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DEPOIMENTO DE PARTE
Sumário
I - Só é admissível o depoimento de parte do comparte se este interveio no processo, tomando posição ou alegando factos que lhe são desfavoráveis. II - Não tendo o comparte réu contestado, não pode dizer-se que assumiu na acção posição divergente do requerente do depoimento, pelo que a prestação do depoimento não é admissível.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
José …. propôs a presente acção comum, com forma sumária contra Alberto … e esposa Cidália … e Valdemar …, pedindo que seja a acção julgada procedente por provada e, em consequência, seja cada um dos 1ºs e 2º réus condenados a restituir ao A. o valor de 3.749,50 €, acrescido dos juros sobre o referido valor, contados à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.
Contestaram os réus Alberto… e esposa Cidália…., pugnando pela improcedência da acção.
Os autos prosseguiram a sua normal tramitação.
A fls. vieram os Réus Alberto…. e mulher Cidália…., apresentar o seu requerimento de prova, no qual, para além do mais, requerem o depoimento de parte do Réu Valdemar …. a toda a matéria da petição inicial e da contestação.
Sobre este requerimento recaiu o seguinte despacho judicial: “Requerem os Réus Alberto … e Cidália … o depoimento de parte do Réu Valdemar a toda a matéria da petição inicial e da contestação. O Autor José … deduziu oposição alegando que tal depoimento não deve ser admitido quanto à matéria da contestação, pois esta versa sobre matéria que é favorável ao depoente, e a prova por confissão apenas poderá versar sobre factos que são desfavoráveis ao confitente. Nos termos do disposto no artº 553º, nº3 do CPC, as partes podem requerer não só o depoimento da parte contrária, mas também o depoimento dos seus compartes. Porém, entende-se que há que fazer uma interpretação restritiva da disposição legal em análise quanto ao depoimento dos compartes, só devendo este ser admitido quando aqueles assumam posições divergentes quanto ao objecto do processo, salientando-se que a finalidade do depoimento de parte é a obtenção da confissão do confitente de factos que lhe sejam desfavoráveis. Não é, a nosso ver, o caso dos autos, porquanto o Réu Valdemar optou por uma posição de total inércia nos autos, não tendo apresentado contestação, decorrendo da contestação apresentada que a sua posição é idêntica à dos RR. Contestantes. Nestes termos, indefiro o depoimento de parte requerido pelos RR.”
Os Réus Alberto … e esposa Cidália … interpuseram recurso deste despacho, visando a revogação do despacho recorrido, conforme alegação, em que concluem, em síntese, que a falta de contestação por parte do co-réu não pode permitir concluir-se que a posição do co-réu é idêntica à dos recorrentes e que não é possível saber qual o teor do depoimento do co-réu, não se podendo prever se vai confessar ou não os factos.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Corridos os vistos, cumpre decidir, para o que importa ter em consideração o decorrente do relatório que antecede.
A única questão que demanda apreciação e decisão é saber se deveria ou não ter sido admitido o depoimento de parte requerido pelos Réus.
Dispõe o nº 3 do artº 553º do CPC que «cada uma das partes pode requerer não só o depoimento da parte contrária, mas também o dos seus compartes».
O depoimento de parte é um meio processual destinado a provocar a confissão judicial, ou seja, o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária (art. 352º C.Civil).
A confissão tem forçosamente que incidir sobre factos desfavoráveis ao confitente e favoráveis à parte contrária. Como afirma Alberto dos Reis (in Código Processo Civil, Anotado, IV, pág. 70), a confissão constitui prova, não a favor de quem a emite, mas a favor da parte contrária; portanto recai necessariamente sobre factos desfavoráveis ao confitente e favoráveis ao seu adversário.
Daqui a maioria da doutrina e jurisprudência têm sustentado o entendimento de que o depoimento de parte tem de incidir necessariamente sobre factos desfavoráveis do depoente, pois apenas estes são susceptíveis de serem confessados.
Por outro lado, atento o seu objecto, o depoimento de parte só pode incidir sobre factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, em conformidade com o disposto no art. 554º, nº 1 CPC.
Por outro lado, para que se possa requerer o depoimento de parte do seu comparte, considera Lebre de Freitas, que «o requerente deve ter um interesse próprio, por definição antagónico ao do depoente, na prova dos factos sobre os quais pretende obter a confissão» (Código de Processo Civil Anot., vol. 2º, pág. 503).
O artº 553º, nº3 do CPC apenas permite que se exija o depoimento de comparte se este toma posição ou alega factos diferentes do comparte que requer o seu depoimento, favoráveis a este e desfavoráveis àquele (cfr. Ac STJ de 27.01.2004: Proc.03ª3530/ITIJ/Net).
Neste sentido, o ac. RL de 21.04.2004: Proc. 972/2004-4.dgsi.Net: “O depoimento de parte visa, em princípio, a obtenção da confissão – ou seja, o reconhecimento pelo depoente da realidade de factos desfavoráveis para si e favoráveis para a parte contrária. Daí que o réu só possa pedir o depoimento do co-réu quando este assuma na acção posições divergentes das suas”.
E, além dos acórdãos citados, entre outros, o ac. RL de 3.10.2000: Col. Jur., 2000, 4º-102.
No caso presente, os Réus Alberto … e Cidália… requereram o depoimento de parte do co-réu Valdemar a toda a matéria da petição e da contestação.
O Réu Valdemar não contestou.
Da falta de contestação, não pode inferir-se que o réu, cujo depoimento de parte se requer, assumiu na acção posição divergente do requerente do depoimento.
Deste modo, à luz do exposto, não é de admitir o requerido depoimento de parte do co-réu Valdemar.
Termos em que, julgando a apelação improcedente, confirma-se a decisão recorrida na parte em que indeferiu o depoimento de parte requerido pelos RR.
Custas, pelos recorrentes.
Guimarães, 7/4/2011
Amílcar Andrade
José Rainho
Carlos Guerra