ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS MORAIS
JUROS DE MORA
Sumário

I - Tendo a Autora , com 43 anos de idade, sido atropelada por veículo automóvel quando procedia ao atravessamento de estrada e em plena passadeira de peões, sofrendo então uma contusão no joelho e ficado com uma cicatriz na face de cerca de 2,5 cm, padecendo então de dores as quais ainda continua a sofrer, e sentindo-se desgostosa com a deformidade que ficou na face, afigura-se-nos equitativo manter no quantitativo de € 7.000,00 a indemnização fixada pelo a quo e que lhe é devida para ressarcir os danos não patrimoniais que lhe foram causados.

Texto Integral

Acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
1.Relatório.
C.., intentou acção declarativa de condenação, na forma sumária , contra a Companhia de Seguros.. .., S.A., pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 12.661,79 €, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, a que devem acrescer juros de mora à taxa legal.
Para tanto , alegou, em síntese, que :
- No dia 2 de Maio de 2007, em Braga, quando atravessava uma passadeira de peões, foi atropelada por veículo automóvel segurado na Ré e cujo condutor, porque circulava com total displicência pela presença de uma passadeira na proximidade, não conservou a necessária distância que permitisse evitar o acidente, o qual apenas ocorreu pela sua desatenção;
- Sucede que, em resultado da actuação da parte do condutor do referido veículo, veio a autora a sofrer danos físicos, sendo obrigada a ser transportada pelo INEM , para as urgências do Hospital S.Marcos ;
- Ora, tais lesões, causaram-lhe e causam-lhe actualmente dor e desgosto, sendo que impossibilitam-lhe ainda hoje um trabalho em conformidade, inclusive devido a contusão no joelho, tendo sofrido e continuando a sofrer dores , com um quantum doloris superior a 2 em 7;
- Ademais, tendo ficado com uma cicatriz na cara, o que a desfigura , esteticamente e como mulher , sente-se desgostosa.
1.1.- Após citação, a Ré Seguradora apresentou contestação, defendendo-se no essencial por impugnação, e, proferido no final dos articulados o competente despacho saneador, fixando-se ainda a matéria de facto assente e organizando-se a base instrutória da causa, procedeu-se finalmente à audiência de discussão e julgamento.
1.2.- No final da respectiva discussão, foi a matéria de facto decidida ( sem reclamações), após o que proferiu o tribunal a quo sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor:

DISPOSITIVO
Pelo exposto, o Tribunal julga a presente acção procedente e, consequentemente, decide:
- condenar a R. “Companhia de Seguros.., S.A.” apagar à A. C.. a quantia de 7.091,55 € ( sete mil, noventa e um euros e cinquenta e cinco cêntimos ), a que acrescem juros de mora à taxa legal, civil, vigente em cada momento, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento ;
- condenar A. e R. no pagamento das custas do processo, na proporção do respectivo decaimento.
Registe e notifique.”
1.3. - Inconformada com tal Decisão, da mesma apelou então a Ré Seguradora, apresentando a recorrente na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
I- A sofreu apenas traumatismo consistente numa contusão do joelho;
II- O período de permanência no Hospital por virtude de tais lesões foi de cerca de meia hora;
III- O período agudo de doença, isto é, aquele durante o qual a A esteve impedida de realizar as actividades da vida diária (incapacidade temporária geral) não foi superior a 3 dias.
IV- O processo de cura da demandante não foi nem doloroso, nem excessivamente incómodo;
V- A demandante não foi sujeita a qualquer intervenção cirúrgica, não sofreu qualquer internamento ou recorreu a consultas hospitalares.
VI- Sofreu dores avaliáveis em 2 numa escala de 1 a 7, sendo o dano estético de apenas 1 ponto.
VII- Em face de tudo o exposto afigura-se desproporcionado o valor de 7.000€ atribuído para compensação dos danos morais da demandante.
VIII- Atendendo aos critérios jurisprudenciais dominantes não deveria a compensação a atribuir à A ser superior à de 2.500,00€/3.000€.
IX- Na fixação da compensação devida pelos danos morais, o julgador ateve-se ao momento da prolação da douta sentença, facto que é expressamente referido nessa decisão;
X- Como tal, os juros moratórios serão devidos, tão só, a partir da prolação dessa douta decisão e nunca desde a citação.
XI- A douta sentença sob censura violou as normas dos artigos 496º, 566º, n.º 3, 805, n.º 1 e 806º do Código Civil.
Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença sob censura e decidindo-se antes nos moldes apontados, como é de inteira e liminar Justiça
1.4.- Não foram apresentadas contra-alegações.
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Thema decidendum
Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões ( daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória , delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem) das alegações do recorrente (cfr. artºs. 684º nº 3 e 685º-A, nº 1, ambos do Código de Processo Civil), e sem prejuízo do disposto na última parte do n.º 2 do art.º 660º do mesmo Código , as questões a apreciar e a decidir são as seguintes :
I- Apurar se a quantia - no valor de € 7.000,00 - atribuída à apelada/lesada, a título de indemnização por danos não patrimoniais, é a adequada, mostrando-se justa ( para a apelante é ela excessiva, devendo situar-se nos 2500/3000€ )
II- Se sobre a quantia indicada em I acrescem os juros de mora ,à taxa legal, a contar da citação da Ré e ora apelante.
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2.Motivação de Facto.
Mostra-se fixada pelo tribunal a quo a seguinte factualidade :
2.1.- No dia 2 de Maio de 2007, pelas 7.30 horas, na Praça.. .., em Braga, ocorreu um atropelamento ;
2.2.- Nele foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-MN, propriedade de J.. e por ele conduzido, e a A., C.. ;
2.3.- À data, a A. tinha 43 anos de idade ;
2.4.- No local do atropelamento existe uma passadeira ;
2.5.- A via perfaz cerca de 4 metros de largura ;
2.6.- Na data e local referidos, o condutor do MN circulava no sentido Rua S. Martinho – Praça Conselheiro Torres de Almeida;
2.7.- Com velocidade superior a 60 km/hora.
2.8.- Desatento ao trânsito de peões.
2.9.- A. encontrava-se a atravessar a passadeira na Praça Conselheiro Torres de Almeida, na direcção Norte-Sul.
2.10.- O condutor do MN, ao aproximar-se do local do atropelamento, dirigiu o veículo para a Praça Conselheiro Torres de Almeida a mais de 60 km/hora, para a passadeira onde a A. se encontrava a passar.
2.11.- Ao efectuar a mudança de direcção não previu a presença de peões.
2.12.- Bateu com a parte frontal do veículo no corpo da A.
2.13.- Por acordo titulado através da apólice n.º.. o proprietário do veículo de matrícula ..-MN declarou transferir e a R. declarou assumir, mediante o pagamento do respectivo prémio, a responsabilidade civil emergente da circulação daquele veículo.
2.14.-Em resultado do atropelamento, a A. teve de ser transportada pelo INEM para as urgências do Hospital de S. Marcos.
2.15.-Em consequência do atropelamento, a A. sofreu contusão no joelho.
2.16.-E ficou com uma cicatriz na face de cerca de 2,5 cm.
2.17.- Teve de efectuar Raio X ao pulso, peito e joelho.
2.18.- Esteve incapacitada para o trabalho pelo período de 13 dias.
2.19.- Período em que não auferiu qualquer vencimento.
2.20.-Deixando de auferir a quantia de 166,79 €.
2.21.-À data a A. trabalhava como empregada doméstica por conta de outrem.
2.22.-Auferindo 385,00 € mensais.
2.23- A. autora sofreu dores e continua a sofrer.
2.24.- Com um quantum doloris de 2 na escala de 7.
2.25.- A cicatriz na cara desfigura a A., que ficou com um dano estético de 1 numa escala de 7.
2.26.- A autora, em face do referido em 2,25, sente-se desgostosa.
2.27.- Durante 3 dias, a A. necessitou de uma pessoa para realizar as tarefas inerentes às suas deslocações, tratamentos e higiene pessoal.
2.28.- As dores que padeceu impossibilitavam que a A. pudesse, sozinha, realizar tais tarefas.
2.29.- Em virtude das lesões a A. deixou as aulas de dança que frequentava.
2.30.- À data, a A. era saudável, não sofrendo de quaisquer limitações físicas ou psíquicas.
2.31.- A Autora recebeu da Segurança Social a título de subsídio de doença no período de 2 de Maio de 2007 a 13 de Maio de 2007 a quantia de 75,24 €.
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3.- Motivação de Direito.
3.1.- A quantia - no valor de € 7.000,00 - , atribuída à apelada, a título de ressarcimento de danos não patrimoniais, é a adequada, mostrando-se justa ?
Na sentença apelada, para justificar o quantum a atribuir à ora apelada a título de reparação pelos danos não patrimoniais sofridos com a acidente dos autos, socorreu-se a Exmª Juíz a quo da seguinte argumentação :
“(…)
Relativamente aos danos não patrimoniais, a lei civil, no art. 496º, nº 1, do CC, limita o seu ressarcimento aos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Este conceito geral deve ser medido através de um padrão objectivo, tendo como referência o “homem comum”, e não mediante uma análise subjectiva, atendendo a sensibilidades embotadas, sensíveis ou particularmente requintadas dos lesados. A correspondente indemnização será fixada equitativamente, devendo ter em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, conforme ressalta da conjugação dos arts. 494º e 496, nº 3 do CC.
O dano não patrimonial está intimamente relacionado com as dores, o sofrimento ou o dano estético. Sendo prejuízos insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património do lesado, a obrigação de os ressarcir tem mais uma natureza compensatória que indemnizatória, sem esquecer, contudo, que não pode deixar de estar presente a vertente sancionatória (cfr., neste sentido ANTUNES VARELA, in Das Obrigações em Geral, 9ª edição, vol. I, pág. 630).
Atente-se, ainda, que a jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, em matéria de danos não patrimoniais, tem evoluído no sentido de considerar que a respectiva compensação deve constituir um lenitivo para os danos suportados, não devendo, assim, ser miserabilista. Deve, para responder actualizadamente ao comando do art. 496° do CC, constituir uma efectiva possibilidade compensatória, devendo ser significativa, desse modo viabilizando uma compensação para os danos suportados e a suportar, já que os mesmos, necessariamente, se irão prolongar no tempo.
Ora, não merece dúvida que os danos alegados e provados pela demandante assumem uma gravidade a que a lei não pode ficar insensível, enjeitando-a.
Na verdade, resulta dos factos dados como provados que em consequência do acidente, a A. sofreu contusão no joelho ; ficou com uma cicatriz na face de cerca de 2,5 cm; sofreu dores e continua a sofrer, com um quantum doloris de 2 na escala de 7; a cicatriz na cara desfigura-a, tendo ficado com um dano estético de 1 numa escala de 7, razão pela qual esta se sente desgostosa.
Durante 3 dias, a A. necessitou de uma pessoa para realizar as tarefas inerentes às suas deslocações, tratamentos e higiene pessoal, pois as dores que padeceu impossibilitavam que a . pudesse, sozinha, realizar tais tarefas.
Em virtude das lesões a A. deixou as aulas de dança que frequentava.
À data, a A. era saudável, não sofrendo de quaisquer limitações físicas ou psíquicas. Na sequência do acidente, foi assistida no Hospital de S. Marcos, em Braga, onde foi submetida a exames diversos, nomeadamente radiológicos.
Perante estes factores, entende-se ponderada a fixação da compensação devida em 7.000,00 €, actualizada a esta data.
Sobre as quantias acima indicadas vencer-se-ão juros de mora à taxa resultante das Portarias aplicáveis, contados desde a citação da R., nos termos do art. 805º, n.º 3, do CC, até integral pagamento.”
Dissentindo a apelante da apontada fundamentação e consequente decisão, importa, portanto, aquilatar da justiça do quantum indemnizatório fixado pelo tribunal a quo, aferindo se efectivamente peca ele por excesso, sendo superior ao dano não patrimonial provado e que visa ressarcir.
Vejamos.
Decorre dos artºs 494º e 496º,nº3, ambos do CC, que o montante da respectiva indemnização será sempre calculado segundo critérios de equidade ( que nada tem que ver com arbitrariedade), e atendendo designadamente ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e a do lesado, e ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida.
Como bem refere o STJ no seu douto Ac. de 7/7/2009 (1), a equidade é um termo de procedência latina (aequitas) com o significado etimológico e corrente de “igualdade”, “proporção”, “justiça”, “conveniência”, “moderação”, “indulgência”, e é utilizado na linguagem da ética e das ciências jurídicas sobretudo para designar a adequação das leis humanas e do direito às necessidades sociais e às circunstâncias das situações singulares (a equidade é, por assim dizer, a “justiça do caso concreto”) .
No âmbito ressarcitório dos danos não patrimoniais, essencial outrossim não olvidar é que, “ (…) a indemnização (…) não reveste natureza exclusivamente ressarcitória , mas também cariz punitivo, assumindo-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, por forma a desagravá-la do comportamento do lesante.” (2)
É que, como decidiu já o STJ (3)“(...) No caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista, pois “ visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada”, não lhe sendo, porém, estranha a “ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”.
Tal natureza punitiva, porém, em sede de acções intentadas contra as companhias Seguradoras de responsável por acidente de viação, como é o caso, como que deixa de fazer sentido, não revestindo a importância que prima facie se lhe quer conferir.
O essencial é que, como vem sendo entendido pelos nossos tribunais superiores, e com vista ao cumprimento do disposto no artº 496º, do CC, a indemnização seja fixada em montante que contribua para alcançar uma efectiva possibilidade compensatória, sendo portanto significativa, isto por um lado, mas, por outro, importa que seja também justificada e equilibrada, não podendo de todo contribuir para um enriquecimento abusivo e imoral do lesado .(4)
Postas estas brevíssimas considerações, e tendo presente a factualidade vertida nos itens 2.12 e 2.14 a 2.18 da motivação de facto do presente Ac., inquestionável é que o direito à integridade física - da apelada e que in casu foi pelo segurado na apelante violado - consubstancia um manifesto bem pessoal inviolável, estando ele ( na CRP e na lei ordinária - art.º 70.º, do CC ) tutelado como um direito absoluto, razão porque se opõe e impõe “erga omnes “, obrigados como estão todos a respeitá-lo .
In casu, como decorre da factualidade assente e supra referida, tendo a autora à data do acidente 43 anos de idade, veio na sequência do atropelamento de que foi vítima, a sofrer uma contusão no joelho, tendo permanecido incapacitada para o trabalho por um período de 13 dias.
Ainda em resultado do atropelamento de que foi vítima, ficou a autora , após cura das lesões físicas então sofridas, com uma cicatriz na face de cerca de 2,5 cm, o que a desfigura e a faz sentir desgostosa, sendo o respectivo dano estético de 1 numa escala de 7, e , também em consequência das referidas lesões sofridas, padeceu a autora de dores , o que continua a acontecer, sendo o quantum doloris de 2 na escala de 7.
Em face do acabado de expor no que aos danos sofridos pela apelada concerne, e se atentarmos aos valores que nos são fornecidos pela Portaria nº 377/2008, de 26 de Maio (5) , com ou sem as alterações introduzidas pela Portaria nº 679/2009, de 25 de Junho, deparamo-nos com quantias indemnizatórias que se situam, manifestamente, muito aquém daqueloutra que fixou o tribunal a quo, pois que, consultado o respectivo anexo I, não apenas não é devida qualquer indemnização no tocante a um quantum doloris situado entre 1 e 3 na escala de aplicável, como outrossim o valor proposto para ressarcimento do dano estético situado em 1 ponto na escala respectiva apenas confere uma indemnização até 800,00 €.
Sucede que, porque não apenas o acidente ocorreu em data anterior à entrada em vigor de qualquer das referidas Portarias [ daí não poderem elas relevar in casu, cfr. artº 12º, do CC ], como, ainda que assim não fosse, sempre os critérios fundamentais a atender para a determinação judicial das indemnizações devidas por danos não patrimoniais, são os que resultam do Código Civil (artºs 494º e 496º), e , ademais, todos aqueles que se mostram subjacentes aos quantuns fixados na Portaria nº 377/2008, de 26 de Maio, com ou sem as alterações introduzidas pela Portaria nº 679/2009, de 25 de Junho, têm o respectivo campo de aplicação circunscrito à fase extra-judicial, ainda que pelo julgador possam ser ponderados (6) .
Importando de seguida recordar algumas das Decisões dos Tribunais Superiores mais recentes que sobre o thema decidendum se pronunciaram já , pois que, nas decisões a proferir, deve sempre o julgador levar em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito ( cfr. artº 8º, nº3, do CC), sendo que, como de resto é consabido, é precisamente no âmbito da fixação da indemnização por danos morais que mais se justifica o recurso a padrões jurisprudencialmente definidos a ponto de se alcançar uma sempre desejada uniformização de critérios que evite o mero subjectivismo em sede da sua fixação , vemos que :
I - Em Decisão proferida por este Tribunal da Relação em 25/10/2012 (7), e com referência a acidente de viação ocorrido a 3/7/2007 [ do qual resultou para o sinistrado/lesado múltiplos ferimentos e lesões traumáticas, tendo sido internado e assistido no serviço de urgência de Hospital, com o diagnóstico de traumatismo do pescoço, traumatismo cervical, traumatismo do pé esquerdo e fractura da base de F2 do 1.º dedo do pé esquerdo, tendo sido sujeito a vários exames radiológicos e imobilizado com tala engessada e teve alta hospitalar no mesmo dia 03 de Julho de 2007; efectuou 15 tratamentos de fisioterapia ao traumatismo da coluna cervical, no período compreendido entre os dias 12 de Julho de 2007 a 28 de Julho de 2007, sofreu dores de grau 3 numa escala de 1 a 7, durante o embate e durante o período de recuperação funcional, vindo a ter alta em 30 de Agosto de 2007, data em que as suas sequelas estabilizaram ] , foi atribuía uma indemnização para ressarcimento de danos morais de 10.000,00 €;
II - Em Decisão proferida ainda por este Tribunal da Relação a 19/6/2012 (8) e com referência a acidente de viação ocorrido a 25/4/2007 [ do qual resultou para o sinistrado/lesado ,que era uma pessoa saudável, dinâmico e de grande vigor físico; sentiu um grande nervosismo e ansiedade, com perturbação do seu descanso, da sua paz interior e da estabilidade da sua vida familiar (alínea GG); teve o braço esquerdo imobilizado por suspensão ao pescoço durante 96 dias, com os incómodos que daí decorrem para a execução das mais pequenas tarefas da vida diária ; ficou totalmente incapaz para o trabalho desde a data do acidente – 25/04/2007 – até 21/03/2008; sente dores intensas nos braço e ombro esquerdos quando precisa de os levantar na execução de um qualquer trabalho ] foi atribuía uma indemnização de 10.000,00€ para ressarcimentos dos correspondentes danos não patrimoniais;
III - Em Decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, a 15/1/2013 (9) e com referência a acidente de viação ocorrido a 19/9/2003 [ no qual foi a sinistrada de 46 anos de idade atropelada por motociclo em passadeira de peões, e sofrendo então: Traumatismo da região bucal; Feridas corto-contusas do lábio superior; Fractura alvéolo-dentária com perda de duas peças dentárias do bloco incisivo superior; Foi imediatamente transportada de ambulância para o Hospital, onde foi submetida a intervenção cirúrgica no Bloco do Serviço de Urgência, para correcção das feridas do lábio superior e redução da fractura com arco de Erich e fio de aço ; Obteve alta hospitalar em 23 de Setembro de 2003; Em consequência do atropelamento ficou com uma cicatriz deformante de 2 cm no lábio superior ; Sofreu ainda escoriações em diversas partes do corpo; Sofreu dores (quantum doloris fixável no grau 4 numa escala de 1 a 7) durante, pelo menos, 15 dias após o acidente; Para reabilitação do maxilar superior, tendo em atenção designadamente os dentes perdidos e fracturados em resultado do acidente, teve necessidade de efectuar, nomeadamente: a) Colocação de prótese acrílica provisória para resolver de imediato as ausências dentárias; b) Desvitalização dos dentes 12, 13, 23 e 24; c) Ponte metalo-cerâmica fixa de 14 elementos; A cicatriz referida e a perda prematura de dentes provocam-lhe desgosto e complexos ] foi atribuía uma indemnização de 15.000,00 € para ressarcimentos dos correspondentes danos não patrimoniais;
IV - Em Decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a 13/12/2012 (10) e com referência a acidente de viação ocorrido a 19/10/2002 [ no qual foi a sinistrada de 24 anos de idade atropelada por veículo em passadeira de peões, e sofrendo então: lesões corporais , ficando caída no pavimento e sido assistida logo local do acidente por equipa de paramédicos ; Sentiu fortes dores na cabeça e na zona lombar e de seguida foi transportada em ambulância para o serviço de urgência do Hospital onde lhe foram ministrados tratamentos vários de limpeza, desinfecção e sutura de feridas contusas na cabeça ; Permaneceu em casa em repouso de 19 a 27 de Outubro de 2002 e entre a data do acidente e até Junho de 2003 sofreu fortes dores na zona lombar, com carácter persistente, sendo que o IML fixou o “quantum doloris” no grau 3, duma escala crescente de 7 valores ; Em 25 de Outubro de 2002 e 25 de Fevereiro de 2003, efectuou um TAC e uma ressonância magnética à coluna lombar que não revelaram alterações patológicas ; Em Julho de 2003 efectuou tratamentos diários de fisioterapia e natação terapêutica durante uma semana e passou a usar uma cinta de contenção lombar e uma almofada de apoio lombar, começando a tomar “Sirdalud”, um relaxante muscular, sempre que as dores se tornavam mais intensas ; No final de 2003 as dores na zona lombar voltaram a intensificar-se o que levou o médico assistente da A. e prescrever um novo TAC à região sacro-coccígea , exame este que em 16/12/2003 revelou a existência de «desvio direito e anterior do último elemento coccígeo, o que condiciona uma curvatura anterior desta estrutura, compatível com uma patologia pós-traumática a envolver o segmento distal do cóccix», tendo a sinistrada em consequência do acidente a A. começado a sentir dores crónicas ao nível da zona lombar e sacro-coccígia que se tornaram por vezes intensas com as mudanças do tempo ; Deixou de poder efectuar corrida e praticar actividade desportiva intensa e fazer grandes viagens ; Durante algum tempo deixou de efectuar as tarefas de limpeza de casa, sendo que ainda hoje evita carregar objectos pesados, por tal lhe causar dor e nos meses seguintes ao acidente sofreu insónias causadas pela imagem gravada na memória de ser projectada pelo automóvel , sendo que ainda hoje e ao atravessar uma passadeira, revive o acidente experimentando grande ansiedade, medo e angústia, mas esse tipo de sensações irá provavelmente atenuar-se com o tempo ] foi atribuía uma indemnização de 25.000,00 € para ressarcimentos dos correspondentes danos não patrimoniais.
Ou seja , não estando in causa em discussão, como vimos já , que em resultado do atropelamento de que foi vítima a apelada padeceu ela de danos morais - que pela sua gravidade, merecem indiscutivelmente a tutela do direito, cfr. nº 1 do artigo 496º do Código Civil - , resumindo-se tão só a discordância da apelante ao montante a atribuir, vemos que, perante a breve resenha jurisprudencial acabada de indicar, desde logo uma primeira conclusão se pode desde já retirar, qual seja a de que, em rigor, não se mostra de todo o montante fixado pelo tribunal a quo completamente desajustado e desfasado da “realidade judicial” , bem pelo contrário.
Por outra banda, não olvidando que, como o obriga o nº 3, do artº 496º, do CC, quando a responsabilidade se fundar em mera culpa, poderá a indemnização ser fixada equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado, e as demais circunstâncias do caso o justifiquem ( cfr. artigo 494º do Código Civil), a verdade é que in casu em nada contribuiu a apelada para a ocorrência do sinistro, antes ficou ele a dever-se in totum ao segurado na apelante, o qual, conduzindo a velocidade superior a 60 km/hora e com desatenção ao trânsito de peões, veio a colher a apelada quando se encontrava ela a atravessar uma passadeira de peões.
Ora, tendo a apelada sido vítima de um acidente grave e que ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do veículo segurado na Ré apelante, não pode outrossim tal elemento deixar de reflectir-se no montante da compensação por danos não patrimoniais.(11)
Por último, tendo a apelada, à data do acidente com 43 anos de idade, ficado com uma cicatriz na face de cerca de 2,5 cm., e situando-se é certo o correspondente dano estético em grau 1 numa escala de 7, a verdade é que tal dano estético - porque logo na face - causa-lhe desgosto, devendo outrossim ser compensado como uma componente relevante do dano moral.(12)
Acresce que, como bem se nota no citado Ac. do STJ de 7/7/2009, o facto de se tratar de uma mulher ainda jovem, tal afectação permanente do estado físico constitui sempre um grave dano estético, mais a mais, sabendo-se que a aparência física está relacionada com a expressão individual dos sujeitos, à sua relação consigo mesmo e com o ambiente social, o que contende com sentimentos de auto-estima, em tempos em que é socialmente exigida uma boa aparência.
E daí que, conclui-se no citado e douto Ac. do STJ de 7/7/2009, “ O dano estético é uma lesão permanente, um dano moral, tanto mais grave quanto são patentes e deformantes as lesões, sendo de valorar especialmente quando são visíveis e irreversíveis “
Impondo-se concluir, e tendo a indemnização a atribuir ao lesado por desiderato proporcionar-lhe uma vantagem capaz de consubstanciar um lenitivo para a dor moral, os sofrimentos físicos, a perda de consideração social e os sentimentos de inferioridade, e tendo presente que in casu, para além de ter a apelada sofrido uma contusão no joelho, sofrendo uma incapacidade para o trabalho pelo período de 13 dias, ficou ainda com uma cicatriz na face de cerca de 2,5 cm, razão porque, tendo 43 anos e sendo do sexo feminino ( e sem que a presente afirmação envolva uma qualquer discriminação em razão do sexo ), temos como equitativa, justa e equilibrada a quantia fixada pelo a quo com vista ao ressarcimento dos danos não patrimoniais sofrido pela apelada.
Concluindo, a apelação da apelante improcede nesta parte.
3.2.- Se sobre a quantia atribuída pelo a quo à apelada a titulo de danos morais acrescem os juros de mora ,à taxa legal, a contar da citação da Ré e ora apelante.
Diz a apelante que, porque em sede de fixação da compensação devida à apelada pelos danos morais, o julgador ateve-se ao momento da prolação da douta sentença, tal obriga a que os juros moratórios sejam devidos, tão só, a partir da prolação da referida decisão e nunca desde a citação.
Nesta parte, tem a apelante toda a razão.
É que, como decorre expressamente da sentença apelada, nela refere a Exmª Juiz a quo que, com referência ao ressarcimento dos danos morais, “ (…) entende-se ponderada a fixação da compensação devida em 7.000,00 €, actualizada a esta data “, mas, algo contraditoriamente, conclui dizendo que sobre as quantias indicadas vencer-se-ão juros de mora à taxa resultante das Portarias aplicáveis, contados desde a citação da R., nos termos do art. 805º, n.º 3, do CC, até integral pagamento.
Ora, não obstante o disposto no nº 3, do artº 805º, do CC [ do qual resulta que, estando em causa uma obrigação alicerçada em responsabilidade por facto ilícito, o devedor constitui-se em mora desde a citação ], o certo é que há muito que o S.T.J. uniformizou jurisprudência [ decidiu-se no Ac. em referência que “ Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação “ ] , no sentido de os juros de mora serem devidos a partir da decisão actualizadora e não a partir da citação sempre que a indemnização por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado (13).
Porque a legislação no âmbito da qual foi proferido o referido Acórdão do STJ mantêm-se inalterada, e porque inquestionável é que no tocante aos danos não patrimoniais a sentença do a quo procedeu ao cálculo da correspondente e devida indemnização com referência à data da decisão, como nela se refere expressamente, óbvio é que o vencimento dos juros de mora só são devidos [ não se pretendendo violar a interpretação restritiva do n.º 3 do artigo 805.º do CC, decidida no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência referido de 9/05/2002 ] a partir da sua prolação , que não da citação da apelante.(14)
Nesta parte, portando, a apelação procede.
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4.- Sumariando ( cfr. nº7, do artº 713º, do CPC).
I - Tendo a Autora , com 43 anos de idade, sido atropelada por veículo automóvel quando procedia ao atravessamento de estrada e em plena passadeira de peões, sofrendo então uma contusão no joelho e ficado com uma cicatriz na face de cerca de 2,5 cm, padecendo então de dores as quais ainda continua a sofrer , e sentindo-se desgostosa com a deformidade que ficou na face, afigura-se-nos equitativo manter no quantitativo de € 7.000,00 a indemnização fixada pelo a quo e que lhe é devida para ressarcir os danos não patrimoniais que lhe foram causados.
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5. Decisão.
Termos em que,
acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em , julgando a apelação parcialmente procedente:
5.1.- Revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré “Companhia de Seguros.., S.A.” a pagar à A. C.. os juros de mora - sobre a quantia de €7.091,55 - à taxa legal, civil, vigente em cada momento, vencidos desde a data da citação até efectivo e integral pagamento ;
5.2. - Manter a sentença apelada na parte em que condenou a R. “Companhia de Seguros.., S.A.” a pagar à A. C.. a quantia de 7.000,00€ a título de indemnização por danos não patrimoniais, mas sendo os juros de mora que a ela acrescem - à taxa legal, civil, vigente em cada momento - , devidos desde a data da sentença e até efectivo e integral pagamento ;
5.3.- Manter no mais a sentença apelada, maxime no tocante aos juros de mora que incidem sobre a quantia de 91,55€ , sendo eles devidos desde a data da citação da apelante e até efectivo e integral pagamento;
Custas da apelação pela apelante e apelada, e na proporção, respectivamente, de 9/10 e de 1/10.
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(1) De 07-07-2009, proc. nº 704/09.9TBNF.S1, in www.dgsi.pt, e socorrendo-se de da obra “Logos-Enciclopédia Luso-Brasileira de Filosofia” ,pág.126.
(2) Cfr. Luís Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, Volume I, Almedina, pág. 298.
(3) No Ac. de 30.10.96, disponível in BMJ nº 460, pág. 444.
(4) Cf., de entre muitos outros, o acórdão do S.T.J. de 29.1.2008, proc. 07A4492, in www.dgsi.pt
(5) Diploma este que, além de transpor para o nosso ordenamento jurídico a Quinta Directiva Automóvel- Directiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio -, regulou inovadoramente, por iniciativa do legislador nacional, diversos domínios da regularização de sinistros rodoviários, sobretudo no que respeita ao dano corporal, fixando os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização do dano corporal, nos termos do disposto no capítulo III do título II do Decreto -Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
(6) No dizer do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5/11/2009, Proc. nº 121/01.2GBPMS.C1.S1, in www.dgsi.pt, os valores referidos na Portaria impõem-se apenas para o efeito de apresentação de proposta razoável para indemnização, sendo tão só “um ponto de partida” .
(7) Proc. nº 250/10.1TCGMR.G1, in www.dgsi.pt .
(8) Proc. nº 430/09.2TBBCL.G1, in www.dgsi.pt .
(9) Proc. nº 1949/06.2TVPRT.P1, in www.dgsi.pt
(10) Proc. nº 5505/05.4TVLSB.L1-2, in www.dgsi.pt
(11) Cfr. Ac. do STJ de 2 de Maio de 2012, Relator Fonseca Ramos, disponível in www.dgsi.pt.
(12) Cfr. Ac. do STJ de 7 de Julho de 2009, Relator Fonseca Ramos, disponível in www.dgsi.pt.
(13) Cfr. Ac. nº 4/2002, de 9/5/2002, in D.R., série I-A, nº. 146, de 27/06/2002, págs. 5057 e segs , e que, na sequência de interpretações contraditórias proferidas sobre a questão em apreço, uniformizou Jurisprudência que definiu uma interpretação restritiva do n.º 3, do artº 805º, do CC.
(14) Cfr, ainda os Acs. do S.T.J., de 25/10/2007, de 23/10/2008, Proc, nº 08B2318 e de 12/02/2009, Prc. nº 07B4125, todos eles disponíveis in www.dgsi.pt.
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Guimarães, 07/05/2013
António Manuel Fernandes dos Santos
António Manuel Figueiredo de Almeida
Ana Cristina Oliveira Duarte