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REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
RECURSO
PRESCRIÇÃO DA PENA DE SUBSTITUIÇÃO
Sumário
1. De acordo com a noção acolhida no art. 628.º do N.C.P.Civil aplicável ao processo penal ex vi do art. 4.º do CPP, “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou reclamação”, pelo que apesar de ser inimpugnável o acórdão do T. Constitucional proferido em 10 de Dezembro de 2015, por disposição expressa do art. 77.º, n.º4, do da LTC, o que naturalmente inviabiliza a interposição de recurso para o Plenário, aquele acórdão podia ser ainda objeto de reclamação, pelo que só depois de decorrido o prazo legal para reclamar pôde considerar-se definitivamente proferida a decisão respetiva.
2. Só a decisão definitiva de revogação da suspensão da execução da pena – e não a mera prolação do despacho respetivo em 06.06.2014 – podia impedir que se completasse o prazo de prescrição da pena de suspensão da execução da pena de prisão, pois enquanto não for definitiva, a decisão revogatória mantém-se suspensa nos seus efeitos em consequência do recurso interposto.
3. Uma vez que a decisão revogatória não se tornou definitiva antes de 8.01.2016 e que esta data é posterior àquela em que se completou o novo prazo prescricional de 4 anos (21.12.2015), não pôde operar-se eficazmente a dita revogação, com o consequente cumprimento da pena principal de prisão, pois não pode revogar-se a pena de suspensão da execução da prisão que entretanto se extinguiu por prescrição, o que implica necessariamente o não cumprimento da pena principal de prisão substituída.
Sumariado pelo relator
Texto Integral
I. Relatório
1. Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal coletivo que correm termos na secção criminal da Instância Central da Comarca de Santarém (J3), o arguido M, aí condenado na pena única de três anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de quatro anos, sob condição, veiorecorrer da decisão judicial de 06.06.2014 que revogou a suspensão da execução da pena de prisão aplicada nestes autos, determinando o seu cumprimento.
2. Com data de 14 de julho de 2015 foi proferido acórdão nesta Relação que, julgando improcedente o recurso, manteve o despacho de 06.06.2014 que revogara a suspensão da execução da pena e determinara o cumprimento da pena de prisão aplicada no acórdão condenatório (cfr. fls. 193 e ss do Apenso G).
O arguido interpôs então recurso para o Tribunal Constitucional que, por decisão sumária de 14 de Outubro de 2015, decidiu não conhecer do recurso (cfr. fls. 338 e ss do Apenso G).
O arguido reclamou ainda para a Conferência, mas, por acórdão datado de 10 de Dezembro de 2015, o Tribunal Constitucional indeferiu a reclamação (cfr. fls. 389 e ss do Apenso G).
3. Posteriormente, o arguido requereu no tribunal de comarca a apreciação da prescrição da suspensão da execução da pena que lhe foi aplicada, alegando que, face à extinção da mesma por prescrição, não pode ser executada a pena de prisão principal.
4. Por despacho de 20.06.2016, aquele tribunal julgou improcedente o incidente de apreciação da prescrição da pena aplicada ao arguido e indeferiu o requerido, ordenando a emissão de mandados de detenção a fim de garantir a execução da pena de prisão principal aplicada ao arguido na decisão condenatória.
5. Na sequência de requerimento do arguido em que alega ter sido cumprida, entretanto, a obrigação de que dependia a suspensão da pena de prisão por acordo com a ofendida e ter o tribunal a quo ocorrido em omissão de pronúncia por não ter apreciado aquele requerimento, o tribunal de Comarca indeferiu o ali requerido por despacho de 05.07.2016.
6. O arguido veio, então, interpor recurso dos despachos de 20.06.2016 e de 05.07.2016, os quais foram julgados improcedentes pelo acórdão desta Relação de 10.01.2017 (fls 2180 a 2223 dos presentes autos).
7. Pelo requerimento de fls 2256 a 2259 dos autos, vem agora o arguido arguir a nulidade de falta de fundamentação deste acórdão do TRE de 10.01.2017, invocando o disposto nos arts. 379º nº 1 al. a) e 374º nº2, do CPP, com os seguintes fundamentos:
- O acórdão ora reclamado limita-se a concluir que o trânsito em julgado da decisão de 06.06.2014 que revogou a pena substitutiva de suspensão da execução da pena de prisão ocorreu em 20.12.2015, o que não se compreende uma vez que naquele acórdão não se expõem os motivos de facto nem os motivos de direito que fundamentam tal conclusão;
- Não se diga que tal fundamentação não é necessária ou relevante, pois em face da conclusão a que chegou o acórdão reclamado é de apenas um dia a diferença entre a alegada data de trânsito em julgado (20.12.2015) e a data do término da fase de execução da pena em virtude da sua prescrição (21.12.2015);
- O recorrente não concorda com aquela conclusão, por duas ordens de razões:
- A data do trânsito não pode ter ocorrido em 20.12.2015, que é um domingo, transferindo-se o termo do prazo para o 1º dia útil seguinte nos termos dos artigos 296º e 297º al. e) do C. Civil, ou seja, para 21.12.2015, data do termo da fase de execução da pena de substituição em causa nos autos;
- Nunca o dia 20.12.2015 poderia ser considerado o dia do trânsito em julgado da referida decisão porque o recorrente considera-se notificado do acórdão do Tribunal Constitucional que lhe indeferiu a reclamação no dia 14.12.2015 e dispunha ainda do prazo de 10 dias para arguir a “inexistência jurídica, nulidade ou ineficácia” do mencionado acórdão da conferência e, por fim, interpor recurso para o Plenário o abrigo dos artigos 224º nº3 da CRP e 79º-D da LTC, o que significa que, face à suspensão do prazo nas férias judiciais, só no dia 06.01.2016 poderia considerar-se transitada em julgado a referida decisão;
- O acórdão reclamado não expõe, ainda, os motivos de facto e de direito que o levaram a concluir que, no caso concreto, o prazo de prescrição da pena de substituição suspender-se-ia enquanto se encontrasse suspensa a pena principal, limitando-se a remeter para a al. a) do art. 125º do C. Penal e a referir que seria por força da lei, não especificando qual lei, quais normas.
Conclui que deve o acórdão sub judice ser declarado nulo e, consequentemente, o despacho primeiramente recorrido ser revogado, com todas as consequências legais daí resultantes.
8. Notificado da presente arguição de nulidade, o senhor Procurador-Geral Adjunto nesta Relação entende não se verificar qualquer nulidade do acórdão por se encontrarem claramente explicitadas as razões de facto e de direito em que se fundamenta a decisão ora reclamada.
II. Fundamentação
Decidindo 1. Antecipando conclusões, consideramos que assiste razão ao recorrente na arguição de nulidade do acórdão desta Relação de 10.01.2017 que constitui fls. 2180 a 2223 dos autos, por falta de fundamentação, de facto e de direito, relativamente à data do trânsito em julgado da decisão proferida pelo tribunal de comarca em 06.06.2014, que revogou a pena substitutiva de suspensão da execução da pena de prisão.
Vejamos porquê.
Conforme referido no ponto 2) do relatório do acórdão de 10.01.2017, ora reclamado:
- O arguido interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do TRE de 14.07.2015 que confirmara o referido despacho do tribunal de comarca de 06.06.2014, mas o TC decidiu não conhecer daquele recurso por decisão sumária de 14 de Outubro de 2015 (cfr fls 338 e sgs do apenso G);
O arguido reclamou desta decisão para a Conferência mas, por acórdão datado de 10 de Dezembro de 2015, o Tribunal Constitucional indeferiu a reclamação (cfr. fls. 389 e ss do Apenso G).
Porém, no acórdão desta Relação ora objeto de reclamação nada mais se diz para fundamentar a afirmação de que o trânsito em julgado do despacho de 06.06.2014 ocorreu em 20.12.2015, o que efetivamente se impõe dado que a determinação da data do trânsito em julgado daquele despacho é essencial para a decisão da invocada prescrição de pena, o que só por inadvertência da nossa parte não foi feito naquele mesmo acórdão.
Assim, verifica-se falta de fundamentação parcial do acórdão desta Relação de 10.01.2017, objeto da presente reclamação, por violação do disposto no art. 374º nº2 do C.P.P., o que constitui a nulidade de sentença prevista na al. a) do art. 379º do CPP, a que aplica o nº2 respetivo, aplicáveis ao acórdão ora objeto de reclamação por remissão do art. 425º nº4 do mesmo CPP, assim procedendo a nulidade arguida pelo arguido e recorrente com o apontado fundamento, independentemente do mérito dos demais fundamentos invocados.
2. Verificada a nulidade impõe-se supri-la, passando a fundamentar-se a decisão relativamente à data em que transitou em julgado o despacho que revogou a pena substitutiva de suspensão da execução da pena de prisão, proferido pelo tribunal de judicial de Tomar em 06.06.2014 (cfr fls 1841 a 1854, dos autos).
Vejamos então.
Conforme vimos, menciona-se no ponto 2 do Relatório do acórdão reclamado que por acórdão de 10.12.2015 o Tribunal Constitucional decidiu, em conferência, indeferir a reclamação da decisão sumária do T.C de 14 de Outubro de 2015 que decidira não conhecer do recurso para aquele tribunal do acórdão deste TRE de 14.07.2015, o qual confirmara o despacho do Tribunal Judicial de Tomar de 06.06.2014 que revogou a pena substitutiva de suspensão da execução da pena de prisão no caso presente.
De acordo com a noção acolhida no art. 628º do N.C.P.Civil aplicável ao processo penal ex vi do art. 4º do CPP, “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou reclamação”, pelo que apesar do acórdão do T. Constitucional proferido em conferência a 10.12.2015 ser inimpugnável por disposição expressa do art. 77º nº4 do da LTC, o que naturalmente inviabiliza a interposição de recurso para o Plenário (cfr Carlos Lopes do Rego, Os recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, 2010, p. 226), aquele acórdão podia ser ainda objeto de reclamação, pelo que só depois de decorrido o prazo legal para reclamar pôde considerar-se definitivamente proferida a decisão respetiva - cfr artigos 613º a 617ºex vi do artigo 666º, todos do NCPC, aplicáveis por via do disposto no art. 69º da LTC, segundo o qual “À tramitação dos recursos para o Tribunal Constitucional são subsidiariamente aplicáveis as normas do Código de Processo Civil, em especial as respeitantes ao recurso de apelação.”.
Ora, a notificação do acórdão proferido em conferência pelo T. Constitucional em 10.12.2015 foi enviada por via postal registada em 11.12.2015, pelo que considera-se a mesma realizada no 3º dia útil posterior ao envio (art. 113º nº2 CPP), ou seja, em 16.12.2015. Assim, uma vez que o prazo de 10 dias para reclamar daquela decisão se suspendeu durante as férias judiciais, i.e. de 22.01.2015 a 3.01.2016, este prazo apenas se concluiu em 8.01.2016.
3. Por outro lado, pelas razões melhor desenvolvidas no acórdão do TRE de 10.07.2007, destes mesmos Desembargadores, bem como no despacho ora recorrido e outros acórdãos das relações aí citados, é aplicável à pena substitutiva de Suspensão da execução da prisão o prazo prescricional de 4 anos previsto no art. 122º nº 1 d) do C. Penal, o qual se conta desde 21.12.2011, por ser nesta data que se completaram 5 anos (quatro do período inicialmente fixado acrescido de um ano de prorrogação) de suspensão da pena sobre a data do trânsito em julgado da sentença condenatória (21.12.2006), descontado o período de execução da pena, por força das disposições conjugadas do nº2 do art. 122º e al. a) do nº1 do art. 126º (Interrupção da prescrição com a execução da pena).
Com efeito, embora o prazo prescricional de 4 anos aplicável às penas de substituição se conte da data do trânsito em julgado da sentença condenatória, nos termos do art. 122º nº2 do C. Penal, este prazo interrompe-se com a execução da pena de substituição nos termos do art. 126º nº1 a) do CPP (que pode consistir no mero decurso do tempo até ao termo do período da suspensão), período de suspensão da pena de prisão que in casu durou cinco anos, como vimos, decorrido o qual começou a contar-se por inteiro novo prazo de 4 anos cujo início teve lugar em 21.12.2011, como vimos, pelo que aquele prazo de 4 anos, mesmo contando-se por inteiro, apenas se completou em 21.12.2015.
Deste modo, quando em 21.12.2015 se completou o prazo de 4 anos previsto no art. 122º nº 1 al. d) do C. Penal, aplicável à pena substitutiva de suspensão da execução de pena aqui em causa, pelas razões referidas e melhor desenvolvidas no acórdão de 10.01.2017, não transitara ainda em julgado o despacho do Tribunal Judicial de Tomar de 6.06.2014 que revogara a suspensão da execução da pena, uma vez que o acórdão de 10.01.2015 proferido em conferência pelo Tribunal Constitucional não se tornou definitivo antes de 8.01.2016, como vimos.
4. Ora, contrariamente ao considerado implicitamente no despacho recorrido de 20.06.2016, só a decisão definitiva de revogação da suspensão da pena – e não a mera prolação do despacho respetivo em 06.06.2014 – podia impedir que se completasse o prazo de prescrição da pena de Suspensão da pena, pois enquanto não for definitiva, a decisão revogatória mantém-se suspensa nos seus efeitos em consequência do recurso interposto.
Assim, uma vez que a decisão revogatória não se tornou definitiva antes de 8.01.2016 e que esta data é posterior àquela em que se completou o novo prazo prescricional de 4 anos (21.12.2015), não pôde operar-se eficazmente a dita revogação, com o consequente cumprimento da pena principal de prisão, pois não pode revogar-se a pena de Suspensão da execução da prisão que entretanto se extinguiu por prescrição, o que implica necessariamente o não cumprimento da pena principal de prisão substituída.
5. Assim sendo, procede o recurso interposto pelo arguido e recorrente, M, do despacho proferido em 20.06.2016 pelo titular da secção criminal da Instância Central da Comarca de Santarém (J3), que julgou improcedente o incidente de apreciação da prescrição da pena aplicada ao arguido aí suscitado e ordenou a emissão dos competentes mandados de detenção.
Deste modo, decide-se revogar aquela mesma decisão com os fundamentos ora expostos, julgando-se prescrita e, consequentemente, extinta a pena em que o arguido foi condenado por acórdão de 20 de Setembro de 2004, transitado em julgado em 21 de Dezembro de 2006, pela prática, em coautoria, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 26.°, 203.° nº. 1, 204.° n. 2 al. c) e 202.° al. b) do Código Penal, na pena de dois anos e sete meses de prisão e pela prática de um crime de detenção ilícita de arma p. e p. pelos artigos 6.° da lei n. 22/97, de 27 de Junho e 275.° n.º 3 do Código Penal (redação da Lei n.º 65/98), na pena de doze meses de prisão. Em cúmulo jurídico foi condenado na pena de três anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de quatro anos, sob condição de proceder ao pagamento/reparação à demandante cível do montante indemnizatório global (no valor de 50.000,00€) e respetivos juros, a comprovar nos autos, no prazo de quatro anos, após trânsito, mas por forma a mostrar-se efetuado o pagamento da proporção de um quarto de tal montante no final de cada um dos primeiros três anos (cfr. fls. 756 e ss).
6. Suprida a arguida nulidade de sentença por falta de fundamentação, o presente acórdão considera-se complemento e parte integrante do acórdão desta Relação de 10.01.2017, objeto da presente reclamação, nos termos do art. 617º nº2 do novo C.P. Civil ex vi do art. 4º do CPP.
III. DISPOSITIVO
Nesta conformidade, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
- Em julgar procedente a nulidade parcial do acórdão deste TRE de 10.01.2017 por falta de fundamentação, invocada pelo arguido, e, em consequência, declarar nulo tudo o aí decidido relativamente ao recurso interposto do despacho proferido em 20.06.2016 pelo titular da secção criminal da Instância Central da Comarca de Santarém (J3), que julgou improcedente o incidente de apreciação da prescrição da pena aplicada ao arguido;
- Em suprir a referida nulidade de sentença, revogando a decisão do tribunal de comarca de 20.06.2016 com os fundamentos expostos e decidir, em substituição, julgar extinta por prescrição a pena única em que o arguido foi condenado por acórdão de 20 de Setembro de 2004, transitado em julgado em 21 de Dezembro de 2006, em cúmulo jurídico das penas parcelares de dois anos e sete meses de prisão e doze meses de prisão, aplicadas, respetivamente, pela prática, em coautoria, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos artigos 26.°, 203.° nº. 1, 204.° n. 2 al. c) e 202.° al. b) do Código Penal e de um crime de detenção ilícita de arma p. e p. pelos artigos 6.° da lei n. 22/97, de 27 de Junho e 275.° n.º 3 do Código Penal (redação da Lei n.º 65/98). Ou seja, a pena única de três anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de quatro anos, sob condição de proceder ao pagamento/reparação à demandante cível do montante indemnizatório global (no valor de 50.000,00€) e respetivos juros, a comprovar nos autos, no prazo de quatro anos, após trânsito, mas por forma a mostrar-se efetuado o pagamento da proporção de um quarto de tal montante no final de cada um dos primeiros três anos (cfr. fls. 756 e ss).
Sem custas.
Notifique, sendo igualmente para que, no prazo de 10 dias, o recorrente possa desistir do recurso interposto para o T. Constitucional, alargar ou restringir o respetivo âmbito, nos termos do nº3 do citado art. 617º do N.C.P.Civil.