CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO
CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
MOTIVO JUSTIFICATIVO
PRESCRIÇÃO DE CRÉDITOS
PRESUNÇÃO DE ACEITAÇÃO DO DESPEDIMENTO PELO TRABALHADOR
Sumário

i. Estando em causa a caducidade de contratos de trabalho temporários ou de contratos de trabalho a termo não é aplicável o disposto no artigo 366.º do CT, na redacção introduzida pela Lei n.º 69/2013, de 30-08, quanto à presunção de aceitação do despedimento por parte do trabalhador;
ii. Não se verifica prescrição de créditos do trabalhador em relação a contratos de trabalho temporários anteriores ao contrato de trabalho a termo se a acção foi intentada decorridos cerca de 3 meses após a comunicação de caducidade deste e entre todos os contratos que vigoraram no âmbito das relações laborais entre o Autor e Ré o hiato temporal não ultrapassou um fim de semana e feriado, estando em causa, por isso, uma sucessão de contratos;
iii. O contrato de utilização de trabalho temporário só pode ser celebrado nas situações previstas no n.º 1 do artigo 175.º do CT, designadamente para uma actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado;
iv. Mas para que tal actividade possa justificar a contratação nos termos referidos é necessário, sempre, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 140.º, que esteja em causa uma necessidade temporária da empresa e o contrato seja celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade;
v. Tal não se verifica se a recorrente/empresa utilizadora justificou a celebração dos contratos com o facto de ter apenas um cliente, cujo ciclo de produção de veículos por parte deste apresenta irregularidades, o que se reflecte directamente na actividade da recorrente e a impossibilita de ter a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do seu quadro de efectivos estável, constatando-se, ainda, que nesse âmbito o trabalhador prestou a actividade à empregadora durante cerca de 4 anos e meio, sempre no mesmo posto de trabalho e a exercer as mesmas funções, e logo que cessou o último dos contratos foi substituído por outros trabalhadores.
(Sumário do relator)

Texto Integral

Proc. n.º 4137/14.0T8STB.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório
BB (residente na …) intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra CC, Lda. (com sede no …), pedindo:
a) que sejam considerados nulos os contratos de trabalho temporário que celebrou com a Ré e, em consequência, considerar-se que o trabalho que prestou ao utilizador o foi em regime de contrato de trabalho sem termo;
b) ser considerado, por essa via, ilícito o despedimento promovido pela Ré e, em consequência, ser reintegrado no posto de trabalho ou a receber uma indemnização no valor de € 3.453,88, acrescida de juros de mora à taxa legal;
c) ser condenada a Ré a pagar-lhe as retribuições vencidas, incluindo subsídio de férias e de Natal, desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que julgar ilícito aquele, quantias acrescidas de juros de mora à taxa legal.
Alegou para o efeito, muito em síntese, que celebrou diversos contratos de trabalho temporário com DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., e que na vigência desses contratos sempre desempenhou as mesmas funções, não se verificado qualquer situação legal que permitisse o recurso à celebração de contratos de trabalho temporário.
Posteriormente à celebração dos contratos de trabalho temporário celebrou um contrato de trabalho a termo com a Ré, que foi objecto de renovações, com a invocação de se tratar de trabalhador à procura do 1.º emprego, quando já era trabalhador efectivo desta; e tendo-lhe esta comunicado a caducidade do contrato tal correspondente a um despedimento ilícito, com as consequências legais que peticionou.

Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, por excepção e por impugnação: (i) por excepção, sustentando, por um lado, que tendo o Autor recebido a compensação pela caducidade do contrato a termo e, anteriormente, pelos contratos de trabalho temporários, e não as tendo restituído tal significa aceitação do despedimento e, por outro, a prescrição de créditos, por o último contrato de trabalho temporário ter cessado em 31-03-2011 e apenas em 12 de Dezembro de 2014 o Autor ter proposto a acção; (ii) por impugnação, afirmando, em síntese, a validade dos contratos de trabalho celebrados.
Pugnou, por consequência, pela procedência das excepções invocadas ou, caso assim se não entenda, pela improcedência da acção.

Respondeu o Autor, a negar a verificação das excepções deduzidas.

Em sede de despacho saneador foi fixado valor à causa (€ 3.453,88), julgada improcedente a excepção de presunção de aceitação da cessação do contrato, bem como da excepção de prescrição de créditos.

A Ré recorreu do despacho que julgou improcedentes as referidas excepções, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:
«1. O Meritíssimo Juiz a quo entendeu que não poderia operar a presunção de aceitação da caducidade dos contratos de trabalho a termo certo, nos termos do disposto no artigo 366.º, n.º 6 do Código do Trabalho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, que remete para o disposto nos n.ºs 2 a 5 daquele artigo, a aplicar aos casos de cessação de contrato de trabalho a termo.
2. O Meritíssimo Juiz a quo entendeu também que não se verificava a excepção de prescrição por julgar de relevo apenas o momento da cessação do contrato de trabalho a termo que ligou o Recorrido à Recorrente e não o momento da cessação dos contratos de utilização e de trabalho temporário que vigoraram anteriormente e que, segundo a tese do Recorrido, estariam feridos de nulidade, com a consequência se se dever entender tratar-se, desde a origem, de um contrato de trabalho sem termo.
3. O douto despacho saneador recorrido errou ao julgar improcedente a excepção de aceitação da caducidade do contrato de trabalho a termo certo.
4. Como se invocou na contestação apresentada, nos termos do disposto no artigo 366.º, n.º 6 do Código do Trabalho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, nos casos de cessação de contrato de trabalho a termo aplica-se o disposto nos n.ºs 2 a 5 daquele artigo.
5. De acordo com o disposto no n.º 4 daquele artigo 366.º do Código do Trabalho, presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe do empregador a totalidade da compensação prevista naquele artigo.
6. O que sucedeu no caso do Recorrido, porquanto a Recorrente pagou-lhe, e este recebeu, a compensação pela cessação do contrato, que não restituiu à Recorrente.
7. Não ilidiu, deste modo, a presunção de aceitação do despedimento.
8. Como se disse, a aceitação do despedimento impede que o ora Recorrido deduza os pedidos que formula na presente acção, impondo-se julgar procedente esta excepção peremptória inominada, absolvendo-se a Recorrente dos pedidos – cfr. artigo 576.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
9. Não foi, porém, este o entendimento do Meritíssimo Juiz a quo, com fundamentação que, a proceder, levaria à inoperância das alterações introduzidas no artigo 366.º, n.º 6 do Código do Trabalho, pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto.
10. Não parece que faça sentido afirmar-se que se trata de um despedimento ilícito para depois argumentar que no caso sempre seria devida a compensação de caducidade com o mínimo de três meses de retribuição de base diuturnidades...passando, pelo meio, pela invocação de que aquele preceito se aplica aos casos de cessação de contratos de trabalho temporário e a termo mas em “contexto de despedimento colectivo”.
11. Em primeiro lugar, cai por terra este último argumento do Meritíssimo Juiz a quo pois, como é sabido – julga-se – os casos de cessação dos contratos de trabalho a termo “em contexto de despedimento colectivo” estavam já abrangidos pelas regras do despedimento colectivo, incluindo a da compensação, dado que, nesse caso, o contrato cessaria por despedimento e não por caducidade.
12. Por outro lado, parece razoavelmente óbvio que o que o legislador pretendeu com a alteração introduzida no artigo 366.º do Código do Trabalho, operada pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, foi, à semelhança do que já sucedia nos casos de despedimento colectivo e de despedimento por extinção do posto de trabalho, impedir que o trabalhador que pretendesse discutir a validade da cessação do contrato a termo, fizesse sua a compensação que lhe seria devida pela cessação do contrato de trabalho, tal como conformada pelo empregador.
13. Dito de outro modo, para que o trabalhador possa discutir a validade da cessação do contrato de trabalho – sem termo ou, agora, também nos casos de contrato de trabalho a termo - terá forçosamente que restituir ao empregador a compensação que lhe seja paga por força do artigo 366.º do Código do Trabalho, sob pena de se presumir que aceitou o despedimento. E dizemos despedimento porque, efectivamente, é o que literalmente decorre do n.º 6 do artigo 366.º, ao mandar aplicar, também nos casos de cessação do contrato de trabalho a termo, a presunção contida no n.º 4 do mesmo preceito. Ou seja, ao legislador nem sequer pareceu relevante afastar a expressão “despedimento” pois, se o tivesse entendido, teria disposto que o n.º 4 seria aplicável com as necessárias adaptações.
14. A alteração sofrida pelo artigo 366.º do Código do Trabalho, imposta pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, visou, de forma clara, impedir que o trabalhador vinculado por contrato de trabalho a termo pudesse discutir a validade da cessação do contrato, sem que, previamente, restituísse ao seu empregador a compensação que recebeu pela cessação que pretende impugnar.
15. Deve pois proceder a presente apelação, revogando-se o douto despacho saneador que deve ser substituído por decisão que julgue procedente a excepção invocada de aceitação da cessação do contrato.
16. O Meritíssimo Juiz a quo entendeu também que não se verificava a excepção de prescrição por, na sua douta argumentação, relevar apenas o momento da cessação do contrato de trabalho a termo que ligou o Recorrido à Recorrente e não o momento da cessação dos contratos de utilização e de trabalho temporário que vigoraram anteriormente e que, segundo a tese do Recorrido, estariam feridos de nulidade, com a consequência se se dever entender tratar-se, desde a origem, de um contrato de trabalho sem termo.
17. Tendo o último contrato de utilização de trabalho temporário cessado em 31 de Março de 2011, quando o ora Recorrido deu entrada da presente acção (o que ocorreu em 12 de Dezembro de 2014) já há muito prescrevera o direito que teria – se direito tivesse – de impugnar a ilicitude da cessação daquele contrato e reclamar a vigência de um contrato de trabalho sem termo com a Ré.
18. Há muito que decorrera já o prazo de um ano previsto no artigo 337.º do Código do Trabalho.
19. Prescrição que a Recorrente expressamente invocou e que constitui excepção peremptória que importa a absolvição do pedido.
20. Em caso similar ao dos presentes autos, embora respeitante a sucessão de contratos de trabalho a termo, decidiu o Tribunal da Relação de Lisboa, APELAÇÃO Nº 4595/12.8TTLSB.L1, em recente Acórdão de 10 de Abril de 2014, por verificada a prescrição no que respeita aos contratos anteriores.
21. O douto despacho saneador deve, também agora, ser revogado e substituído por decisão que julgue procedente esta excepção.
22. Decidindo como decidiu, a douta sentença violou o disposto no artigo 366.º, n.ºs 4 e 6, e 381.º, todos do Código do Trabalho.
Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se o douto despacho saneador recorrido nos termos supra expostos e absolvendo-se a Recorrente de todos os pedidos.
Decidindo-se assim far-se-á JUSTIÇA!».

O Autor respondeu ao recurso, a pugnar pela sua improcedência, para o que formulou nas contra-alegações as seguintes conclusões:
«1ª No momento da cessação dos contratos de trabalho temporários de 2010 e 2011 não estava ainda em vigor a Lei nº 69/2013, de 30/04, pelo que o respectivo regime nunca lhes poderia ser aplicado.
2ª Mesmo no que concerne à cessação do contrato de trabalho a termo, ocorrida em Setembro de 2014 (portanto, encontrando-se já em vigor aquele regime), não é de aplicar à situação dos autos o disposto no art. 366º, nº 6, uma vez que aí apenas estão contidos os casos de contratos de trabalho temporários e a termo inseridos num processo de despedimento colectivo.
3ª Para além do elemento sistemático, a conclusão resulta do facto de a remissão do art. 344º para o art. 366º do CT ser restrita à forma de cálculo da compensação, não influindo nos respectivos efeitos, ao contrário do que sucede em sede de despedimento por extinção do posto de trabalho, em que, no art. 372º do CT, é feita uma remissão genérica para o regime do art. 366º.
4ª É pertinente a convocação do art. 5º, nº 2, da Lei nº 69/2013 para efeito de determinar se a compensação paga ao Recorrido satisfaz o valor mínimo aí previsto, uma vez que a modalidade contratual a que se reporta a norma é a do contrato de trabalho sem termo, ou seja, aquela em que se converte um contrato de trabalho temporário ou a termo considerado ilegal.
5ª Para a análise do prazo prescricional releva o momento da cessação do contrato de trabalho a termo do Recorrido, pois que foi a partir desse momento que este teve condições efectivas para recorrer aos meios legais disponíveis.
6ª Ou seja, entre os vários contratos celebrados com o Recorrido houve uma tal sucessão temporal que impediu uma real desvinculação quanto à relação de subordinação, não havendo assim, até àquela data, o pressuposto que subjaz à previsão do artigo 337º, nº 1, do CT (prazo para a propositura da acção).
7ª Não devem assim proceder as excepções aduzidas pela Recorrente, de presunção de aceitação do despedimento e de prescrição, pois que, pelos motivos descritos, não merece, sob ambos os ângulos, qualquer censura o douto despacho proferido pelo M.mo Juiz a quo.
Termos em que deve o recurso ser declarado improcedente e mantido o douto despacho saneador».

Entretanto, os autos prosseguiram os trâmites legais, tendo-se procedido à audiência de julgamento, e em 05-06-2015 foi proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor:
«Destarte, condeno a Ré CC, Lda., no seguinte:
a) reconhecer como ilícito o despedimento do A. BB, procedendo à sua reintegração no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, devolvendo este a compensação por caducidade do contrato de trabalho que recebeu, no valor de € 2.247,50;
b) pagar ao A. as remunerações que este deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da acção e até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, incluindo proporcionais dos subsídios de férias e de Natal, mas com dedução das importâncias referidas nas als. a) e c) do n.º 2 do art. 390.º do Código do Trabalho, o que será liquidado no competente incidente;
c) pagar ao A. os juros de mora, à taxa do art. 559.º n.º 1 do CCivil, desde a data da liquidação, quanto ao valor indicado na al. b).».

Inconformada com a referida sentença, a Ré dela interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:
«1. O presente recurso vem interposto da douta sentença de Fls. , que julgou parcialmente procedente a acção, e condenou a Recorrente, entre o mais, reintegrar o ora Recorrido, por ter entendido que fora despedido ilicitamente pela Recorrente.
2. O Meritíssimo Juiz a quo errou no julgamento que fez, como errou também na condenação da Ré em custas.
3. A douta sentença recorrida representa uma injusta condenação que decorre de uma errada aplicação do direito aos factos provados.
4. Dá-se aqui por reproduzida a factualidade provada sob os pontos 1., 2., 3., 6., 8., 9., 10., 11., 13., 14., 15., 16., 17., 18., 19., 20., 21. e 46. da matéria de facto, de onde decorre que dos contratos de utilização de trabalho temporário ficaram a constar os factos detalhados que fundamentaram a contratação da utilização do trabalho temporário do Recorrido e, bem assim, com todo o detalhe, o nexo entre os fundamentos invocados e a duração dos contratos.
5. Os contratos de utilização de trabalho temporário continham, eles próprios, a descrição factual exaustiva dos fundamentos invocados e, bem assim, a relação entre os fundamentos invocados e a duração de cada um deles.
6. Foram cumpridas as exigências decorrentes do disposto no artigo 177.º, n.º 1, alínea b) do Código do Trabalho por, daqueles contratos, constar o motivo justificativo do recurso ao trabalho temporário com a menção expressa dos factos que o integram e, bem assim, constar também a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.
7. Os factos que ficaram provados nos pontos 36., 37., 38., 39., 40., 41., 42., 43., 44., 45. e 46 da matéria de facto, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, impõem concluir que a Recorrente, é certo que por opção estratégica sua – o que, estranhamente, terá impressionado o Meritíssimo Juiz a quo - desenvolve uma actividade económica cujo ciclo anual de produção apresenta irregularidades decorrentes da natureza estrutural do mercado e do facto de depender exclusivamente da sua única cliente Autoeuropa.
8. O que, ao contrário do que parece entender o Meritíssimo Juiz a quo, é inteiramente legítimo e se enquadra no disposto na alínea e) do n.º 2 do artigo 140.º do Código do Trabalho, por remissão do n.º 1 do artigo 175.º do mesmo Código.
9. E também se discorda da asserção vertida pelo Meritíssimo Juiz a quo (Fls. 12 da douta sentença), quando afirma: “(…) – a aceitar-se a validade da motivação aposta naqueles contratos, tal levaria à conclusão da Ré poder utilizar a título precário a totalidade dos seus trabalhadores.”.
10. O que está em causa, mas que terá escapado ao Meritíssimo Juiz a quo, é o facto da produção da Ré contar com uma variação de dia para dia, com dias de paragem impostos pela Autoeuropa e com dias de fecho também impostos pela Autoeuropa, o que, como é bom de ver, provoca uma forte irregularidade no ciclo anual de produção da Recorrente.
11. Como consta a Fls. 9 da douta sentença, a Recorrente não aderiu à hipótese aventada pelo Meritíssimo Juiz a quo, pois que tem, como afirmou a testemunha Marta Costa, 180/190 trabalhadores efectivos, 50/55 trabalhadores a termo e 40 trabalhadores ao abrigo de contratos de utilização de trabalho temporário temporários.
12. Não só os contratos cumpriram integralmente o disposto no artigo 177.º, n.º 1, alínea b) do Código do Trabalho, como os fundamentos invocados correspondem integralmente à verdade.
13. A douta sentença recorrida também errou ao julgar improcedente a excepção de aceitação da caducidade do contrato de trabalho a termo certo.
14. Nos termos do disposto no artigo 366.º, n.º 6 do Código do Trabalho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, nos casos de cessação de contrato de trabalho a termo aplica-se o disposto nos n.ºs 2 a 5 daquele artigo.
15. De acordo com o disposto no n.º 4 daquele artigo 366.º do Código do Trabalho, presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe do empregador a totalidade da compensação prevista naquele artigo.
16. O que sucedeu no caso do Recorrido porquanto a Recorrente pagou-lhe, e este recebeu, a compensação pela cessação do contrato, que não restituiu à Recorrente.
17. Não ilidiu, deste modo, a presunção de aceitação do despedimento.
18. A aceitação do despedimento impede que o Recorrido deduza os pedidos que formulam na presente acção, impondo-se julgar procedente esta excepção peremptória inominada, absolvendo-se a Recorrente dos pedidos – cfr. artigo 576.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
19. Não foi, porém, este o entendimento do Meritíssimo Juiz a quo, que, com fundamentação que levaria à inoperância das alterações introduzidas no artigo 366.º, n.º 6 do Código do Trabalho, pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto.
20. Entendeu o Meritíssimo Juiz a quo que tal disposição não seria aplicável em virtude de, previamente, ter declarado que entre as partes vigorava um contrato de trabalho sem termo.
21. O Meritíssimo Juiz a quo avança ainda que os casos de caducidade de contrato de trabalho sem termo estão expressamente regulados no Código do Trabalho e que a compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição de base e diuturnidades, por imposição do artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 69/2013.
22. Salvo o devido respeito, parece que o Meritíssimo Juiz a quo, porventura precipitadamente, confundiu os diversos argumentos, pois não parece que faça sentido afirmar-se que se trata de um despedimento ilícito para depois argumentar que no caso sempre seria devida a compensação de caducidade com o mínimo de três meses de retribuição de base diuturnidades...
23. Parece razoavelmente óbvio que o que o legislador pretendeu com a alteração introduzida no artigo 366.º do Código do Trabalho, pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, foi, à semelhança do que já sucedia, por exemplo, nos casos de despedimento colectivo e de despedimento por extinção do posto de trabalho, impedir que o trabalhador que pretendesse discutir a validade da cessação do contrato, fizesse sua a compensação que lhe seria devida pela cessação do contrato de trabalho, tal como conformada pelo empregador.
24. Dito de outro modo, para que o trabalhador possa discutir a validade da cessação do contrato de trabalho – sem termo ou, agora, também nos casos de contrato de trabalho a termo - terá forçosamente que restituir ao empregador a compensação que lhe seja paga por força do artigo 366.º do Código do Trabalho, sob pena de se presumir que aceitou o despedimento. E dizemos despedimento porque, efectivamente, é o que literalmente decorre do n.º 6 do artigo 366.º, ao mandar aplicar, também nos casos de cessação do contrato de trabalho a termo, a presunção contida no n.º 4 do mesmo preceito. Ou seja, ao legislador nem sequer pareceu relevante afastar a expressão “despedimento” pois, se o tivesse entendido, teria disposto que o n.º 4 seria aplicável com as necessárias adaptações.
25. Em suma, a alteração sofrida pelo artigo 366.º do Código do Trabalho, imposta pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, visou, de forma clara, impedir que o trabalhador vinculado por contrato de trabalho a termo, pudesse discutir a validade da cessação do contrato, sem que, previamente, restituísse ao seu empregador a compensação que recebeu pela cessação que pretende impugnar.
26. Decidindo como decidiu, a douta sentença violou o disposto no artigo 177.º, n.º 1, alínea b), no artigo 140.º, n.º 2, alínea e), no artigo 175.º, n.º 1, e no artigo 366.º, n.ºs 4 e 6, todos do Código do Trabalho e, ainda o disposto no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do disposto no artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código do Processo do Trabalho.
27. A douta sentença recorrida deve, pois, ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente.
Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida nos termos supra expostos e absolvendo-se a Recorrente de todos os pedidos.
Decidindo-se assim far-se-á JUSTIÇA!».

O Autor respondeu ao recurso, a pugnar pela sua improcedência, tendo nas contra-alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:
«1. Contrariamente ao alegado pela Recorrente, a sentença proferida não padece de qualquer erro de julgamento.
2. Quando escreveu, a fls. 11 da sentença, que o facto de a Recorrente estar sujeita ao modelo de produção da Autoeuropa reflecte uma mera opção de planeamento da sua atividade em torno deste seu único cliente não quis o M.mo Juiz a quo cercear a iniciativa privada, mas apenas evidenciar que esse facto não a desonera de suportar os riscos próprios da sua atividade.
3. Isto porque a previsão do art. 140º, nº 2, al. e) do CT (aplicável in casu por força dos arts. 175º, nº 1, e 180º, nº 1) não visa legitimar o recurso ao contrato de trabalho a termo (e temporário) em quaisquer situações em que se verifiquem irregularidades independentemente do carácter permanente das necessidades. Pelo contrário, para se enquadrarem na norma as necessidades têm de ser temporárias.
4. Entendimento diverso, que privilegiasse a iniciativa privada nos termos pretendidos pela Recorrente, contrariaria o necessário equilíbrio que o legislador pretendeu obter de forma a preservar o direito à segurança no emprego, não obstante admitir situações de exceção (como é o caso dos vínculos laborais precários).
5. Não houve lapso na sentença. A jurisprudência citada a fls. 12 a 14 da sentença serve para reforçar a ideia de que a exigência de fundamentação e de ligação entre esta e o termo aposto ao contrato é, antes de mais, formal.
Isto é, tem que decorrer do próprio contrato, por forma a possibilitar o controlo externo. Este primeiro patamar de avaliação consubstancia uma das cautelas com que o legislador rodeou os regimes da contratação a termo e temporária.
6. A afirmação de que “o mercado automóvel não apresenta ciclos anuais, regulares ou irregulares de funcionamento” não deve despoletar qualquer perplexidade, uma vez que, de facto, este mercado não se integra na noção de atividade sazonal ou de outra equiparável, para efeito do disposto no art. 140º, nº 2, al. e), do CT.
7. Bem se compreende que assim seja, na medida em que o que subjaz à equiparação é uma proximidade material entre situações tradicionais de sazonalidade e atividades cuja produção está dependente de equivalente variação cíclica, regular e previsível. Ora, não é este o caso da Recorrente.
8. Contrariamente ao que afirma a Recorrente, da matéria de facto resulta evidente que não foram cumpridos os requisitos legais exigidos para o recurso à contratação temporária.
9. Com efeito, houve uma sucessão de contratos de trabalho temporários a termo incerto, com fundamento na al. e) do nº 2 do art. 140º do CT (em que as descrições são idênticas ou muito semelhantes entre si), intercalados com outros, a termo certo, já baseados na al. g) daquele preceito, sendo evidente o cariz não excecional que lhes preside.
10. A exigência legal de estabelecimento e menção expressa da ligação existente entre o motivo da aposição do termo e o respetivo período não se basta com uma mera previsão aleatória da sua duração. É notório que no caso essa previsão não teve qualquer correspondência com a realidade, já que foi constante a prorrogação da necessidade da empresa que alegadamente esteve na base da contratação inicial do Recorrido.
11. Na douta sentença recorrida não se põe em causa a legitimidade da opção estratégica da Recorrente relativamente ao seu método de produção, mas sim o facto de tal escolha ser irrelevante para o caso, já que por si só não justifica o recurso ao trabalho temporário.
12. A admitir que assim fosse, no limite, considerando que a irregularidade faz parte do método produtivo da Recorrente, todos os trabalhadores desta poderiam ser temporários. É precisamente para este resultado pernicioso que chama a atenção o M.mo Juiz a quo a fls. 12 da douta sentença.
13. A presunção de aceitação do despedimento prevista no artigo 366º, nº 5, do CT refere-se apenas aos casos de despedimento coletivo, não tendo aplicação no caso.
14. É, desde logo, a própria epígrafe da norma que restringe o respetivo âmbito de aplicação.
15. A ideia de que a norma se aplicava aos contratos de trabalho a termo era baseada numa interpretação incorreta do art. 344º, nº 2, do CT (sobre a caducidade de contrato de trabalho a termo certo), segundo a qual a remissão dele constante para o art. 366º (compensação por despedimento coletivo) seria para efeito da aplicação em bloco de todo o regime aí contido.
16. Na verdade, tal remissão releva apenas para efeito de cálculo da compensação, não abarcando outros aspetos particulares do regime do despedimento coletivo, como o da presunção de aceitação.
17. Deste modo, não estando em causa uma situação em que se aplique a dita presunção, não havia qualquer ónus de ilisão da mesma para efeito de impugnação do despedimento.
Nestes termos e com o douto suprimento de Vªs Exªs, deve o recurso ser julgado improcedente e, em consequência ser confirmada a douta sentença proferida».

Seguidamente, na 1.ª instância foi proferido o seguinte despacho quanto à admissibilidade dos (2) recursos interpostos pela Ré:
«Julgo validamente prestada a caução de € 12.842,14, oferecida pela Ré através do depósito autónomo que antecede.
Em consequência, decido:
• admitir o recurso de apelação interposto pela Ré do despacho saneador, na parte em que julgou improcedentes as excepções de presunção de aceitação do despedimento e de prescrição, o qual sobe de imediato, nos próprios autos (uma vez que também se admite o recurso da sentença, por uma questão de economia processual, entende-se que deverão subir em conjunto), e com efeito devolutivo;
• admitir, igualmente, o recurso interposto pela Ré da sentença, que também é de apelação, sobe de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo, face à caução prestada».

Neste tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, que não foi objecto de resposta, no sentido da improcedência do recurso.

Tendo o anterior relator cessado funções neste tribunal, foram os autos distribuídos ao ora relator.
Preparando a deliberação foi remetido projecto de acórdão aos exmos. juízes desembargadores adjuntos.
Realizada a conferência, cumpre decidir.
II. Objecto dos recursos
Consabido que é que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações [cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho, aplicável ex vi dos artigos 87.º, n.º 1 e 1.º, n.º 2, alínea a), ambos do Código de Processo do Trabalho], no caso colocam-se à apreciação do tribunal as seguintes questões:
i. do recurso do despacho saneador: saber se ocorrem as excepções peremptórias de prescrição de créditos e de presunção de aceitação da cessação dos contratos de trabalho celebrados;
ii. do recurso da sentença final: saber se os contratos de trabalho temporário se mostram devidamente justificados e se a justificação tem correspondência com a realidade, com as consequências legais daí decorrentes e tendo em conta o peticionado na acção.
Refira-se que o primeiro dos recursos interpostos deveria ter subido de imediato e em separado (cfr. artigo 79.º-A, n.º 2, al. i), do CPT e artigo 644.º, n.º 1, al. b), do CPC): todavia, uma vez que tal não se verificou, conhecer-se-á agora, e aqui, de ambos os recursos.

III. Factos
A 1.ª instância deu como provados os seguintes factos, que se aceitam, por não virem impugnados e não se vislumbrar fundamento legal para a sua alteração:
1. No dia 01.04.2010, o A. celebrou com a DD, Lda., um escrito pelo qual se comprometeu, mediante a retribuição base mensal de € 619,15, a exercer as funções de operador de produção – estofador de 3.ª-A, sob as ordens e direcção da Ré, enquanto empresa utilizadora, com início nessa data e termo logo que extinto o fundamento que lhe deu origem;
2. As funções a exercer pelo A. vinham descritas em anexo ao dito escrito, devendo «executar todas as actividades na linha de montagem, proceder ao autocontrole dos produtos e componentes, de acordo com as orientações do chefe de equipa, das normas e procedimentos internos, no sentido de contribuir para a satisfação atempada de todas as encomendas, segundo o sistema de funcionamento Just in Time (JIT)»;
3. Em anexo ao contrato, justifica-se o recurso a esta modalidade de contratação, nos seguintes termos:
«Alínea e) do n.º 2, do art. 140.º do Código do Trabalho, por remissão do n.º 1 do art. 175.º do mesmo Código: “Actividade de natureza sazonal ou outras actividades económicas cujo ciclo anual de produção apresente irregularidade decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado ou de outra causa relevante” devido aos seguintes pontos:
1. A 2.ª Outorgante tem como cliente exclusivo a Volkswagen/Autoeuropa a quem fornece assentos completos para os modelos VW Sharan, Seat Alhambra, VW Scirocco e VW Eos.
2. A planificação da produção da 2.ª Outorgante é, em regra, feita a partir de encomendas/contratos globais por modelo de viatura a um ritmo pré-definido, designado JIT – “just in time”.
3. Contudo, tais exigências de fornecimento – JIT – estão condicionadas à instabilidade e irregularidade dos mercados mundiais. Acresce o facto dos modelos actualmente produzidos pela Volkswagen/Autoeuropa, Seat Alhambra e VW Sharan, se encontrarem no fim do ciclo de vida. Desde 2001 e até ao presente a redução anual da produção dos referidos modelos tem-se situado na ordem dos 20%, decréscimo igualmente previsível para 2009. O final da produção está programado para Fevereiro de 2010.
4. A produção dos diversos modelos continua a contar com períodos sem trabalho “Down days”, tornando muito difícil a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do quadro de efectivos da 2.ª Outorgante. Os dias de paragem obrigatórios que traduzem por outro lado na manutenção de uma cadência de produção mais elevada nos dias de trabalho, tornam necessário o reforço temporário da capacidade nominal instalada.
5. Resta complementar que a capacidade nominal da Vanpro para 2010 é de 112 viaturas por dia útil de trabalho para o MPV (VW Sharan e Seat Alhambra) até Fevereiro, 160 viaturas por dia útil de trabalho para o Scirocco e 98 viaturas por dia útil de trabalho para o Eos.
6. Em paralelo, a 2.ª outorgante está a prever iniciar um novo projecto “Nova Sharan NF”, cuja fase de arranque está programada na semana 8 de 2010 Modelo VW Sharan e na semana 10 de 2010 para o Modelo Seat Alhambra;
7. Os factos descritos nos pontos anteriores demonstram a irregularidade da produção da 2.ª Outorgante decorrente de natureza estrutural do mercado da indústria automóvel e das causas que acima se apontaram.
8. A irregularidade da produção implica um acréscimo temporário de actividade que se estima deverá ocorrer no período compreendido entre o início de Janeiro de 2010 e final de Julho de 2010»;
4. Por carta de 08.07.2010, a DD, Lda., comunicou ao A. a caducidade do contrato celebrado em 01.04.2010, terminando a 13.08.2010, uma sexta-feira;
5. No dia 16.08.2010, uma segunda-feira, o A. celebrou com a mesma DD, Lda., um escrito pelo qual se comprometeu, mediante a retribuição base mensal de € 619,15, a exercer as funções de operador de manutenção, sob as ordens e direcção da Ré, enquanto empresa utilizadora, com início nessa data e termo em 29.08.2010;
6. As funções a exercer pelo A. vinham descritas como devendo «executar tarefas de manutenção de equipamentos e edifício, limpezas e pinturas»;
7. No dia 30.08.2010, o A. celebrou com a DD, Lda., novo escrito pelo qual se comprometeu, mediante a retribuição base mensal de € 619,15, a exercer as funções de operador de produção – estofador de 3.ª-A, sob as ordens e direcção da Ré, enquanto empresa utilizadora, com início nessa data e termo logo que extinto o fundamento que lhe deu origem;
8. As funções a exercer pelo A. vinham descritas como devendo «executar todas as actividades na linha de montagem, proceder ao autocontrole dos produtos e componentes, de acordo com as orientações do chefe de equipa, das normas e procedimentos internos, no sentido de contribuir para a satisfação atempada de todas as encomendas, segundo o sistema de funcionamento Just in Time (JIT)»;
9. Em anexo ao contrato, justifica-se o recurso a esta modalidade de contratação, nos seguintes termos:
«Alínea e) do n.º 2, do art. 140.º do Código do Trabalho, por remissão do n.º 1 do art. 175.º do mesmo Código: “Actividade de natureza sazonal ou outras actividades económicas cujo ciclo anual de produção apresente irregularidade decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado ou de outra causa relevante” devido aos seguintes pontos:
1. A 2.ª Outorgante tem como cliente exclusivo a Volkswagen/Autoeuropa a quem fornece assentos completos para os modelos, VW Sharan, Seat Alhambra, VW Scirocco e VW Eos.
2. A planificação da produção da 2.ª Outorgante é, em regra, feita a partir de encomendas/contratos globais por modelo de viatura a um ritmo pré-definido, designado JIT – “just in time”.
3. A produção dos diversos modelos continua a contar com períodos sem trabalho “Down days”, tornando muito difícil a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do quadro de efectivos da 2.ª Outorgante. Os dias de paragem obrigatórios que traduzem por outro lado na manutenção de uma cadência de produção mais elevada nos dias de trabalho, tomam necessário o reforço temporário da capacidade nominal instalada.
4. Resta complementar que a capacidade nominal da Vanpro para 2010 é de 160 viaturas por dia útil de trabalho para o Scirocco e 98 viaturas por dia útil de trabalho para o Eos.
5. Em paralelo, a 2.ª outorgante está a iniciar um novo projecto “Nova Sharan NF”, cuja fase de início está a decorrer, prevendo-se que atinja o volume normal até final de 2010;
6. Os factos descritos nos pontos anteriores demonstram a irregularidade da produção da 2.ª Outorgante decorrente de natureza estrutural do mercado da indústria automóvel e das causas que acima se apontaram.
7. A irregularidade da produção implica um acréscimo temporário de actividade que se estima deverá ocorrer no período compreendido entre o início de Agosto de 2010 e final de Dezembro de 2010»;
10. No recibo de 31.08.2010, a DD, Lda., pagou ao A. a quantia de € 383,09, a título de compensação de caducidade;
11. Por carta de 15.11.2010, a DD, Lda., comunicou ao A. a caducidade do contrato celebrado em 30.08.2010, terminando a 23.12.2010, uma quinta-feira, véspera de Natal;
12. No dia 27.12.2010, uma segunda-feira, o A. voltou a celebrar novo escrito com a DD, Lda., pelo qual se comprometeu a exercer as mesmas funções sob as ordens e direcção da Ré, enquanto empresa utilizadora, mediante a mesma retribuição, desde essa data e até 02.01.2011;
13. O recurso a esta modalidade de contratação foi motivado pela execução de “tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro”, decorrente de:
«1. Necessidade de se recuperarem assentos em falta, para cerca de 800 viaturas do modelo VW Eos, por dificuldade de se conseguir os componentes, em qualidade e prazo, para que os mesmos fossem feitos dentro da produção e sequência diária normal.
2. O modelo VW Eos sofreu um facelift, que originou uma alteração aos componentes anteriormente pré-definidos.
3. A execução dos trabalhos de recuperação da produção dos assentos VW Eos em falta terá, previsivelmente, início no dia 26.12.2010, prevendo-se a sua conclusão para o dia 02.01.2011»;
14. No recibo de 31.12.2010, a DD, Lda., pagou ao A. a quantia de € 332,27, a título de compensação de caducidade;
15. No dia 03.01.2011, uma segunda-feira, o A. voltou a celebrar novo escrito com a DD, Lda., pelo qual se comprometeu, mediante a mesma retribuição, a exercer as mesmas funções de operador de produção – estofador de 3.ª-A, sob as ordens e direcção da Ré, enquanto empresa utilizadora, com início nessa data e termo logo que extinto o fundamento que lhe deu origem;
16. Em anexo ao referido contrato, encontrava-se uma motivação para o recurso a esta modalidade de contratação idêntica à utilizada aquando da celebração do contrato de 30.08.2010, embora com eliminação do ponto 5. daquele contrato e alterações aos pontos 3., 4. e 6. (anterior 7.);
17. A nova redacção do ponto 3. passou a mencionar que os períodos sem trabalho “Down days” eram determinados pelo cliente Volkswagen/Autoeuropa, com antecedência irregular, mantendo-se toda a demais redacção;
18. No ponto 4. passou agora a mencionar-se que a capacidade nominal da CC para 2011 era de 178 viaturas por dia útil de trabalho para o Scirocco e 120 Eos e 282 para o MPV;
19. Por seu turno, no ponto 6. (correspondente ao ponto 7. no contrato de 30.08.2010) passou a mencionar-se que a irregularidade da produção que implicava um acréscimo temporário de actividade se estimava agora dever ocorrer no período compreendido entre 03.01.2011 e final de Agosto de 2011;
20. Por carta de 25.02.2011, a DD, Lda., comunicou ao A. a caducidade do contrato celebrado em 03.01.2011, terminando a 31.03.2011;
21. No recibo de 31.04.2011, a DD, Lda., pagou ao A. a quantia de € 263,00, a título de compensação de caducidade;
22. No dia 30.03.2011, o A. celebrou novo escrito, desta vez com a Ré, pelo qual foi admitido ao serviço desta, com início em 01.04.2011 e termo em 30.09.2011 (mas mencionando-se que produz efeitos a partir de 30.03.2011), a fim de exercer as mesmas funções de estofador 3.º-A, e mediante a retribuição base mensal de € 639,15;
23. Na cláusula 2.ª desse contrato justifica-se a contratação a termo pelo facto do A. se tratar de trabalhador à procura do primeiro emprego, mais constando que este declara expressamente nunca ter exercido qualquer actividade por contrato de trabalho sem termo;
24. No dia 11.07.2012, o A. celebrou novo escrito com a Ré, pelo qual acordaram na renovação extraordinária do contrato a termo certo, pelo prazo de 12 meses, com início em 01.10.2012 e termo em 30.09.2013;
25. Na cláusula 1.ª n.º 2 desse escrito justifica-se a contratação a termo pelo facto do A. se encontrar ainda à procura do primeiro emprego;
26. No dia 24.07.2013, o A. voltou celebrar novo escrito com a Ré, pelo qual acordaram na renovação extraordinária do contrato a termo certo, desta vez pelo prazo de 6 meses, com início em 01.10.2013 e termo em 31.03.2014, mais uma vez se afirmando que tal se justificava pelo facto do A. se encontrar ainda à procura do primeiro emprego;
27. No dia 17.02.2014, o A. voltou celebrar novo escrito com a Ré, pelo qual acordaram noutra renovação extraordinária do contrato a termo certo, mais uma vez pelo prazo de 6 meses, com início em 01.04.2014 e termo em 30.09.2014, repetindo-se a justificação do A. se encontrar ainda à procura do primeiro emprego;
28. Por carta datada de 01.09.2014, a Ré comunicou ao A. a caducidade do contrato iniciado em 01.04.2011, com termo a 30.09.2014;
29. Com a cessação deste contrato, a Ré pagou ao A. a quantia de € 2.247,50, a título de compensação pela caducidade do contrato, que este não devolveu;
30. Ultimamente, o A. auferia a retribuição base mensal de € 767,53;
31. O A. esteve de baixa por doença de Junho a Setembro de 2014, não tendo regressado à empresa, depois de lhe ter sido comunicada a caducidade do contrato de trabalho;
32. O A. trabalhou sempre na linha de produção da Ré, no mesmo posto de trabalho, exercendo sempre as funções de estofador de 3.ª-A, desde que foi celebrado o contrato de trabalho temporário de 01.04.2010 e até à comunicação de caducidade efectivada em 30.09.2014;
33. Trabalhava em regime de turnos rotativos, alternando entre o turno das 07h00 às 15h30 e o das 15h30 às 24h00;
34. Acompanhavam o A. no desempenho das mesmas funções outros trabalhadores efectivos da Ré, outros contratados a termo e ainda trabalhadores contratados mediante contrato de trabalho temporário;
35. Após a cessação do seu contrato de trabalho, o A. foi substituído por outros trabalhadores;
36. A Ré resulta de uma joint-venture de duas multinacionais, a … e a …, que a detêm em partes iguais;
37. Iniciou a sua actividade no Parque Industrial da AutoEuropa em 1994, com o início do funcionamento desta unidade industrial, tendo por objecto a produção e montagem de assentos para automóveis;
38. A actividade da Ré foi planeada para fornecer em exclusivo a unidade industrial da AutoEuropa, sendo assim esta a sua única cliente;
39. A produção da Ré está assim, desde o início da sua actividade, exclusivamente dependente das encomendas da AutoEuropa, as quais têm de ser satisfeitas segundo o modelo de produção just in time;
40. Este modelo de produção significa que, embora a AutoEuropa forneça uma previsão de produção de cerca de 30 dias, as encomendas apenas se tornam fixas com uma antecedência de seis horas, devendo ser fornecidas nesse prazo;
41. De Abril de 2010 a Junho de 2011, a produção de assentos da Ré foi a seguinte:
Carros/Dia Sharan Scirocco Eos Total
Abr-2010 2 250 152 404
Mai-2010 3 251 162 416
Jun-2010 14 250 132 396
Jul-2010 94 227 109 430
Ago-2010 200 190 115 505
Set-2010 260 140 0 400
Out-2010 300 190 0 490
Nov-2010 300 100 100 500
Dez-2010 300 80 120 500
Jan-2011 260 180 140 580
Fev-2011 260 180 115 555
Mar-2011 280 180 100 560
Abr-2011 280 180 100 560
Mai-2011 280 180 100 560
Jun-2011 308 197 98 603
42. As variações de produção da AutoEuropa e, por consequência, da própria Ré, decorrem do próprio mercado, nomeadamente da variação de encomendas de carros produzidos naquela fábrica;
43. A produção da Ré está igualmente dependente dos dias de paragem de produção da AutoEuropa (down days), quer das férias do pessoal desta;
44. Assim, no ano de 2010, por imposição da AutoEuropa, a produção da Ré foi sujeita a paragens nas férias de 15 a 27 de Agosto e de 24 a 31 de Dezembro, a dois down days em 15 e 16 de Março, tendo trabalhado em 8 sábados (6 e 13 de Janeiro, 5, 20 e 27 de Março, 4, 11 e 18 de Dezembro);
45. No ano de 2011, por imposição da AutoEuropa, a produção da Ré foi sujeita a paragens nas férias de 1 a 14 de Agosto e de 19 a 30 de Dezembro, a dois down days em 5 de Janeiro e em 31 de Outubro, tendo trabalhado em 6 sábados (22 e 29 de Janeiro, 18 de Junho e 2, 16 e 23 de Julho);
46. A Ré celebrou contratos de utilização de trabalho temporário correspondentes aos contratos de trabalho temporário celebrados pelo A., reproduzindo as mesmas justificações de recurso àquele modelo de contratação.

IV. Fundamentação
1. Da prescrição de créditos
Sustenta o recorrente nesta matéria, em síntese, que tendo o último contrato de trabalho temporário cessado em 31 de Março de 2011, quando o recorrente intentou a presente acção – em 12 de Dezembro de 2014 – há muito que prescrevera o invocado direito de “impugnar a ilicitude da cessação daquele contrato e reclamar a vigência de um contrato de trabalho sem termo”.
Sobre esta problemática discorreu assim a decisão recorrida:
«Quanto à excepção de prescrição, o contrato de trabalho do A. cessou menos de um ano antes da propositura da causa. No que concerne aos anteriores contratos de trabalho temporário, o A. invoca a sua antiguidade ao momento temporal em que estes tiveram o seu início, sendo essa uma das questões de fundo que deverão ser analisadas na decisão final.
Mas, para a análise da excepção de prescrição, releva apenas o momento em que o contrato de trabalho do A. com a Ré cessou, e visto que a causa foi proposta em menos de um ano após esse momento, julgo igualmente improcedente esta excepção».
Vejamos.
É pacífico que, como resulta do disposto no artigo 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho, o crédito do trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte à quele em que cessou o contrato de trabalho.
Assim, tendo o contrato de trabalho a termo cessado em 30-09-2014, é manifesto que em 12-12-2014, quando o Autor intentou a presente acção, não haviam prescrito os créditos decorrentes de tal contrato.
E quanto ao alegados créditos dos contratos de trabalho temporário?
Atente-se para tanto no período de vigência desses contratos:
i. o 1.º contrato de trabalho temporário iniciou-se em 01-04-2010 e terminou em 13-08-2010, uma sexta-feira;
ii. na segunda-feira seguinte, dia 16-08-2010, as partes celebraram novo contrato (e referimos aqui novo contrato apenas por facilidade de compreensão, sem que tal envolva qualquer juízo de natureza jurídica), que cessou em 29-08-2010;
iii. no dia seguinte (30-08-2010) foi celebrado novo contrato que terminou em 23-12-2010, quinta-feira, véspera de Natal;
iv. No dia 27-12-2010 foi celebrado novo contrato que cessou em 02-01-2011;
v. no dia 03-01-2011 foi celebrado novo contrato que cessou em 31-03-2011, tendo logo no dia 30-03-2011 entre o Autor e A Ré sido celebrado um contrato de trabalho a termo, com início a 01-04-2011, mas com produção de efeitos a 30-03-2011.
Verifica-se, assim, um hiato temporal muito reduzido entre a celebração dos vários contratos, correspondendo esse espaço temporal, por regra, a apenas o fim de semana entre a cessação do anterior contrato e o início do novo contrato.
Ora, como se assinalou Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17-01-2007 (Proc. n.º 7258/2006, disponível em www.dgsi.pt), entendimento também reafirmado no acórdão do mesmo tribunal de 02-07-2014 (Proc. n.º 4598/12.2TTLSB.L1, igualmente disponível em www.dgsi.pt), também convocado nos autos pelo recorrido, «[s]e se sucedem diversos contratos de trabalho a termo, intervalados entre si, o prazo de prescrição relativamente aos créditos emergentes dos contratos já cessados, sendo certo que se iniciou no dia subsequente ao da respetiva cessação (cfr. art.º 38.º nº 1 da LCT e 381.º, n.º 1 do CT), tem de considerar-se novamente suspenso a partir do momento em que, entre as partes, se celebrou novo contrato, pois a razão de ser que determinou o legislador a optar pela mencionada especificidade quanto à prescrição dos créditos laborais subsiste».
O referido entendimento é, pois, aplicável, mutatis mutandis, aos presentes autos, tendo em conta que está em causa a sucessão de contratos de trabalho temporário e um contrato de trabalho a termo a cuja prazo de prescrição se aplica do disposto no artigo 337.º, n.º 1, do CT, e que entre os contratos existiu um hiato temporal muito reduzido, equivalendo, no máximo, a um fim de semana e feriado que mediou entre o termo de um contrato e o início de outro.
Assim, face à alegação do Autor, de contratos de trabalho sucessivos, e tendo o último dos contratos cessado em 30-09-2014, não se verifica a prescrição de créditos.
Nesta sequência, é de concluir que não se verifica a alegada prescrição de créditos, assim improcedendo, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.

2. Da presunção de aceitação da cessação do contrato
Na contestação, a Ré alegou, além do mais, que o contrato de trabalho a termo certo que manteve com o Autor cessou no dia 30 de Setembro de 2014, em virtude da comunicação de caducidade do mesmo contrato que lhe enviou em 1 de Setembro de 2014, e que tendo o Autor recebido a compensação pecuniária no montante de € 2.247,50 pela cessação do contrato – aliás, como terá recebido anteriormente as compensações pelos anteriores contratos de trabalho temporários – presume-se que aceitou o despedimento, presunção essa que não ilidiu.
Em sede de despacho saneador o tribunal a quo julgou improcedente a referida excepção, desenvolvendo para tanto, e no que importa, a seguinte fundamentação:
«No que concerne à excepção de presunção de aceitação da cessação dos contratos de trabalho, teremos a apontar que a norma invocada pela Ré – o art. 366.º n.º 6 do Código do Trabalho, na redacção da Lei 69/2013, de 30 de Abril – entrou em vigor apenas a 01.10.2013, constituindo uma novidade em relação ao regime anterior.
Sendo assim, no que concerne à cessação dos contratos de trabalho temporários de 2010 e 2011, tal presunção não é aplicável, por não estar prevista na legislação em vigor naquele tempo. E não se argumente que, tendo o A. proposto a acção em Dezembro de 2014, tal presunção já lhe seria aplicável – o regime jurídico relevante para aferir da licitude do despedimento é aquele que estava em vigor ao tempo da cessação do contrato de trabalho, e o trabalhador não pode ser colocado em posição desvantajosa em relação a outros trabalhadores despedidos na mesma altura mas mais lestos na propositura da respectiva acção impugnatória do despedimento.
No que concerne à cessação do contrato de trabalho a termo, em Setembro de 2014, a referida norma já estava em vigor. No entanto, concordamos com o trabalhador, quando afirma que o art. 366.º n.º 6 do Código do Trabalho, na versão actualmente em vigor, aplica-se apenas à cessação de contratos de trabalho a termo e contratos de trabalho temporários, em contexto de despedimento colectivo.
O art. 366.º do Código do Trabalho regula a matéria da compensação por despedimento colectivo, como consta expressamente da respectiva epígrafe, e o seu actual n.º 6 limita-se a regular a matéria da compensação a ser paga no caso daquele despedimento englobar a cessação daquelas espécies contratuais, incluindo a matéria da presunção de aceitação, por uma questão de coerência e unidade do sistema jurídico.
(…)
Destarte, decido desde já julgar improcedente a excepção de presunção de aceitação da cessação do contrato».
Quer no recurso que interpôs do despacho saneador, que conheceu da excepção em causa, quer no recurso que interpôs da sentença final, a recorrente insurge-se contra tal entendimento, argumentando, ao fim e ao resto, que o disposto no artigo 366.º do Código do Trabalho, maxime o seu n.º 6, na redacção introduzida pela Lei n.º 69/2013, de 30 de Agosto, se aplica aos contratos dos autos.
Adiantando desde já a solução, diga-se que a 1.ª instância decidiu com acerto.
Com efeito, e por um lado, não se vislumbra como tendo o referido n.º 6 do artigo 366.º e na referida redacção («[n]os casos de contrato de trabalho a termo e de contrato de trabalho temporário, o trabalhador tem direito a compensação prevista no n.º 2 do artigo 344.º e do n.º 4 do artigo 345.º, consoante os casos, aplicando-se, ainda, o disposto nos n.ºs 2 a 5 do presente artigo») entrado em vigor em 01-10-2013 (artigo 10.º da referida lei) e constituindo um regime jurídico inovador, possa ser aplicado aos contratos de trabalho temporário cessados em 2010 e 2011; por outro, a epígrafe do artigo 366.º é “Compensação por despedimento colectivo”, estabelecendo-se nos n.ºs 1 e 2 qual o montante da compensação por esse despedimento a que o trabalhador tem direito, e nos n.ºs 3 a 5 a responsabilidade do empregador pelo pagamento da compensação e a presunção de aceitação do trabalhador quando recebe a totalidade dessa retribuição: e é então que no n.º 6 do mesmo artigo se estatui que estando em causa um contrato de trabalho a termo ou um contrato de trabalho temporário, a compensação será a prevista no n.º 2 do artigo 344.º e no n.º 4 do artigo 345.º - e não a prevista nos n.ºs 1 e 2 do artigo 366.º - “aplicando-se, ainda, o disposto nos n.ºs 2 a 5 do presente artigo”.
Todavia, dada a inserção sistemática do n.º 6 estamos sempre no âmbito do despedimento colectivo: e é nesse âmbito que se prevê qual o montante da compensação nos casos de contrato de trabalho a termo e de trabalho temporário e a presunção de aceitação do despedimento quando o trabalhador recebe a totalidade da compensação prevista no artigo.
De resto, aludindo-se expressamente no n.º 4 do artigo 366.º a “despedimento” e mandando o n.º 6 do mesmo artigo aplicar, tout court (não referindo qualquer expressão, como por exemplo, “com as necessárias adaptações”), o disposto no n.º 2 a 5 do mesmo artigo só pode reportar-se a situações de despedimento.
Assim, ressalvado o devido respeito por diferente entendimento, conclui-se que o disposto no artigo 366.º, n.º 6, do Código do Trabalho não é aplicável ao caso em apreço e, consequentemente, que não se verifica a presunção de aceitação do despedimento.
Improcedem, pois, também nesta parte, as conclusões das alegações de recurso.

3. Quanto à validade ou não dos contratos de trabalho temporários
A 1.ª instância entendeu que o motivo justificativo para a celebração dos contratos em causa se apresenta genérico, não contendo a menção concreta dos factos que integram o aludido motivo justificativo.
Respiga-se para tanto da sentença recorrida a seguinte fundamentação:
«Analisando os contratos de trabalho temporário dos autos, em três deles (os de 01.04.2010, 30.08.2010 e 03.01.2011) invocam-se as disposições dos arts. 140.º n.º 2 al. e) e 175.º n.º 1 do CTrabalho, e ainda a circunstância da Ré ter por único cliente a AutoEuropa, estando dependente das suas encomendas, segundo o modelo de produção just in time, sendo a produção sujeita a irregularidades, decorrentes da existência de períodos sem produção (down days), obrigando a uma cadência de produção mais elevada nos dias de trabalho. Afirma-se ainda nos referidos contratos de trabalho temporário (e nos correspondentes contratos de utilização) que a irregularidade de produção se estima decorrer durante um período que varia entre o início do mês de Janeiro de 2010 e final de Agosto de 2011 (considerando a globalidade daqueles três contratos).
É desde logo notório que esta justificação não menciona qualquer facto que permita formular um juízo de enquadramento do recurso ao trabalho temporário com fundamento no art. 140.º n.º 2 al. e) do CTrabalho. Com efeito, daquela formulação não resulta estar em causa qualquer actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima.
Por um lado, há a notar que foi a Ré quem planeou o seu modelo de actividade, totalmente dependente das encomendas da sua única cliente, a AutoEuropa. Logo, se existem irregularidades de produção pela circunstância da Ré ter um único cliente e estar dele totalmente dependente, tal reflecte, tão só, uma opção estratégica industrial que à Ré apenas diz respeito – a aceitar-se a validade da motivação aposta naqueles contratos, tal levaria à conclusão da Ré poder utilizar a título precário a totalidade dos seus trabalhadores.
Por outro lado, não se vislumbra que a actividade da Ré seja meramente sazonal, nem a ocorrência de um “ciclo anual de produção” irregular decorrente da natureza estrutural do respectivo mercado – analisando o quadro de produção diária de assentos da Ré, observa-se uma evolução paulatina de Abril de 2010 a Julho de 2011. E não se deixará de notar que o mercado automóvel não apresenta ciclos anuais, regulares ou irregulares, de funcionamento.
De todo o modo, as justificações invocadas nos referidos contratos de utilização de trabalho temporário mencionam irregularidades do processo produtivo decorrentes da Ré ter apenas um único cliente e estar dependente das suas encomendas e dos seus momentos de produção, mas não estabelecem o necessário nexo de causalidade entre o motivo invocado e a duração do contrato, exigida pelo art. 177.º n.º 2, in fine, o qual deveria transparecer da mera apreciação formal da cláusula contratual relativa à estipulação do termo. Com efeito, não se indica qual o período de tempo previsível para dominar a alegada “irregularidade de produção”, ou sequer o motivo pelo qual esse facto exigiria a utilização do trabalho do A. por três períodos sucessivos de duração incerta.
Como já acima se referiu, a cláusula de motivação do recurso ao trabalho temporário por parte do utilizador, tem por função permitir a verificação externa – por parte do trabalhador, dos serviços de inspecção do trabalho e do próprio Tribunal – da conformidade da situação concreta com as tipologias legais e a realidade e a adequação da própria justificação invocada face à duração estipulada para o contrato. Deste modo, a entidade patronal não pode suprir insuficiências na motivação, com recurso a outros factos, não transcritos no contrato mas que pretenda trazer a juízo – a verificação externa da conformidade legal da motivação invocada, faz-se através da análise dos fundamentos de facto constantes do próprio texto do contrato, sendo irrelevantes outros motivos determinantes da vontade dos contraentes, se a mesma não estiver expressa no texto contratual.
(…)
Considerando-se insuficientemente expressa a cláusula de justificação do recurso ao trabalho temporário por parte do utilizador, face aos restritos termos do art. 177.º n.º 2 do CTrabalho – a justificação deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado – a consequência legal é a consideração do trabalho ser prestado pelo A. à Ré, enquanto empresa utilizadora, em regime de contrato de trabalho sem termo – art. 177.º n.ºs 4 e 5 do CTrabalho (n.ºs 5 e 6, após a renumeração introduzida pelas Leis 53/2011, de 14 de Outubro, 23/2012, de 25 de Junho, e 69/2013, de 30 de Agosto).
Tanto mais que é nulo o contrato de utilização de trabalho temporário celebrado fora das situações em que tal legalmente é admitido, considerando-se assim o trabalho prestado ao utilizador em regime de contrato de trabalho sem termo – art. 176.º n.ºs 2 e 3 do Código do Trabalho. E no caso, apurou-se que a actividade da Ré não era sazonal, agindo esta no âmbito do mercado automóvel, que efectivamente não apresenta irregularidades de natureza estrutural.
Conclui-se, pois, que o A. deve considerar-se trabalhador efectivo da Ré desde o início dos contratos de trabalho temporário, i.e., desde 01.04.2010. Logo, quando celebrou o contrato de trabalho a termo certo com a Ré, com início a partir de 01.04.2011, o A. não apenas não era trabalhador à procura de primeiro emprego, como deveria ter sido considerado pela Ré como seu trabalhador em regime de contrato de trabalho sem termo, desde a data de celebração do primeiro contrato de trabalho temporário e do correspondente contrato de utilização.
Finalmente, para além de considerar como único contrato aquele que seja objecto de renovação (arts. 149.º n.º 4 e 178.º n.º 3 do Código do Trabalho), a lei não admite a sucessão no mesmo posto de trabalho de trabalhador temporário ou de trabalhador contratado a termo, antes de decorrer um período de tempo igual a um terço da duração do referido contrato, incluindo renovações – art. 179.º n.º 1 do Código do Trabalho. E considera incluída no cômputo dos limites legais, a duração dos contratos de trabalho a termo ou de trabalho temporário cuja execução se concretiza no mesmo posto de trabalho – arts. 182.º n.º 5 e 148.º n.º 5 do Código do Trabalho. No caso, o A. foi inicialmente admitido em 01.04.2011 com uma justificação elaborada em termos algo confusos – tais justificações começam por afirmar estar em causa uma actividade sazonal, mas terminam com a invocação de um acréscimo temporário de actividade, num período que vai de Janeiro de 2010 a Agosto de 2011 – mas manteve-se sempre no mesmo posto de trabalho e exercendo sempre as mesmas funções, pelo se deve considerar a existência de um único contrato, desde 01.04.2010 até 30.09.2014, num total de quatro anos e meio. Logo, mesmo que se considerasse lícita a contratação do A. pela Ré, com a justificação de se tratar de trabalhador à procura de primeiro emprego, foi ultrapassado o limite máximo de duração de tal contrato, incluindo as suas renovações extraordinárias, decorrente dos arts. 148.º n.º 1 al. a) do Código do Trabalho, 2.º n.º 2 da Lei 3/2012, de 10 de Janeiro, e 2.º n.º 2 da Lei 76/2013, de 7 de Novembro (18 meses + 18 meses + 12 meses = 4 anos), implicando a conversão do contrato em sem termo – art. 147.º n.º 2 al. b) do Código do Trabalho.
Desta conclusão decorre que a comunicação de caducidade do seu contrato de trabalho corresponde a uma forma de despedimento, ilícito por não precedido do necessário procedimento legal – art. 381.º al. c) do CTrabalho.

Outro é o entendimento da recorrente, que sustenta, muito em resumo, que os contratos em causa se encontram devidamente justificados e que se verifica o nexo entre os motivos justificativos e a duração dos contratos.
Vejamos de que lado está a razão.

Nos termos da alínea a), do artigo 172.º, do Código do Trabalho, considera-se contrato de trabalho temporário o contrato de trabalho a termo celebrado entre uma empresa de trabalho temporário e um trabalhador, pelo qual este se obriga, mediante retribuição daquela, a prestar a sua actividade a utilizadores, mantendo-se vinculado à empresa de trabalho temporário.
E de acordo com o estatuído na alínea c) do mesmo artigo, considera-se contrato de utilização de trabalho temporário o contrato de prestação de serviço a termo resolutivo entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual esta se obriga, mediante retribuição, a ceder àquele um ou mais trabalhadores temporários.
É sabido que o trabalho temporário assenta numa relação triangular, em que incumbe (i) à empresa de trabalho temporário a posição jurídica de empregador, cabendo-lhe as respectivas obrigações contratuais, nomeadamente as remuneratórias, os encargos sociais e a contratação do seguro de acidentes de trabalho, (ii) ao utilizador, por delegação da empresa de trabalho temporário, a direcção e organização do trabalho (iii) e ao trabalhador temporário o acatamento das prescrições do utilizador no que respeita ao modo, lugar, duração de trabalho e suspensão da prestação de trabalho, higiene, segurança e medicina no trabalho.
Assim, o trabalhador temporário é contratado pela empresa de trabalho temporário, mas presta a sua actividade em benefício directo do utilizador.
O contrato de utilização de trabalho temporário só pode ser celebrado, no que ora releva, nas situações referidas nas alíneas a) a g) do n.º 2 do artigo 140.º (por remissão do artigo 175.º, n.º1), situações que se reportam, ao fim e ao resto, a necessidades temporárias, de gestão corrente das empresas, e deve conter o motivo justificativo do recurso ao trabalho temporário por parte do utilizador, o que deve ser feito através da menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se o nexo entre a justificação invocada e o termo estipulado [artigo 177.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do CT)..
Importa ter presente que a Lei Fundamental consagra a garantia à segurança no emprego (artigo 53.º), o que envolve, como assinalam Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 711), não só o direito a não ser despedido sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos, mas também todas as situações que se traduzam em injustificada precariedade da relação de trabalho, para que possa ocorrer uma contratação que não garanta a referida segurança no emprego, o que impõe, além do mais que agora não releva, a existência de um motivo justificativo para essa contratação, o mesmo é dizer um requisito relacionado, na sua essência, com as situações que legitimam a celebração de contratos a termo.
Como se observou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-09-2012 (Proc. n.º 406/10.7TTVCT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt) “A contratação a termo, enquanto instrumento legal de vinculação precária, ditado por uma tríplice ordem de razões (de natureza económica, social e de política de emprego) assume, como é sabido, o compromisso possível entre o princípio programático do “direito à segurança no emprego”, com assento constitucional (art. 53º da C.R.P.), de interesse e ordem pública, e o princípio civilista geral da liberdade contratual”.
Na apreciação do motivo justificativo do contrato de trabalho a termo, como de modo impressivo se assinalou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-07-2008 (Proc. n.º 325/08, disponível em www.dgsi.pt) haverá que fazer duas análises distintas: (i) saber se o texto contratual obedece ao pressupostos legais da contratação a termo; (ii) saber se o motivo invocado e o prazo previsto têm correspondência com a realidade prestacional do trabalhador contratado e com a conjuntura laboral da empresa, sendo que, em conformidade com o n.º 1 do artigo 176.º, cabe ao utilizador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de utilização de trabalho temporário.
Ou seja, visa-se com tais exigências legais permitir a verificação ou controle da conformidade da situação concreta com a tipologia legal das situações excepcionais que consentem tal contratação, da veracidade da justificação invocada e até da adequação da duração convencionada para o contrato (neste sentido, acórdão do STJ de 14-01-2015, Proc. n.º 488/11.4TTVFR.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt).

No caso em apreciação, os contratos de utilização foram celebrados uns ao abrigo da alínea e), outros da alínea f), ambos do n.º 2 do artigo 140.º, por remissão do artigo 175.º
Nos termos da referida alínea e) considera-se a existência de necessidade temporária da empresa a [a]ctividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima”; já face ao estatuído na alínea f) considera-se necessidade temporária o «[a]créscimo excepcional da actividade da empresa».
De acordo com o já referido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-07-2008, a “actividade sazonal é aquela que só surge em determinado período do ano, necessariamente limitado, perdendo posteriormente a sua utilidade (…) Em contrapartida, o ciclo de produção legalmente atendível é o ciclo anual, tornando-se ainda mister que as suas irregularidades decorram da natureza estrutural – que não conjuntural – do respectivo mercado”
Escreve Júlio Vieira Gomes (Direito do Trabalho, 1.º Volume, 2007, pág. 595) que[a] noção de actividades sazonais parece ter começado por cingir-se às estações do ano, em termos climatéricos e às suas repercussões em certas actividades, mormente na agricultura (colheitas, sementeiras), estendendo-se depois a outras indústrias em que a actividade também depende da estação do ano (pense-se no turismo balnear ou em certas actividades de turismo de Inverno, como as estâncias de esqui ou na produção de queijos dependente da qualidade do leite, por sua vez condicionada pelo estado dos pastos). A noção foi progressivamente ampliada, abrangendo a pouco e pouco situações cíclicas de aumentos de procura ou relativas, como a letra da lei sugere, ao abastecimento de matérias-primas”.
O que parece poder afirmar-se com segurança é que as actividades sazonais, ou outras cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, ou seja, em que se verifiquem “picos de trabalho”, se deverão caracterizar como actividades que têm uma natureza cíclica, previsível e regular, excluindo-se, pois, as situações em que essas variações sejam imprevisíveis, o que pode suceder em qualquer actividade.
Não pode olvidar-se que a actividade sazonal, ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades da natureza estrutural do respectivo mercado, para justificarem a contratação a termo (ou de trabalho temporário) devem corresponder ao critério geral constante do n.º 1 do artigo 140.º quanto à admissibilidade de contratação a termo, o mesmo é dizer deve estar em causa uma necessidade temporária da empresa e o contrato ser celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade (neste sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II, 3.ª Edição, Almedina, pág. 270).
Ora, no caso, lendo e relendo os contratos em apreciação, o que resulta dos contratos de 01-04-2010, 30-08-2010 e 03-01-2011 como motivo justificativo é, em síntese, que a aqui recorrente tem como único cliente a Autoeuropa, a quem fornece assentos completos para vários modelos de automóveis, estando dependente das suas encomendas e do momento de produção e que as exigências de fornecimento estão condicionadas à instabilidade e irregularidade dos mercados mundiais.
Já em relação ao contrato celebrado em 16-08-2010 invoca-se como motivo justificativo a alínea g) do n.º 2 do artigo 140.º («execução de tarefa ocasional ou serviço determinado definido e não duradouro»), face à «necessidade excepcional de mão-de-obra por forma a fazer face às solicitações do Cliente» (fls. 13 dos autos).
Também em relação ao contrato celebrado em 27-12-2010 se justificou o motivo com a «tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro», precisando-se depois que havia a necessidade de se recuperarem assentos em falta, para cerca de 800 viaturas do modelo VW Eos, prevendo-se o início da execução para 26-12-2010 e a conclusão para o dia 02-01-2011.
Se em relação a este último contrato se pode considerar que se encontra devidamente justificado, com indicação dos concretos factos, o mesmo já não se verifica em relação ao contrato celebrado em 16-08-2010, que nada acrescenta à fórmula legal prevista na alínea g) do n.º 2 do artigo 140.º: apenas se justifica com necessidade excepcional de mão-de-obra por parte do cliente, mas não se apresenta qualquer concretização quanto ao porquê dessa necessidade excepcional por parte cliente, assim se desrespeitando o disposto na alínea b) do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 177.º do Código do Trabalho.
E em relação aos 3 contratos celebrados ao abrigo da alínea e) do n.º 2 do artigo 140.º, o que deles resulta é que a recorrente justificou a celebração dos mesmos com o facto de ter apenas como cliente a Autoeuropa, e como o ciclo de produção de veículos por parte desta apresenta irregularidades tal reflete-se directamente na actividade da recorrente, impossibilitando-a de ter a manutenção e planeamento dos postos de trabalho do seu quadro de efectivos estável.
Ressalvado o devido respeito por diferente entendimento, tal motivação mais não representa do que a afirmação do risco genérico decorrente de uma determinada empresa – seja por estratégia empresarial, seja por qualquer outro motivo – ter um modelo de negócio com apenas um cliente, em que este pode por circunstâncias várias (crise de mercado, estratégia empresarial, etc.) reduzir ou até suspender a produção.
Da referida leitura da motivação desses contratos não se retira que a celebração dos mesmos se tivesse ancorado numa qualquer concreta necessidade temporária de empresa e que os contratos tivessem sido celebrados pelo tempo estritamente necessário à satisfação dessa necessidade: o que parece estar em causa é, não qualquer concreta necessidade temporária da empresa, mas antes uma espécie de “bolsa de emprego” em que a recorrente manteria ou não alguns trabalhadores conforme a maior ou menor necessidade de produção.
Como se assinalou na sentença recorrida, “foi a Ré quem planeou o seu modelo de actividade, totalmente dependente das encomendas da sua única cliente, a AutoEuropa. Logo, se existem irregularidades de produção pela circunstância da Ré ter um único cliente e estar dele totalmente dependente, tal reflecte, tão só, uma opção estratégica industrial que à Ré apenas diz respeito – a aceitar-se a validade da motivação aposta naqueles contratos, tal levaria à conclusão da Ré poder utilizar a título precário a totalidade dos seus trabalhadores”.
Além disso, como também se refere – e bem – na sentença recorrida, não parece que se possa afirmar que está em causa uma actividade sazonal ou um ciclo anual de produção decorrente da natureza estrutural do mercado, assim se justificando a contratação a termo, pois o mercado automóvel não funcionará por ciclos anuais, antes impõe planeamento a mais longo prazo, tendo em conta, designadamente, as orientações e preferências do mercado e, com elas, a opção por determinadas categorias/modelos de veículos.
Aliás, não deixa de ser impressivo que, como decorre dos factos provados sob os n.ºs 32 e 35, ao longo dos cerca de 4 anos e meio que o recorrido exerceu a actividade para a recorrida sempre se manteve no mesmo posto de trabalho e no exercício das mesmas funções, e após a cessação do exercício da actividade para a Ré foi substituído por outros trabalhadores, o que evidencia que não estava em causa qualquer necessidade temporária, mas sim uma necessidade permanente.
É certo que, como é público e resulta da matéria de facto (n.º 42), a produção do cliente da Ré/recorrente não é sempre igual, em termos quantitativos, variando no número de produção de viaturas; essa variação poderá depender, afigura-se, de diversos factores, designadamente das necessidades do mercado automóvel: mas daí não se retira que embora dependendo a Ré/recorrente apenas daquele cliente tal configure, por si só, qualquer concreta necessidade temporária dela recorrer a contratação a termo, ou a trabalho temporário e, mais ainda, que os contratos tenham sido celebrados pelo tempo estritamente necessário à satisfação dessa necessidade.
A admitir-se a validade dos contratos de utilização de trabalho temporário em apreciação com fundamento na existência de actividade sazonal ou actividade cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do mercado, tal equivaleria a possibilitar a manutenção de significativo número de trabalhadores ao serviço da mesma numa situação de precariedade, olvidando a natureza excepcional de tal contratação: seria até uma via de anular o risco empresarial inerente à “mão-de-obra”, transferindo-o para os trabalhadores e, por uma via oblíqua, permita-se-nos a expressão, «deixar entrar pela janela o que não se quis deixar entrar pela porta», uma vez que quer a lei fundamental (artigo 53.º), quer a própria legislação laboral (artigo 140.º) apenas permitem a contratação a termo (ou através do trabalho temporário) em específicos casos, e através da interpretação dessas normas, maxime da alínea e), permitia-se, de uma forma que consideramos generalizada, o recurso à contratação a termo ou a trabalho temporário.
De resto, como se assinala na sentença recorrida, a aceitar-se a referida justificação dos contratos, no limite a recorrente até poderia utilizar a título precário todos os trabalhadores, na medida em que o motivo invocado – de irregularidade na produção e encomendas do cliente – poderia ser transposto para todos os contratos.
Assim, por um lado, as referidas cláusulas justificativas da celebração dos contratos de trabalho temporário não se encontram suficientemente concretizadas; por outro, não se pode olvidar que nuns contratos é invocada a justificação prevista na alínea e) e noutros a alínea f) do n.º 1 do artigo 140.º, que abrangem situações substancialmente distintas, e o certo é que ao longo dos vários contratos de trabalho – de 01-04-2010 a 30-09-2014, portanto mais de 4 anos – o trabalhador sempre trabalhou na mesma linha de produção da Ré, no mesmo posto de trabalho, e exercendo sempre as funções de estofador de 3.ª, o que é indiciador de que estava em causa uma situação de necessidade permanente e não temporária da empresa e, assim, que esta não provou os factos que justificam a celebração dos contratos a termo ou de trabalho temporário (cfr. artigos 140.º, n.º 5, e 176.º, n.º 1, do Código do Trabalho).
Importa ainda acrescentar, e na esteira do afirmado na 1.ª instância, que tendo-se o trabalhador mantido sempre no mesmo posto de trabalho e a exercer as mesmas funções durante mais de 4 anos, e considerando-se como único contrato, se mostra ultrapassado o limite de 4 anos de duração do contrato previsto na interpretação conjugada dos artigo 148.º, n.º 1, alínea a), artigo 2.º, n.º 2 da Lei n.º 3/2012, de 10-01 e artigo 2.º, n.º 2, da Lei n.º 76/2013, de 07-11.
Por isso, sem desdouro pela argumentação da recorrente a mesma não pode proceder.
Acrescente-se, finalmente, que pelos motivos que se deixaram supra referidos, sob o n.º 2, não pode considerar-se que existiu presunção de aceitação do despedimento por parte do trabalhador: e estando em causa um despedimento, ilícito, por não precedido de procedimento disciplinar, uma vez que entre as partes vigorava um contrato sem termo, pelos mesmos motivos não pode aqui convocar-se o disposto no artigo 366.º do CT para a presunção de aceitação do despedimento, sendo que o recebimento pelo trabalhador de importâncias pela caducidade dos contratos não apresenta quaisquer requisitos que permita configurá-lo como remissão abdicativa (cfr. artigo 863.º do Código Civil).
E assim sendo, como se entende, sendo nulos os contratos de utilização do trabalho temporário, considera-se o trabalho prestado pelo Autor/recorrido à Ré/recorrente em regime de contrato de trabalho sem termo, pelo que quando celebrou o contrato de trabalho a termo não podia ser considerado trabalhador à procura do 1.º emprego, pelo que é de considerar ilícita a cessação do contrato comunicado por esta, o que corresponde a um despedimento ilícito, por não precedido do respectivo procedimento [cfr. n.ºs 2 e 3 do artigo 176.º e 381.º alínea c), do CT].
Nesta sequência, só nos resta concluir pela improcedência das conclusões das alegações de ambos os recursos e, por consequência, pela improcedência destes.

Vencida nos recursos deverá a Ré/recorrente suportar o pagamento das custas respectivas (artigos 527.º do Código de Processo Civil).

V. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento aos recursos interpostos por CC, Lda., e, em consequência, confirmam as decisões recorridas.
Custas de ambos os recursos pela recorrente.

Évora, 13 de Outubro de 2016
João Luís Nunes (relator)
Alexandre Ferreira Baptista Coelho
Joaquim António Chambel Mourisco