NULIDADE DA SENTENÇA
ARTIGO 615º DO C.P.C.
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
RESPONSABILIDADE PELA CONSTRUÇÃO E CONSERVAÇÃO DE EDIFÍCIOS
Sumário


1- As nulidades da sentença são vícios intrínsecos da formação de tal peça processual, taxativamente consagrados no nº1, do art. 615º, do CPC, sendo vícios formais do silogismo judiciário relativos à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento, de facto ou de direito;

2- Passando a possibilidade de alteração da matéria de facto a ser função normal do Tribunal da Relação (verdadeiro Tribunal de substituição), com vista a, com mais um grau de jurisdição, poderem ser supridos erros de julgamento e, assim, melhor alcançado os fins a que o Estado se propõe – maior certeza e segurança jurídicas, com decisões mais justas que levam a maior equidade e paz social -, o legislador sentiu a necessidade de impor ao recorrente o cumprimento de rigorosas regras (v. art. 640º, do CPC) para evitar autenticas repetições de julgamentos, por vão inconformismo, pois que apenas quis consagrar a possibilidade de revisão quanto a concretas questões de facto relativamente às quais haja entendimento fundamentado do recorrente existir erro de julgamento;

3- Relativamente aos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, a al. a), do nº2, do art. 640º, do CPC, tem de ser interpretada de forma funcionalmente adequada tendo em vista os objetivos prosseguidos com a imposição do ónus nele estatuído e por referência ao princípio da proporcionalidade.

4- Não cumprem o ónus estabelecido naquela norma os recorrentes que se limitam a indicar o nome de depoentes, com mera indicação do início e do fim dos respetivos depoimentos e minutos que entendem “com relevo para este recurso”, sem indicar concretamente a prova em que fundamentam cada ponto de facto e sem fazer análise crítica das provas;

5- A falta de indicação por parte dos apelantes das passagens da gravação em que funda cada ponto de facto do recurso têm, como consequência, a imediata rejeição do mesmo, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica tal omissão e falta de análise crítica das provas;

6- A ruína de um edifício ou obra é um facto que indicia, só por si, a ilicitude - o incumprimento de deveres relativos à construção ou conservação dos edifícios - não se justificando, assim, que recaia sobre o lesado o ónus de demonstrar a forma como a mesma ocorreu;

7- E presumindo-se a culpa (art. 492º, do CC) é sobre o responsável pela construção ou conservação que impende o ónus da prova de que não foi por sua culpa que ocorreu a ruína do edifício ou obra (e, designadamente, de que se verifica ausência de vícios de construção ou defeitos de conservação) ou que os danos continuariam a verificar-se, ainda que não houvesse culpa sua.

8- Contudo, não provando o lesado infiltrações na sua fração, provenientes do terraço (onde o muro ruiu), nem, sequer, a realização de obras no terraço onde o muro ruiu, não cumpre o ónus da prova dos factos constitutivos do alegado direito, nos termos do nº1, do art. 342º, do Código Civil, por, desde logo não provar o primeiro requisito da responsabilidade civil – a ocorrência do facto.

Texto Integral


Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

José instaurou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO ABERTO, representado por Empresa X – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., Fundação W e CONDOMÍNIO DO PRÉDIO URBANO sito na Avenida 1…, Vila Real, pedindo que:

a) Seja o 1º R. condenado a pagar ao A. a quantia de 9 600,00 €, acrescidos de IVA, a título de indemnização pelos danos materiais causados na fração autónoma “C7” do A., acrescidos de IVA à taxa legal em vigor e ainda de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento;
b) Seja o 1º R. condenado a pagar ao A., a título de dano de privação do uso, gozo e fruição da fração “C7”, a quantia de 14 000,00 €, acrescidos das quantias mensais que se vencerem desde 2 de Setembro de 2013 até à data em que o 1.º R liquide ao A. a quantia destinada à reparação efetiva dos danos sofridos na fração autónoma do A., tudo acrescido de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento;
c) Seja o 1º R. condenado a pagar ao A., a título de danos não patrimoniais, a quantia de 5 000,00 €, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento;
d) Seja o 1º R. ainda condenado, para cessar os factos que são a causa adequada dos danos sofridos pelo A., a reparar, a expensas suas, com o uso dos meios técnicos apropriados, de acordo com as melhores “regras de arte”, materiais e mão-de-obra adequados, a laje em cimento do terraço, reconstruindo o muro do terraço em tijolo e vigas de ferro rebocado, devidamente escorado e travado, eliminando as fissuras e fendas no piso e na laje da cobertura do edifício, de modo que a cobertura do terraço e também a fração “C7” do A. não fiquem expostas ao vento, sol, chuva e demais condições climatéricas, tudo no período de 30 dias após decisão judicial transitada em julgado;

Pede, ainda, a título subsidiário, que:

e) Sejam os 2º R. e 3º R condenados solidariamente a pagar ao A. a quantia de 9 600,00 €, acrescidos de IVA, a título de indemnização pelos danos materiais causados na fração autónoma “C7” do A., acrescidos de IVA à taxa legal em vigor e ainda de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento, sendo na parte que cabe indemnizar pelo 3º R. ao A. descontada a proporção da permilagem referente à fração autónoma “C7” do A.;
f) Sejam os 2º R. e 3º R condenados solidariamente a pagar ao A., a título de dano de privação do uso, gozo e fruição da fração “C7”, a quantia de 14 000,00 €, acrescidos das quantias mensais que se vencerem desde 2 de Setembro de 2013 até à data em que o 1.º R liquide ao A. a quantia destinada à reparação efetiva dos danos sofridos na fração autónoma do A., tudo acrescido de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento, sendo na parte que cabe indemnizar pelo 3º R. ao A. descontada a proporção da permilagem referente à fração autónoma “C7” do A.;
g) Sejam os 2º R. e 3º R condenados solidariamente a pagar ao A., a título de danos não patrimoniais, a quantia de 5 000,00 €, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento, sendo na parte que cabe indemnizar pelo 3º R. ao A. descontada a proporção da permilagem referente à fração autónoma “C7” do A.;
h) Sejam os 2º R. e 3º R ainda solidariamente condenados, para cessar os factos que são a causa adequada dos danos sofridos pelo A., a reparar, a expensas suas, com o uso dos meios técnicos apropriados, de acordo com as melhores “regras de arte”, materiais e mão-de-obra adequados, a laje em cimento do terraço, reconstruindo o muro do terraço em tijolo e vigas de ferro rebocado, devidamente escorado e travado, eliminando as fissuras e fendas no piso e na laje da cobertura do edifício, de modo que a cobertura do terraço e também a fração “C7” do A. não fiquem expostas ao vento, sol, chuva e demais condições climatéricas, tudo no período de 30 dias após decisão judicial transitada em julgado;

Mais pede, a título subsidiário, que:

i) Seja o 3º R condenado a pagar ao A. a quantia de 9 600,00 €, acrescidos de IVA, a título de indemnização pelos danos materiais causados na fração autónoma “C7” do A., acrescidos de IVA à taxa legal em vigor e ainda de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento, sendo na parte que cabe indemnizar pelo 3º R. ao A. descontada a proporção da permilagem referente à fração autónoma “C7” do A.;
g) Seja o 3º R condenado a pagar ao A., a título de dano de privação do uso, gozo e fruição da fração “C7”, a quantia de 14 000,00 €, acrescidos das quantias mensais que se vencerem desde 2 de Setembro de 2013 até à data em que o 1.º R liquide ao A. a quantia destinada à reparação efetiva dos danos sofridos na fração autónoma do A., tudo acrescido de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento, sendo na parte que cabe indemnizar pelo 3º R. ao A. descontada a proporção da permilagem referente à fração autónoma “C7” do A.;
h) Seja o 3º R condenado a pagar ao A., a título de danos não patrimoniais, a quantia de 5 000,00 €, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento, sendo na parte que cabe indemnizar pelo 3º R. ao A. descontada a proporção da permilagem referente à fração autónoma “C7” do A.;
i) Seja o 3º R ainda condenado, para cessar os factos que são a causa adequada dos danos sofridos pelo A., a reparar, a expensas suas, com o uso dos meios técnicos apropriados, de acordo com as melhores “regras de arte”, materiais e mão-de-obra adequados, a laje em cimento do terraço, reconstruindo o muro do terraço em tijolo e vigas de ferro rebocado, devidamente escorado e travado, eliminando as fissuras e fendas no piso e na laje da cobertura do edifício, de modo que a cobertura do terraço e também a fração “C7” do A. não fiquem expostas ao vento, sol, chuva e demais condições climatéricas, tudo no período de 30 dias após decisão judicial transitada em julgado (…)”
Alega, para tanto e resumidamente, que é proprietário da fração autónoma designada por “C7”, correspondente a um estabelecimento comercial de café e snack-bar, integrante do prédio urbano sito na freguesia e concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 222, o qual integra ainda as frações autónomas designadas por “D” e “E3”, pertencentes ao réu Fundo e à ré Fundação W, respetivamente (esclarecendo que a fração “C7” se localiza por debaixo da fracção “D”, a qual, por sua vez, se situa por debaixo de um terraço que constitui a cobertura do edifício, o qual, por seu turno, se destina ao uso exclusivo da fração “E3”) e que, em data anterior a 02/05/2011, o réu Fundo realizou obras no dito terraço, na sequência das quais veio a ocorrer a queda de um muro aí existente, após o que ficou exposta a cobertura do edifício e se vieram a registar infiltrações de águas pluviais no interior da fracção “C7”, causando-lhe diversos danos patrimoniais e não patrimoniais.
Sustenta, ainda, que o réu Fundo é o responsável pelo ressarcimento dos danos alegados, por ter realizado uma obra da qual vieram a eclodir os referidos prejuízos, e que a ré Fundação W, na qualidade de condómina com uso exclusivo do terraço, e o réu Condomínio do n.º 00, por se tratar de uma parte comum do imóvel, deverão ser responsabilizados, subsidiariamente, uma vez que se lhes impõem o dever de conservarem o terraço e o muro em causa.

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Cada um dos Réus apresentou a sua contestação.
O Réu Fundo, na sua contestação (fls. 126-131), invocou a ineptidão da petição inicial, para além de impugnar os danos alegados pelo autor e refuta que deva ser responsabilizado nos termos peticionados.
A Ré Fundação W, na contestação (fls. 90-108,) suscitou a sua ilegitimidade, rejeitou a sua responsabilidade pela eclosão dos danos invocados pelo autor, que impugnou, sem prejuízo de suscitar a culpa do lesado, a terem-se verificado os danos.
O Réu Condomínio, na contestação que apresentou (fls. 138-151, arguiu a sua ilegitimidade, impugnou os danos invocados pelo autor e refuta a responsabilidade.
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Tendo falecido o autor (em 24/10/2013), foram habilitados os seus herdeiros, Maria, Manuel, António, Joaquim e Manuela, por sentença (fls. 25-26 do Ap. A), transitada em julgado.
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Foi admitida a intervenção principal provocada do lado passivo de António, AGC, LDA., ORDEM DOS ENGENHEIROS e CONDOMÍNIO DO PRÉDIO URBANO sito na Avenida … Vila Real (doravante abreviadamente designado Condomínio do n.º 99), que se apresentaram a contestar, tendo a chamada AGC, Lda. (cfr. fls. 215-217) declinado a sua responsabilidade pelos danos invocados pelo autor, que impugnou; a chamada Ordem dos Engenheiros (fls. 231-233) secundado a contestação oferecida pelo réu Fundo e refutado a responsabilidade pelos danos alegados pelo autor, que impugnou; o chamado António (fls. 284-285) secundado a contestação oferecida pela chamada Ordem dos Engenheiros e rejeitado a responsabilidade pelos danos descritos pelo autor, que impugnou; e o chamado Condomínio do n.º 99 (fls. 321-324) refutado a responsabilidade pelos danos invocados pelo autor, que impugnou.
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No despacho saneador (fls. 237-255) foi decidido, além do mais, julgar inverificado o vício de ineptidão da petição inicial e improcedente a arguição da ilegitimidade passiva.
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Realizou-se audiência de julgamento, com observância do formalismo legal.
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Foi proferida sentença a julgar a ação totalmente improcedente e a absolver os Réus dos pedidos formulados.
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Os Autores apresentaram recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a decisão e substituída por outra que determine a procedência do recurso. Formularam as seguintes CONCLUSÕES:

- A decisão proferida fez errada decisão da matéria de facto e, especialmente, incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, como a seguir se vai demonstrar.
- Na sentença recorrida, considerou-se provado que por cima da fração “C7” está construída a fração “D” e por cima da fração “D” encontra-se um terraço, com uma área de cerca de 415 m2, o qual, além daquela, serve de cobertura de outras frações autónomas dos prédios descritos sob os n.ºs 222 e 888, localizando-se, do lado sul desse terraço, um muro em tijolo e vigas de ferro rebocado a cimento, assente na laje.
- E, deu-se, ainda, como provado que, em data não concretamente apurada, ruiu e caiu parte do muro indicado em 21, numa extensão de cerca de 15,00 metros, situada sobre a fração “D” e que a cobertura do terraço referido em 20 apresenta-se exposta ao vento, Sol, chuva, água e demais condições climatéricas.
- Contudo, não se considerou provado que a queda do muro implicou a abertura das fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço, nem se considerou provado que a ruína do muro ficou a dever-se à falta de conservação e manutenção do terraço e do muro pela ré Fundação W ou pelo Condomínio do n.º 00, por aí não terem sido realizadas as obras necessárias para o efeito.
- A matéria de facto considerada provada e não provada encontra-se em contradição, pois que ao considerar-se provada a queda do muro que se encontrava edificado sobre a laje do terraço, não poderia deixar de se considerar provado que tal ocorrência provocou a abertura de fendas e fissuras na laje do terraço.
- Pois, a queda de um qualquer muro, ao deixar a base do mesmo exposta, provoca no solo fissuras e fendas.
- E, na douta sentença considerou-se mesmo provado que a cobertura do terraço se encontra exposta ao vento, sol, chuva, água e demais condições climatéricas.
- contudo, contraditoriamente, considerou-se não provado que a queda do muro implicou a abertura de fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço, o que, é contraditório com o acima afirmado, o que expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos - artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC..
- Pelo que, necessário seria, não só na sequência lógica do acima afirmado, como pelo depoimento das testemunhas, como infra ficará demonstrado, dar como provado, que a queda do muro implicou a abertura de fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço, como todas as consequências daí resultantes.
10º - O que torna a sentença nula, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC, e se invoca com as devidas e legais consequências.
11º - Nulidade esta que ora se invoca para todos os devidos e legais efeitos.
12º - Com base nas DECLARAÇÕES DE PARTE DO CHAMADO ANTÓNIO, as quais constam gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 16:07:17 e fim pelas 10:22:36, com relevo para este recurso de 01:22 a 01:57.
13º - E, com base nos depoimentos das TESTEMUNHAS: B.1 ) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA BB, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 09:41:07 e fim pelas 10:22:36, com relevo para este recurso 02:17 a 18:25; B.2 ) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA HH, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 10:23:08 e fim pelas 10:45:05, com relevo para este recurso 01:10 a 13:02; B.3 ) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA FF, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 10:46:13 e fim pelas 10:57:26, com relevo para este recurso 01:05 a 05:53; B.4) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA RR, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 10:58:01 e fim pelas 11:10:38, com relevo para este recurso de 04:37 a 06:10; B.5) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA MM, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 11:12:40 e fim pelas 11:58:47, com relevo para este recurso de 09:20 a 10:40 e de 37:53 a 43:54; B.6) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA CC, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 14:33:55 e fim pelas 14:48:57, com relevo para este recurso 04:14 a 07:59; B.7) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA OO, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 14:53:31 e fim pelas 15:05:15, com relevo para este recurso 03:49 a 05:10; B.8) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA LL, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 15:07:48 e fim pelas 15:46:40, com relevo para este recurso 03:49 a 10:31 e B.9) DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA JJ, o qual consta gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, em 31/03/2017, com início às 15:51:58 e fim pelas 15:55:41, com relevo para este recurso 02:37 a 03:30.
13ª - E, com base na PROVA DOCUMENTAL: C.1) Documentos compostos por fotos do terraço depois da queda do muro, bem como, dos destroços do mesmo, juntos como Docs. 5 a 9 com a p.i. e C.2) Documento composto por orçamento apresentado para reparação do teto e das paredes da fração “C7” dos AA., Doc. 10 junto com a p.i..
14ª - Em função do supra exposto, resulta que se impunha decisão diversa da proferida, no sentido de se dar como provado que:





15º - E deveria ter sido dado como não provado que:



16º - O Tribunal recorrido fez errada decisão da matéria de facto.
17º - Nos termos do artigo 492º, n.º 1 do Código Civil “O proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado danos.”.
18º - E, nos termos do n.º 2 daquele preceito legal “A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a defeito de conservação.”.
19º - O art. 492.º estabelece uma presunção de culpa que recai sobre o proprietário ou possuidor do edifício.
20º - Conforme se decidiu no Acórdão da Relação do Porto, de 19/12/2012, proferido no âmbito do processo n.º 2198/11.3TBPVZ.P1, publicado in www.dgsi.pt :
I - O art.º 492.º, n.º 1, do Código Civil estabelece uma presunção de culpa que recai sobre o proprietário ou possuidor do edifício ou obra.
II - Por isso, tem o ónus de alegar e provar que não foi por culpa sua que ocorreu a ruína do edifício ou obra, nomeadamente por ausência de vícios de construção ou defeitos de conservação, ou que os danos se verificariam mesmo que não houvesse culpa da sua parte.
21º - Como refere Luís Teles de Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, I, 9.ª ed., pp. 334-335 “salvo no caso de fenómenos extraordinários, como os terramotos, a ruína de um edifício ou obra é um facto que indicia só por si o incumprimento de deveres relativos à construção ou conservação dos edifícios, não se justificando por isso que recaia sobre o lesado o ónus suplementar de demonstrar a forma como ocorreu esse incumprimento. É antes o responsável pela construção ou conservação que deve genericamente demonstrar que não foi por sua culpa que ocorreu a ruína do edifício ou obra – nomeadamente pela prova da ausência de vícios de construção ou defeitos de conservação – ou que os danos continuariam a verificar-se, ainda que não houvesse culpa sua”.
22º - Nesse sentido o Acórdão do STJ de 29.04.2008, publicado in www.dgsi.pt, considerou que no caso em apreço era deveras difícil por parte do lesado a prova da existência do vício de construção ou defeito de conservação, já que não tendo, em regra, conhecimentos técnicos, nem sabendo quais a regras de atuação utilizadas, lhe era praticamente impossível provar a existência de defeitos de conservação, pelo que ao lesado apenas é exigível uma prova de primeira aparência do defeito e do nexo de causalidade, sendo de considerar que se ocorre um determinado evento causador de danos, e não se devendo tal facto a culpa do lesado, nem a caso fortuito ou de força maior, existiu defeito de conservação. E abona-se em Menezes Leitão para considerar que não foi ilidida a presunção de culpa do art. 492º, n.º 1 do C.C..
23º - Por sua vez, o Acórdão da Relação do Porto de 24.04.2003, publicado in www.dgsi.pt, igualmente afastou a necessidade de prova pelo lesado de que existiu vício de construção ou defeito de conservação na obra que ruiu, dizendo “Contudo, é nosso entendimento que tal orientação não poderá ser seguida nesses precisos termos, salvo em casos de verificação de fenómenos extraordinários, pois que, em situações de normalidade, deverá caber ao responsável pela construção ou conservação de uma obra demonstrar que não foi por culpa sua que ocorreu a sua ruína ou até que os danos sempre se verificariam, mesmo que não existisse culpa sua – v., no sentido que se acaba de expor e na apreciação que é feita ao art. 1350 do CC, Menezes Cordeiro, in “Direitos Reais”, pág. 598, ao escrever que “… se houver desmoronamento efectivo, o titular do edifício responde pelos danos havidos, salvo se provar que não teve culpa ou que nada se poderia fazer para evitar o acidente”.
24º - Contudo, o Tribunal a quo entendeu que não ficou evidenciado que o Réu Fundo de Investimento Imobiliário “FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO ABERTO” promoveu uma intervenção no terraço da qual advieram danos para a fração “C7” dos AA..
25º - Entendem os Recorrentes que andou mal o Tribunal a quo, uma vez que, conforme resulta da prova testemunhal e da prova documental junta aos autos, o Réu Fundo, ou o seu inquilino na altura, em sua representação, levou a cabo trabalhos na laje do terraço, na qual colocou tela, que sobrepôs no muro aí existente, em toda a sua extensão, e, após, procedeu à colocação de placas em cimento, por cima da tela.
26º - Ora, como foi referido, expressamente, por várias testemunhas, o peso da tela, exercido sobre o muro, provocou a sua derrocada, e, consequentemente, a abertura de fendas em cima do terraço que serve de cobertura ao prédio, ficando o mesmo exposto ao sol, à chuva e ao vento.
27º - Situação, essa, que provou, infiltrações de água na fração dos AA., as quais se evidenciaram mais na parede situada por baixo do local onde se encontrava o muro.
28º - Aliás, como foi dito, pelas testemunhas BB e HH que, imediatamente, após a queda do muro que a situação de infiltração de água na fração “C7” se tornou grave, tomando grandes proporções, ao ponto de se ter sido necessário retirar a água acumulada dentro da fração.
29º - Tendo resultado demonstrados todos os factos supra expostos, era ao R. Fundo que cabia afastar a presunção que recai sobre si, nos termos do artigo 492º do C.C., e não o contrário.
30º - Andou mal o Tribunal recorrido ao basear-se, no relatório pericial, para assim concluir que os danos da fração dos AA., que, segundo os senhores peritos, consistem em simples manchas de condensação, não se devem aos atos do R. Fundo, uma vez que, os senhores peritos se deslocaram à fração, após esta ter sido pintada, em virtude de um outro sinistro, posterior à queda do muro, provocado por tubagens de rede de água, cuja regularização foi feita pelo seguro do Inquilino do R. Fundo, conforme resulta dos depoimentos das testemunhas RR e MM.
31º - Pois, tal situação, apenas serviu para camuflar, por pouco tempo, os problemas de humidade que, conforme foi dito pelas testemunhas BB e HH, continuam por solucionar.
32º - O Tribunal Recorrido não podia deixar de considerar demonstrado que o R. Fundo procedeu ao obras no terraço, as quais provocaram a queda do muro, donde advieram danos para a fração dos AA..
33º - Em função do supra exposto, era ao R. Fundo que competia ilidir a presunção que recaía sobre si, nos termos do artigo 492º do C.C., o que não fez
34º - Pelo que, o Tribunal a quo deveria ter condenado o R. Fundo na totalidade do pedido.
35º - O Tribunal recorrido violou, por erro de interpetação e aplicação o disposto no artigo 492º do C.C..
36º - Caso assim se não entenda, uma vez que o Tribunal a quo considerou provado que o terraço que serve de cobertura das frações autónomas dos prédios descritos sob os n.ºs 222 a 888 constituirá parte comum desses prédios, constituídos em propriedade horizontal, nos termos do artigo 1421º, n.º 1, al. b) do C.C..
37º - E, mais se considerou provado que o terraço, na parte onde se verificou a queda do muro é parte comum do prédio urbano descrito na CRP sob o n.º 222.
38º - Sendo que, nos termos do artigo 1424º, n.º 1 do C.C. “Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções.”.
39º - Donde resulta, a responsabilização do R. Condomínio do n.º 00, nos termos do artigo 492º, n.º 2 do C.C..
40º - Nesse sentido, o Acórdão do STJ de 16/11/2006, publicado in www.dgsi.pt decidiu que: II - Estando assente que os defeitos do terraço - cobertura da fracção do piso 3.º e de uso exclusivo do condómino do 4.º do piso -, que provocaram os danos sofridos pelo proprietário da fracção do piso 3.º, são defeitos do terraço enquanto cobertura - pois resultaram de deficiências da tela que o revestia -, e não o resultado de uma qualquer utilização daquele por parte do dono da fracção do 4.º piso, forçoso é de concluir que o condomínio é responsável pela reparação dos prejuízos suportados pelo proprietário da fracção inferior.
41º - E no acórdão do STJ de 16/10/2003, publicado in www.dgsi.pt escreveu-se: Os terraços de cobertura de um prédio constituído em regime de propriedade horizontal, são partes imperativamente comuns.
42º - Pelo que, considerando que o terraço serve de cobertura ao prédio com o artigo n.º 222, terá de se concluir pela responsabilização do R. Condomínio do n.º 00.
43º - Uma vez que, conforme se deixou supra explanado e, conforme resulta da prova produzida nos autos, os danos verificados na fração “C7” dos AA. ficaram a dever-se a infiltrações provenientes do terraço que constitui parte comum do prédio, cuja conservação e manutenção é da responsabilidade dos condóminos, na proporção das suas frações.
44º - E, prescreve o artigo 492º, n.º 1 do Código Civil que “O proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado danos.”.
45º - Acresce que, nos termos do n.º 2 daquele preceito legal “A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a defeito de conservação.”.
46º - Pelo exposto, não tendo o R. Condomínio do n.º 00 ilidido a presunção que recaía sobre si, nos termos do artigo 492º do C.C., deveria este ter sido condenado a indemnizar os AA. pelos prejuízos sofridos, nos termos peticionados nos autos.
47º - O Tribunal recorrido violou, por erro de interpetação e aplicação o disposto nos artigos 1424º, n.º 1 e 492º do C.C..
48º - Caso assim se não entenda e, considerando que o terraço dos autos, apesar de não apresentar divisórias, é do uso exclusivo da fração “E3” do R. Fundação W, deverá decidir-se pela responsabilização deste, nos termos do artigo 1424º, n.º 3 do C.C..
49º - Nesse sentido, seguido pela doutrina e jurisprudência minoritárias, diz-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09/06/2016, publicado in www.dgsi.pt: Dúvidas não subsistem que as ditas despesas de manutenção são a cargo dos condóminos que usam e fruem do terraço por serem eles os beneficiários exclusivos do mesmo e, em princípio, terem sido eles quem deram origem ao desgaste ou deterioração dos materiais do mesmo terraço.
50º - Ora, conforme se deixou supra explanado e, conforme resulta da prova produzida nos autos, os danos verificados na fração “C7” dos AA. ficaram a dever-se a infiltrações provenientes do terraço, cuja conservação e manutenção é da responsabilidade dos condóminos que dele façam uso exclusivo.
51º - Ora, nos termos do artigo 492º, n.º 1 do Código Civil “O proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado danos.”.
52º - E, conforme prescreve o n.º 2 daquele preceito legal “A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a defeito de conservação.”.
53º - Pelo exposto, não tendo o R. Fundação W ilidido a presunção que recaía sobre si, nos termos do artigo 492º do C.C., deveria este ter sido condenado a indemnizar os AA. pelos prejuízos sofridos, nos termos peticionados nos autos.
54º - O Tribunal recorrido violou, por erro de interpetação e aplicação o disposto nos artigos 1424º, n.º 3 e 492º do C.C..
55º - Caso assim se não entenda e, caso se considere que o terraço dos autos, apesar de não apresentar divisórias, é do uso exclusivo da fração “E3” do R. Fundação W, e das frações dos Chamados António e AGC, Lda., onde se encontram instalados o Hotel Y e a Delegação da Ordem dos Engenheiros, deverá decidir-se pela responsabilização destes condóminos, por terem em comum, o uso exclusivo do referido terraço, nos termos do artigo 1424º, n.º 3 do C.C..
56º - Nesse sentido, seguido pela doutrina e jurisprudência minoritárias, diz-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09/06/2016, publicado in www.dgsi.pt: Dúvidas não subsistem que as ditas despesas de manutenção são a cargo dos condóminos que usam e fruem do terraço por serem eles os beneficiários exclusivos do mesmo e, em princípio, terem sido eles quem deram origem ao desgaste ou deterioração dos materiais do mesmo terraço.
57º - Assim, conforme resulta da prova produzida nos autos, os danos verificados na fração “C7” dos AA. ficaram a dever-se a infiltrações provenientes do terraço, cuja conservação e manutenção é da responsabilidade dos condóminos que dele façam uso exclusivo.
58º - Nos termos do artigo 492º, n.º 1 do Código Civil “O proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado danos.”.
59º - E, prescreve o n.º 2 daquele preceito legal “A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a defeito de conservação.”.
60º - Pelo exposto, não tendo o R. Fundação W e os Chamados António, AGC, Lda. e Ordem dos Engenheiros, ilidido a presunção que recaía sobre si, nos termos do artigo 492º do C.C., deveriam estes ter sido condenados a indemnizar os AA. pelos prejuízos sofridos, nos termos peticionados nos autos.
61º - O Tribunal recorrido violou, por erro de interpetação e aplicação o disposto nos arts 1424º, n.º 3 e 492ºdo CC.
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Foram oferecidas contra-alegações pela F PATRIMÓNIO - FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO ABERTO (anteriormente designado F Património) onde sustenta não dever ser dado provimento ao presente recurso, sendo de manter a sentença, formulando as seguintes conclusões:

1.ª Os Apelantes vêm interpor recurso da douta sentença que julgou a acção por eles interposta improcedente por não provada e em consequência, absolveu o ora Recorrido dos pedidos contra si dirigidos;
2.ª Resulta das doutas alegações dos Recorrentes que (i) a sentença sena nula por existir uma contradição entre a matéria de facto dada como provada e não provada; (ii) a douta sentença recorrida teria feito uma incorrecta apreciação dos meios de prova e em consequência a aplicação do direito aos factos não seria a correcta; e (iii) haveria uma incorrecta interpretação do disposto no art: o 492º nº 1 do Código Civil;
3.ª Os Recorrentes vêm impugnar a decisão quanto à matéria de facto constante do facto provado 30 e dos factos não provados 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13 e 14;
4.ª Defendem os Apelantes que dos factos dados como provados nos pontos 19, 20, 21, 22 e 23 teria de ter decorrer, igualmente como provado, o facto não provado 3, sob pena de existir uma contradição;
5.ª Nos termos do artº 615º nº1, alínea c) do CPG, a nulidade da sentença poderá resultar ou (i) da oposição entre os fundamentos e a decisão ou (ii) da existência de um vicio ou incongruência que torne a decisão ininteligível;
6.ª Sendo que os Apelantes nas suas alegações se abstêm de concretizar qual dos segmentos do enunciado legal fundamenta a alegada nulidade;
7.ª Sendo que não se encontra verificado o âmbito de aplicação da norma em qualquer uma das suas vertentes: mesmo admitindo que se verificava a contradição entre os factos provados invocados e o facto dado como não provado - o que também se discorda conforme infra se explicitará - dai não resultaria nenhum vício entre a fundamentação e a decisão da sentença;
8.ª O facto de não ter sido dado como provado o facto não provado 3, não leva a que exista uma contradição entre a fundamentação da sentença e a decisão;
9.ª A argumentação é coerente com a factualidade que deu como provada, em nada comprometendo a decisão tomada;
10.ª Identicamente não resulta qualquer obscuridade ou ambiguidade que comprometa a interpretação da decisão, pelo contrário, exactamente porque não deu como provados os efeitos da queda do muro, é que se compreende - entre outras razões - que tenha absolvido os Réus /Recorridos;
11.ª . Adicionalmente a ambiguidade ou obscuridade, a existir, teria de assumir uma gravidade tal que colocasse em completa contradição a fundamentação e a decisão, ou tornasse impossível alcançar o sentido da decisão, com base na fundamentação apresentada: ora manifestamente não é o caso da sentença que os Recorrentes colocam em crise;
12.ª. Não se encontra assim preenchido o âmbito de aplicação do art.º 615.º a: o 1 c) do CPC, pelo que não deverá ser considerada nula a sentença proferida nos presentes autos;
13.ª Adicionalmente também não se consegue compreender a decorrência lógica que os Apelantes afirmam existir entre os factos provados e o não provado;
14.ª Afirmam os Recorrentes que “não é necessário possuir-se conhecimentos técnicos na área da construção e da engenharia civil, para se ter conhecimento que, a queda de um qualquer muro, ao deixar a base do mesmo exposta, provoca no solo fissuras e tendas" - cfr. pag. 11 das doutas alegações de recurso apresentadas pelos Apelantes;
15.ª Ora a afirmação em causa é falaciosa, dado que em momento algum o douto tribunal deu como provado que a queda do muro "deixou a base do mesmo exposta"; apenas foi dado como provado que "ruiu e caiu parte do muro indicado em 21, numa extensão de cerca de 1,00 metros, situada sobre a fracção “D”” - cfr. facto provado 22;
16.ª Pelo que a decorrência “lógica” dos Recorrentes se encontra desde logo prejudicada;
17.ª Mas ainda que tal não fosse, a queda de um muro pode não deixar exposta a base no qual está assente, dependerá do modo e condições em que ruir: não é difícil admitir uma situação em que apenas o restante muro seja afectado em nada prejudicando a base de sustentação do mesmo;
18.ª A queda do muro não implica assim, por si só, que a base em que assenta fique exposta;
19.ª Aliás, a posição do douto tribunal está em perfeita sintonia com a conclusão do relatório pericial na resposta 2;
20.ª Portanto, mesmo para quem tem "conhecimentos técnicos na área da construção e da engenharia civil", conforme afirmam os Recorrentes, a conclusão é idêntica à do douto tribunal;
21.ª Deste modo, não só não se encontra preenchido o âmbito de aplicação do art.º 615. º nº 1 c) do CPC como a ilação que os Apelantes pretendem extrair dos factos dados como provados em 19, 20, 21, 22 e 23 não permite dar como provado o facto não provado em 3, termos em que não deverá ser considerada nula a douta sentença;
22.ª Os Recorrentes pretendem ainda pelo presente recurso impugnar a decisão sobre a matéria de facto;
23.ª Sucede que os Recorrentes não especificaram, concretamente; para cada um dos factos que impugnam os meios de prova que determinariam uma decisão diversa conforme impunha o art.º 640º do CPC;
24.ª Pelo contrário os Recorrentes e1encam a totalidade da factualidade que impugnam e de seguida apresentam transcrições - em alguns casos da quase totalidade dos depoimentos, como por exemplo para as testemunhas BB e HH - sem especificar que parte pretendem que suporte decisão diversa para cada um dos factos;
25.ª Os Recorrentes deixam assim à discrcionariedede do douto Tribunal da Relação, fazer a selecção das passagens relevantes para cada um dos factos impugnados - ónus que era da responsabilidade dos Recorrentes nos termos do nº 2 do artº 640º do CPC;
26.ª Deste modo deverá entender-se que os Recorrentes não deram cumprimento ao ónus que se lhe impunha devendo, consequentemente, o recurso ser rejeitado quanto à apreciação da matéria de facto;
27.ª Caso assim não se entende, hipótese que se equaciona por mero dever de patrocínio; ainda assim a matéria de facto não deverá ser alterada;
28.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como não provado o facto 30 da matéria de facto provada, contudo não deverá ser dado provimento à impugnação dos Recorrentes com base no depoimento prestado pelas testemunhas BB, HH, AL e RR;
29.ª Todos os citados depoimentos são coincidentes com a factualidade dada como provada no ponto 31 com a qual os Recorrentes concordaram: o centro comercial no qual a fracção “C7” se inseria; estava sem clientela há mais de 10 anos;
30.ª Deste modo, a apreciação que o douto tribunal fez do facto em causa, foi correcta e plenamente suportada pela prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento, não assistindo assim razão aos Recorrentes;
31.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 1 da matéria de facto não provada, contudo não tem qualquer fundamento a impugnação apresentada;
32.ª Antes de mais não ficou provado que o fundo Recorrido tenha alguma vez realizado obras no terraço ou no muro que terá desabado conforme resulta dos depoimentos prestados pelas testemunhas RR, MM e PP;
33.ª A única obra realizada foi na própria fracção "D", pelo "Banco Q, S.A. " - actualmente o "Banco Q, S.A. " - na qualidade de arrendatário, e somente em 2015 ou seja em data posterior ao desabamento do muro que os Recorrentes colocam em 2011;
34.ª Sendo que os Recorrentes não conseguiram determinar sequer a data da queda do muro - ónus que lhes competia - conforme resulta do facto provado em 22;
35.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 2 da matéria de facto não provada, contudo não tendo sido demonstrado que o Recorrido realizou obras, inevitavelmente, não poderia ter sido dado como provado que as mesmas haviam sido realizadas sem o consentimento do condomínio;
36.ª Portanto também no que concerne a este ponto não deverá ser dado provimento à impugnação dos Recorrentes;
37.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 3 da matéria de facto não provada, contudo a impugnação encontra-se em manifesta contradição com o constante do relatório pericial (ponto 2º') que o tribunal entendeu valorar, o qual se encontra fundamentado e não merece qualquer juízo de censura;
38.ª Ou seja, com base no relatório pericial não foi possível dar como provada a fatualidade que os Recorrentes impugnam nem estes apresentaram elementos adicioneis que pudessem contrariar as conclusões do relatório pericial, pelo que não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
39.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 4 da matéria de facto, contudo a posição dos Recorrentes encontra-se em contradição com o relatório pericial (ponto 4º), e com o depoimento da testemunha, MM;
40.ª Deste modo não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
41.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 5 da matéria de facto não provada, contudo a impugnação apresentada encontra-se em contradição com a prova produzida, concretamente, o depoimento da testemunha MM e o relatório pericial (ponto 6º) que concluiu que a humidade existente na fracção “C7”' resultava de fenómenos de condensação, natural numa loja que se encontrava encerrada há já vários anos;
42.ª Adicionalmente, as manchas de humidade foram qualificadas pelos peritos de "superficiais"; realidade que não é compatível com a descrição de água a escorrer abundantemente de paredes e tectos alegada pelos Recorrentes;
43.ª Deste modo não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
44.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 6 da matéria de facto não provada, contudo a impugnação encontra-se me contradição com o relatório pericial (pontos 7º, 8º e 9º) e o depoimento da testemunha MM;
45.ª A realidade presenciada pelos peritos não se coaduna com os factos alegados pelos Recorrentes de existir água a escorrer das paredes, ou seja, com base no relatório pericial não foi possível dar como provada a factualidade que os Recorrentes impugnam;
46.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 7 da matéria de facto não provada, contudo com base no relatório pericial (ponto 11º), o mesmo não podia ter sido qualificado de modo diferente;
47.ª No entender dos peritos, a utilização normal da loja seria suficiente para atenuar a condensação e anular os problemas de que padece, ou seja, não existem quaisquer limitações ao uso económico da fracção;
48.ª É exactamente a falta de uso da loja que causa os problemas de condensação de que padece e não o contrário;
49.ª Mais, não se compreende de que modo os Recorrentes podem afirmar que ficaram impedidos de rentabilizar a loja por via da cessão da exploração a terceiros mediante uma renda mensal de € 500,00 quando se demonstrou e foi dado como provado - cfr. facto provado 31 - que o centro comercial na qual esta se insere, se encontra encerrado por falta de clientela há mais de dez anos;
50.ª Face às condicionantes do Centro Comercial, e ao facto de a quase totalidade das lojas se encontrar encerrada, as afirmações dos Recorrentes são irrealistas - e contrariadas pela factualidade dada como provada e pelo relatório dos peritos. Deste modo não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
51.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 8 da matéria de facto não provada, contudo em momento algum foi dado como provado que o fundo Recorrente fosse o autor das obras de que, alegadamente, teria resultado a queda muro - nem sequer foi dado como provado que tais obras tivessem existido;
52.ª Ou seja, não existe qualquer elemento nos autos que permita concluir que a actuação do fundo Recorrido esteve na origem de factos que obrigassem à substituição dos tectos falsos e paredes da fracção “C7'';
53.ª Nenhuma das testemunhas inquiridas atribuiu a autoria de tais obras ao fundo Recorrido;
54.ª Ainda mais quando, como supra se demonstrou, os problemas de que padece a fracção em causa resultam de fenómenos de condensação, resultantes da falta de uso da mesma;
55.ª Deste modo não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
56.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 9 da matéria de facto não provada, contudo também este facto não poderia ter sido dado como provado face ao relatório pericial apresentado pelos peritos (ponto 14º);
57.ª Os peritos não conseguiram apurar quais as reparações que seria necessário realizar sem que fosse feita uma análise mais complexa - o que os Recorrentes também não demonstraram ter feito para suportar as suas alegações em apresentaram quaisquer outros elementos;
58.ª Pelo que também quanto a este ponto, não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
59.ª Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 10 da matéria de facto não provada, contudo o valor apresentado por estes para as reparações encontram-se em manifesta contradição com o relatório pericial (ponto 19º), que apresenta um valor manifestamente mais baixo;
60.ª O único elemento apresentado pelos Recorrentes para provar este facto foi um orçamento de teor genérico e inconclusivo;
61.ª Pelo que também quanto a este ponto, não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
62.ª. Os Recorrentes pretendem que seja dado como provado o facto 11 da matéria de facto não provada, contudo não apresentam quaisquer elementos que demonstrem a existência de danos morais;
63.ª Adicionalmente não podem os Recorrentes pretender obter, em simultâneo, a prova deste facto e do facto não provado 14, dada a sua incompatibilidade: não podem os Recorrentes querer imputar os danos morais pelos mesmos factos a dois Réus/Recorridos distintos;
64.ª Pelo que também quanto a este ponto, não poderia a douta sentença ter dado como provado o referido facto;
65.ª Defendem ainda os Apelantes que a douta sentença teria feito uma incorrecta interpretação do disposto no art. 492º, nº 1 do Código Civil;
66.ª Entendem os Recorrentes que se deveria ter dado como provada a autoria das obras por parte do fundo e consequentemente deveria o mesmo ter sido condenado nos termos do artº 492º do CC;
67.ª Para que se encontre preenchido o âmbito de aplicação do artº 492º nº 1 do CC, no caso dos presentes autos, seria necessário demonstrar que o muro havia ruido, em consequência de obra realizada pelo aqui Recorrido;
68.ª Ora dada a factualidade dada como provada, não ficou demonstrado que o fundo Recorrido tivesse tido feito alguma intervenção no terraço;
69.ª Aliás não só não ficou provada a autoria da obra como a existência da própria obra em si não foi dada como provada;
00.ª Pelo que não se encontra preenchido o pressuposto para a responsabilidade consagrada no art. º 492.º: a realização de obras;
71.ª Adicionalmente, as poucas testemunhas que alinharam terem existido tais obras, nunca as imputaram ao fundo Recorrido, conforme se afirma na douta sentença.
*
A Ré Fundação W apresentou contra alegações pugnando pela improcedência do recurso, concluindo que a decisão recorrida não merece qualquer reparo, já que a mesma resultou de uma exaustiva produção de prova, incluindo inspeção ao local, tendo o MM Juiz a quo, feito uma valoração criteriosa e prudente das provas produzidas, incluindo as provas documentais trazidas pelas partes.
Resulta das Doutas Alegações dos recorrentes que a sentença seria nula por existir contradição entre a matéria de facto provada e não provada, deixando à consideração do Douto Tribunal da Relação a seleção das passagens relevantes para cada um dos factos impugnados, ónus que lhe caberia nos termos do disposto no artº 640 nº2 do CPC.
*
O Réu CONDOMÍNIO DO PRÉDIO URBANO SITO NA AVENIDA …, VILA REAL, apresentou contra-alegações onde pugna pela improcedência do recurso concluindo: 1. Estando as alegações do Recorrente delimitadas pelas conclusões, nos termos do disposto no artigo 639.º do CPC, o Recorrido limitar-se-á a responder às mesmas.
2. Nas conclusões, os Recorrentes vêm invocar a nulidade da sentença, nos termos do disposto na alínea c) n.º 1 do artigo 615.º do CPC, ou seja, por entenderem que a matéria de facto provada e não provada se encontra em contradição.
3. Para tanto, alegam que, ao considerar-se provada a queda do muro que se encontrava edificado sobre a laje do terraço, não poderia considerar de se considerar provado que tal ocorrência provocou a abertura de fendas e fissuras no piso e na laje do terraço.
4. Desde logo, o facto de não se ter considerado provado o facto não provado sob o número 3 – “a queda do muro implicou a abertura de fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço” – não implica uma contradição entre os fundamentos e a decisão, sendo completamente irrelevante para a decisão.
5. Por outro lado, e com todo o respeito, não se verifica a alegada contradição.
Vejamos,
6. O Tribunal “a quo” considerou como provado que “Em data não concretamente apurada, ruiu e caiu parte do muro indicado em 21, numa extensão de cerca de 15,00 metros, situada sobre a fração D”.
7. E considerou, ainda, como provado, que “a cobertura do terraço referido em 20 (terraço com a área de 415 m2, o qual, além da fração D, serve de cobertura de outras frações autónomas dos prédios descritos sob os n.ºs 222 e 888) apresentasse exposta ao vento, sol, chuva, água e demais condições climatéricas”.
8. O Tribunal “a quo” em momento algum considerou como provado que “a base do muro ficou exposta”.
9. Tal não é, não só, consequência necessária da queda do muro, pois um muro pode cair sem afetar a base do mesmo, como também, o Relatório Pericial é perentório em referir que “não foram percecionadas fendas nem fissuras na zona onde existia o muro”.
10. Em conclusão, não se verifica a nulidade invocada, pelo que deve a mesma improceder.
11. Prosseguindo, os Recorrentes impugnam a matéria de facto, pugnando pela sua alteração e consequente decisão diversa da recorrida.
12. A esse propósito, estatui o artigo 640.º n.º 1, b) do CPC que “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição (...) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de fato impugnados diversa da recorrida”.
13. Acrescenta o n.º 2 do mesmo preceito legal:
2 – “No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”.
14. Ora, da leitura das alegações dos Recorrentes, constata-se, por demais evidente, que estes não cumpriram com o ónus que se lhe impunha, não especificando, para cada um dos factos que impugnam, os meios de prova em concreto - e, no caso da prova gravada, a indicação com exatidão das passagens em que se funda – que impunham decisão diversa da recorrida.
15. Efetivamente, os Recorrentes limitam-se a transcrever depoimentos, sem concretizar que parte em concreto entendem que impõe uma decisão diversa para cada um dos fatos.
16. Em consequência, deve o recurso ser rejeitado quanto à apreciação da matéria de facto.
17. Sem prescindir, por mera cautela de patrocínio, sempre se entende que a impugnação da matéria de facto deverá improceder. Vejamos,
18. Em concreto, os Recorrentes entendem que deveriam ter sido considerados provados os factos não provados sob os números 1 a 14, (…).
19. E, ainda, como não provado a matéria de fato constante do ponto 30 da matéria de fato provada(…)
20. Contrariamente ao entendimento dos Recorrentes, a decisão do Tribunal “a quo”, no que a aqui Recorrida interessa - nomeadamente, os factos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 13 e 14 da matéria não provada, e do facto 30 da matéria de fato provada - não merece o mínimo reparo, devendo manter-se na íntegra.
21. Na douta sentença recorrida, para a qual aqui se remete, o Tribunal “a quo sustentou de forma clara e inequívoca a sua decisão sobre a matéria de facto, fundamentando-se na prova produzida (testemunhal, documental e pericial) que, em concreto, determinou cada uma das respostas à matéria de fato, aliada às regras da experiência comum.
22. Vejamos a fundamentação da sentença recorrida (…)
23. Conforme consta da douta sentença, as testemunhas foram unânimes em afirmar que o estabelecimento dos AA. se encontrava encerrado há bastante tempo (em momento muito anterior à alegada ocorrência de infiltrações), o que não pode ser desassociado do estado de paralisação da atividade comercial do Centro Comercial Y, onde se integra a fração.
24. Dos depoimentos transcritos pelos Recorrentes conclui-se a mesma factualidade.
25. A testemunha BB refere por diversas vezes que quando começou a haver infiltrações, a loja já não se encontrava arrendada, acrescentando “mas, nessa altura (infiltrações), eu tenho quase a certeza que já não estava alugado”.
26. Facto que é confirmado pela testemunha HH.
27. A testemunha AL confirmou essa factualidade, afirmando:
Advogado: E a partir dessa data (2004) nunca mais esteve arrendada a loja?
Testemunha: Eu penso que teve, foi um ano ou dois. Se teve, o Centro Comercial Y fechou, eu também tive lá uma loja nessa altura, portanto fechou e como as pessoas começaram a sair eu também nunca mais fui para o Centro Comercial Y.
28. O depoimento desta testemunha tem total correspondência com a matéria provada no ponto 31 “Desde há mais de 10 anos que o Centro Comercial Y, onde se integra a fração C7, apresenta quase todas as lojas encerradas, por falta de clientela”.
29. Em relação ao fato não provado sob o ponto 3 – “A queda do muro implicou a abertura das fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço”, o Tribunal “a quo”, muito bem, deu relevância ao relatório pericial e respetivos esclarecimentos, no qual, os senhores peritos esclareceram que não percecionaram fendas nem fissuras na zona onde existia o muro.
30. Acresce que as testemunhas nada afirmaram que pudesse contrariar a posição dos senhores Peritos.
31. Em conformidade, o Tribunal “a quo” só poderia considerar esse fato como não provado.
32. No que respeita aos fatos n.º 4, 5, 6, 7 e 8, os alegados danos na fração dos AA., os Senhores Peritos afirmaram o seguinte:

• “Não podem atestar uma relação direta da queda do muro com eventuais infiltrações que tenham ocorrido na fração dos AA”.
• “Pela aparência das manifestações e pela perceção local de um ambiente consideravelmente saturado, a principal causa aparenta ser a condensação superficial”.
• “Não foi possível verificar quaisquer vestígios de água no interior da fração “D” do 1.º R Banco”.
• “Não se verificou a existência do referido escorrimento de água, quer no teto, quer nas paredes adjacentes”.
• “Foi, no entanto, possível visualizar a presença de manchas superficiais, fungos e deterioração de tinta, cuja causa principal se atribui a fenómenos de condensação superficial”.
• Não se verificou a existência de indícios de que o pavimento da fração C7 ficou, como fica, inundado.
• Não se verificou a existência de indícios de que a água da chuva se infiltrou, como se infiltra, por toda a instalação elétrica, com risco de curto circuito”.
• O fato de o espaço se encontrar fechado origina um défice de ventilação e uma temperatura ambiente interior reduzida, potenciando os referidos fenómenos. Uma eventual utilização do espaço proporciona em condições normais a atenuação da condensação superficial pelas razões apresentadas, permitindo ser destinada à atividade para a qual cesta licenciada.
• Por último, em relação à necessidade de substituição dos tetos falsos e paredes no café, os Senhores Peritos afirmaram que, para se concluir por tal afirmação, era necessário fazer um ensaio destrutivo, o que não foi requerido pelos AA.
33. Em relação a todos os pontos da matéria de fato em apreciação o Tribunal “a quo, muito bem, referiu: (…)
“Porém, no que tange à identificação dos danos apresentados pela fracção “C7” encontrámos alguma controvérsia, pois as testemunhas BB e HH asseveraram que esse imóvel apresentava sinais de grande presença de água nas paredes e no tecto, o que trouxe danos de grande monta, o que relacionaram com a queda do muro situado no referido terraço, mas a verdade é que não apenas os relatos destes intervenientes se revelaram vagos e imprecisos quanto à identificação do estado de coisas existente na fracção “C7” e provêem de colaboradores de uma sociedade pertencente ao autor, como também são dissonantes da realidade que os Srs. Peritos percepcionaram na fracção “C7” aquando da inspecção que efectuaram (não são perceptíveis danos de tal magnitude, como estes deram nota no laudo, o qual fizeram acompanhar de diversas fotografias ilustrativas das conclusões que verteram no relatório – cfr. fls. 425 e 426) e não foram acompanhados por qualquer outro meio de prova que os corroborasse (por exemplo, fotografias que atestassem o propalado estado de degradação), salvo o orçamento de fls. 72, cujo teor genérico é inconclusivo quanto à realidade apreendida pela pessoa que o elaborou (v.g. a testemunha FF, o qual também indicou não se recordar do estado de coisas que verificou quando se deslocou à fracção “C7”), para além de que, pelos motivos aventados no relatório pericial, não se revela possível determinar as causas da queda do muro (os Srs. Peritos equacionam diversas hipóteses alternativas, sem lograrem dar prevalência a uma delas), ou se a ruína deste originou infiltrações de águas pluviais na fracção “C7” (os Srs. Peritos salientam apenas terem constatado indícios de condensação, mas já não de humidadesresultantes de infiltrações).”
34. Em conformidade com o exposto, não poderia a douta sentença ter dado os factos como provados.
35. Prosseguindo, quanto ao ponto 10.º, os Senhores Peritos estimaram que, para a substituição do teto falso e a pintura adequada de todas as superfícies importaria o custo de € 2.800,00, valor muito inferior aos € 9.600,00 constante do documento apresentados pelos AA.
36. No entanto, e conforme acima referido, os Senhores Peritos não confirmaram tais danos, nem, consequentemente, a necessidade de realizar tais obras de reparação.
37. Diga-se que os Autores não provaram que, em momento anterior à presente ação, deram conhecimento à Recorrida da existência das alegadas infiltrações e danos.
38. Em relação aos artigos 13.º e 14.º dos fatos não provados, não foi feita qualquer prova sobre as causas da queda do muro, nem dos alegados danos morais articulados.
39. Efetivamente, os Autores atribuem a queda do muro a vários fatores, distintos entre si, ora a obras efetuadas pelo Réu fundo, ora à falta de manutenção pela Ré Fundação W ou pela aqui Recorrida.
40. Das causas avançadas pelos Senhores Peritos, e, todas elas, especulativas, em nenhum momento é referida a falta de manutenção.
41. Pelo contrário, os Senhores Peritos afirmaram que a colocação de aparelhos de ar condicionado pelos Autores na face exterior do muro, o que aconteceu, conforme depoimento da testemunha LL, provoca esforços nesse elemento construtivo, contribuindo para a sua rotação no sentido exterior e, quando associado ao facto de o muro se encontrar parcialmente apoiado em consola sobre a laje inferior, qualquer esforço incidente no muro nesse sentido terá mais impacto sobre uma eventual rotação do mesmo.
42. Acresce ainda que, em relação à aqui Recorrida, os Senhores Peritos confirmaram que o terraço em causa nos autos é, ainda, cobertura de frações pertencentes ao prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Avenida … (Hotel Y), e,
43. O prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Avenida …, Vila Real encontra-se integrado num conjunto de edifícios conhecido por “Complexo Y”, em que diferentes prédios constituídos em propriedade horizontal estão interligados entre si ao nível das caves, do rés-do-chão e dos terraços do 1.o Andar.
44. No que aos terraços diz respeito, a interligação caracteriza-se pela existência de terraços amplos, mas integrados em termos de área a várias propriedades horizontais, e sem divisão física (através de um muro, por exemplo) de acordo com a sua afectação a cada uma das propriedades horizontais em que cada parte se insere.
45. No caso do terraço onde ruiu e caiu o muro em causa nos autos, do mesmo apenas a parte correspondente a sessenta e seis metros quadrados, que se encontra afecta ao uso exclusivo da Fracção E – Três – Escritório D, da propriedade do 2.o Réu, pertence à propriedade horizontal da aqui Recorrida.
46. Toda a demais área do terraço pertence ao seguintes prédios urbanos:
• A área de dezoito metros quadrados está destinada ao uso exclusivo da Fracção G, Escritório A, sito no 1.o andar direito do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Avenida ….
• A área de nove metros quadrados está destinada ao uso exclusivo da Fracção H, Escritório B, sito no 1.o andar direito do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Avenida ….
• A área de duzentos metros quadrados está integrada no primeiro andar da Torre A (Hotel Y), o qual é composto por terraço com a área 16/20 de duzentos metros quadrados, zona coberta destinada a sala de estar, sala de pequenos almoços, cozinha, copa e zona de economato, com a área de trezentos metros quadrados.
47. Todas as fracções acima referidas têm acesso independente ao terraço.
48. Atento o exposto, e sem prescindir de tudo o acima alegado, nunca poderia ser a aqui Recorrida condenada a indemnizar quaisquer danos, pois a maioria da área do terraço não se encontra da sua propriedade horizontal, não tendo sido demonstrado que a área do terraço onde se situa o muro que ruiu se enquadra nos 66m2 que dela fazem parte, por um lado, e, por outro, o terraço serve de cobertura a frações integradas em outras propriedades horizontais que não da Recorrida.
49. Em conclusão, a douta sentença recorrida deve manter-se nos exatos termos, também no que respeita à decisão sobre a matéria de facto, improcedendo o recurso dos Autores.
50. Por fim, os Recorrentes alegam que o Tribunal “a quo” fez uma errada interpretação aplicação do direito, nomeadamente, dos artigos 492.º e 1421.º n.º 1, b) do CC.
51. Desde logo, conforme já referido, os AA. não lograram demonstrar e provar que a área do terraço onde se situa o muro que ruiu se enquadra nos 66m2 que dela fazem parte, por um lado,
52. e, por outro, resultou provado que o terraço serve de cobertura a frações integradas em outras propriedades horizontais que não da Recorrida.
53. Tal terraço é parte comum dos seguintes prédios, nas seguintes proporções:
A) A parte correspondente a sessenta e seis metros quadrados, que se encontra afecta ao uso exclusivo da Fracção E – Três – Escritório D, da propriedade do 2.o Réu, pertence à propriedade horizontal da aqui Recorrida.
B) A área de dezoito metros quadrados está destinada ao uso exclusivo da Fracção G, Escritório A, sito no 1.o andar direito do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Avenida ….
C) A área de nove metros quadrados está destinada ao uso exclusivo da Fracção H, Escritório B, sito no 1.o andar direito do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Avenida ….
D) A área de duzentos metros quadrados está integrada no primeiro andar da Torre A (Hotel Y), o qual é composto por terraço com a área de duzentos metros quadrados, zona coberta destinada a sala de estar, sala de pequenos almoços, cozinha, copa e zona de economato, com a área de trezentos metros quadrados.
54. Resultou provado que todas as frações têm acesso ao terraço, que é, ainda, cobertura de frações pertencentes ao prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na Avenida 1… e Bloco A (Hotel Y).
55. Ora, não tendo os Recorrentes alegado e provado que a parte do terraço onde o muro ruiu se integra na área de 66 m2 afetos à propriedade horizontal da Recorrida, nunca poderia a mesma ser condenada nos presentes autos.
56. Os Recorrentes não provaram que em algum momento, anterior à citação dos presentes autos, tivessem dado conhecimento à Recorrida dos alegados danos que aqui vieram invocar.
57. Do relatório pericial não consta como causa provável da queda do muro um defeito de construção ou defeito de conservação.
58. E, se houve defeito de construção, a Recorrida não realizou quaisquer obras.
59. Aliás, foram os próprios Autores quem colocou aparelhos de ar condicionado na parte exterior do muro, facto que, segundo os peritos, contribuiu para a sua queda.
60. Acresce que os alegados danos na fração não foram provocados por alegadas infiltrações, mas pela condensação.``
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O Tribunal a quo sustenta (cfr fls 651)), nenhuma concreta nulidade ter sido cometida não ocorrendo incoerência intrínseca da decisão proferida com a fundamentação em que se suporta sendo que o que o recorrente evidencia é a sua discordância com o sentido da decisão, o que constitui fundamento do recurso em si.
*
Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.
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II. OBJETO DO RECURSO

Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Assim, as questões a decidir são as seguintes:
1ª - Da nulidade da sentença;

2º Questão prévia da falta de indicação da prova em que se fundamenta o erro, facto por facto, e de análise crítica da mesma e se seria de alterar a decisão da matéria de facto fixada pelo Tribunal a quo quanto aos pontos mencionados pelos recorrentes: referentes ao “facto provado” nº 30 e aos “factos não provados” nºs 1 a 14.
3ª – Se se encontram preenchidos os pressupostos de responsabilidade civil extracontratual do proprietário, do possuidor da obra que ruiu e do obrigado a conservar o edifício.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
III. A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Assim, são os seguintes os factos provados, com relevância para a decisão:

1. A propriedade horizontal relativa ao prédio urbano sito na freguesia e concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 222, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1111.º (anteriormente inscrito na matriz predial urbana da freguesia de S… sob o artigo 333.º), foi constituída por escritura pública outorgada em 18/06/1982, no Cartório Notarial (constante de fls. 38-57, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) – cfr. art. 8.º a 10.º da p.i.;
2. Na escritura pública de 18/06/1982 consta, no que ora releva (cfr. art. 8.º a 10.º, 16.º e 19.º da p.i.):
“(…) o Bloco A é constituído por três caves, rés-do-chão e doze andares, é coberto com um terraço encimado por chapas de fibrocimento, é servido por escadas e dois elevadores comuns a partir do rés-do-chão até ao décimo segundo andar, tendo ainda um outro ascensor tipo monta cargas que funciona a partir da primeira cave ao rés-do-chão, dando, portanto, serventia a todas as caves, a seguir discriminados: (…) Terceira Cave – destina-se a comércio conforme fracções e respectivas áreas a seguir discriminadas: (…) Fracção C – Sete – Loja número … com a área de sessenta metros quadrados. Atribui a esta fracção o valor de cem mil escudos a que corresponde cinco por mil do valor total do Bloco (…) Rés-do-chão – destina-se a comércio e tem uma única fracção como segue: Fracção D: Um amplo salão com quinhentos e cinquenta metros quadrados, estando incluída nesta área quatro quartos de banho, com dois metros quadrados cada um e um hall com sete metros quadrados. Atribui a esta fracção o valor de seiscentos e cinquenta mil escudos a que corresponde trinta e dois, vírgula cinquenta por mil do valor total do Bloco (…) Primeiro Andar – destina-se a escritórios como a seguir se discriminam: (…) Fracção E-Três – Escritório D – composto por um hall com dez metros quadrados, dois quartos de banho com as áreas respectivas de três e dois metros quadrados, por quatro salas com as áreas respectivas de quinze, doze, quinze e doze metros quadrados, por um corredor com quatro metros quadrados, e por um terraço com sessenta e seis metros quadrados. Atribui a esta fracção o valor de quinhentos mil escudos a que corresponde vinte e cinco por mil do valor total do Bloco.”;
3. O direito de propriedade relativo à fracção autónoma designada por “C7”, integrante do prédio descrito sob o n.º 222, encontra-se registado a favor do autor (por compra a DC, Limitada), mediante a apresentação n.º 3 de 09/02/1983 – cfr. art. 1.º e 2.º da p.i;.
4. Na descrição predial relativa à fracção “C7” consta ser composta por uma loja, com o n.º …, e possuir uma área de 60 m2 – cfr. art. 1.º da p.i.;
5. Na matriz predial referente à fracção “C7” consta que esta se destina a comércio, possuindo o valor patrimonial de € 42.350,00, avaliado no ano de 2012 – cfr. art. 1.º da p.i.;
6. O direito de propriedade relativo à fracção autónoma designada por “D”, integrante do prédio descrito sob o n.º 222, encontra-se registado a favor do réu Fundo (por compra ao Banco Q e Comercial de Lisboa, Empresa Pública), mediante a apresentação n.º 11 de 15/12/1993 – cfr. art. 5.º e 6.º da p.i.;
7. A ré Fundação W consta na matriz predial como titular do rendimento relativo à fracção autónoma designada por “E-3”, integrante do prédio descrito sob o n.º 222 – cfr. art. 7.º da p.i. e 4.º da cont. de fls. 90-108;
8. A propriedade horizontal relativa ao prédio urbano sito na freguesia e concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 888, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 7777.º, foi constituída por escritura pública outorgada em 22/03/1984, no Cartório Notarial (constante de fls. 153-163, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) – cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108;
9. Na escritura pública de 22/03/1984 consta, no que ora releva (cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108):
“(…) o Bloco B foi construído em betão armado, tijolo e cal, tem a área de cento e setenta metros quadrados, é constituído por cave, rés-do-chão e cinco andares, é servido por escadas e dois elevadores comuns a partir do rés-do-chão até ao quinto andar e é coberto com um terraço encimado por chapas de fibrocimento, conforme as fracções a seguir discriminadas: (…) Primeiro Andar: O primeiro andar destina-se a escritórios conforme a seguinte discriminação: Fracção G – Escritório A, no primeiro andar direito, composto por hall com a área de doze vírgula quarenta e dois metros quadrados, comum ao escritório B da fracção H e por dois quartos de banho tendo cada uma a área de dois vírgula quarenta metros quadrados, também comuns ao escritório B da fracção H, e composto também por duas salas com as áreas respectivas de doze vírgula dezasseis metros quadrados e dez vírgula quarenta e quatro metros quadrados e por um terraço com a área de dezoito metros quadrados. Atribui a esta fracção o valor de duzentos, cinquenta mil escudos a que corresponde quatro vírgula nove por cento do valor total do prédio. Fracção H – Escritório B no primeiro andar direito, composto por duas salas com as áreas de dez vírgula oitenta e oito metros quadrados e nove metros quadrados, por um terraço com a área de nove metros quadrados e ainda por um hall com a área de doze vírgula quarenta e dois metros quadrados, comum ao escritório A da fracção G e por dois quartos de banho, cada um com a área de dois vírgula quarenta metros quadrados, também comuns ao escritório A da fracção G. Atribui a esta fracção o valor de duzentos, cinquenta mil escudos a que corresponde quatro, vírgula nove por cento do valor total do prédio”;
10. A propriedade horizontal relativa ao prédio urbano sito na freguesia e concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 999, foi constituída por escritura pública outorgada em 14/11/1997, no Cartório Notarial (constante de fls. 162-167, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) – cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108;
11. Na escritura pública de 14/11/1997 consta, no que releva para os presentes autos (cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108):
“(…) resolvem (…) constitui-lo em propriedade horizontal, ficando por isso as partes componentes de cada uma das fracções individualizadas pelas letras maiúsculas, as quais com as respectivas composições e percentagens, constam de uma relação organizada nos termos do número dois do artigo sessenta e quatro do Código do Notariado, que também arquivo (…) são comuns as partes do prédio indicadas no artigo mil quatrocentos vinte e um daquele Código, sem prejuízo das particularidades das partes comuns da mencionada relação de bens”.
12. À escritura pública de 14/11/1997 foi anexa uma certidão (constante de fls. 168-100, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), e na qual consta, no que agora releva (cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108):
“Descrição do Prédio: O prédio urbano (…) designado por Torre A (…) composto por três caves, rés-do-chão e doze andares, destinado a indústria hoteleira e tem a seguinte descrição (…) primeiro andar, composto por terraço com a área de duzentos metros quadrados, zona coberta destinada a sala de estar, sala de pequenos- almoços, cozinha, copa e zona de economato, com a área de trezentos metros quadrados”;
13. Na relação anexa à escritura pública de 14/11/1997 consta, no que ora releva (cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108):
“(…) Rés-do-chão, constituído por zona destinada à recepção, bar, copa, gabinete e quarto de banho, com a área de 300 m2, um terraço com a área de cento e noventa metros quadrados, uma galeria coberta, nas traseiras com a área de vinte e um metros quadrados e um átrio com a área de cento e doze metros quadrados (…) primeiro andar, composto por terraço com a área de duzentos metros quadrados, zona coberta destinada a sala de estar, sala de pequenos almoços, cozinha, copa e zona economato, com a área de trezentos metros quadrado (…)”;
14. A ré Fundação W é uma pessoa coletiva de direito privado, de utilidade pública, dispondo para a prossecução das suas atribuição de várias agências, localizadas em diversos pontos de Portugal, entre as quais se conta a agência a funcionar na fracção “E3” – cfr. art. 7.º da p.i. e 1.º e 2.º da cont. de fls. 90-108;
15. O direito de propriedade relativo às frações autónomas designadas por “G” e “H”, integrantes do prédio descrito sob o n.º 888, encontra-se registado a favor do chamado António (por doação efetuada por SR, CR e António), mediante a apresentação n.º 2818 de 20/01/2014 - cfr. art. 6.º da cont. de fls. 231-233;
16. Mediante documento datado de 01/06/2001, o chamado António e a esposa LC (nas qualidades de usufrutuários), SR, CR e António (nas qualidades de proprietários), deram de arrendamento à chamada Ordem dos Engenheiros, pelo período inicial de 5 anos, com início naquela data, para fins não habitacionais, as fracções “G” e “H”, mediante a remuneração mensal de cem mil escudos - cfr. art. 6.º da cont. de fls. 231-233;
17. O direito de propriedade relativo ao prédio descrito sob o n.º 69 encontra-se registado a favor da chamada AGC, Lda. (por compra a NM e esposa CM), mediante a apresentação n.º 25 de 02/03/1988 – cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108;
18. O autor tem equipado e instalado um estabelecimento de café e snack-bar na fracção “C7”, de cujo recheio fazem parte, designadamente, o mobiliário de mesas e cadeiras, banca frigorífica e máquina de café – cfr. art. 13.º e 14.º da p.i.;
19. Por cima da fracção “C7” está construída a fracção “D” – cfr. art. 17.º da p.i.;
20. Por cima da fracção “D” encontra-se um terraço, com uma área de cerca de 415 m2, o qual, além daquela, serve de cobertura de outras fracções autónomas dos prédios descritos sob os n.ºs 222 e 888 – cfr. art. 18.º, 23.º e 24.º da p.i., 36.º da cont. de fls. 90-108, 5.º e 11.º a 14.º da cont. de fls. 138-151;
21. (…) localizando-se, do lado sul desse terraço, um muro em tijolo e vigas de ferro rebocado a cimento, assente na laje – cfr. art. 20.º e 21.º da p.i.;
22. Em data não concretamente apurada, ruiu e caiu parte do muro indicado em 21, numa extensão de cerca de 15,00 metros, situada sobre a fracção “D” – cfr. art. 21.º, e 33.º da p.i.;
23. A cobertura do terraço referido em 20 apresenta-se exposta ao vento, sol, chuva, água e demais condições climatéricas – cfr. art. 35.º da p.i.;
24. As fracções “E3”, “G” e “H” e o prédio descrito sob o n.º 69 dispõem de acesso ao terraço indicado em 20 – cfr. art. 8.º da cont. de fls. 90-108;
25. No terraço identificado em 20 localiza-se uma casa das máquinas, referente aos ascensores – cfr. art. 11.º da cont. de fls. 90-108;
26. O terraço indicado em 20 não se encontra dividido, não sendo perceptíveis quais as áreas correspondentes às fracções “E3”, “G” e “H” – cfr. art. 12.º da cont. de fls. 90-108;
27. Antes da instauração da acção o autor não interpelou a ré Fundação W para lhe dar conhecimento dos danos que invoca e para estes serem cessados – cfr. art. 18.º da cont. de fls. 90-108;
28. O autor não procedeu à realização de reparações no terraço – cfr. art. 25.º da cont. de fls. 90-108;
29. A zona indicada em 22 encontra-se nas imediações das fracções “G” e “H” e do prédio descrito sob o n.º 999 – cfr. art. 35.º da cont. de fls. 90-108;
30. O estabelecimento comercial de café e snack-bar existente na fracção “C7” encontra-se encerrado, pelo menos em data anterior ao ano de 2011, devido à falta de interessados no seu arrendamento – cfr. art. 20.º, 21.º e 50.º da cont. de fls. 138-151;
31. Desde há mais de 10 anos que o Centro Comercial Y, onde se integra a fracção “C7”, apresenta quase todas as lojas encerradas, por falta de clientela – cfr. art. 51.º a 53.º da cont. de fls. 138-151;
32. O acesso do prédio descrito sob o n.º 999 ao terraço é realizado por uma porta em vidro, a qual se encontra encerrada a parafusos – cfr. art. 4.º e 5.º da cont. de fls. 215-217;
33. O acesso das fracções “G” e “H” ao terraço dispõe de grades de ferro – cfr. art. 8.º da cont. de fls. 215-217;
34. A delegação, da chamada Ordem dos Engenheiros, sita nas fracções “G” e “H”, apenas abre poucas horas por dia – cfr. art. 9.º da cont. de fls. 215-217.
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Matéria de Facto não provada:

1. Em data anterior a 02/05/2011 o réu Fundo fez obras no terraço identificado em 20 dos factos provados, levantando o revestimento da laje em cimento do terraço e aplicando uma tela por cima daquela laje, e, sobre ela, colocou tijoleira suspensa em suportes de metal como revestimento, assim tendo formado uma caixa-de-ar entre a tela e a laje e a tijoleira de revestimento do terraço, tendo ainda colocado uma tela sobre o muro do terraço, sem que este fosse escorado ou travado – cfr. art. 26.º a 32.º da p.i.;
2. (…) as quais não foram consentidas pelos condóminos do prédio descrito sob o n.º 222 – cfr. art. 51.º e 52.º da p.i.;
3. A queda do muro implicou a abertura das fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço – cfr. art. 34.º da p.i.;
4. Desde 02/05/2011 as águas pluviais que caíram e caem na cobertura do terraço entraram, como entram no edifício e infiltraram-se, como se infiltram, no interior da fracção “C7”, a qual ficou, por esse motivo, exposta ao vento, sol, chuva e demais condições climatéricas – cfr. art. 36.º e 37.º da p.i.;
5. (…) escorrendo abundantemente, como escorrem, as águas pluviais sobre o tecto da fracção “C7”, formando enormes goteiras, o que estragou a tinta do tecto, deixando em seu lugar manchas de humidade a toda a extensão do tecto – cfr. art. 15.º, 38.º a 41.º da p.i.;
6. (…) escorrendo, como escorrem, as águas pluviais sobre as paredes da fracção “C7”, com o que estragou a tinta das paredes, deixando em seu lugar manchas de humidade e ficando o pavimento inundado e infiltrando-se a água da chuva por toda a instalação eléctrica e com risco de curto-circuito – cfr. art. 15.º, 42.º a 48.º da p.i.;
7. (…) ficando a fracção “C7” impedida de ser destinada a qualquer actividade, designadamente, ao comércio, o que implicou que o autor tivesse ficado impedido de rentabilizar o imóvel através da cessão de exploração do estabelecimento a terceiros, mediante o pagamento de uma renda mensal que não seria inferior a € 500,00 – cfr. art. 49.º, 50.º, 00.º a 73.º da p.i.;
8. Como consequência directa e necessária da conduta do réu Fundo é necessário substituir os tectos falsos e paredes da fracção “C7”, precedida da remoção e demolição de tectos falsos, paredes e respectiva estrutura de suporte existentes, bem como a limpeza dos materiais demolidos – cfr. art. 56.º a 59.º da p.i.;
9. (…) o fornecimento e montagem de tectos falsos e paredes da fracção “C7”, incluindo todos os acessórios à sua boa execução, para depois se proceder à execução de pinturas interiores em toda a área do imóvel – cfr. art. 60.º e 61.º da p.i.;
10. (…) implicando a realização desses trabalhos um custo de € 9.600,00, acrescido de I.V.A., calculado à taxa legal em vigor – cfr. art. 62.º e 63.º da p.i.;
11. Com a conduta do réu Fundo o autor ficou e está triste, amargurado, envergonhado, constrangido, tem momentos de abatimento moral e psicológico, incómodos, arrelias, pressões nervosas, crises de choro e noites sem dormir – cfr. art. 82.º da p.i.;
12. A ruína do muro ficou a dever-se à falta de conservação e manutenção do terraço e do muro pela ré Fundação W, por aí não terem sido realizadas as obras necessárias para o efeito – cfr. art. 86.º a 88.º da p.i.;
13. A ruína do muro ficou a dever-se à falta de conservação e manutenção do terraço e do muro pelo réu Condomínio do n.º 00, por aí não terem sido realizadas as obras necessárias para o efeito – cfr. art. 92.º a 94.º e 105.º a 107.º da p.i.;
14. Com a conduta da ré Fundação W e do réu Condomínio do n.º 00 o autor ficou e está triste, amargurado, envergonhado, constrangido, tem momentos de abatimento moral e psicológico, incómodos, arrelias, pressões nervosas, crises de choro e noites sem dormir – cfr. art. 100.º e 118.º da p.i.;
15. Em meados de 2012 foi colocada uma tela e efectuados trabalhos de impermeabilização do terraço, o que impede a infiltração de águas pluviais que poderiam escorrer – cfr. art. 38.º da cont. de fls. 138-151;
16. O muro ruiu e caiu devido ao peso dos aparelhos de ar condicionado nele colocados pelo autor e pelo réu Fundo – cfr. art. 39.º da cont. de fls. 138-151.
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III. B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

1. DA NULIDADE DA SENTENÇA

Invocando os apelantes nulidade da sentença, tal questão é a que primeiro cumpre apreciar, pois que, contendendo com a validade da própria decisão, só se concluirmos pela sua validade se passa à apreciação das demais questões suscitadas, o que de outro modo fica prejudicado.
Sustentam verificar-se nulidade da sentença nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC por se ter dado como provado que, em data não concretamente apurada, ruiu e caiu parte do muro indicado em 21, numa extensão de cerca de 15,00 metros, situada sobre a fração “D” e que a cobertura do terraço referido em 20 apresenta-se exposta ao vento, Sol, chuva, água e demais condições climatéricas e, contudo, não se considerou provado que a queda do muro implicou a abertura das fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço, nem se considerou provado que a ruína do muro ficou a dever-se à falta de conservação e manutenção do terraço e do muro pela ré Fundação W ou pelo Condomínio do n.º 00, por aí não terem sido realizadas as obras necessárias para o efeito. A matéria de facto considerada provada e não provada encontra-se em contradição, pois que ao considerar-se provada a queda do muro que se encontrava edificado sobre a laje do terraço, não poderia deixar de se considerar provado que tal ocorrência provocou a abertura de fendas e fissuras na laje do terraço, pois, a queda de um qualquer muro, ao deixar a base do mesmo exposta, provoca no solo fissuras e fendas e a sentença considerou-se mesmo provado que a cobertura do terraço se encontra exposta ao vento, sol, chuva, água e demais condições climatéricas, contudo, contraditoriamente, considerou-se não provado que a queda do muro implicou a abertura de fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço, o que, é contraditório com o acima afirmado.
Todos os Réus se apresentaram a defender não se verificar a apontada nulidade da sentença.
O F Património refere que nos termos do artº 615º, nº1, alínea c) do CPC, a nulidade da sentença poderá resultar ou (i) da oposição entre os fundamentos e a decisão ou (ii) da existência de um vicio ou incongruência que torne a decisão ininteligível, e que os Apelantes nas suas alegações se abstêm de concretizar qual dos segmentos do enunciado legal fundamenta a alegada nulidade, mas que o facto de não ter sido dado como provado o que consta do facto não provado 3, não leva a que exista uma contradição entre a fundamentação da sentença e a decisão. Dos factos dados como provados nos pontos 19 a 23 não decorre, como pretendem os recorrentes, que tenha de se dar como provado o facto não provado 3, sob pena de existir contradição. A argumentação é coerente com a factualidade que deu como provada, em nada comprometendo a decisão tomada. Identicamente não resulta qualquer obscuridade ou ambiguidade que comprometa a interpretação da decisão, pelo contrário, exatamente porque não deu como provados os efeitos da queda do muro, é que se compreende - entre outras razões - que tenha absolvido os Réus /Recorridos. Adicionalmente a ambiguidade ou obscuridade, a existir, teria de assumir uma gravidade tal que colocasse em completa contradição a fundamentação e a decisão, ou tornasse impossível alcançar o sentido da decisão, com base na fundamentação apresentada, o que não é o caso. Também não se consegue compreender a decorrência lógica que os Apelantes afirmam existir entre os factos provados e o não provado. Afirmam os Recorrentes que “não é necessário possuir-se conhecimentos técnicos na área da construção e da engenharia civil, para se ter conhecimento que, a queda de um qualquer muro, ao deixar a base do mesmo exposta, provoca no solo fissuras e fendas" mas que tal afirmação é falaciosa dado que, em momento algum, o douto tribunal deu como provado que a queda do muro "deixou a base do mesmo exposta"; apenas foi dado como provado que "ruiu e caiu parte do muro numa extensão de cerca de 1,00 metros, situada sobre a fracção “D”” - cfr. facto provado 22.Mas ainda que tal não fosse, a queda de um muro pode não deixar exposta a base no qual está assente, dependerá do modo e condições em que ruir. Aliás, a posição do tribunal está em perfeita sintonia com a conclusão do relatório pericial na resposta 2, portanto, mesmo para quem tem "conhecimentos técnicos na área da construção e da engenharia civil", conforme afirmam os Recorrentes, a conclusão é idêntica à do tribunal.
A Ré Fundação W sustenta que os recorrentes, em momento algum, concretizam os segmentos da disposição legal que justifica a nulidade da sentença e que resultando das alegações dos recorrentes que a sentença seria nula, por existir contradição entre a matéria de facto provado e não provada, deixa à consideração do Douto Tribunal da Relação o cumprimento do ónus que lhes caberia, nos termos do disposto no artº 640º, nº2 do CPC.
O Réu CONDOMÍNIO do nº 00, sustenta que, o facto de não se ter considerado provado o facto não provado sob o número 3 – “a queda do muro implicou a abertura de fendas e fissuras no piso e na laje de cobertura do terraço” – não implica uma contradição entre os fundamentos e a decisão, sendo completamente irrelevante para a decisão, mas que, mesmo que assim não fosse, não se verifica a alegada contradição, pois que o Tribunal a quo considerou como provado que “Em data não concretamente apurada, ruiu e caiu parte do muro indicado em 21, numa extensão de cerca de 15,00 metros, situada sobre a fração D” e considerou, ainda, como provado, que “a cobertura do terraço referido em 20 (terraço com a área de 415 m2, o qual, além da fração D, serve de cobertura de outras frações autónomas dos prédios descritos sob os n.ºs 222 e 888) apresentasse exposta ao vento, sol, chuva, água e demais condições climatéricas”. O Tribunal a quo em momento algum considerou como provado que “a base do muro ficou exposta” e tal não é, não só, consequência necessária da queda do muro, pois um muro pode cair sem afetar a base do mesmo, como também, o Relatório Pericial é perentório em referir que “não foram percecionadas fendas nem fissuras na zona onde existia o muro”.
O Tribunal a quo pronunciou-se (cfr. fls 651) no sentido de a propalada contradição assenta numa divergente apreciação dos meios de prova por banda dos recorrentes e não na ausência de coerência intrínseca da decisão proferida com a fundamentação em que se suporta, como decorre do cotejo da sentença colocada em crise.

Cumpre decidir.

O nº1, do art.º 615º, do CPC, que consagra as causas de nulidade da sentença, estabelece que é nula a sentença quando:

a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
As nulidades da sentença são vícios formais, intrínsecos de tal peça processual, taxativamente consagrados no nº1, do art. 615º, do CPC, sendo tipificados vícios do silogismo judiciário, inerentes à sua formação e à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento (error in judicando, de facto ou de direito (1).
Assim, as nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento, estes, a sindicar noutro âmbito.
Há nulidade da sentença quando o seu dispositivo está em contradição com as premissas efetivamente adotadas pelo juiz e não com as premissas que ele poderia ter adotado, no entender de uma das parte, mas não adotou.
Como se analisa em Acórdão da Secção, de 16/11/2017, em que a ora relatora foi adjunta, proferido no processo APELAÇÃO Nº 42/14.9TBALJ.G1 “Os vícios que se encontram enunciados neste normativo reportam-se à estrutura ou aos limites da sentença, tratando-se de defeitos de atividade ou de construção da própria sentença proferida. Respeitam a vícios da estrutura da sentença os fundamentos enunciados nas alíneas b) (falta de fundamentação) e c) (oposição entre os fundamentos e a decisão); e respeitam a vícios atinentes aos limites da sentença, os enunciados nas alíneas d) (omissão ou excesso de pronúncia) e e) (pronuncia ultra petitum).
Os vícios em referência “afetam formalmente a sentença e provocam a dúvida sobre a sua autenticidade, como é o caso da falta de assinatura do juiz, ou a ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduzir logicamente a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia)” (2).
Diferentemente desses vícios são os erros de julgamento (error in judicando), os quais contendem com erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de uma distorção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa.
Nos erros de julgamento assiste-se a uma deficiente análise crítica das provas produzidas ou a uma deficiente enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto, sendo que esses erros, por não respeitarem já a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença, mas ao mérito da relação material controvertida nela apreciada, não a inquinam de invalidade, mas de error in judicando atacáveis em via de recurso (3).
Na al. c) deste preceito prevêem-se duas causas de nulidade da sentença: uma primeira causa, decorrente da circunstância de se assistir à oposição entre a decisão e os fundamentos de facto e/ou de direito em que ela repousa; e uma segunda causa de nulidade decorrente da sentença padecer de ambiguidade ou obscuridade que torna a decisão ininteligível.
Quanto à primeira dessas causas de nulidade, a mesma afirma-se quando existe uma contradição lógica entre a decisão e os fundamentos de facto e/ou de direito avocados na sentença para ancorar essa decisão. Isto é, o julgador segue determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e em vez de a tirar, decide noutro sentido, oposto ou divergente.
Esta oposição não se confunde, porém, com “o erro na subsunção dos factos à norma jurídica, ou muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já se o raciocínio expresso na fundamentação apontar para determinada consequência jurídica e na conclusão for tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir” (4).
Dito por outras palavras, a nulidade da sentença com fundamento em oposição entre os fundamentos e a decisão traduz-se num vício real no raciocínio do julgador explanado na sentença, consistente em a fundamentação apontar num determinado sentido e a decisão seguir caminho oposto ou, pelo menos, diferente. Esse vício distingue-se do erro de julgamento em virtude de neste não existir qualquer vício de raciocínio do julgador, mas apenas uma incorreta interpretação da lei ou uma indevida aplicação desta aos factos provados ou não provados no caso concreto.
(…) uma sentença sofre de ambiguidade quando a parte decisória propriamente dita (com exclusão, portanto, dos fundamentos nela explanados para ancorar essa decisão) tem mais do que um sentido, tornando-se, consequentemente, incerto, duvidoso ou indefinido o respetivo comando para um declaratário normal; será obscura quando o seu exato sentido não pode ser alcançado por esse declaratário médio, ou seja, no primeiro caso, um declaratário médio, quando confrontado com a decisão, interpreta-a em mais que um sentido e, consequentemente, desconhece qual o sentido a seguir; no caso de obscuridade, esse declaratário médio/normal nem sequer consegue apreender o que o juiz quis dizer na parte decisória (5).”
Ora, in casu, verifica-se que a parte decisória da sentença não padece nem do vício consagrado na 1ª parte nem do previsto na 2ª parte, da referida al. c).
Não existe qualquer contradição lógica nos pressupostos de facto e de direito que se analisam na decisão recorrida.
E, na verdade, também não há contradição entre os factos provados e os não provados. Com efeito, o facto de o tribunal a quo ter dado como provada a queda do muro que se encontrava edificado sobre a laje do terraço não impunha que se tivesse de considerar também provado, para que não houvesse contradição, que tal ocorrência tenha provocado a abertura de fendas e fissuras na laje do terraço nem, sequer que a queda de um muro deixe a base do mesmo exposta nem que provoque no solo fissuras e fendas. O tribunal não deu, na verdade, como provado que a queda do muro deixou a base do mesmo exposta. Apenas foi dado como provado que "ruiu e caiu parte do muro numa extensão de cerca de 1,00 metros, situada sobre a fracção “D”” e, como é evidente a queda de um muro pode não deixar exposta a base no qual está assente. Tudo dependerá do modo e condições em que ruir, pois um muro pode, na verdade, cair sem afetar a base do mesmo. Até do relatório pericial resulta não terem sido percecionadas fendas nem fissuras na zona onde existia o muro.
Não se vislumbra existir qualquer contradição lógica entre a parte decisória da sentença proferida pelo tribunal a quo e os fundamentos de facto e de direito aduzidos. Poderá é existir erro de julgamento (de facto e/ou de direito), decorrente do tribunal a quo ter valorado de forma incorreta as provas produzidas, interpretado inadequadamente os factos dados como provados e não provados ou subsumido os factos a normas jurídicas incorretamente aplicadas, mas tal não determina, como vimos, da nulidade da sentença proferida, sendo questões do objeto do recurso em si.
A sentença recorrida não padece, igualmente, de ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, sendo facilmente perceptível.
Como bem sustenta o Tribunal a quo, nenhuma concreta nulidade foi cometida não ocorrendo incoerência intrínseca da decisão proferida com a fundamentação em que se suporta sendo que o que o recorrente evidencia é a sua discordância com o sentido da decisão, o que constitui fundamento do recurso em si.
Concluímos, pois, que a sentença não padece da apontada nulidade.
Pelo exposto, improcede a invocada nulidade da sentença proferida pelo tribunal a quo.
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2. Da questão prévia da falta de indicação da prova em que se fundamenta o erro, facto por facto, e de análise crítica da mesma e se seria de alterar a decisão da matéria de facto

Antes de apreciarmos a impugnação da matéria de facto, cumpre analisar a questão prévia suscitada pelos Réus FUNDAÇÃO W e CONDOMÍNIO do nº 00 que invocam que o recurso tem de ser rejeitado quanto à apreciação da matéria de facto, pois que os recorrentes não especificaram, por cada um dos factos que impugnaram, os meios probatórios que determinariam decisão diversa da tomada em Primeira Instância, sendo que elencaram toda a factualidade que impugnaram sem especificarem, para cada um dos factos, com incumprimento do disposto no artº 640º, do CPC, pois não cumpriram o ónus que lhes impunha de especificarem, para cada um dos factos que impugnaram, os meios de prova em concreto e, existindo prova gravada, não indicaram, com exatidão as passagens em que se funda decisão diversa da recorrida, limitando-se a transcrever depoimentos, sem indicarem que parte em concreto entendem que impõe decisão diversa para cada um dos fatos.
Cabe, pois, antes de mais, analisar se os impugnantes observaram os ónus legalmente impostos em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, e que vêm enunciados no art. 640º, os quais constituem requisitos habilitadores para que o tribunal ad quem possa conhecer da impugnação.
Na verdade, no que se reporta à atividade jurisdicional que, quanto a tal, deve ser levada a cabo por este Tribunal de Segunda Instância, o nº1, do art. 640º, consagra que, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição (negrito nosso):

a)- os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b)- os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)- a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
O n.º 2, do referido artigo acrescenta que:
a) … quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (negrito nosso).

Como resulta do referido preceito, e seguindo a lição de Abrantes Geraldes, quando o recurso verse a impugnação da decisão da matéria de facto deve o recorrente observar as seguintes regras:

a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;(…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente; (6).
Com a reforma introduzida ao Código de Processo Civil pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, o legislador consagrou o registo da audiência de discussão e julgamento, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. O tribunal de segunda instância passou a fazer um novo julgamento da matéria impugnada, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta do estatuído no art. 662º, n.º 1 do CPC, quando nele se expressa que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento supervenientes impuserem decisão diversa.
Comparando o anterior regime com o atual (cfr. o art. 712º, do anterior CPC, com o art. 662º do atual), verificamos que a possibilidade de alteração da matéria de facto, que era excecional, passou a ser função normal do Tribunal da Relação, elevado a verdadeiro Tribunal de substituição, verificados os referidos requisitos legais. Conferiu-se, assim, às partes um duplo grau de jurisdição, por forma a poderem reagir contra eventuais e hipotéticos erros de julgamento, com vista a alcançar uma maior certeza e segurança jurídicas e a, desse modo, obter decisões mais justas, alcançando-se, assim, uma maior equidade e paz social, sempre buscadas pelo Estado, verdadeiro interessado na realização da justiça.
O duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto pressupõe novo julgamento quanto à matéria de facto impugnada e “somente será alcançado se a Relação, perante o exame e análise crítica das provas produzidas, a respeito dos pontos de facto impugnados, puder formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das prova, sem estar limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova, princípio este que tido por absoluto transformaria este duplo grau de jurisdição em matéria de facto, numa garantia praticamente inútil” (7).
Tendo o recurso por objeto a impugnação da matéria de facto, a Relação deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, procedendo à efetiva reapreciação da prova produzida, devendo nessa tarefa considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda relevantes, apreciando livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art. 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil).
Contudo, o legislador, ao impor ao recorrente o cumprimento das referidas regras, visou afastar soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição dos julgamentos, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente. (8)
Não se consagra a possibilidade de repetição do julgamento e de reapreciação de todos os pontos de facto, mas, apenas e só, a reapreciação pelo tribunal superior e, consequente, formação da sua própria convicção (à luz das mesmas regras de direito probatório a que está sujeito o tribunal recorrido) quanto a concretos pontos de facto julgados provados e/ou não provados pelo tribunal recorrido. A possibilidade de reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver a reapreciação global de toda a prova produzida, impondo-se, por isso, ao impugnante, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais, a observância das citadas regras. O Tribunal da Relação, sendo de 2ª instância, continua a ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto (9), estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.
Em suma, deve, assim, o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, sendo que, como refere Abrantes Geraldes, esta última exigência (plasmada na transcrita alínea c) do nº 1 do art. 640º) vem reforçar o ónus de alegação imposto ao recorrente (…) por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, devendo ser apreciada à luz de um critério de rigor enquanto decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo (10).
É entendimento doutrinal e jurisprudencial uniforme que, nas conclusões das alegações, que têm como finalidade delimitar o objeto do recurso e fixar as questões a conhecer pelo tribunal ad quem, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do recurso, como a lei adjetiva comina no nº1, do art. 640º.
Não obstante o NCPC proceder, como vimos, ao alargamento e reforço dos poderes da Relação no domínio da reapreciação da matéria de facto, deve ser rejeitado o recurso, no atinente a tal ponto, quando o recorrente não cumpra os ónus impostos pelos nº1 e 2, a), do art. 640º (11).
A indicação “com exatidão das passagens da gravação em que se funda” concretiza-se mencionando o minuto em que cada uma de tais “passagens” tem início. A “transcrição” das “passagens” não constitui uma alternativa à indicação “com exatidão das passagens da gravação” e esta indicação não se pode ter por feita quando somente se menciona a hora de início e do fim de cada depoimento (12)
Como se decidiu no Acórdão desta Secção, em que a ora Relatora foi Adjunta, proferido na apelação nº 3361/12.5TBBCL.G1 a Doutrina consideraimpõe-se a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto quando ocorra: “a) falta de conclusões sobre a impugnação da matéria de facto (art. 635º, n.º 4 e 641º, n.º 2, al. b); b) falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a); c) falta de especificação na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); d) falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e) falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido a cada segmento da impugnação” (13).
Os critérios que se acabam de enunciar têm sido seguidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, conforme evidenciam, a título exemplificativo, os acórdãos proferidos em 18/11/2008, Proc. 08A3406; 15/09/2011, Proc. 1079/07.0TVPRT.P.S1; 04/03/2015, Proc. 2180/09.0TTLSB.L1.S2; 01/10/2015, Proc. 824/11.3TTLSB. L1. S1; 26/11/2015, Proc. 291/12.4TTLRA.C1; 03/03/2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1.S1; 11/02/2016; Proc. 157/12.8TUGMR.G1.S1, todos in base de dados da DGSI.
Note-se que aquela instância superior tem operado uma distinção entre ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto do recurso em sede de impugnação da matéria de fato, onde os requisitos impostos à parte se encontram ligados com o mérito ou demérito da pretensão, e ónus secundários, que se prendem com os requisitos formais.
Quanto aos requisitos primários ou fundamentais de delimitação do recurso, onde inclui a obrigação do recorrente de formular conclusões e nestas especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e a falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados e falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, requisitos estes sobre que versa o n.º 1 do art. 640º-A do CPC, a jurisprudência tem considerado que aquele critério de rigor se aplica de forma estrita, não admitindo quaisquer entorses, pelo que sempre que se verifique o incumprimento de algum desses ónus por parte do recorrente se impõe rejeitar o recurso.
Já no que respeita aos ónus da impugnação secundários, que são os enunciados no n.º 2 daquele art. 640º-A, em que se consagra a obrigação do recorrente, quando os meios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenha sido gravada, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, a jurisprudência considera que embora a observância desse ónus deva ser apreciado à luz de um critério de rigor, não convém exponenciar esse critério ao ponto de ser violado o princípio da proporcionalidade e seja denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador” (14).
Sustenta-se que se está perante meros requisitos de forma, destinados a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência, pelo que o cumprimento desse ónus tem de ser “interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não se justificando a imediata e liminar rejeição do recurso quando, apesar de a indicação do recorrente não for totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento” (15).
Conforme se lê no acórdão do STJ, cujo excerto se acaba de transcrever e infra identificado, “na interpretação da norma que consagra este ónus de indicação exata a cargo do recorrente que impugna prova gravada, não pode deixar de se ter em consideração a filosofia subjacente ao atual CPC, acentuando a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências puramente formais, carecidos de um interpretação funcionalmente adequada e compaginável com as exigências resultantes do princípio da proporcionalidade e da adequação – evitando que deficiências ou irregularidades puramente adjetivas impeçam a composição do litígio ou acabem por distorcer o conteúdo da sentença de mérito, condicionado pelo funcionamento de desproporcionadas cominações ou preclusões processuais”.
Acontece que não obstante ser entendimento unânime do STJ no sentido de que aquele ónus de impugnação secundário tem de ser apreciado à luz de um critério da proporcionalidade, sendo de rejeitar a impugnação da matéria de facto quando não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte tenha fundado a sua impugnação, já existe discordância sobre as concretas condições que têm de se encontrar observadas para que à luz do enunciado critério de proporcionalidade se considere estar cumprido minimamente esse critério, de modo a não levar à rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto.
Assim, enquanto no Ac. do STJ. de 09/07/2015, proferido no Proc. 284040/11.0YIPRT.G1.S1, se considerou que “tendo o apelante, nas suas conclusões de recurso (i) identificado os pontos de facto que considerava mal julgados, por referência aos quesitos da base instrutória, (ii) indicado o depoimento das testemunhas, que entendeu mal valorados, (iii) fornecido a indicação da sessão no qual foram prestados e do início e termo dos mesmos, apresentado a sua transcrição, (iv), bem como referido qual o resultado probatório que no seu entender deveria ter tido lugar, relativamente a cada quesito e meio de prova, tanto bastava para que a Relação tivesse procedido à reapreciação da matéria de facto, ao invés de a rejeitar” (16), outros entendem que o cumprimento daquele ónus por referência ao princípio da proporcionalidade não se basta com a indicação do início e termo dos depoimentos em que se funda o recurso, sequer com a apresentação da transcrição integral desses depoimentos, mas exige a indicação da concreta passagem ou passagens da gravação em que se funda o recurso (início e termo do excerto ou excertos em relação aos depoimentos que o recorrente considere relevantes) ou a transcrição desse excerto ou excertos.
Neste último sentido pronunciou-se o Ac. STJ. de 14/09/2006, Proc. n.º 06B1998, onde se lê que: “Deve ser rejeitado o pedido de alteração da matéria de facto formulado na apelação que se refira unicamente aos depoimentos de determinadas testemunhas, mas omita os concretos pontos gravação das declarações daquelas que impunham uma decisão diversa sobre os trechos da matéria de facto impugnada”.
Também no Ac. do STJ. de 19/01/2016, Proc. n.º 3326/10.4TBLRA.C1.S1, pondera-se que “ a falta de indicação exata e precisa do segmento da gravação em que se fundamenta o recurso, nos termos da alínea a) do n.º 2 do art. 640º do CPC não implica, só por si a rejeição do pedido de impugnação sobre a decisão da matéria de facto, desde que o recorrente se reporte à fixação eletrónica/digital e transcreve os excertos que entenda relevantes de forma a permitir a reanálise dos factos e o contraditório.
Ainda no Ac. do STJ. de 19/02/2015, Proc. 405/09.1TMCBR.C1.S1, escreve-se que “… que a apresentação das transcrições globais dos depoimentos não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640º do Cód. Proc. Civil”.
Sem se perder de vista que o ónus enunciado no n.º 2 do art. 640º é meramente processual, destinando-se a facilitar a localização pelo tribunal ad quem, mas também pelo recorrido, dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação, habilitando o último a exercer cabalmente o seu direito de defesa em sede de contra-alegações e a apreender o raciocínio seguido nessa impugnação pelo recorrente por referência a esses concretos elementos probatórios, e que a filosofia subjacente ao atual CPC acentua a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências meramente formais, reclamando que se interprete o art. 640º, n.º 2, al. a) de forma funcionalmente adequada atento o fim a que se destina, o que reclama o recurso ao princípio da proporcionalidade na apreciação do cumprimento daquele ónus, sendo de rejeitar toda e qualquer interpretação do enunciado normativo no sentido de impor o indeferimento do recurso da matéria de facto como decorrência automática do incumprimento do ónus que prescreve, propendemos para este segundo entendimento. É que, de contrário, não só estaríamos a fazer tábua rasa daquele preceito legal, que é expresso no sentido de impor ao recorrente a indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, ou em alternativa, proceder à transcrição das mesmas, falando, aliás, em “transcrição de enxertos” de depoimento ou depoimentos que o recorrente “considere relevantes”, como se estaria a minorar os princípios da auto-responsabilidade das partes que, em sede de recurso, independentemente do valor da causa, têm de estar sempre representadas por técnico habilitado com os indispensáveis conhecimentos jurídicos – advogado -, além de se estar a restringir, minorando-os, os deveres de cooperação, lealdade e boa-fé processuais a que se encontram adstritas e, inclusivamente, se poder fazer perigar os direitos de defesa do recorrido, que desconheceria quais os concretos e específicos fundamentos probatórios em que o recorrente funda a sua impugnação e o raciocínio por ele seguido a partir desses fundamentos, por forma a poder cabalmente defender-se, em sede de contra-alegações, carreando para os autos outros excertos do depoimento daquela ou de outras testemunhas ou partes que sustentariam, na sua perspetiva, o julgamento feito pelo tribunal a quo.
Resulta do que se vem dizendo, que não pudemos deixar de sufragar a posição jurisprudencial que sustenta que ao cumprimento do ónus enunciado no art. 640º, n.º 2, al. a), não basta ao recorrente que pretende atacar a decisão quanto aos concretos pontos da matéria de facto dados como provados e/ou não provados pelo tribunal a quo indicar o início e o termos dos depoimentos que, na sua perspetiva, impõem solução diversa, sequer a transcrição integral desses depoimentos, mas antes reclama que o recorrente indique a concreta passagem em que se funda o seu recurso, indicando o início e termo do(s) excerto(s) dos depoimentos das partes e/ou testemunhas que impõem essa solução diversa ou proceda à transcrição desse(s) excerto(s)”.
In casu, impõe-se reconhecer que os recorrentes não cumpriram o consagrado na al. a) do n.º 2 daquele artigo, verificando-se falta de indicação exata das passagens da gravação em que fundam o erro cometido pelo tribunal a quo, pois que se limitaram a referir “com base nas declarações de parte…”, “com base no depoimento das testemunhas …” “e com base na prova documental (fotos do terraço e orçamento apresentado para reparação do teto e paredes da fracção “C7” dos AA”) que, na sua perspetiva, impunham decisão diversa da proferida, sem sequer mencionar, ponto por ponto, a prova e onde se encontra (relativamente à gravada) para cada um dos factos, indicando apenas o início e o fim dos depoimentos e onde se situa a parte que entendem “com relevo para este recurso”, fazendo-o em bloco, sem especificar a prova quanto a cada facto, o que não cumpre, como acima sustentamos, o ónus enunciado no preceito anteriormente referido.
Analisado o corpo das alegações e as respetivas conclusões, entendemos que o Recorrente, que impugna a decisão da matéria de facto, faz referência aos concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados, indica os elementos probatórios que conduziriam à alteração daqueles pontos nos termos por ele propugnados, a decisão que, no seu entender, deveria sobre eles ter sido proferida mas não indica, com rigor as passagens da gravação em que funda o recurso (como imposto pelo nº 2 al. a) do citado normativo) quanto a cada concreto facto nem procede a uma análise critica das provas em obediência à al. b), do nº1, do referido art. 640º, pois que não justifica os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Efetivamente, os recorrentes não especificaram, por cada um dos factos que impugnam, quais os meios probatórios que determinariam decisão diversa da tomada em Primeira Instância, sendo que elencam toda a factualidade que impugnam sem especificarem a parte que justifica decisão diversa, para cada um dos factos.
Não cumpriram,pois, o ónus que se lhes impunha, não especificando, para cada um dos factos que impugnam, os meios de prova em concreto e, no caso da prova gravada, sem indicarem, com exatidão, as passagens em que se fundam, que impunham decisão diversa da recorrida, limitando-se a transcrever depoimentos, sem concretizar que parte em concreto entendem que impõe uma decisão diversa para cada um dos fatos.
Ora, como vimos, tal não basta para que se possa considerar cumprido aquele ónus, o que obsta ao conhecimento do objeto de recurso, pois que nesta Segunda Instância não se realiza novo julgamento sendo, tão só, de reapreciar os concretos meios probatórios relativamente aos pontos de facto impugnados. A falta de indicação por parte do apelante quer dos elementos probatórios que conduziriam à alteração de cada um dos pontos nos termos por ele propugnados, quer da decisão que, no seu entender, deveria sobre eles ter sido proferida, quer, ainda, das passagens da gravação em que funda o recurso (nº 2 al. a) do citado normativo) relativamente a cada facto concreto (e não em bloco), situação esta que se verifica in casu, têm, como consequência, a imediata rejeição do recurso, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica a omissão, pois que quanto ao recurso da matéria de facto não existe despacho de aperfeiçoamento ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, por aplicação do disposto no art. 639º, nº3, do CPC.
Acresce que os recorrentes não fizeram, também, qualquer apreciação crítica dos meios de prova produzidos a justificar o erro de julgamento.
A falta de indicação por parte dos apelantes das passagens da gravação em que funda o recurso têm, como consequência, a imediata rejeição do mesmo, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica a omissão. Na esteira do que acima se deixou dito, perante a omissão pelos recorrentes do cumprimento do ónus estatuído no art. 640º, designadamente no n.º 2, al. a), impõe-se rejeitar o recurso da matéria de facto interposto pelos mesmos.
Cumpre, ainda, acrescentar que, independentemente do que se acaba de concluir, que, mesmo que os Recorrentes tivessem cumprido o ónus enunciado no citado art. 640º, n.º 2, al. a), do CPC, e tivessem efetuado análise crítica das provas, sempre se imporia confirmar a sentença recorrida quanto àquela concreta matéria decidida, pois que o Tribunal a quo, na fundamentação de facto, bem ponderou e decidiu as questões impugnadas como se passa a citar:

“Relativamente aos factos considerados provados e não provados a convicção do Tribunal assentou nos seguintes meios de prova:

No que se refere aos factos provados n.ºs 18 a 34 e aos factos não provados n.ºs 1 a 16, procedeu-se à ponderação das declarações de parte do chamado António, dos depoimentos das testemunhas BB (funcionária da sociedade GC, Lda., pertencente ao autor, do qual era procuradora), HH (funcionário da GC, Lda.), FF (empreiteiro, responsável pela elaboração do orçamento de fls. 72), RR (gerente do Balcão do Banco Q localizado na fracção “D”), MM (colaborador do Banco Q no Departamento Central do Porto, tendo estado presente na inspecção realizada pelos Srs. Peritos), PP (colaboradora da ré Fundação W, sendo coordenadora da gestão do património), RR (colaboradora da ré Fundação W, estando à frente da Direcção de Serviços e Instalações), OO (colaborador da ré Fundação W, exercendo funções na fracção “E3”), AL (condómino do réu Condomínio do n.º 00, do qual foi administrador durante cerca de 9 anos), VV (director de alojamento da chamada AGC, Lda.), JJ (funcionário da delegação … da chamada Ordem dos Engenheiros, localizada nas fracções “G” e “H”), RR (engenheira, deslocando-se por vezes à delegação … da chamada Ordem dos Engenheiros), LP (antigo delegado, da chamada Ordem dos Engenheiros, durante cerca de 6 anos), AM (condómina do réu Condomínio do n.º 99), EC (condómino do réu Condomínio do n.º 99) e JE (condómino do réu Condomínio do n.º 99), da certidão matricial de fls. 36-37, das escrituras públicas de constituição de propriedade horizontal de 18/06/1982 (fls. 38-57), de 22/03/1984 (fls. 153-160 e 383v-386v) e de 14/11/1997 (fls. 162-167, complementada pela certidão de fls. 168-100 e pela relação de fls. 367-368), das fotografias de fls. 65-67, 00-71, 111-112, 171-189 e 472, do orçamento de fls. 72 e do relatório pericial de fls. 419-433 (integrado pelos esclarecimentos de fls. 457-461 e 466-468).
Assim, quanto à instalação de um estabelecimento de café e snack-bar na fracção “C7”, esta foi confirmada pelas testemunhas BB, HH e AL e é consonante com a certidão matricial de fls. 36-37 e as fotografias de fls. 425. No entanto, esses intervenientes convergiram que se tratava de um estabelecimento encerrado há bastante tempo, inclusivamente quando teriam surgido as primeiras manifestações de humidades no interior da fracção “C7”, o que não pode ser desassociado do estado de paralisação da actividade comercial do Centro Comercial Y onde se integra aquela fracção, que perpassou dos depoimentos daquelas testemunhas, secundadas pelos depoimentos das testemunhas FF, RR, MM, OO, AM, EC e JE e é patenteado nas fotografias de fls. 176-189.
Nesta decorrência, perante a ausência de outros elementos probatórios que levassem a juízo distinto, concluiu-se pela verificação da factualidade relatada nos factos provados n.ºs 18, 30 e 31.
Dito isto, importa recordar que parte significativa das questões sob apreciação, mormente a configuração dos imóveis e os danos propaladamente ocorridos na fracção “C7” e as suas causas, constituem matéria de alguma complexidade técnica e de difícil análise.
Na realidade, perpassa dos articulados, dos documentos constitutivos da propriedade horizontal (v.g. as referidas escrituras públicas de 18/06/1982, 22/03/1984 e 14/11/1997), do acervo fotográfico junto aos autos e do laudo pericial, que não é fácil compreender as delimitações físicas dos prédios urbanos, pois estes apresentam-se interligados e constituem uma continuidade física.
Por outro lado, a existência de uma conexão directa entre o terraço sob escrutínio e a fracção “C7” incrementa as dificuldades de estabelecimento de uma relação entre a situação física existente no terraço e os danos alegadamente ocorridos, quando é também certo que a aferição de tal nexo causal se revela de algum melindre técnico na generalidade dos processos em que discutem questões análogas às dos presentes autos.
Deste modo, ganhou especial realce a perícia realizada, ainda que caiba recordar que a força probatória do exame pericial é fixada livremente pelo Tribunal (artigos 389.º do Código Civil e 607.º, n.º 5, do C.P.C.), o que se compreende, pois ao julgador impõe-se que sindique o laudo à luz das demais provas trazidas ao processo, podendo dele afastar-se quando o laudo não se afigure convincente ou seja contrariado ou desmentido por outros meios de prova (17).
Contudo, procedendo-se à análise do laudo pericial (integrado pelos respectivos esclarecimentos), verifica-se que as conclusões obtidas se mostram devidamente fundamentadas ao nível das razões de facto e de ciência que as suportam, não suscitando, por esse motivo, qualquer juízo de censura ou de discordância, sendo certo que também não se pode desconsiderar que a realização de perícias confere garantias acrescidas, quer ao nível da competência técnica, quer ao nível da isenção e imparcialidade, em comparação, por exemplo, com a narrativa trazida pelas testemunhas oferecidas pelas partes a respeito de questões técnicas, como a testemunha MM, cujo depoimento, nos seus aspectos essenciais (apesar de ser realizado por um economista de formação, como o próprio reconheceu), constituiu uma pronúncia técnica acerca das mesmas questões sujeitas ao crivo do Srs. Peritos.
Por esse motivo, quanto à caracterização do terraço e do muro aí existente, à determinação da parte do muro que ruiu e caiu, à localização relativa dos prédios descritos sob os n.ºs 69, 222 e 888 e das fracções “D”, “E3”, “C7”, “G”, “H” e aos acessos de que estas gozam ao terraço, atendeu-se primacialmente ao laudo pericial (e respectivos esclarecimentos), o qual, quanto ao facto provado n.º 22, foi ainda complementado pela circunstância de nenhum interveniente inquirido ter logrado situar no tempo a queda parcial do muro, embora balizando o evento por reporte à data aventada para a descoberta dos danos aventados na fracção “C7”.
Porém, no que tange à identificação dos danos apresentados pela fracção “C7” encontrámos alguma controvérsia, pois as testemunhas BB e HH asseveraram que esse imóvel apresentava sinais de grande presença de água nas paredes e no tecto, o que trouxe danos de grande monta, o que relacionaram com a queda do muro situado no referido terraço, mas a verdade é que não apenas os relatos destes intervenientes se revelaram vagos e imprecisos quanto à identificação do estado de coisas existente na fracção “C7” e provêem de colaboradores de uma sociedade pertencente ao autor, como também são dissonantes da realidade que os Srs. Peritos percepcionaram na fracção “C7” aquando da inspecção que efectuaram (não são perceptíveis danos de tal magnitude, como estes deram nota no laudo, o qual fizeram acompanhar de diversas fotografias ilustrativas das conclusões que verteram no relatório – cfr. fls. 425 e 426) e não foram acompanhados por qualquer outro meio de prova que os corroborasse (por exemplo, fotografias que atestassem o propalado estado de degradação), salvo o orçamento de fls. 72, cujo teor genérico é inconclusivo quanto à realidade apreendida pela pessoa que o elaborou (v.g. a testemunha FF, o qual também indicou não se recordar do estado de coisas que verificou quando se deslocou à fracção “C7”), para além de que, pelos motivos aventados no relatório pericial, não se revela possível determinar as causas da queda do muro (os Srs. Peritos equacionam diversas hipóteses alternativas, sem lograrem dar prevalência a uma delas), ou se a ruína deste originou infiltrações de águas pluviais na fracção “C7” (os Srs. Peritos salientam apenas terem constatado indícios de condensação, mas já não de humidades resultantes de infiltrações).
Cumpre também salientar que o chamado António e as testemunhas JJ, RR, LP e VV, confirmaram que existiam restrições nos acessos ao terraço a partir das fracções “G” e “H” e do prédio descrito sob o n.º 999, respectivamente, o que vai de encontro com a perspectiva do local proporcionada pelas fotografias de fls. 111, 460, 461 e 472.
De igual modo, cabe notar que nenhum interveniente fez menção à realização de obras no terraço pela sociedade responsável pela administração do réu Fundo, ou posteriormente pelo autor, pois as únicas testemunhas que fizeram menção a uma intervenção no terraço (v.g. as testemunhas BB, HH, RR, AL e EC) identificaram o Banco Q, S.A. (hoje Banco Q, S.A.), como a entidade que promoveu a realização desses trabalhos, ou seja, a inquilina da fracção “D” (embora não conste dos autos o respectivo contrato de arrendamento, as testemunhas MM e RR explicaram que a fracção “D” se encontra locada à aludida instituição bancária), a qual possui uma personalidade jurídica e uma esfera jurídica distintas da sociedade que explora o réu Fundo, senhorio do imóvel, apesar de ligados ao mesmo grupo financeiro.
Consequentemente, não tendo sido reunidos elementos probatórios que permitissem firmar um juízo diverso (…) conclui-se pela não ocorrência da factualidade narrada nos factos não provados n.ºs 1, 3 a 6, 12, 13, 15 e 16.
Por outro lado, o juízo negativo quanto à materialidade relatada nos factos não provados n.ºs 2 e 7 a 11 e 14, fundou-se na circunstância de ser logicamente dependente da demais factualidade considerada não provada (…).
Vigorando os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e regulando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta, a Relação só deve alterar a decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a específicos pontos impugnados.
Como referido, norteando-se pelos princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e regendo-se o julgamento humano por padrões de probabilidade, nunca de certeza absoluta, o uso dos poderes de alteração da decisão sobre a matéria de facto, proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, pelo Tribunal da Relação deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados (18), devendo ser usado, apenas, quando seja possível, com a necessária certeza e segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
Assim, só deve ser efetuada alteração da matéria de facto pelo Tribunal da Relação quando este Tribunal, depois de proceder à audição efetiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam para direção diversa e impõem uma outra conclusão, que não aquela a que chegou o Tribunal de 1ª Instância.
Na apreciação dos depoimentos, no seu valor ou na sua credibilidade, é de ter presente que a apreciação dessa prova na Relação envolve “risco de valoração” de grau mais elevado que na primeira instância, em que há imediação, concentração e oralidade, permitindo contacto direto com as testemunhas, o que não acontece neste tribunal. E os depoimentos não são só palavras; a comunicação estabelece-se também por outras formas que permitem informação decisiva para a valoração da prova produzida e apreciada segundo as regras da experiência comum e que, no entanto, se trata de elementos que são intraduzíveis numa gravação.
Por estas razões, está em melhor situação o julgador de primeira instância para apreciar os depoimentos prestados uma vez que o foram perante si, pela possibilidade de apreensão de elementos não apreensíveis na gravação dos depoimentos.
Tendo presentes os mencionados princípios orientadores, conforme citado no Douto Acórdão deste Tribunal, no Processo nº3300/15.1.T8GMR-J.G1 (19), relatado pelo Ilustre Desembargador Pedro Alexandre Damião Cunha e analisando o caso concreto, concluímos que nenhuma censura mereceria a sentença recorrida, sendo que, efetivamente, quanto aos factos não provados 1 a 14 não podia ter sido dada resposta positiva, pois que a prova produzida não permite dar resposta diversa, por falta de prova, consistente e segura, noutro sentido(tendo, até e desde logo de se atentar, como referido, na prova pericial e inspeção ao local), subscrevendo-se integralmente a fundamentação acima transcrita, sendo que nenhuma alteração seria de introduzir aos concretos pontos de facto mencionados nas conclusões do recurso e acima citados, únicos a poder ser apreciados, caso tivesse sido cumprido o ónus consagrado na al. a), do nº2, do art. 640º.
E, servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, nelas devem ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação (quanto aos demais previstos no art. 640º, é suficiente que constem de forma explícita na motivação do recurso) (20).
Sendo função das conclusões do recurso indicar, embora de forma sintética, os fundamentos porque se pede a alteração (seja de facto seja de direito) da decisão, nelas tem o recorrente, que impugna a matéria de facto, de especificar os concretos factos que entende estarem mal julgados. A aferição deste mau julgamento é a questão colocada à decisão do tribunal de 2ª instância e, como tal, tem de constar das conclusões ou estará fora do objeto do recurso. Já a especificação dos concretos meios de prova que impunham decisão diversa e o cumprimento da exigência indicada na al. a), do nº2, do art. 640º do NCPC têm a sua sede própria no corpo da alegação. Acresce, ainda, que cabe ter em conta, que, quanto ao recurso da decisão da matéria de facto, não existe a possibilidade de despacho de convite ao aperfeiçoamento, sendo este tipo de despacho reservado somente aos recursos em matéria de direito. A falta de especificação nas conclusões dos factos concretos que se consideram mal julgados não dá lugar a despacho de aperfeiçoamento no quadro do nº3, do art. 639º do NCPC, (21).
Assim, por falta de análise crítica das provas e de observância do formalismo imposto pela al. a) do nº2, do art. 640º, do CPC, rejeita-se o recurso, na parte respeitante à reapreciação da matéria de facto.

3. Dos pressupostos de responsabilidade civil do proprietário ou possuidor da obra que ruiu ou, ainda, do obrigado a conservar o edifício.

Imputa o Autor aos Demandados a responsabilidade pelos danos alegadamente sofridos.

Refira-se que na responsabilidade civil cabe distinguir a:

1- Responsabilidade civil contratual, que é a que decorre da falta de cumprimento das obrigações emergentes dos contratos;
2 - Responsabilidade civil extracontratual que é a que advém da violação de direitos absolutos ou da prática de certos atos que, embora lícitos, causam prejuízo a outrem, sendo categorias desta:

a) a emergente de atos ilícitos;
b) a emergente de atos lícitos (ato consentido por lei mas que a mesma lei considera de justiça que o seu titular indemnize o terceiro pelos danos que lhe causar);
c) a emergente do risco (alguém responde pelos prejuízos de outrem em atenção ao risco criado pelo primeiro).

O Código Civil ocupa-se da matéria da responsabilidade civil:

- no capítulo sobre fontes das obrigações, sob a epígrafe responsabilidade civil - artigos 483º a 510º;
- no capítulo sobre modalidades das obrigações, sob a epígrafe obrigação de indemnizar - artigos 5620 a 5720;
- e no capítulo sobre cumprimento e não cumprimento das obrigações, sob a epígrafe falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor - artigos 798° a 812°).
Alicerça o Autor a sua pretensão em responsabilidade civil extracontratual.
Na verdade, a responsabilidade civil contratual distingue-se da extracontratual ou aquiliana pelo facto de naquela estar em causa a violação de direitos de crédito ou de obrigações em sentido técnico, nelas se incluindo não só os deveres primários de prestação, mas também deveres secundários e esta emergir da violação de deveres de ordem geral e correlativamente de direitos absolutos do lesado.
Estas duas categorias de responsabilidade civil - porque diferentes - foram tratadas pelo Código Civil em secções distintas quanto à regulação da sua fonte (nos artigos 483.º ss para a responsabilidade civil extracontratual e nos artigos 798.º e ss para a responsabilidade contratual), ainda que seja hoje dominante uma corrente que considera não ser esta repartição estanque, existindo normas no sector reservado à responsabilidade delitual que se aplicam, manifestamente, à responsabilidade contratual, como é o caso das referentes à obrigação de indemnizar, que foi objeto de um tratamento unitário pelo legislador nos artigos 562.º e seguintes do Código Civil.

Dispõe o artigo 483°, sob a epigrafe "princípio geral" que 1. aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação, 2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei.

São, pois, pressupostos da responsabilidade civil:

1- facto voluntário;
2 - ilicitude (que é a infração de um dever jurídico, por violação direta de um direito de outrem e violação da lei que protege interesses alheios ou violação de obrigação contratualmente assumida);
3 - nexo de imputação do facto ao agente (culpa - dolo ou mera culpa -, implicando uma ideia de censura ou reprovação da conduta do agente);
4 - dano (perda que o lesado sofreu, em consequência de certo facto, nos interesses materiais, espirituais ou morais, que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar);
5 - nexo de causalidade entre o facto e o dano (tendo o facto de constituir a causa do dano).
Concluem os recorrentes ter o Tribunal a quo cometido erro de interpretação e aplicação do disposto nos artigos 492º e 1424º, n.º 1 e 3, ambos do Código Civil, imputando a responsabilidade pelos danos por si sofridos, alegadamente causados pelo ruir do muro, ao proprietário, ao possuidor e às pessoas obrigadas a conservar o edifício ou obra.
Estatui o art. 492º, do Código Civil, que tem a epígrafe Danos causados por edifícios ou outras obras que:
1. O proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos.
2. A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a defeito de conservação.
E o artigo 1424º, daquele Código, com a epígrafe Encargos de conservação e fruição, estatui que:
1.Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício … são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações.
(…)
3.As despesas relativas … às partes comuns que sirvam exclusivamente alguns dos condóminos ficam a cargo dos que dela se servem.
Ora, prevê-se no referido artigo 492º a responsabilidade do proprietário ou possuidor de qualquer edifício ou obra cuja ruína, causada por defeito de construção ou de conservação, provocar danos a terceiros. Esta responsabilidade é agravada por uma presunção de culpa. E,…, admite-se que o agente afaste a sua responsabilidade pela prova da existência de uma causa virtual, isto é, que faça relevar negativamente esta.
O nº 2, confundindo, uma vez mais a responsabilidade delitual com a obrigacional (com a referência à obrigação emergente de negócio jurídico), determina que o obrigado à indemnização será aquele que estiver obrigado a conservar o edifício ou obra, se a ruína se dever apenas a defeito de conservação. Se a causa for defeito de construção e de conservação, haverá corresponsabilidade do proprietário e do obrigado à conservação, repartindo-se a obrigação de indemnizar nos termos do art. 497º (22).
Consagra o referido artigo um regime de responsabilidade civil extracontratual dependente de culpa, ainda que presumida, fundada na violação de deveres de diligência que devem ser observados na construção e na conservação de edifícios ou outras obras. Mesmo que a posse do edifício não pertença ao proprietário, este deverá responder pelos danos causados pela sua ruina sempre que, no caso concreto, se considere que ele continua obrigado a tomar as providências necessárias para prevenir os danos derivados da ruína e não consiga ilidir a presunção de culpa que sobre si recai. No art. 492º pretendeu-se responsabilizar todos aqueles que retiram vantagens da propriedade de um edifício ou outra obra – o proprietário ou o possuidor em nome próprio. (23)
Estabelece-se neste artigo uma mera presunção de culpa e não a responsabilidade objetiva do proprietário ou possuidor. A responsabilidade prevista neste artigo, por culpa presumida, incide não só sobre o proprietário ou possuidor (em nome próprio) como sobre aquele que por lei ou negócio jurídico é obrigado a conservar a coisa, sendo o dano devido, neste caso, a defeitos de conservação. O legislador presume a culpa do agente, responsabilizando-o pela produção do dano, embora através de uma presunção iuris tantum, que poderá ser invalidada provando outra coisa. Inverte-se o ónus da prova, a benefício do lesado.
Consagrou-se legalmente ser responsável o proprietário ou o possuidor, salvo se houver alguém obrigado, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício e a ruína se dever exclusivamente a defeito de conservação, caso em que este responderá em vez do proprietário ou do possuidor (24).
Parecendo, contudo, que o nº 2, do art. 492º do CC dá a entender que o obrigado, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde sempre, com exclusão do proprietário ou possuidor, pelos danos devidos unicamente a defeitos de conservação, pois diz “em lugar do proprietário ou possuidor”, tal não deve ser interpretado, inteiramente, à letra. Tem de ser conferida uma interpretação restritiva a tal preceito por forma a considerar-se que a referida pessoa responde, em lugar do proprietário ou possuidor quando não houver culpa deste. Caso a haja, respondem os dois perante o lesado. O proprietário ou o possuidor só se exonera quando tiver agido sem culpa na escolha da pessoa encarregada da conservação e quando não tiver, por outra forma concorrido culposamente para a produção do dano. A responsabilidade prevista … no art. 492º do novo CC não exclui a responsabilidade que derive dos princípios gerais, pois aquela tem o fim de aumentar, e não diminuir as garantias dos lesados.
Por conseguinte, se alguém, embora não seja proprietário ou possuidor do edifício ou obra, tiver ilicitamente e com culpa causado a dano, é responsável por este, nos termos gerais (25).
Determinados os possíveis responsáveis – proprietário, possuidor, pessoa encarregada da conservação e qualquer agente que atuando ilicitamente e com culpa tiver causado danos a alguém -, vejamos agora como estão distribuídas as regras do ónus da prova da responsabilidade civil por danos causados por edifícios ou outras obras.
Na responsabilidade extracontratual incumbe ao lesado o ónus de provar todos os referidos pressupostos consagrados no nº1 do art. 483º, do Código Civil, entre eles, como vimos, a culpa do autor da lesão, nos termos dos artigos 487º, nº 1 e 342º, nº 1, ambos daquele Código, salvo existindo presunção especial de culpa, já que a obrigação de indemnizar, independentemente de culpa, só existe nos casos especificados na lei - v. nº 2 do artigo 483º do Código Civil, contando-se, entre tais casos, o consagrado no artigo 492º, do Código Civil.
Como vimos, o artº 492º dispensa a prova do facto presumido, ou seja, a culpa. Porém, só se passa à culpa (que se presume) depois de verificada a ilicitude do facto.
Ora, a Doutrina e a Jurisprudência dividem-se, presentemente, quanto à questão do ónus de prova da ilicitude, consubstanciada no vício de construção ou defeito de conservação.
Considera Ana Maria Taveira da Fonseca, in ob cit, que O regime de inversão do ónus da prova da culpa do proprietário, do possuidor ou daquele que está obrigado a conservar o edifício, previsto no art. 492º, só se pode aplicar depois de demonstrado o vício de construção ou o defeito de manutenção. Em face da dificuldade sentida pelos lesados na prova da causa da ruina, existindo uma “prova de primeira aparência”, não contrariada por contraprova que torne duvidosa a prova oferecida, de que esta se deveu a vício de construção ou a um defeito de construção, deve dar-se este facto como provado (26).
O Supremo Tribunal de Justiça, no seguimento de Doutrina citada, vem considerando, maioritariamente, que a prova do vício de construção ou do defeito de conservação cabe, nos termos gerais da responsabilidade civil, ao lesado - v., entre muitos, Acórdãos do S.T.J. de 06.02.1996, C.J./STJ, Ano IV, Tomo I, 77, de 22.02.2005 (Processo 1789/05), de 09.06.2005 (Processo 688/05), de 10-1-2006 (Processo 3241/05) e de 11/11/2010 (Processo 7848/05.8TBCSC.L1.S1), estes in dgsi.Net - podendo os referidos vícios provar-se por todos os meios, tendo, aqui relevância especial as presunções judiciais (artigo 351.º do Código Civil), já que conhecida a causa do dano, se concluirá se houve defeito de conservação – v. VAZ SERRA, Responsabilidade pelos Danos Causados por Edifícios ou Outras Obras, BMJ n.º 88, 14 e 36 e ainda Ac. R.L de 29.11.2007 (Processo 8211/2007-8), in dgsi.Net. Defende esta orientação que, embora o art. 492º, do CC, estabeleça uma presunção de culpa que favorece o lesado, tal presunção só funciona após a prova da ilicitude, isto é de o evento se ter ficado a dever a vício de construção ou defeito de conservação, do ónus do lesado, nos termos gerais da responsabilidade civil.
Inversamente, Luís Menezes Leitão, seguido pela jurisprudência, defende que A posição de alguma doutrina, seguida inicialmente pela jurisprudência é a de que a aplicação desta presunção de culpa depende da prova de que existia um vício de construção ou um defeito de conservação no edifício ou obra que ruiu, prova essa que, de acordo com as regras gerais, deveria ser realizada pelo lesado.
Discordamos, no entanto, salvo o devido respeito, dessa orientação, uma vez que fazer recair esta prova sobre o lesado equivale a retirar grande parte do alcance à presunção de culpa. Salvo no caso de fenómenos extraordinários, como os terramotos, a ruína de um edifício ou obra é um facto que indicia só por si o incumprimento de deveres relativos à construção ou conservação dos edifícios, não se justificando por isso que recaia sobre o lesado o ónus suplementar de demonstrar a forma como ocorreu esse incumprimento. É antes o responsável pela construção ou conservação que deve genericamente demonstrar que não foi por sua culpa que ocorreu a ruína do edifício ou obra - nomeadamente pela prova da ausência de vícios de construção ou defeitos de conservação ou que os danos continuariam a verificar-se, ainda que não houvesse culpa sua.
O fundamento desta responsabilização não se baseia no perigo causado pelos imóveis ou no proveito deles retirado pelo seu proprietário ou possuidor, não sendo por isso uma hipótese de responsabilidade objectiva. Trata-se antes de uma responsabilidade subjectiva fundada na violação dos deveres a observar na construção e na conservação de edifícios ou outras obras (deveres de segurança no tráfego), a qual é agravada através de uma presunção de culpa (27).
O Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 29.04.2008 (Pº 08A867) - e no mesmo sentido, Acórdão da Relação do Porto de 14-05-2009 - decidiu que ao lesado apenas é exigível a prova do eventono caso em apreço a queda de telhas e placas de cimento do edifício – havendo que concluir pela culpa presumida, reportada ou a vício de construção ou a defeito de conservação, caso não se demonstre a existência de caso fortuito de força maior ou a culpa do lesado; e desde que, o responsável não tenha feito a prova de que não houve culpa sua.
No Acórdão da Relação de Lisboa de 7/7/2016 Processo 12509/14.4T8LSB.L1-8, in dgsi.net foi seguida esta última orientação (cfr ainda o Acórdão da Relação de Lisboa de 20/3/2013 Processo 335/10.4TCLRS.L1-2) “porquanto reportando-nos ás regras da experiência da vida, a derrocada do prédio, a sua ruina indicia que não foram observadas as boas regras de construção ou conservação. Por isso, não faz sentido que o lesado tenha que provar essa inobservância, onerando-o com uma prova, muitas vezes, de difícil realização.
Porém, faz todo o sentido, até pela especial ligação do proprietário ou possuidor ao imóvel, que este prove a ausência de vícios de construção ou defeitos de conservação ou que os danos continuariam a verificar-se, ainda que não houvesse culpa sua.
A não entender-se deste modo, na prática, o que aconteceria é que a dita presunção de culpa se desvaneceria, face à dificuldade de prova para quem é “apanhado” desprevenido numa situação inesperada”.
Aí se sintetiza: “salvo no caso de fenómenos extraordinários, como os terramotos, a ruína de um edifício ou obra é um facto que indicia só por si o incumprimento de deveres relativos à construção ou conservação dos edifícios, não se justificando por isso que recaia sobre o lesado o ónus suplementar de demonstrar a forma como ocorreu esse incumprimento.
É antes o responsável pela construção ou conservação que deve genericamente demonstrar que não foi por sua culpa que ocorreu a ruína do edifício ou obra - nomeadamente pela prova da ausência de vícios de construção ou defeitos de conservação ou que os danos continuariam a verificar-se, ainda que não houvesse culpa sua”.

Assim, a ruína de um edifício ou obra indicia, só por si, a ilicitude - o incumprimento de deveres relativos à construção ou conservação dos edifícios - não se justificando face a isso, que recaia sobre o lesado o ónus de demonstrar a forma como a mesma ocorreu. É antes sobre o responsável pela construção ou conservação que impende o ónus da prova de que não foi por sua culpa que ocorreu a ruína do edifício ou obra (e, designadamente, de que se verifica ausência de vícios de construção ou defeitos de conservação) ou que os danos continuariam a verificar-se, ainda que não houvesse culpa sua.

In casu, verifica-se não ter ficado provada a versão carreada para os autos pelo autor, que alegou ter o Réu Fundo promovido uma intervenção no terraço (v.g. obras de substituição da cobertura), da qual advieram danos para a fração sua propriedade - “C7”.
E era exigível ao lesado a prova do evento, do facto em si, no caso em apreço que ocorreu a realização das obras e que se deram infiltrações na sua fração de águas provenientes do terraço, onde ocorreu a queda do muro.

Para que nos encontrássemos no âmbito de aplicação do artº 492º, nº 1, do CC, era necessário que tivessem ocorrido infiltrações de água, para a fração do Autor, decorrentes de o muro ter ruido, fosse por defeito de construção fosse por vício de conservação.
Ora, não tendo ficado demonstrada a realização de quaisquer obras pelo Fundo Recorrido nem as alegadas infiltrações, não se encontra preenchido pressuposto da responsabilidade consagrada no citado nº1, do art.º 492.º.
Não tendo os Recorrentes logrado provar os referidos pressupostos de responsabilização do réu Fundo e dos demais Demandados têm de improceder as pretensões deduzidas pelo Autor.
Na verdade, sendo as despesas necessárias à conservação das partes comuns dos edifícios da responsabilidade dos condóminos (cfr. artigo 1424.º, n.º 1, do Código Civil), abstratamente poderia equacionar-se responsabilização dos Condomínios (cfr. artigo 492.º, n.º 2, do Código Civil).
Porém, não resultou, sequer, provado que a fracção “C7” apresentasse danos resultantes da falta de conservação do terraço e do muro aí localizado.
Não tendo o Autor provado o facto e danos dele resultantes, não se encontram preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil de qualquer dos demandados.
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Ponderadas as questões suscitadas, é evidente que, não existindo qualquer modificação na matéria de facto considerada provada, nenhuma crítica pode ser apontada à decisão de mérito proferida pelo Tribunal de 1ª Instância.
Improcedem, por conseguinte, as conclusões da apelação, não ocorrendo a violação de qualquer normativos invocados pelos apelantes, devendo, por isso, a decisão recorrida ser mantida.
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IV. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
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Custas pelos apelantes, pois que ficaram vencidos – art. 527º, nº1 e 2, do CPC.
Guimarães, 30 de novembro de 2017

(Des. Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha)
(Des. José Manuel Alves Flores)
(Des. Sandra Maria Vieira Melo)

1. Cfr., entre muitos, Ac. do STJ de 1/4/2014, Processo 360/09: Sumários, Abril /2014, p1 e Ac. da RE de 3/11/2016, Processo 1070/13:dgsi.Net.
2. Abílio Neto, in “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro/2014, pág. 734.
3. Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in base de dados da DGSI.
4. José Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, pág. 670; Ac. STJ. de 20/01/2004, Proc. 03S1697, in base de dados da DGSI.
5. Abílio Neto, in ob. cit., pág. 739; Lebre de Freitas, “A Ação Declarativa Comum”, cit., pág. 333.
6. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, pags 155-156
7. Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1.S1, in base de dados da DGSI.
8. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, 2017,pag. 153
9. Ibidem, pág. 153.
10. Ibidem, pags 155 e seg e 159
11. Ac. da Relação do Porto de 18/12/2013, Processo 7571/11.4TBMAI.P1.dgsi.Net
12. Cfr. Ac. Da Relação de Guimarães de 30/1/2014, Processo 273733/11.1YIPRT.G1. e Ac. Da Relação de Coimbra de 24/2/2015, Processo 145/12.4TBPBL.C1, in dgsi.Net
13. Abrantes Geraldes, idem, pags 155-156
14. Abrantes Geraldes, in ob. cit., págs. 160 e segs.
15. Ac. STJ. 29/10/2015, Proc. n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, in base de dados.
16. Base da dados da DGSI, pronunciando o Ac. STJ, de 29/10/2015, Proc. 233/09.4TBVNG.G1.S1,
17. Cfr. Vaz Serra, “Provas, Direito Probatório Material”, in B.M.J. n.º 112, pág. 155-157 e Antunes Varela, “Manual de Processo Civil”, 2.ª Ed., 2004, Coimbra Editora, pág. 582-584.
18. Ac. da Relação do Porto de 19/9/2000, in CJ, 2000, 4º, 186 e Apelação Processo nº 5453/06.3, cujo relator foi o Ilustre Desembargador Dr. Ataíde das Neves
19. Acórdão da Relação de Guimarães de 16-02-2017 Processo nº3300/15.1.T8GMR-J.G1, in www.dgsi.net
20. Cfr. Ac. Da Relação de Évora de 3/11/2016, processo 1070/13. dgsi.Net
21. Ac. Do STJ de 3/5/2016, Processo 145/11, Sumários, Maio/2016, p.3
22. Ana Prata (Coord.) e outros, Código Civil Anotado, Vol. I, 2017, Almedina, pág. 638
23. Ana Maria Taveira da Fonseca, Responsabilidade civil pelos danos causados pela ruína de edifícios ou outras obras, em Novas Tendências da Responsabilidade Civil, 2007, pags 85 a 145
24. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª Edição, Coimbra Editora, pág. 494
25. Vaz Serra, RLJ, 104º, pág. 124.
26. Abílio Neto, Código Civil Anotado, 16ª Edição, 2009, Ediforum Edições Jurídicas, Lda, pág. 491.
27. Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 14.ª Ed., 2017, Almedina, pág. 316 e seg.