DEPOIMENTO INDIRECTO
VALORAÇÃO PARA EFEITOS DE DIFAMAÇÃO
Sumário

I – O direito do arguido ao silêncio não assenta no intuito de o beneficiar, condicionando a prova testemunhal, mas decorre do princípio do acusatório, que impõe à acusação o dever de provar os factos imputados.
II – Tendo o arguido optado por não prestar declarações no exercício do seu direito ao silêncio, o tribunal pode valorar livremente o depoimento de testemunha que relate conversas tidas com ele, mesmo na parte em que se trata de testemunho de ouvir dizer.

Texto Integral

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães

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I- Relatório

José V... foi condenado pela prática de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos arts. 180.º, 182.º e 183.º n.º 1 al. a) e 2 do Código Penal na pena 320 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, perfazendo o montante de € 2.240,00.

Mais foi condenado a pagar € 6.500,00 à lesada Cláudia C... em sede de pedido de indemnização civil.

Inconformado recorre o arguido suscitando, em síntese, as seguintes questões:

- impugnação da matéria de facto (credibilidade do depoimento de Carlos R..., depoimento indirecto e direito ao silêncio do arguido);

- violação do princípio in dubio pro reo;

- medida da pena e do montante da indemnização civil.

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O Ministério Público junto do tribunal recorrido e a lesada responderam ao recurso, pugnando pela manutenção do julgado.

Admitido o mesmo, o Exº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no mesmo sentido.

Colhidos os vistos cumpre decidir.

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II- Fundamentação

Conforme é sabido, as conclusões do recurso delimitam o âmbito do seu conhecimento e destinam-se a habilitar o tribunal superior a conhecer as razões pessoais de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida (arts. 402º., 403º. e 412º., nº.1, todos do Código de Processo Penal e Ac. do STJ de 19-6-1996, BMJ nº.458, pág. 98), devendo conter, por isso, um resumo claro e preciso das questões desenvolvidas no corpo da motivação que o recorrente pretende ver submetidas à apreciação do tribunal superior.

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A) Factos provados

1- Em data indeterminada do mês de Outubro de 2009, o arguido criou uma página de rede social na internet denominada “HI5”, à qual associou uma fotografia da assistente.

2- Em Outubro de 2009, na referida página, o arguido identificou o seu utilizador com a dita fotografia da assistente a que deu o nome de “vaca”, com o comentário “num concurso de cus eu ganhava de caras”.

3- E manteve a página identificada como “Vaca que ri”.

4- Entre 18 de Outubro de 2009 e 10 de Novembro de 2009, além de outros conteúdos, o arguido manteve escrito na página o seguinte perfil:

a. Sobre mim: Sou uma grande vaca. Tenho a mania que sei tudo, que sou a maior. Mas sou rasca que chegue.

b. Interesses: Muito poucos para além de estar de boca aberta; isso já me ocupa o tempo todo.

c. Música Favorita: O hino nacional.

d. Filmes favoritos: A 5.ª pata do cavalo.

e. Shows de TV favoritos: O big brother.

f. Livros favoritos: Nunca consegui ler nenhum. Já agora o que é um livro?

g. Frase favorita: Abre a boca nem que seja para dizer asneiras.

5- O arguido manteve a página aberta, pelo menos entre 18 de Outubro de 2009 e 10 de Novembro de 2009.

6- Tendo, durante esse lapso temporal, enviado diversos pedidos de amizade para pessoas de Fafe, por forma a que estes utilizadores pudessem associar a página aos respectivos contactos e, desse modo, acompanharem a evolução da informação introduzida.

7- E, em 10 de Novembro de 2009 o arguido já tinha “41 amigos” associados, que acederam ao conteúdo da página.

8- Só não tendo mais “amigos” associados, porque muitas pessoas, ao aperceberem-se do conteúdo da página, não aceitavam o pedido de amizade enviado pelo arguido.

9- Como o arguido não impôs qualquer restrição à visualização do conteúdo da página, qualquer contacto dos “41 amigos” associados da página, bem como, qualquer curioso, pesquisador ou utilizador das redes sociais podia aceder à dita página da “HI5”.

10- Pelo que, o conteúdo da referida página de “HI5” foi vista por um número de pessoas que não é possível calcular.

11- Muitas delas amigas e/ou conhecidas da assistente.

12- E nem o facto de várias pessoas se terem insurgido contra o conteúdo da página e atitude do seu criador, através de comentários que deixaram ali escritos, fez o arguido retirar a página daquela rede social.

13- O arguido, com as expressões que escreveu e manteve na página quis, com todas elas, difamar a assistente identificando-a nos termos expostos na página e supra referenciados.

14- Além disso, o arguido sabia que a assistente era pessoa conhecida e referenciada em muitos locais.

15- Pois o arguido sabia que a assistente, além de ser advogada, também, na altura da prática dos factos era candidata à vereação da Câmara Municipal de Fafe, tendo sido eleita vereadora daquele município em Outubro de 2009.

16- Pretendendo, assim, com a sua actuação e o meio usado divulgar aqueles conteúdos ao maior número de pessoas que conhecessem ou tivessem referências da assistente.

17- Além disso, o arguido agiu com deliberada malvadez dirigindo convites a pessoas de Fafe imputando à assistente factos e condutas ofensivas da sua honra e consideração.

18- Com o intuito de ofender a assistente, como ofendeu, e bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

19- A assistente ficou muito ofendida com a conduta do arguido e com os juízos, factos e condutas que este lhe imputou.

20- Das quais só veio a tomar conhecimento porque os seus amigos lhe chamaram à atenção para a página e para o seu conteúdo.

21- E, de imediato, a assistente enviou um e-mail ao “HI5”, denunciando o conteúdo abusivo da página, que mandou cancelar, tendo apresentado queixa à Polícia Judiciária.

22- As redes sociais, como o HI5, são consideradas um dos meios mais utilizados de comunicação social.

23- O arguido é companheiro da irmã do companheiro da assistente.

24- O arguido efectuou a mencionada página para se vingar da assistente em virtude de uma desavença ocorrida em Setembro de 2009.

25- A assistente devido à conduta do arguido sofreu vergonha, humilhação, perda de auto-confiança e auto-estima.

26- A conduta do arguido determinou que a assistente suspeitasse de várias pessoas conhecidas suas, de correligionários e adversários políticos, de colegas de profissão e de qualquer pessoa que tivesse qualquer atitude ou expressão menos compreensível.

27- O que causou à demandante o receio de andar em público.

28- A assistente tem receio que pessoas que tiveram acesso à página formulem sobre ela juízos depreciativos.

29- A assistente refugiou-se em casa e no escritório sofrendo, assim, dano no desempenho da sua profissão.

30- Deixou de comparecer a várias reuniões políticas ou a actividades políticas públicas e até reuniões de grupos muito alargadas que não fossem da sua restrita confiança pessoal, com prejuízo do seu desempenho político e da sua promoção como figura política.

31- Começou a evitar a comparecer em cafés, tertúlias e em todos os locais onde estivesse mais pessoas do que os seus amigos muito chegados.

32- O arguido é professor de educação física, auferindo o rendimento mensal de €1.300,00 (mil e trezentos euros).

33- É proprietário de um apartamento T3, liquidando a prestação mensal a título de mútuo bancário, no valor de € 600,00 (seiscentos euros).

34- O arguido não tem antecedentes criminais.

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B) Motivação de Facto

O tribunal fundou a sua convicção na análise crítica e conjunta de toda a prova produzida em audiência de julgamento, alicerçada nas regras da experiência comum (cf. art.º 127.º do Código de Processo Penal).

Pertinentemente refere JUAN-LUIS GÓMEZ COLOMER, El juicio oral, in Juan Montero et all, Derecho Jurisdicional III Processo Penal, 9ª ed., Valência 2000, p. 331, que é necessário que o julgador na descrição fáctica explicite de maneira clara, terminante e não contraditória os factos que ficaram provados sempre que os mesmos interessem à boa decisão da causa; havendo dúvidas, deverá explicar-se porque é que o juiz não está seguro dos factos e o motivo da dúvida; a prova deverá ser concretamente valorada, tornando-se necessário que o arguido e as restantes “partes” saibam donde extraiu o julgador os seus elementos de convicção.

No que concerne aos antecedentes criminais do arguido atendeu-se ao CRC junto aos autos.

Relativamente às condições sócio económicas do arguido valoramos as declarações espontaneamente prestadas pelo próprio, sendo que o modo seguro como foram efectuadas fez com que o Tribunal não duvidasse sobre o seu teor.

O arguido, no âmbito de um direito que lhe assiste, não prestou declarações.

A assistente, bem como a testemunha Carlos R..., mencionou que antes de ter visualizado a página na internet (no HI5) tinha existido quezílias com o arguido.

Atendendo à apresentação da queixa (10/11/2009) – cf. fls. 3 – o facto da impressão da página de fls. 79 e ss., datar de 19/11/2009 (parte final de cada página) e a fls. 81 referir a data “18/Out 15:16”, o Tribunal deu como provado as datas referenciadas em 5.º

Os factos 6.º, 8.º, 9.º e 12.º resultaram dos depoimentos das testemunhas que visualizaram a página na internet, mormente a de Paula C..., a qual no âmbito de um depoimento calmo, coerente e muito objectivo, salientou que se tratava de uma página que se encontrava acessível a qualquer utilizador. Referiram que a página da internet que visualizaram está de acordo com o doc. de fls. 79 e ss. faltando, nomeadamente, o comentário de utilizadores que se insurgiam para com o teor da página.

O ponto 7.º resultou da análise do doc. de fls. 79 e ss.

Os factos 14.º e 15.º resultam desde logo do mencionado pela assistente não tendo o tribunal ignorado a ligação existente entre arguido/assistente.

Dos autos e do depoimento prestado pelos Inspectores da Polícia Judiciária verificamos que foi apurado (cf. fls. 17) que a página de Internet em apreço foi acedida, no dia 9/11/2009, por alguém com privilégio de administrador, por intermédio de um endereço titulado pela empresa Claranet Portugal.

Tendo sido averiguado (cf. fls. 26) que o IP foi atribuído à OK Pneus – Comércio de Pneus, S.A. –.

Em sede de julgamento o Inspector da Polícia Judiciária que acompanhou a investigação (Armando B...) esclareceu que foi efectuado um acesso à página na internet, na oficina – OK Pneus –, por um utilizador que conseguiria modificar a página por ter acesso de administrador.

Em termos contabilísticos, junto da OK Pneus, foram apuradas facturas de serviços prestados no dia 9/11/2009 - sendo que o Tribunal não ignora que existiram mais serviços cujos clientes não foram identificados.

Uma das pessoas identificadas foi José V... (sendo a identificação completa do arguido: José V...) cf. factura de fls. 128 e 129. O veículo foi um Hyundai de matrícula 27-43-TB.

Foi mencionado nomeadamente pela ofendida e pela testemunha Carlos R..., sem qualquer hesitação, que o arguido utilizava o veículo em apreço, não obstante não ser o seu proprietário (o veículo é da propriedade do pai do arguido).

A testemunha Carlos R... mencionou que a expressão “5ª pata do cavalo” e “rasca que chegue” são expressões que o arguido habitualmente utilizava. Estas expressões constavam na página da internet a qual foi imprimida e junta aos autos, onde se constata a visualização de uma fotografia da assistente (fls. 79 a 81).

Acresce que a testemunha Carlos R..., companheiro da ofendida, (o arguido é companheiro da irmã da testemunha) referiu em ambas as vezes que foi inquirido pelo Tribunal que o arguido lhe tinha telefonado e assumido a autoria da página.

[Foi a testemunha inquirida uma vez sem a presença do arguido e outra na sua presença].

O arguido referiu à testemunha que se encontrava arrependido e que tinha cometido tal acto (feitura da página do HI5) sem ponderar as consequências, pedindo desculpas.

Prestou a testemunha um depoimento que se nos afigurou sincero e verosímil não olvidando que é compreensível, devido à relação existente entre arguido/testemunha, que o arguido lhe tenha telefonado no caso em apreço.

Ou seja, a testemunha justifica a sua razão de ciência e é compreensível que o telefonema lhe tenha sido dirigido. Não se verificando motivos para duvidar que a testemunha o tenha recepcionado.

Aliás, a testemunha mesmo na presença do arguido, em sede de julgamento, e após as várias perguntas efectuadas, manteve o depoimento anteriormente prestado, sem mostrar qualquer dúvida e hesitação, pelo que o Tribunal o valorou.

Pelo exposto, valoramos o depoimento da testemunha Carlos R..., com a prudência que a situação impunha e de acordo com as regras da normalidade, conjugando com toda a prova efectuada em julgamento.

[Sendo um depoimento que é passível de ser valorado, conforme infra se fundamentará Foi prestado um depoimento directo no que concerne ao que a testemunha ouviu. Com efeito, a testemunha limitou-se a mencionar o que o arguido lhe comunicou. Nesse ponto é um depoimento directo, apreciado nos termos dos arts.º 125.º, 127.º e 128.º do CPP.

Segundo o Ac. da Relação do Porto, proferido em 4-7-2007, no processo nº 0647256, disponível no site www.dgsi.pt, «o depoimento de uma testemunha que relata a conversa que manteve com a arguida não deriva de conhecimento indirecto, mas de conhecimento directo, pelo que não pode ser considerado depoimento indirecto. Daí que, contrariamente ao que sustenta a arguida, resulta do art. 129º, nº 1, em conjugação com o art. 128º do Código Processo Penal, que o depoimento de uma testemunha que em audiência relata factos que a arguida lhe confessou, não é um depoimento indirecto, pois versa sobre factos de que directamente teve conhecimento na conversa que estabeleceu com a arguida».
O critério operativo da distinção entre depoimento directo e indirecto é o da vivência da realidade que se relata: se o depoente viveu e assistiu a essa realidade o seu depoimento é directo; se não, é indirecto.
Porém, a prova dos factos constituintes do crime em apreço pela declaração da testemunha que ouviu a confissão, é uma prova indirecta.
Pelo que cumpre verificar em que termos é admissível tal prova, o que nos remete para o disposto no art.º 129.º do CPP (no âmbito da prova testemunhal; depoimento indirecto).
Ora, nos termos do art.º 129.º do CPP o Tribunal teria de chamar a pessoa que referiu tal factualidade à testemunha, sob pena de, nesse ponto, não poder servir como meio de prova.
Assim, foi determinada a presença do arguido e da testemunha - cfr. se alcança da acta.
O que sucedeu. Tendo a testemunha mantido o seu depoimento e o arguido, que se encontrava presente, no âmbito de um direito que lhe assiste, nada ter mencionado.
Assim, poderá ser valorado o depoimento da testemunha uma vez que o arguido nada disse?
Entendemos que sim.
Vejamos.
Por se tratar de matéria interligada com direitos de defesa, constitucionalmente consagrados, é de mencionar o Ac. do T.C. nº 440/99 de 8.7, quando refere que o depoimento de ouvir dizer deve ser valorado como meio de prova, "desde logo, porque não há diferença substancial entre a situação do arguido que não pode ser encontrado e a daquele que, chamado à audiência, invoca o seu direito ao silêncio para não depor".
Nesse Acórdão tirou-se a seguinte conclusão: "Há, assim, que concluir que o artigo 129°, n° 1 (conjugado com o artigo 128°, n° 1) do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de que o tribunal pode valorar livremente os depoimentos indirectos de testemunhas, que relatem conversas tidas com um co-arguido que, chamado a depor, se recusa a fazê-lo no exercício do seu direito ao silêncio, não atinge, de forma intolerável, desproporcionada ou manifestamente opressiva, o direito de defesa do arguido".
Não verificamos motivos (em termos constitucionais) para que não possa ser valorado o depoimento indirecto da testemunha.
Também o STJ. tem aceite tais depoimentos de ouvir dizer, valorando-os como meio de prova, nomeadamente no Ac. de 30.09.1998, in BMJ 479-414, aí se têm como válidas as declarações da queixosa/demandante civil sobre matéria que lhe foi oralmente transmitida pelo arguido, o qual se negou a prestar declarações em audiência de julgamento. "Não estamos, contudo, perante depoimento indirecto proibido. A queixosa/demandante civil prestou declarações dizendo o que ouviu directamente da boca do arguido e fê-lo na presença deste, que estava assistido pelo respectivo defensor". "Por conseguinte, a posição assumida in casu pelo arguido - no uso de direito que não se põe em causa - de optar pelo silêncio, de forma alguma pode obstar à admissão e valoração das declarações da queixosa/demandante civil".
Não ignoramos posição em sentido contrário, mormente a de Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Código de Processo Penal, 3ª ed. pp. 344 e ss. (no sentido que não vale como prova o depoimento indirecto de uma testemunha sobre o que se ouviu dizer ao arguido, ao assistente ou às partes civis). Contudo, s.m.o., e com o devido respeito, que é muito, após ponderação e recolha de outros elementos de estudo, concluímos que tal depoimento é admissível.
O legislador não exclui no âmbito das pessoas a que se reporta o art.º 129º n.º1 do CPP, o arguido. A pretensão do legislador é no sentido de que no âmbito de um depoimento testemunhal, em que o depoimento resulta do que se ouviu dizer a pessoas determinadas, que o juiz chame essas pessoas determinadas a depor (sendo, se for o caso, o arguido).
No sentido de valorar o depoimento indirecto é de parafrasear o Ac. da Relação do Porto, datado de 24/09/2008, procº 0843468, disponível no site www.dgsi.pr:
Também é indiscutível que o arguido, caso se logre a sua comparência, mantém intocado o seu direito ao silêncio - art.º 343º n.º1 do Código de Processo Penal. Agora o que não pode o arguido pretender é que o exercício desse direito ao silêncio inviabilize o depoimento de ouvir dizer. O balanceamento dos concretos interesses do caso já foi feito pelo legislador resultando que se aceita o depoimento indirecto desde que se verifique o condicionalismo previsto no art.º 129º do Código de Processo Penal.
Sendo esse o quadro em que se verifique a impossibilidade de ouvir a pessoa indicada como fonte pelas testemunhas de acusação, que, de resto, podem ser contraditadas pelo arguido, através do seu mandatário, é razoável e proporcionado que esses depoimentos possam ser valorados como meios de prova, sendo estes depoimentos apreciados pelo tribunal com a prudência que a «impossibilidade» de ouvir a fonte impõe e de acordo com as regras da lógica e da experiência. Desde logo, porque não há diferença substancial entre a situação do arguido que não pode ser encontrado e a daquele que, chamado à audiência, invoca o seu direito ao silêncio para não depor.
Esta é a solução a que se chega após um prudente balanceamento dos interesses conflituantes que se prosseguem no processo penal. Operando a concordância prática dos interesses em jogo conclui-se que o artigo 129º, nº 1 do Código de Processo Penal, (conjugado com o artigo 128º, nº 1), interpretado no sentido de que o tribunal pode valorar livremente os depoimentos indirectos de testemunhas, que relatem conversas tidas com um arguido que, podendo depor, se recusa a fazê-lo no exercício do seu direito ao silêncio, não atinge, de forma intolerável, desproporcionada ou manifestamente opressiva, o direito de defesa do arguido nem o contraditório.
É de salientar a conclusão mencionada no Douto Acórdão do Tribunal de Guimarães, datado de 25/5/2009, Procº 359/06GVCRM.G1, disponível no site www.dgsi.pt: Ouvir de um arguido que ele praticou um acto criminoso e reproduzir isso em tribunal não é ilegal, cabendo ao tribunal avaliar essa prova como contributo para a procedência ou não da acusação.

].

Assim, ponderando:

i) o facto da viatura utilizada pelo arguido estar no local e dia onde foi apurado que a pessoa com palavra passe de administrador acedeu à página da internet;

ii) não olvidando que certas expressões eram comummente utilizadas pelo arguido (“5ª pata do cavalo”; “rasca que chegue”) - (facto que não poderá ser de todo ignorado e conjugado com a restante matéria apurada);

iii) a existência de quezílias com a assistente no mês anterior à publicação da página.

iv) o referido pela testemunha Carlos, supra referenciado, o qual efectuou um depoimento de modo peremptório e sem hesitações, realçando que o arguido lhe tinha comunicado, pedindo desculpas, que foi o autor da página.

Permitiu, conjugando com as regras da experiência e do normal suceder, que o Tribunal formasse uma convicção positiva sobre os factos constantes na acusação formulada contra o arguido.

Os factos 10.º, 13.º, 16.º a 18.º resultam da análise dos factos dados como provados, na sua globalidade, tomando em consideração as regras da normalidade.

Relativamente à factualidade ínsita no pedido de indemnização civil, a sua prova desde logo resulta das regras da normalidade. Sendo compreensível em termos de causalidade adequada que a assistente tivesse sofrido os danos não patrimoniais alegados.

Sendo que não se poderá olvidar que a assistente como Advogada de profissão e ligada às actividades políticas (na altura foi eleita vereadora), e como tal mais exposta, sentisse vergonha, humilhação, perda de auto-confiança e de auto-estima.

Sendo que se denotou no depoimento da assistente a revolta e indignação com o sucedido e a perturbação que sentiu no seu dia a dia. Desde evitar o público e começar a desconfiar das pessoas que a rodeavam.

O companheiro da assistente confirmou a indignação e mau estar que a assistente sentiu com a conduta ilícita de que foi alvo, não se ignorando que os amigos constantes da página do HI5 eram de Fafe, muito próximas da assistente.

Salientou que a assistente começou a se isolar das pessoas (de igual modo mencionou a testemunha Miguel Almeida, salientando que a assistente estava desgastada com a situação e que o sucedido devido à actividade política da assistente rapidamente as pessoas tomaram conhecimento).

A irmã da assistente, bem como as testemunhas Paula C..., Duarte R..., Diana M... e Sandra S..., salientaram o desgosto que a assistente sentiu e como ficou afectada em termos pessoais, isolando-se das pessoas, o que a prejudicou em termos profissionais.

Pelo exposto, e conjugando toda a prova efectuada, alicerçada nas regras da experiência e do normal suceder, o Tribunal formou a sua convicção.

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Apreciando

1- Impugnação da matéria de facto

Invoca o recorrente que a prova produzida impunha ao tribunal a quo uma decisão diferente da que resulta da peça recorrida, pretendendo que o tribunal de recurso sindique a forma como o tribunal de primeira instância apreciou a prova produzida em audiência, mas, para tanto, haveria, antes de mais, o recorrente de ter dado adequado cumprimento ao disposto no art. 412º., nºs. 3 e 4 CPP, o que não se mostra correctamente efectuado.

É que ao contrário do que por vezes se pensa, o recurso não tem por finalidade nem pode ser confundido com um "novo julgamento" da matéria de facto, assumindo-se antes como um “remédio” jurídico.

Como várias vezes salientou o Prof. Germano Marques da Silva, presidente da Comissão para a Reforma do Código de Processo Penal:

- “… o recurso é um remédio para os erros, não um novo julgamento” (conferência parlamentar sobre a revisão do Código de Processo Penal, in Assembleia da República, Código de Processo Penal, vol. II, tomo II, Lisboa 1999, pág. 65);

- “o recurso em matéria de facto não se destina a um novo julgamento, constituindo apenas um remédio para os vícios do julgamento em primeira instância” (Forum Justitiae, Maio/99);

- “Recorde-se que o recurso ordinário no nosso Código é estruturado como um remédio jurídico, visa corrigir a eventual ilegalidade cometida pelo tribunal a quo. O tribunal ad quem não procede a um novo julgamento, verifica apenas da legalidade da decisão recorrida, tendo em conta todos os elementos de que se serviu o tribunal que proferiu a decisão recorrida. Daí que também a renovação da prova só seja admitida em situações excepcionais e, sobretudo, o recorrente tenha que indicar expressamente os vícios da decisão recorrida.” (Registo da prova em Processo Penal. Tribunal Colectivo e Recurso, in Estudos em homenagem a Cunha Rodrigues, vol. I, Coimbra, 2001).

Da mesma forma, na jurisprudência pode ler-se, por exemplo, no Ac. do STJ de 24/10/2002, proferido no pr. 2124/02: “… o labor do tribunal de 2.ª Instância num recurso de matéria de facto não é uma indiscriminada expedição destinada a repetir toda a prova (por leitura e/ou audição), mas sim um trabalho de reexame da apreciação da prova (e eventualmente a partir dos) nos pontos incorrectamente julgados, segundo o recorrente, e a partir das provas que, no mesmo entender, impõem decisão diversa da recorrida – art.º 412º, nº 3, als. a) e b) do C.P.P. e levam à transcrição (nº 4 do art.º 412º do C.P.P.)“.

Ou no acórdão do STJ de 15-12-2005 (pr. 2.951/05, relatado pelo conselheiro Simas Santos), “o recurso de facto para a Relação não é um novo julgamento em que a 2ª Instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1ª Instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes se deve afirmar que os recursos, mesmo em matéria de facto, são remédios jurídicos destinados a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros”.

Por conseguinte, o recurso em matéria de facto, destina-se apenas à reapreciação da decisão proferida em primeira instância em pontos concretos e determinados. Tem como finalidade a reapreciação de “questões de que pudesse conhecer a decisão recorrida” (cfr. designadamente o art. 410º., nº.1 do CPP).

Daí que o legislador tenha estabelecido um específico dever de motivação e formulação de conclusões do recurso nesta matéria, dispondo o art. 412.º, n.º 3, do Código de Processo Penal:

«Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.»

Acrescentando o n.º 4 do mesmo artigo que:

“Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação”.

Impunha-se ao recorrente, em vista disso, para que do recurso pudesse retirar alguma utilidade que impugnasse devidamente a matéria de facto, cumprindo adequadamente o constante dos nºs 3 e 4 do art. 412º. CPP.

E é sabido que ao cumprimento de tal desiderato não bastará somente identificar os intervenientes, efectuar uma apreciação mais ou menos genérica do que possam ter dito, ou atacar somente a motivação ou a convicção do tribunal a quo (tal qual acontece no presente caso), devendo antes precisar-se, antes de mais, detalhadamente cada um dos pontos da matéria de facto colocados em crise, indicando-se depois, relativamente a cada um deles (ponto por ponto), as passagens concretas e determinadas dos depoimentos em que se funda a impugnação que impõem decisão diversa, argumentando em concreto, relativamente a cada um deles, sobre o porquê de tais passagens imporem a dita decisão diversa e procurando-se localizar, ao menos de forma aproximada, o início e termo de tais passagens por referência aos suportes técnicos, conforme o preceituado no referido n.º4. Assim, por exemplo, o recorrente poderá indicar que o afirmado se reporta à passagem do depoimento da testemunha A que vai do minuto 3º. ao 6º. da gravação efectuada em CD pelo Tribunal.

Ora, no presente caso resulta manifesto que o recorrente assim não procedeu, já que se limita a apontar genericamente a sua discordância do julgamento (já que a tanto equivale a sua discordância relativamente à totalidade dos pontos 1 a 19, 24 e 25) invocando que só uma testemunha (Carlos R...) terá afirmado ter sido o arguido o autor dos factos mas que tal testemunha padeceria de falta de credibilidade por ser o companheiro da assistente, intentando colocar em causa a credibilidade que o Tribunal a quo entendeu dar ao depoimento em causa, opção essa levada a cabo de forma perfeitamente transparente e fundamentada tal qual se apreende da motivação de facto transcrita acima, contra a qual nenhum argumento válido e concreto esgrime o recorrente.

Ao fim e ao cabo, o recorrente limita-se a fazer a sua própria análise crítica da prova para concluir que o essencial dos factos deveria ter sido considerado não provado. Sucede que - como já múltiplas vezes se repetiu em diversos acórdãos desta Relação - o momento processualmente previsto para o efeito são as alegações finais orais a que alude o artigo 360º. CPP. A impugnação da decisão da matéria de facto não se destina à repetição, agora por escrito, do que então terá sido dito. Fica-se a saber qual teria sido a decisão se o arguido/recorrente tivesse sido a juiz do seu próprio caso, mas isso nenhumas consequências pode ter, pois é ao juiz e não a outros sujeitos processuais, naturalmente condicionados pelas específicas posições que ocupam, que compete o ofício de julgar.

Parece claro, por isso, que o recorrente por um lado não indica com rigor, de forma objectiva e detalhada, em relação a cada um dos pontos que pretende impugnar, a prova ou provas que impõem decisão diversa da recorrida e, por outro, centra as respectivas razões de queixa em meras questões de credibilidade no tocante à apreciação da prova.

Ora, não é por mero acaso que o ónus de impugnação especificada reclama nesta sede a indicação das provas que “impõem” e não das que simplesmente “permitiriam” decisão diversa.

É que afigura-se indubitável que há casos em que, face à prova produzida, as regras da experiência permitem ou não colidem com mais do que uma solução e se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção.

Acresce que - como já vimos - o recorrente acaba por se limitar a colocar em crise a convicção do tribunal a quo.

Ora, a gravação das provas funciona como uma “válvula de escape” para o tribunal superior poder sindicar situações insustentáveis, situações-limite de erros de julgamento sobre matéria de facto (assim, o acórdão do STJ de 21-1-2003).

E, como se refere no acórdão da Relação do Porto de 26-11-2008 (publicado na RLJ, ano 139º, nº 3960, págs. 176 e segs., rel. Maria do Carmo Silva Dias), “não podemos esquecer a percepção e convicção criada pelo julgador na 1.ª instância, decorrente da oralidade da audiência e da imediação das provas. O juízo feito pelo Tribunal da Relação é sempre um juízo distanciado, que não é colhido directamente e ao vivo, como sucede com o juízo formado pelo julgador da 1ª. Instância”.

A credibilidade das provas e a convicção criada pelo julgador da primeira instância “têm de assentar por vezes num enorme conjunto de situações circunstanciais, de tal maneira que essa convicção criada assenta não tanto na quantidade dos depoimentos prestados, mas muito mais em outros factores” (tal qual se escreveu no já referido acórdão do STJ de 21-1-2003), fornecidos pela imediação e oralidade do julgamento. Neste, “para além dos testemunhos pessoais, há reacções, pausas, dúvidas, enfim, um sem número de atitudes que podem valorizar ou desvalorizar a prova que eles transportam” (assim, o acórdão do STJ de 9-7-2003, pr. 3100/02, rel. Leal Henriques

Daí que o recurso da decisão da primeira instância em matéria de facto não sirva para suprir ou substituir o juízo que aquele tribunal formulou, apoiado na imediação, sobre a maior ou menor credibilidade ou fiabilidade das testemunhas. O que a imediação dá, nunca poderá ser suprimido pelo tribunal da segunda instância. Este não é chamado a fazer um novo julgamento, mas a remediar erros que não têm a ver com o juízo de maior ou menor credibilidade ou fiabilidade das testemunhas. Esses erros ocorrerão quando, por exemplo, o tribunal pura e simplesmente ignora determinado meio de prova (não apenas quando não o valoriza por falta de credibilidade), ou considera provados factos com base em depoimentos de testemunhas que nem sequer aludem aos mesmos, ou afirmam o contrário.

Ora, o recorrente não alega qualquer destes erros (nem estes se detectam da análise dos autos). Limita-se a contestar basicamente o juízo do tribunal da primeira instância sobre a fiabilidade dos depoimentos prestados.

Fundamentalmente, está em causa a credibilidade de depoimentos que o tribunal da primeira instância aceitou como credíveis mas que o recorrente entende que não deveriam ser aceites como tal.

Como está bom de ver, na decorrência do supra-exposto, esta é uma questão que, de forma exemplar, escapa ao juízo do tribunal da segunda instância, por estar estreitamente dependente da imediação.

Não está aqui em causa qualquer erro de julgamento (no sentido acima indicado), mas tão só a contestação da decisão do tribunal da primeira instância sobre a credibilidade e fiabilidade dos depoimentos em causa.

*

Afirma depois o recorrente de forma conclusiva e ilógica que o Tribunal teria violado o disposto no art. 132º., nº.1, al. d) CPP. Ora este dispositivo reporta-se aos deveres das testemunhas, nele se afirmando que as testemunhas têm o dever de responder com verdade às perguntas que lhes forem dirigidas. Daí que naturalmente só as mesmas testemunhas o possam violar e não o Tribunal que não é testemunha nem pode assumir o papel destas.

Mais à frente afirma, também, o recorrente que o art. 129º CPP proíbe o depoimento indirecto de uma testemunha sobre o que ouviu dizer a outra pessoa determinada pelo que o depoimento de Carlos R... não poderia servir como meio de prova e, em todo o caso, nunca poderia ser valorado em prejuízo do direito ao silêncio do arguido.

De novo labora em erro o recorrente que não terá lido com a atenção devida o que estipula o art. 129º. CPP, o qual está longe de proibir em definitivo os depoimentos indirectos. O que ali se afirma é que a proibição só ocorre se o depoente recusar ou não conseguir indicar a pessoa através da qual tomou conhecimento dos factos ou se esta última não for chamada a depor (e neste último caso com a ressalva atinente ao falecimento, anomalia psíquica superveniente ou impossibilidade de encontrar a pessoa em causa) e nenhuma destas situações se evidencia nos autos.

Acresce que no presente caso foram diversos os meios de prova que devidamente conjugados permitiram ao Tribunal a quo chegar à conclusão que retirou relativamente à matéria fáctica provada, estando muito longe de se ater somente à confissão da prática dos factos pelo arguido relatada pela testemunha Carlos R..., tal qual se extrai de forma clara da fundamentação da matéria de facto acima transcrita.

Ali se pode ler por exemplo que:

“Dos autos e do depoimento prestado pelos Inspectores da Polícia Judiciária verificamos que foi apurado (cf. fls. 17) que a página de Internet em apreço foi acedida, no dia 9/11/2009, por alguém com privilégio de administrador, por intermédio de um endereço titulado pela empresa Claranet Portugal.

Tendo sido averiguado (cf. fls. 26) que o IP foi atribuído à OK Pneus – Comércio de Pneus, S.A. –.

Em sede de julgamento o Inspector da Polícia Judiciária que acompanhou a investigação (Armando B...) esclareceu que foi efectuado um acesso à página na internet, na oficina – OK Pneus –, por um utilizador que conseguiria modificar a página por ter acesso de administrador.

Em termos contabilísticos, junto da OK Pneus, foram apuradas facturas de serviços prestados no dia 9/11/2009 - sendo que o Tribunal não ignora que existiram mais serviços cujos clientes não foram identificados.

Uma das pessoas identificadas foi José V... (sendo a identificação completa do arguido: José V...) cf. factura de fls. 128 e 129. O veículo foi um Hyundai de matrícula 27-43-TB.

Foi mencionado nomeadamente pela ofendida e pela testemunha Carlos R..., sem qualquer hesitação, que o arguido utilizava o veículo em apreço, não obstante não ser o seu proprietário (o veículo é da propriedade do pai do arguido).

A testemunha Carlos R... mencionou que a expressão “5ª pata do cavalo” e “rasca que chegue” são expressões que o arguido habitualmente utilizava. Estas expressões constavam na página da internet a qual foi imprimida e junta aos autos, onde se constata a visualização de uma fotografia da assistente (fls. 79 a 81).

Acresce que a testemunha Carlos R..., companheiro da ofendida, (o arguido é companheiro da irmã da testemunha) referiu em ambas as vezes que foi inquirido pelo Tribunal que o arguido lhe tinha telefonado e assumido a autoria da página.

[Foi a testemunha inquirida uma vez sem a presença do arguido e outra na sua presença].

O arguido referiu à testemunha que se encontrava arrependido e que tinha cometido tal acto (feitura da página do HI5) sem ponderar as consequências, pedindo desculpas.

Prestou a testemunha um depoimento que se nos afigurou sincero e verosímil não olvidando que é compreensível, devido à relação existente entre arguido/testemunha, que o arguido lhe tenha telefonado no caso em apreço.

Ou seja, a testemunha justifica a sua razão de ciência e é compreensível que o telefonema lhe tenha sido dirigido. Não se verificando motivos para duvidar que a testemunha o tenha recepcionado.

Aliás, a testemunha mesmo na presença do arguido, em sede de julgamento, e após as várias perguntas efectuadas, manteve o depoimento anteriormente prestado, sem mostrar qualquer dúvida e hesitação, pelo que o Tribunal o valorou.

Pelo exposto, valoramos o depoimento da testemunha Carlos R..., com a prudência que a situação impunha e de acordo com as regras da normalidade, conjugando com toda a prova efectuada em julgamento.

[Sendo um depoimento que é passível de ser valorado, conforme infra se fundamentará].

Assim, ponderando:

i) o facto da viatura utilizada pelo arguido estar no local e dia onde foi apurado que a pessoa com palavra passe de administrador acedeu à página da internet;

ii) não olvidando que certas expressões eram comummente utilizadas pelo arguido (“5ª pata do cavalo”; “rasca que chegue”) - (facto que não poderá ser de todo ignorado e conjugado com a restante matéria apurada);

iii) a existência de quezílias com a assistente no mês anterior à publicação da página.

iv) o referido pela testemunha Carlos, supra referenciado, o qual efectuou um depoimento de modo peremptório e sem hesitações, realçando que o arguido lhe tinha comunicado, pedindo desculpas, que foi o autor da página.

Permitiu, conjugando com as regras da experiência e do normal suceder, que o Tribunal formasse uma convicção positiva sobre os factos constantes na acusação formulada contra o arguido”.

E, como bem refere a recorrida na respectiva resposta, os pedidos de desculpa são puros factos presenciados e vividos pelo arguido e pela testemunha, que esta captou de forma directa e pelos seus sentidos da visão e da audição, que racionalizou e percebeu, não se tratando por isso mesmo de qualquer testemunho de ouvir dizer ou depoimento indirecto nesta sede, sucedendo até que a própria confissão do arguido, ou a confirmação da sua autoria do crime, que a testemunha em causa também percepcionou directamente já era em si mesma dedutível logicamente do pedido de desculpas que tinha por fundamento os factos confirmados, pelo que é destituída de fundamento a alegação do recorrente nesta sede, efectuada aliás sem qualquer delimitação factual relativamente à totalidade do depoimento prestado pela testemunha Carlos R....

Acresce, finalmente, que mesmo admitindo que estaríamos confrontados simplesmente com um testemunho de ouvir dizer (confessar a prática do crime ao arguido), ainda aí a jurisprudência maioritária tem perfilhado o entendimento de que tendo deposto, ou sido chamada a depor, a pessoa a quem se ouviu dizer, ainda que se trate do arguido e este recuse prestar declarações, desaparece a proibição de prova de valoração do depoimento de ouvir dizer.

Assim, por exemplo, pode ler-se no Ac. Rel. Guimarães de 17-05-2004, pr. 2012/03-2, disponível em www.dgsi.pt:

I- Nos termos do art. 343º do C. P. Penal, o arguido é inteiramente livre de se pronunciar sobre os factos da acusação ou sobre os que resultarem da discussão da causa, assistindo-lhe, também, o direito de se remeter ao silêncio, sem que o tribunal disso possa extrair ilações em seu prejuízo ou benefício.

II- Coberto desse silêncio não pode, contudo, impedir que o Tribunal aprecie livremente os depoimentos das testemunhas, ainda que a razão de ciência das mesmas radique em informações ou declarações que o arguido lhes tenha prestado.

III – Nesses casos, não pode afirmar-se a afectação do contraditório, que é a razão subjacente à proibição de depoimentos indirectos prevista no art. 129º do C. P. Penal.

IV – Ao arguido cabe a responsabilidade de adoptar a estratégia que entender mais adequada à sua defesa, mas o respeito pelos princípios da legalidade, da proporcionalidade, do contraditório e da igualdade não deixa de se verificar se o tribunal, a requerimento ou oficiosamente tomar declarações a testemunhos de “ouvir dizer”, estando a “fonte” presente em tribunal, em condições de poder confirmar, negar ou esclarecer tais depoimentos”.

Ou, mais recentemente no Ac. Rel. Porto, de 9-2-2011, pr. 195/07.2 GACNF.P1, 1ª Secção:

“… Com efeito, quando em audiência uma testemunha afirma o que ouviu ao arguido, que está presente e que fez uso do seu direito ao silêncio, não colocando em crise a afirmação da testemunha acerca do que afirmou lhe ter ouvido, o depoimento, não deixa, nessa parte, de poder ser valorado.

Não é prova proibida e, como qualquer outra, deve ser apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do Tribunal - art. 127º do CPP.

O art. 129º do CPP admite o testemunho de ouvir dizer, somente impõe que as pessoas referenciadas no depoimento, sejam chamadas a depor (ressalvando as excepções aí previstas e já referidas).

No caso, estando o arguido presente e escusando-se a prestar declarações, verifica-se a impossibilidade de ouvir a “pessoa indicada como fonte”.

Assim, como salienta o Ac. do T.C. nº 440/99 de 8.7, aquele depoimento de ouvir dizer pode ser valorado como meio de prova, “desde logo, porque não há diferença substancial entre a situação do arguido que não pode ser encontrado e a daquele que, chamado à audiência, invoca o seu direito ao silêncio para não depor”.

Nesse Acórdão tirou-se a seguinte conclusão: “Há, assim, que concluir que o artigo 129°, n°1 (conjugado com o artigo 128°, n°1) do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de que o tribunal pode valorar livremente os depoimentos indirectos de testemunhas, que relatem conversas tidas com um co-arguido que, chamado a depor, se recusa a fazê-lo no exercício do seu direito ao silêncio, não atinge, de forma intolerável, desproporcionada ou manifestamente opressiva, o direito de defesa do arguido”.

Também o STJ tem aceite tais depoimentos de ouvir dizer, valorando-os como meio de prova, nomeadamente no Ac. de 30-9-1998, in BMJ 479-414, aí se têm como válidas as declarações da queixosa/demandante civil sobre matéria que lhe foi oralmente transmitida pelo arguido, o qual se negou a prestar declarações em audiência de julgamento. “Não estamos, contudo, perante depoimento indirecto proibido. A queixosa/demandante civil prestou declarações dizendo o que ouviu directamente da boca do arguido e fê-lo na presença deste, que estava assistido pelo respectivo defensor”. “Por conseguinte, a posição assumida in casu pelo arguido – no uso de direito que não se põe em causa - de optar pelo silêncio, de forma alguma pode obstar à admissão e valoração das declarações da queixosa/demandante civil”.

Aliás, a génese do direito ao silêncio não assenta num intuito de beneficiar o arguido, condicionando a prova testemunhal, antes decorrendo do princípio do acusatório, que impõe à acusação o dever de provar os factos que lhe são imputados, facultando ao arguido um comportamento que, em última análise, poderá obstar a que se auto-incrimine.

Estando o arguido presente em audiência, pode sempre contraditar plenamente a testemunha que relatou aquilo que lhe ouviu dizer, requerer as diligências que entenda pertinentes, tendentes a demonstrar a sua falta de idoneidade, a contraditar a sua razão de ciência, a impossibilidade do seu testemunho.

É indiscutível que o arguido mantém intocado o seu direito ao silêncio, art.º 343º n.º1 do Código de Processo Penal. Agora, o que não pode o arguido pretender é que o exercício desse direito ao silêncio inviabilize o depoimento de ouvir dizer.

Como expressivamente se refere no Ac. desta Relação do Porto de 05.05.2010 [12] “Nesta matéria bem sabemos que jurisprudência existe que entende que as declarações de uma testemunha relatando conversa mantida com o arguido constituem depoimento indirecto, portanto proibido, a menos que o arguido corrobore tais declarações. Salvaguardando o devido respeito por tal posição, temos uma opinião diferente: considerando que o depoimento indirecto é uma comunicação, com função informativa, de um facto de que o sujeito teve conhecimento por um terceiro (Acórdão da Relação de Lisboa de 11-10-2006, processo 5998/2006), parece-nos razoavelmente claro que não constitui depoimento indirecto – portanto não enquadrável no art. 129º do C.P.P. e, portanto, não constituindo prova proibida -, o depoimento de uma testemunha que relata o que ouviu o arguido dizer, isto mesmo que o arguido não preste declarações na audiência, no exercício do seu direito ao silêncio. Para além disso, estando o arguido presente na audiência – quando o estiver -, pode sempre contraditar um tal depoimento (Neste sentido citam-se, a título meramente exemplificativo e para além do já citado, os acórdãos desta relação de 4-11-2009, proferido no processo 91/04.5GBPRD, de 25-6-2008, processo 0742789, de 27-2-2008, processo 0810050 e de 9-2-2005, processo 0445066)”.

Esta interpretação não viola o artigo 32º/1 e 5 da Constituição da República, pois, conforme se decidiu no Ac. do Tribunal Constitucional de 8/7/99, in DR, II S, de 9/11/99, aquele artigo 129º/1, “interpretado no sentido de que o tribunal pode valorar livremente os depoimentos indirectos de testemunhas, que relatam conversas tidas com um co-arguido que, chamado a depor, se recusa a fazê-lo no exercício do seu direito ao silêncio, não atinge de forma intolerável, desproporcionada ou manifestamente opressiva, o direito de defesa do arguido”, entendimento que veio a ser reafirmado através do citado Ac. do TC nº 440/99 de 8.7… “.

Finalmente, como já vimos, o Tribunal a quo não valorou apenas o depoimento da testemunha Carlos R..., nem tão pouco em exclusivo a parte onde a mesma testemunha alude à confissão do recorrente. Valorou toda a prova produzida em audiência em obediência ao princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127º do CPP, mostrando-se a motivação da decisão de facto devidamente alicerçada na análise conjugada de toda a prova produzida e de acordo com as regras da experiência comum, não merecendo qualquer censura.

Não se verifica, desta forma, a valoração de qualquer prova inadmissível, a merecer a censura do tribunal de recurso, nem se mostram violados o direito ao silêncio do recorrente, o respectivo direito a não se auto-incriminar ou os princípios do acusatório, do contraditório e da imediação, improcedendo por isso tudo o esgrimido pelo mesmo nesta sede.

Improcede, por conseguinte, esta parcela do recurso.

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2- Princípio In Dubio Pro Reo

Alude, igualmente, o recorrente à pretensa violação deste princípio por, em seu entender, o Tribunal a quo ter valorizado os depoimentos da assistente e do seu companheiro e não ter valorizado um eventual espaço de dúvida em favor do arguido não merecendo qualquer censura.

Ora, como é sabido o princípio da presunção de inocência confunde-se de certa forma com o in dubio pro reo. Vd. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, ed. 1974, págs. 213 e seguintes.

Trata-se de uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não houver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa.

Mas daqui não resulta que, tendo havido versões díspares ou até contraditórias sobre factos relevantes, o arguido deva ser absolvido em obediência a tal princípio.

Com efeito a sua violação pressupõe um estado de dúvida no espírito do julgador, só podendo ser afirmada, quando, do texto da decisão recorrida, decorrer, por forma evidente, que o tribunal, na dúvida, optou por decidir contra o arguido.

Cumpre referir, por isso, que não se apreende nos autos que a aplicação do princípio in dubio pro reo se imponha, pois que, avaliada a prova segundo as regras da experiência e o princípio da livre apreciação, não se revela a existência de qualquer dúvida no espírito do tribunal sobre a existência dos factos, resultando patente que o mesmo tribunal, numa apreciação positiva sobre o acontecer naturalístico, formulou um juízo para além da dúvida razoável.

E, como já vimos, o princípio in dubio pro reo “parte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador” – Cristina Líbano Monteiro, “In Dubio Pro Reo”, Coimbra, 1997.

Essa “dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal” no dizer do Ac. STJ de 25-10-2007, no proc. 07P3170.

Igualmente, no Ac. do STJ de 12-7-05, disponível em www.dgsi.pt se referiu que “Este princípio é uma imposição ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não houver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa…A violação deste princípio pressupõe um estado de dúvida no espírito do julgador, só podendo ser afirmada, quando se apreender, por forma evidente, que o tribunal, na dúvida, optou por decidir contra o arguido”.

No presente caso é patente que o tribunal recorrido valorou os meios de prova de acordo com a experiência comum e com critérios objectivos que permitem estabelecer um substrato racional de fundamentação e convicção, não se detectando a existência de qualquer situação de dúvida, sendo certo que tal princípio seguramente não será aplicável às dúvidas que o Tribunal não teve mas que deveria ter tido na opinião do recorrente.

Não há, pois, que o censurar pela não aplicação do princípio in dubio pro reo.

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3- Medida da pena e do montante da indemnização civil

Censura o recorrente a sentença recorrida por entender que a medida da pena é excessiva, entendendo que a multa deve ser fixada no mínimo legal, 120 dias, à taxa diária mínima de € 5,00.

Cumpre analisar a medida em causa.

Culpa e prevenção são as referências norteadoras da determinação da medida da pena - art. 71º., nº.1, do Código Penal - a qual visa a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade - artigo 40º., nº.1 do mesmo diploma.

A este propósito, e como bem escreve o Prof. Figueiredo Dias (in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 3, 2º a 4º, Abril-Dezembro de 1993, págs. 186 e 187), o modelo de determinação da medida da pena consagrado no Código Penal vigente “comete à culpa a função (única, mas nem por isso menos decisiva) de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral (de integração) a função de fornecer uma «moldura de prevenção», cujo limite máximo é dado pela medida óptima de tutela dos bens jurídicos - dentro do que é consentido pela culpa - e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico; e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto de pena, dentro da referida «moldura de prevenção», que melhor sirva as exigências de socialização (ou, em casos particulares, de advertência ou de segurança) do delinquente”.

A medida da pena há-de, primordialmente, ser dada por considerações de prevenção geral positiva, isto é, prevenção enquanto necessidade de tutela dos bens jurídicos que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma infringida, que fornece uma “moldura de prevenção”, isto é, que fornece um “quantum” de pena que varia entre um ponto óptimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida da tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias e onde, portanto, a medida da pena pode ainda situar-se até atingir o limiar mínimo, abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar.

A culpa - juízo de apreciação, de valoração, que enuncia o que as coisas valem aos olhos da consciência e o que deve ser do ponto de vista da validade lógica e da moral ou do direito, conforme se expendeu no Ac. do STJ de 10-4-1996 (in CJ, Acds. do STJ, ano IV, tomo II, pág. 168) - constitui o limite inultrapassável da medida da pena, funcionando assim como limite também das considerações preventivas (limite máximo), ligada ao princípio de respeito pela dignidade da pessoa do agente.

Dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva - entre o ponto óptimo e o ponto ainda comunitariamente suportável -, podem e devem actuar pontos de vista de prevenção especial de socialização, sendo eles que vão determinar, em último termo, a medida da pena.

No dizer de Fernanda Palma (in “As Alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva”, nas “Jornadas sobre a Revisão do Código Penal”, ed. 1998, AAFDL, pág. 25) “a protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial”.

Em jeito de síntese, e como bem refere Figueiredo Dias (in ”Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Editorial Notícias, ed. 1993, pág. 214) “culpa e prevenção são assim os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena (em sentido estrito ou de determinação concreta da pena)”.

No caso dos autos, o arguido foi condenado pela prática de um crime de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos arts. 180.º, 182.º e 183.º n.º 1 al. a) e 2 do Código Penal na pena 320 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, perfazendo o montante de € 2.240,00, sendo a pena cominada em abstracto para o tipo de crime em causa de prisão até 2 anos ou de multa não inferior a 120 dias (e cuja moldura máxima é de 360 dias – cfr. artigos 47º, nº1 e 183º, nº2, do Código Penal), correspondendo a cada dia de multa uma quantia entre € 5,00 e € 500,00, a fixar em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais (arts. 71º., nº.1 e 47º., nº.2 CP).

Escreveu-se o seguinte na sentença recorrida a tal propósito:

“Deste modo, atendendo que o arguido não tem antecedentes criminais e que está inserido social e profissionalmente entendemos que a pena não privativa da liberdade satisfaz de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Aplicar-se-á, pois, uma pena de multa.

Nos termos ao art.º 71.º n.º1 do Código Penal, a determinação concreta da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo mormente às circunstâncias mencionadas no n.º2 do art.º 71.º.

A pena de multa, aplicável in casu, não pode ser inferior a 120 dias – art.º 183.º n.º 2 do Código Penal.

Assim, ponderando:

i) A ilicitude dos factos, a qual reputamos como elevada, bastando ponderar o teor das expressões ofensivas da honra e considerações constantes nos factos provados, mormente 2 a 4, sendo que a visada era facilmente reconhecida pela utilização de uma fotografia sua;

ii) O facto do arguido ter agido com dolo directo;

iii) As consequências gravosas da conduta ilícita, pois afectou de modo gravoso o bem estar social e pessoal da assistente.

iv) A falta de antecedentes criminais do arguido;

v) A situação sócio económica e familiar do arguido,

Afigura-se-nos, como adequada e proporcional a aplicação de uma pena de 320 (trezentos e vinte dias) de multa.

Nos termos do art.º 47.º n.º2 “cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5 e € 500 que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais”.

O arguido é professor de educação física, auferindo o rendimento mensal de €1.300,00 (mil e trezentos euros). É proprietário de um apartamento T3, liquidando a prestação mensal a título de mútuo bancário, no valor de €600,00 (seiscentos euros).

Assim, cada dia de multa fixar-se-á em € 7,00 (sete euros).

O que perfaz o montante global de € 2.240,00”.

A pena de multa fixada em 320 dias situa-se acima da média da respectiva moldura abstracta (que é de 240 dias) o que se justifica com a ponderação entre as circunstâncias agravantes e as atenuantes detectadas na factologia apurada, impondo-se ponderar na inexistência de antecedentes criminais, na situação sócio-económica do arguido, mas também na respectiva modalidade do dolo, na sua forma mais grave (directo), na ilicitude elevada dos factos praticados, nas consequências gravosas dos mesmos e nas exigências preventivas que o caso reclama, tal qual resulta da peça recorrida.

A respectiva diária fixada, em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos, alicerça-se na respectiva base factual, situando-se, ao fim e ao cabo, bem próxima do respectivo limite mínimo de € 5,00.

Daí que não nos mereça qualquer censura a medida em concreto encontrada para a pena de multa que vem colocada em crise, já que nenhuma circunstância aconselha ou impõe a aplicação de pena de multa inferior, uma vez que, por um lado, são perfeitamente válidos e relevantes os pressupostos em que se estribou a medida encontrada (maxime os elementos que depõem contra o arguido já referidos acima) e, por outro, perante os factos provados, se mostra a respectiva diária, a fixar em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos, perfeitamente suportada na respectiva base factual.

Mais se dirá que uma pena de multa que for fixada em termos de representar, a final, um valor insignificante, ou quase, não tem quaisquer potencialidades para lograr as finalidades da punição, tal como elas estão legalmente fixadas: nem o lesado ou a comunidade sentirão que a ordem jurídica tutela adequadamente os seus interesses, nem o arguido sentirá que o crime, de facto, “não compensa”, podendo mesmo sentir-se reconfortado a repetir a sua conduta, confiado na permanente suavidade da Justiça Criminal.

Por seu turno, no tocante à compensação à lesada, entende o recorrente de forma manifestamente conclusiva que a mesma não deverá exceder € 1.500,00, invocando critérios de razoabilidade e proporcionalidade que tão pouco concretiza, apenas dizendo que deve ser ponderado de acordo com as condições da assistente e as condições económicas do arguido, o que naturalmente foi sopesado na sentença.

Ora, no tocante a esta matéria tão pouco nos merece qualquer censura a sentença recorrida que analisou adequada e fundadamente a situação, podendo ler-se, entre o mais, o seguinte:

“A ofendida, a fls. 202 e ss., deduziu pedido civil pelos danos não patrimoniais sofridos pela prática do crime, peticionando uma compensação no valor de €20.000,00 (vinte mil euros) …

… Assim, teremos de considerar:

i) A gravidade das expressões (e alusões desprestigiantes à assistente) utilizadas, mencionadas nos factos 2 a 4

ii) O facto de ter sido utilizado um meio de grande difusão e sempre acessível, podendo ser visualizado mais do que uma vez;

iii) Estar visível uma foto da visada; sendo a assistente uma pessoa conhecida e referenciada em muitos locais, devido, desde logo, ao exercício da sua profissão como Advogada e na altura dos factos candidata à Vereação da Câmara Municipal de Fafe (tendo sido eleita vereadora);

iv) Na página estavam contactos de “41 amigos”, não ignorando os que teriam simplesmente acedido à página.

v) A arguida sofreu vergonha, humilhação, perda de auto-confiança e auto-estima. Começando a suspeitar de vários conhecidos seus, o que afectou, necessariamente, a sua conduta para com os mesmos.

Pelo exposto, analisando toda a factualidade dada como provada, e não olvidando a gravidade da conduta do arguido e as consequências no bem estar da assistente, entendemos segundo um juízo de equidade (cf. art.º 4º al. a) e 496.º n.º3 ambos do Código Civil) justa e adequada a atribuição de uma compensação pelos danos de natureza não patrimonial sofridos pela lesada em consequência do crime de difamação agravada, no montante global de € 6.500,00 (seis mil e quinhentos euros).

Não haverá lugar à condenação em juros pois não foram peticionados”.

Conclui-se, assim, que a pena e a compensação à lesada fixadas na decisão sub judice não o foram em medida excessiva, antes se mostrando plenamente adequadas e justificadas no caso.

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III- Decisão

Termos em que se nega provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UCs.