Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
DIREITO DE PREFERÊNCIA
PRÉDIO RÚSTICO
PRÉDIOS CONFINANTES
Sumário
1. São pressupostos do direito real de preferência sobre prédios rústicos: a) que tenha sido vendido ou dado em cumprimento um prédio com área inferior à unidade de cultura; b) que o preferente seja dono de prédio confinante com o prédio alienado; c) que o adquirente do prédio não seja proprietário confinante. 2. Se houver vários proprietários confinantes com o prédio vendido e a venda tiver sido feita a um deles, os demais proprietários confinantes não podem preferir.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I. RELATÓRIO
A.. e marido B.. intentaram contra C.. e mulher D.., E.. e marido F.. e G.. e mulher H.., acção com processo sumário em que pedem que se declare que os autores têm direito de preferência na venda do prédio identificado na petição e, em consequência, se adjudique aos autores o referido prédio, preferência essa que lhes é conferida pelo artigo 1380.º, n.º 1 do Código Civil.
Os autores depositaram a quantia global de € 7011,03, relativa ao valor da compra, despesas notariais, IMT e despesas com o registo predial.
Contestaram os segundos réus/compradores alegando que o prédio em questão nos autos se encontra encravado entre um regato, o prédio dos autores e quatro prédios pertencentes aos contestantes, sendo que onera com servidão de passagem oito prédios pertencentes aos contestantes, pelo que a preferência na alienação do mesmo sempre seria dos réus contestantes. Além do mais, o prédio em causa nos autos confronta a norte com outro prédio dos contestantes, que tem a área de 5680 m2, pertencendo-lhes, também por aí, o direito de preferência, nos termos do artigo 1380.º n.º 2, alínea b) do Código Civil. Finalmente, alegam que o prédio em litígio foi oferecido aos autores pelo preço e pelas condições pelas quais foi vendido, não tendo os autores manifestado vontade de preferir.
Responderam os autores, impugnando a matéria de facto alegada pelos contestantes, designadamente quanto à propriedade dos prédios confinantes e às suas áreas, bem como à alegada servidão de passagem, alegando, ainda, a existência de um curso de água a dividir as propriedades dos réus.
Foi elaborado despacho saneador, sem selecção da matéria de facto, ao abrigo do disposto no artigo 787.º do CPC.
Efectuou-se inspecção ao local e levantamento topográfico dos prédios.
Após julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, absolvendo os réus dos pedidos contra eles formulados.
Discordando da decisão, vieram os autores interpor recurso, tendo formulado as seguintes
Conclusões:
1. O Direito de preferência em causa tem a sua origem na Lei 2116 de 14 de Agosto de 1962.
2. Segundo a Base VI, n.º 1 dessa lei, os proprietários dos terrenos confinantes com um prédio rústico alienado gozavam do direito de preferência desde que esse prédio tivesse área inferior à unidade de cultura.
3. Com a entrada em vigor do Código Civil, artigo 1380 n.º 1, o direito de preferência só passou a aproveitar aos proprietários de prédios confinantes com a área também inferior à unidade de cultura.
4. Preceitua hoje o artigo 18 n.º 1, do DL n.º 384/88 de 25 de Outubro, que “os proprietários de terrenos confinantes gozam do direito de preferência previsto no artigo 1380º do Código Civil, ainda que a área daqueles seja superior à unidade de cultura”.
5. Na génese deste diploma legal, esteve uma profunda preocupação com o progresso da agricultura portuguesa, tendo como principal objectivo orientar este progresso no sentido de aumentar a produção no sector agro-alimentar, em ordem a satisfazer as necessidades do país e a reduzir o volume de bens importados, rentabilizando os meios de produção, aumentando a competitividade da actividade agrícola, proporcionando à população rural um nível de vida mais próximo dos padrões verificados noutros sectores de actividades.
6. Tal preocupação resulta inequivocamente do preâmbulo do DL supra referido.
7. Este progresso tão desejado encontrou desde cedo um entrave originado pela fragmentação e dispersão da propriedade e das explorações agrícolas.
8. No sentido de obviar a esta condicionante negativa, entendeu o legislador estabelecer como principio subjacente ao normativo legal transposto no artigo 18 do diploma em análise e no artigo 1380 n.º 2 a) e c) do código Civil, por remissão daquele, o de contribuir para a concentração da propriedade, tendo em conta os referidos interesses agrários, promovendo o reagrupamento espontâneo da propriedade, “ por forma a que a transmissão de qualquer terreno implicasse a sua aquisição por um proprietário confinante, e havendo vários, por aquele que mais benefícios alcançasse e mais vantagens oferecesse, sob o ponto de vista da estrutura agrária local” Neste sentido Ac. Rel. Coimbra de 12 de Setembro de 2006 (jusnet4762/ 2006) e ainda (parecer n.º 32/VII, da Câmara Corporativa, de 21-04-60, sobre o projecto de Decreto de Lei de que resultou, mais tarde, a lei n.º 2116, de 15-06-62) primeiro diploma que estabeleceu as bases a que deveria obedecer o emparcelamento da propriedade rústica, com vista a conseguir explorações, economicamente rentáveis.
9. O direito de preferência baseado na confinância de prédios “integra-se assim num conjunto de medidas legais tendentes a combater a excessiva pulverização da propriedade rústica, que oferece inconvenientes, de ordem económica, pela menor produtividade dos prédios, quando estes se reduzem a proporções muito limitadas”.
10. “Os objectivos da Lei, ao permitir a unificação de terrenos confinantes, são os de evitar a dispersão e de conseguir formar prédios com dimensão óptima, tornando-os, assim, mais rentáveis e produtivos. Ac. Rel. Coimbra 12 de Setembro de 2006.
11. Uma vez esclarecidos os princípios subjacentes ao direito de preferência consagrado nas disposições combinadas dos artigos 1380 n.º1 do Cód. Civil e 18.º n.º 1, do Dl n.º 384/88, de 25 de Outubro (Lei do emparcelamento), a solução que se pretende ver esclarecida com a presente alegação é a de saber se aquele direito de preferência só será concedido quando a venda é feita a quem não seja proprietário confinante com o prédio vendido, ou se, sendo vários os proprietários confinantes a pretenderem comprar aquele prédio, existe um direito recíproco entre proprietários confinantes, sendo critério decisivo da atribuição do direito de preferência (não se tratando da venda de prédio encravado), a obtenção de área que mais se aproxime da unidade de cultura.
12. “A letra da lei, que tem de ser entendida em termos convenientes e razoáveis, impostos pelas regras da interpretação, não afasta o que o espírito do legislador reclama, a bem do princípio da unidade do sistema jurídico, consagrado no artigo 9º do código civil, ou seja, que sendo vários os prédios confinantes, a cada um dos respectivos proprietários assiste um direito de preferência autónomo e distinto, limitando-se a lei a estabelecer, nos n.ºs 2 e 3 do artigo 1380, do Código Civil um critério de prioridade entre vários os preferentes (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, III, 1987, 274; RC, de 16/11/82, Cj, ano VII, T5, 26; RC, de 17/02/78, CJ, ano III, T2, 272; Rp, de 6/2/76, CJ, Ano I, T1, 96).”
13. São requisitos do direito real de preferência, a que alude o artigo 1380º, do CC, a existência de dois prédios confinantes que pertençam a proprietários diferentes, que ambos sejam aptos para cultura, sem que os dois atinjam ou transcendam os limites da área mínima de cultura, que um deles tenha sido vendido ou dado em cumprimento, que o preferente seja dono do prédio confinante com o prédio alienado, e que o adquirente do prédio não seja proprietário confinante ou, sendo-o, na hipótese de concurso de preferentes proprietários de prédios confinantes, não se tratando de um caso de alienação de prédio encravado, aquele que, pela preferência, obtenha a área que mais se aproxime da unidade de cultura, para a respectiva zona.”
14. A venda de prédio rústico a proprietário de prédio com aquele confinante não afasta, por si só, em caso de concurso de preferentes proprietários de prédios confinantes, a possibilidade de qualquer um destes poder exercer o direito de preferência, consagrado pelo artigo 1380º, do CC. “. Ac. Rel. Coimbra, 12 de Setembro de 2006.
15. “O elemento histórico de interpretação da norma conduz, também, à solução que se defende, quando se compara o texto do artigo 1380º, nº 1, do CC, segundo o qual "os proprietários de terrenos confinantes, de área inferior à unidade de cultura, gozam, reciprocamente, do direito de preferência, nos casos de venda, dação em cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédios a quem não seja proprietário confinante", com o preceituado pelo artigo 18º, nº 1, do DL nº 384/88, de 25 de Outubro, citado, nos termos do qual "os proprietários de terrenos confinantes gozam do direito de preferência previsto no artigo 1380º, do Código Civil, ainda que a área daqueles seja superior à unidade de cultura”. Ac. Rel. Coimbra, 12 de Setembro de 2006.
16. Não pode tal preceito legal ser entendido de outra forma.
17. Não aplicar no presente caso, ou casos semelhantes, o critério de prioridade entre preferentes, seria considerar, a norma prevista no artigo 1380º n.º 2 b), inútil, na determinação desta mesma prioridade.
18. Facilmente qualquer dos proprietários confinantes, em conluio com o vendedor do prédio pretendido, afasta os demais proprietários confinantes.
19. Para tal, basta que não efectuem a comunicação prevista nos artigos 416º, 418.º e 1410º do Código civil e celebrem a escritura de compra e venda, para que o seu direito jamais possa ser colocado em causa.
20. Afastando-se assim, todos os principios subjacentes aquelas normas.
21. Assim, violou a douta sentença, além do mais, o disposto no artigo 1380º do Código Civil, designadamente o seu n.º 2 alínea b).
22. Resultaram provados os seguintes factos:
a)Os Autores são donos e legítimos proprietários do seguinte prédio:
– Prédio rústico composto de terreno de lavradio, vinha e mato, sito no lugar da C..., com a área de 4 267,31 m2, a confrontar de norte com linha do Caminho de Ferro, de sul com Manuel F..., de Nascente com Faustino G.... e de poente com herdeiros de Alfredo L... (actualmente com os terceiros R.R., em consequência da escritura celebrada em 14 de Agosto de 2007), inscrito na respectiva matriz predial rústica da referida freguesia de A..., sob o artigo 3....º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 1..., com o valor patrimonial de 133,24 euros;
b) O prédio dos A.A., identificado em 1, confronta de poente com o prédio actualmente dos terceiros R.R.;
c) Por escritura Pública celebrada no dia 14 de Agosto de 2007, no Cartório Notarial de Viana do Castelo, a cargo da Notária Maria Isaura Abrantes Martins, exarada a fls. 95 a 96 verso, do livro 93-B, daquele cartório, os primeiros e segundos R.R., venderam aos terceiros R.R., pelo preço de 6 350.00 Euros (seis mil trezentos e cinquenta euros), o seguinte Prédio:
- Prédio rústico, composto de uma leira de lavradio e vinha, sita em C..., com a área de 3.895 m2, a confrontar de norte com José da S..., de sul com Padre R... e outros, de nascente com os A.A. e de Poente com Regato, inscrito na respectiva matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 3....º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 1....
d) Os prédios identificados em 1 e 5 são confinantes e contíguos entre si e destinam-se ambos a cultivo agrícola.
e) O prédio objecto da preferência tem a área de 3.895 m2.
f) O prédio dos A.A. tem a área total de 4267,31 m2.
g) Nem o prédio inscrito na matriz sob o artigo 345º (dos R.R.), nem o prédio dos A.A. (artigo 344º) se encontram onerados com a servidão de passagem a favor do prédio objecto da preferência.
h) O único prédio dos R.R. que confina directamente com o prédio objecto da preferência é o inscrito na matriz sob o artigo 345.º, com a área de 1236.62m2.
i) O somatório da área do artigo 345º dos R.R. com a área do prédio objecto da preferência (artigo 346º) ascende a 5.131,62 m2 (1.236,62 + 3.895).
j) O somatório da área do prédio artigo 344.º dos A.A. com a área do prédio objecto da preferência (artigo 346º) ascende a 8.162,32 m2 (4.267,32 + 3.895).
23. Não resultou provado que o prédio em litígio tivesse sido oferecido a todos
os confrontantes, incluindo os A.A., pelo preço que foi vendido aos R.R. contestantes, tendo tal excepção extintiva do direito dos A.A. sido julgada improcedente.
Terminam pedindo que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que julgue a acção procedente e declare que os autores têm direito de preferência na venda do prédio rústico composto de uma leira de lavradio e vinha, sita em C..., com a área de 3895 m2, a confrontar de norte com José da S..., de sul com Padre R... e outros, de nascente com os autores e de poente com regato, inscrito na respectiva matriz predial rústica da freguesia de Alvarães sob o artigo 3....º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 1....
Os réus/recorridos contra-alegaram pugnando pela manutenção da sentença objecto do recurso.
O recurso foi admitido como de apelação, com efeito devolutivo.
A questão a resolver traduz-se em saber:
- se pode ser exercido o direito de preferência por um proprietário confinante, quando o prédio rústico objecto da preferência foi adquirido por outro proprietário confinante.
II. FUNDAMENTAÇÃO
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
1.1. Os Autores são donos e legítimos proprietários do seguinte prédio:
- Prédio rústico, composto de terreno de lavradio, vinha e mato, sito no lugar da C..., freguesia de A..., com a área de 4.267,31 m2 , a confrontar de norte com linha do Caminho de ferro, de Sul com Manuel F..., de Nascente com Faustino G... e de poente com herdeiros de Alfredo L... (actualmente com os terceiros R.R., em consequência da escritura celebrada em 14 de Agosto de 2007), inscrito na respectiva matriz predial rústica da referida freguesia de A..., sob o artigo 3...º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 1..., com o valor patrimonial de €133,24.
1.2. O direito de propriedade sobre tal prédio encontra-se registado a favor dos A.A. na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo pela inscrição G Ap. 36 de 1997/10/31.
1.3. Os A.A. por si e pelos seus antepossuidores, desde há mais de 1, 10, 15, 20 e mais anos que estão na posse do prédio identificado em 1.1., utilizando-o, ocupando-o, velando-o, limpando-o, dando de arrendamento, recebendo todos os seus produtos e rendimentos, à vista de toda a gente, de forma pública e pacifica, sem oposição de quem quer que seja, continuada e ininterruptamente e com a convicção de estar a exercer um direito próprio correspondente ao direito de propriedade e de não lesar ou violar direitos de outrem, sendo, aliás, os A.A. por todos reconhecido como seu único e exclusivo dono.
1.4. O prédio dos A.A., identificado em 1.1., confronta de poente com o prédio
actualmente dos terceiros R.R.
1.5. Por escritura pública celebrada no dia 14 de Agosto de 2007, no Cartório
Notarial de Viana do Castelo, a cargo da Notária Maria Isaura Abrantes Martins, exarada de fls 95 a 96 verso, do livro 93-B, daquele cartório, os primeiros e segundos R.R., venderam aos terceiros R.R., pelo preço de 6 350,00 euros (seis mil trezentos e cinquenta euros), o seguinte prédio:
- Prédio Rústico, composto uma leira de lavradio e vinha, sita em C..., com a área de 3.895 m2, a confrontar de norte com José da S..., de sul com Padre R... e outros, de nascente com os A.A. e de Poente com Regato, inscrito na respectiva matriz predial rústica da freguesia de A..., sob o artigo 3...º e descrito na Conservatória do Registo predial de Viana do Castelo sob o n.º 1.....
1.6. Com base na referida escritura de compra e venda, os terceiros R.R. registaram a seu favor o direito de propriedade sob o prédio identificado em 1.5., pela inscrição G apresentação 16 de 2007/08/17.
1.7. O prédio identificado em 1.5., confronta pelo lado nascente, em toda a sua extensão, com o lado poente do prédio dos A.A., descrito supra em 1.1..
1.8. Os prédios identificados em 1.1. e 1.5. são confinantes e contíguos entre
si e destinam-se ambos a cultivo agrícola.
1.9. Os Réus ora contestantes são donos e legítimos possuidores dos seguintes prédios:
A -Leira de lavradio e vinha, sita em Lugar da Igreja, a confrontar do norte com Herdeiros de José T..., do sul com Regato, do nascente com José J... e do poente com Alzira R..., inscrita na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 2...º;
B -Leira de lavradio e vinha, sita em lugar da Igreja, a confrontar do norte com José M..., do sul com Regato, do nascente com Felicidade R... e do poente com José S., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 2...°;
C -Leira de lavradio e vinha, sita em Lugar da I..., a confrontar do norte com Manuel R..., do sul com Regato, do nascente com Alzira R... e do poente com Manuel J..., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 2...º;
D -Leira de lavradio e vinha, sita em Lugar da I..., a confrontar do norte com José F..., do sul com Regato, do nascente com Manuel J... e do poente com Ana R..., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 2...º;
E -Leira de lavradio e vinha, sita em Lugar da I..., a confrontar do norte com José Maria F..., do sul com José J..., do nascente com José M... e do poente com Manuel J..., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 2...°;
F -Leira de lavradio e vinha, sita em Lugar da I..., a confrontar do norte com Padre R..., do sul com Joaquim P..., do nascente com Manuel J... e do poente com José S..., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A..., sob o artigo 2...°;
G -Leira de lavradio e vinha, sita em Lugar da I..., a confrontar do norte com Linha Férrea, do sul com Padre R..., do nascente com Próprio e do poente---, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 2...°;
H -Leira de lavradio e vinha, sita em Lugar da I..., a confrontar do norte com José S..., do sul com Manuel R..., do nascente com Regato e do poente com Caminho de Servidão, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 2...°;
I - Terreno com vinha, sita em Lugar da C..., a confrontar do norte com Linha de Caminho de Ferro, do sul com Alfredo L..., do nascente com Manuel R... e do poente com Regato, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de A... sob o artigo 3...°;
1.10. O direito de propriedade sobre esses prédios encontra-se registado na Conservatória de Registo Predial de Viana do Castelo a favor dos Réus, contestantes;
I - Pela inscrição nº 54539, referente à descrição n°69346, do prédio identificado na alínea A) em 1.9.;
II - Pela inscrição nº 54539, referente à descrição nº 90725, do prédio identificado na alínea B) em 1.9.;
III - Pela inscrição nº 52929, referente à descrição nº 89827, do prédio identificado na alínea C) em 1.9.;
IV - Pela inscrição nº 52929, referente à descrição nº 89826, do prédio identificado na alínea D) em 1.9.;
V - Pela inscrição nº 52929, referente à descrição nº 89828, do prédio identificado na alínea E) em 1.9.;
VI - Pela inscrição nº 52929, referente à descrição nº 89829, do prédio identificado na alínea F) em 1.9.;
VII - Pela inscrição nº 52929, referente à descrição nº 89823, do prédio identificado na alínea G) em 1.9.;
VIII - Pela inscrição nº 52929, referente à descrição nº 89824, do prédio identificado na alínea H) em 1.9.;
IX - Pela inscrição nº 52929, referente à descrição nº 89817, do prédio identificado na alínea I) em 1.9..
1.11. Os réus contestantes estão por si e seus antepossuidores, há mais de 1, 5, 10, 15, 20 e mais anos, ininterruptamente, na fruição dos prédios descritos em 1.9., neles plantando e colhendo todos os produtos que os mesmos são susceptíveis de produzir e pagando os respectivos impostos à vista de toda a gente da freguesia e para além dela, de forma pública e pacífica, sem oposição de quem quer que seja, com a convicção de exercerem um direito próprio de propriedade e de não lesar os direitos de outrem.
1.12. O prédio objecto da preferência (artigo matricial 346º) encontra-se encravado entre um regato, a poente, a que se seguem os prédios infra descritos em 1.19. e 1.20.; o prédio dos AA (artigo 344º), a nascente; e o prédio pertencente aos RR inscrito na matriz sob o artigo 345º, a norte.
1.13. O prédio descrito em 1.5. tem acesso através de um caminho de passagem constituído por servidão sobre vários prédios entre ele e o caminho público sito a nascente.
1.14. O prédio objecto da preferência onera com servidão de passagem, entre
outros, os prédios rústicos dos RR contestantes inscritos na matriz sob os artigos 2114º e 2115º.
1.15. O caminho de servidão de passagem para o prédio objecto da preferência inicia-se a poente e nele desemboca a nascente, com uma extensão superior a 180 metros lineares sobre diversos prédios servientes.
1.16. O prédio objecto da preferência confronta em toda a sua extensão a norte com o prédio propriedade dos Réus inscrito na matriz sob o artigo 345º, com área de 1.236,62 m2, e que este, por sua vez, confronta do seu lado poente com Regato, a que se seguem os prédios rústicos dos RR inscritos na matriz sob os artigos 2114º e 2115º, estes com área total de 4.238,92m2 (incluindo a área do caminho de servidão de 214,35m2).
1.17. O prédio objecto da preferência tem a área de 3.895 m2.
1.18. O prédio dos AA tem a área total de 4.267,31 m2.
1.19. Entre os prédios dos Réus inscritos na matriz sob os artigos 2119º, 2120º e 2121º, e o prédio objecto da preferência existem pelo menos duas parcelas de terreno, dos quais aqueles não são proprietários.
1.20. Entre estes prédios dos Réus (artigos 2219º, 2120º e 2121º) e o rego das águas situado a poente do prédio objecto da preferência existem as referidas duas parcelas de terreno, uma propriedade de Salvador A... e outra propriedade de Tarcísio S....
1.21. Quer os AA a nascente, quer os RR, a norte confrontam com o prédio objecto da preferência.
1.22. Nem o prédio inscrito na matriz sob o artigo 345º (dos Réus), nem o prédio dos AA (artigo 344º) se encontram onerados com a servidão de passagem a favor do prédio objecto da preferência.
1.23. O acesso aos prédios dos A.A., é feito através de um caminho de servidão que onera prédio de terceiro, situado a nascente daqueles prédios e que os
liga a um caminho público, actualmente denominado por Rua do Pradinho.
1.24. O único prédio dos RR que confina directamente com o prédio objecto da preferência é o inscrito na matriz sob o artigo 345º, com área de 1.236,62 m2.
1.25. Existe uma linha de água, com cerca de um metro de largura, que separa os artigos 2114ºe 2115º do artigo 345º, todos propriedade dos R.R..
1.26. O artigo rústico 2115º confronta a nascente com regato e o artigo rústico
345º confronta a poente com regato.
1.27. A ligação entre os prédios dos RR inscritos na matriz sob os artigos 2115º, por um lado, e 345º, por outro, é feita através de uma passagem, em tempos constituída por tábuas ou pranchas de madeira, e que há cerca de 10 anos foram substituídas pela colocação de manilhas no leito do regato, colocação essa levada a cabo por um filho dos RR.
1.28. Os terrenos em causa, encontram-se classificados no Plano Director Municipal como área de Reserva Agrícola Nacional.
1.29. A colocação das manilhas no leito do regato não foi objecto de qualquer autorização por parte da entidade competente.
1.30. O referido curso de água provém da freguesia de Vila de Punhe e vai desaguar directamente no Rio Neiva, encontrando-se o mesmo devidamente assinalado, na planta do PDMVC.
1.31. O somatório da área do prédio artigo 345º dos RR com a área do prédio
objecto da preferência (artigo 346º) ascende a 5.131,62 m2 (1.236,62 + 3.895).
1.32. O somatório da área do prédio artigo 344º dos AA com a área do prédio
objecto da preferência (artigo 346º) ascende a 8.162,32 m2 (4.267,32 + 3.895).
Como é sabido, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente – artigos 660.º, n.º 2, 684.º, n.ºs 2 e 3 e 685.º-A, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil.
Vejamos, então.
Na sentença recorrida considerou-se que os autores provaram todos os pressupostos para o exercício do direito de preferência, à excepção de um, que se considerou essencial, motivo pelo qual a acção improcedeu.
Assim, os autores provaram que foi vendido prédio com área inferior à unidade de cultura, que eles, autores, são donos de prédio confinante com o alienado e que o seu prédio também tem área inferior à unidade de cultura. Faltou-lhes provar que os adquirentes do prédio objecto da preferência não fossem confinantes.
Entendeu-se na sentença sob recurso que tendo o prédio sido adquirido por quem também é proprietário de prédio confinante, não se verifica o último requisito do artigo 1380.º, n.º 1 do Código Civil, não tendo os autores logrado provar todos os elementos constitutivos do seu direito, razão pela qual a acção foi julgada improcedente.
Dispõe o artigo 1380.º do Código Civil, sob a epígrafe ‘Direito de preferência’ e englobado na Secção VII (do Capítulo III – Propriedade de Imóveis) designada por «Fraccionamento e Emparcelamento de Prédios Rústicos»:
«1. Os proprietários de terrenos confinantes, de área inferior à unidade de cultura, gozam reciprocamente do direito de preferência nos casos de venda, dação em cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédios a quem não seja proprietário confinante.
2. Sendo vários os proprietários com direito de preferência, cabe este direito:
a) No caso de alienação de prédio encravado, ao proprietário que estiver onerado com a servidão de passagem;
b) Nos outros casos, ao proprietário que, pela preferência, obtenha a área que mais se aproxime da unidade de cultura fixada para a respectiva zona.
3. Estando os preferentes em igualdade de circunstâncias, abrir-se-á licitação entre eles, revertendo o excesso para o alienante.
4. É aplicável ao direito de preferência conferido neste artigo o disposto nos artigos 416.º a 418.º e 1410.º, com as necessárias adaptações».
Conforme se pode ler em Pires de Lima e Antunes Varela, in «Código Civil Anotado», vol. III, 2.ª edição, pág. 270 e 271 «são os seguintes os pressupostos do direito real de preferência atribuído por este preceito: a) que tenha sido vendido ou dado em cumprimento um prédio com área inferior à unidade de cultura; b) que o preferente seja dono de prédio confinante com o prédio alienado; c) que o prédio do proprietário que se apresenta a preferir tenha área inferior à unidade de cultura; d) que o adquirente do prédio não seja proprietário confinante».
E prosseguem os autores citados: «o objectivo do artigo 1380.º é fomentar o emparcelamento de terrenos a minifundiários, criando objectivamente as condições que, sob o ponto de vista económico, se consideram imprescindíveis à constituição de explorações rendíveis».
Compete ao autor o ónus de alegar e provar os requisitos do direito de preferência enunciados naquele artigo 1380.º n.º 1 do Código Civil – neste sentido, Acórdão da Relação de Guimarães de 16/02/2005, in www.dgsi.pt/jtrg.
Ora, tendo ficado provado que os réus adquirentes, no momento da aquisição, eram já proprietários confinantes, não se verifica o último requisito do artigo 1380.º n.º 1 do Código Civil. Os autores não provaram que os réus não eram proprietários confinantes do prédio sobre o qual se arrogam o direito de preferência. Ou seja, os autores não provaram todos os elementos constitutivos do seu direito, como se impunha nos termos do artigo 342.º n.º 1 do Código Civil, pelo que a acção terá de improceder – neste sentido, para além do Acórdão já citado, também, Acórdão da Relação de Guimarães de 16/03/2010, disponível no mesmo site da dgsi.
O n.º 2 do artigo 1380.º do Código Civil só deve e pode ser invocado quando o direito de preferência tenha condições de se constituir, isto é, quando se verifiquem todos os pressupostos indicados no n.º 1 do referido artigo
É necessário analisar, primeiro, se o direito de preferência se pode concretizar à luz do n.º 1 do artigo 1380.º do Código Civil e, só no caso afirmativo, é que se deve prosseguir para o n.º 2, quando ocorra a circunstância aí enunciada de serem vários os proprietários com direito de preferência.
Assim, também, se decidiu nos Acórdãos do STJ de 07/07/1994, in BMJ n.º 439, pág. 562 e de 15/05/2007 in CJ/STJ, ano XV, tomo II, pág. 74.
Neste último Acórdão do STJ de 15/05/2007 pode ler-se: «parece-nos absolutamente claro que se está perante um facto constitutivo do direito em causa: este só existe, só se constitui, se a venda for efectuada a quem não seja proprietário confinante. Se há casos em que o elemento gramatical da norma elimina logo à partida, praticamente, qualquer dúvida que pudesse alimentar-se a respeito do assunto, este será um deles (…) como bem explica o Professor M. Henrique Mesquita no parecer junto ao processo, «…se houver vários proprietários confinantes com o prédio vendido e a venda tiver sido feita a um deles, os demais proprietários confinantes não podem arrogar-se o direito de preferir».
O argumento final aí aduzido parece ser essencial nesta questão e tem a ver com os fins que a lei entendeu prosseguir com o emparcelamento e o direito de preferência quanto a prédios rústicos, fins esses que os apelantes expõem nas conclusões das suas alegações de recurso – conclusão 1.ª a 10.ª – sem que, no entanto, tirem a conclusão final adequada.
É que, o objectivo da lei de evitar a dispersão e de conseguir formar prédios com uma dimensão que possibilite torná-los mais rentáveis e produtivos, é satisfeito quando o prédio é vendido a um proprietário confinante, não sendo, então, necessário fazer intervir o mecanismo da preferência para realizar o fim pretendido.
Explicitando melhor, conclui-se naquele Acórdão do STJ de 15/05/2007: «A venda feita a um dos confinantes satisfaz o fim da lei que é reunir dois prédios num só (quando um deles ou ambos tenham área inferior à unidade de cultura), sem necessidade de fazer intervir o mecanismo da preferência, que constitui sempre um entrave à liberdade de contratar».
O Acórdão da Relação de Coimbra de 12/09/2006, citado nas conclusões da alegação dos recorrentes, em sentido contrário ao que acabamos de expor, aparece isolado na jurisprudência, sendo certo que nesta, a par, aliás, com a doutrina, este ponto não tem suscitado praticamente divergências: não ser o adquirente do imóvel proprietário confinante é sempre identificado como um pressuposto do direito de preferência atribuído pelo artigo 1380.º do Código Civil.
Daí que improcedam as demais conclusões da alegação dos apelantes, designadamente a que refere que, não se aplicando no caso presente o critério da prioridade entre preferentes, levaria a considerar a norma prevista no n.º 2, alínea b) do artigo 1380.º como inútil na determinação desta mesma prioridade – conclusão 17.º. O que acontece é que a norma do n.º 2 está logicamente subordinada à do n.º 1. Não se constituindo o direito de preferência dos autores por não se mostrar preenchido um dos requisitos em que a lei faz assentar o direito de preferência, então não poderá ser estabelecida uma prioridade entre vários direitos de preferência, pois o dos autores não existe.
Improcedendo, assim, as conclusões da alegação dos apelantes, decide-se manter na íntegra a decisão recorrida.
Sumário:
1. São pressupostos do direito real de preferência sobre prédios rústicos: a) que tenha sido vendido ou dado em cumprimento um prédio com área inferior à unidade de cultura; b) que o preferente seja dono de prédio confinante com o prédio alienado; c) que o adquirente do prédio não seja proprietário confinante;
2. Se houver vários proprietários confinantes com o prédio vendido e a venda tiver sido feita a um deles, os demais proprietários confinantes não podem preferir.
III. DECISÃO
Em face do exposto, julga-se a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes.
***
Guimarães, 14 de Dezembro de 2010