipo de declaração prestada pelo arguido à margem dos formalismos impostos pela lei processual para os actos a realizar no inquérito.
Em idêntico sentido, se pronunciou o acórdão de 12.12.2013, no proc. n.º 292/11.0JAFAR.E1.S1, rel. Conselheiro Santos Cabral, inwww.dgsi.pt, onde se lê:
Na verdade, só a partir do momento em que a suspeita passa a ser razoavelmente fundada se impõe a suspensão imediata do acto e a constituição formal como arguido nos termos do artigo 59 nº1 do Código Penal. Até esse momento o processo de obtenção de diversas declarações, incluindo as do então suspeito, e posterior arguido, logra cobertura legal nos termos dos artigos 55 nº 2 e 249 nº 1 e 2, als. a) e b) do mesmo diploma.
A constituição de arguido constitui, assim, um momento, uma linha de fronteira na admissibilidade das denominadas “conversas informais”, pois que é a partir daí que as suas declarações só podem ser recolhidas, e valoradas, nos estritos termos indicados na lei, sendo irrelevantes todas as conversas, ou quaisquer outras provas, recolhidas informalmente. Consequentemente, não é admissível o depoimento que se reporte ao contacto entre a autoridade policial e o arguido durante o inquérito, quando há arguido constituído, e se pretende “suprir” o seu silêncio, mantido em auto de declarações, por depoimentos de agentes policiais, testemunhando a “confissão” informal, ou qualquer outro tipo de declaração prestada pelo arguido à margem dos formalismos impostos pela lei processual, para os actos a realizar no inquérito.
Sobre a mesma (autoridade policial) incumbe o dever de, nos termos do art. 249 do CPP, praticar “os actos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova”, entre os quais, “colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime. Estas “providências cautelares” são fundamentais para investigar a infracção, para que essa investigação tenha sucesso. E daí que a autoridade policial deva pratica-las mesmo antes de receberem ordem da autoridade judiciária para investigar (art. 249, nº 1).
Nessa fase não há ainda inquérito instaurado, não há ainda arguidos constituídos.
É uma fase de pura recolha informal de indícios, que não é dirigida contra ninguém em concreto. As informações que então forem recolhidas pelas autoridades policiais são necessariamente informais, dada a inexistência de inquérito.
Na situação em análise e através da consulta aos elementos convocados à motivação do tribunal, constata-se que as diligências aí mencionadas, “com a cooperação do arguido”, se inserem nesses procedimentos de investigação, ainda que na sequência da detenção do aqui recorrente (reportada ao NUIPC ---/14.7PALGS), prévias à sua constituição como arguido, resultando, ainda, que essa cooperação não surge senão como assumida por si.
Não se descortina atropelo às suas garantias.
A valoração dessa sua colaboração não se reconduz a conversas informais com a interpretação dada pelo recorrente, nada obstando a que o tribunal tivesse valorado a prova daí decorrente.
C) - do erro notório na apreciação de provas:
Nas suas conclusões de recurso, o recorrente, reportando-se aos NUIPC antes indicados (---/14.4PALGS, ---/14.0PALGS e ---/15.0PALGS), refere que O tribunal recorrido incorreu em erro notório na apreciação da prova.
Relaciona esse erro com a alegada violação do referido art. 355.º do CPP.
Tal erro-vício haverá de ser interpretado como o tem sido o facto notório em processo civil, ou seja, como o facto de que todos se apercebem directamente, ou que, observado pela generalidade dos cidadãos, adquire carácter notório (acórdão do STJ de 06.04.1994, in CJ Acs. STJ, ano II, tomo II, pág. 185).
Consubstancia, como referem Simas Santos/Leal-Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, Rei dos Livros, 2008, págs. 77/78, falha grosseira e ostensiva na análise da prova, perceptível pelo cidadão comum, denunciadora de que se deram provados factos inconciliáveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, seja, que foram provados factos incompatíveis entre si ou as conclusões são ilógicas ou inaceitáveis ou que se retirou de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável. Ou, dito de outro modo, há um tal erro quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das leges artis. Erro notório, no fundo, é, pois, a desconformidade com a prova produzida em audiência ou com as regras da experiência (decidiu-se contra o que se provou ou não provou ou deu-se como provado o que não pode ter acontecido).
Além de que, nos termos do n.º 2 do art. 410.º do CPP do CPP, tem de resultar do “texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum”.
Ora, sem que se mostrem violadas regras da produção da prova, não está o acórdão inquinado desse vício.
Acresce que, se o recorrente o pretendeu reportar à problemática da valoração probatória, como o faz, a situação não se reconduz ao preconizado erro notório, desde logo, porque não está em causa prova vinculada, sem prejuízo de que esse vício funcione como limite da liberdade de apreciação, o que, porém, não se descortina que tenha sido preterido.
Afastada está, pois, a presença de erro notório na apreciação dessas provas.
D) - da insuficiência de provas:
Apontando insuficiência de provas quanto aos factos atinentes aos NUIPC ---/14.1PALGS e ---/14.7PALGS, o recorrente conclui que o tribunal formou a sua convicção para condenar o arguido com base em prova indiciária.
Quanto ao NUIPC ---/14.1PALGS, o recorrente alega que não só os depoimentos das testemunhas Balthasar e Christian não permitem concluir que o recorrente praticou o crime, como os depoimentos de Kleyton e PJ, não permitem induzir a forma como as coisas furtadas chegaram à posse do arguido, nem que as obteve nas condições previstas nos artigos 203.º e 204 do Código Penal
Relativamente ao NUIPC ---/14.7PALGS, invoca que o tribunal a quoforma a sua convicção, essencialmente, com base nos depoimentos, por um lado, da testemunha Anabela, ofendida, que não conhece nem reconhece o arguido I como sendo o autor do furto à sua residência. Por outro, com base no depoimento da testemunha ML que, no essencial, declarou que os arguidos D, I e S, compareceram no seu estabelecimento para a venda das peças furtadas referidas na acusação. Parece-nos mais que evidente que os elementos de prova nos quais o tribunal recorrido baseou a sua convicção são manifestamente insuficientes para poder julgar provados os factos respeitantes à autoria dos factos respeitantes ao crime de furto do arguido I.
Traz, pois, a questão de que, não se tendo produzido prova directa, os elementos colhidos sejam insuficientes, porque, apenas, consubstanciando a dita prova indiciária e, na sua perspectiva, sem a necessária credibilidade para se ter considerado os factos como provados.
Não pondo em causa a admissibilidade dos meios de prova tidos por relevantes, a visão do recorrente afigura-se despida de argumentação para infirmar a convicção que foi formada.
Desde logo, como sublinha o Conselheiro Santos Cabral, in “Código de Processo Penal Comentado”, Almedina, 2016, pág. 378, Não faz a nossa lei processual penal qualquer referência a requisitos especiais em sede de demonstração dos requisitos da prova indiciária. O fundamento, e creditação desta, está dependente da convicção do julgador a qual, sendo uma convicção pessoal, deverá ser sempre objectivável e motivável.
Não basta, pois, ao recorrente, afirmar a sua discordância sustentado em que a prova tenha sido indiciária.
Já Vaz Serra salientava, in “Provas (Direito Probatório Material)”, BMJ n.º 110, que Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência (…) ou de uma prova de primeira aparência.
E, identicamente, o Conselheiro Santos Cabral, in ”A Prova indiciária as novas formas de criminalidade”, Estudos Jurídicos/Direito e Processo Penal, acessível em www.stj.pt, que Na formação da convicção judicial intervêm provas e presunções, sendo certo que as primeiras são instrumentos de verificação directa dos factos ocorridos e as segundas permitem estabelecer a ligação entre o que temos por adquirido e aquilo que as regras da experiência nos ensinam poder inferir.
As presunções, que são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, como decorre do art. 349.º do Código Civil, reconduzem-se, afinal, ao produto das regras da experiência, através das quais o julgador conclui que a existência de certo(s) facto(s) conhecido(s) denuncia a verificação de outro(s), inserindo-se nos procedimentos lógicos dessa prova indiciária ou indirecta, penalmente permitida (arts. 124.º a 126.º do CPP).
Entre outros, no acórdão do STJ de 21.10.2004, in CJ Acs. STJ ano XII, tomo III, pág. 199, salientou-se que as presunções simples ou naturais (…) são simples meios de convicção, pois que se encontram na base de qualquer juízo. O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz através desta espécie de presunções.
E conforme Germano Marques da Silva, ob. cit., Editorial Verbo, 1993, vol. II, pág. 82, É clássica a distinção entre prova directa e prova indiciária. Aquela refere-se imediatamente aos factos probandos, ao tema da prova, enquanto a prova indirecta ou indiciária se refere a factos diversos do tema da prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência, uma ilação quanto ao tema da prova. Assim,se o facto probatório (meio de prova) se refere imediatamente ao facto probando, fala-se de prova directa, se se refere a outro do qual se infere o facto probando, fala-se em prova indirecta ou indiciária.
Dir-se-á que, na passagem do facto conhecido para a aquisição (ou para a prova) do facto desconhecido, intervêm juízos de avaliação, produzidos através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam fundadamente afirmar, segundo as regras da experiência, que determinado facto, não anteriormente conhecido nem directamente provado, é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido.
Nisso reside a concretização das presunções que, como doutrinariamente sedimentado, podem ser graves, precisas e concordantes: graves, quando as relações do facto desconhecido com o facto conhecido são tais que a existência de um estabelece, por indução necessária, a existência do outro; precisas, quando as induções, resultando do facto conhecido, tendem a estabelecer, directa e particularmente, o facto desconhecido; concordantes, quando, tendo todas uma origem comum ou diferente, tendem pelo conjunto e harmonia, a afirmar o facto que se quer provar.
Como tal, as exigências relativas à sua valoração reflectem que haverão de ser impostas com relativa segurança, denotando percurso intelectual e lógico e sem soluções de descontinuidade, mormente, sem relação demasiado longínqua entre o facto conhecido e o facto adquirido.
Acompanhando, ainda, o Conselheiro Santos Cabral, estudo cit., é a compreensão global dos indícios existentes, estabelecendo correlações e lógica intrínsecas que permite e avaliza a passagem da multiplicidade de probabilidades, mais ou menos adquiridas, para um estado de certeza sobre o facto probando.
Revertendo às situações concretas e perante a motivação do tribunal:
- no NUIPC ---/14.1PALGS, resulta que, comprovado que os objectos foram retirados da residência em causa, foram, parte deles, encontrados em poder das testemunhas que ficaram indicadas, tendo estas esclarecido a respectiva origem, manifestamente reportada à posse pelo aqui recorrente;
- no NUIPC---/14.7PALGS, decorre que apenas um indivíduo subtraiu os objectos da residência, sendo que, na posterior transação do ouro no estabelecimento, conforme RDE indicada, dois deles foram abordados e o outro (o recorrente) encetou fuga, vindo a ser perseguido.
Inevitavelmente, não se pode dissociar o recorrente dessas ocorrências e o tribunal foi sensível a esta circunstância, não só pela conjugação ponderada dos elementos indiciários, que são plurais, contemporâneos e concordantes, como também porque não se suscitou contra-indício que tendesse para outro entendimento.
Ainda que a motivação decisória seja relativamente sucinta, nela se explicitou o caminho por que o tribunal enveredou, tendo assentado em presunção extraída desses elementos, logrando, conforme à prova obtida e contendo-se nos limites de valoração permitidos, alicerçar a necessária certeza.
A convicção surge, pois, como suficientemente sustentada.
E) - da atenuação especial da medida das penas:
O recorrente preconiza que deva beneficiar do regime especial para jovens.
No essencial, refere: Ora, se é verdade que o regime especial para jovens não é de aplicação automática e que o arguido incumpriu as medidas de coacção de obrigação de permanência na habitação a que foi sujeito, a verdade é que o mesmo é ainda primário, está familiarmente inserido e a sua integração social não está de todo comprometida, uma vez que o arguido é estudante e conta com o apoio da sua família materna.
Por seu lado, o tribunal afastou essa aplicação, fundamentando:
“importa ainda considerar o Regime Penal Especial dos Jovens Adultos, previsto no DL 401/82 de 2/9, relativamente ao arguido Iúri, que à data dos crimes sob apreciação ainda não tinha sequer perfeito 18 anos, pelo que, segundo o disposto no art. 4º do referido diploma, sendo-lhe aplicável pena de prisão deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73º e 74º do CP - a que actualmente correspondem os arts. 72º e 73º - quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
Sendo certo que se entende decorrer desta disposição legal que tratando-se de jovens adultos as razões de ressocialização devem prevalecer, em detrimento das questões da culpa e da ilicitude - vd. Ac do STJ de 21/9/2006, relatado pelo Sr. Cº Rodrigues da Costa, disponível em www.dgsi.pt - todavia, no caso do arguido Iúri é convicção deste Tribunal face à factualidade respeitante à sua situação pessoal que ficou apurada, que a atenuação especial da pena em nada contribuirá para a sua reinserção social, conclusão que se retira do não investimento do arguido no sentido da mudança do seu comportamento, designadamente pelos incumprimentos sucessivos das medidas de coacção, que conduziram à prisão preventiva.
Deste modo, não se procederá à atenuação especial da pena, sem prejuízo da ponderação da juventude do arguido nas medidas concretas das penas a aplicar, diminuindo-as.
Vejamos.
Tal regime especial, acolhido pelo art. 9.º do CP, denota o propósito de consagrar um direito de jovens imputáveis, cujo fundamento ficou explicitado no preâmbulo do Código, no seu n.º 6, então aprovado pelo Dec. Lei n.º 400/82, de 23.09:
Outra questão particularmente importante (…) é a aceitação de que os imputáveis maiores de 16 anos e menores de 21 anos são merecedores de legislação especial (…) Esta ideia corresponde, por um lado, à consciencialização do que há de arbitrário – mas não intrinsecamente injusto – na determinação de certa idade como limite formal para distinguir o imputável do inimputável. É justamente para atenuar os efeitos deste corte dogmático e praticamente imprescindível que se vê com bons olhos um direito de jovens imputáveis que vise paredes meias, nos princípios e nas medidas protectivas e reeducadoras, os fins do direito de menores. Mas, se esta seria, já por si, uma razão que levaria ao acatamento legislativo daquele direito para jovens imputáveis, outras motivações e razões arreigam a nossa convicção. Salientem-se não só as que decorrem dos efeitos menos estigmatizantes que este direito acarreta, como também – em conexão com aquelas sequelas e no seio deste ramo de direito – a maior capacidade de ressocialização do jovem que se abre ainda para zonas não traumatizadas, como tal perfeitamente lúcido e compreensivo às solicitações justas e adequadas da ordem jurídica.
Na verdade, a imposição de um regime penal próprio para os designados «jovens delinquentes»traduz uma das opções fundamentais de política criminal, ancorada em concepções moldadas por uma racionalidade e uma intencionalidade de proeminência das finalidades de integração e socialização, que, por isso, comandam, quer a interpretação, quer a avaliação e a aplicação, das normas pertinentes.
Constitui, assim, uma imediata injunção dessa política criminal, que se impõe, por si e nos respectivos fundamentos, à modelação interpretativa dos casos concretos objecto de apreciação e julgamento, injunção que se mantém actual, como transparece, designadamente, da Proposta de Lei n.º 45/VIII (in Diário da Assembleia da República, 2.ª Série A, de 21.09.2000), como a mais recente manifestação externa de uma intenção legislativa de recomposição do regime vigente.
Na exposição de motivos desta Proposta de Lei, acentuou-se a necessidade, indiscutível, de encontrar as respostas e reacções que melhor parecem adequar-se à prática por jovens adultos de factos qualificados pela lei como crime - «o direito penal dos jovens adultos surge, assim, como categoria própria, envolvendo um ciclo de vida, correspondendo a uma fase de latência social que faz da criminalidade um fenómeno efémero e transitório. Observa-se, com efeito, nas sociedades modernas, que o acesso à idade adulta não se processa como antigamente, através de ritos de passagem, como eram o fim da escolaridade, o serviço militar ou o casamento que representavam um “virar de página” na biografia individual. O que ocorre, hoje, é uma fase de autonomia crescente face ao meio parental e de dependência crescente face à sociedade que faz dos jovens adultos uma categoria social heterogénea, alicerçada em variáveis tão diversas como são o facto de o jovem ter ou não autonomia financeira, possuir ou não uma profissão, residir em casa dos pais ou ter casa própria. Este período de latência social — em que o jovem escapa ao controlo escolar e familiar sem se comprometer com novas relações pessoais e profissionais — potencia a delinquência, do mesmo modo que, a partir do momento em que o jovem assume responsabilidades e começa a exercer os papéis sociais que caracterizam a idade adulta, regride a hipótese de condutas desviantes.
É este carácter transitório da delinquência juvenil que, se se quer evitar a estigmatização, deve ter-se presente ao modelar o sistema de reacções.».
Já no Preâmbulo do Dec. Lei n.º 401/82, se destacava que: 1. O presente diploma visa regular uma matéria de largo interesse e importância (…)
2. Tal interesse e importância não resultam tão só da ideia de que o jovem imputável é merecedor de um tratamento penal especializado, mas vão também ao encontro das mais recentes pesquisas no domínio das ciências humanas e da política criminal, como, finalmente, entroncam num pensamento vasto e profundo, no qual a capacidade de ressocialização do homem é pressuposto necessário, sobretudo quando este se encontre ainda no limiar da sua imaturidade. (…) 4. Trata-se, em suma, de instituir um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção.
Nesta intencionalidade de política criminal, uma das ideias essenciais é, pois, a de evitar, na medida do possível, a aplicação aos jovens adultos de penas institucionais ou detentivas, comprovada que está a natureza criminogénea da prisão e sabendo-se que os seus malefícios se exponenciam nos jovens adultos, já porque se trata de indivíduos particularmente influenciáveis, já porque a pena de prisão, ao retirar o jovem do meio em que é suposto se inserir progressivamente, produz efeitos dessocializantes devastadores,constituindo um sério factor de exclusão.
O regime contém uma dupla vertente de opções no domínio sancionatório: evitar, por um lado e tanto quanto possível, a pena de prisão, impondo a atenuação especial sempre que se verifiquem condições prognósticas que prevê (art. 4.º do Dec. Lei n.º 401/82) e, por outro lado, pelo estabelecimento de um quadro específico de medidas ditas de correcção (arts. 5.º e 6.º do mesmo diploma)).
A aplicação do regime, desencadeando a atenuação especial da pena “nos termos dos arts. 73.º e 74.º do Código Penal” (a que actualmente correspondem os arts. 72.º e 73.º) - depende, pois, do juízo que possa (deva) ser formulado relativamente às condições do jovem arguido, e que deve ser positivo quando as diversas variáveis a considerar (idade, situação familiar, educacional, vivências pregressas, antecedentes de formação pessoal, traços essenciais de personalidade em formação) permitam uma prognose favorável (acórdão do STJ de 07.11.2007, no proc,. n.º 07P3214, rel. Conselheiro Henriques Gaspar, acessível inwww.dgsi.pt).
Sem perder de vista exigências de prevenção geral, são sobretudo exigências de prevenção especial que presidem à aplicação, ou não, do regime, ou seja, através da aferição das circunstâncias atinentes à pessoa do agente, que redundarão, ou não, em que o julgador conclua pela existência de “sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”.
Tudo dependerá do juízo de prognose, assente nas condições de vida do jovem, bem como na análise global da sua personalidade, que permitam perceber se o seu desenvolvimento sócio-psicológico ainda consente uma qualquer intervenção de ajustamento e de consolidação da personalidade que funcione como uma vantagem para a sua reinserção social ou, ao invés, se qualquer intervenção desse tipo já é tardia, perante o quadro de desenvolvimento da sua personalidade, revelando claro discernimento.
Como se escreveu no acórdão do STJ de12.03.2009, no proc. n.º 08P3773, rel. Conselheiro Rodrigues da Costa, inwww.dgsi.pt:
As razões sérias residem, por um lado, em saber se a criminalidade em que se envolveu o jovem radica, de algum modo (e de algum modo a explicam), naquela fase especialmente difícil que é o trânsito da fase juvenil para a fase adulta e, por outro, em não tolher, de forma irremediável (devido à especial protecção de que carece), a reinserção social do jovem condenado com a aplicação de penas que nele fazem repercutir de forma especialmente nefasta os efeitos criminógenos da prisão e obstaculizam o seu regresso à vida social, com quebra dos laços de sociabilidade, em cujo fortalecimento se enraíza um crescimento sadio.
Já se vê, pois, que a sua aplicação está longe de ser automática, ou seja, como puramente decorrente da idade do condenado.
Em concreto, sem que se possam perder de vista as elevadas exigências de prevenção geral, associadas à frequência de ilícitos patrimoniais em que o recorrente incorreu, sobretudo geradora de sensível perturbação quando, como é o caso, incidiu, em grande parte, em residências, além da vertente pessoal inerente ao crime de roubo que cometeu, as suas condições pessoais não aconselham, antes pelo contrário, que deva ser premiado com a visada atenuação.
Com efeito, apesar da sua juventude, denota já um quadro vivencial de relativa tendência de autonomia e com ligação a actuações potencialmente desviantes, com visível grau de maturidade, realçando-se, conforme se provou, que “Entre as suas condutas desadequadas foi persistindo o desafio a conceitos de autoridade, uso de tabaco e drogas em contextos de grupo e foi sinalizado a entidades sociais e de apoio à infância …. abandonou os estudos. Não mantinha qualquer ocupação, desinvestido igualmente da prática de desporto. Convivia com pares com práticas delituosas, associadas ao consumo de substâncias estupefacientes e a condutas ilícitas para obtenção de proventos. I. reconhece efectuar consumos de haxixe junto de pares de faixa etária superior, no entanto nunca efectuou acompanhamento psicoterapêutico especializado, desvalorizando a necessidade de tratamento médico. Viria a ser referenciado pelas OPC’s em várias ocorrências que determinaram a aplicação de medidas de coacção cada vez mais gravosas, inclusive Obrigação de Permanência na Habitação com recurso a Vigilância Eletrónica. O reduzido auto-controlo e respeito pelas medidas coactivas aplicadas, culminou na prisão preventiva em 03-08-2015 por incumprimento das medidas anteriores de confinamento na habitação. Em meio prisional … Foi punido em Outubro com 15 dias em cela disciplinar por não cumprir as regras internas de forma gravosa. Apresenta em abstracto capacidade de avaliar o prejuízo dos comportamentos socialmente ilegítimos sem que efectivamente revele preocupação quanto ao que a si diz respeito, posicionando-se de modo pouco crítico e contido no discurso.”.
Não obstante a circunstância de que tal regime permita compatibilizar a reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem, como elementos de coesão comunitária, contribuindo para o reencaminhamento do jovem para o direito, necessário se torna que o objectivo de socialização se apresente, de algum modo, facilitado, suportado em sérias razões donde se conclua que o apontado desígnio de reinserção social seja melhor alcançado com a visada atenuação especial.
Ora, não se descortina que, perante as condições pessoais e de personalidade do aqui recorrente, existam propriamente vantagens na aplicação desse regime.
Não é de descurar, também, que a faculdade legal sempre haverá de ser compaginada com as necessidades da aplicação da pena (ainda que a atenuação se repercuta na medida abstracta), à luz das quais o julgador se deve mover na apreciação e, assim, identicamente a este nível, em concreto, conclusão diversa não é de aceitar.
Justificado se mostra, pois, que não beneficie dessa atenuação.
F) - da escolha e da medida das penas:
O recorrente manifesta que as penas parcelares, bem como a pena única, são excessivas.
Pugna por medidas próximas dos limites mínimos legais ou mesmo, quanto aos crimes que admitem penas não privativas da liberdade, a opção por estas e, no global, por pena conjunta inferior a 5 anos de prisão e suspensa na execução.
Apela à sua idade, à ausência de antecedentes criminais, à sua inserção familiar e às finalidades de ressocialização e reabilitação.
Do acórdão decorre fundamentado, no que aqui releva:
“Determinação das Penas Enquadradas desta forma as condutas dos arguidos cumpre determinar as penas concretas, dentro das molduras abstractas previstas na lei, o que se fará, tendo em vista as finalidades que presidem à aplicação das penas, da protecção dos bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade, nos termos do art. 40º do CP e, em função das exigências de prevenção de futuros crimes, nos termos dos arts. 71º e 70º do CP e, tendo a culpa por limite inultrapassável, como preceitua o art. 40º/2 do CP.
Nos casos sob apreciação, há a ponderar as necessidades de prevenção geral que são prementes quanto aos crimes de roubo e de furto atenta a frequência da prática destes tipos de ilícito e o alarme social que lhes está associado, (…), - a ilicitude – é elevada quanto a todos os crimes de roubo e de furto, atentas as circunstâncias das actuações do arguido Iúri, considerado o valor dos bens subtraídos (…), - a intensidade do dolo – na forma directa (…), - a gravidade das consequências – assumindo significativo relevo os prejuízos causados pelo roubo e pelos furtos qualificados praticados pelo arguido I, dado os valores em causa, - a conduta anterior e posterior dos arguidos – atenuando as exigências de prevenção especial o facto dos arguidos I, S e A não terem antecedentes criminais (…), e sendo assinalável a cooperação prestada pelo arguido I aos OPC durante a fase de inquérito, postura, todavia, diferente da que assumiu em audiência de julgamento, sem prejuízo de lhe assistir tal direito.
Deste modo, face a todo o circunstancialismo descrito, E, tendo-se presente que as molduras penais abstractas dos crimes de furto sob apreciação (…) preveêm penas de prisão ou multa, em alternativa, devendo, segundo o critério geral estabelecido no art. 70º do CP, dar-se preferência à segunda, sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição previstas no art. 40º/1 do CP, da protecção dos bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade,
no caso do arguido I, entende-se que as concretas circunstâncias do arguido, das suas condições pessoais, referidas no relatório social, e dos incumprimentos sucessivos do processo de agravamento das medidas de coacção, são de molde a concluir que a aplicação de penas de multa ou outras de substituição da prisão não satisfazem as necessidades de prevenção especial deste arguido, optando-se, por isso, por penas de prisão, (…) Assim, julga-se adequadas às exigências de prevenção geral e especial assinaladas e à culpa de cada um dos arguidos - que se perfila mais acentuada no caso do arguido I, reportada a cada uma das concretas situações - as seguintes penas:
- ao arguido I, 3 anos de prisão pelo crime de roubo do art. 210º /1 do CP, 2 anos de prisão por cada um dos três crimes de furto qualificado do art. 204º/1-f) do CP, e 8 meses de prisão por cada um dos crimes de furto simples do art. 203 do CP, (…) Cúmulo jurídico de penas aplicadas ao arguido I. Verificando-se uma situação de concurso de crimes importa proceder nos termos do art. 77º/1 e /2 do CP ao cúmulo jurídico das penas parcelares.
Assim, considerados o conjunto dos factos provados e a sua gravidade global e a personalidade do arguido neles revelada, como preceitua o art. 77º/1 do CP, acreditando-se que não estará em causa uma tendência criminosa do arguido, sendo certo que a pena aplicável não poderá exceder a soma das penas concretas, 10 anos e 4 meses de prisão, tendo como limite mínimo a mais elevada das penas parcelares aplicadas, 3 anos de prisão, entende-se ser de fixar a pena única em 6 (seis) anos e 9 (nove) meses de prisão, que se tem por adequada e proporcional à culpa do arguido e às necessidades de prevenção especial. (…)
Analisando:
Relativamente à opção do tribunal em ter aplicado penas de prisão, no tocante aos crimes de furto, quer os qualificados, quer o simples, pese embora a juventude e a ausência de antecedentes criminais do aqui recorrente, concorda-se plenamente com a fundamentação do acórdão, pouco mais havendo a acrescentar.
Na verdade, conforme Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Editorial Notícias, 1993, págs. 52/53, (…) o sistema sancionatório do nosso CP assenta na concepção básica de que a pena privativa da liberdade – sendo embora um instrumento de que os ordenamentos jurídico-penais actuais não conseguem ainda infelizmente prescindir – constitui a ultima ratio da política criminal (…) bem pode afirmar-se que o CP vigente deu realização (…) aos princípios político-criminais da necessidade, da proporcionalidade e da subsidiariedade da pena de prisão, revelando ao mesmo tempo a sua oposição de princípio à execução contínua de penas curtas de prisão.
Também, segundo Anabela Miranda Rodrigues, in “Sistema Punitivo Português”, Revista Sub Judice, n.º 11, Janeiro/Junho.1996, pág. 32, A principal linha de força a destacar aqui é que a prisão (…) deve ver a sua aplicação reduzida aos casos de cometimento de crimes mais graves em que uma reacção através de outras formas de pena não poderia assegurar o efeito essencial de prevenção geral desejado.
Nisto se traduz a natureza da prisão como ultima ratio, em sintonia com o disposto no art. 18.º, n.º 2, da CRP, designadamente, tendo em conta o subjacente princípio da proporcionalidade, consubstanciado, segundo Gomes Canotilho/Vital Moreira, in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, volume I, págs. 392 e seg., na proibição do excesso, a qual se desdobra nos princípios da adequação, da exigibilidade e da proporcionalidade em sentido restrito, sem perder de vista, é certo, outras condicionantes ao nível da prevenção especial e que possam ser satisfeitas através de outras formas de pena.
Devendo a escolha da pena ser efectuada apenas por referência a considerações de natureza preventiva, adequadas às finalidades que à mesma subjazem, previstas no art. 40.º, n.º 1, do CP, as elevadas necessidades que, em concreto, se deparam confluem, inequivocamente, para o afastamento da pena de multa.
De outro modo, a defesa da ordem jurídica ficaria seriamente prejudicada, sem que as condições pessoais do recorrente sejam, se bem que com algum apoio familiar, de molde a torná-la menos premente, atenta a sua revelada instabilidade e o desvalor comportamental que foi denotando.
Acresce que o tribunal não deixou de ponderar, como consignou no acórdão, as exigências preventivas que se divisam, de dimensão importante.
No que concerne às medidas concretas aplicadas por cada um dos ilícitos, tendo em conta os factores descritos no acórdão, que se afiguram correctamente avaliados, entende-se que respeitaram os critérios legais e não excedem a culpa enquanto seu limite.
Ora, para além das considerações aduzidas no acórdão, conforme Hans Heinrich Jescheck, in “Tratado de Derecho Penal, Parte General”, II, pág. 1194, o ponto de partida da determinação judicial das penas é a determinação dos seus fins, pois, só partindo dos fins das penas, claramente definidos, se pode julgar que factos são importantes e como se devem valorar no caso concreto para a fixação da pena.
Segundo Fernanda Palma, in “As Alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva” em “Jornadas sobre a Revisão do Código Penal”, AAFDL, 1998, pp.25-51, e em “Casos e Materiais de Direito Penal”, Almedina, 2000, pp. 31-51 (32/33), a protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial. Por outro lado, a reintegração do agente significa a prevenção especial na escolha da pena ou na execução da pena. E, finalmente, a retribuição não é exigida necessariamente pela protecção de bens jurídicos. A pena como censura da vontade ou da decisão contrária ao direito pode ser desnecessária, segundo critérios preventivos especiais, ou ineficaz para a realização da prevenção geral.
De qualquer modo, por respeito à salvaguarda da dignidade humana, a medida da culpa constitui limite inultrapassável da medida da pena e, como já referia Claus Roxin, in “Derecho Penal, Parte General”, tomo I, tradução da 2.ª edição alemã e notas por Diego-Manuel – Luzón Peña, Miguel Diaz y Garcia Conlledo e Javier de Vicente Remesal, Civitas, págs. 99/100, a pena não pode ultrapassar na sua duração a medida da culpabilidade mesmo que interesses de tratamento, de segurança ou de intimidação relevem como desenlace uma detenção mais prolongada (…) não pode ultrapassar a medida da culpabilidade, mas pode não alcançá-la sempre que isso seja permitido pelo fim preventivo. Nele radica uma diferença decisiva frente à teoria da retribuição, mas que reclama em todo o caso que a dita pena àquela corresponda, com independência de toda a necessidade preventiva.
Ainda, segundo Figueiredo Dias, in “Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, ano 3, 2º a 4º, Abril-Dezembro de 1993, págs.186 e 187, o modelo de determinação da medida da pena consagrado no CP vigente comete à culpa a função (única, mas nem por isso menos decisiva) de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração) a função de fornecer uma moldura de prevenção, cujo limite máximo é dado pela medida óptima de tutela dos bens jurídicos – dentro do que é consentido pela culpa – e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico; e à prevenção especial a função de encontrar o “quantum” exacto de pena, dentro da referida moldura de prevenção, que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares, de advertência ou de segurança) do delinquente.
Acompanhando o mesmo Autor, in “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime” cit., págs. 231 e 214, Esta (a medida da pena) deve, em toda a extensão possível, evitar a quebra da inserção social do agente e servir a sua reintegração na comunidade, só deste modo e por esta via se alcançando uma eficácia óptima de protecção dos bens jurídicos, sendo que culpa e prevenção são (…) os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena (em sentido estrito ou de determinação concreta da pena).
Esse juízo de culpa, que na realidade é o suporte axiológico-normativo da punição, reconduz-se a um juízo de valor e apreciação, que enuncia o que as coisas valem aos olhos da consciência e o que deve ser do ponto de vista da sua validade lógica, ética ou do direito (acórdão do STJ de 10.04.1996, in CJ Acs. STJ ano IV, tomo II, pág. 168).
Ora, em concreto, quer as exigências de prevenção geral, quer as de índole especial, impõem que as penas não se quedem pelos limites mínimos, nem que representem resposta tida por insuficiente para censurar o desvalor da conduta, sobretudo tendo presente que a actuação do recorrente se verificou, na maioria, em residências, com o que essa circunstância tem de importante para outros bens jurídicos além do património, a que se juntam a sua conturbada vivência e a sua dificuldade de adequada reinserção, propiciada, designadamente, por hábitos de convivência e de consumos de estupefacientes que não o favorecem, revelando, ainda, sinais de ausência de acatamento das regras que lhe foram sendo determinadas nos autos.
São de manter as penas parcelares.
Acerca da pena única cominada, delimitados os indicados limites (mínimo de 3 anos de prisão e máximo de 10 anos e 4 meses de prisão), afigura-se que merece alguma redução, ainda que não para a medida proposta pelo recorrente.
Adoptado, neste âmbito, o modelo de pena única ou, mais rigorosamente, de pena conjunta, decorrendo de uma avaliação conjunta dos factos e da personalidade do agente, o mesmo caracteriza-se por:
- não prescindir da determinação da medida concreta das penas parcelares, sendo a partir delas que se constrói a moldura penal do concurso;
- a medida da pena do concurso no caso concreto é determinada dentro da moldura penal abstracta, entre um mínimo e um máximo, com a mesma liberdade com que se determina a unicidade de pena – culpa e prevenção, relacionadas com a gravidade do ilícito global em conjugação com a personalidade unitária revelada pelo agente, e não por adição das penas parcelares (ou de uma dada porção ou fracção delas), só sendo de agravar a pena no caso de se concluir pela radicação da multiplicidade delituosa na personalidade daquele, em termos de constituir uma tendência ou carreira criminosa (Conselheiro Rodrigues da Costa, “O Cúmulo Jurídico na Doutrina e na Jurisprudência do STJ”, inwww.stj.pt - estudos jurídicos)
Deste modo, dando acolhimento a um princípio de combinação, abandona-se a perspectiva atomística da determinação das penas parcelares para passar a uma visão de conjunto, detectando a gravidade global do facto referida à personalidade do agente.
Atende aos factores de determinação da pena (art. 71.º do Código Penal), mas reportando-os a uma imagem global que a pena conjunta irá reflectir na medida encontrada.
Conforme Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime” cit., págs. 291/292, Tudo deve passar-se (…) como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade - unitária - do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
Em conformidade, se bem que o tribunal tenha atentado nos aspectos pertinentes à fixação da pena conjunta e, designadamente, que “não estará em causa uma tendência criminosa do arguido”, decidiu aplicar pena sensivelmente na média legal (esta corresponde a 6 anos e 8 meses de prisão), o que representa algum excesso.
Afigura-se de valorar devidamente que se apresentam, tão-só, crimes patrimoniais, a comprovada cooperação do recorrente e a sua juventude, tendentes a que a aludida imagem global não mereça a cominação de pena na medida fixada, mas outra que não atinja essa média legal.
Assim, por mais proporcional e justa, entende-se fixar a pena única em 5 anos e 9 meses de prisão.
Afastada fica a eventual suspensão da sua execução, uma vez que excede o limite legal previsto no art. 50.º, n.º 1, do CP.
3. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se:
- conceder parcial provimento ao recursointerposto pelo arguido I. e, em consequência, alterar a pena única que lhe foi aplicada e, em substituição, fixá-la em 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão;
- no mais, manter o acórdão recorrido.
Sem custas, dado o decaimento apenas parcial (cfr. art. 513.º, n.º 1, do CPP).