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FURTO QUALIFICADO
VALOR ESTIMADO
Sumário
I - É incorrecta a enunciação como facto provado que “o arguido se apoderou do veículo ligeiro de passageiros com o valor estimado de 8.000,00 euros”. O “valor da coisa” é um dado objectivo (e não subjectivo), quantificável e determinado; não é um valor estimado pelo dono da coisa.
II - Dizer-se que “ o ofendido estimou em € 8.000,00 o valor do veículo”, é prova do facto e não o facto; dizer-se, na matéria de facto provada, que o veículo tem o “valor estimado de”, continua a ser “prova” e não “facto”; o que cumpriria apurar e determinar factualmente era se a coisa tinha efectivamente o valor que o ofendido lhe atribuiu, ou seja, se possuía o dito valor estimado.
III - Não tendo resultado demonstrado o “valor elevado” da coisa alheia subtraída, a substração de veículo automóvel realiza o crime do art. 203º, nº 1 do CP e não o tipo qualificado do artigo 204.º, nº1, al) do CP. [[1]]
Texto Integral
Acordam na Secção Criminal:
1. No Processo comum colectivo nº 1468/14.3PAPTM, da Comarca de Faro, foi proferido acórdão em que se decidiu:
“a) Absolver o arguido JN do crime por que vinha acusado.
b) Condenar o arguido JP pela prática, como autor material de 1 (um) crime de furto qualificado, na forma consumada, dos arts. 203º nº1 e 204º nº 1-a) do CP na pena de 2 (dois ) anos e 6 (seis) meses de prisão;
c) Condenar o arguido JP pela prática, como autor material de 1 (um) crime de condução sem habilitação legal do art 3º nº2 do DL 2/98 de 3/1 na pena de 1 (um) ano de prisão,
d) Absolver o arguido JP dos demais crimes por que vinha acusado.
e) Operar o cúmulo jurídico das penas e condenar o arguido na pena única de 3 (três) anos de prisão efectiva.”
Inconformado com a decisão, recorreu o arguido JP, concluindo:
“1ª O arguido JP foi condenado, nos presentes autos, como autor material de um crime de furto qualificado, e um crime de condução sem habilitação legal, em cúmulo jurídico numa pena única de três anos de prisão (vide fls. 314, pag.13 do acórdão recorrido).
2ª O acórdão ora recorrido, proferido pelo Tribunal a quo, é de uma manifesta injustiça porquanto o arguido foi condenado face a uma convicção do Tribunal a quo que carece de qualquer suporte probatório e se funda em meros ELEMENTOS INDICIÁRIOS, inexistindo PROVA DIRECTA do essencial dos factos dados como provados.
3ª Os pontos 1.3 a 1.8, e 1.10 da matéria de facto provada (constante de fls. 303 a 306 (parte inicial) pag.2 a 5 do acórdão recorrido) são os pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados e dos quais resultou a condenação do arguido numa pena única de 3 anos de prisão. (artigo 412.º nº 3 alínea a) do C.P.P.)
4ª A factualidade contida nos referidos pontos, segundo o tribunal a quo estribou-se nos seguintes meios de prova (vide fls. 308 a 311, pag.7 a 10 do acórdão recorrido):
Depoimentos das testemunhas de acusação DG e VC de fls 309 e 310; declarações do arguido prestadas audiência de julgamento de fls 308; documentos de fls 310.
5ª Contudo, os indicados elementos de prova, não permitiam que o Tribunal a quo desse como assente a factualidade supra indicada, pois estes elementos probatórios nem todos conjugados permitem dar como provados sequer um dos supra mencionados factos.
6ª Os depoimentos das TESTEMUNHAS não permitem provar qualquer desses factos como decorre da leitura da sua transcrição integral.
7ª A testemunha DG limitou-se a dizer no seu depoimento que no dia em que o veículo foi furtado, não se encontrava em casa da namorada e onde se encontrava o veículo, assim como relatou as suspeitas que tinha sobre autoria do furto, as quais recaiam sobre um cidadão alemão, hospede na casa da sua namorada no âmbito do programas alemã, sobre a acolhimento de delinquência juvenil.
Conforme gravação: (…)
8ª A testemunha VC limitou-se a relatar os factos, que tiveram lugar na diligência em que participou neste processo, nomeadamente o que viu e ouviu quando chegou ao local do acidente, em que participou a viatura de marca Volkswagen Multivam afirmando que a viatura se encontrava tombada, com um individuo lá dentro, que identificou como sendo o arguido, encarcerado e ferido, no lugar do pendura e que quando chegou ao local perguntou aos indivíduos presentes se tinham conhecimento de mais algum ocupante do veículo sinistrado, que eventualmente tivesse saído da viatura. Foi dito por dois indivíduos, que eles também vinham na viatura quando esta se despistou, tendo os mesmos indivíduos negado estes factos mais tarde á testemunha VC militar da GNR. Conforme gravação: (…)
9ª Ambas as testemunhas afirmaram desconhecer quem furtou o veículo, em que circunstâncias e quem a conduzia no momento do acidente.
10ª No que respeita à restante prova, a Documental referida pelo Tribunal a quo como tendo sido determinante para a formação da sua a convicção: (…)
12ª Verifica-se assim que ao ora recorrente - arguido JP – nenhum facto pelos quais foi condenado, foi provado pelos documentos junto aos autos.
13ª Demais prova indicada: Declarações do arguido em audiência de julgamento de fls. 310: Esta prova, tem que ser encarada á luz do estatuto de arguido, o qual não tem obrigação de falar verdade, nem sendo punido se mentir sobre os factos que entender falar. Não houve confissão, uma vez o tribunal não a considerou como tal, cfr. confirmado pelo tribunal no acórdão recorrido de fls. 310 e 311”… não se apresenta verosímil, segundo as regras da experiência comum, provado que não foi o arguido que deixou o veículo no local onde foi encontrado, e que foi em virtude do acidente que o veículo foi encontrado com o arguido lá dentro, encarcerado….”sendo por isso uma prova sujeita à livre apreciação do tribunal, tendo de ser produzida prova sobre os factos.
14ª Conclui-se que NÃO EXISTE PROVA TESTEMUNHAL, DOCUMENTAL OU QUALQUER OUTRA QUE POSSA ENVOLVER O ARGUIDO JP nos factos em causa nos autos, e como tal o arguido devia ter sido absolvido.
15ª ASSIM COMO SE VERIFICA, E É CONFIRMADO PELO TRIBUNAL A FLS. 310, NÃO EXISTE PROVA DIRECTA DOS FACTOS: “elementos de prova em face dos quais se suscitaram dúvidas fundadas sobre a autoria dos arguidos dos factos que lhe eram respetivamente imputados na acusação.”.
16ª Assim, perante estes elementos indiciários, e sem QUALQUER PROVA DIRECTA o tribunal a quo conclui o seguinte a fls. 311: “pelo que, não restam dúvidas, pelo menos quanto a este trajecto de Portimão a Alvor, de que o arguido se encontrava na posse do veículo, porque se tinha apoderado dele, com intuito apropriativo…”
17ª Esta convicção do tribunal a quo, extravasa a compreensão de qualquer homem médio colocado na posição de julgador, tratando-se assim de erro notório na apreciação da prova.
18ª Nesta sede conclui-se que por falta de elementos de prova e até de elementos indiciários referidos nos pontos:
- PONTOS 1.3 a 1.5 DOS FACTOS PROVADOS (fls. 303 do acórdão recorrido): (…)
- PONTOS 1.6 a 1.8 DOS FACTOS PROVADOS (fls. 304 do acórdão recorrido): (…)
- PONTOS 1.10 DOS FACTOS PROVADOS (fls. 304 a 306) do acórdão recorrido) (…)
19ª Os factos constantes dos pontos, supra ao serem considerados como provados pelo tribunal a quo, deu origem a um erro notório na apreciação da prova pelo tribunal recorrido.
20ª Ora, sem existência de prova directa de que foi o arguido a praticar os factos de que vem acusado e sendo os indícios existentes tão falíveis que são colocados em causa pela PROVA TESTEMUNHAL e DOCUMENTAL, jamais o tribunal poderia ter dado como provados os supra mencionados factos exigindo-se uma decisão de ABSOLVIÇÃO!
21ª Verifica-se erro notório na apreciação da prova quando se constata erro de tal forma patente que não escapa à observação do homem de formação média, o que deve ser demonstrado a partir do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum (cit. Ac. STJ de 17 de Dezembro de 1999; BMJ, 472, 407)
22ª Assim o tribunal dá como assente factos, alegadamente alicerçado no depoimento de testemunhas, que não foram alegados por essas mesmas testemunha e em documentos insuficientes para a produção de tal prova, incorrendo no vício DO ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA NOS TERMOS DO ART. 410º N.º 2, AL. C) DO C.P.P.
23ª Por outro lado, o Tribunal a quo incorre também em Erro Notório na Apreciação da Prova por Violação DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO:
“Só existe erro na apreciação da prova quando do texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, resulta com toda a evidência a conclusão contrária à que chegou o tribunal. Nesta perspectiva, a violação do princípio in dubio pro reo pode e deve ser tratada como erro notório na apreciação da prova quando do texto da decisão recorrida se extrair, por forma mais que óbvia, que o colectivo optou por decidir, na dúvida, contra o arguido.”
(neste sentido Ac. STJ de 15 de Abril de 1998; BMJ, 476, 82)
24ª O princípio in dubio pro reo, como corolário importante na materialização do princípio da presunção de inocência apresenta-se-nos como limite normativo do princípio da livre apreciação da prova, pois impede o julgador de tomar uma decisão segundo o seu critério no que respeita aos factos duvidosos desfavoráveis ao arguido, uma vez que os factos favoráveis devem dar-se como provados, quer sejam certos ou duvidosos. (…)
25º O princípio in dubio pro reo é, pois, uma garantia subjectiva e, além disso uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa.
26ª Ora, como supra se demonstrou, o Tribunal a quo violou o Princípio da Presunção da Inocência e o Princípio in dubio pro reo, pois declara que fundou a sua convicção de fls 310.” Elementos de prova em face dos quais se suscitaram dúvidas fundadas sobre a autoria dos arguidos dos factos que lhe eram respectivamete imputados na acusação…” mas decide em sentido contrario, de fls…311.”não se apresenta verosímil, segundo as regras da experiência comum, provado que não foi o arguido que deixou o veiculo no local onde foi encontrado, e que foi em virtude do acidente que o veiculo foi encontrado com o arguido lá dentro..”
27ª Após larga dissertação doutrinal e jurisprudencial sobre a prova directa e a indirecta ou indiciária, que não se coloca em causa, até por ser desfavorável à posição assumida pelo tribunal recorrido, a fls. 50 e 51 do acórdão recorrido e sobre a possibilidade de utilização de prova indiciária pode-se ler: (…)
28ª Ora, o recorrente, não só da leitura e interpretação sistemática que faz do Código de Processo Penal, entende, respaldado na doutrina e jurisprudência, que não obstante serem admissíveis as chamadas presunções judiciais através das quais, mediante ilações ou deduções de factos conhecidos se retiram, com base em regras de experiência comum, outros factos desconhecidos (prova indiciária ou indirecta), a verdade é que só prova directa é que poderá importar a condenação em julgamento.
29ª Na esteira da doutrina de Germano Marques da Silva, vide o Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 30-04-2003 (…)
30ª “A prova indiciária não conduz a um julgamento de certezas. A prova indiciária contém, apenas um conjunto de factos conhecidos que permitirão partir para a descoberta de outro ou outros que deixarão de se mover no campo das probabilidades para entrarem no domínio das certezas. Contudo, o indício é (em si) um facto certo do qual, por interferência lógica baseada em regras da experiência, consolidadas e fiáveis, se chega à demonstração do facto incerto a provar segundo o esquema do chamado silogismo judiciário.
31ª "(...) A exigência de prova sobre a ocorrência dos factos não é a mesma nas diferentes fases do processo. Enquanto para acusar importa a convicção do MP sobre a indiciação suficiente, e para pronunciar também a indiciação suficiente é bastante, já para a condenação importa a prova.
32ª Por indiciação suficiente entende-se a possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, em razão dos meios de prova já existentes, uma pena ou medida de segurança, a prova é a certeza dos factos.
33ª A prova tem de ser sempre plena, conduzir à convicção e não à simples admissão de maior probabilidade. Provado e provável ou possível são conceitos antitéticos de um ponto de vista jurídico. A certeza não é conciliável com a reserva da verdade contrária.
34ª (...) A prova indiciária (indiciação suficiente) permite a sujeição a julgamento, mas não constitui prova, no significado rigoroso do conceito, pois aquilo que está provado já não carece de prova e a acusação e a pronúncia tomam apenas legítima a discussão da causa. Tão-pouco determina uma presunção legal, pois que a prova que pode servir de fundamento à decisão judicial é somente a que tiver sido produzida ou examinada na discussão da causa (art. 355º), em audiência, e não a que, para fins intermédios do processo, consta do inquérito ou da instrução.
35ª A natureza indiciária da prova significa que não se exige prova plena, a prova, mas apenas a probabilidade, fundada em elementos de prova que, conjugados, convençam a possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada uma pena ou medida de segurança criminal.”
36ª A conclusão da doutrina e da jurisprudência acerca desta matéria respalda-se no facto de a existência de falhas no raciocínio lógico do julgador, a contrariedade da conclusão alcançada pelo Tribunal perante o acervo fáctico, ou mesmo o não afastamento de dúvidas razoáveis face à conclusão retirada constituem violações das regras de experiência comum e das máximas de vida por todos aceites, incorrendo tal decisão no vício de erro notório na apreciação da prova nos termos do art. 410º nº 2 al. c) do C.P.P.
37ª De forma bem mais eloquente é o que se pode ler na fundamentação do Ac. STJ de 17-03-2004,: (…)
38ª Relevantes neste ponto, para além dos meios de prova directos, são os procedimentos lógicos para prova indirecta, de conhecimento ou dedução de um facto desconhecido a partir de um facto conhecido: as presunções.
39ª A noção de presunção (noção geral, prestável como definição do meio ou processo lógico de aquisição de factos, e por isso válida também, no processo penal) consta do artigo 349º do Código Civil:
«presunções são: as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido, para firmar um facto desconhecido».
40ª Importam, neste âmbito, as chamadas presunções naturais ou hominis, que permitem ao juiz retirar de um facto conhecido ilações para adquirir um facto desconhecido.
41ª Assim, na passagem do facto conhecido para a aquisição (ou para a prova) do facto desconhecido, têm de intervir, pois, juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam fundadamente afirmar, que segundo as regras da experiência, que um determinado facto, não anteriormente conhecido nem directamente provado, é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, um ou vários factos conhecidos.
42ª A presunção intervém, assim, quando as máximas da experiência da vida e das coisas, baseadas também nos conhecimentos retirados da observação empírica dos factos, permitem afirmar que certo facto é a consequência típica de outro ou outros.
43ª A ilação derivada de uma presunção natural não pode, porém, formular-se sem exigências de relativa segurança, especialmente em matéria de prova em processo penal em que é necessária a comprovação da existência dos factos para além de toda a dúvida.
44ª Há-de, pois, existir e ser revelado um percurso intelectual, lógico, sem soluções de continuidade, e sem uma relação demasiado longínqua entre o facto conhecido e o facto adquirido. A existência de espaços vazios no percurso lógico de congruência segundo as regras de experiência, determina um corte na continuidade do raciocínio, e retira o juízo do domínio da presunção, remetendo-o para o campo já da mera possibilidade física mais ou menos arbitrária ou dominada pelas impressões.
45ª A compreensão e a possibilidade de acompanhamento do percurso lógico e intelectual seguido na fundamentação de uma decisão sobre a matéria de facto, quando respeite a factos que só podem ter sido deduzidos ou adquiridos segundo as regras próprias das presunções naturais, constitui um elemento relevante para o exercício da competência de verificação da (in)existência dos vícios do artigo 410º, nº 2, do CPP, especialmente do erro notório na apreciação da prova, referido na alínea c). - cfr., v. g., o acórdão deste STJ, de 7 de Janeiro de 2004, proc.3213/03.
46ª O trilho que o tribunal de primeira instância percorre na fundamentação do acórdão condenatório proferido, resume-se, no fundo, em encontrar pequenos indícios (foi encontrado dentro do veiculo, encarcerado, ferido, sentado no lugar do pendura, dentro veiculo automóvel) sendo certo que a convicção adquirida pelo colectivo quanto à culpabilidade do arguido é evidente para concluir que o arguido cometeu os crimes de que vinha acusado.
47ª Sucede que, para a condenação do recorrente, impunha-se prova directa da prática do ilícito criminal cometido pelo arguido, isto é, a demonstração materializada em factos concretos, apurados em tribunal por qualquer meio que não seja proibido, de que efectivamente o arguido praticou o crime pelo qual vinha acusado.
48ª O Julgador, a quem é atribuída a função de aplicar a lei, tem de se libertar da mera convicção pessoal, emocional, subjectiva e imotivável de homem comum, pois não é esse o significado a reter da livre apreciação da prova nos termos do art. 127º do C.P.P.. Cabe-lhe a nobre função de decidir de acordo com os factos concretos apurados a partir da prova produzida em audiência, ainda que conjugados com regras de experiência comum ou critérios de lógica.
49ª Nas palavras de Figueiredo Dias “a convicção que se exige ao juiz é uma convicção pessoal, mas em todo o caso uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros” Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, lições coligidas por Maria João Antunes, 1988-9, pág. 140 e ss.
50ª Por outras palavras, o Julgador, por muitas e genuínas convicções que tenha sobre a eventual culpabilidade de determinado arguido num caso concreto, não existindo matéria probatória suficiente para concluir pela sua participação ou envolvimento na prática dos alegados factos descritos no libelo acusatório, só pode apontar para uma solução: a absolvição.
51ª Se assim o tribunal não proceder – como manifestamente o tribunal a quo não procedeu, – estará a violar o princípio do in dubio pro reo, corolário a retirar a final da procedência do vício agora invocado do erro notório na apreciação da prova nos termos do art. 410º nº 2 al. c) do C.P.P..
52ª Não crê o Recorrente que a certeza processual exigível ao tribunal recorrido tenha sido efectivamente observada, porquanto a dúvida razoável sobre a autoria dos crimes em apreço é não só legítima como intransponível, tendo sido dados como provados factos capazes de preencherem a tipicidade dos crimes, sustentados unicamente em prova indiciária e em encadeados raciocínios só aparentemente lógicos. Ao contrário do perfilhado pelo ilustre Tribunal recorrido, entende o Recorrente que nenhuma condenação em julgamento pode ser sustentada apenas e só com base em prova indiciária, muito menos em prova indiciária que se apresenta repleta de tantas incertezas.
53ª Assim, a fundamentação do aresto pelo Tribunal recorrido não podia lograr alcançar os factos dados como provados que preenchem a tipicidade dos crimes de furto qualificado e condução sem habilitação legal falsificação e atribuírem a sua autoria ao recorrente, (DEVIA TER SIDO ABSOLVIDO) fazendo-o em notório erro na apreciação da prova nos termos do art. 410º nº 2 al. c) do C.P.P. por violação do princípio do in dubio pro reo. Em virtude deste vício considera-se que é possível uma decisão da causa pelo Tribunal ad quem.
54ª 2.Dispõe o 204.º,CP,as circunstâncias qualificadoras do crime de furto,” Quem furtar coisa móvel alheia:
a)De valor elevado;
55ª 3.São então elementos típicos objectivos deste tipo, a substração da coisa móvel alheia e, 4.São elementos típicos subjectivos deste tipo, a vontade de substrair a coisa móvel contra o desejo do detentor/possuidor.
56ª 5.Dispõe o artigo 3.º,1”Quem conduzir veículo a motor na via publica ou equiparada sem para tal estar habilitado nos termos do código da Estrada é punido…….”
57ª 6.O nº 2”-Se o agente conduzir, nos termos do numero anterior, motociclo ou automóvel a pena é de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias.”.
58ª 7.São elementos objectivos deste tipo, conduzir o veículo a motor, sem estar habilitado.
59ª 8.São elementos subjectivos deste tipo a vontade de conduzir o veículo sem habilitação legal.
60ª 9.Para que se possa punir a conduta do agente a título de furto, é obrigatório o preenchimento cumulativo de todos estes elementos típicos objectivos.
61ª 10.) Ora, não se conhecendo o autor do furto do veículo de marca Volkswagen Multivan, não se pode condenar ninguém como autor do mesmo, assim também não se pode condenar ninguém pelo crime de condução sem habilitação legal.
62ª 11.Sem prescindir e admitindo por mera hipótese académica como provados os factos, em que assenta o acórdão objecto de recurso, constatamos, claramente que o recorrente não praticou o crime de furto qualificado e o crime de condução sem habilitação legal.
63ª 12.Com efeito, para que se verifique o crime de furto qualificado, p. e p pelo artigo 204.º,nº1,al) a CP, é necessário que a coisa alheia furtada seja de valor elevado, e nos termos do art.202.º,al)a CP ” Valor elevado- e aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no momento a pratica do facto;”
64ª 13.Ou seja, a coisa para ter valor elevado tem de valer mais de 5100 euros.
65ª 14.Acontece que, o arguido vinha acusado de “apoderou-se da mencionada viatura, Volkswagen Multivam …com o valor estimado de 8000€.” bem como de uma caixa de plástico contendo diversos tipos de ferramentas com o valor de 300€;um casaco de cor preta da marca HH com o valor estimado de 200€ e um casaco de cor verde, cuja marca se desconhece e com o valor estimado de 100€..”
66ª 15.Na audiência de julgamento, não foi feita prova do valor real e actual da viatura furtada, nem dos objectos que se encontravam no interior do veículo, que consta como tendo sido apropriados indevidamente.
67ª 17.O Sr. DG, proprietário do veículo em causa, no seu depoimento gravado em audiência de julgamento deu alguns elementos indiciários, que comprovam que o veículo automóvel supra, não podia valer os estimados 8.000 euros, nem os objectos que alegadamente estariam no interior do veículo automóvel, no momento do furto, teriam o valor de 600 euros, estimado pelo seu proprietário.
68ª 18.A testemunha no seu depoimento gravado disse(…)
69ª 19.Ou seja a viatura supra referida, à data do furto tinha 19 anos. É pois fácil de concluir que o veículo automóvel Volkswagen Multivam, não tem um valor de mercado de 8.000 euros.
70ª 20.É público e notório que, pesquizando na internet, ou junto de concessionários especializados, encontramos vários preços para este modelo de carro, e em lado algum ou em nenhum site ou portal, especialmente, aqueles que são especialistas em venda de automóveis, o mesmo é valorado em mais de 3500 euros.
71ª 21.Quanto aos outros objectos, na acusação valiam 600 euros, no depoimento do Sr.Dietrich em audiência, passaram a valer 300 euros na sua totalidade.
72ª 23.É evidente que o tribunal a quo, fez uma errada interpretação dos factos, nomeadamente as circunstâncias qualificativas do crime de furto qualificado-Valor elevado
73ª 24.O crime de furto, independentemente de quem tenha sido o seu autor, a existir teria de ser furto simples como disposto no artigo 203.º CP.
74ª 25.Ao ter condenado o arguido a uma pena pela prática de um crime de furto qualificado, sem que os seus elementos objectivos do tipo estejam preenchidos e, sem que tivesse investigado o valor objectivo do veículo automóvel “verifica-se o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto, a que alude o artigo 410.º,nº2,al.a), do Código de Processo Penal.” Cfr.,Ac.T.R.C,proc.11/10.8GCPBL.C1, de 07-11-2012.” Constatamos que não foi investigada a matéria de facto relevante para a decisão em termos de saber, ao menos aproximadamente o valor dos bens, porquanto sendo desconhecido o respectivo valor, devem considerar-se de valor diminuto.
75ª 26.Devendo assim o crime ser desqualificado para o crime matricial.
76ª 27.O arguido vinha também acusado de um crime de condução sem habilitação legal p.e p pelo artigo 3.º,nº 2 do DL 2/98 de 3/1.A punibilidade deste tipo de crime depende da existência de um veículo a motor que pode ser um automóvel, a circular na via pública e conduzido por um condutor que para esse efeito não está habilitado.
77ª 28.Se conduzir, significa que alguém assume o controle de uma viatura, guiar, dar rumo ou direcção, transportar de um lugar para o outro, ter a direcção efectiva do veículo, então o arguido, de facto, não conduzia o veículo em causa, não tinha a sua direcção efectiva e não determinava, nem podia determinar, a sua direcção de marcha ou velocidade.
78ª 29.A punibilidade deste crime depende, assim, da verificação de 3 elementos objectivos: a) a existência de um veículo a motor que pode ser um automóvel, b) circular na via pública, c) por um condutor que para, esse efeito não está habilitado. «Conduzir é assumir o controlo de um determinado veículo, enquanto o mesmo se desloca, quer tenha o respectivo motor em funcionamento quer o não tenha em tal situação, quer se encontre em posição de marcha por meios próprios ou por meios alheios.
79ª 30.Fundamental para a verificação da condução é que o veiculo circule e que o agente tenha a sua direcção efectiva, podendo determinar, ainda que não exclusivamente, a direcção da sua marcha e velocidade Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 6.12.2006.
80ª 31.Por sua vez também o Acórdão da Relação de Coimbra de 04 de Novembro de 2009 Processo nº 206/08.4GBTNV.C1 (JusNet 6702/2009) decidiu: “Existe actividade de condução automóvel a partir do momento em que se coloca o veículo em movimento, dirigindo-se a sua marcha para o espaço de circulação público.
81ª 32.Assim, só pode falar-se de condução se o veículo com motor transitar nas vias do domínio público ou nas do domínio privado - quando abertas ao trânsito público, onde a lei estabelece a liberdade de trânsito, ainda que com restrições (artigos 2.º e 3.º do Código da Estrada) -, não bastando, por conseguinte, a mera entrada no veículo e colocação ao volante. A noção de condução de veículo abrange apenas processos de movimento no trânsito, uma vez que um veículo parado não produz qualquer ameaça abstracta para a segurança rodoviária e, consequentemente, para bens singulares, quer pessoas quer patrimoniais. Neste sentido, cf. Paula Ribeiro de Faria, Comentário Conimbricense do Código Penal, tomo II, págs. 1064, § 4.º, e 1094, § 4.º.. Só está a transitar o veículo que se movimenta, ainda que sem o motor ligado, como nas situações em que o veículo segue de empurrão ou a reboque - Cfr. Acórdão da Relação do Porto de 25-09-2002, proc. n.º 0240610 (JusNet 4996/2002), in www.dgsi.pt..
82ª 33.Acontece que somente ficou provado em audiência de julgamento que o arguido se encontrava dentro veículo de marca Volkswagen, no lugar do pendura, encarcerado, ferido na perna e que outros dois indivíduos terão saído do veículo após este se ter acidentado.
83ª 34.Razão pela qual os elementos objectivos e subjectivos do tipo não estão preenchidos, não havendo ilícito dado como provado, o arguido deve ser absolvido.
84ª 1.A determinação concreta da pena, dentro da "moldura de prevenção", terá como limite máximo inultrapassável a medida da culpa, nos termos do disposto no artigo 40.º, n.º 2 do Código Penal - é o Princípio da Culpa -, fundado nas exigências irrenunciáveis de respeito pela dignidade da pessoa humana. O limite mínimo corresponderá ao mínimo da pena que, em concreto, ainda protege com eficácia os bens jurídicos tutelados, o mínimo imprescindível a assegurar as expectativas de protecção da comunidade.
85ª 2.Para além de que, a pena, na sua execução, deverá sempre ter um caráter ressocializador e pedagógico.
86ª 3.Estabelece o artigo 71.º, n.º 1, do Código Penal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção desde que existindo um facto ilícito típico doloso, se prove o seu cometimento.
87ª 4.Por seu turno, dispõe o n.º 2 do mesmo artigo que, na determinação concreta da pena, o Tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.
88ª 5.Não se dando como provados os factos de que o arguido vem acusado, não há ilicitude e também não há dolo.
89ª 6.Sem prescindir e admitindo por mera hipótese académica como provados os factos em que assenta o acórdão, objecto de recurso, sempre o tribunal a quo teria em linha de conta que o arguido á data dos factos ainda não tinha feito 20 anos, estando por isso abrangido Regime Penal Especial dos Jovens Adultos previsto no Decreto-lei nº 401/82 de 2 de Setembro.
90ª 7.Que no seu artigo nº 4 dispõe que sendo-lhe aplicável pena de prisão deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 72.º e 73º do Código Penal.
91ª 8.Contudo, o tribunal recorrido não teve em conta as circunstâncias que relevam a favor do arguido, tais como a sua idade, estar empregado á data dos factos e ter colaborado com o tribunal.
92ª 9.Desvalorando que nos jovens adultos, as questões de ressocialização devem prevalecer em detrimento das questões de culpa e ilicitude.
93ª 10.Acontece que o tribunal em lugar de atenuar a pena, agravou-a com base num relatório social cujo conteúdo não foi contraditado em audiência de julgamento, em violação do disposto no artigo 355.º do CPP.
94ª 11.O tribunal a quo baseou a sua decisão numa opinião subjectiva do técnico que elaborou o relatório, ou seja agravou a pena do arguido com base em juízes de valor não contraditados em audiência, não em elementos objectivos verificáveis por um qualquer homem medio. “conclusão que se retira dos factos assinalados no seu relatório social……apresentar reduzida capacidade de resistência à frustração e não consegue antecipar o risco das consequências dos seus actos, reagindo por oposição a figuras da autoridade, não aceitando ser contrariado.”
95ª 12.Ou seja, o tribunal recorrido só teve em linha de conta os juízes de valor que não beneficiam o arguido, desvalorizando a conclusão do relatório que em si mesmo entra contradição, pois nesta afirma que “jovem comunicativo, reservado, influenciável em contexto de pares…..Ainda que não se identifique com a totalidade dos factos que lhe são imputados, revela sentido critico…”…atendendo às características do arguido será importante que o mesmo venha a melhorar as suas competências pessoais ao nível da formação e invista no tratamento dos consumos aditivos perspetivando uma adequada inserção laboral e social.”
96ª 13. Mesmo encontrando-se convencido que o arguido cometeu os crimes de que vinha acusado – pese embora não exista prova nesse sentido – o Tribunal a quo deveria ter ponderado não ter elementos suficientes para concluir pela existência de dolo directo e elevada ilicitude e tendo formado a sua convicção praticamente na ausência de prova impunha-se uma pena próxima do mínimo legal, ou seja uma pena de multa. Tanto mais que, se tivesse sido observado o princípio do in dubio pro reo no caso em apreço, o arguido teria que ter sido absolvido, face à incerteza das situações apresentadas para a condenação.
97ª 1.«Determina o artigo 50º, n.º1 do Código Penal que o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
98ª 2.No caso, o arguido não tem antecedentes criminais, nada constando na CRC, é primário, é jovem, estava a trabalhar na altura dos factos.
99ª 3.Em audiência de julgamento, o sr. Procurador da República requereu nas suas alegações finais, que o tribunal suspendesse a pena que eventualmente viesse a ser aplicada.
100ª 4.O recorrente não concebe a condenação pelos factos de que vem acusado, por não provados, mas se o tribunal ad quem por mera hipótese académica, confirmar a condenação do arguido, defende que a salvaguarda das exigências mínimas essenciais de defesa do ordenamento jurídico (prevenção geral) e o afastamento do agente da criminalidade (prevenção especial) se cumprem com a suspensão da execução da pena, pois a ameaça constante futura sobre a execução da pena é suficiente para a sua ressocialização e paz social.
101ª 5.O Tribunal a quo utilizou a mesma fundamentação invocada para a determinação concreta da pena, para fundamentar a não suspensão da execução da pena e o recorrente discorda com os mesmos fundamentos apresentados na impugnação dos factos supra e que dá aqui por integralmente reproduzidos para os efeitos legais.
102ª 6.Ainda que o arguido tivesse praticado os crimes pelos quais foi condenado, o que não se concebe, defende o recorrente a suspensão da execução da pena de prisão nos termos do disposto no artigo 50.º CP .”
O Ministério Público respondeu ao recurso pronunciando-se no sentido da procedência parcial, concluindo: “Deve o Douto Acórdão recorrido manter-se, à excepção de se dever suspender na execução mediante deveres a pena de prisão de três anos aplicada ao arguido JP, salvo o respeito devido por distinta opinião.”
Neste Tribunal, a Sra. Procuradora-geral Adjunta pronunciou-se no sentido da confirmação integral da sentença. Não houve resposta ao parecer.
Colhidos os vistos, teve lugar a conferência.
2. No acórdão, consideraram-se os seguintes factos provados:
“NUIPC 751/14.2PAPTM (Apenso)
1.1 No dia 2 de Junho de 2014, pelas 23h00, no hall de entrada do lote 10 da Praceta Major David Neto, o arguido JP, então aí residente, e JN desmontaram o ciclomotor da marca Yamaha, BWS, de cor branca, com a matrícula EG, estando aposta no mesmo a matrícula HN, cuja carenagem, banco e farolim traseiro retiraram.
1.2 Tal veículo com valor estimado de €200,00 pertence a MC, mas é habitualmente utilizado por VC, sua filha.
NUIPC 44/15.8GDPTM e NUIPC 46/15.4GBPTM (Apensos):
1.3 No dia 11 de Fevereiro de 2015, pelas 3h10, o arguido JP apoderou-se do veículo ligeiro de passageiros de matrícula -LX, pertencente a DG, com o valor estimado de 8.000 euros, que se encontrava estacionado no Parque de estacionamento da Alameda, e conduziu-o até à rotunda de Alvor, junto à praça de táxis, sem que, para o efeito, estivesse habilitado com carta de condução.
1.4 Na altura, o arguido perdeu o controlo do veículo e despistou-se, ficando encarcerado no seu interior.
1.5 O arguido JP actuou com a intenção concretizada de se apoderar e fazer seu o veículo e os objectos que se encontravam no seu interior, não obstante saber que não lhe pertenciam e que agia contra a vontade de DG, seu legítimo proprietário.
1.6 Ademais, o arguido JP estava ciente das características do veículo com a matrícula --LX, bem como as vias de trânsito por onde circulou e bem sabia que em tais condições não podia conduzir nas vias públicas, como efectivamente fez.
1.7 O arguido agiu na ocasião supra referida em 1.3, de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as respectivas condutas são proibidas e punidas por lei.
1.8 Na referida ocasião o arguido JP conduzia com uma TAS de 1,37g/l +/-0,18g/l.
1.9 O arguido JP não tem antecedentes criminais.
1.10 O arguido tem 21 anos … De origem guineense…na época dos factos não dispunha de autonomia económica, residia com o agregado familiar da mãe numa casa arrendada… sendo o mais velho de 3 irmãos, filhos dos progenitores…, e com um irmão uterino mais velho que integrou a família desde sempre, e mais 3 irmãos uterinos….veio para Portugal com a mãe com 3 anos de idade…Entretanto ocorreu a separação dos pais que foi conflituosa e problemática, com intervenção judicial, suscitando questões ao nível da saúde mental da progenitora, problemas aditivos de bebidas alcoólicas e um modo de vida desregrado … que determinaram a entrega judicial dos filhos ao pai. Entre os 4 anos e os 10 anos de idade, JP deixou de conviver com a mãe regularmente. A relação foi retomada gradualmente sem particular receptividade por parte do arguido. A rigidez nas regras impostas pela mãe, com recurso a ameaças punitivas, funcionou como factor intimidatório para o arguido…Em contrapartida o modelo educativo do pai foi caracterizado pelo afecto, pela permissividade, por dificuldades em impor regras o que resultou na perda de controlo e orientação da vida dos descendentes. Por decisão conjunta dos pais, em setembro/2008, o arguido integrou o agregado familiar materno reconstituído, mantendo visitas ao pai aos fins-de-semana. … Apesar de evidenciar competências positivas, o percurso escolar do arguido foi problemático e pouco satisfatório a partir dos 10 anos: fazia-se acompanhar por indivíduos de faixa etária superior; desinvestiu dos estudos em conjunto com absentismo escolar, tendo sido identificadas práticas delituosas, motivando a sinalização da família na CPCJ de Portimão. A intervenção pretendia que o jovem viesse a melhor a assiduidade e comportamento no espaço escolar, acatasse as orientações parentais, distanciando-se de pares delinquentes. Veio a ser acompanhado nos serviços da DGRS ampliada a intervenção à vertente das problemáticas aditivas, com consultas no Gabinete de Atendimento a Jovens e Envolventes. Completou o 9º ano num curso do PIEF, na área de ajudante de cozinha. De temperamento impulsivo, apesar de educado e sociável, o jovem apresenta reduzida capacidade de resistência à frustração e no contexto de grupo de pares nem sempre consegue antecipar o risco das consequências dos seus actos. Revela em abstrato noção de regras sociais básicas, ainda que reaja por oposição a figuras de autoridade, não aceitando ser contrariado. Na esfera pessoal JP reconhece dificuldade em concentrar-se numa relação única, ainda que aos 19 anos tivesse um relacionamento afectivo de duração superior a um ano, com vivência conjunta com a namorada em casa da progenitora. Ambos estariam a trabalhar, no entanto o arguido manteve convívios externos ao núcleo familiar vindo a terminar a relação. Apreciador de convívios com pares em cafés ou outros locais de diversão, contextos nos quais é frequente ingerir bebidas alcoólicas de forma intensa. Não admite que este é um padrão de dependência aditiva, ainda que reconheça perder o controlo dos seus atos quando está embriagado. Tem experiência laboral como ajudante de cozinha em hotelaria, na Pizza Hut, na construção civil e num snack-bar em parceria com a mãe, sem ter estabilizado uma atividade laboral ou hábitos regulares de trabalho. No último trimestre do ano transacto teve funções como gestor comercial na empresa de telecomunicações NOS, dependendo os seus rendimentos de comissões. … Em 10-12-2016 foi detido pela PJ de Lisboa, encontrando-se desde então preso preventivamente no E.P. de Caxias, suspeito da prática de crimes de carjacking. Confrontado com estes novos ilícitos, a gravidade dos mesmos, ocorridos em data posterior aos factos que lhe são atribuídos no presente processo, o arguido tende a justificar as eventuais condutas delituosas devidos a necessidades económicas. O mesmo tipo de argumento justificativo é manifestado pelo sujeito para enquadrar outros ilícitos criminais.
Foram ainda consignados os factos não provados.
A motivação da matéria de facto, na parte que releva em recurso, foi a que segue:
“Interpretada a totalidade da prova produzida, conjugadamente, à luz das regras da experiência comum e da livre convicção, - quanto à questão da culpabilidade - e respeitando aos factos provados e não provados a convicção do Tribunal fundamentou-se
- nas declarações do arguido JP - que (…) Quanto ao veículo Volkswagen (NUIPC---/15.15.8GDPTM), e à condução sem habilitação legal (NUIPC--/15.4GBPTM), declarou que estava sob o efeito do álcool e “apanhou” a carrinha que estava estacionada no Parque de estacionamento da Alameda e levou-a para se ir divertir um bocado, tendo-se despistado, e que não revistou a carrinha e dos objectos que conteria não se recorda de nada, (…)
- nos depoimentos das testemunhas (…) DG, de nacionalidade Alemã, dono da carrinha Volkswagen, cujo valor estimou em cerca de 8.000 euros, que foi furtada do quintal da namorada, na Quinta do Mocho, e que decorridos 3 ou 4 dias lhe telefonou a PSP para lhe entregar o veículo, que estava acidentado e completamente danificado, numa sucateira, porque lhe tinham cortado o tecto para salvar o ocupante, faltava-lhe o casaco que valia à volta de 200 euros, e a caixa de ferramentas que valia mais de 100 euros, que suspeitou de um indivíduo alemão que vivia em casa da namorada dele, mas desconhece se havia alguma ligação entre esse indivíduo e o arguido,
VC, militar da GNR, que interveio na ocorrência de acidente de viação, em Alvor, por despiste da carrinha, e no interior encontrava-se o arguido JP, encarcerado, que confirmou que o veículo aparentava ter bom estado antes do despiste, mas que fiou totalmente danificado, para sucata, depois de lhe ter sido cortado o tecto para desencarcerar a vítima, o arguido JP,
nos documentos, - autos de apreensão de fls. 81-83, 55 do Ap. 44/15.8GDPTM, 9-10 do Ap. 1726/14.7PAPTM, 15 de Ap. 751/14.2PAPTM; - informação sobre o IMEI de fls. 16, 26-28; - reportagem fotográfica de fls. 83; - auto de exame e avaliação de fls. 84; - informação do IMTT de fls. 63; - termo de entrega de fls. 56 do Ap. 44/15.8GDPTM, 20 do Ap. 751/14.2PAPTM; - relatório de inspecção judiciária de fls. 33-39 do Ap. 44/15.8GDPTM; - reportagem fotográfica de fls. 10 do Ap. 751/14.2PAPTM; - informações do registo automóvel de fls. 12-13 do Ap. 751/14.2PAPTM; - participação de acidente de viação de fls. 10-17 do Ap. 123/15.1GBPTM;
elementos de prova em face dos quais se suscitaram dúvidas fundadas sobre a autoria dos arguidos dos factos que lhe eram respectivamente imputados na acusação, com excepção daqueles em que as mesmas foram supridas pelas declarações confessórias do arguido JP quanto ao furto da carrinha Volkswagen e à condução com álcool, na ocasião do despiste, sendo certo que tendo a dita viatura sido furtada cerca de 4 ou 5 dias antes ao seu proprietário, da Quinta do Mocho, na zona da Caramujeira, a versão apresentada pelo arguido visando sugerir que a encontrou por acaso, em Portimão, e decidiu tomá-la apenas para ir dar uma volta, até Alvor, não se apresenta verosímil, segundo as regras da experiência comum, provado que não foi o arguido que deixou o veículo no local onde foi encontrado, e que foi em virtude do acidente que o veículo foi encontrado com o arguido lá dentro, encarcerado, sem hipótese de fugir à acção das autoridades, dali tendo saído para o hospital, pelo que, não restaram dúvidas, pelo menos, quanto a esse trajecto de Portimão a Alvor de que o arguido se encontrava na posse do veículo, porque se tinha apoderado dele, com intuito apropriativo.
Por último, quanto aos factos não provados sob os nºs 2.4 e 2.12 a ausência de convicção resultou de não ter sido efectuado o exame pericial da munição, que a descrevesse e qualificasse como arma proibida, sendo insuficiente para esse efeito a reportagem fotográfica de fls. 10 que apenas documenta a apreensão do objecto, mas não substitui o exame pericial, elementos de prova em face dos quais foram os factos julgados provados e não provados em conformidade.
Quanto à situação pessoal do arguido JP a convicção fundou-se no CRC e no relatório social juntos aos autos.”
3. Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios do art. 410º, nº 2 do CPP (AFJ de 19.10.95), as questões a apreciar são (a) a impugnação da matéria de facto, (b) o erro de subsunção e (c) a pena
(a)Da impugnação da matéria de facto
O arguido pugna pela revogação do acórdão condenatório, defendendo que os factos da acusação não resultaram demonstrados em julgamento e que deve ser absolvido dos dois crimes imputados.
No questionamento da factualidade, o recorrente procede à impugnação da matéria de facto ao abrigo do disposto no art. 412º, nºs 3 e 4 do CPP, ou seja, por via do recurso amplo. Individualiza os pontos de facto que considera incorrectamente julgados - e que são os pontos constantes dos factos provados do acórdão sob os números 1.3 a 1.8, e 1.10 – e procede à indicação das provas em que funda a impugnação - por referência à prova gravada, que transcreve: as declarações do arguido, os depoimentos do ofendido DG e de VC, militar da GNR.
Sendo de considerar cumpridos os ónus legais de especificação na impugnação da matéria de facto, procedeu a Relação à análise da prova transcrita no recurso e ao exame da prova documental existente no processo e referida no exame das provas do acórdão.
Tendo-se, depois, procedido à sindicância do “acórdão de facto” (consistente nos factos provados, factos não provados e exame crítico das provas) no confronto das razões da discordância do recorrente sustentadas nas concretas provas que suportam a sua argumentação, adianta-se ser de concluir que a justificação da convicção do colectivo de juízas, permanece compreensível e suficientemente justificada relativamente a todos pontos impugnados, à excepção de um deles (o respeitante ao valor do veículo subtraído), tudo pelas razões que se passam a explicar.
O recorrente impugna os factos que interessam à imputação objectiva (e, logo, também a subjectiva), defendendo que inexiste prova de que tenha sido o autor da subtracção do veículo automóvel --LX, bem como prova de que o tenha conduzido.
Refere que em audiência se apurou apenas que se encontrava no interior do veículo, do qual foi retirado já acidentado, estando na altura “do lado do pendura”; e que estas circunstâncias seriam insuficientes para se poder concluir pela sua responsabilidade na subtracção e na condução do veículo furtado.
Corresponde à verdade do processo e da prova, e assim resulta também do acórdão, que o veículo subtraído ficou inutilizado, na sequência de um acidente de viacção e também da acção desenvolvida pela autoridade e pelos meios de socorro ao arguido, já que este se encontrava no interior e no lugar do pendura aquando do acidente. O veículo teve de ser cortado para o desencarceramento. Todas estas circunstâncias se encontram demonstradas por prova directa e elas constituem factos circunstanciais ou instrumentais dos factos principais, dados como provados.
Por si só, e na ausência de outras, seriam insuficientes para a demonstração dos factos impugnados. Pois subscreve-se a jurisprudência que tem decidido que “do facto do arguido haver sido encontrado na posse de objectos furtados não se pode inferir, com suficiente segurança, pelas regras da lógica e da experiência comum, que ele foi autor do furto” (Ac. TRP 28.01.2009 Rel. Isabel Pais Martins) e que “a simples detenção dos objectos furtados por parte do arguido, desacompanhada de qualquer outro indício, não permite induzir a forma como as coisas furtadas foram por ele obtidas, nem que ele as obteve nas condições requeridas pelo art. 203º do CP” (Ac. TRG 18.01.2009 Rel. Cruz Bucho).
Na ausência de qualquer outra prova – ausência que, no caso, não ocorreu – dificilmente se poderia concluir pela resposta de “provado” quanto aos factos referentes à autoria do crime de furto e, consequentemente, do crime de condução sem habilitação legal.
Mas a elas acrescem outras provas, outros elementos a que o recorrente chama de indícios (e assim se podem também denominar) que robustecem a decisão de “provado” e impedem a detecção do erro de facto.
O arguido não foi apenas “encontrado” no interior do veículo subtraído e no lugar do pendura. Estava nesta posição, é certo, mas do depoimento do oficial da GNR, também transcrito no recurso, resulta que o veículo acidentado se imobilizou tombado lateralmente e que o lado do condutor ficou para cima. Ou seja, a pessoa que ocupasse esta posição teria necessariamente que resvalar para o lugar do pendura.
Também nas declarações que prestou em julgamento (que aliás transcreveu em recurso), o arguido admitiu textualmente: “eu estava sob o efeito do álcool”, “apanhei uma carrinha que estava estacionada”, “tinha acabado de beber uns copo e apanhei a carrinha e levei-a”. “Apanhar” uma carrinha é subtraí-la, “levá-la” é conduzi-la.
Refere o recorrente que uma “confissão” não poderia ser agora valorada, por não ter ficado consignada em acta, nem terem sido ouvidos sobre ela o arguido e o Ministério Público.
Mas a argumentação não colhe, pois a situação em apreço – de admissão, pelo arguido, de factos imputados na acusação – não se enquadra na prevista no art. 344º do CPP, que trata da confissão do arguido, mormente da integral e sem reservas, em casos de dispensa de produção de prova, por causa ou na sequência, dessa confissão.
Não tendo aqui ocorrido uma confissão integral e sem reservas de todos os factos da acusação, nem uma confissão parcial da qual decorresse a desnecessidade de produzir prova, esta norma, e o regime que prevê, não seriam aqui aplicáveis.
Em suma, as declarações de arguido – na imediação e na oralidade, no mais amplo contraditório que é a audiência de julgamento - são o seu meio de defesa por excelência. Mas não deixam de constituir um meio de prova. Foi essa a opção do legislador, como resulta, por exemplo, da disciplina do já mencionado art. 344º do CPP, por via do qual é atribuída à confissão efeitos de prova plena.
Ao prestar declarações sobre os factos que lhe são imputados, optando livremente por abandonar um “nada dizer”, as declarações de arguido passam a integrar o conjunto das provas valoráveis (de acordo com o princípio da aquisição processual das provas) livremente (segundo o princípio da livre apreciação). E mesmo sobre a possibilidade de uma valoração positiva (no sentido da condenação) de uma “apresentação de versão inverídica pelo arguido” se pronunciou já o Supremo Tribunal de Justiça, nomeadamente no acórdão de 12.03.2009 (Rel. Santos Cabral).
O arguido beneficia da presunção de inocência até à sua condenação transitada em julgado, consagrada no art. 32º, nº2 da CRP e um dos direitos fundamentais reconhecido internacionalmente. Recai sempre sobre o acusador o encargo de destruir essa presunção de inocência.
O princípio in dubio pro reo impõe a valoração do non liquetem questão de prova, sempre no sentido favorável ao arguido. Só que, no caso, o tribunal não estava em presença de um non liquet, pois as provas dos factos ora impugnados – muitas delas indirectas, é certo – permitiam concluir, em conjunto também com as declarações do arguido, pela consistência da versão dos factos apresentada na acusação e dada como provada no acórdão.
E se, à partida, é recomendável que a consistência da prova indirecta assente numa pluralidade e concordância de indícios – que, no caso, até existe - “a capacidade demonstrativa da prova indirecta não é determinável de um modo apriorístico e puramente formal; só em face de valoração final do material probatório obtido num determinado processo se poderá verificar a maior ou menor eficácia persuasiva da prova directa em relação à prova indiciária e vice-versa; um único indício nem sempre tem uma força persuasiva inferior à da prova directa ou demonstrativa” (Ac. TRL 07.01.2009 Rel. Carlos Almeida).
E se se mantém actual a lição antiga de Cavaleiro de Ferreira, no sentido da avaliação da prova indirecta se dever rodear das maiores cautelas atenta a sua tendencial fragilidade (Cavaleiro de Ferreira, Lições de Processo Penal, 1981, p.289), há que não diabolizar a prova por indícios sob pena de frustrar a perseguição de crimes em que apenas esta prova é possível e, consequentemente, deixar sem tutela os bens jurídicos por eles protegidos.
Bem andou o tribunal ao valorar em sentido positivo as provas na sua globalidade, completando as provas indirectas com as declarações do arguido, que admitiu a prática de alguns dos factos.
O juízo sobre a prova é um juízo global, no sentido de a convicção se formar do escrutínio rigoroso e cuidado de cada uma das provas individualmente consideradas, mas também de todas elas no seu conjunto, directas e/ou indirectas A convicção formar-se-á, sempre e apenas, a final, ou seja, avaliada cada prova e toda a prova.
De tudo se conclui que o conjunto dos indícios aponta no sentido do passo lógico efectuado pelo tribunal, conducente à resposta de “provado” também quanto à factualidade sobre a imputação dos factos à pessoa do recorrente.
A ausência de erro na decisão da matéria de facto abrange ainda o núcleo de factualidade referente à personalidade do arguido, que o recorrente impugnou também.
Segundo o acórdão, os factos pessoais provados resultaram da informação colhida (correctamente, adianta-se) no relatório social, efectuado ao abrigo do disposto nos arts. 369º e 370º do CP.
Protesta o recorrente, alegando que “o relatório social não foi contraditado em audiência de julgamento, em violação do disposto no artigo 355.º do CPP”, que o tribunal se baseou numa “opinião subjectiva do técnico que elaborou o relatório, em juízos de valor não contraditados em audiência, e não em elementos objectivos verificáveis por qualquer homem medio”.
Sucede que o relatório social não foi junto ao processo já após encerramento da fase de produção da prova, foi-o no decurso do julgamento, mais precisamente entre a sessão realizada a 13/05 e a realizada a 09/06, em plena discussão da causa, portanto, e muito antes do encerramento da fase de produção de prova.
Não está alegado em recurso, nem resulta dos autos, que tenha sido negado à defesa o acesso ao processo e ao relatório social.
Nos termos do art. 370º, nº 3 do CPP, a leitura do relatório social em audiência só é permitida a requerimento, e a defesa não a requereu.
Acresce que não foi contraposta outra prova sobre a personalidade do arguido (designadamente testemunhal) que visasse contrariar a informação constante do relatório. Independentemente das obrigações oficiosas decorrentes do princípio da investigação, a defesa podia ter trazido a julgamento a prova de outras eventuais circunstâncias pessoais mais favoráveis ao arguido, empenhando-se activamente na disponibilização de factos relativos à sua personalidade, assim se envolvendo mais abertamente na fase da determinação da pena.
Na ausência de informação de efeito contra-indiciante, que a defesa nunca esteve impedida de trazer ao processo, baseou-se o tribunal, acertadamente, no relatório social, que, na definição do art. 1º, al. g) do CPP, consiste precisamente na “informação sobre a inserção familiar e socio-profissional do arguido, elaborada por serviços de reinserção social, com o objectivo de auxiliar o tribunal ou o juiz no conhecimento sobre a personalidade do arguido, para os efeitos e nos casos previstos na lei”.
De tudo resulta que, em matéria de prova e de decisão da matéria de facto na parte à imputação objectiva e subjectiva e às condições pessoais do arguido, é de reconhecer a conformidade entre o que foi dito e aquilo que o tribunal ouviu e diz ter ouvido; inexistem provas proibidas ou produzidas fora das normas que regem os meios de prova; o tribunal justificou adequada e racionalmente a opção que fez relativamente à avaliação dos conteúdos probatórios, apelando às regras da lógica e da experiência comum, e sem violação do princípio do in dúbio e da presunção de inocência. Conclui-se, pois, nesta parte, no sentido da ausência de erro de julgamento.
Mas disse-se de início que o tribunal não justificou devidamente um dos pontos de facto impugnados: o respeitante ao valor do veículo subtraído.
Na matéria de facto provada do acórdão especificou-se que o arguido se apoderou “do veículo ligeiro de passageiros de matrícula ---LX, pertencente a DG, com o valor estimado de 8.000 euros”.
Constata-se logo a inexactidão, plasmada na descrição deste enunciado, respeitante à determinação do valor da coisa móvel subtraída.
O valor da coisa é um valor objectivo, não subjectivo,devidamente quantificado e, se possível, concretamente determinado; não um valor estimado, no caso, estimado pelo dono da coisa.
Dizer-se que “ o ofendido estimou em € 8.000,00 o valor do veículo”, como se refere, nesta parte bem, na motivação da matéria de facto, é “prova do facto” e não o “facto”.
Dizer-se na matéria de facto provada, e nesta parte mal, que o veículo tem o “valor estimado de”, continua a ser a “prova” e não o “facto”.
O que cumpria apurar e determinar factualmente era se a coisa tinha efectivamente o valor que o ofendido lhe atribuiu, ou seja, se possuía o dito valor estimado.
Mas a isso o acórdão não responde.
O veículo, apesar de apreendido, nunca foi examinado no processo (e o sinistro não seria impediente duma avaliação); inexiste outra prova para além duma declaração do proprietário justificada insuficientemente e também não suportada por qualquer outro meio.
Tem, pois, razão o recorrente quando argumenta que “na audiência de julgamento, não foi feita prova do valor real e actual da viatura furtada”, que “a viatura supra referida, à data do furto tinha dezanove anos”, que “o veículo automóvel Volkswagen Multivam não tem um valor de mercado de 8.000 euros”, que é “público e notório que, pesquizando na internet, ou junto de concessionários especializados, encontramos vários preços para este modelo de carro, e em lado algum ou em nenhum site ou portal, especialmente, aqueles que são especialistas em venda de automóveis, o mesmo é valorado em mais de € 3.500,00”.
Sendo de assentir na razoabilidade desta argumentação, a que se chega pelas regras de experiência e de vida e de normal acontecer, e a que a resposta ao recurso nada contrapõe e o acórdão não oferece explicação adequada, há que constatar o cometimento de um erro de facto.
Assim, e para sua reparação, determina-se que o ponto 1.3. da matéria de facto provada passe a ter a seguinte redacção:
“1.3 No dia 11 de Fevereiro de 2015, pelas 3h10, o arguido JP apoderou-se do veículo ligeiro de passageiros de matrícula --LX, pertencente a DG, com o valor não concretamente determinado, que se encontrava estacionado no Parque de estacionamento da Alameda, e conduziu-o ate à rotunda de Alvor, junto à praça de táxis, sem que, para o efeito, estivesse habilitado com carta de condução.”
(b)Do erro de subsunção
O recurso em matéria de direito apresenta-se interposto e motivado na estrita decorrência da procedência do recurso em matéria de facto: o recorrente defende que não cometeu os crimes por não ter praticado os factos, ou por determinados factos não se terem provado.
Não suscita, assim, o erro de subsunção enquanto verdadeiro erro na aplicação do direito: não discute a decisão sobre a interpretação e aplicação de nenhum dos dois tipos de crime da condenação – o crime de furto qualificado dos arts. 203º nº1 e 204º nº 1-a) do CP na pena de 2 (dois ) anos e 6 (seis) meses de prisão e o crime de condução sem habilitação legal do art 3º nº 2 do DL 2/98; defende apenas que deve ser absolvido por, em seu entender, não resultarem demonstrados os pontos de facto que impugnou e que relevam no preenchimento de elementos típicos dos crimes imputados.
Nessa impugnação incluiu o ponto de facto “valor da coisa subtraída”, e esta pretensão mereceu acolhimento. A procedência parcial do recurso em matéria de facto envolve a procedência, também parcial, do recurso em matéria de direito, ou seja, a procedência na parte relativa à repercussão jurídica desta alteração na factualidade. Factualidade que, originariamente, realizava a agravante especial prevista na al. a) do art. 204º, nº 1 do CP (“valor elevado”) e que, agora, deixa de se verificar.
No presente caso, para que ocorresse o crime de furto qualificado do artigo 204.º (do nº1, al),do CP, pois outra circunstância não acontecia) seria necessário poder concluir que a coisa alheia subtraída era de “valor elevado”, ou seja, de valor que excedia as 50 unidades de conta avaliadas no momento da prática do facto (na definição do art.202.º, al) a, do CP, o que dá € 5.100,00).
Não tendo ficado demonstrado que o valor da coisa subtraída ultrapassava aquele patamar mínimo de agravação do tipo base, há que proceder à alteração da qualificação jurídica dos factos no acórdão e condenar o arguido como autor do crime do art. 203º, nº 1 do CP (mantendo-se no processo as condições de procedibilidade, pois o ofendido exerceu o direito de queixa, conforme resulta de fls 40/41).
(c)Da pena
Em matéria de pena, o recorrente defendeu a suspensão da execução da prisão, ao abrigo do art. 50º do CP, aceitando (e não discutindo) a escolha da(s) pena(s).
Já relativamente à medida da(s) pena(s), parcelares e única, insurgiu-se também, através da refutação da não aplicação do regime previsto para jovens delinquentes de que defende dever beneficiar. Mas, nesta parte, argumentou na decorrência do recurso da matéria de facto, dos factos sobre a personalidade do arguido. Esta impugnação improcedeu, o que prejudica também o recurso em matéria de direito, na parte correspondente.
No entanto, a alteração da qualificação jurídica implicará sempre uma reapreciação da pena parcelar correspondente ao tipo de crime alterado, a consequente reformulação do cúmulo jurídico, devendo proceder-se, por fim, à ponderação da pretensão do arguido sobre a aplicação de pena suspensa.
Tendo em conta que os recursos são sempre “remédios jurídicos”, e que também em matéria de pena mantêm o arquétipo de remédio jurídico, a Relação deve intervir na pena, alterando-a, nos limites das incorrecções ou distorções detectadas no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação e aplicação de normas e princípios legais e constitucionais que regem em matéria de pena, e tendo sempre como referente a exacta pretensão do recorrente.
Não decide de tudo, nem decide como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância, pois o recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal a quo enquanto componente individual do acto de julgar.
Há, assim, que partir da fundamentação da pena no acórdão, que foi a que segue:
“Enquadradas desta forma as condutas do arguido JP cumpre determinar as penas concretas, dentro das molduras abstractas previstas na lei, o que se fará, tendo em vista as finalidades que presidem à aplicação das penas, da protecção dos bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade, nos termos do art. 40º do CP e, em função das exigências de prevenção de futuros crimes, nos termos dos arts. 71º e 70º do CP e, tendo a culpa por limite inultrapassável, como preceitua o art. 40º/2 do CP. No caso sob apreciação, há a ponderar
- as necessidades de prevenção geral que são prementes quanto aos crimes de furto, atenta a frequência da prática destes tipos de ilícito e o alarme social que lhes está associado, sendo também muito acentuadas tais exigências quanto aos crimes de condução sem habilitação legal atentos os índices de sinistralidade conhecidos,
- a ilicitude – é elevada quanto a ambos os crimes, sendo que o arguido também conduzia sob o efeito do álcool,
- a intensidade do dolo – na forma directa, em ambas as situações,
- a gravidade das consequências – incrementada pelo prejuízo resultante da destruição do veículo para o proprietário,
- a conduta anterior e posterior do arguido – atenuando as exigências de prevenção especial apenas a inexistência de antecedentes criminais, sendo reduzido o relevo da confissão parcial face às circunstâncias em que o arguido foi encontrado na posse do veículo,
Deste modo, face a todo o circunstancialismo descrito, e tendo-se presente que as molduras penais abstractas dos crimes praticados pelo arguido preveêm penas de prisão ou multa, em alternativa, devendo, segundo o critério geral estabelecido no art. 70º do CP, dar-se preferência à segunda, sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição previstas no art. 40º/1 do CP, da protecção dos bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade, no caso concreto, perante a imagem global da actuação do arguido, a pena de multa não realizaria de forma adequada e suficiente as finalidades da punição previstas no art. 40º/1 do CP, da protecção dos bens jurídicos e da reintegração do agente na sociedade, e não representaria nem uma censura suficiente do facto nem “uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada ”.
Por último, importa ainda considerar o Regime Penal Especial dos Jovens Adultos, previsto no DL 401/82 de 2/9, uma vez que à data dos crimes sob apreciação o arguido ainda não tinha sequer perfeito 20 anos, pelo que, segundo o disposto no art. 4º do referido diploma, sendo-lhe aplicável pena de prisão deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73º e 74º do CP - a que actualmente correspondem os arts. 72º e 73º - quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
Sendo certo que se entende decorrer desta disposição legal que tratando-se de jovens adultos as razões de ressocialização devem prevalecer, em detrimento das questões da culpa e da ilicitude - vd. Ac do STJ de 21/9/2006, relatado pelo Sr. Cº Rodrigues da Costa, disponível em www.dgsi.pt - todavia, no caso do arguido JP é convicção deste Tribunal face à factualidade respeitante à sua situação pessoal que ficou apurada, que a atenuação especial da pena em nada contribuirá para a sua reinserção social, conclusão que se retira dos factos assinalados no seu relatório social do jovem apresentar reduzida capacidade de resistência à frustração e não conseguir antecipar o risco das consequências dos seus actos, reagindo por oposição a figuras de autoridade, não aceitando ser contrariado.
Deste modo, não se procederá à atenuação especial da pena, sem prejuízo da ponderação da juventude do arguido nas medidas concretas das penas a aplicar, diminuindo-as.
Assim, face às molduras abstractas das penas e às exigências de prevenção geral e especial assinaladas e ao grau de culpa acentuada do arguido reportada a cada uma das concretas actuações, julgam-se adequadas as penas de 2 anos e 6 meses de prisão pelo crime de furto qualificado, e de um 1 ano de prisão pelo crime de condução ilegal.”
Dentro da margem de actuação da Relação, a que aludimos, continua plausível a decisão sobre a escolha da pena (opção pela prisão, em detrimento da multa) e o afastamento do regime previsto para jovens delinquentes, que se mostram suficientemente justificados no acórdão. Releva também que da alteração da moldura penal prevista para o crime de furto (tipo base) resulta uma baixa do limite máximo (da prisão e da multa) mantendo-se os limites mínimos.
A nova moldura abstracta, de prisão até três anos ou multa justifica, no entanto, um abaixamento na pena parcelar correspondente ao furto, pena que se fixa agora em 15 meses de prisão, substituindo a fixada anteriormente.
A moldura penal do concurso é agora de 15 meses a 2 anos e 3 meses de prisão (art. 77º, nºs 1 e 2 do CP).
Como nota Figueiredo Dias, “a generalidade das legislações manda construir para a punição do concurso uma pena única ou pena do concurso, desde logo justificável à luz da consideração – necessariamente unitária – da pessoa ou da personalidade do agente; e politico-criminalmente aceitável à luz das exigências da culpa e da prevenção (sobretudo de prevenção especial) no processo de determinação e de aplicação de qualquer pena” (Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 2005, p. 280). Segundo o autor, a mera adição mecânica das penas faz aumentar injustamente a sua gravidade proporcional e abre a possibilidade de ser deste modo ultrapassado o limite da culpa. Pois se a culpa não deixa de ser sempre referida ao facto (no caso, aos factos), a verdade é que, ao ser aferida por várias vezes, num mesmo processo, relativamente ao mesmo agente, ela ganha um mesmo efeito multiplicador. (…) Por outro lado, uma execução fraccionada (…) opõe-se inexoravelmente a qualquer tentativa séria de socialização” (loc. cit.).
Razões de culpa, de prevenção e da personalidade da pessoa justificam o cúmulo de penas e um cúmulo material de penas não só não é adoptado na lei vigente, como não o foi nos códigos penais precedentes (Cavaleiro Ferreira, Lições de Direito Penal, II, 2010, p. 156).
Na fixação da pena única o tribunal procede à reavaliação dos factos em conjunto com a personalidade do arguido (art. 77º, nº1 do CP), exigindo-se uma especial fundamentação também desta pena, a fixar “em função das exigências gerais de culpa e de prevenção (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, 2005, p. 291).
“Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização) ” (Figueiredo Dias, loc. cit.).
No caso, o arguido tinha 20 anos de idade à data dos factos e tem 22 anos presentemente, não lhe são conhecidos antecedentes criminais, os factos pessoais são os referidos no acórdão e transcritos em 2., encontra-se preso preventivamente à ordem de outro processo, mas esta circunstância não pode funcionar contra ele, por força do art. 32º, nº 1 da CRP.
Atendendo à sua primariedade e juventude, estando aqui em apreciação apenas a prática de dois crimes sem especial gravidade, não se pode considerar que exista uma tendência criminosa por parte do arguido, sendo de concluir que a pena única de 20 meses de prisão se adequa às finalidades (preventivas) da punição e respeita o limite da sua culpa.
Pretende o recorrente que esta pena seja suspensa na execução.
Disse-se no acórdão, tendo então como referência uma pena concreta mais elevada, que “considerados os factos provados respeitantes à sua situação pessoal donde ressaltam a reduzida capacidade de resistência à frustração e a incapacidade de antecipar o risco das consequências dos seus actos, bem como a reacção por oposição a figuras de autoridade, entende-se que a ameaça da pena não será suficiente para evitar a prática de novos crimes, com o que fica manifestamente comprometido o juízo de prognose favorável que constitui o pressuposto da suspensão, devendo, por isso, o arguido cumprir pena de prisão efectiva, com vista à sua ressocialização.”
Considera-se que não é de subscrever esta asserção.
A personalidade do arguido, que levou já à conclusão de uma ausência de vantagem na aplicação do regime penal para jovens delinquentes e na atenuação especial de pena, revela efectivamente necessidades de ressocialização elevadas. Mas daí não resulta que, relativamente a um jovem sem condenações anteriores, que cometeu um crime de furto de veículo e um crime de condução sem habilitação legal, elas se prossigam apenas dentro da prisão.
Na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, em que nos revemos, “as reacções penais relativamente a jovens que praticam factos criminais devem, tanto quanto possível, aproximar-se das medidas de reeducação, e na máxima medida permitida pela concordância prática com exigências de prevenção, com a utilização da plasticidade dos modelos que o regime penal específico prevê, evitar as penas privativas de liberdade.
(…) A suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos constitui uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, de forte exigência no plano individual, particularmente adequada para, em certas circunstâncias e satisfazendo as exigências de prevenção geral, responder eficazmente a imposições de prevenção especial de socialização, ao permitir responder simultaneamente à satisfação das expectativas da comunidade na validade jurídica das normas violadas, e à socialização e integração do agente no respeito pelos valores do direito, através da advertência da condenação e da injunção que impõe para que o agente conduza a vida de acordo com os valores inscritos nas normas.
A suspensão da execução, acompanhada das medidas e das condições admitidas na lei que forem consideradas adequadas a cada situação, permite, além disso, manter as condições de sociabilidade próprias à condução da vida no respeito pelos valores do direito como factores de inclusão, evitando os riscos de fractura familiar, social, laboral e comportamental como factores de exclusão.
Por fim, a suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que for considerada mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos” (STJ 07.11.2007, Rel. Henriques Gaspar).
Neste mesmo acórdão se considerou que “num caso em que, ao tempo dos factos, o recorrente tinha 17 anos de idade, em que o mesmo revela dificuldades de integração, decorrentes de uma situação problemática em termos familiares [vivia numa barraca pertencente a uma tia-avó; não tinha nem tem contactos familiares com o pai; de nacionalidade são-tomense veio residir para Portugal com a idade de 10 anos; criado com a avó paterna não conheceu a mãe; tem escolaridade baixa, tardiamente concluída por falta de motivação e de apoio familiar; trabalhou esporadicamente e por períodos curtos; frequentou em 2005 um programa de recuperação de toxicodependência], por este quadro, de uma singularidade que necessariamente interpela a sociedade, os seus poderes e instituições, os limites das respostas normativas e institucionais hão-se ser equacionados certamente até ao máximo das possibilidades que permitem, na concordância prática entre as exigências dos pressupostos, o sentido dos institutos e a plasticidade das reacções (…)”.
E ali se conclui que “as penas de prisão aplicadas em medida não superior a 5 anos devem ser, por princípio, suspensas na execução, salvo se o juízo de prognose sobre o comportamento futuro do agente se apresentar claramente desfavorável, e a suspensão for impedida por prementes exigências geral-preventivas, em feição eminentemente utilitarista da prevenção”.
No caso presente, justifica-se também fazer uso do instituto da suspensão da pena, apostando na ressocialização do arguido em liberdade, tanto mais que tal implicará ope legis a cooperação da D.G.R.S. no processo de ressocialização do condenado (art. 53º, nº 3 do CP).
A pena adequada é inquestionavelmente a prisão suspensa com regime de prova, prevista nos arts. 50º, nº 1 e 53º, nº 3 do CP, já que a prestação de trabalho a favor da comunidade, a outra pena de substituição passível de ponderação (art. 58º do CP), atentas as concretas prementes necessidades de ressocialização do condenado, não se revelaria suficiente para, no caso, realizar as finalidades da punição.
E numa interpretação conforme ao art. 32º, nº 1 da CRP, a circunstância de o arguido se encontrar detido preventivamente à ordem de outro processo não pode relevar aqui na ponderação.
4. Face ao exposto, acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:
- Julgar parcialmente procedente o recurso;
- Alterar a matéria de facto como referido em 2. (pág. 16);
- Absolver o arguido do crime do arts. 203º nº 1 e 204º nº 1- a) do CP, antes o condenando pelo crime do art. 203º nº1 do CP na pena de 15 meses de prisão;
- Reformular o cúmulo jurídico efectuado, fixando a pena única em 20 meses de prisão;
- Suspender esta pena com regime de prova;
- Manter o acórdão na parte restante.
Sem custas.
Évora, 07.02.2017
(Ana Maria Barata de Brito)
(Maria Leonor Vasconcelos Esteves)
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[1] Acórdão sumariado pela relatora