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CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
NULIDADE
DIREITO À REMUNERAÇÃO
Sumário
1 - O contrato de mediação imobiliária é um acordo formal nos termos do qual uma parte se obriga a diligenciar pela aproximação de duas pessoas com vista à celebração de um negócio concreto relativamente a um imóvel. 2 – No âmbito desse contrato a contraprestação a pagar pelo comitente à entidade mediadora depende da conclusão e perfeição do negócio a celebrar entre aquele e o terceiro angariado, como consequência adequada da intervenção desenvolvida pelo intermediário que, portanto, funciona como condição legal ou imprópria do pagamento. 3 - O mediador pode reclamar a remuneração, no momento em que, entre o comitente e a entidade angariada, for concluído o negócio visado pelo exercício da mediação no concreto contrato firmado, mas tal direito só existe desde que a atividade mediadora seja causal do resultado produzido, de modo a integrar-se de forma, idoneamente, determinada, na cadeia dos factos que deram origem ao negócio em causa. 4 – Tendo a autora, mediadora, provado que da sua atividade profissional resultou a apresentação do comprador com o qual, na sequência de negociações, veio a ser celebrado o contrato de compra e venda, tal evidencia atividade causalmente adequada da sua parte, para a celebração do mesmo, não obstante os termos do contrato terem resultado posteriormente de negociações diretas entre os interessados que aquela pôs em contacto. 5 - A atuação da autora, enquanto mediadora foi determinante para a concretização da venda realizada e que foram as suas diligências que serviram para aproximar os interessados na realização do negócio, proporcionando a sua conclusão, pelo que não obstante o contrato ser nulo por falta de forma, tem direito a uma retribuição compensatória, em alternativa da restituição de tudo o que prestou, atenta a impossibilidade desta restituição, devendo na fixação de tal retribuição partir-se do “preço” que em termos informais terá sido estabelecido pelas partes ou, fazer apelo aos usos generalizados e estabelecidos em matéria de mediação imobiliária, caso não se possa ter certezas quanto ao que foi informalmente estabelecido.
Texto Integral
ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
... - Mediação Imobiliária, Unipessoal, Lda., instaurou ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra G..., a qual corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro (Faro – Instância Central – 1ª Secção Cível – J3), peticionando a condenação do réu no pagamento da quantia de € 307.500,00, acrescida de IVA à taxa legal, a título de comissão, bem como juros desde a citação até integral pagamento ou, subsidiariamente, caso seja declarada a nulidade do contrato de mediação imobiliária por falta de forma legal, a condenação do réu no pagamento de igual quantia, correspondente ao serviço prestado a restituir.
Como fundamento do peticionado, alega, em síntese, que celebrou com o réu contrato de mediação imobiliária, verbal, tendo por objeto o prédio urbano que identifica, diligenciou pela angariação do comprador e não foi paga a comissão acordada. Caso se entenda que o contrato é nulo, por não observar a forma legal, invoca que a restituição dos serviços prestados importa o pagamento do respetivo valor, correspondente à quantia peticionada.
Citado, o réu vem contestar invocando a verificação da exceção dilatória de ilegitimidade passiva, a nulidade do contrato por falta de forma legal, a falta de atribuições legais para a autora intervir no negócio realizado, a caducidade do contrato e do direito da autora, a caducidade da licença de mediação imobiliária, impugnando na generalidade os factos alegados, concluindo pela improcedência da ação e pedindo a condenação da autora como litigante de má-fé em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00.
Na resposta, a autora defendeu a improcedência das exceções invocadas.
No saneador julgou-se improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade, prejudicada a apreciação das exceções perentórias de caducidade do contrato e do direito da autora e a caducidade da licença de mediação imobiliária, após o que foi proferida decisão que julgou parcialmente improcedente a ação, absolvendo o réu do pedido formulado com fundamento na celebração de contrato de mediação válido. Os autos prosseguiram seus termos com vista a apurar se autora e réu celebraram contrato de mediação nulo e se aquela tem direito a ser paga pelos serviços prestados, tendo sido realizada audiência final e após proferida sentença cujo dispositivo reza: “Pelo exposto, ao abrigo dos citados preceitos legais, na presente acção declarativa intentada por ... - Mediação Imobiliária, Unipessoal, Lda., contra G... julgo procedente, por provado, o pedido formulado pela autora de condenação do réu no pagamento da quantia de € 307.500,00, correspondente à retribuição da prestação efetuada, acrescida de IVA, à taxa legal, no total de € 378.225,00, e de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar desde a data do trânsito em julgado da sentença até integral pagamento.
Custas pelo réu, (artº 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).[1]
Custas dos incidentes de litigância de má-fé a cargo do réu, com taxa de justiça que se fixa em 2 (duas) U.C´s para cada incidente, no total de 4 (quatro) U.C´s (artº7º, nº4 do Regulamento das Custas Processuais).”
*
Irresignado, veio o réu interpor recurso de apelação, terminando por formular as seguintes conclusões que se transcrevem:
“Previamente:
a) Nas declarações de parte do Réu criou-se uma confusão linguística com relevo e influência na decisão final.
b) Quando o Réu utilizou o termo “dealings” referia-se em termos genéricos a relações informais, contactos, negociações, dado que a raiz do termo, o verbo “deal” reporta-se à ação de “tratar de” ou “tratar com” (i will deal with something ou I will deal with somenone) mas não se referia, seguramente, à celebração de nenhum acordo, de algum contrato formal ou mesmo da comissão de alguma tarefa ou mandato.
c) Estes dois últimos termos, acordo ou contrato formal, em língua inglesa, são sempre designados por written agreement ou contract.
d) Este mal-entendido linguístico, com origem na tradução e confusão de conceitos jurídicos, levou ao desfecho do processo com a decisão de que ora se recorre, quando, devidamente interpretadas, as declarações de parte têm um sentido diferente daquele que o tribunal lhes deu.
e) A nosso ver, este facto constitui nulidade parcial do julgamento, dado que equivale à impercetibilidade do depoimento que, em última análise, leva a uma decisão fundada, não em erro de julgamento, mas antes e a montante, na decisão viciada pela absoluta falta de apreensão do verdadeiro teor do depoimento contido nas declarações de parte do Réu.
f) Este fundamento é, aqui a agora, invocável nos termos do disposto no artigo 199.º do CPC (uma vez que só com a sentença foi possível aferir o significado dado pelo tribunal a quo às referidas expressões, para efeitos decisórios e de apreciação da matéria de facto), o que ora se faz, requerendo-se seja determinada pela Veneranda Relação a repetição parcial do julgamento com a repetição da prestação de declarações de parte do Réu, na presença de intérprete idóneo com conhecimentos de direito, assim como de inglês jurídico.
g) O que ora expressamente se invoca e requer.
Da Reapreciação da Matéria de facto
1) O Tribunal a quo deu como provados - sob os pontos 6, 10, 11 e 21 dos factos provados constantes da douta sentença recorrida - a seguinte matéria de facto: 6 - Há cerca de dois anos, o réu encarregou a autora de diligenciar no sentido de conseguir um comprador para o referido prédio; 10 - O acordo celebrado entre autora e réu foi meramente verbal (acordo); 11 - Na mesma altura o réu celebrou acordos semelhantes com outras empresas de mediação imobiliária, tendo o prédio sido anunciado para venda por diversas outras empresas do ramo. 21 - O réu, já depois de estar em contacto direto com D..., informou A..., vendedor da autora, de que não pagaria qualquer comissão e pediu que o imóvel fosse retirado do seu portefólio, conforme documento de fls.41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
2) O n.º 6 dos factos provados não se encontra provado da forma como o foi, ou seja, que não está simplesmente provado que “Há cerca de dois anos, o réu encarregou a autora de diligenciar no sentido de conseguir um comprador para o referido prédio”.
3) Na verdade, o que ficou provado foi que há cerca de dois anos, o réu aceitou que a autora mostrasse a propriedade, no seguimento da autora espontaneamente o ter procurado nesse sentido, por ser prestigioso para aquela ter o tipo de propriedades como a do Réu no seu portefólio.
4) O facto n.º 10 dos factos provados, em que se refere que “O acordo celebrado entre a autora e o réu foi meramente verbal (acordo)”, para além de não se encontrar provado, padece logo à partida de conceptualizações jurídicas que nada têm que ver ou podem ser confundidos com a matéria de facto.
5)
Tal facto deve ser considerado não provado.
6) Relativamente ao facto n.º 11 dos factos provados “Na mesma altura o réu celebrou acordos semelhantes com outras empresas de mediação imobiliária, tendo o prédio sido anunciado para venda por diversas outras empresas do ramo”, os mesmos argumentos avançados para o facto n.º 10 são aqui aplicáveis, nomeadamente a circunstância do tribunal, ao referir que o réu “celebrou acordos semelhantes com outras empresas de mediação imobiliária”, fazer um exercício de qualificação jurídica e não de apreciação de facto, ademais quando também não foi feita prova nos autos da existência de quaisquer acordos (muito menos semelhantes ao celebrado entre a Autora e o Réu uma vez que, como se demonstrou supra, o mesmo inexiste) celebrados entre o Réu e outras empresas de mediação imobiliária.
7) Também aqui andou mal o tribunal a quo, errando igualmente neste ponto, que deverá ser corrigido por essa Veneranda Relação alterando a redação do facto dado como provado no sentido de referir que: O Réu foi contactado por outras mediadoras para publicitação do imóvel, sem nunca ter sido celebrado qualquer acordo ou sequer sido estabelecido um “acordo de cavalheiros” sobre o valor da comissão.
8) Relativamente ao facto n.º 21.º dos factos provados refere-se que “O réu, já depois de estar em contacto direto com D..., informou A..., vendedor da autora, de que não pagaria qualquer comissão e pediu que o imóvel fosse retirado do seu portefólio, conforme documento de fls.41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido” (sublinhado nosso).
9) Mais uma vez, mal andou o tribunal a quo, pelo que o facto n.º 21 dos factos provados deverá ser corrigido por essa Veneranda Relação alterando a redação do facto dado como provado no sentido de referir tão só que o réu informou A..., vendedor da autora, de que não pagaria qualquer comissão e pediu que o imóvel fosse retirado do seu portefólio, conforme documento de fls.41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
Da apelação
A apelação versa sobre os seguintes temas apreciados pelo tribunal a quo: i. A existência de qualquer acordo entre a Autora e o Réu; ii. A qualificação jurídica de tal acordo; iii. A retribuição da Autora;
10) Relativamente à existência de acordo entre a Autora e o réu, resulta da reapreciação da prova que não existiu qualquer acordo entre a Autora e o Réu, quando muito, o que terá ocorrido, foi um relacionamento entre estes, em que foi a Autora quem procurou e contactou o Réu para promover o imóvel deste, pois era prestigioso para ela ter aquele tipo de propriedades no seu portefólio.
11) Na verdade, todos os elementos de prova, exceto evidentemente o da parte interessada – a testemunha A... -, apontam para a inexistência de qualquer acordo mesmo que meramente verbal e, mormente, para uma aceitação tácita de um contrato de mediação imobiliária;
12) No máximo, o que se pode afirmar a este propósito é que a autora, por sua conta e risco, exerceu espontaneamente a mediação, nada mais;
13) Assim, não podia o Tribunal a quo, no enquadramento fáctico-legal, considerar ter havido um acordo entre Autora e Réu, e muito menos um acordo de mediação imobiliária;
14) No que à qualificação do contrato se refere ao contrário do que o tribunal refere, os atos que ficaram provados não são concludentes no sentido da vontade das partes celebrarem o contrato de mediação imobiliária, pois, como referido na matéria de facto, não ficou provado nenhum acordo quanto ao pagamento de comissão e seu valor;
15) Não se tendo provado a existência de convenção acerca da remuneração do pretenso mediador não se verificam os pressupostos para, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 217.º do CC, se concluir pela existência legal de uma declaração tácita de aceitação de uma proposta contratual de mediação imobiliária;
16) Pelo que jamais aqui se pode falar da existência de um contrato e da sua nulidade mas, bem ao contrário, da total inexistência de um contrato;
17) A qualificação jurídica que se pode dar à factualidade apurada é a da ocorrência de um caso de mediação espontânea por parte da autora que levou, não a um contrato de compra e venda de imobiliário, mas antes a uma cessão de participações sociais numa sociedade detentora de um imóvel, o que afasta clara e definitivamente os factos deste caso do regime de mediação imobiliária;
18) Finalmente no que se refere à retribuição da Autora importa reter que, à data dos factos, já há disciplina jurídica própria para o contrato de mediação imobiliária, concretamente, a Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, cujo n.º 2 do Artigo 16.º estipula expressa e taxativamente quais os elementos obrigatórios que devem constar do contrato, prevendo-se na alínea c) “As condições de remuneração da empresa, em termos fixos ou percentuais, bem como a forma de pagamento, com indicação da taxa de IVA aplicável”.
19) Ora, não tendo sido estipuladas as condições de remuneração não pode haver contrato de mediação imobiliária.
20) E, não havendo contrato de mediação imobiliária, ainda que se considere que a mediação possa ter existido, sempre se terá que considerar que esta foi exercida a título espontâneo pela autora e, consequentemente, não há direito à retribuição.
21) E, não havendo direito à retribuição, não se pode fazer apelo às regras do mandato para determinar o quantum que advém de um direito que, no caso, não existe por violação da própria disciplina jurídica do contrato de mediação.
Da violação de Lei:
Proferindo sentença contendo a decisão de que ora se apela e que se impugna violou o tribunal A quo disposto na alínea c) do n.º 2 do art. 16.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, assim como o n.º 1 do art. 217.º e o art. 232.º, ambos do Código Civil.”
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Foram apresentadas alegações por parte da apelada, pugnando pela manutenção do julgado.
Apreciando e decidindo
Como se sabe, o objeto do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso. Assim, como emerge das conclusões, as questões a apreciar são as seguintes: 1ª - Da nulidade do Julgamento; 2ª - Do erro de julgamento no que concerne à matéria de facto; 3ª - Da (in)existência de acordo entre autora e ré, tendo em vista aquela diligenciar no sentido de conseguir um comprador para o prédio do réu; 4ª - Do direito da autora à retribuição.
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Na sentença recorrida foi considerado como relevante e provado o seguinte quadro factual: 1 - A autora é uma sociedade comercial por quotas, cujo objeto social inclui a mediação imobiliária. 2 - A mesma encontrava-se licenciada para o exercício da atividade de mediação imobiliária até 06.08.2015. 3 - O réu era o beneficiário da totalidade das ações da sociedade “A… Holdings LLC”, pessoa coletiva n.º …, com sede em …, Delaware, Estados Unidos da América. 4 - A referida sociedade tinha inscrito a seu favor, pela ap. 42 de 2002/06/07, o direito de propriedade do prédio urbano, denominado lote 38, Loteamento …, situado em …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, freguesia de Almancil, sob o n.º …/20020607, inscrito na matriz predial sob o artº … . 5 - No referido lote encontra-se edificada uma casa de habitação, a qual foi construída pelo réu. 6 - Há cerca de dois anos, o réu encarregou a autora de diligenciar no sentido de conseguir um comprador para o referido prédio. 7 - Indicando-lhe o preço de venda de € 6.500.000,00. 8 - O negócio que o réu tencionava vir a celebrar era a venda do prédio. 9 - A comissão normalmente praticada pela autora varia entre 5 e 6% do valor de venda dos imóveis, a que acresce o IVA à taxa legal. 10 - O acordo celebrado entre autora e réu foi meramente verbal (acordo). 11 - Na mesma altura o réu celebrou acordos semelhantes com outras empresas de mediação imobiliária, tendo o prédio sido anunciado para venda por diversas outras empresas do ramo. 12 - Ao longo de cerca de dois anos, a autora: a) abriu um processo interno para a venda do imóvel, o qual ficou com a referência QDL…; b) promoveu a divulgação do imóvel, quer no seu estabelecimento, quer noutros locais; c) apresentou a diversos clientes e contactos o negócio de transmissão do imóvel, procurando interessá-los na aquisição; d) prestou as informações pedidas por esses interessados; e) acompanhou os interessados em variadas visitas ao imóvel, fazendo ali deslocar os seus vendedores. 13 - No seguimento da prática desses atos, a autora encontrou um interessado na compra do imóvel D.... 14 - O qual, após variados contactos, obtenção de informações e visitas ao imóvel acompanhado pelos vendedores da autora, confirmou-lhe que pretendia adquirir o imóvel. 15 - No dia 07.04.2015, D... apresentou a seguinte proposta à autora, que esta transmitiu ao réu: a) o pagamento da quantia de €5.500.000,00 em dinheiro; b) a permuta da moradia 99, no Monte …, Quinta …, que avaliou em 1.300.000,00; c) a elaboração por parte do funcionário da autora A... de uma lista de defeitos do imóvel, a fim de serem corrigidos. 16 - No dia 13.04.2015, informado pela autora de que o réu estava renitente em aceitar a proposta por causa da permuta, D... reformulou a mesma passando a oferecer € 6.000.000,00 em dinheiro. 17 - Depois desta fase inicial de negociações, o réu manteve contactos diretos com D..., tendo ambos acordado os termos finais do negócio, incluindo o preço no valor de € 6.150.000,00. 18 - Por documento escrito datado de 23.06.2015 intitulado de “contrato de compra e venda de ações” o réu declarou, entre o mais, vender a D... as ações de que era beneficiário no capital da sociedade identificada em 3, conforme documento de fls. 331/335, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 19 - O preço de venda das acções foi de €6.150.000,00, que D... declarou pagar e o réu receber, passando aquele a ser beneficiário da totalidade das ações da sociedade, conforme documento de fls.331/335, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 20 - Na mesma data foi cancelada uma hipoteca a favor do Banco …, S.A., que incidia sobre o imóvel, para garantia de dívidas pessoais do réu. 21 - O réu, já depois de estar em contacto direto com D..., informou A..., vendedor da autora, de que não pagaria qualquer comissão e pediu que o imóvel fosse retirado do seu portefólio, conforme documento de fls.41, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 22 - A autora não recebeu até hoje qualquer quantia do réu.
Com interesse, foram considerados não provados os seguintes factos:
a) o réu aceitou pagar à autora, a título de remuneração, uma comissão de 5%, acrescidos do IVA, sobre o preço pelo qual o negócio viesse a ser concretizado;
b) no decorrer das negociações o réu nunca teve conhecimento de quem era o potencial interessado no imóvel;
c) o réu, em meados de Abril, recebeu chamada telefónica de C… a informá-lo de um interessado na aquisição do imóvel e que era um empresário inglês, de Birmingham, que se dedicava ao ramo da impressão;
d) perante essa informação o réu pesquisou na internet empresas de impressão em Birmingham, encontrou o endereço eletrónico que identificou de acordo com as indicações telefónicas e entrou em contacto com o interessado;
e) a partir desse momento o réu e D... indicaram os advogados que os representavam em Portugal para conclusão do negócio;
f) a atividade desenvolvida pela autora não teve influência na conclusão do negócio;
g) a não assinatura do acordo com o réu deveu-se a conduta da autora.
Conhecendo da 1ª questão
Invoca o recorrente a existência de nulidade (parcial) do julgamento, por em seu entender, quando da prestação das suas declarações, ter havido erro na tradução do que foi por si afirmado, designadamente o termo “dealings” por si utilizado, tinha como objetivo a descrição duma realidade inerente a “relações informais, contactos, negociações”, mas não “à celebração de nenhum acordo, de algum contrato formal ou mesmo de comissão de alguma tarefa ou mandato”.
Embora a questão esteja a ser levantada, quanto a nós, tardiamente, pois, devia tê-lo sido em sede de audiência de julgamento,[2] caso se verificasse que a tradução estava a ser mal efetuada, não respeitando com fidedignidade o que era dito pelo depoente, diremos que não se vislumbra que o tribunal a quo tenha interpretado mal o que o réu disse no seu depoimento, muito embora possa existir em termos de tradução uso de termos menos adequados, o que não temos por certo, uma vez que da consulta de vários dicionários, resulta que dealings [substantivo plural de dealing substantivo] pode ser traduzido como, relações comerciais, transações comerciais, negócios, tratos, acordos (v.https://www.infopedia.pt/dicionarios/ingles-portugues/dealings; http://dicionario.reverso.net/ingles-portugues/dealings/forced; http://pt.bab.la/dicionario/ingles-portugues/dealings; http://www.linguee.pt/portugues-ingles /search?source=auto&query=dealings).
Em nosso entender não existe qualquer irregularidade de tradução com influência no decidido, uma vez que do teor da mesma, não resulta que se tivesse concluído que o réu teria celebrado com a autora um acordo ou contrato formal (written agreement ou contract), nem esse foi o entendimento do Julgador resultante do depoimento prestado. Pois, o Julgador a quo, na motivação não deixa de afirmar: “No que concerne às declarações de parte do réu, na sua globalidade, analisadas em confronto com o documentado e declarado pela testemunha A..., corroboram a posição que assumiu no articulado, aceitou que a autora diligenciasse por encontrar um comprador para o imóvel mas entende que não tem qualquer acordo com a mesma, embora com a comunicação de fls.41 entenda que acabava com qualquer tipo de negócios que tivesse com a autora (o que é um pouco contraditório, ou tinha ou não tinha acordo com ela).”
O Julgador a quo é o próprio a retirar das declarações do réu que no entender deste não existia qualquer acordo com a autora, donde se pode e deve concluir que a existir irregularidade de tradução ela não teve influência, na apreciação dos factos e consequentemente no exame a decisão da causa.
Improcede, nesta vertente, o recurso.
Conhecendo da 2ª questão
O recorrente vem pôr em causa o julgamento referente à matéria de facto, respeitante aos factos provados sob os n.ºs 6, 10, 11, e 21, solicitando em face do depoimento da testemunha A... e do depoimento por si prestado, que seja modificada a redação constante nos n.ºs 6, 11 e 21 e que o vertido no n.º 10 seja dado como não provado.
Quanto aos factos n.ºs 6 e 10 diremos que os mesmos reproduzem, respetivamente, o que consta nos artº 6º e 13º da petição inicial, cujo conteúdo, não foi posto em causa pelo réu na sua contestação, ou melhor, foi expressamente reconhecido como sendo verdadeiro, conforme emerge do artº 64º da contestação (Corresponde à verdade o vertido em alguns artigos da petição inicial, nomeadamente: a) Artigo 3., artigo 6., artigo 7., artigo 8, artigo 13, artigo 20., artigo 21., artigo 22., artigo 23., artigo 24., artigo 25. e artigo 26. , na sua plenitude).
Nos termos do artº 574º do CPC, o réu, ora recorrente, tomou posição definida perante os aludidos factos alegados pela autora, aceitando-os como verdadeiros, de modo que os mesmos se devem ter por confessados em face do que resulta do disposto no artº 352º do CC.
E foi com base nessa confissão (não com base em qualquer outro meio de prova) que os mesmos foram tomados em consideração pelo Julgador a quo,[3] não estando sequer abrangidos pelo princípio da livre apreciação da prova, o qual não abrange os factos que estejam plenamente provados por acordo ou confissão das partes, conforme resulta à evidência do disposto no artº 607º, n.ºs 4 e 5, do CPC.
Mas mesmo que assim não fosse não resulta das declarações do réu, prestadas em audiência de julgamento, que a realidade dos factos não seja a que foi reconhecida no acervo fatual dado por provado, uma vez que embora afirme que “não tinha nenhum acordo formal com nenhuma agência” de tal deduz-se que celebrou um de outro tipo, ou seja, neste caso, um acordo verbal, pois, se assim não fosse, pura e simplesmente teria afirmado que em relação às partes inexistia qualquer tipo de negócio, quer formal, quer verbal.
Aliás, conforme bem salienta a recorrida, o próprio réu afirma na sua contestação (artº 50º) que é “De notar ainda que, o contrato foi meramente verbal, como a Autora bem reconhece (...)”, sendo esta formulação usada na invocada exceção da nulidade do contrato de mediação, por não ter sido reduzido a escrito, donde, como é evidente, tal alegação pressupõe, ab initio, ter havido um acordo celebrado entre as partes, pois de outra forma não se podia defender a nulidade do contrato, por falta de forma, sem pôr em causa o princípio da boa fé, pelo qual se deve reger a intervenção processual dos litigantes.
No que respeita especificamente ao facto provado n.º 10 invoca o recorrente também a que o mesmo não deve constar do acervo factual por padecer “à partida de concetualizações jurídicas que nada têm a ver ou podem ser confundidas com matéria de facto”. Não podemos partilhar de tal opinião. Pois, a referência “acordo” não pode ser entendida como sendo uma concetualização jurídica, uma vez que tal termo é usado comumente e tem um significado corrente e vulgar e, no caso, o que se pretende concretizar factualmente é que não foi reduzido a escrito o acordo, a combinação, a que as partes chegaram e que, aliás, foi expressamente confessado pelo réu, donde não há impedimento a que tal realidade seja integrada no acervo factual.[4]
Relativamente ao facto n.º 11 diremos que se trata de um facto instrumental com vista a afirmar a veracidade do facto anterior, o que perante a prova deste, até por expresso reconhecimento do réu, não assume relevância para a decisão da causa, mas, no entanto, não pode deixar de se considerar provado na formulação que lhe foi dada.
Efetivamente do conteúdo dos documentos juntos a fls. 50 a 53 e 57 a 70 (contendo publicitação, com fotos, do imóvel, para venda e indicação do respetivo preço, efetuado por duas outras imobiliárias, que não a autora) dos autos conjugado com o depoimento da testemunha A... que referiu que haviam mais mediadoras, que identificou a tratar do negócio nos mesmos moldes da autora, não podemos deixar de reconhecer ter sido feita a prova de tal facto, sendo certo, que o próprio réu, na sua contestação (artº 71º) admite que a publicitação do imóvel por outras empresas ocorreu, embora afirme a inexistência, com elas, de “qualquer contrato válido”.
Também, relativamente ao facto n.º 21 a sua redação não deve sofrer a alteração preconizada pelo recorrente, embora tal alteração não se mostre relevante para a solução a dar à causa em face dos outros factos já dados como assentes. Tal decorre do conteúdo do email documentado a fls. 41 dos autos, datado de 11/04/2015, conjugado com o teor do circunstancialismo factual dado como provado em 15, do qual, em face das regras da experiência é permitido concluir a existência de contacto direto entre o réu e D... nos termos e circunstâncias referenciadas em 21. Pois, como salienta o Julgador a quo “do depoimento da referida testemunha A..., em confronto com a mencionada troca de comunicações com o réu e D..., evidencia-se, nomeadamente pela proximidade das datas, que o réu terá descoberto a identidade do interessado (o que era fácil, tendo presente que se identifica a propriedade que este pretendia fosse incluída no negócio – moradia 99 do Monte da …)”
Nestes termos, entendemos ser de manter imutável o acervo factual provado e não provado.
Improcede, também, neste segmento a apelação.
Conhecendo da 3ª questão
A recorrente põe em causa a existência (bem como a caraterização) de qualquer contrato com o réu, no âmbito da mediação imobiliária.
Nos termos do artº 2º, nº 1, da Lei 15/2013 de 08/02 “a atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.”
O contrato de mediação imobiliária é assim o contrato nos termos do qual uma parte se obriga a diligenciar pela aproximação de duas pessoas com vista à celebração de um dos indicados negócios relativamente a um imóvel.
“A mediação é, em essência, uma prestação de serviço, um contrato para a obtenção de um negócio; e, por isso, é com a concretização desse negócio com a entidade angariada que se cumpre o fim precípuo da mediação. A obrigação do mediador é a de encontrar um terceiro com quem determinado contrato venha a ser celebrado.”- v. Ac. STJ, de 03/04/2008, disponível in www.dgsi.pt.
Por isso, “a contraprestação a pagar pelo comitente à entidade mediadora depende da conclusão e perfeição do negócio a celebrar entre aquele e o terceiro angariado, como consequência adequada da intervenção desenvolvida pelo intermediário que, portanto, funciona como condição legal ou imprópria do pagamento.
Efetivamente, o mediador só pode reclamar a remuneração, no momento em que, entre o comitente e a entidade angariada, for concluído o negócio visado pelo exercício da mediação, sendo certo que a atividade mediadora deve ser causal do resultado produzido, de modo a integrar-se de forma, idoneamente, determinada, na cadeia dos factos que deram origem ao negócio.
Por outro lado, se o negócio não vier a concluir-se, sem embargo de toda a proficiência e empenho da entidade mediadora, não há lugar a remuneração, o que acontece, de igual modo, se o negócio se vier a concretizar com outrem, que não o angariado.”[5]
Tendo em conta as regras estabelecidas para o ónus da prova (artº 342º n.º 1 do CC) “ incumbe à mediadora, se impetra nos autos a remuneração a que se acha com direito, a prova dos elementos constitutivos deste o que, in casu, passa pela existência daquela relação de causalidade”- v. Ac. do TRP de 15 de Julho de 2009 disponível in www.dgsi.pt no processo 2187/07.2TBVRL.P1.
Em face da matéria de facto dada como provada não podemos deixar de estar em consonância com o que é afirmado pelo Julgador a quo, quanto à contratualização referente à mediação imobiliária, não obstante a inexistência de contrato formal, ao salientar: “Em face da matéria de facto provada, não restam dúvidas que o acordo firmado pelo réu com a autora visava a celebração de um contrato de compra e venda de um prédio, pelo preço de € 6.500.000,00.
Na verdade, como ficou provado (aliás por acordo das partes), o réu encarregou a autora de diligenciar no sentido de conseguir um comprador para o prédio, indicando-lhe o preço de venda (€ 6.500.000,00), sendo que o negócio pretendido seria a compra e venda do imóvel.
É certo que o negócio que veio a ser celebrado, efetivamente, entre o réu e D..., não foi o de compra e venda do prédio, mas sim de compra e venda das ações da sociedade que era sua proprietária, transferindo-se a posição de beneficiário das ações da sociedade.
Porém, salvo melhor opinião, daqui não resulta que o negócio visado pelo réu fosse aquele, tal como transparece dos factos provados (e confessados - o réu pretendia angariar um comprador para o imóvel e pretendia celebrar uma compra e venda do prédio - factos referidos em 6 e 8).
Tanto basta para, em nosso entender, fazer incluir a atividade da autora em causa no âmbito do citado artº 2º, nº1 da Lei nº 15/2013, (…)
Assim, perante estes factos, inexistem dúvidas acerca da aplicabilidade do regime jurídico que regula a atividade de mediação imobiliária a que vimos fazendo alusão.
No que respeita à efetiva celebração de contrato de mediação imobiliária.
Para além dos referidos factos resultou, ainda, provado que a autora desenvolveu um conjunto de ações (abriu um processo interno para a venda do imóvel, o qual ficou com a referência QDL…; promoveu a divulgação do imóvel, quer no seu estabelecimento, quer noutros locais; apresentou a diversos clientes e contactos o negócio de transmissão do imóvel, procurando interessá-los na aquisição; prestou as informações pedidas por esses interessados; e acompanhou os interessados em variadas visitas ao imóvel, fazendo ali deslocar os seus vendedores), no seguimento das quais encontrou um interessado na compra, o qual após variados contactos, obtenção de informações e visitas ao imóvel acompanhado pelos vendedores da autora, confirmou-lhe que pretendia adquirir o prédio.
Ou seja, a autora aceitou desenvolver (e fê-lo) um conjunto de ações tendentes a conseguir encontrar um interessado na aquisição do prédio identificado nos autos, tendo sido o réu quem a encarregou de diligenciar no sentido de encontrar o respetivo comprador.
Donde, podemos qualificar o contrato tacitamente celebrado entre as partes como contrato de mediação imobiliária (neste sentido, vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07.05.2014, acessível in www.dgsi.pt., no qual se que se analisa um alegado contrato de mediação não reduzido a escrito e a possibilidade de recorrer à figura da aceitação tácita da proposta contratual, que aqui seguimos de perto).
Na verdade, os atos que ficaram provados são concludentes no sentido da vontade das partes celebrarem o contrato de mediação imobiliária, mormente a incumbência da autora, por parte do réu, de angariar comprador para o imóvel, a publicitação e contactos efetuados por esta, a prestação de informações e visitas ao imóvel acompanhado pelos seus vendedores, atividades que o réu aceita que foram desenvolvidas (não relevando sequer desconhecimento das mesmas, nomeadamente das visitas ao imóvel de potenciais interessados).
Logo, podemos concluir que entre as partes foi celebrado um contrato de mediação imobiliária, mediante o qual a autora se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra de um determinado imóvel pertencente a sociedade detida pelo réu, pelo preço de € 6.500.000,00, desenvolvendo para o efeito as necessárias ações de promoção e recolha de informações.
Como resultou igualmente provado, a autora efetuou mais do que um contacto com potenciais compradores do imóvel, divulgando-o e fazendo algumas deslocações para o mostrar a eventuais interessados.
Por via dessa divulgação, foi contactada por D..., que se revelou interessado em adquirir o imóvel, deslocando-se ao mesmo acompanhado de vendedor da autora, não resulta que o réu tenha informado a autora de que pretendia ele próprio diligenciar pela venda do imóvel ou que prescindia da mediação.
Apenas com a comunicação de 11.04.2015 o réu informou a autora que deveria retirar o imóvel do portefólio, não existindo da sua parte intenção de pagar qualquer comissão.
Logo, salvo melhor opinião, tal comportamento traduz que, até essa data, o acordo entre as partes se encontrava vigente, vindo a ser denunciado nessa data, alegando-se discordância dos valores de comissão.
(…)
Pelo exposto, ainda que posteriormente as negociações se tenham desenrolado apenas entre o réu e D..., dúvidas não restam de que foi a autora que deu a conhecer o imóvel ao comprador.
Ou seja, D... teve conhecimento do referido imóvel através da atividade desenvolvida pela autora, visitou o imóvel acompanhado de um dos seus vendedores e foi em consequência disso que o negócio de compra e venda das ações veio a celebrar-se (tendo por objeto indireto o imóvel).
Podemos, assim, concluir que a atuação da mediadora foi determinante para a concretização da venda realizada e que foram as suas diligências que serviram para aproximar os interessados na realização do negócio, proporcionando a sua conclusão.
Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.05.2010, acessível in www.dgsi.pt,: “Efetivamente, o mediador só pode reclamar a remuneração, no momento em que, entre o comitente e a entidade angariada, for concluído o negócio visado pelo exercício da mediação, sendo certo que a atividade mediadora deve ser causal do resultado produzido, de modo a integrar-se de forma, idoneamente, determinada, na cadeia dos factos que deram origem ao negócio”.
Do facto de se ter visado a compra e venda do imóvel e ter, efetivamente, sido realizada a compra e venda das ações da sociedade sua proprietária, não altera a conclusão a que se chegou: o interessado era, no fundo, o próprio réu, beneficiário da totalidade das ações da sociedade proprietária do imóvel e a atuação da mediadora foi determinante para a concretização da venda/alienação.
A sociedade proprietária do imóvel celebrou o negócio de compra e venda das ações com o interessado, por sua iniciativa, por preço que entendeu, mas só o fez depois de ter beneficiado de toda a atividade de divulgação e publicitação do mesmo realizada pela autora e angariação do interessado conseguido pela mesma.
Pode ver-se idêntico juízo, formulado no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 29.06.2010, segundo o qual “Constata-se, pois, que a autora provou que da sua atividade profissional resultou a apresentação do comprador com o qual, na sequência de negociações, veio a ser celebrado o contrato de compra e venda, precisamente, pelo preço pretendido pelo recorrente e referido no contrato de mediação. O que traduz atividade causalmente adequada por parte da autora, não obstante os termos do contrato terem resultado, eventualmente, de negociações diretas entre os interessados que aquela pôs em contacto, nada impedindo que a vertente factual da relação de causalidade conste implicitamente dos factos provados ou seja alcançada por presunção natural, nos termos do art.351º, do Código Civil” (vide, ainda, o Acórdão do mesmo Tribunal, de 15.11.2007, ambos acessíveis in www.dgsi.pt).
Como resultou provado, a atividade da autora foi determinante para a concretização do negócio da compra e venda das ações da sociedade proprietária do imóvel, foi “causal” do mesmo, utilizando a expressão mencionada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24.09.2009 “A prestação do mediador terá de ser causal, em relação ao negócio celebrado entre o comitente e o terceiro(…)” (acessível no mesmo site).
E como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27.05.2010, já referido, “O mediador só pode reclamar a remuneração no momento em que, entre o comitente e a entidade angariada, for concluído o negócio visado pelo exercício da mediação, sendo certo que a atividade mediadora dever ser causal do resultado produzido, de modo a integrar-se de forma, idoneamente, determinada, na cadeia dos factos que deram origem ao negócio”, defendendo-se igual posição nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 14.01.2012, e do Tribunal da Relação do Porto de 23.09.2008, acessíveis in www.dgsi.pt, e do Tribunal da Relação do Porto de 08.09.2011, publicado in C.J., Ano XXXVI, tomo IV, p. 165/167.
Como resulta, ainda, dos factos provados, apesar da atividade e empenho postos no exercício da sua atividade, a autora não acompanhou o negócio que se veio a concretizar até à sua conclusão.
Porém, o que cabe verificar é se existe nexo de causalidade entre a atividade da autora/mediadora e o negócio visado, ou se ocorreu anormal quebra desse nexo por causa imputável ao cliente.
O ónus da alegação e prova da verificação do nexo causal entre a sua atuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado, como pressuposto e facto constitutivo do seu direito compete ao mediador (neste sentido, vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 13.04.2010, in www.dgsi.pt).
Por via de regra tal nexo de causalidade adequada só se verifica se o negócio se concretizar durante o período de vigência do contrato, admitindo a jurisprudência que o direito à remuneração da mediadora se afirme mesmo que o contrato tenha sido posteriormente feito com o mesmo angariado, se ela provar que o comitente impediu tal concretização neste período para se eximir ao pagamento da comissão (neste sentido, vide os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 15.07.2009 e 06.10.2009, in www.dgsi.pt).
Porém, analisados os factos provados, evidencia-se que todos os atos praticados pela autora constituem elemento decisivo para a celebração do contrato de compra e venda das ações da sociedade, em termos tais que podemos afirmar, num juízo de prognose póstuma, que sem eles não se teria conseguido o interessado/comprador.
Ou seja, de tais atos resultou, como consequência adequada, a conclusão do contrato, sendo que decisivas foram as negociações encetadas pela autora.
Podemos até dizer que, face ao comportamento posterior do réu, ao negociar diretamente com o interessado, houve quebra da boa-fé negocial no sentido do aproveitamento indevido da atividade desenvolvida pela mediadora e a frustração da remuneração que lhe seria devida.
Pelo que se conclui encontrar-se demonstrado o nexo de causalidade adequada entre a atividade de promoção que a autora desenvolveu junto do potencial comprador (D...) (a visita realizada, informações prestadas e os contactos que manteve, através do seu comercial A..., com o referido interessado até meados de Abril de 2015) e a celebração do contrato de compra e venda das ações.
Sucede, porém, que o contrato de mediação em causa é nulo, como confessadamente a autora invocava na petição inicial.
Na verdade, nos termos do disposto no artº 16º, nº1 da Lei nº15/2013, estipula-se quanto à forma do “Contrato de mediação imobiliária”, que “O contrato de mediação imobiliária é obrigatoriamente reduzido a escrito”, prevendo o nº 2 do mesmo preceito os elementos que deve conter obrigatoriamente.
Ainda nos termos do nº 5 do mesmo preceito legal, estabelece-se que “O incumprimento do disposto nos nºs 1, 2 e 4 do presente artigo determina a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação”.
Concluindo-se, assim, que existiu tal contrato e que o mesmo é nulo, por não observar o legal formalismo (artºs 219º e 220º do Código Civil e artº16º da Lei nº15/2013, de 08.02) (…)”
De tal decorre, assim, também, a improcedência da apelação, na vertente inexistência de contratualização entre autora e ré.
Conhecendo da 4ª questão
Verificada a existência, entre as partes de um contrato nulo, por falta de forma, haverá que apreciar os efeitos decorrentes da nulidade.
Dispõe o artº 289º n.º 1 do CC que “tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroativo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.”
Como se salientou dos factos provados resulta que a autora se comprometeu a promover, e promoveu a venda do imóvel, venda esta efetuada a interessado que a autora levou a fazer visitas promocionais.
Como é evidente é inviável a “restituição” dos serviços prestados pela autora pelo que fazendo a aplicação do citado artº 289º do CC há que encontrar a maneira de, em alternativa da restituição, a compensar pela atividade desenvolvida no interesse do réu.[6]
Com vista a tal retribuição compensatória deverá partir-se do “preço” que posto em termos informais terá sido estabelecido pelas partes[7] ou, fazer apelo aos usos generalizados e estabelecidos em matéria de mediação imobiliária, caso não se possa ter certezas quanto ao informalmente estabelecido.
No caso em apreço não se apurou o preço que as partes informalmente convencionaram, mas a comissão normalmente praticada pela autora no âmbito da mediação imobiliária varia entre 5% e 6% do valor da venda do imóvel a que acresce o IVA à taxa legal (facto provado n.º 9), devendo ter-se em conta a percentagem menor (aliás, já considerada pela autora no seu pedido), não havendo nela reduções a fazer uma vez que o negócio foi concretizado, só o não sendo diretamente com intervenção da autora, porque foi o réu que impediu tal, ao manter contactos diretos com o comprador.
Ora, tendo o preço da venda do imóvel em causa sido de € 6.150 000,00, o cálculo de 5% corresponde a € 307.500,00, a que acresce o IVA à data em vigor, de 23%, o que perfaz a soma total de € 378.225,00 devidos pelo réu a título de remuneração da autora.
Deste modo, verificado o direito da autora ao ressarcimento pela atividade desenvolvida, improcede, também, neste segmento a apelação.
Nestes termos irrelevam as conclusões da apelante, não se mostrando violadas as normas legais cuja violação foi invocada, sendo de julgar improcedente a apelação.
*
DECISÂO Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida. Custas pela apelante.
Évora, 23 de março de 2017
Mata Ribeiro Sílvio Teixeira de Sousa Maria da Graça Araújo
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[1] - Redação dada após deferimento da reforma da sentença, quanto a custas.
[2] - O réu esteve representado por advogado, tinha este a obrigação de a arguir de imediato, a alegada nulidade, nos termos do art. 199º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
[3] - Salienta o Julgador a quo na sua fundamentação sobre o julgado referente à matéria de facto que “Assim, começou o Tribunal por levar em consideração os factos admitidos por acordo das partes, nomeadamente os factos descritos sob os nºs 1, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 15 (proposta transmitida ao réu), 17 a 20 e 22 dos factos provados (artºs 64º, 68º a 70º e 76º da contestação). (….)”
[4] - v. entre outros Acs. do STJ de 08/06/2000, 28/05/2002 e 01/07/2014, respetivamente em Sumários 42º, 32; 5/2002 e proc. 04B1357, disponível em www.dgsi.pt.
[5] - Ac. do STJ de 27/05/2010, disponível em www.dgsi.pt, no processo 9934/03.0TVLSB.L1.S1
[6] - v. Ac. TRL de 24/09/2002 in Col. Jur. Tomo 4º, 76; Ac. STJ de 20/04/2004 in www.dgsi.pt, no processo 04A800.
[7] - v. Ac. TRL de 24/03/2009 in www.dgsi.pt, no processo 3006/07.5TBOER.L1-7