Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
VENDA DE COISA DEFEITUOSA
IMÓVEL DESTINADO A LONGA DURAÇÃO
PRAZO DE CADUCIDADE
DENÚNCIA DOS DEFEITOS
RECONHECIMENTO DOS DEFEITOS
Sumário
I - Nos termos do art.º 331º nº1, do CC a caducidade só é impedida pela prática do acto, a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo, dentro do prazo legal ou convencional. II - Nos termos do n.º 2, a caducidade pode, igualmente, ser impedida pelo reconhecimento do direito por parte do seu beneficiário, nos casos em que resulte de estipulação negocial (caducidade convencional), ou de disposição legal relativa a direitos disponíveis. III - No regime da venda de coisa defeituosa, estando em causa um bem imóvel, o prazo para denúncia dos defeitos é de um ano depois de ser conhecido o defeito e até cinco anos após a entrega da coisa (art.º 916.º, n.ºs 3); e o prazo de caducidade do direito de acção é o previsto no art.º 917.º para a acção de anulação por simples erro, e, por analogia, para a acção a exigir a reparação ou seja, seis meses após a denúncia dos defeitos, ou, se não tiver havido denúncia, seis meses após o decurso dos prazos fixados no art. 916.º. IV – No entanto, se a compra e venda tiver por objecto bem imóvel destinado a longa duração, que tenha sido construído, reparado ou modificado pelo vendedor, os prazos de caducidade serão: (1) de um ano para fazer a denúncia dos defeitos, prazo que se conta a partir do descobrimento dos mesmos (art.º 1220.º, n.º 1, do Código Civil), (2) de um ano, a partir da denúncia, para pedir a indemnização ou a eliminação dos defeitos nº 2,3 e 4 do art.º 1225 do CC e (3) de cinco anos, a contar da entrega da obra, dentro dos quais terá que ser feita a denúncia e proposta a ação de indemnização ou reparação do imóvel. V – Se em cumprimento de um contrato promessa de compra e venda de uma moradia a construir pelo promitente vendedor, vier a ser celebrado o contrato definitivo, o prazo para a denúncia dos defeitos, apenas se inicia com a celebração da escritura de compra e venda, ainda que o adquirente tenha começado a habitar a casa, por autorização do promitente-comprador, muitos meses antes e nessa altura já fossem visíveis defeitos aparentes. VI – Se o reconhecimento da existência dos defeitos, a sua enumeração e o compromisso assumido pela R. de os eliminar ou reparar aconteceu antes de antes de esgotado o prazo de caducidade, tal reconhecimento tem a virtualidade de impedir a caducidade do direito do A. , ou seja a partir desse momento não é lícito à R. (devedor) invocar contra o A. (credor) a excepção de caducidade, ainda que o devedor demore anos a cumprir. Na verdade o direito foi exercido e uma vez exercido ou reconhecido já não está sujeito a prazo de caducidade.
Texto Integral
Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
«AA, (…), intentou a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra BB..., CONSTRUÇÕES, LDA., (…), peticionando:
- A condenação da Ré a efetuar trabalhos contratados e não executados, e bem assim os mal executados e com defeito relativamente ao imóvel adquirido pelo Autor àquela sociedade, ou, em alternativa, a condenação da sociedade Ré no pagamento ao Autor, a título de danos patrimoniais, de uma indemnização na quantia de € 40.493,00 (quarenta mil quatrocentos e noventa e três euros);
- A condenação da Ré a devolver ao Autor seis andaimes modulares e respetivos travamentos propriedade do Autor, ou, caso tal não seja possível, a condenação da Ré no pagamento ao Autor, a título de danos patrimoniais, da quantia de € 400,00 (quatrocentos euros);
- A condenação da Ré a pagar ao Autor, a título de danos patrimoniais a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) (estes de lucros cessantes), € 930,00, (novecentos e trinta euros) € 100,00 (cem euros), € 313,00 (trezentos e treze euros) e € 336,00 (trezentos e trinta e seis euros);
- A condenação da Ré a pagar ao Autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros).
Alegou para tanto, e em síntese, que:
- O Autor, como promitente-adquirente, e a Ré, como promitente-vendedora, celebraram contrato promessa de compra e venda sobre uma moradia e terreno sito em Brejos de Azeitão, tendo estipulado que a moradia seria construída de acordo com um documento anexo ao contrato;
- A Ré nunca terminou alguns dos trabalhos na moradia a que se obrigou, nem retificou outros com defeitos, apesar de ter sido interpelada para o efeito, os quais devem ser realizados, e cujo valor estima em € 40.493,00 (quarenta mil quatrocentos e noventa e três euros);
- A Ré retirou do lote do Autor seis andaimes modulares e respetivos travamentos, os quais nunca devolveu ao Autor, e cujo valor estima em € 400,00 (quatrocentos euros);
- A Ré não entregou a moradia na data acordada (Abril de 2014), pelo que o Autor não conseguiu vender o seu apartamento, venda de que dependia a concessão pela Caixa Geral de Depósitos ao Autor de empréstimo bancário para aquisição da moradia à Ré, tendo perdido a oportunidade de obter uma quantia superior ao valor recebido, perdendo a diferença de € 10.000,00 (dez mil euros);
- No dia da outorga escritura de compra e venda, 14 de Dezembro de 2004, o Autor entregou diretamente à Ré um cheque recebido da Caixa Geral de Depósitos, o qual excedia em € 313,00 (trezentos e treze euros) o montante acordado como preço da moradia, e que o Autor pressupunha receber da Ré, o que nunca sucedeu;
- Em 13 de Março de 2005 foi debitada na conta do Autor a quantia de € 336,00 (trezentos e trinta e seis euros) relativa a custas com o cancelamento de duas hipotecas que a Ré tinha sobre a moradia em apreço, sendo que tal quantia é da responsabilidade da Ré, a qual nunca a liquidou junto do Autor;
- Apesar de diversas vezes instada para o efeito, a Ré nunca instalou o sistema de rega automática nos dois espaços do jardim da moradia, obrigando o Autor a instalar dois sistemas provisórios, os quais importaram para o Autor a despesa de € 930,00 (novecentos e trinta euros);
- A Ré recusou igualmente instalar o sistema automático no aquecimento central, obrigando o Autor, em razão do frio intenso sentido, a instalar o mesmo, o qual importou para o Autor a despesa de € 100,00 (cem euros);
- O Autor era uma pessoa alegre e divertida, tendo toda a situação de incumprimentos e sucessivos recuos por parte da Ré no acabamento da moradia e reparação dos defeitos contribuído para um quadro depressivo do Autor, que [à data da entrada da petição inicial em juízo] se encontra de baixa psiquiátrica desde 2005, e medicado, tendo que tomar diariamente ansiolíticos e antidepressivos, tendo esta situação tido reflexos a nível familiar, social e laboral, danos não patrimoniais que devem ser compensados.
Mais juntou documentos e arrolou testemunhas.
*
A Ré apresentou contestação, defendendo-se por exceção, invocando:
- A caducidade do pedido de eliminação dos defeitos ou da respetiva indemnização;
- A compensação dos créditos detidos sobre o Autor, no valor global de € 14.560,29 (catorze mil quinhentos e sessenta euros e vinte e nove cêntimos) relativo aos materiais empregues na moradia
além do contratado, reparações efetuadas no apartamento do Autor e juros de mora pagos ao banco em virtude da demora do Autor na celebração da escritura.
Impugnou ainda a matéria de facto constante da petição inicial, negando-a, genericamente, alegando, em suma, que:
- Não houve qualquer atraso por parte da Ré na entrega da casa ou celebração da escritura;
- A moradia estava concluída quando o Autor a passou a habitar com a família;
- Apenas ficaram por terminar alguns trabalhos, verificando-se igualmente apenas alguns dos defeitos alegados pelo Autor;
Termina pedindo a declaração de caducidade do direito à eliminação dos defeitos ou à sua indemnização, a declaração de compensação do crédito da Ré no montante da eventual indemnização a que o Autor venha a ter direito, a absolvição do demais peticionado pelo Autor e a condenação deste nas custas.
Juntou documentos.
*
O Autor apresentou Réplica, respondendo às exceções invocadas pela Ré, negando a existência de caducidade do seu direito a exigir a eliminação dos defeitos ou a respetiva indemnização, impugnando ainda os valores cuja compensação a Ré peticiona.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
*
Foi proferido despacho saneador, onde se fixou o valor da ação e se selecionou a matéria de facto assente e controvertida.
*
Foi designada data para a realização da audiência de julgamento, tendo, no seu início, sido suspensa a instância por acordo das partes por um período de 90 (noventa) dias.
*
O Autor veio juntar aos autos articulado superveniente, alegando que após a suspensão da instância acordada pelas partes a Ré procedeu a intervenção na moradia no sentido de reparar os defeitos ali existentes, mantendo-se a maioria dos defeitos já invocados e trabalhos omitidos, tendo esta intervenção originado danos numa aparelhagem, num computador e numa impressora propriedade do Autor, tendo havido ainda necessidade de contratar uma empregada de limpeza para proceder à sujidade deixada pela Ré, o que lhe causou prejuízos no valor de € 1.229,10 (mil duzentos e vinte e nove euros e dez cêntimos).
Mais juntou documentos e arrolou testemunhas. *
A Ré impugnou genericamente os factos alegados no articulado superveniente do Autor».
*
Por fim, produzidas as provas, foi proferida sentença, onde se decidiu o seguinte: «a) Julgar procedente a exceção perentória de caducidade invocada pela Ré BB..., Construções, Lda., absolvendo-a dos pedidos alternativos de reparação das deficiências no imóvel a si adquirido pelo Autor AA sito …, e de indemnização correspondente, a título de danos patrimoniais; b) Julgar improcedente a exceção de direito material de compensação invocada pela Ré BB..., Construções, Lda.; c) Condenar a Ré BB..., Construções, Lda. a proceder à instalação da iluminação da piscina da moradia, conforme acordado no anexo do contrato-promessa que serviu de base ao contrato de compra e venda da moradia; d) Condenar a Ré BB..., Construções, Lda. a pagar ao Autor AA a quantia de € 750,00 a título de danos patrimoniais; e) Condenar a Ré BB..., Construções, Lda. a pagar ao Autor AA a quantia de € 5.000,00 a título de danos não patrimoniais; f) Condenar a Ré BB..., Construções, Lda. a restituir ao Autor AA as quantias de € 144,00 e 312,16; g) Absolver a Ré BB..., Construções, Lda. do demais peticionado».
*
Inconformado com o decidido, veio o A. RR., interpor recurso de apelação, tendo rematado as suas alegações com as seguintes
Conclusões:
«1ª. O A./Recorrente, na sua réplica, alegou que a R., ao invocar a excepção da caducidade, actuava em abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, pois na reunião de 09/06/2006, para além da declaração e aceitação por parte da R. de todos os defeitos da obra, a mesma comprometeu-se na sua reparação, como, aliás, consta da matéria de facto provada (números 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24 e 25 da fundamentação de facto) da douta sentença recorrida.
2ª Ora, foi perante esta factualidade que o A., na sua réplica alegou que a R., ao invocar a caducidade do direito do A. exigir a supressão dos defeitos da obra e de exigir os trabalhos em falta, actuava em abuso de direito, isto é, em “venire contra factum proprium”.
3ª. Efectivamente, age com abuso de direito, o construtor/vendedor do imóvel, que, depois de lhe terem sido denunciados os defeitos da obra em tempo oportuno e se compromete a repará-los, vem depois invocar a caducidade da acção, como é, aliás, o presente caso (V. Ac. STJ, de 27/11/2007, proc.º 07A3581; Ac. STJ, de 18/09/2014, proc.º n.º 1857/09.9TJVNF.S1.P1; Ac. STJ, de 29/10/2013, proc.º 364/03.4TBVRM.G1.S1, Ac. RL, de 12/12/06, rec. 6315/2006-7, in www.dgsi.pt.
4ª. Porém, a douta sentença recorrida não se pronunciou sobre esta questão, o que constitui omissão de pronúncia, nos termos da al. d), do n.º 1, do art.º 615º do NCPC, constituindo nulidade de sentença.
5ª. O A. opôs-se à prestação de declaração de parte pela R., já que o seu legal representante seria o último a ser ouvido da audiência de julgamento, tendo estado presente em toda a audiência, ao lado do seu ilustre mandatário, pelo que a tudo assistiu e ouviu.
6ª. Ora, esta figura erigida pelo NCPC, procura fornecer ao julgador mais elementos, mas que sejam fidedignos e autênticos, para poder apreciar livremente as referidas declarações, salvo se constituirem confissão.
7ª. Assim, tais declarações não devem ser pervertidas na sua autenticidade pelo facto de a parte ter assistido ao depoimento de parte e declarações de parte do A., bem como, à inquirição de todas as testemunhas, dando-lhe todas as possibilidades de contornar a verdade material.
8ª. Já o A. prestou depoimento de parte a requerimento do R., e logo de seguida, as declarações de parte, sem nada ter ouvido, quer da parte contrária, quer das testemunhas, já que foi o primeiro a ser inquirido, o que criou manifesta desigualdade na prestação das declarações de parte, o que não pode ser o espírito do NCPC ao criar este novo instrumento de prova.
9ª. As declarações de parte da R., prestadas deste modo serão absolutamente inúteis, por falta de salvaguarda da sua objectividade e genuinidade, sendo certo que é prática dos tribunais de 1ª instância que as partes que pretendam prestar declarações de parte, não assistam ao julgamento.
10ª. Ora, o art.º 9º do Código Civil não permite que o legislador possa criar normas jurídicas inúteis, pelo que estamos perante mais uma nulidade, que se argui.
11ª. Assim, ao admitir a declaração de parte da R. foi violado o princípio da igualdade das partes, previsto no art.º 4º do NCPC, e, ainda, embora não autonomamente consagrado na CRP, possui dignidade constitucional, por derivarem, em última instância, do princípio de Estado de Direito Democrático previsto no art.º 2º da CRP, e constituem emanação directa do princípio da igualdade previsto no art.º 13º da Lei Fundamental, pelo que, também aí, esta foi violada.
12ª. A douta sentença recorrida padece da nulidade prevista na al. c), do n.º 1, do art.º 615º do NCPC, pois os fundamentos de facto estão em oposição com a decisão, já que a douta sentença refere que “Da factualidade dada como provada resulta que a R. não realizou os seguintes trabalhos: fornecimento e montagem do chuveiro de apoio à piscina, fornecimento de peças de reserva como acordado inicialmente, fornecimento e montagem do telheiro (3,5m x 1,7m) com forno, churrasqueira e bancada com lava loiça de acordo com a foto anexa ao contrato promessa, entrega do projecto da piscina para formalizar a sua legalização na Câmara Municipal de Setúbal, instalação de iluminação no interior da piscina e instalação de sistema de rega definitivo.
13ª. Contudo, o Autor apenas logrou demonstrar (e tal resulta da concatenação entre o relatório pericial e o anexo ao contrato-promessa) que as obras contratadas e não realizadas se resumem à iluminação do interior da piscina e a instalação do sistema de rega definitivo, sendo que este sistema se encontra já efectivamente instalado…”
14ª. Ora, do acima transcrita resulta contradição, sendo que os fundamentos de facto estão em oposição com a decisão, padecendo a douta sentença recorrida da aludida nulidade.
15ª. Considerou a douta sentença recorrida que “in casu” ocorria a excepção peremptória de caducidade alegada pela R., verificando-se extinto o direito do Autor de exigir a eliminação dos defeitos alegados, ou a respectiva indemnização, mas, salvo o devido respeito, sem razão.
16ª. “In casu”, estamos perante um contrato promessa de compra e venda e perante um contrato de compra e venda de um imóvel, sendo necessário definir o momento a partir do qual se iniciam os prazos de caducidade, isto é, nos termos do art.º 329º do C. Civil, o momento a partir do qual o direito pode ser exercido.
17ª. Ora os prazos de caducidade nunca poderão começar a sua contagem enquanto a obra não estiver concluída, sendo certo que no caso “sub judice”, no momento em que o A. passou a viver na moradia, a obra ainda não estava acabada, muito longe disso, para além de que, mesmo aquando da celebração da escritura de compra e venda (14 de Dezembro de 2004) a moradia ainda não estava acabada, faltando realizar algumas obras, como, aliás, resulta da factualidade provada.
18ª. Assim, o início do prazo de caducidade nunca poderia iniciar-se antes do dia 14 de Dezembro de 2004, até porque, até aí, o A./Recorrente não era, sequer, ainda, proprietário da moradia, mas mero promitente comprador, e, ao ocupá-la, em 29 de Maio de 2004, fê-lo, na medida em que o sr. CC, lho permitiu, como resulta da sua declaração de parte, prestada em audiência de julgamento, no dia 30/01/2015, entre as 14:42:58 horas e as 15:37:47 horas, gravada em CD audio, onde refere ao minuto 48 que “…relativamente à entrega da casa…ele pediu-me e eu disse, pode utilizar, …pode utilizar…o sr. eng.º não tinha, ainda, feito os contratos …porque não tinha feito a escritura…”, devendo, assim, ao ponto 9 dos Factos provados, ser acrescentado “…, com autorização do legal representante da R….”, .
19ª. E, se se considerar como início do prazo de caducidade a data da celebração da escritura de compra e venda, os defeitos foram, todos, atempadamente, denunciados, ao contrário do pretendido pela douta sentença recorrida.
20ª. Por outro lado, como resulta da factualidade provada (n.ºs 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24 e 25 da fundamentação de facto da douta sentença recorrida) a R., através do seu representante legal, reconheceu todas as deficiências do imóvel, constantes de uma lista elencando as deficiências detectadas, sendo que, para além deste reconhecimento, comprometeu-se a reparar tais deficiências.
21ª. Com este reconhecimento (caso já houvesse alguma caducidade, o que não se concede nem admite), sempre emergeria uma causa impeditiva da caducidade, nos termos do artigo 331º do C. Civil, pois nos direitos disponíveis nada impede a renúncia à caducidade (art.º 330º, n.º 1 do C. Civil), que pode ser expressa ou tácita (cfr. art.º 217º, n.º 1 do C. Civil), sendo que se verifica a renúncia tácita quando o vendedor/construtor revelando consciência de que os direitos já caducaram, se propõe satisfazer a respectiva prestação (cfr. Dr. João Cura Mariano - Juiz – “Responsabilidade Contratual do Empreiteiro Pelos Defeitos da Obra”, fls. 137/138 – 4ª Ed. Almedina.
22ª. Acresce que o impedimento da caducidade resultante do reconhecimento do respectivo direito não determina a contagem de novo prazo de caducidade, passando o exercício desse direito a estar sujeito, apenas, ao prazo de prescrição ordinário previsto no artigo 309º do C. Civil (cfr. Ac. RL, de 01/10/2009 – Relatora Desembargadora Fátima Galante, in www.dgsi.pt).
23ª. Por outro lado, o regime da caducidade dos direitos de denúncia e dos direitos que assistem ao adquirente do imóvel justifica-se na necessidade de protecção do interesse do construtor/vendedor em ver definida a sua responsabilidade pelos defeitos da obra num prazo mais curto possível. Nesta medida, o adquirente do imóvel, após a denúncia dos defeitos, tem um ano para exercer os seus direitos.
24ª. E, porque em qualquer das situações está em causa um prazo de caducidade, o seu regime específico tem de ser articulado com as normas que definem o regime da caducidade, particularmente, com o disposto no art.º 331º do C. Civil, sendo que impede a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deve ser exercido.
25ª. E, sempre que se esteja no domínio de direitos não excluídos da disponibilidade das partes, como é o caso, há que atribuir eficácia impeditiva a comportamentos declaratórios inequívocos por parte do vendedor quanto à existência do direito (ainda que não pratique actos equivalentes à realização do mesmo, como será o caso de proceder à eliminação dos defeitos), pois que com tal atitude deixou de ocorrer o fundamento de protecção da situação de incerteza.
26ª. Ora, “in casu”, temos que a R./Recorrida assumiu a sua responsabilidade quanto à existência dos defeitos, e, porque se está no âmbito dos direitos não excluídos da disponibilidade das partes, o acto de reconhecimento avoca efeitos mais extensos impedindo a caducidade dos direitos de reparação e eliminação dos defeitos por parte do adquirente do imóvel.
27ª. Assim, ao considerar que se encontrava verificada no caso em apreço, a excepção peremptória da caducidade, a douta sentença recorrida violou os arts. 217º, 309º, 329º, 330º, 331º e 1225º, todos do C. Civil.
28ª. Por outro lado, o A./Recorrente, sempre foi alertando a R. /Recorrida para os defeitos da obra , por forma verbal, como resulta da sua declaração de parte registada conforme alegado no n.º 17 das presentes alegações (que aqui se dá por reproduzido), que, sensivelmente aos 11 minutos e seguintes refere “…verbal, sempre, eu, as deficiências só comecei a fazer por escrito passado um ano de me entregar a casa,…mas nunca o sr. CC me disse que não fazia…mesmo até eu escrever a 1ª vez. Eu só lhe escrevi a 1ª vez em Junho de 2005 porque o Sr. CC teve uma titude que até aí não tinha tido – foi que ele disse para fazermos uma reunião para esclarecer, eu disse-lhe, concerteza, vamos fazer, e nunca mais chegava essa reunião, e a partir daí começou a ser por escrito. Quasede certeza que foi em Junho de 2005, foi um ano depois de eu ocupar a casa…foi quando fiz a 1ª carta…até aí era tudo oral, o Sr. CC disponibilizava-se, imediatamente, quando eu dizia, olhe, mais uma rachadela ali, um armário que não fecha, disponibilizava-se a fazer as coisas e nunca disse que não ía fazer…” concatenada com a declaração de parte do legal representante da R., registada em CD audio, prestada na audiência de discussão e julgamento no dia 30/01/2015, entre as 15:47:05 horas e as 17:15:38 horas, em que ao primeiro minuto e seguintes refere “… reconheço que havia pequenas fissuras no estuque…mas que estavam consolidadas, que resulta da desidratação dos materiais..mas depois isso é reparado passado 1, 2 ou 3 anos…não se consegue evitar…antigamente nunca se fazia uma pintura por cima do estuque sem passarem dois ou três anos, e hoje, o mal é fazer-se a construção toda dentro de um ano… e pôr uma pintura em cima”, e ao minuto 07:00 e seguintes, refere “…estamos a falar do que aconteceu ao fim de pouco tempo (e não do que se passou nestes anos todos) e que depois não foram reparadas na altura porque não tive acesso à moradia, porque senão tinha feito isso dentro dos dois ou três anos, quando fui para fazer a intervenção, o sr. eng.º disse-me: “só entra aqui quem assumir a responsabilidade do que está aqui dentro”, e eu disse “assim não me deixa entrar aqui o pessoal”, porque eu reparava a moradia como fiz em todas as outras, ao fim de três anos faço uma vistoria nas moradias todas…ao fim de dois, três anos, normalmente, quando acontece no estuque, faço uma vistoria…” e aos minutos 43 a 45 refere “…pequenas coisas que iam surgindo, a 1ª foi na moradia, no piso da garagem, a seguir à escritura… e depois, mais tardehouve coisas, pronto, havia uma estaladela, e eu disse: deixe estar sr. eng.º, que a gente trata disso tudo, aliás, foi sempre a minha resposta…”. 29ª. Também a testemunha DD, cujo depoimento foi prestado em audiência de julgamento no dia 15/01/2015, das 15:27:20 às 16:01:53 horas, e se encontra registado em CD audio, refere, ao minuto 6 “…sim, tive conhecimento da situação, numa das alturas, que eu ía lá muito, ele pediu-me para olhar para o interior das casa…, muitas vezes vi o AA interpelá-lo relativamente às deficiências que havia para concluir, sei que depois o AA elencou-as por escrito…foram duas reuniões que eu presenciei…para elencar as deficiências…perto do Verão de 2006, correu-se todas as áreas e ía-se anotando as deficiências que deviam ser corrigidas…eram bastantes. Na altura, o sr. CC disse que ía corrigi-las…”. 30ª. A testemunha EE, no seu depoimento registado como alegado no n.º 18 das presentes alegações, afirma que “…ía lá muitas vezes ao fim de semana, e várias vezes ouvi conversas de portão, digamos, em que o sr. eng.º pedia ao sr. CC para acabar o que faltava fazer e arranjar o que estava mal feito, e o sr. CC respondia sempre que não estava esquecido, que ía fazer, que estivesse descansado, mas nunca fez, o sr. AA nesse ano, várias vezes ouvi estas conversas, depois passou a escrito, claro…”. 31ª. Resulta das referidas declarações e depoimentos, que o A., após ocupar a casa, ou, pelo menos, logo após a realização da escritura, foi denunciando os defeitos à R., que sempre lhe respondeu através do seu legal representante, que iriam resolver tudo, isto é, os defeitos foramsendo denunciados à medida que íam aparecendo e a R. reconhecia-os e prontificava-se a repará-los, para além de que a R. ao fim de 2/3 anos fazia uma vistoria e reparava-os (o que equivale à renúncia por parte da R., do prazo de um ano para denúncia dos defeitos previsto no art.º 1225º do C. Civil), sendo certo que, se não os reparou, não foi por lhe terem vedado a entrada na moradia, mas porque não se quis responsabilizar por qualquer dano que viesse a ser causado no recheio da casa, pelas reparações, pelo que no ponto 16 dos Factos provados da douta sentença recorrida deve ser acrescentado o seguinte : “…, para além de o A., quer após ir viver para a moradia, quer logo após a realização da escritura, ter denunciado os defeitos que a moradia ia revelando e o legal representante da R. os ter reconhecido e prontificado a repará-los, e a R., ao fim de 2/3 anos, fazer uma vistoria e reparar os defeitos 32ª. Assim, a R. adoptou comportamentos que, inequivocamente, se assumem num reconhecer do direito de o A. ver reparados os defeitos da moradia, bem como assumiu que fazia uma vistoria à moradia passados 2/3 anos para elencar e reparar os defeitos encontrados (o que determina o afastamento “in casu”, da regra prevista no n.º 2, do art.º 1225º do C. Civil), pelo que tais comportamentos não podem deixar de ser considerados relevantes para efeitos da não verificação da caducidade do direito do A., quer do ponto de vista de os defeitos serem considerados atempadamente denunciados, quer do ponto de vista do direito do A. à reparação dos mesmos e/ou à respectiva indemnização. 33ª. Deste modo, inexiste no caso “sub judice” qualquer caducidade do direito do A., quer no que concerne à denúncia dos defeitos, quer noque respeita à sua reparação/indemnização, pelo que a douta sentença recorrida violou os arts. 330º, 331º e 1225º do C. Civil. 34ª. Da suprareferida matéria de facto gravada resulta que, ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, os defeitos assim considerados não eram aparentes no sentido de se declararem e estarem visíveis para o A. no dia 29 de Maio de 2004, sendo que muitos deles, até de acordo com declarações do legal representante da R., se declararam e foram denunciados, logo após a escritura, pelo que não se pode considerar, como fez a douta sentença recorrida, que os defeitos eram aparentes, vísíveis em 29/05/2004 e que o direito a denunciá-los caducou em 29/5/2005. 35ª. Efectivamente, dos autos, acabam por não resultar as datas concretas, a partir das quais se há-de computar o decurso do prazo de caducidade do direito de denúncia dos defeitos da moradia, e, para que haja caducidade é necessário que aquele a quem aproveita alegue e prove a data da descoberta dos defeitos pelo dono da obra, não sendo posível concluir pela caducidade da denúncia dos defeitos da obra quando se ignora a data do termo inicial do prazo da denúncia dos defeitos e de cada defeito, que, como já referido, não pode ser a data de 29/05/2004 (cfr. Ac. RL, de 29/01/2015, Rec. 5838/09.0TBVFX.L1-2, in www.dgsi.pt, pelo que a douta sentença recorrida violou o art.º 329º do C. Civil. 36ª. Saliente-se que, na reunião de 09/06/2006, para além das constantes e permanentes denúncias dos defeitos pelo A. e aceitação por parte da R. de todos os defeitos da obra, a que acresce o facto de a R. se ter comprometido a fazer uma vistoria e reparar os defeitos após 2/3 anos(cfr. declarações de parte do A. e da R. suprareferidas) a mesma comprometeu-se na sua reparação. 37ª. Perante esta factualidade, o A., na sua réplica, alegou que a R., ao invocar a caducidade do direito do A. exigir a supressão dos defeitos da obra e de exigir os trabalhos em falta, actuava em abuso de direito, isto é, em “venire contra factum proprium”. 38ª. Efectivamente, age com abuso de direito, o construtor/vendedor do imóvel, que, depois de lhe terem sido denunciados os defeitos da obra em tempo oportuno e se compromete a repará-los, vem depois invocar a caducidade da acção, como é, aliás, o presente caso (V. Ac. STJ, de 27/11/2007, proc.º 07A3581; Ac. STJ, de 18/09/2014, proc.º n.º 1857/09.9TJVNF.S1.P1; Ac. STJ, de 29/10/2013, proc.º 364/03.4TBVRM.G1.S1, Ac. RL, de 12/12/06, rec. 6315/2006-7, in www.dgsi.pt. 39ª. Por outro lado, integra a violação das cláusulas gerais da boa fé e do abuso de direito o comportamento do vendedor de coisa alegadamente defeituosa que, reconhecendo e admitindo a existência dos defeitos, comprometendo-se a repará-los, como aconteceu “in casu”, quer através de acordo e uso da R., no sentido de que passados 2 a 3 anos faria uma vistoria à moradia e repararia os defeitos, quer através de reunião para o efeito, em 09/06/2006, após lhe terem sido denunciados os defeitos, vem ulteriormente, contra facto próprio, invocar a caducidade, em consequência de o comprador, confiando justificadamente na seriedade do propósito de correcção dos defeitos manifestado pela conduta do vendedor, não ter actuado antes de se ter revelado na práticao resultado final de tais tentativas de resolução do problema (cfr. Ac. STJ, de 18/09/2014, rec. 1857/09.9TJVNF.S1.P1 e Ac. STJ, de 29/10/2013, rec. 364/03.4TBVRM.G1.S1, in www.dgsi.pt). 40ª. Deste modo, a R., ao invocar em juízo a caducidade do direito do A., quer a denunciar os defeitos, quer ao direito à sua reparação e/ou indemnização, incorre em abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, pelo que ao não decidir nesta conformidade, considerando as alegadas excepções de caducidade invocadas pela R. como improcedentes, a douta sentença recorrida violou o art.º 334º do C. Civil. 41ª. Dos docs. de fls. 178 e 179, 180 a 197, 215 e 226 dos autos, relativos aos empréstimos e suas prorrogações, verifica-se a necessidade da licença de utilização da moradia, que só foi emitida em 3/08/2004 e registada na matriz pela R., em 14/09/2004, registo que ficou mal feito, e determinou que o A., que já tinha o empréstimo aprovado, tivesse que pedir prorrogação do prazo, como consta do número 13 dos Factos provados, o qual veio a caducar, tendo sido necessário formular novo pedido de empréstimo, que obteve aprovação em 04/09/2004. 42ª. Ora, esta situação obrigou o A. a realizar novos registos provisórios e a suportar novos custos, que são da inteira responsabilidade da R., pelo que, ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, o A./recorrente deve ser ressarcido dos montantes despendidos com os registos provisórios. 43ª. No número 46 dos Factos provados, a douta sentença recorrida baseou-se nos docs. de fls 156 a 161, que não provam que as instalações estivessem certificadas e a funcionar nas datas neles apostas, já que a electricidade só foi instalada a partir de 22/6/2004, o gás, a partir de 27/7/2004 e a água em fins de Junho de 2004, conforme docs. de fls. 198, 199 e 200, pelo que são estas datas que devem figurar no número 46 dos Factos provados.
44ª. A testemunha EE, em audiência de julgamento no dia 15/01/2015, entre as 14:32:12 horas e as 14:52:01 horas, ao minuto 5, refere “…o sr. FF queria o apartamento que reunia as condições que ele precisava…e só não foi vendido porque ele tinha pressa, gostou, queria avançar, eu questionei o sr. AA para falar com o sr. CC….o sr. CC não dava datas…nessa altura € 150.000,00…”, sendo que a testemunha FF, em audiência de discussão e julgamento no dia 15/01/2015, entre as 17:07:31 horas e as 17:10:07 horas, refere entre o minuto 1 e o minuto 9, que “…Estive para comprar uma casa ao sr M… …era bem situada, eu tenho um filho deficiente motor e preciso de hospital perto, na altura facilitava-me imenso…contactei a D. EE…agendámos ver a casa…para meados de Janeiro 2004, foi quando conheci o sr. AA, estava interessado na casa por € 150.000,00, a minha esposa estava grávida e precisávamos de resolver a situação, estar tudo pronto em Junho…o sr. AA não conseguiu na altura disponibilizar a casa…A D. EE, porque eu andei a pressioná-la, a casa interessava-me, dizia-me que o sr. AA não conseguia fazer a escritura da outra casa…” .
45ª. Foi também referido pelo A., em audiência de julgamento (dia 15/1/2015, entre as 12:03:15 horas e as 12:55:48 horas) ao minuto 8 “…tive uma oferta de compra, na altura não pôde ser consumado porqueainda andávamos a confirmar prazos, e, realmente, verificou-se que a casa de Azeitão era quase impossível ser entregue na Páscoa…e não a vendi por € 150.000,00…vendi-a mais tarde por € 140.000,00…”, bem como pela testemunha EE , a propósito da entrega da casa, no seu depoimento em 15/1/2015, entre as 14:57:07 e as 15:07:52 horas, “….o sr. CC dizia sempre ao sr. AA que lhe ía entregar a casa na Páscoa…”, e, ainda, a testemunha GG, que a este respeito afirmou, ao minuto 8 do seu depoimento “…seria para a a altura da Páscoa de 2004, não foi entregue nessa altura…” 46ª. Destes testemunhos e da declaração do A., conjugados com o facto de a licença de utilização da moradia só ter sido obtida em Agosto de 2004 e a R. só ter efectuado o registo na matriz em 7/12/2004, apenas podendo fazer a escritura em 14/12/2004, retira-se que a casa do Pragal só não foi vendida por € 150.000,00 porque houve atrasos por parte da R. no processo da moradia, o que determinou que o A./recorrente tivesse um prejuízo na venda do apartamento de € 10.000,00, que é imputável à R., ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, que, assim, violou o art.º 564º, n.º 1 do C. Civil, pois dos depoimentos suprareferidos resulta, à saciedade, que se o A./Recorrente pudesse disponibilizar o apartamento, o sr. FF tê-lo-ía comprado. 47ª. Assim, a alínea b) dos Factos não provados deve passar a constar como mais um número dos Factos provados. 48ª. O A., em audiência de julgamento do dia 15/01/2015, ao minuto 34 da sua declaração, refere “…o estado em que a casa me ficou…quando entrei em casa fiquei maluco…fartei-me de falar com o sr.CC, que me disse que tratava de tudo, só me pediram para tirar os cortinados, o que fiz…havia pó por tudo quanto era sítio, os utensílios da cozinha, tudo cheio de pó…tive danos num computador, numa impressora, …tive que contratar uma pessoa para me fazer a limpeza…roupa toda para lavar, tudo…” e a testemunha EE, no seu depoimento prestado no dia 15/01/2015, entre as 14:57:07 e 15:07:52 horas, gravado em CD audio, refere, ao minuto 5 e seguintes, “…a aparelhagem de som foi substituída, o sr. AA comprou uma simples…o computador e a impressora não comprou…os senhores começaram as obras sem acautelar nada, a limpeza foi feita pelo sr. AA, inclusive fui eu que entreguei o dinheiro à senhora da limpeza, cerca de 300 euros…a aparelhagem antes das obras funcionava, depois não…ao fim de semana as míúdas, antes, estavam naquele computador…”, e, ainda, o depoimento da testemunha eng.º HH, prestado em 22/01/2015, entre as 11:07:00 horas e as 11:25:59 horas, que refere, ao minuto 11 e seguintes “...aquilo estava…fazem reparações e não protegem nada…lixam uma parede, estava tudo cheio de pó, isso vi eu, a sala dos computadores estava completamente cheia de pó…era um portátil e uma torre…a aparelhagem da filha estava cheia de pó, uma das vezes que lá fui tentámos pô-la a funcionar e nada…os computadores foi o AA que me telefonou, estivemos a ver se conseguíamos…”. 49ª. Destes depoimentos, resulta, à saciedade, que a R. aquando das obras que realizou na moradia em 2012, não protegeu os bens do A. e deixou toda a casa, móveis e roupas repletos de pó, para além de ter causado estragos numa aparelhagem de som do A.; num computador e numa impressora, para além de não ter efectuado a devida limpeza, peloque a matéria de facto constante das alíneas y); z); aa); bb) e cc) dos Factos não provados da douta sentença recorrida devem passar a constar dos Factos provados, com as legais consequências. 50ª. O fax de 29/12/2006 referido no n.º 16 dos Fcatos provados não foi recepcionado nem pelo A., nem pelo seu mandatário, tendo sido impugnado, nessa medida, pelo que não podia a douta sentença recorrida tê-lo considerado, até porque, as transmissões telemáticas estão sujeitas a erros humanos e mecânicos, e bastava ser mal enviado, a folha mal colocada no aparelho, para o seu conteúdo não ser recepcionado, sendo que a nota de ok , não assegura que o seu teor tenha sido recepcionado, pelo que só por carta regista com A/R ou por outro meio seguro quanto à sua recepção tal desiderato podia ter sido conseguido, o que “in casu”, manifestamente, não aconteceu, pelo que a referência ao fax de 29 de Dezembro de 2006 deve ser retirada do referido número. 51ª. Aliás, a junção aos autos do referido fax, viola o art.º 87º, n.º 1, al. f) do Estatuto da Ordem dos Advogados, pois constitui violação do dever de sigilo profissional (Ac. Cons. Sup. de 26/2/88, R.O.A 48-1039; Ac. RL, de 9/3/95, CJ, Ano XX, Tomo II, Pág. 67), pelo que ao referido documento não devia ter sido dada qualquer relevância, devendo, até, ser desentranhado dos autos e devolvido à parte que o apresentou. 52ª. Finalmente, a douta sentença recorrida condenou a R. no pagamento ao A./Recorrente de uma indemnização por danos não patrimoniais, no montante de € 5.000,00, o que, face à factualidade provada e ao prolongamento da situação por 11 anos, imputável à R ., que se comprometeu várias vezes a efectuar os trabalhos em falta e a corrigiras deficiências, e iniciava intervenções, que logo interrompia, sistematica e recorrentemente, criando uma situação de grande desgaste e sofrimento para o A./Recorrente, o que justifica que, a este título, lhe seja arbitrada a indemnização peticionada de € 10.000,00. Nestes termos e nos mais de direito, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve: - Serem consideradas procedentes as alegadas nulidades de sentença, com as legais consequências; - Ser o presente recurso considerado procedente, por provado e, em consequência, ser a douta sentença revogada e substituída por douto acordão que acolha a tese do Recorrente…..»
*
**
Na perspectiva da delimitação pelo recorrente[2], os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 635º nº 4 e 639º do novo Cód. Proc. Civil)[3], salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 608º do novo Cód. Proc. Civil ).
Das conclusões acabadas de transcrever, decorre que as questões suscitadas no recurso são:
Nulidade da sentença ( por omissão de pronúncia e por contradição entre os fundamentos e a decisão Art.º 615º nº 1 al. D) e C) respectivamente);
Erro na apreciação da prova e na decisão de facto no tocante aos pontos 9 e 16º dos factos provados e al. b), y), z), aa), bb), e cc) dos factos não provados e consequente alteração da decisão jurídica em que tais pontos poderiam influir.
Erro na decisão jurídica por não se verificar a caducidade do direito à eliminação e denúncia dos defeitos e por existir abuso de direito da R. ao invocá-la.
Erro na aplicação do direito relativamente ao quantum da indemnização por danos não patrimoniais.
*
** Dos factos
Na primeira instância foi proferida a seguinte decisão em matéria de facto:
« Factos provados A factualidade dada como provada, e com relevância para a boa decisão da causa, é a seguinte: 1. No dia 11 de Outubro de 2003, o Autor e a Ré celebraram um acordo intitulado contrato promessa de compra e venda. 2. Nos termos desse acordo, a Ré prometeu vender ao Autor que prometeu comprar um terreno e moradia sito …, pelo preço de € 274.338,84 (duzentos e setenta e quatro mil trezentos e trinta e oito euros e oitenta e quatro cêntimos). 3. Nesse acordo ficou estipulado que a escritura pública de compra e venda seria outorgada logo que a moradia tivesse licença de utilização. 4. Nos termos da cláusula quarta desse acordo foi estipulado que “Todos os trabalhos que possam impedir a emissão de licença de utilização só serão executados após o seu levantamento e celebração da escritura de compra e venda”. 5. Nesse acordo ficou estipulado que a moradia seria executada de acordo com o documento anexo ao intitulado contrato promessa. 6. O Autor solicitou à Câmara Municipal de Setúbal uma vistoria para verificação das deficiências da moradia. 7. Em 3 de Agosto de 2004 a Câmara Municipal de Setúbal emitiu a licença de utilização da moradia. 8. A Ré não executou a iluminação no interior da piscina. 9. No dia 29 de Maio de 2004, o agregado familiar do Autor foi viver para a moradia. 10. Com o propósito do Autor vender o seu apartamento sito no Pragal e para que a Caixa Geral de Depósitos lhe pudesse conceder um empréstimo para aquisição da moradia. 11. Nessa altura a moradia ainda se encontrava com os trabalhos por concluir. 12. Em Fevereiro de 2004, a Caixa Geral de Depósitos concedeu ao Autor o empréstimo. 13. O Autor prorrogou o prazo do empréstimo por mais 3 meses. 14. No dia 14 de Dezembro de 2004, Autor e Ré celebraram a escritura de compra e venda. 15. O Autor vendeu o seu apartamento sito no Pragal pelo preço de € 140.000,00 (cento e quarenta mil euros). 16. O Autor, por si e por intermédio do seu mandatário, fez sucessivas interpelações à Ré por escrito, pedindo a conclusão da obra e a reparação de deficiências, por cartas datadas de 25 de Julho de 2005 (com fax anexo datado de 13 de Julho de 2005), 17 de Outubro de 2005, 1 de Novembro de 2005, 23 de Novembro de 2005, 23 de Dezembro de 2005, 6 de Maio de 2006, 30 de Maio de 2006, a qual respondeu, por si e por intermédio do seu mandatário, por cartas datadas de 27 de Julho de 2005, 10 de Outubro de 2005, 24 de Outubro de 2005, 18 de Dezembro de 2005, 3 de Janeiro de 2006, 18 de Abril de 2006, 9 de Maio de 2006, e fax datado de 29 de Dezembro de 2006. 17. Em 2 de Janeiro de 2006, a pedido do Ré, deslocaram-se à moradia dois técnicos da empresa que procedeu à instalação da caldeira que se desligava quando se abre uma segunda torneira, mantendo a piscar um led com o símbolo de chama. 18. Em 9 de Junho de 2006 ocorreu uma reunião entre o Autor, o sócio gerente da Ré, o técnico responsável pela obra, técnicos de arquitetura e engenharia e especialistas em construção civil com o propósito de se aferir o estado da obra. 19. No decurso dessa reunião foi elaborada uma lista elencando as deficiências detetadas. 20. A Ré, por via do seu representante legal, reconheceu tais deficiências. 21. E comprometeu-se a reparar tais deficiências. 22. A Ré não terminou os seguintes trabalhos: - fornecimento e montagem do chuveiro de apoio à piscina. - fornecimento de peças de reserva como acordado inicialmente. - fornecimento e montagem do telheiro (3,5m x 1,7m) com forno, churrasqueira e bancada com lava loiça de acordo com a foto anexa ao contrato promessa. - entrega do projeto da piscina para formalizar a sua legalização na Câmara Municipal de Setúbal. - iluminação do interior da piscina. - instalação do sistema de rega definitivo. 23. Os trabalhos executados apresentam as seguintes deficiências: - existência de fissuras em todas as paredes interiores. - juntas e pavimentos das varandas sem betume. - caixilharias empenadas de todos as portas dos roupeiros. - parede, pavimento e juntas do escritório e da despensa com manchas de humidade. - as pedras da lareira da sala estão partidas. - sobreposição das portas do armário da bancada da casa de banho do rés-do-chão. - falta de estanquicidade da cabine do duche que apresentava brechas laterais. - remates, rodapés e sancas da cozinha com fissuras. - erro de montagem nos azulejos ao lado da porta de ligação à casa das máquinas; - porta metálica de acesso à garagem com manchas de tinta. - gavetas dos móveis da cozinhas são de plástico ao invés de metálicas conforme acordado e constante da casa modelo. - pedras da bordadura da piscina com fissuras. - portão exteriores de acesso à casa (viaturas/pessoas) com dificuldade ao nível do sistema de abertura e fecho. - a caixa do correio é permissiva à entrada de água e apresenta dificuldades ao nível da fechadura. - cabine do duche, base do chuveiro da casa de banho da suite e do 1.º andar, e azulejos apresentam-se partidos e com falta de esmalte. - infiltrações de água ao nível da casa de banho do 1º. Andar. - aparecimento de bolhas nas paredes da garagem. - fissuras ao nível das juntas do pavimento e mosaicos partidos. - muro do fundo da propriedade com fissuras e acabando por cair bocados. - fissuras ao nível da ligação das casas ao exterior. - as armaduras da iluminação exterior apresentam manchas de ferrugem. 24. A Ré não colocou batentes nas portas dos armários da cozinha e na união das pedras. 25. A Ré não instalou o automático no aquecimento central. 26. O Autor efetuou a instalação posterior do automático no aquecimento central. 27. A Ré não instalou o sistema de rega automática nos dois espaços de jardim da moradia. 28. O Autor procedeu à instalação de dois sistemas de rega provisórios. 29. O Autor solicitou um orçamento para concluir os trabalhos e reparar as deficiências cujo valor é de € 40.493,00 (quarenta mil quatrocentos e noventa e três cêntimos). 30. No dia da escritura, a Caixa Geral de Depósitos emitiu um cheque no valor de € 247.151,00 (duzentos e quarenta e sete mil cento e cinquenta e um euros), quantia superior ao preço remanescente da moradia, mas que o Autor entregou à Ré, que se comprometeu a devolver o excedente. 31. No dia 13 de Março de 2005 foi debitada na conta do Autor a quantia de € 336,00 (trezentos e trinta e seis euros) referente a custas com apresentações registrais, sendo a quantia de € 144,00 (cento e quarenta e quatro euros) relativa a dois registos de cancelamento de hipotecas da Ré. 32. O Autor esteve de baixa psiquiátrica desde Julho de 2005 até data não especificada, e medicado, diariamente, com ansiolíticos e antidepressivos. 33. O Autor era uma pessoa alegre e divertida e passou a sofrer de insónias e a isolar-se, e vive ensimesmado. 34. Tal quadro depressivo causou tensão e ansiedade no seio da família. 35. E provocou uma degradação na relação do Autor com a sua companheira e a sua filha, criança à data dos factos. 36. Tal estado depressivo afetou o relacionamento do Autor com os amigos. 37. Este passou a assumir um comportamento irritável. 38. E passou a isolar-se. 39. O Autor sentiu-se angustiado. 40. À data dos factos, o Autor vivia diversos problemas de natureza laboral, o que acabou por levar à sua reforma antecipada. 41. A construção da moradia foi efetuada com o recurso ao crédito bancário por parte da Ré. 42. A Ré instalou equipamento ecológico na piscina da moradia. 43. A Ré acordou com o Autor realizar trabalhos de reparação da casa de banho do apartamento do Pragal. 44. Na sequência desse acordo forneceu uma cabine. 45. E ocupou um operário na pesquisa e deteção da rotura da respetiva canalização. 46. As infraestruturas de água, eletricidade e telecomunicações foram inspecionadas, certificadas e ligadas definitivamente em 7 de Maio de 2004, 17 de Maio de 2004 e 19 de Maio de 2004, respetivamente. 47. O Autor acompanhou a execução dos trabalhos desde o momento em que firmou o contrato promessa de compra e venda até à sua conclusão.
Factos não provados Com relevância para a boa decisão da causa, não se provou que: a) Face ao atraso na entrega da moradia o Autor tivesse que justificar a prorrogação do prazo de empréstimo por mais 3 meses. b) Devido ao atraso na entrega da moradia, na celebração da escritura e na concessão do empréstimo bancário, o Autor deixou de vender o apartamento pelo preço de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros). c) Era do conhecimento do Réu que a Caixa Geral de Depósitos só concedia o empréstimo para a aquisição da moradia depois de liquidado o empréstimo contraído para aquisição do andar sito no Pragal. d) Os técnicos da empresa que procedeu à instalação da caldeira da moradia concluíram que a caldeira apresentava um problema de saída de gases. e) A Ré não terminou os seguintes trabalhos: - o difusor da lareira colocado num quarto apresenta a tubagem que transporta o ar quente à vista; - a viga principal da pérgola tem o ferro à vista que também apresenta sinais de ferrugem; - chapa de vedação sobre os muros existentes em todo o perímetro das traseiras. f) Os trabalhos executados apresentam as seguintes deficiências: - descascamento do revestimento e pintura do pilar do hall de entrada; - armários despenseiros da cozinha que empenados o que impossibilita a colocação das prateleiras. - irregularidades ao nível do remate ao teto da tubagem do exaustor. - muro do fundo com fissuras com extensão superior a 2 metros. - fissuras no muro da frente e piso exterior. -infiltrações de água ao nível do telhado do quarto das traseiras/nascente. - o pavimento da garagem permite a entrada de água no seu interior. - manchas de humidade nas paredes que ladeiam a janela no escritório. - portas do armário da bancada da casa do 1º. Andar com sobreposição. g) A quantia de € 336,00 (trezentos e trinta e seis euros) debitada na conta do Autor no dia 13 de Março de 2005 se referia integralmente a custas com o cancelamento de duas hipotecas constituídas pela Ré. h) A instalação de dois sistemas de rega pelo Autor teve um custo no valor de € 930,00 (novecentos e trinta euros). i) A instalação do automático do aquecimento central pelo Autor se deveu ao frio, e que por este despendeu a quantia de € 100,00 (cem euros). j) A Ré retirou do lote do Autor seis andaimes modulares e respetivos travamentos, seis simples a dois pontos, três cruzados móveis a quatro pontos e três estáticos a quatro pontos que servem de guarda-costas. k) A situação psicológica do Autor não contribuiu para o desenvolvimento e crescimento normais e saudáveis da sua filha, causando sofrimento ao Autor. l) A escritura pública não foi celebrada na data estipulada devido ao Autor não ter obtido o empréstimo junto da Caixa Geral de Depósitos, nos montantes de € 166.867,00 (cento e sessenta e seis mil oitocentos e sessenta e sete euros) € 20.284,00 (vinte mil duzentos e oitenta e quatro euros) e € 60.000,00 (sessenta mil euros). m) Os encargos bancários suportados pela Ré no período de ocupação e utilização da moradia pelo Autor antes da celebração da escritura de venda ascenderam a € 9.050,00 (nove mil e cinquenta euros). n) Nos termos do acordo estipulado, a Ré não se obrigou a fornecer o equipamento destinado à piscina. o) A Ré despendeu a quantia de € 4.250,00 (quatro mil duzentos e cinquenta euros) pelo equipamento ecológico instalado na piscina da moradia do Autor. p) O fornecimento e montagem da portada para a casa das máquinas da piscina importou em € 247,45 (duzentos e quarenta e sete euros e quarenta e cinco cêntimos. q) O despendeu as quantias de € 551,00 (quinhentos e cinquenta e um euros) e € 190,00 (cento e noventa euros) na aquisição do Senso Coluna, do espelho e dos apliques instalados a pedido do Autor na casa de banho da suite da moradia. r) A cabine fornecida pela Ré para instalação na casa-de-banho do apartamento do Autor sito no Pragal tinha um valor de € 420,00 (quatrocentos e vinte euros). s) Os trabalhos realizados pela Ré no apartamento do Autor sito no Pragal tenham ocupado um operário durante dois dias e importado despesas salariais para a Ré no valor de € 150,00 (cento e cinquenta euros). t) A Ré despendeu a quantia de € 144,00 (cento e quarenta e quatro euros) no cancelamento de dois registos de hipoteca que incidiam sobre o prédio. u) A instalação do sistema de rega definitivo consistia apenas tão só na instalação dos pontos de tomada à frente e à retaguarda para instalação pelo prestador de serviço de jardinagem. v) O Autor não reclamou antes do enchimento da piscina da falta de iluminação da piscina. w) A Ré não se obrigou a fornecer e montar o chuveiro de apoio à piscina e a entrega do projeto da piscina para formalizar a sua legalização na Câmara Municipal de Setúbal. x) Nos termos do acordo estipulado entre Autor e Ré não estava incluída a instalação do jardim. y) No período de 9 de Dezembro de 2012 a 26 de Maio de 2012, aquando da execução dos trabalhos, a Ré causou estragos numa aparelhagem de som do Autor. z) Tendo o Autor despendido a quantia de € 179,10 (cento e setenta e nove euros e dez cêntimos) na sua substituição. aa) A Ré causou estragos num computador Compaq Pentium IV, no valor de € 600,00 (seiscentos euros), numa impressora HP Deskjet 1220C, no valor de € 150,00 (cento e cinquenta euros). bb) Após a execução dos trabalhos, a Ré não efetuou a limpeza na casa. cc) Tendo o Autor despendido nessa limpeza a quantia de € 300,00 (trezentos euros).»
*
** Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia
Alega o recorrente que a sentença é nula, porquanto, tendo invocado a existência de abuso do direito por parte da R. ao invocar a caducidade do direito à reparação dos defeitos, quando anteriormente os havia reconhecido e se comprometera a repará-los, o Tribunal não se pronunciou sobre tal matéria.
O Sr. Juiz, apreciando tal invocação, sustentou que a sentença não padece do alegado vício, porquanto, a apreciação de tal questão ficou prejudicada pelo reconhecimento da verificação da invocada caducidade do direito à reparação, porquanto se considerou que o alegado reconhecimento dos defeitos só seria impeditivo da caducidade se tivesse ocorrido antes do decurso do respectivo prazo, o que, no entender do Sr. Juiz, não tinha sucedido (o reconhecimento existira depois de decorrido o prazo de caducidade do direito). Assim ao julgar procedente a caducidade, considerou prejudicada a apreciação do alegado abuso de direito.
Não nos parece que no caso se verifique uma questão de prejudicialidade na apreciação da questão do alegado abuso de direito. Na verdade o abuso do direito ocorre exactamente quando, formalmente se verificam os pressupostos de facto e de direito do DIREITO alegadamente exercido abusivamente, pelo que importa apreciar se se verificam os pressupostos que tornam esse exercício abusivo e consequentemente ilícito, á luz do disposto no art.º 334º do CC. Ao deixar de conhecer de tal questão, na sentença, ficou esta inquinada de nulidade, por omissão de pronúncia.
Procede pois a invocada nulidade da sentença, que oportunamente será reparada, por este Tribunal, se for caso disso, já que está também posta em causa no recurso a bondade da decisão quanto à existência da caducidade do direito à denúncia e reparação dos defeitos da obra, pelo que inexistindo a caducidade, fica prejudicada, aqui sim, a apreciação do alegado abuso do direito.
*
** Da nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão.
Nos termos do art.º 615º, n.º 1 al. c) do novo CPC, cuja redacção é idêntica à do artigo 668º nº 1 al. c) do anterior CPC, a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão. Trata-se de um vício lógico. Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica. No processo lógico, as premissas de direito e de facto apuradas pelo julgador conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas ao oposto[4]. Uma coisa é o erro na subsunção dos factos à norma jurídica, o erro na interpretação da norma jurídica, o erro de julgamento[5] ou até mesmo a contradição que possa existir entre os factos que a sentença dá como provados e outros já apurados no processo, designadamente por já haverem sido incluídos nos factos assentes, e outra, muito diferente, é a oposição referida na al. c) do n.º 1 do art.º 615º, geradora de nulidade[6]. Das alegações e das conclusões decorre que se imputa à sentença, a existência de contradição entre o facto dado como provado sob o nº 22 e a conclusão retirada pelo tribunal, de que das obras contratadas apenas não foram realizadas a iluminação interior da piscina e a instalação do sistema de rega definitivo.
É entendimento uniforme da jurisprudência que a nulidade da sentença prevista na alínea c) do art.º 615 do novo CPC [anterior art.º 668º n1 al. c)] só se verificará quando exista vício intrínseco no processo lógico de decisão (Rodrigues Bastos, "Notas ao CPC", vol. III, p. 246). Ou seja, pressupõe um erro lógico na ponta final da argumentação jurídica - os fundamentos invocados apontam num sentido e, inesperadamente, contra a conclusão decisória que dos mesmos, e dentro da linha de raciocínio adoptada, se esperava, veio a optar-se pela solução adversa (acórdãos do STJ de 26.04.95 Publicado na CJSTJ, ano III, 1995, vol. II, p. 57., 30.10.96, Proc. nº 366/96, 14.5.98, Proc. nº 297/97 e de 23.11.2000, Proc. nº 3080/00). É indispensável, portanto, que os fundamentos invocados pelo juiz devessem logicamente conduzir a resultado oposto ao que vier expresso na sentença[7]. Se a decisão está certa, ou não, é questão de mérito, e não de nulidade da mesma.
O Sr. Juiz, no despacho de sustentação, defendeu não se verificar a alegada nulidade. Para tanto argumentou que « face à prova produzida em audiência de julgamento apurou-se que a moradia se encontrava com os trabalhos por concluir (ponto 11 da matéria de facto provada), mais se elencando quais os trabalhos que faltava concluir (ponto 22 da matéria de facto provada). Por outro lado, deu-se por igualmente provada a existência de contrato celebrado entre as partes e reduzido a escrito com anexo onde as partes fizeram constar as exatas obras a realizar pela Ré (ponto 5 da matéria de facto provada). Neste sentido, importa ter em consideração que são realidades distintas apurar quais os trabalhos que foram detetados como estando inacabados na moradia por parte da Ré e os trabalhos que são obrigação da Ré por força do vínculo contratual estabelecido. O que se logrou apurar foi, apenas - e era essa a verdadeira questão decidenda - quais os trabalhos que se verificavam como inacabados na moradia, e, dentro desses, concatenada que foi a matéria de facto dada como provada (referidos pontos 5, 11 e 22 da matéria de facto provada), demonstrar quais os que emergiam contratualmente como obrigação para a Ré».
Feita esta explicitação é óbvio que inexiste qualquer contradição na sentença com virtualidade para gerar a sua nulidade. Na verdade a conclusão que o Sr. Juiz retirou não está em contradição com a factualidade dada como provada, apenas se limita a circunscrever, de entre as faltas constatadas (art. 5,11 e 22) as que decorriam do anexo ao contrato promessa e que não foram executadas e deveriam ter sido, em cumprimento desse mesmo contrato.
Não existe, pois, qualquer oposição entre os fundamentos de facto (ou de direito) e a decisão pelo que improcede a invocada nulidade de sentença.
*
** Da impugnação da decisão de facto
Ouvidos os depoimentos das testemunhas indicadas pelo recorrente, no tocante aos pontos de facto que pretende ver alterados e vista a fundamentação da decisão de facto, entendemos que, com excepção do aditamento reclamado pelo recorrente relativamente ao ponto 9 dos factos provados, a decisão de facto não merece reparos, nem justifica qualquer alteração, porquanto os depoimentos referidos não impõem decisão diversa. Coisa que não sucede quanto ao aditamento ao referido ponto 9, no sentido de aí se consignar que o facto aí referido ocorreu por «autorização do representante legal da R.». Na verdade isso mesmo resulta das declarações de parte do Sr. CC. Assim o ponto nove dos factos provados passará a ter a seguinte redacção: 9. No dia 29 de Maio de 2004, o agregado familiar do Autor foi viver para a moradia, por autorização do legal representante da R..
Quanto ao mais mantém-se inalterada a decisão de facto.
*
** Do Direito
* Da caducidade do direito de denúncia e do direito à eliminação dos defeitos
A decisão recorrida apreciou a questão da caducidade do direito de denúncia e de acção do autor, tendo concluído pela caducidade dos mesmos.
A caducidade é uma excepção peremptória que, a proceder, determina a absolvição da demandada do pedido, nos termos do disposto no artigo 576º, nº 3 do Código de Processo Civil.
Dispõe o art.º 298.º, n.º 2 do C.C. que, “Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.”.
Nos termos do art.º 331º nº1, do mesmo diploma a caducidade só é impedida pela prática do acto, a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo, dentro do prazo legal ou convencional. Mas quando a lei fixa um prazo para o exercício de certo direito, não quer tornar esse direito dependente da observância do prazo, mas apenas fazê-lo extinguir, se o prazo não for observado (Manuel de Andrade, citado por Vaz Serra, Prescrição Extintiva e Caducidade, Pág. 587 e ss.). Assim, não há dúvidas que o fundamento do instituto da caducidade é a necessidade da certeza jurídica, isto é, a exigência de que certos direitos sejam exercidos durante certo prazo, a fim de que a situação jurídica fique definida e inalterável (Manuel Andrade in ob. cit. pág. 464).
Dispõe o nº 1 do art.º 331º do C.C. que a caducidade só é impedida pela prática do acto dentro do prazo legal, decorrendo do n.º 1 do art.º 332º, e assim tem sido entendido pela doutrina e pela jurisprudência, que o momento relevante para impedir a caducidade do direito, quando este tem de ser exercido através de uma acção judicial a propor dentro de certo prazo, é o momento da propositura da acção – art. 259º nº1 do CPC.
Nos termos do n.º 2, a caducidade pode, igualmente, ser impedida pelo reconhecimento do direito por parte do seu beneficiário, nos casos em que resulte de estipulação negocial (caducidade convencional), ou de disposição legal relativa a direitos disponíveis[8].
No que respeita aos limites subjetivos do reconhecimento, pressupõe-se que o ato seja praticado pelo sujeito a quem a caducidade aproveita, através de uma declaração dirigida ao titular do direito[9], impondo-se, por outro lado um limite temporal ao reconhecimento, só valendo como tal o ato que ocorra antes de esgotado o prazo de caducidade[10].
Na caducidade está em causa um verdadeiro prazo peremptório de exercício do direito enquanto pelo contrário na prescrição não se fixam prazos para o direito ser exercitado mas, antes, prazos a partir dos quais o devedor se pode opor ao exercício do direito, por não ser mais razoável, embora com possibilidades de os exercer (Carvalho Fernandes, Teoria Geral, 2ª. Ed., Vol. II, pág.546). Assim, enquanto o direito prescrito continua a existir, o direito caducado perdeu a sua existência.
*
**
A presente acção tem por objecto a condenação da R., na reparação dos defeitos do imóvel, por si construído e vendido ao A.
Fazendo antes de entrar na análise concreta do caso, importa fazer uma resenha dos regimes legais aplicáveis à venda de coisa defeituosa e ao exercício dos direitos com vista à eliminação ou reparação dos defeitos e bem assim da forma como os Tribunais têm aplicado tais regimes.
Perante os termos da alegação veiculados na petição poder-se-iam discutir dois regimes de caducidade do direito de acção: o do regime dos artigos 916.º e 917.º e o do art.º 1225.º, todos do Código Civil (C.C.).
Lê-se no art.º 916.º do C.C. que o comprador deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da coisa, excepto se este houver usado de dolo (n.º 1), devendo a denúncia será feita até trinta dias depois de conhecido o defeito e dentro de seis meses após a entrega da coisa (n.º 2), sendo que os prazos referidos no número anterior são, respectivamente, de um e de cinco anos, caso a coisa vendida seja um imóvel (n.º 3).
No que respeita à caducidade da acção, prescreve o art.º 917.º do C.C. que a acção de anulação por simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta seis meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no nº 2 do artigo 287.º.
Defronte a este regime, em estipulação especial, lê-se no art.º 1225.º do C.C. que sem prejuízo do disposto nos artigos 1219.º e seguintes, se a empreitada tiver por objecto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou por erros na execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente (n.º 1).
Neste seguimento, a denúncia, em qualquer dos casos, deve ser feita dentro do prazo de um ano e a indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia (n.º 2), sendo os prazos previstos no número anterior igualmente aplicáveis ao direito à eliminação dos defeitos, previstos no artigo 1221.º, estendendo-se tal regime ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado (n.º 4).
Tentaremos, para melhor esclarecimento, um tratamento da questão através da maiêutica, procurando resposta na jurisprudência de referência. Que mecanismos de defesa tem o adquirente de coisa defeituosa ao seu dispor? Relativamente aos direitos do comprador de coisa defeituosa, o seu reconhecimento pressupõe o funcionamento, de forma articulada, de três prazos: - o prazo de denúncia dos defeitos, que, tratando-se de imóvel a coisa vendida, é de um ano a contar do conhecimento dos mesmos, quer por força do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 916º, quer, se for o caso, por força do disposto no artigo 1225º, nºs 2 e 4, ambos do Código Civil; - o prazo de exercício do direito (eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato, indemnização): seis meses a contar da denúncia atempada dos defeitos, nos termos do artigo 917º do Código Civil, ou, na hipótese de ser aplicável ao caso, um ano, nos termos do nº 3 do artigo 1225º, ex vi do nº 4 do mesmo dispositivo; - o prazo (limite máximo da garantia legal) de cinco anos sobre a data da entrega da coisa vendida, independentemente da data do conhecimento dos defeitos e da sua denúncia, como decorre dos artigos 916º, nº3, parte final e 1225º, nº4 do Código Civil (Ac. Rc de 15-05-2012, proc. n.º 70/11.6TBTCS.C1, relator JUDITE PIRES, disponível em dgsi.pt, nosso destacado).
No caso sub judice, atento o teor da sentença, está em causa não só o prazo para a denúncia dos defeitos como o do exercício do direito, ou seja, o prazo que o adquirente ou proprietário dispõe para fazer actuar contra o vendedor/construtor relapso as obrigações decorrentes da existência de defeitos imputável a este.
Trata-se, necessariamente, de um prazo que tem ínsito um princípio de confiança no trafego jurídico das coisas e no sentido em que, tendo conhecimento do defeito, não permite ao adquirente/proprietário uma actuação meramente discricionária na oportunidade do exercício jurisdicional. Quer-se, evidentemente, obstar à perenidade do litígio e de modo a tornar mais eficiente a tutela. Quanto mais tempo passar mais desequilibrado será para o vendedor suportar o ónus de responder pelos vícios da coisa física, sujeita à sempre inexorável deterioração e natural perda de qualidades pelo devir do tempo. Em que situações se deve preferir o regime do art.º 1225.º do C.C., de maior pendor garantístico, ao regime supletivo do art.º 917.º do C.C.?
Perante a diferença de prazos, a amplitude do regime do art.º 1225.º encontra-se definida, prima facie, para o construtor (latu sensu) da coisa imóvel. Encontrando-se ambas as qualidades no Réu em acção judicial - vendedor e construtor – esta prefere àquela como regime especial pelo defeito em coisa imóvel.
Claro que, como em qualquer acção declarativa, o ónus de alegação é corolário indispensável da tutela reclamada. Não se apurando que o vendedor reúne também a qualidade de construtor, a acção para obter a reparação ou substituição dos defeitos de coisa imóvel vendida está sujeita ao prazo de caducidade do artigo 917º do Código Civil, que deverá ser aplicado por interpretação extensiva (Ac. RL, de 12-03-2009, proc. n.º 1094/08.6TBBRR.L1-2, relator NETO NEVES, acessível em dgsi.pt). Quando o vendedor não tenha sido o construtor do imóvel, o comprador apenas dispõe do prazo do artigo 917º do Código Civil (seis meses) para exercer contra ele o direito de acção para obter a eliminação de defeitos que afectem o prédio urbano adquirido (Ac. Rc de 15-05-2012, proc. n.º 70/11.6TBTCS.C1, relator JUDITE PIRES, disponível em dgsi.pt). No domínio das relações comprador/vendedor, emergentes do contrato de compra e venda de imóvel não construído pelo vendedor são aplicáveis os princípios contidos nos artigos 916º e 917º do CC, sendo pois de seis meses, após detectados e denunciados, o prazo para instaurar a acção quanto à reparação de defeitos verificados na obra (Ac. Re, de 02-02-2006, proc. n.º 1764/05-3, relator MARIA ALEXANDRA SANTOS, em dgsi.pt). O Decreto-Lei nº 267/94, de 25 de Outubro, ao alterar o artigo 1225º do Código Civil submeteu ao regime de empreitada a venda de imóvel quando o vendedor haja sido simultaneamente o construtor. O comprador de um imóvel apenas dispõe do prazo de um ano, contado da data da denúncia dos defeitos, para judicialmente exigir do vendedor a eliminação dos mesmos quando o vendedor tenha sido simultaneamente o construtor do mesmo imóvel. O vendedor não tem a qualidade de construtor quando apenas promoveu a construção do imóvel através de empreitada, a menos que o tenha feito no âmbito de uma actividade profissional de construção/venda, ou com o propósito de, lucrativamente, proceder à sua venda posterior (Ac. Rc de 15-05-2012, proc. n.º 70/11.6TBTCS.C1, relator JUDITE PIRES, disponível em dgsi.pt). O regime do nº 4 do art. 1225º do CCiv. só é aplicável ao caso de ter sido o vendedor a construir, modificar ou reparar o imóvel; não quando o vendedor promoveu a construção por empreitada. O prazo de caducidade do direito de acção previsto no art. 917º do CCiv. – seis meses após a denúncia – para o caso de anulação por simples erro, será de estender às situações em que se peça a reparação ou substituição da coisa, a redução do preço e o pagamento de uma indemnização pela violação contratual positiva (Ac. RP, de 11-12-2007, proc. n.º 0725473, relator RODRIGUES PIRES, em dgsi.pt).
Nestes termos, o comprador de coisa defeituosa não pode auferir da proteção do art.º 1225.º contra o vendedor da coisa sem que este seja construtor da coisa. O artigo 917.º deve ser aplicado às acções que visem o direito à reparação ou o direito à indemnização pela existência de defeito na coisa vendida imputável ao vendedor?
Aqui a resposta tem sido, inequívoca e univocamente, positiva. O vendedor – presumindo-se a sua culpa – quando a prestação for defeituosamente cumprida, responde pelos prejuízos causados ao credor, nomeadamente, pela eliminação dos defeitos. Sendo a execução defeituosa da prestação um acto ilícito tem o credor lesado que alegar e demonstrar os restantes requisitos da responsabilidade civil, e, desde logo, os factos que integram, esse incumprimento, ou seja, o defeito. O art.º 917.º do CC deve ser interpretado extensivamente, no sentido de abranger todas as acções baseadas no cumprimento defeituoso, incluindo, naturalmente, aquelas em que se peça a reparação da coisa. O prazo de caducidade da acção previsto no art.º 917.º do CC pode, excepcionalmente, ser alargado nos termos do disposto no art.º 287.º, nº 2. E assim, tendo a denúncia sido efectuada em tempo e não estando cumprida qualquer uma das obrigações do contrato, designadamente o pagamento do preço acordado, os direitos do comprador podem ser feitos sem dependência de prazo. A interpretação extensiva para aplicabilidade do prazo de exercício da acção anulatória às demais acções fundadas em vício da coisa vendida (art.º 917.º), impõe-se nos mesmos termos no tocante à aplicabilidade do nº 2 do art.º 287.º do CC. (Ac. STJ, de 24-05-2012, proc. n.º 1288/08.4TBAGD.C1.S1, relator SERRA BAPTISTA, em dgsi.pt).
Assim, o artigo 917 do Código Civil de 66, relativo à caducidade do direito de anulação por simples erro, aplica-se, por interpretação extensiva, ao caso de reparação de coisas defeituosas vendidas. Em tais termos, os defeitos devem ser denunciados até 30 dias depois do seu conhecimento e dentro de 6 meses após a entrega da coisa vendida, caducando a acção de reparação desta findo qualquer desses prazos sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos 6 meses sobre esta (Ac. STJ, de 12-01-1994, proc. n.º 084501, relator PAIS DE SOUSA, disponível em dgsi.pt). No domínio da venda de coisas defeituosas realizada entre profissionais (não consumidores) rege o regime jurídico previsto nos art.ºs 913º a 922º, do CC, sendo de aplicar o prazo curto de caducidade previsto no art.º 917 à acção de indemnização fundada na violação contratual positiva sempre que se trate de pretensão fundada no defeito previsto no art.º 913º. O prazo de caducidade de seis meses, previsto no art.º 917º, do CC, deve aplicar-se, por interpretação extensiva, para além da acção de anulação, também às acções que visem obter a reparação ou substituição da coisa, ou ainda a redução do preço e o pagamento de uma indemnização pela violação contratual (Ac. RC, de 12-06-2012, proc. n.º 4752/08.1TBLRA.C1, relator FONTE RAMOS, acessível em dgsi.pt). O prazo de seis meses, previsto na letra do artigo 917º para a propositura da acção de anulação com fundamento em erro, vale também (por interpretação extensiva) para a propositura (Ac. STJ, de 05-03-2013, proc. n.º 3298/05.4TVLSB.L1.S1, relator MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA, em dgsi.pt)».
*
Do que acaba de dizer-se pode concluir-se que no regime da venda de coisa defeituosa, estando em causa um bem imóvel, o prazo para denúncia dos defeitos é de um ano depois de ser conhecido o defeito e até cinco anos após a entrega da coisa (art.º 916.º, n.ºs 3); e o prazo de caducidade do direito de acção é o previsto no art.º 917.º para a acção de anulação por simples erro, e, por analogia, para a acção a exigir a reparação ou seja, seis meses após a denúncia dos defeitos, ou, se não tiver havido denúncia, seis meses após o decurso dos prazos fixados no art. 916.º - como vem sendo entendimento maioritário da doutrina e da jurisprudência[11].
No entanto, se a compra e venda tiver por objecto bem imóvel destinado a longa duração, que tenha sido construído, reparado ou modificado pelo vendedor, o prazo de caducidade do direito de acção para reparação dos defeitos é o prazo de um ano previsto no nº 3 do artº 1225º, por remissão para o nº 2 do mesmo preceito.
É o que resulta do n.º 4 do mesmo artº 1225º, que assim manda aplicar àquela situação específica o regime do contrato de empreitada.
Como é sabido, o nº1 do artº 1225º estabelece um regime especial de responsabilidade do empreiteiro, no caso de imóveis de longa duração, responsabilidade essa perante o dono da obra ou terceiro adquirente.
Ora, o acrescento relativo ao “terceiro adquirente” deveu-se à redacção que à norma veio dar o disposto no D.-L. nº 267/94 de 25 de Outubro. Como resulta do seu preâmbulo, visou-se com aquele Diploma proteger o direito do cidadão adquirente, enquanto consumidor, responsabilizando o empreiteiro, “…tenha ou não sido ele o vendedor, não só perante o dono da obra, como já sucedia anteriormente, mas também perante terceiro que adquiriu o imóvel…”.
No encalço de tal modificação normativa, o mesmo diploma acrescentou o já referido nº4, com a seguinte redacção: “O disposto nos números anteriores é aplicável ao vendedor do imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado”.
Como se escreveu no Ac. do STJ de 18.02.03, disponível in www.dgsi.pt., para a aplicação do regime da empreitada à compra e venda no caso particular previsto no nº 4 do art. 1225.º apontam razões ponderosas, desde a analogia de situações até ao carácter de interesse e ordem pública da responsabilidade do empreiteiro ou construtor, passando pelos efeitos socialmente injustos da aplicação ao comprador do imóvel com defeitos de um curto prazo de caducidade do seu direito de acção com vista à reparação dos mesmos.
Se o vendedor construiu o imóvel através de empreiteiro, assume a posição de dono da obra e a situação do terceiro adquirente está salvaguardada pelo disposto no nº 1 do artº 1225º, podendo demandar directamente o empreiteiro para reparação dos defeitos do imóvel, em relação ao qual beneficia do prazo de caducidade de um ano previsto nos nºs 2 e 3 do artº 1225º.
Assim, em princípio, construtor nos termos e para os efeitos do disposto no nº 4 do artº 1225º, será quem construiu por meio de gestão directa.
Mas, se o vendedor promoveu a construção de um imóvel com a finalidade de o vender e obter lucro dessa venda, já tem de se considerar que assume a qualidade de construtor nos termos e para os efeitos do disposto no preceito em análise, não sendo relevante que tenha adjudicado a empreiteiro a execução das respectivas obras[12]. Justifica-se aqui o alargamento do prazo para instauração da acção em que se pede a reparação dos defeitos porque também são válidas para esta situação as razões de protecção do cidadão adquirente, enquanto consumidor, e o carácter de interesse e ordem pública da responsabilidade do empreiteiro ou construtor que estiveram na base das alterações efectuadas ao art. 1225º pelo DL 267/94.
Feito o esquiço dos regimes, importa apreciar o caso concreto.
Da factualidade assente e com relevantíssimo interesse para o conhecimento da questão da caducidade do direito do autor à eliminação dos defeitos e à sua denúncia, decorre que a R. é simultaneamente a construtora e a vendedora do imóvel, objecto da presente acção e que foi adquirido pelo A., mediante contrato de compra e venda, titulado por escritura pública lavrada no dia 14 de Dezembro de 2004 (ponto 14 dos factos provados).
Na sentença considerou-se ter ocorrido caducidade dos direitos do A. com a seguinte argumentação: « Ao contrato de compra e venda sobre bens imóveis aplica-se, em caso de verificação de defeitos, o regime previsto para o contrato de empreitada quanto à denúncia dos defeitos em edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração, e em cuja base esteve a proteção do consumidor (art.º 1225.º, n.º 4, do Código Civil). A lei prevê assim três prazos a cumprir pelo dono da obra: (1) o prazo de um ano para fazer a denúncia dos defeitos, prazo que se conta a partir do descobrimento dos mesmos (art.º 1220.º, n.º 1, do Código Civil), (2) o prazo de um ano, a partir da denúncia, para pedir a indemnização ou a eliminação dos defeitos, e (3) o prazo de cinco anos, a contar da entrega da obra, dentro dos quais terá que ser feita a denúncia e proposta a ação de indemnização ou reparação do imóvel. …. Ora, conforme resulta da matéria de facto provada, Autor e Ré trocaram diversa correspondência entre si neste âmbito. Contudo, da análise do conteúdo das cartas e fax remetidos pelo Autor à Ré resulta que o mesmo apenas comunicou a existência de deficiências de forma clara e concreta nas seguintes cartas: - de 17 de Outubro de 2005 (portão exterior com problemas, caldeira/sistema de águas quentes com problemas, WC inoperativa, prateleiras em risco de caírem, as portas de armários que não fecham); - de 1 de Novembro de 2005 (WC do R/C inoperativo, saída de ar quente da lareira para o quarto do 1.º andar continuava sem grelha, os roupeiros e armários dos WC sem fechar); - de 25 de Novembro de 2005 (infiltrações no WC do 1.º andar, portão exterior do acesso de viaturas com dificuldades em abrir). - de 23 de Dezembro de 2005, (por via do seu mandatário) comunicou à Ré uma listagem extensa e concretizada das deficiências que entende carecerem de reparação. Importa observar que o Autor foi residir para a moradia em 29 de Maio de 2004, conforme resulta da matéria de facto provada (facto que estava assente entre as partes). Ora, sendo os defeitos elencados nas cartas datadas de 17 de Outubro, 1 de Novembro e 25 de Novembro, todas de 2005, defeitos aparentes, deveriam ter sido conhecidos imediatamente pelo Autor aquando da ocupação da moradia, e ter sido denunciados até 29 de Maio de 2005 (art.º 1220.º, n.º 1, do Código Civil), prazo o qual foi ultrapassado, tendo caducado (art.º 1225.º do Código Civil), não tendo o Autor logrado provar que aceitou a moradia com reserva sobre os alegados defeitos. “Defeitos aparentes” são os que se revelam por sinais visíveis e permanentes, isto é, todos aqueles que podiam e deviam ser reconhecidos por um homem médio com inteligência média[13]. Não se vislumbram motivos para que o Autor não tivesse tomado conhecimento dos mesmos antes, pelo que, se os denunciou em conformidade, mas tardiamente, fê-lo invocando um direito que já não existia. No que concerne às deficiências comunicadas por carta datada de 23 de Dezembro de 2005, ainda que algumas delas não integrem o conceito de “defeitos aparentes”, temos que, após a sua denúncia, e não se verificando a reparação por parte da Ré, o Autor tinha o prazo de um ano para interpor a competente ação judicial no sentido de exigir a sua reparação, sendo que a petição inicial dada entrada nos presentes autos tem carimbo de 27 de Fevereiro de 2008, mostrando-se, também aqui, ultrapassado o prazo para acionar judicialmente a Ré pedindo a eliminação dos defeitos ou a sua indemnização (art.º 1225.º do Código Civil). Pelo exposto, e sem necessidade de mais considerandos, procede totalmente a exceção de caducidade alegada pela Ré, verificando-se extinto o direito do Autor de exigir a eliminação dos defeitos alegados, ou a respetiva indemnização, o que, constituindo exceção perentória, importará a absolvição dos pedidos efetuados pela Ré relativamente à eliminação defeitos da moradia ou à sua indemnização (art.º 576.º, n.º 1 e 3, do Código de Processo Civil)».
Do trecho acabado de transcrever, decorre com evidente clareza que a conclusão a que o tribunal “ a quo” chegou está inquinada por erro na premissa maior do silogismo, qual seja a data relevante para o conhecimentos dos defeitos da obra, dando de barato que eram aparentes, e consequentemente para o início do prazo de caducidade para a sua denúncia. O Tribunal considerou que tal data seria o dia 29 de Maio de 2004, data em que o A. passou a residir na moradia em causa nos presentes autos. Acontece que nessa data o A. não tinha nenhum direito real sobre a moradia ou o prédio onde se encontrava implantada, tinha apenas uma expectactiva jurídica de o vir a adquirir, em cumprimento do contrato promessa que celebrara com a R.. O A. era assim um mero detentor, um possuidor precário, em nome alheio e como tal não lhe assistia qualquer direito de denúncia dos defeitos da moradia, pela singela razão de que não era proprietário do prédio. Tais direitos pressupõem a aquisição da propriedade do prédio. Naquela data, a haver defeitos, apenas o dono da obra os poderia denunciar.Ora nessa ocasião a R. era simultaneamente a dona da obra e o empreiteiro!!!
Só com a realização da escritura de compra e venda do imóvel, em 14 de Dezembro de 2004, se consolidou na esfera jurídica do A. o direito à denúncia dos defeitos do mesmo, na qualidade de adquirente do imóvel, devendo fazê-lo contra a R., simultaneamente construtora e vendedora do mesmo. Assim o prazo para a denúncia dos defeitos aparentes então existentes, só se iniciou naquela data e não em 29 de Maio de 2004, como por manifesto erro se considerou na sentença. Daqui resulta desde logo que são tempestivas, as denúncia dos defeitos operadas pelas comunicações de:
-de 17 de Outubro de 2005 (portão exterior com problemas, caldeira/sistema de águas quentes com problemas, WC inoperativa, prateleiras em risco de caírem, as portas de armários que não fecham); - de 1 de Novembro de 2005 (WC do R/C inoperativo, saída de ar quente da lareira para o quarto do 1.º andar continuava sem grelha, os roupeiros e armários dos WC sem fechar); - de 25 de Novembro de 2005 (infiltrações no WC do 1.º andar, portão exterior do acesso de viaturas com dificuldades em abrir).
Mas é igualmente tempestiva a denúncia operada pela comunicação de 23 de Dezembro de 2005, porquanto a R. não conseguiu demonstrar, como era seu ónus[14], que os defeitos aí denunciados fossem aparentes, já existissem à data da celebração da escritura e consequentemente já tivesse sido excedido o prazo legal para a sua denúncia.
Vejamos agora se ocorre também a caducidade do direito à eliminação dos defeitos denunciados.
Diz-se na sentença que « no que concerne às deficiências comunicadas por carta datada de 23 de Dezembro de 2005, ainda que algumas delas não integrem o conceito de “defeitos aparentes”, temos que, após a sua denúncia, e não se verificando a reparação por parte da Ré, o Autor tinha o prazo de um ano para interpor a competente ação judicial no sentido de exigir a sua reparação, sendo que a petição inicial dada entrada nos presentes autos tem carimbo de 27 de Fevereiro de 2008, mostrando-se, também aqui, ultrapassado o prazo para acionar judicialmente a Ré pedindo a eliminação dos defeitos ou a sua indemnização (art.º 1225.º do Código Civil).»
Como já dissemos supra a caducidade apenas é impedida pela prática do acto dentro do prazo legal, decorrendo do n.º 1 do art.º 332º, e assim tem sido entendido pela doutrina e pela jurisprudência, que o momento relevante para impedir a caducidade do direito, quando este tem de ser exercido através de uma acção judicial a propor dentro de certo prazo, é o momento da propositura da acção – art. 259º nº1 do CPC. Como também já referimos, o nº 2 do art.º 331º do CC, prevê uma outra situação impeditiva da caducidade – o reconhecimento do direito por parte do devedor (beneficiário da caducidade).
Esta causa impeditiva da caducidade ocorre, nos casos em que resulte de estipulação negocial (caducidade convencional), ou de disposição legal relativa a direitos disponíveis[15]. É precisamente o caso dos autos, pois estamos perante matéria na disponibilidade plena das partes.
Está demonstrado nos autos que a R. não só reconheceu a existência dos defeitos denunciados, como se comprometeu a repará-los. Relevam neste aspecto, os factos descritos sob os nº 18 a 21 dos factos provados onde consta o seguinte: 18. Em 9 de Junho de 2006 ocorreu uma reunião entre o Autor, o sócio gerente da Ré, o técnico responsável pela obra, técnicos de arquitetura e engenharia e especialistas em construção civil com o propósito de se aferir o estado da obra. 19. No decurso dessa reunião foi elaborada uma lista elencando as deficiências detetadas. 20. A Ré, por via do seu representante legal, reconheceu tais deficiências. 21. E comprometeu-se a reparar tais deficiências».
Desta materialidade decorre desde logo que a reunião ocorreu dentro do prazo de um ano que o A. tinha para exercer o direito de acção contra a R. para exigir a eliminação dos defeitos. Assim o reconhecimento da existência dos defeitos, a sua enumeração e o compromisso assumido pela R. de os eliminar ou reparar aconteceu antes de antes de esgotado o prazo de caducidade[16] e consequentemente tal reconhecimento tem a virtualidade de impedir a caducidade do direito do A. , ou seja a partir desse momento não é lícito à R. (devedor) invocar contra o A. (credor) a excepção de caducidade, ainda que o devedor demore anos a cumprir. Na verdade o direito foi exercido. E uma vez exercido ou reconhecido, como é óbvio, pela natureza das coisas, deixa de estar sujeito a prazo de caducidade[17]. O que se segue é uma questão de execução e não do direito de acção à eliminação dos defeitos.
A invocação da excepção da caducidade nestas circunstâncias é, pelas razões apontadas, manifestamente improcedente. Para quem discorde desta posição, sempre se dirá, que a não ser assim, tal invocação (depois de ter havido reconhecimento expresso e compromisso de reparar ou eliminar os defeitos) sempre constituiria um abuso do direito, na modalidade de “venire contra factum proprium” e consequentemente ilícita. Efectivamente e como bem observa o recorrente, é vasta a jurisprudência do STJ, que aponta nesse sentido[18] .
Pelo exposto, é seguro concluir que, no caso sub judicio, não só não ocorre qualquer caducidade do direito de denúncia dos defeitos do imóvel por parte do A./adquirente, como também não existe qualquer caducidade do direito de exigir a eliminação ou reparação dos mesmos. Ao invés verifica-se que a R. reconheceu a existência dos defeitos elencados na reunião de 9 de Junho de 2006 e comprometeu-se a repará-los, assumindo assim tal obrigação. Os trabalhos em falta e as deficiências verificadas, consta dos pontos 22, 23 e 24 dos factos provados. Assim, na procedência da apelação, impõe-se revogar a sentença, na parte em que julgou procedente a excepção de caducidade do direito à reparação dos defeitos ou a ser indemnizado pelo danos patrimoniais daí decorrentes (pedidos 1 e 2) e outrossim julgar parcialmente procedente o pedido de condenação da R. na execução dos trabalhos em falta e na reparação dos defeitos do imóvel, descritos sob os nº 22 a 24 dos factos provados.
*
** Dos danos patrimoniais
Quanto aos danos patrimoniais reclamados pelo A. (prejuízos e lucros cessantes) a alteração do decidido na sentença, pressupunha a procedência da apelação no tocante à impugnação da decisão de facto relativa aos alegados prejuízos e lucros cessante. Ora tendo improcedido a apelação quanto a esse particular, improcede, consequentemente, o pedido de ateração da decisão que quantificou tais danos e que assim se mantém.
*
** Dos danos não patrimoniais
Insurge-se também o A. quanto à medida da indemnização fixada a título de danos não patrimoniais pelas consequência do comportamento ilícito da R. em recusar cumprir o que estava obrigada, não só por força do contrato como da lei. Entende que o valor correcto seria o que foi pedido, ou seja €10.000,00 (dez mil euros).
Analisada a sentença, verifica-se que o Sr. Juiz, considerou que « o Autor demonstrou em audiência de julgamento que em consequência dos sucessivos atrasos na reparação dos defeitos existentes (e provados, embora improcedente o ser ressarcimento, em virtude da procedente exceção de caducidade), sofreu um abalo, tendo passado a andar mais irritado, padecendo de insónias, vivendo um quadro depressivo e de ansiedade no seio familiar, o que foi demonstrado pelas diversas testemunhas ouvidas, as quais confirmaram o isolamento social face aos amigos e o comportamento do mesmo perante a companheira e a filha.
Provou-se ainda o início da baixa psiquiátrica do Autor, e, bem assim, a medicação que o mesmo tomou algures naquele período». E concluiu que tais factos são graves e merecem a tutela do direito. Porém entendeu adequado ressarcir tais danos com uma indemnização de €5.000,00. Salvo o devido respeito, o valor arbitrado, parece-nos escasso. Na verdade ponderando a gravidade dos danos e a sua extensão ao longo de 10 anos, sem que a R., fizesse o que quer que fosse para atenuar tais danos (ao invés, tudo fez para não ser obrigada a cumprir o que estava na origem dos padecimentos do A.), entendemos que será justo compensar o A. com uma quantia, actualizada com referência à data da sentença, no montante €8.000,00 (oito mil euros).
*
**
Em síntese:
I - Nos termos do art.º 331º nº1, do CC a caducidade só é impedida pela prática do acto, a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo, dentro do prazo legal ou convencional.
II - Nos termos do n.º 2, a caducidade pode, igualmente, ser impedida pelo reconhecimento do direito por parte do seu beneficiário, nos casos em que resulte de estipulação negocial (caducidade convencional), ou de disposição legal relativa a direitos disponíveis.
III - No regime da venda de coisa defeituosa, estando em causa um bem imóvel, o prazo para denúncia dos defeitos é de um ano depois de ser conhecido o defeito e até cinco anos após a entrega da coisa (art.º 916.º, n.ºs 3); e o prazo de caducidade do direito de acção é o previsto no art.º 917.º para a acção de anulação por simples erro, e, por analogia, para a acção a exigir a reparação ou seja, seis meses após a denúncia dos defeitos, ou, se não tiver havido denúncia, seis meses após o decurso dos prazos fixados no art. 916.º.
IV – No entanto, se a compra e venda tiver por objecto bem imóvel destinado a longa duração, que tenha sido construído, reparado ou modificado pelo vendedor, os prazos de caducidade serão: (1) de um ano para fazer a denúncia dos defeitos, prazo que se conta a partir do descobrimento dos mesmos (art.º 1220.º, n.º 1, do Código Civil), (2) de um ano, a partir da denúncia, para pedir a indemnização ou a eliminação dos defeitos nº 2,3 e 4 do art.º 1225 do CC e (3) de cinco anos, a contar da entrega da obra, dentro dos quais terá que ser feita a denúncia e proposta a ação de indemnização ou reparação do imóvel.
V – Se em cumprimento de um contrato promessa de compra e venda de uma moradia a construir pelo promitente vendedor, vier a ser celebrado o contrato definitivo, o prazo para a denúncia dos defeitos, apenas se inicia com a celebração da escritura de compra e venda, ainda que o adquirente tenha começado a habitar a casa, por autorização do promitente-comprador, muitos meses antes e nessa altura já fossem visíveis defeitos aparentes.
VI – Se o reconhecimento da existência dos defeitos, a sua enumeração e o compromisso assumido pela R. de os eliminar ou reparar aconteceu antes de antes de esgotado o prazo de caducidade, tal reconhecimento tem a virtualidade de impedir a caducidade do direito do A. , ou seja a partir desse momento não é lícito à R. (devedor) invocar contra o A. (credor) a excepção de caducidade, ainda que o devedor demore anos a cumprir. Na verdade o direito foi exercido e uma vez exercido ou reconhecido já não está sujeito a prazo de caducidade.
* ** Concluindo
Na procedência parcial da apelação, acorda-se em revogar a sentença recorrida no tocante às alíneas a) e e) do dispositivo e, em sua substituição, condenar a R. :
1) na execução dos trabalhos em falta e na reparação dos defeitos do imóvel, descritos sob os nº 22 a 24 dos factos provados.
2) no pagamento ao A., a título de danos não patrimoniais, da indemnização de €8.000,00 (oito mil euros), com referência à data de 12 de Março de 2015.
No mais, mantém-se o decidido na sentença.
*
Custas, tanto na primeira como nesta instância, a cargo de A. e R. na proporção do respectivo decaimento.
Notifique.
Évora, em 11 de Maio de 2017.
__________________________________________________
[1] Transcrito da sentença.
[2] O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 635º, n.º 2 2ª parte do Cód. Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 636 n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo recorrente. Vd. Sobre esta matéria – disposições correspondentes do anterior CPC - Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa –1997, págs. 460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio CC, Manual dos Recursos, Liv. Almedina, Coimbra – 2000, págs. 103 e segs. -
[3] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56.
[4] Antunes Varela, J. M. Bezerra e Sampaio e Nora, "Manual de Processo Civil", 2ªedição, Coimbra, 1985, pags. 690 e 691.
[5] Rodrigues Bastos, "Notas ao Código de Processo Civil", vol. III, Lisboa, 1972, pag. 246 e Ac. STJ de 20/10/2005, no Proc. 2374/05 Da 7ª secção (relator Oliveira Barros).
[6] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V (reimpressão) – 1981, págs. 131 e 141 a 142; J. Rodrigues Bastos, Notas ao Cód. Proc. Civil, Vol. III, pág. 246 nota 4; J. Lebre de Freitas e outros Lebre de Freitas e outros, Cód. Proc. Civil Anotado, Vol. 2.º, Coimbra Editora, Ld.ª (2001), pág. 670 nota 3.
[7] Ac. do STJ de 01/26/2006 , proc. n.º 05B2742, in http//www.dgsi.pt/jstj….
[8] Ana Filipa Morais Antunes, Prescrição e Caducidade – o Tempo e a sua repercussão nas relações jurídicas, Coimbra Editora, 2ª edição, pág. 337.
[9] Cfr, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2012/05/24, proc. n.º 1060/09.4TJLSB.L1-6, in www.dgsi.pt/.
[10] Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2013/02/07, proc. n.º 756/10.2TBFLG.G1.S1, e do Tribunal da Relação do Porto de 2013/11/19, processo n.º 1857/09.5TJVNF.S1.P1, in www.dgsi.pt/.
[11] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, II, pág. 218, Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso, pág. 413 e Calvão e Silva, Compra e Venda de Coisas Defeituosas, Conformidade e Segurança, 4ª edição, Almedina, 2008, pág. 73; e os Acs. do STJ de 12.01.94, desta Relação de 29.01.01, 26.11.02, 14.06.04, 23.06.05, 24.10.06 e 11.12.07 e da RL de 01.07.04, todos em www.dgsi.pt.
[12] Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11/04/2013, Acórdão da Relação de Lisboa de 12/06/2007, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/05/2003, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/05/2006, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[13] Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2008/04/10, proc. n.º 1798/2008-6, in www.dgsi.pt/.
[14] Trata-se de matéria de excepção peremptória, incumbindo ao beneficiário da mesma o ónus de alegar e provar os factos constituintes da excepção – art.º 342º nº 2 e 333º nº 2 ambos do CC.
[15] Ana Filipa Morais Antunes, Prescrição e Caducidade – o Tempo e a sua repercussão nas relações jurídicas, Coimbra Editora, 2ª edição, pág. 337.
[16] Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2013/02/07, proc. n.º 756/10.2TBFLG.G1.S1, e do Tribunal da Relação do Porto de 2013/11/19, processo n.º 1857/09.5TJVNF.S1.P1, in www.dgsi.pt/.
[17] O impedimento da caducidade resultante do reconhecimento do respectivo direito não determina a contagem de novo prazo de caducidade, passando o exercício desse direito a estar sujeito, apenas, ao prazo de prescrição ordinário previsto no artigo 309º do C. Civil (cfr. Ac. RL, de 01/10/2009 – Relatora Desembargadora Fátima Galante, in www.dgsi.pt).
[18] Age com abuso de direito, o construtor/vendedor do imóvel, que, depois de lhe terem sido denunciados os defeitos da obra em tempo oportuno e se compromete a repará-los, vem depois invocar a caducidade da acção, como é, aliás, o presente caso. Vide , entre outros os Ac. STJ, de 27/11/2007, proc.º 07A3581; Ac. STJ, de 18/09/2014, proc.º n.º 1857/09.9TJVNF.S1.P1; Ac. STJ, de 29/10/2013, proc.º 364/03.4TBVRM.G1.S1 e também, no mesmo sentido, o Ac. TRL, de 12/12/06, rec. 6315/2006-7, todos disponíveis in www.dgsi.pt.