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CÚMULO JURÍDICO DE PENAS
PENA UNITÁRIA
DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DA PENA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário
I – Com a reforma de 2007 o cúmulo jurídico de penas passou a abranger penas cumpridas, prescritas ou extintas e a determinação superveniente da pena única do concurso passou a suceder tão-só relativamente a crimes cuja condenação haja transitado em julgado. II – Em sede de conhecimento superveniente do concurso, exige-se que todos os crimes tenham sido praticados antes do trânsito em julgado da condenação por qualquer um deles. III – Quando haja crimes cometidos antes e depois do trânsito em julgado de decisões integrantes do cúmulo, importa formar um primeiro cúmulo tomando por referência a primeira decisão transitada em julgado e os crimes cometidos em data anterior àquele trânsito, sendo que os crimes praticados em data posterior devem ser por sua vez aglutinados com referência à primeira das condenações que entre eles haja transitado em julgado, bem como aos factos cometidos antes de tal trânsito praticados, e assim sucessivamente quanto aos demais crimes, se os houver, formando-se tantas penas autónomas de execução sucessiva quanto os cúmulos a efetuar nesses termos. IV- Existe omissão de pronúncia quando o Tribunal, sem a menor alusão, deixa fora do cúmulo pena que dele devia fazer parte.
Texto Integral
Acordam na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:
I.
RELATÓRIO. ---
Nestes autos de processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, a 2.ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial da comarca de Guimarães, por acórdão de 05.07.2012, depositado no mesmo dia, deliberou, além do mais, ---
Condenar o arguido Duarte L... Preso à ordem do processo n.º 370/07.0GEGMR. --- ---
«Na pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão», em cúmulo jurídico das penas em que o mesmo foi condenado nestes autos e no processo 23/11.4PEGMR Cf. volume I, fls. 250 a 265. ---. --- Do recurso para a Relação. ---
Inconformado com a referida decisão, o Arguido veio dela interpor recurso para este Tribunal em 01.08.2012, concluindo as suas motivações nos seguintes termos: (transcrição) ---
«I - O arguido é o segundo de três filhos de um casal de limitados recursos económicos.
II - Aos dezasseis anos iniciou o consumo de estupefacientes e com a escalada deste comportamento foram surgindo complicações ao nível da sua situação familiar e desempenho da sua actividade laboral.
III - Ao nível da saúde apresenta algumas fragilidades sendo portador de doença infecto-contagiosa, com acompanhamento hospitalar em ambulatório.
IV - O recorrente beneficia de apoio emocional por parte da esposa, que o tem visitado no estabelecimento prisional e pretende regressar para junto desta quando sair em liberdade, o que também por ela é aceite.
V - O recorrente mostrou-se arrependido dos comportamentos tidos e mostra receio de não voltar a ver o filho menor uma vez que padece de doença infecto-contagiosa e teme não sobreviver ao termo do cumprimento da pena de prisão.
VI - De acordo com o n.° 2 do artigo 77.º do Código Penal a pena aplicável, em cúmulo jurídico, tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
VII - Ora, neste caso foram aplicadas ao recorrente as penas de 2 anos de prisão (nestes autos) e de 6 meses de prisão (no processo n.° 23/11.4PEGMR do 1º Juízo Criminal do Tribunal de Guimarães).
VIII - Assim, a pena de prisão a aplicar será entre os 2 anos e os 2 anos e seis meses.
IX - A pena efectivamente aplicada ao recorrente é muito elevada.
X - 0 tribunal a quo errou na medida da pena aplicada.
XI - O acórdão recorrido não fez a correcta aplicação dos artigos 71.º e 72.º do Código Penal. A aplicação dos fins gerais e especiais das penas não foi considerada, pelo que a pena concretamente aplicada ao recorrente não deveria ser superior ao mínimo legalmente previsto, ou seja, 2 anos e um mês de prisão.
XII - O acórdão violou os artigos 71.º e 72.º do Código Penal.
Termos em que, recebido o presente recurso, devem V. Exas. alterar a medida da pena e fixá-la no mínimo legal de 2 anos e um mês de prisão.
Mas, como sempre, V. Exas. decidirão de forma a fazer Justiça» Cf. volume I, fls. 269 a 270 verso. ---. ---
Notificada do referido recurso, o Ministério Público respondeu ao mesmo, tendo concluído pela respectiva improcedência Cf. volume II, fls. 273 a 275. ---. ---
Neste Tribunal, na intervenção aludida no artigo 416.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o Ministério Público foi de parecer que deve ser negado provimento ao recurso Cf. volume II, fls. 284 e 285. ---. ---
Notificados daquele parecer, o Arguido nada disse. ---
Proferido despacho liminar, colhidos os vistos legais e efectuada a conferência, cumpre ora apreciar e decidir. --- II. OBJECTO DO RECURSO.
Atentas as indicadas conclusões apresentadas, sendo que é a tais conclusões que este Tribunal deve atender no presente recurso, definindo aquelas o objecto deste, sem prejuízo de questões de conhecimento oficioso, cumpre no presente acórdão apreciar e decidir tão-só do cúmulo de jurídico de penas em causa. --- III. DA DECISÃO RECORRIDA – FACTOS E SUA MOTIVAÇÃO. ---
A decisão recorrida configura a factualidade provada e não provada, assim como a respectiva motivação da seguinte forma: (transcrição) ---
«2.1.- Factos provados.
Discutida a causa, o Tribunal apurou que:
1- Por acórdão proferido nos presentes autos em 17.10.2011 e já transitado em julgado, o arguido foi condenado pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.°, n.° 1, do Código Penal, na pena de dois anos de prisão.
2- No referido acórdão foram considerados provados os seguintes factos:
- No dia 13 de Abril de 2010, pelas 1h10m, o arguido circulava ao volante do veículo automóvel de marca "volkswagen", modelo "Golf”, cor azul, na Rua da Cruz da Pedra, Creixomil, área desta comarca, quando avistou o ofendido Adão Agostinho Pereira, que ali circulava no seu veículo automóvel.
- Logo ali decidiu assaltá-lo e retirar-lhe os bens e valores que levava.
- Em execução de tal propósito, o arguido imobilizou o veículo automóvel que conduzia à frente do veículo onde circulava o ofendido forçando-o a parar de imediato e, acto contínuo, abriu a porta do lado do condutor onde se encontrava Adão P... e disse-lhe: "dá-me tudo o que tens".
- Nessa altura e porque Adão P... não lhe obedeceu, retirou do bolso das calças que trazia vestidas um objecto com uma lâmina, vulgo punhal, desferindo o mesmo na face do lado esquerdo, junto à orelha daquele enquanto proferia as seguintes expressões "dá-me tudo o que tiveres e vais comigo", "vou-te arrumar para que não contes a ninguém que fui eu que te roubei".
- Nesse momento, porque ouviu um cão a latir no interior daquele veículo, afastou-se mas não sem antes dizer a Adão P... "se fizeres queixa contra mim arrumo contigo" colocando-se, de imediato, em fuga.
- Em consequência dos factos supra descritos o arguido causou a Adão P... uma escoriação linear vertical com 4 cm de comprimento na região masseteriana esquerda da face, que lhe provocaram dores e sete dias de doença sem afectação da capacidade de trabalho geral e profissional.
- Ao actuar da forma descrita pretendia o arguido subtrair e apoderar-se dos bens e objectos que o ofendido transportava.
- Quis o arguido, por meio de violência, subtrair e apoderar-se de coisas que sabia não lhe pertencerem e que agia contra a vontade e autorização do respectivo proprietário.
- Planeou a forma de actuar e os meios empregues, bem sabendo que só lograva alcançar os seus objectivos mediante o uso da força e violência que veio, efectivamente, a ser actualizada, coarctando ao ofendido qualquer possibilidade de resistência.
- Objectivo este, que não logrou alcançar, por motivos alheios à sua vontade.
3- Nos autos de processo sumário n.º 23/11 4PEGMR que termos no 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, por sentença proferida em 6.06.2011 e transitada em julgado em 30.09.2011, o arguido Duarte L... foi condenado, pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo art. 203.°, n.° 1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão.
4- Na referida sentença foram considerados provados os seguintes factos:
- No dia 24.05.2011, pelas 15h15m, o arguido entrou no estabelecimento comercial denominado "I...", pertencente a "D..., Supermercados, Lda.", sito na Rua da Eira, n.° 85, em Mesão Frio, Guimarães.
- No interior do referido estabelecimento, retirou dos expositores e colocou numa mochila os artigos descritos no documento de fls. 14, no valor global de € 89,73, tendo passado pela caixa registadora sem proceder ao seu pagamento, altura em que foi interceptado por funcionários do estabelecimento.
- O arguido conhecia os factos descritos, quis actuar como actuou, sabendo que aqueles artigos não lhe pertenciam, que se apoderara de tais objectos para fazer deles coisa sua, contra a vontade do seu legítimo proprietário.
- Sabia que a sua conduta é proibida e punida por lei.
5- Do registo criminal do arguido consta que:
- por sentença proferida em 5.03.1998, no processo comum singular n.° 358/97, do 2.° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de trinta dias de multa, à taxa diária de Esc. 200$00, pela prática, em 13.10.1996, de um crime de consumo de estupefaciente;
- por acórdão proferido em 14.11.2000, transitado em julgado em 29.11.2000, no processo comum colectivo n.° 40/00, da 1.ª Vara do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de cem dias de multa, à taxa diária de Esc. 300$00, pela prática, em 1.09.1999, de um crime de auxílio material;
- por acórdão proferido em 20.04.2001, transitado em julgado em 7.05.2001, no processo comum colectivo n.° 751/99.OPBGMR, da 2. Vara Mista do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de um ano e nove meses de prisão, suspensa na sua execução por três anos, pela prática, em 19.06.1999, de um crime de roubo;
- por acórdão proferido em 9.01.2002, transitado em julgado em 29.01.2002, no processo comum colectivo n.° 954/99.8, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, foi o arguido condenado na pena de três anos e dois meses de prisão, pela prática, em 28.10.1999, de um crime de furto qualificado;
- por acórdão proferido em 12.04.2002, transitado em julgado em 23.05.2002, no processo comum colectivo n.° 1446/98.8PB3GMR, da 2.ª Vara do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de dois anos de prisão, suspensa na sua execução por três anos, pela prática, em 25.10.1998, de um crime de roubo;
- por acórdão proferido em 13.01.2003, transitado em julgado em 6.03.2003, no processo comum colectivo n.° 1446/98.8PBGMR, da 2.ª Vara do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena única de quatro anos e seis meses de prisão;
- por sentença proferida em 9.04.2010, transitada em julgado em 9.04.2010, no processo sumaríssimo n.° 1377/08.5PBGMR, do 2.° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de quarenta dias de multa, à taxa diária de € 5,00, pela prática, em 17.04.2008 Por manifesto lapso de escrita, o acórdão recorrido refere a data de «17.09.2011» como a dos factos - cf. certidão de fls. 196 a 205. ---
, de um crime de furto;
- por acórdão proferido em 1.03.2011, transitado em julgado em 29.03.2011, no processo comum colectivo n.° 370/07.OGEGMR, da 1.ª Vara Mista do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de um ano e nove meses de prisão, pela prática, em 1.10.2004, de um crime de burla na forma tentada, em 15.10.2007, de um crime de roubo na forma tentada, e em 1.10.2004, de um crime de falsificação de boletins, actas ou documentos;
- por sentença proferida em 6.06.2011, transitada em julgado em 30.09.2011, no processo sumário n.° 23/11.4PEGMR, do 1.° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de seis meses de prisão, pela prática, em 24.05.2011, de um crime de furto Por manifesto lapso de escrita, o acórdão recorrido refere o processo n.º «23/22.4PEGMR» e a data de «30.00.2011» como a do trânsito em julgado - cf. certidão de fls. 208 a 214. ---;
- por acórdão proferido em 17.10.2011, transitado em julgado em 7.11.2011, no processo comum colectivo n.° 633/10.7PBGMR Por manifesto lapso de escrita, o acórdão recorrido refere o processo n.º «630/10.7PBGMR». ---, da 2.ª Vara Mista do Tribunal Judicial de Guimarães, foi o arguido condenado na pena de dois anos de prisão, pela prática, em 13.04.2010, de um crime de roubo.
6- O arguido é o segundo de três filhos de um casal de limitados recursos económicos, sendo o progenitor pintor da construção civil e a mãe operária têxtil.
7- O seu processo de desenvolvimento decorreu dentro da normalidade, integrando uma estrutura familiar estável, tendo os progenitores proporcionado as condições básicas necessárias à manutenção do quotidiano.
8- O arguido completou o 9.° ano de escolaridade, com quinze de idade.
9- Refere alguns problemas de comportamento, porém não implicativos da normal progressão do seu percurso escolar.
10- Abandonou a escola por iniciativa própria.
11- Iniciou-se profissionalmente como ajudante de motorista numa empresa de cutelaria, apresentando outras experiências profissionais como motorista e como escriturário.
12- Aos dezasseis anos iniciou o consumo de estupefacientes, tendo conseguido, numa fase inicial, manter alguma estabilidade comportamental.
13- Com a escalada deste comportamento, foram surgindo complicações ao nível da sua situação familiar e desempenho da sua actividade laboral.
14- O arguido refere algumas tentativas de tratamento, mas sem sucesso.
15- Vivencia um agudizar da relação familiar, tendo culminado na sua saída de casa.
16- Passa, então, a residir em casas abandonadas, com outros grupos de indivíduos relacionados com a toxicodependência.
17- Contraiu casamento aos 33 anos de idade, tendo resultado um filho, que foi retirado judicialmente, encontrando-se aos cuidados de uma irmã do arguido.
18- Ao nível da saúde, apresenta algumas fragilidades, sendo portador de doença infectocontagiosa, com acompanhamento hospitalar em ambulatório.
19- Beneficou de liberdade condicional em 2006, procurando responder às regras de conduta impostas nesse âmbito.
20- Após o termo da liberdade condicional, o arguido retomou o comportamento aditivo, entrando num crescente desorganizar do seu estilo de vida, voltando a cometer actos ilícitos.
21- À data dos factos, o arguido residia com a esposa num imóvel arrendado, com modestas condições de habitabilidade, em Creixomil, Guimarães.
22- Esta estrutura familiar apresentava uma dinâmica com acentuadas fragilidades, devido aos hábitos aditivos do casal e ausência de rendimentos.
23- O arguido não exercia qualquer actividade profissional, efectuando esporadicamente trabalhos no sector da construção civil.
24- Esta situação pessoal e familiar manteve-se até à detenção do arguido em Junho de 2011.
25- Encontra-se actualmente detido no Estabelecimento Prisional Regional de Guimarães, onde cumpre pena de prisão.
26- O arguido está em ruptura relacional com a família de origem, a qual evidencia desgaste face ao estilo de vida adoptado pelo arguido em meio livre, bem como pelos seus contactos com a justiça, verificando-se um distanciamento relacional significativo por parte destes.
27- Beneficia de apoio emocional por parte da esposa, que o tem visitado no estabelecimento prisional.
28- Pretende regressar para junto da esposa quando sair em liberdade, intenção manifestada também por esta.
29- O arguido esteve, provisoriamente, no Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo, para avaliação da possibilidade de ingresso na Unidade Livre de Drogas, para tratamento à problemática aditiva.
30- No entanto, foi recusada a sua permanência neste serviço, devido à sua situação jurídica indefinida.
31- Reagiu de forma negativa à pena de prisão aplicada, com dificuldades de adaptação ao meio prisional, com registo de incidentes disciplinares.
32- Em julgamento, verbaliza arrependimento e o receio, motivado doença infecto-contagiosa de que padece, de não sobreviver ao termo cumprimento da pena e de não voltar a ver o seu filho.
2.2.- Motivação.
O Tribunal baseou a sua convicção na análise das certidões juntas a fls. 179 a 205 e 208 a 214, do certificado de registo criminal de fls. 153 a 163 e do relatório social junto aquando do julgamento, conjugados com as declarações prestadas pelo arguido em julgamento» Cf. volume I, fls. 250 a 256. ---. IV. FUNDAMENTAÇÃO. --- Do concurso de crimes. ---
Nos termos do artigo 78.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, na redacção da Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, aplicável in casu, «se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior (…)», as quais definem os termos da punição do concurso de crimes, «sendo a pena que já estiver cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes», aplicando-se tal regime «(...) só (…) relativamente aos crimes cuja condenação transitou em julgado». ---
Alargando significativamente os casos de determinação superveniente da pena única do concurso, a reforma de 2007 deixou de exigir que a pena em que o agente foi condenado, por decisão transitada em julgado, não estivesse cumprida, prescrita ou extinta. ---
Por outro lado, com tal reforma a determinação superveniente da pena única do concurso passou a ocorrer tão-só relativamente a crimes cuja condenação transitou em julgado. ---
Explicitando, em sede de conhecimento superveniente do concurso só relevam, pois, os crimes que tenham sido cometidos antes de transitar em julgado a condenação por qualquer um deles. ---
Ou seja, o momento decisivo para a verificação da ocorrência de um concurso de crimes a sujeitar a uma pena única é o trânsito em julgado da condenação: todos os crimes praticados antes daquele trânsito devem ser objecto de cúmulo jurídico.
Ao cometer crimes após o trânsito em julgado da decisão o Arguido revela desrespeito pela solene advertência que a decisão judicial constitui, pelo que os novos crimes não podem ser tidos numa relação de concurso com os anteriormente cometidos e já julgados na decisão transitada. ---
Tais novos factos devem ser punidos de forma autónoma, com cumprimento sucessivo das respectivas penas. ---
Orientação diversa, consagrando o chamado cúmulo por arrastamento, não se coaduna com a teleologia e a coerência internas do ordenamento jurídico-penal, não tendo em conta as necessárias diferenças entre os institutos do concurso de crimes, da sucessão de crimes e da reincidência. ---
A primeira decisão transitada será, assim, o elemento aglutinador de todos os crimes que estejam em relação de concurso, englobando-os em cúmulo, demarcando as fronteiras do círculo de condenações objecto de unificação. ---
A partir desta barreira inultrapassável fica afastada a unificação, formando-se outras penas autónomas, de execução sucessiva, as quais podem estar, por sua vez, entre si numa ou em várias relações de concurso, havendo então que unificá-las numa ou em várias penas únicas, de cumprimento sucessivo, sempre com referência à primeira das condenações que haja transitado em julgado e aos factos antes da mesma praticados No mesmo sentido vejam-se os acórdãos do Venerando Supremo Tribunal de Justiça de 19.12.2007, Processo n.º 07P3400, e 29.03.2012, Processo n.º 316/07.5GBSTS.S1-3.ª, ambos in www.dgsi.jstj.pt. . --- Na situação em apreciação. ---
A factualidade dada como provada permite-nos apresentar a seguinte tabela:
Processo
Data dos factos
Data da decisão
Data do trânsito
Crime cometido
Pena
358/97
2.º JC Guimarães
13.10.1996
05.03.1998
- / -
Consumo de estupefacientes
30 Dias de multa
40/00
1.ª VM Guimarães
01.09.1999
14.11.2000
29.11.2000
Auxilio material
100 Dias de multa
751/99.0PBGMR
2.ª VM Guimarães
19.06.1999
20.04.2001
07.05.2001
Roubo
1 Ano e 9 meses de prisão suspensa
954/99.8
1.º J Fafe
28.10.1999
09.01.2002
29.01.2002
Furto qualificado
3 Anos e dois Meses de prisão
1446/98.8PBGMR
2.ª VM Guimarães
25.10.1998
12.04.2002
23.05.2002
Roubo
2 Anos de prisão suspensa
1377/08.5PBGMR
2.ª JC Guimarães
17.04.2008
09.04.2010
09.04.2010
Furto
40 Dias de multa
370/07.0GEGMR
1.ª VM Guimarães
01.10.2004
15.10.2007
01.03.2011
29.03.2011
Burla tentada, roubo tentado e falsificação de boletins, actas ou documentos
1 Ano e nove meses
de prisão
23/11.4PEGMR
1.º JC Guimarães
24.05.2011
06.06.2011
30.09.2011
Furto simples
6 Meses de prisão
Nestes autos
2.ª VM Guimarães
13.04.2010
17.10.2011
07.11.2011
Roubo tentado
2 Anos de prisão
O Tribunal recorrido foi o da última condenação pelo que é o competente para o cúmulo jurídico de penas em causa – cf. artigo 471.º, n.º 2, do Código de Processo Penal. ---
As decisões proferidas no âmbito dos indicados processos n.ºs 358/97, 40/00, 751/99.0PBGMR, 954/99.8 e 1446/98.8PBGMR transitaram em julgado em data anterior à dos factos que integram os indicados quatro restantes processos e as penas neles aplicadas foram entretanto declaradas extintas, pelo cumprimento, tendo as penas de prisão aplicadas sido objecto de cúmulo jurídico no processo n.º 1446/98.8PBGMR, conforme decorre do Certificado de Registo Criminal do Arguido constante de fls. 153 a 163, pelo que as penas aplicadas no âmbito dos referidos processos n.ºs 358/97, 40/00, 751/99.0PBGMR, 954/99.8 e 1446/98.8PBGMR não integram o cúmulo jurídico de penas relativas aos processos n.ºs 1377/08.5PBGMR, 370/07.0GEGMR e 23/11.4GEGMR, bem como aos presentes autos. ---
No que respeita àqueles quatro último processos, a decisão condenatória que primeiro transitou em julgado foi a proferida no processo n.º 1377/08.5PBGMR, sendo que à data já havia sido cometida a factualidade em causa no processo n.º 370/07.0GEGMR, mas não a que aludem o processo n.º 23/11.4PEGMR e os presentes autos. ---
Por outro lado, a factualidade pela qual o Arguido foi condenado no âmbito dos presentes autos ocorreu em altura anterior à do trânsito em julgado da decisão proferida no indicado n.º 23/11.4PEGMR. ---
Tal significa que urge proceder a dois cúmulos jurídicos sucessivos de penas: um que abranja as penas aplicadas no âmbito dos processos n.ºs 1377/08.5PBGMR, 370/07.0GEGMR e outro que abranja as penas aplicadas nestes autos e no processo n.º 23/11.4PEGMR. ---
Ora, o Tribunal recorrido apenas procedeu àquele último cúmulo. ---
A omissão daquele primeiro cúmulo determina a nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia e determina que o Tribunal recorrido realize nova audiência e após profira novo acórdão cumulatório, procedendo aos dois apontados cúmulos sucessivos de penas – cf. artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal. --- V. DECISÃO. ---
Pelo exposto, revoga-se a decisão recorrida, ordenando-se que o Tribunal recorrido realize nova audiência e profira novo acórdão cumulatório nos termos supra explicitados. -
Sem tributação. ---
Notifique.
Guimarães, 22 de Outubro de 2012