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EXECUÇÃO
SUSPENÇÃO DA EXECUÇÃO
CESSAÇÃO
Sumário
I – O artº 882º do Código de Processo Civil é uma norma própria do processo executivo que, não estabelecendo prazo para a suspensão da instância impõe, todavia, a obrigatoriedade de uma calendarização, ao exigir que o requerimento respectivo contenha um plano de pagamento. II - Esse plano de pagamento traduzirá, por isso, o tempo durante o qual a instância executiva se encontrará suspensa. III - Decorrido esse tempo, cessa a suspensão e volta a correr o prazo legal concedido para dedução de oposição à execução.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I - Relatório
No Tribunal Judicial de Braga, o Sr. Juiz da Vara de Competência Mista proferiu despacho que indeferiu, por extemporâneo, o requerimento de oposição à execução apresentado pela recorrente Silva…, Ldª.
Com ele não se conformando, veio interpor recurso a oponente da execução supra identificada.
Nas correspondentes alegações, concluiu do seguinte modo: 1ª - A ora Recorrente foi citada para os termos de execução, no dia 6 de Agosto de 2009, mas o prazo de 20 (vinte) dias para deduzir oposição à execução, conta-se a partir do dia 1 de Setembro de 2009 (primeiro dia posterior ao do termo das férias judiciais - art. 144, nº 1 do CPC). 2ª - No dia 9 de Setembro de 2009, a Exequente e a Executada requereram a suspensão da instância. 3ª - Pronunciando-se sobre o requerimento referido na conclusão anterior, o Tribunal “a quo”, por despacho do dia 23 de Setembro de 2009, decidiu: “Ao abrigo do disposto no artº 882º do Código de Processo Civil, declara-se suspensa a instância até pagamento da última prestação acordada.”. 4ª - Os efeitos do despacho que decretou a suspensão da instância retroagem-se à data da entrada do requerimento mencionado na conclusão 2ª. 5ª - O despacho que decretou a suspensão da instância não estabeleceu data limite para o período da suspensão, e os seus efeitos mantêm-se até ao pagamento da prestação, ou até à data da prolação de novo despacho a ordenar o prosseguimento dos autos, se aquele pagamento não for efectuado na data acordada, conforme o disposto no art.884 do CPC. 6ª - “In casu”, a Executada não pagou a prestação, na data acordada, mas invocou uma causa legítima para o seu não pagamento, na oposição que deduziu à execução. 7ª - Requerido o prosseguimento da execução, a Executada pugnou, tempestivamente, pelo seu indeferimento. 8ª - No dia 12 de Fevereiro de 2010, a ora Recorrente foi notificada do despacho que ordenou o prosseguimento dos autos de execução, e no dia 19 de Fevereiro de 2010, deduziu oposição à execução e apresentou o pedido de prestação de caução. 9ª - A oposição à execução foi deduzida tempestivamente, porque o processo de execução esteve suspenso desde o dia 9 de Setembro de 2009 até ao dia 12 de Fevereiro de 2010. 10ª - O prazo de 20 (vinte) dias para a oposição à execução conta-se desde o dia 1 de Setembro de 2009 até ao dia 9 de Setembro de 2009 e desde o dia 13 de Fevereiro de 2010 até ao dia 23 de Fevereiro de 2010. 11ª - O regime da suspensão da instância decretada ao abrigo do disposto no artº 882 do CPC é especial e tem regra própria para a cessação dos seus efeitos – “vide” arts. 284, nº 1, d) e 884 do CPC. 12ª - O despacho recorrido assenta num equívoco, porque a data nele mencionada para o termo do período de suspensão da instância – 30-11-2009 – corresponde à data do vencimento da obrigação; não consta do despacho que ordenou a suspensão da instância; e não obedece nem dá cumprimento ao comando do art. 884 do Código de Processo Civil que fixa o regime da cessação da suspensão da instância executiva, decretada ao abrigo do disposto no art. 882 do CPC. 13ª - O despacho recorrido frustra os objectivos que as partes visaram com o requerimento de suspensão da instância e viola ou não faz correcta interpretação e aplicação das normas dos artºs 144º, nº1, 276º, nº1, d), 283º, nº2, 284º, nº1, d), 882º e 884º, todos do CPC. 14ª - O despacho recorrido viola também o disposto no artº 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, porque recusa, ilicitamente, à ora Recorrente, o direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido por lei.
Termina pedindo a revogação do despacho sob censura e admitida a oposição à execução e o respectivo incidente de prestação de caução.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II – Factos Provados
A executada foi citada no dia 6-8-2009.
Por requerimento de 9-9-2009 as partes requereram a suspensão da instância.
Por despacho do dia 23 de Setembro de 2009, decidiu o Tribunal a quo: “Ao abrigo do disposto no artº 882º do Código de Processo Civil, declara-se suspensa a instância até pagamento da última prestação acordada.”.
Este despacho foi notificado às partes em 24-9-2009.
A última prestação acordada deveria ser paga até ao dia 30-11-2009, que a recorrente não pagou na aludida data.
No dia 12 de Fevereiro de 2010, a ora Recorrente foi notificada do despacho que ordenou o prosseguimento dos autos de execução.
No dia 19 de Fevereiro de 2010, a mesma deduziu oposição à execução e apresentou o pedido de prestação de caução.
Perante esta apresentação, foi proferido o seguinte despacho, agora sob recurso:
«Dos autos de execução resulta que a executada foi citada no dia 6-8-2009 e por requerimento de 9-9-2009 as partes requereram a suspensão da instância. O tribunal determinou a suspensão até ao pagamento da última prestação acordada, ou seja, até ao dia 30-11-2009, por despacho de 23-9-2009, notificado às partes em 24-9-2009.
O requerimento apresentado pelas partes no decurso do prazo de oposição, por si só, não tem a virtualidade de determinar a suspensão da instância e, como tal, não tem influência no prazo em curso. Consequentemente, quando foi determinada a suspensão da instância já tinha decorrido o prazo de 20 dias para deduzir oposição (cf. artigo 813.º n.º 1 do Código Processo Civil).
Todavia, admitindo o entendimento de que a suspensão teria efeito desde a data da entrada do requerimento, certo é que não se inutiliza o prazo decorrido anteriormente (cf. artigo 283º nº2 do Código Processo Civil). Pelo que, cessada a suspensão em 30-11-2009 e continuando a correr o prazo da oposição à execução, o respectivo termo ocorreu no dia 11-12-2009.
Conclui-se, pois, que a oposição deduzida pelo executado mediante requerimento apresentado em 19-2-2009 é manifestamente extemporânea.
Em face do exposto e ao abrigo do disposto no artigo 817.º n.º 1 alínea a) do Código Processo Civil, indefere-se liminarmente a oposição por ter sido deduzida fora de prazo». III – O Direito
Anteriormente à reforma introduzida pelo DL 329-A/95, a doutrina e a jurisprudência eram praticamente uniformes no sentido de que norma do artº279º Código de Processo Civil, que permite a suspensão da instância “por determinação do juiz” não era aplicável à acção executiva.
Assim o entendiam o Prof. Alberto dos Reis (Comentário ao Código de Processo Civil, 3º, pág. 274), os Cons. Rodrigues Bastos (Notas o Código de Processo Civil, II, pág. 45) e Lopes do Rego (Comentários ao Código de Processo Civil, 2ª ed., 281/282), e, ainda, entre muitos outros, os Acs. do STJ de 04/06/1980 (BMJ 298º-232), de 14/01/1993 (CJ, T.1-59) e de 18/06/1996 (CJ, T.2-149).
Subjacente a esta posição estava a ideia de que, uma vez que a suspensão resultava de estar a decisão da causa dependente do julgamento de outra já proposta, parecia clara a sua inaplicabilidade ao processo de execução, em que não há que proferir decisão sobre o fundo da causa, visto o direito que se pretende efectivar já estar declarado.
Porém, a aludida reforma veio introduzir o acordo de pagamento e pôs fim à aludida controvérsia - se seria lícito ao juiz suspender a acção executiva, com base no artº 279º-1 CPC (“motivo justificado”…) - criando, para a suspensão da instância executiva com esse fundamento, um regime especial, liberto do prazo de seis meses por ele imposto com o limite temporal da suspensão do processo (declarativo ou executivo) por acordo das partes (ver Lopes do Rego, Comentário ao CPC…, artº 882-1).
O artº 882º preceitua, na verdade, que é admitido o pagamento em prestações da dívida exequenda, se exequente e executado, de comum acordo, requererem a suspensão da instância executiva.
Esta norma própria do processo executivo, que não estabelece prazo para a suspensão da instância e tem por escopo obstar à necessidade da venda executiva, impõe, todavia, a obrigatoriedade de uma calendarização, ao exigir que o requerimento respectivo contenha um plano de pagamento.
Esse plano de pagamento traduzirá, por isso, o tempo durante o qual a instância executiva se encontrará suspensa, isto é, enquanto não se verificar a sua extinção decorrente do pagamento de todas as prestações.
Este prazo, assim obtido, consubstancia-se num prazo a favor do devedor, havendo, todavia, possibilidade quer da sua perda, quer de ficar sem efeito a suspensão da execução.
A perda de prazo verifica-se quando o executado deixa de pagar qualquer das prestações acordadas, uma vez que o incumprimento imputável ao executado tem como consequência o vencimento imediato das seguintes, possibilitando ao exequente que requeira o prosseguimento da execução para satisfação do remanescente do seu crédito – artº 884º do Código de Processo Civil.
Por seu turno, a suspensão fica sem efeito em duas situações: se algum credor, cujo crédito esteja vencido e cuja reclamação haja sido admitida, requerer o prosseguimento da execução para satisfação do seu crédito (artº 885º, nº1, 1ª parte); se o credor que obteve segunda penhora sobre os mesmos bens reclamar o seu crédito nos quinze dias posteriores à notificação do despacho que ordenou a suspensão da segunda execução (art. 885º, nº1, 2ª parte) – Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, 361.
Do regime acabado de expor seguem-se, na nossa opinião, duas conclusões:
A primeira é a de que, apresentado o requerimento de pagamento em prestações, a instância suspende-se até ao termo do prazo ali acordado, sem qualquer margem de arbítrio do juiz, que só após o respectivo términus voltará a conduzir o processo;
A segunda é a de que, só mediante requerimento do exequente e verificados que sejam os respectivos pressupostos, poderá deixar de vigorar o aludido prazo que havia sido acordado em favor do executado.
No caso que ora nos ocupa, as partes apresentaram requerimento de pagamento da dívida exequenda em prestações e, mediante ele, o Sr. Juiz a quo, no cumprimento do artº 882º, declarou suspensa a instância.
Fez constar do seu despacho que a declarava suspensa até ao pagamento da última prestação acordada.
Como é bom de ver, queria com isto significar que a suspensão ocorreria até ao termo do prazo estipulado para pagamento e não ao pagamento, caso contrário cairíamos no absurdo de, por falta de pagamento, a instância ficar suspensa ad aeternum!
Portanto, nada sendo requerido até àquela data, a suspensão manter-se-ía e, vencida ela, o processo seguiria os seus termos normais, sem necessidade de qualquer outro requerimento para que a suspensão findasse, tanto mais que deixou de vigorar no nosso processo executivo o princípio segundo o qual o impulso processual incumbe às partes.
Para que se verificasse o fim da suspensão em data diferente, algo mais teria de ocorrer, isto é, ou um requerimento do exequente invocando incumprimento, ou um requerimento de terceiros, ao abrigo do artº 885º do Código de Processo Civil.
Ambas as situações, porém, sempre seriam em benefício dos credores e, por isso, poriam fim ao prazo concedido a favor do devedor/executado.
Quer-se com isto dizer que não constituía expectativa legítima da executada, ora apelante, a existência de um outro prazo a seu favor, para além da data de vencimento da última prestação, no caso, 30-11-2009 e que, de acordo com o teor do despacho ali terminaria a suspensão.
O requerimento do exequente previsto no citado artº 884º ocorreria, na previsão da norma, visando o prosseguimento da execução antes da data anteriormente estabelecida.
Tenha-se, agora, presente que a recorrente foi citada no dia 6-8-2009 e por requerimento de 9-9-2009 as partes requereram a suspensão da instância, que foi deferida.
Sendo inquestionável que, de acordo com o disposto no artº 283º, nº2, do Código de Processo Civil, o prazo entretanto decorrido até ao início da suspensão não ficaria inutilizado, impõe-se concluir que sempre a oposição a apresentar teria de dar entrada até ao dia 11.12.2009, acrescido dos 3 dias consignados no artº 145º do mesmo diploma. Porém, foi oferecida a 19-2-20010, pelo que é extemporânea.
Bem andou, pois, o Tribunal a quo.
IV – Decisão:
Nestes termos, acordam os juízes que constituem esta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Guimarães, 15 de Março de 2011
Raquel Rego
Mário Brás
António Sobrinho