Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
CASO JULGADO
TERCEIROS PARA EFEITOS DE CASO JULGADO
NULIDADE DA VENDA REALIZADA EM EXECUÇÃO
LEGITIMIDADE DO AGENTE DE EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
Sumário
1- Os “terceiros” abrangidos pela força do caso julgado a que se reporta o art. 55º do CPC são: a) os adquirentes de coisa ou direito litigioso que, por ato inter vivos, adquiram essa coisa ou direito na pendência de ação declarativa tendo por objeto essa coisa ou direito e nela não se cuidam em habilitar; b) os litisconsortes passivos que tendo sido chamados ao processo mediante incidente de intervenção principal provocada, não cuidam em intervir. Nessas situações, a sentença que venha a ser proferida, opera caso julgado quanto a esses terceiros (arts. 263º, n.º 3 e 320º do CPC).
2- Tendo sido anulada a venda realizada numa execução, não obstante no despacho que anulou essa venda e que ordenou a restituição ao comprador do preço da venda assim anulada e o pagamento de uma indemnização a esse comprador, não se identifique expressamente quem são os obrigados a essa restituição e ao pagamento dessa indemnização, esses obrigados estão, à partida e automaticamente, definidos, tratando-se dos sujeitos que são “as partes” da execução em que aquele despacho foi proferido.
3- O agente de execução é um auxiliar da justiça do Estado, escolhido pelo exequente.
4- O agente de execução onde foi proferido aquele despacho que anulou a venda e que condenou à restituição do preço e ao pagamento da indemnização, não é “parte” dessa execução.
5- Tendo a execução de ser delimitada, objetiva e subjetivamente pelo título executivo, e não sendo o agente de execução “parte” da execução onde aquele despacho foi proferido, aquele é parte ilegítima na execução instaurada pelo comprador que viu a venda assim anulada, que com base naquele despacho (título executivo), o demanda, com vista à cobrança coerciva do preço cuja restituição àquele é determinada nesse despacho e para cobrança coerciva da indemnização fixada nesse despacho.
Texto Integral
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
I. RELATÓRIO.
Recorrente:- Empresa A – Imóveis, Lda. Recorrida- José.
*
Empresa A – Imóveis, Lda., instaurou execução para pagamento de quantia certa, contra José, agente de execução, Banco X, S.A. e Manuel, dando à execução o despacho proferido em 19/03/2012, nos autos de Proc. n.º1844/06.5TBBRG-A, que consta do seguinte teor:
“Nos presentes autos executivos foi penhora ¼ do direito de propriedade sobre o prédio urbano, identificado no auto de penhora de fls. 25 e seguintes.
Realizou-se a venda judicial desse direito, em 28 de setembro de 2010, tendo sido a proposta apresentada por “Empresa A – Imóveis, Lda.”
Veio posteriormente a adquirente “Empresa A – Imóveis, Lda.” requerer a anulação da venda porquanto constatou que existe um contrato de arrendamento que tem por objeto o prédio urbano em causa, que se encontra efetivamente ocupado, e que não foi publicitado; que se tivesse conhecimento desse contrato não teria oferecido aquela proposta de aquisição do direito penhorado e que se frustrou o destino que tinha para o dito imóvel.
Requereu ainda a restituição da quantia de 250,00 euros, correspondente às despesas que suportou com o registo da aquisição.
O exequente e o “Banco X, S.A., opuseram-se ao deferimento da pretensão da adquirente, com os fundamentos de fls. 210 e seguintes e 218 e seguintes.
Foram juntos documentos, inquiridas testemunhas e tomado depoimento de parte aos executados.
O Sr. Solicitador de execução prestou esclarecimentos.
Cumpre apreciar e decidir.
Começando pelos esclarecimentos prestados pelo Sr. Solicitador de execução, este disse que quando afixou os editais o armazém estava ocupado, não sabendo explicar por quem.
As testemunhas Joaquim, legal representante da sociedade “EBA”, e Maria, proprietária de 50% do armazém, afirmaram que aquela empresa está instalada no armazém, pagando renda. Foi especialmente determinante o depoimento de Maria, isento e credível, sem interesse na decisão a proferir, e que afirmou que há muitos anos que recebe a renda do pavilhão, local onde a “EBA” arranjou os autocarros.
Foi ouvido AL, sócio da “Empresa A – Imóveis, Lda.”, que assegurou que se a Empresa A soubesse que o pavilhão estava arrendado não o teria adquirido.
Conjugados estes depoimentos com os documentos juntos aos autos, nomeadamente os recibos do pagamento das rendas, resulta que o pavilhão cujo direito de propriedade foi vendido nos autos (1/4 desse direito) encontra-se arrendado a terceiros, que ocupam efetivamente o local, e que esse arrendamento não foi dado a conhecer aquando da publicidade da venda.
A existência de um contrato de arrendamento sobre o imóvel não pode deixar de ser entendido como uma limitação do direito de propriedade vendido, que não foi publicitado e, portanto, conhecido no momento da realização da venda, e que excede os limites normais inerentes ao direito de propriedade.
Assim, o comprador, que apresentou uma proposta com base em anúncios e editais que omitiram a existência daquele contrato de arrendamento, pode requerer a anulação da venda, nos termos do disposto no art. 908º, n.º 1 do CPC, o que fez.
Pode ainda o comprador pedir a indemnização a que tem direito, tendo, no caso em mérito, pedido a restituição do que pagou, com juros, e o reembolso da quantia de 250 euros que suportou para registar a aquisição a seu favor.
Assim, decide-se:
- anular a venda judicial realizada no dia 28 de Setembro de 2010;
- restituir ao comprador o preço de 53.000,00 euros, acrescidos dos juros, contados a partir da data do depósito; e
- atribuir ao comprador a quantia de 250,00 euros, a título de indemnização pelas despesas que suportou com o registo da aquisição do direito a seu favor.
Custas do incidente pelo exequente e credor reclamante” – cfr. doc. de fls. 74 a 75.
Em sede de requerimento executivo, o exequente alegou o seguinte:
“Por decisão de fls., …, proferida no apenso A dos presentes autos com o n.º 1844/06.5TBRRG, que corre termos por este juízo e já transitada em julgado, foi decidido: - anular a venda judicial realizada no dia 28 de setembro de 2010; - restituir ao comprador o preço de 53.000,00 euros, acrescidos de juros, contados a partir da data do depósito; - atribuir ao comprador a quantia de 250,00 euros, a título de indemnização pelas despesas que suportou com o registo da aquisição do direito a seu favor, conforme documento que se junta em anexo.
Acontece que, não obstante terem sido notificados da decisão em mérito e terem sido, por várias vezes e meios, instados pela exequente, os executados não cumpriram a decisão proferida e não restituíram à compradora o preço de 53.000,00 euros, acrescidos dos respetivos juros, contados da data do depósito por parte da exequente, e não indemnizaram a exequente no montante de 250,00 euros.
Assim, devem os executados, solidariamente, à exequente o montante de 53.250,00 euros, a que necessariamente acrescerão os respetivos juros de mora sobre o valor de 53.000,00 euros contados à taxa legal desde a data do depósito (28/09/2010) e até efetivo e integral pagamento, ascendendo os já vencidos na presente data à quantia de 6.801,42 euros” – cfr. doc. de fls. 68 a 71.
O executado José, deduziu oposição à execução, invocando a inexistência de título executivo, alegando, em síntese, que aquele despacho que anulou a venda tem força meramente declarativa, na medida em que declara a invalidade da venda, com a consequente obrigação de restituição do preço à embargada e constituição da obrigação do pagamento a esta de uma indemnização, mas não determina quais os sujeitos passivos dessas obrigações, limitando-se, em sede condenatória, a impor o pagamento das custas ao exequente e a um credor reclamante.
Invoca a exceção da inexequibilidade do título executivo, sustentando não ser sujeito ativo, sequer passivo, da relação material e processual em discussão nos autos executivos onde se realizou aquela venda, mas simplesmente foi o agente de execução designado na respetiva ação executiva, inexistindo, quanto a ele, qualquer título executivo.
Mais invoca as exceções da sua ilegitimidade para a execução e da inexigibilidade, alegando os mesmos argumentos acabados de referir para sustentar estas invocadas exceções.
Finalmente, pede a condenação da exequente como litigante de má-fé, em multa e em indemnização, sustentando ter entregue ao exequente e aos credores reclamantes, entre os quais se contava o próprio Estado, representado pelo Ministério Público, o produto da venda há mais de dois anos, pelo que apenas estes são responsáveis pela restituição da quantia exequenda à embargante. Mais sustenta que ao instaurar a presente execução contra aquele, o exequente invoca factos que sabe serem falsos e faz dos meios processuais um uso reprovável.
Recebida a oposição, a exequente contestou-a, concluindo pela improcedência das exceções invocadas pelo opoente e pela improcedência do pedido de condenação daquela como litigante de má-fé.
Realizou-se audiência prévia, onde, uma vez frustrada a conciliação das partes, concedeu-se a palavra às últimas para alegarem, querendo, de facto e de direito, advertindo-as que o tribunal se propunha conhecer das exceções dilatórias invocadas e/ou de mérito.
Proferiu-se saneador, em que se julgou procedente a exceção da ilegitimidade do executado/embargante procedente e absolveu-se o mesmo da instância executiva, constando essa decisão da seguinte parte disjuntiva:
“Pelo exposto, na procedência da excepção dilatória da ilegitimidade do executado/embargante, José, decide-se absolver o mesmo da instância, declarando-se, desta forma, extinta a execução que contra o mesmo corre termos e a que se referem os presentes embargos de executado, com todas as legais consequências daí decorrentes, nomeadamente a do levantamento de todas as penhoras que, eventualmente, no seio dessa execução, hajam atingido o seu património.
Custas pela exequente/embargada”.
Inconformada com o assim decidido, a exequente vem interpor recurso, apresentando as seguintes conclusões:
A - No que se reporta à exequibilidade da sentença contra terceiros, dispõe o artº 55 do CPC que “A execução fundada em sentença condenatória pode ser promovida não só contra o devedor, mas ainda contra as pessoas em relação às quais a sentença tenha força de caso julgado.”. B - O facto de o recorrido não figurar no título executivo dado à execução não pode, por isso, levar à conclusão da sua ilegitimidade passiva, uma vez que, para além de ter ouvido no processo 1844/06.5TBBRG-A, sempre o recorrido se encontraria abrangido pelo âmbito da eficácia subjetiva do caso julgado. C - Tendo transitado em julgado a sentença, as entidades que receberam a parte do preço pago pela recorrente ficaram constituídos na obrigação de devolver/restituir à recorrente a parte do crédito que receberam em consequência da referida anulação. D - A execução a que se reportam os embargos de executado tem por base uma sentença judicial proferida em 19/03/2012, constante do sistema Citius com a referência 10081737, já transitada em julgado, no âmbito de um incidente deduzido pela aqui recorrente, enquanto compradora de um bem imóvel, no seio da ação executiva. E - Atento o efeito da decisão judicial em mérito já transitada em julgado, a obrigação de restituir o preço pago pela recorrida só poderá impender sobre todas as pessoas que beneficiaram com a distribuição do preço pago. F - No apenso A do Proc. nº 1844/06.5TBBRG-A, foi proferida sentença já transitada em julgado que decidiu anular a venda judicial realizada no dia 28 de Setembro de 2010, restituir ao comprador o preço de 53.000,00€, acrescidos de juros contados a partir da data do depósito; e atribuir ao comprador a quantia de 250,00€ a título de indemnização pelas despesas que suportou com o registo da aquisição do direito a seu favor. G- Não se pode pretender que esta sentença veja o seu alcance limitado à primeira estatuição que decidiu pela anulação da venda e fazer-se tábua rasa do restante no que respeita à restituição do preço. H - Em consequência da sentença dada à execução a venda em apreço foi efetivamente anulada e o Sr. Agente de execução procedeu a uma nova venda, tendo recebido novamente as respetivas custas e honorários, as quais saem precípuas do valor da execução. I - Tendo sido anulada a venda em causa e ordenada a restituição à aqui recorrente da quantia de 53.000,00€ naturalmente que são os beneficiários deste preço a quem incumbe a obrigação de restituir à recorrente este valor, nos termos que foram definidos na sentença dada à execução. J - O próprio regime da declaração de anulação previsto no artigo 289.º n.º 1 do Código Civil prevê que seja efectivamente realizada a restituição do preço da venda, objecto de anulação, à aqui Recorrente. K - A legitimidade passiva do recorrido vem quer do facto de ter sido ouvido e prestado esclarecimentos no processo apenso à execução com o nº 1844/06.5TBBRG-A que anulou a venda, quer pelo próprio efeito da abrangência do caso julgado da mesma decisão. L – A vinculação do recorrido à sentença de anulação tem de operar no seu todo e não apenas na parte que lhe convém, tal como dispõe o artº 55 do CPC. M - A douta decisão impugnada não pode manter-se, pois violou, entre outras, as disposições conjugadas dos artigos 53.º, 55º do CPC e do artigo 289.º do Código Civil, fazendo uma errada e incorreta apreciação dos preceitos em mérito.
*
O executado/opoente não apresentou contra-alegações.
*
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II- FUNDAMENTOS
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
No seguimento desta orientação, a única questão que é submetida à apreciação deste tribunal é se o tribunal a quo incorreu em erro de direito ao julgar procedente a exceção da ilegitimidade passiva do executado, José, para a execução e ao absolvê-lo da instância executiva.
**
A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos relevantes para a apreciação e decisão do presente recurso são os que constam do relatório elaborado e que acima se explanaram.
**
B- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Não sendo a obrigação voluntariamente cumprida pelo devedor e estando proibido o recurso à força própria com o fim de realizar ou assegurar o direito (art. 1º do CPC.), a lei processual civil coloca ao dispor do credor que disponha de título executivo, meios coativos tendo em vista obter a satisfação coerciva desse seu crédito.
Esses meios processuais são as “ações executivas”, as quais, no dizer do 10º, n.º 4 do CPC, são aquelas em que o credor requer as providências adequadas à realização coativa de uma obrigação que lhe é devida.
Acontece que não se destinando as ações executivas a discutir direitos, mas a executar o direito já definitivo, aquelas carecem de assentar no denominado “título executivo”. É assim que nos termos do n.º 5 daquele art. 10º, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva (art. 10º, n.º 5 do CPC).
O título executivo apresenta-se como requisito essencial da ação executiva uma vez que a execução apenas pode ser instaurada caso aquele seja existente, dado que é o título executivo que documenta os factos jurídicos que constituem a causa de pedir da pretensão deduzida pelo exequente e confere igualmente o grau de certeza exigido por lei para que sejam aplicadas medidas coercivas contra o executado.
O título executivo além de delimitar objetivamente a execução, também a delimita subjetivamente.
Com efeito, o art. 53º, n.º 1 do CPC estabelece, como regra geral em sede de legitimidade para a execução, que esta tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figura como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor.
Além de ser requisito essencial para a instauração da ação executiva, o título executivo é também condição suficiente uma vez que, pela força probatória especial que lhe é imanente, o título executivo apresenta os requisitos externos da exigibilidade que a lei prevê, de modo que verificados que sejam esses requisitos, presume-se a existência do direito que o título corporiza, legitimando o exercício “da ação executiva de forma abstrata”. Essa presunção apenas pode ser afastada pela prova da inexigibilidade ou da inexistência do direito, a alegar e provar pelo executado em sede de oposição à execução(1).
Sintetizando, nas palavras expressivas de Lebre de Freitas, o ponto de partida da ação executiva é o “acertamento”, “pois a realização coativa da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjetivos e objetivos) da relação jurídica de que ela é objeto” e é o título executivo que contém esse acertamento, posto que é ele que determina o objeto da execução, assim como a legitimidade ativa e passiva para a ação executiva e é, também, em face deste que se verifica se a obrigação é certa, líquida e exigível (2).
O título executivo realiza, assim, uma tripla função.
Por um lado, determina o fim da execução, estabelecendo, em função da obrigação que encerra, se a execução tem por finalidade o pagamento de quantia certa, a entrega de coisa certa ou a prestação de facto (art. 10º, n.º 6 do CPC).
Por outro lado, o título executivo estabelece os limites da execução, não sendo legítimo ao exequente apelar à relação causal ou a uma eventual obrigação hipotética implícita para, desse modo, suprir eventuais insuficiências ou imprecisões do título executivo, uma vez que a força probatória especial que a lei confere ao título reside no documento (e não no documentado) e decorre da circunstância deste escrito cumprir as formalidades legalmente exigidas para ser havido como título executivo e daí que a obrigação exequenda tenha de estar consubstanciada no próprio título executivo, sendo irrelevante tudo aquilo que o exequente alegue no requerimento executivo e que o extravase.
Finalmente, o título executivo delimita subjetivamente a execução.
Acrescente-se que o art. 703º do CPC, elenca, de forma taxativa, os títulos executivos que podem servir de base à execução, contando-se, nesse elenco, no que ao caso presente interessa, as “sentenças condenatórias”.
O título executivo que serve de base à presente execução é o despacho, transitado em julgado, proferido em 19/03/2012, no âmbito dos autos de execução para pagamento de quantia certa, que anulou a venda judicial realizada em 28/09/2010, mediante o qual o aqui exequente comprou ¼ indiviso do direito de propriedade que incide sobre um prédio urbano, direito esse penhorado no âmbito dessa execução, e que determinou, como consequência dessa anulação, a restituição à exequente do preço de 53.000,00 euros pago por essa compra anulada, acrescido de juros, contados a partir da data do depósito daquele preço e, bem assim que lhe arbitrou a quantia de 250,00 euros, a título de indemnização pelas despesas que suportou com o registo daquele direito em seu nome, processo executivo esse em que o aqui executado e opoente desempenhava as funções de agente de execução à data daquela venda assim anulada.
Precise-se que embora o art. 703º, n.º 1, al. a) fale em “sentenças condenatórias”, é pacífico na doutrina e na jurisprudência que este conceito tem um sentido amplo, abrangendo não só as sentenças condenatórias strictu sensu, isto é, as proferidas numa ação declarativa de condenação, mas, também, as homologatórias, em que o juiz se limita a sancionar a composição dos interesses em litígio pelas partes (os denominados “títulos parajudiciais” (3)), as homologatórias da partilha, os despachos e outras decisões ou atos de autoridade judicial que condenem no cumprimento duma obrigação, assim como as decisões de tribunais arbitrais (4).
Deste modo, não merece dúvidas que o despacho que determinou a anulação da venda e determinou a restituição do preço à exequente, acrescida de juros e, bem assim que lhe fixou a indemnização nos termos acima referidos, embora seja um despacho – e não uma sentença, conforme pretende a recorrente suceder -, porque nele expressamente se condena à restituição à exequente do preço pago pela última pela aquisição do direito cuja venda anulou, acrescido dos juros e da indemnização -, assume a natureza de “sentença condenatória” para efeitos do disposto no art. 703º, n.º 1, al. f) do CPC., podendo, consequentemente, servir de título executivo à presente execução, conforme serve, pelo que a questão que se suscita é se em função desse título executivo, o executado, aqui opoente, José, detém legitimidade passiva para a execução e, consequentemente, para ser executado para pagamento das quantias que naquele título condenou fossem restituídas (o preço da venda anulada) e pagas (juros sobre o preço a devolver e indemnização) à exequente.
Precise-se que diversamente da exceção da inexistência de título executivo, é a falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, a que alude a al. c) do art. 729º do CPC.
Nos termos do disposto no art. 577º, al. e) daquele Código, a ilegitimidade de uma das partes consubstancia exceção dilatória, pelo que o fundamento de oposição da ilegitimidade passiva invocado pelo opoente integra-se no elenco de oposição à presente execução para entrega de coisa certa.
Como ficou dito, estabelece o art. 53º, n.º 1 do CPC. que a execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figura como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título figura como devedor.
Este preceito legal enuncia a regra geral da legitimidade para a ação executiva, conferindo-a a quem no título figura como credor e como devedor.
Note-se que o texto legal não afirma que é parte legitima como exequente o credor e como executado o devedor; não o diz nem tinha de o dizer, sob pena de confundir a questão da legitimidade com a da procedência. É que o exequente e o executado podem ser partes legítimas, pese embora não serem credor e devedor.
A legitimidade deriva, em princípio, da posição das partes face ao título. Porque na ação executiva se visa obter a tutela efetiva do direito a uma prestação que se encontra, em definitivo, fixada, o interesse direto em demandar e o interesse direto em contradizer não radica nos sujeitos que são titulares da relação material controvertida, mas antes quem no título figura como credor e como devedor.
Deste modo, enquanto na ação declarativa “há que indagar da posição das partes em face da pretensão, o que implica averiguar a titularidade, real ou meramente afirmada pelo autor, da relação ou outra situação jurídica material em que ela se funda e dá por vezes lugar a dificuldades de distinção perante a questão de mérito, na ação executiva a indagação a fazer resolve-se no confronto entre as partes e o título executivo: têm legitimidade como exequente e executado, respetivamente, quem no título figura como credor e devedor” (5).
Mas nem sempre é parte legítima como exequente ou como executado a pessoa a quem o título atribui a posição de credor ou devedor. É que os arts. 54º e 55º do CPC estabelecem desvios à regra geral da determinação da legitimidade para a ação executiva em que o legislador, por razões de economia processual, em determinados casos, optou por derrogar o princípio da legitimidade formal.
O n.º 1 do art. 54º do CPC estabelece o primeiro caso de desvio àquele regra geral, ao estabelecer que: “tendo havido sucessão no direito ou na obrigação, deve a execução correr entre os sucessores das pessoas que no título figuram como credor ou devedor da obrigação exequenda; no próprio requerimento para a execução o exequente deduz os factos constitutivos da sucessão”.
Conforme se tem entendido, o termo “sucessão” constante desta disposição deve ser interpretado não no sentido estrito de sucessão por morte, mas como abrangendo todos os casos em que o direito tenha sido transmitido. É esta interpretação ampla que corresponde à finalidade da disposição em causa que, como já afirmando, assenta no princípio da economia processual (6).
Note-se que esta sucessão tanto pode ocorrer antes da propositura da ação executiva ou na pendência desta. No primeiro caso, em consonância com a parte final do n.º 1 do art. 54º do CPC, o exequente, no próprio requerimento para a execução, deduz os factos constitutivos da sucessão. Se a sucessão ocorrer durante a pendência da execução, torna-se necessário suscitar o incidente de habilitação nos termos dos arts. 351º a 357º do CPC.
O segundo caso de desvio à regra geral de determinação da legitimidade para a ação executiva encontra-se enunciado no art. 54º, n.ºs 2 a 4 do CPC. Estes normativos regem sobre os casos em que o crédito exequendo beneficia de garantia real constituída sobre bens de terceiros.
Nessas situações, apesar do exequente não ter título executivo contra esses terceiros, proprietários do bem onerado com a garantia real que garante o crédito exequendo, caso aquele pretenda penhorar o bem onerado por essa garantia real, a lei permite-lhe que, ab initio, instaure a execução contra esse terceiro proprietário do bem onerado com a garantia real (apesar, reafirma-se, deste não ser “devedor” do exequente), isolada ou conjuntamente, com o seu devedor (n.ºs 2 e 3) ou dirija essa execução que instaurou contra o devedor, já no decurso desta, também contra o terceiro caso pretenda penhorar o bem onerado com a garantia real.
Finalmente, o terceiro e último caso de desvio àquela regra geral encontra-se enunciado no art. 55º do CPC, em função do qual “A execução fundada em sentença condenatória pode ser promovida não só contra o devedor, mas ainda contra as pessoas em relação às quais a sentença tenha força de caso julgado”.
Como é entendimento, cremos maioritária, os “terceiros abrangidos pelo caso julgado”, a que se reporta esta norma são: a) os adquirentes de coisa ou direito litigioso que, por ato inter vivos, na pendência da ação declarativa, não cuidem em nela se habilitar, em relação aos quais, nos termos do art. 263º, n.º 3 do CPC, a sentença que vier a ser proferida, nessa ação declarativa, não deixa de produzir os seus efeitos e, consequentemente, de operar caso julgado quanto a esses terceiros adquirentes da coisa ou direito litigioso, não obstante estes não se tenham habilitado nessa ação onde é proferida aquela sentença; e b) os litisconsortes, que tenham sido chamado ao processo, e que não tenham nele intervindo. A sentença que venha a ser proferida nesse processo, nos termos do disposto no art. 320º do CPC, não deixa de produzir efeitos quento a esses litisconsortes chamados, não obstante estes não tenham intervindo no processo na sequência desse chamamento.
Neste sentido pronuncia-se José Lebre de Freitas (7), em anotação a este normativo, a que correspondia o art. 57º do anterior CPC, onde escreve: “A regra geral em matéria de eficácia subjetiva do caso julgado é que este apenas vincula as partes na ação (…). A sentença condenatória constitui, assim, desde logo, caso julgado contra as pessoas que hajam sido por ela condenadas, quer tenham intervindo logo inicialmente na ação, quer nela tenham intervindo posteriormente a título principal, espontaneamente (…) ou não (…). Existem situações, porém, em que a eficácia subjetiva do caso julgado se estende, do lado passivo, a pessoas não condenadas pela sentença, as quais ficam vinculadas às consequências e aos efeitos da decisão. É o caso do chamado à intervenção principal que, sendo titular de situação suscetível de gerar litisconsórcio passivo, voluntário ou necessário (…), ou pluralidade subjetiva subsidiária passiva (…), não intervém na causa, não se devendo ter constituído como parte (…). A sentença que venha a ser proferida constitui caso julgado relativamente ao chamado por imposição do art. 328º, n.º 2” (atual art. 320º). “É também o caso do adquirente da coisa ou direito litigioso na pendência da ação declarativa, sem a subsequente intervenção no processo” (8).
No caso, conforme pondera o opoente, no despacho que serve de título executivo à presente execução e que anulou a venda, condenando na restituição do preço da venda anulada à exequente, acrescida de juros, e que lhe arbitrou uma indemnização, não se identifica expressamente quem são os obrigados ao pagamento da quantia cuja restituição ordena e da indemnização fixada ao exequente.
No entanto, tendo aquele despacho condenatório sido proferido no âmbito da anulação da venda realizada numa execução em que o aqui opoente era agente de execução, tendo esse despacho condenatório sido proferido no âmbito do incidente de anulação da venda ali realizada, o qual correu termos por apenso àquela execução, estão automaticamente e à partida definidos os sujeitos que assim foram condenados por aquele despacho condenatório, entretanto transitado em julgado.
Esses sujeitos são as “partes” daquela execução onde aquele despacho condenatório foi proferido, “partes” essas que, consequentemente, são quem, em função do título executivo que serve de base à presente execução – o despacho condenatório – são abrangidas pela condenação que encerra de restituírem ao exequente o preço da venda anulada, acrescido dos juros fixados nesse despacho condenatório e da indemnização nele arbitrada à exequente.
A questão que se encontra submetida a esta Relação da ilegitimidade passiva do executado e opoente José para a execução passa, assim, por se determinar se este era “parte” daquela execução onde foi proferido aquele despacho condenatório, resposta esta que, antecipe-se, desde já, sem dúvida alguma, merece resposta negativa.
Na verdade, conforme é pacífico entre exequente e opoente, o executado e opoente, José, não detém naquela execução a qualidade de exequente, sequer de executado, sequer, ainda, de credor reclamante, mas era agente de execução à data da venda anulada.
Não obstante não haja entendimento uniforme na jurisprudência sobre o estatuto jurídico do agente de execução, na medida em que há quem entenda que o agente de execução é uma espécie de mandatário do exequente, embora a sua missão esteja também dotada de características de oficialidade pública, na medida em que aquele está ao serviço dos interesses do credor exequente, sendo por ele escolhido de entre os agentes de execução registados em lista oficial (art. 720º, n.º 1 do CPC) (9), posição esta que não subscrevemos, não sendo para nós o agente de execução um mandatário do exequente, com poderes de representação deste, mas um auxiliar de justiça do Estado, escolhido pelo exequente (10), quer se adote uma ou outra dessas posições, necessário é concluir que o agente de execução, ou seja, o aqui oponente José, não foi parte da execução onde aquela venda foi anulada pelo despacho exequendo e, consequentemente, que esse despacho exequendo que anulou a venda e determinou a restituição do preço ao exequente e arbitrou ao último a indemnização de 250,00 euros, não o condenou, pelo que é manifesta a ilegitimidade passiva do executado e oponente José para a presente execução.
Note-se que o argumento da exequente de que aquele executado foi quem recebeu o preço da compra anulada, que o mesmo recebeu os seus honorários e prestou declarações no âmbito do incidente de anulação da venda, que culminou com a prolação do despacho que serve de título executivo à presente execução, além da invocação pelo mesmo dos efeitos da anulação enunciados no art. 289º do CC., esquece que não é legítimo àquela apelar à relação causal que subjaz ao título executivo ou a uma eventual obrigação hipotética para suprir eventuais imprecisões ou insuficiências desse título, tendo, necessariamente, a execução de ser delimitada, objetiva e subjectivamente pelo documento, isto é, pela despacho que serve de título executivo, do qual resulta que aquele opoente não foi parte da execução, não figurando, consequentemente, desse título como devedor daquele, apenas reforça o que se vem dizendo.
É que caso o opoente fosse “parte” da execução, que não é, aquele não podia ter prestado “esclarecimentos no âmbito do incidente de anulação da venda” que culminou com a prolação do despacho condenatório acima referido e que serve de título executivo à presente execução, posto que, como é consabido, as “partes”, nos processos em que detêm esse estatuto processual de “parte”, apenas podem prestar depoimento de parte (cfr. art. 452º do CPC) ou requerer a prestação de declarações de parte (art. 466º do CPC).
Quanto aos honorários que o oponente recebeu, trata-se da remuneração do trabalho daquele.
Se o oponente não entregou o produto da venda às partes da execução, ou seja, a quem devia ser entregue no âmbito daquela – exequente e eventuais credores reclamantes que gozassem de preferência no pagamento pelo produto daquela venda – e se aquela remuneração de que se pagou não lhe era devida e/ou se incorreu em qualquer incumprimento dos seus deveres, enquanto agente de execução, constitutiva de responsabilidade profissional do opoente para com a exequente, é matéria que está por discutir em eventual ação que o exequente entenda propor contra aquele e que não foi discutida no incidente de anulação da venda que culminou com a prolação do despacho condenatório que serve de título executivo à presente execução.
Argumenta a recorrente que o caso julgado operado por aquele despacho condenatório é oponível ao opoente nos termos do disposto no art. 55º do CPC, mas sem evidente razão.
É que, conforme acima ficou dito, o campo de aplicação deste normativo, respeita, única e exclusivamente, aos casos em que na pendência de uma ação declarativa, um terceiro adquire a coisa ou o direito em discussão nessa ação e não cuida em se habilitar na mesma e, bem assim aos casos em que entre as partes passivas (demandadas) de uma açã declarativa e terceiros interceda uma relação de litisconsórcio e esses terceiros sejam chamados a essa ação, mediante o competente incidente da intervenção provocada, e nela não intervêm. Em todos esses casos, a sentença que venha a ser proferida no âmbito dessa ação declarativa, vincula esses terceiros e opera caso julgado quanto aos mesmos.
Acontece que no caso presente não se verifica nenhuma das situações acima referidas e a que se reporta aquele art. 55º do CPC.
Com efeito, o opoente e executado José, no âmbito do incidente de anulação da venda que realizou no processo executivo, não adquiriu, a qualquer título, os bens objeto dessa venda. Acresce que aquele opoente era agente de execução no processo executivo em que aquela venda anulada foi realizada, não intercedendo entre aquele e os aí executados qualquer relação litisconsorcial, e muito menos, foi chamado a essa execução por via dessa relação. Aliás, se assim fosse, automaticamente, ficaria impedido de exercer as funções de agente de execução nessa execução, onde adquiria a qualidade de “parte” por via desse chamamento, mais concretamente, de executado.
Aqui chegados, resulta do que se vem dizendo, improcederem todos os fundamentos recursórios invocados pela embargante, impondo-se confirmar a decisão recorrida.
**
Decisão:
Nestes termos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a apelação integralmente improcedente e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.
*
Guimarães, 30 de novembro de 2017
(Dr. José Alberto Moreira Dias)
(Dr. António José Saúde Barroca Penha)
(Dra. Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha)
1. Alberto dos Reis, “Código Civil Anotado”, vol. I, 3ª ed., Coimbra Editora, 1982, pág. 24. 2. Lebre de Freitas, “A Ação Executiva À Luz do Código Revisto”, 3ª ed., págs. 31 e 33. 3. Lebre de Freitas, “Ação Executiva”, 3ª ed., pág. 43 4. Alberto dos Reis, in “Processo de Execução”, vol. I, pág. 127; Lebre de Freitas, in ob. cit., págs. 42 a 44; Lopes Cardoso, in “Manual da Ação Executiva”, 3ª ed., págs. 25 a 29. Já se discute se as decisões judiciais são exequíveis apenas quando contenham uma condenação expressa ou se essa exequibilidade é extensível aos casos em que a condenação contida nessas decisões judiciais é meramente implícita – para maiores desenvolvimentos sobre esta problemática, vide Delgado de Carvalho, in “Ação Executiva para Pagamento de Quantia Certa”, 2ª ed., págs. 311 a 319. 5. Lebre de Freitas, “A ação Executiva”, 3ª ed., pág. 104. 6. Ac. STJ. 19/9/2002, Rev. n.º 2145/02-2º, Sumários, 9/2002; 19/06/2012, Proc. 82-C/2000.C1.S1; RG. 26/09/2013, Proc. 9705/10.7TBOER-A.G1; RP. 24/02/2014, Proc. 2747/10.4YYPRT-B.P1; R.C. 08/04/2014, Proc. 434/12.8TBVIS-B.C1, todos in base de dados. A nível doutrinário: Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, págs. 112 a 113; e “A Ação Executiva”, 3ª ed., págs. 104 e 105; Marco Carvalho Gonçalves, in ob. cit., págs. 166 e 167. 7. “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 1999, págs. 116 e 117. 8. Reafirmando esta sua posição, Lebre de Freitas, in “A Ação Executiva à Lua do Código Revisto”, 3ª ed., págs. 108 a 111. No mesmo sentido Lopes Cardoso, “Manual da Ação Executiva”, 1992, págs.105 a 107. Ainda Marco Gonçalves, in “Lições de Processo Civil Executivo”, 2016, págs.171 a 172, que restringe a aplicação do campo do preceito ao adquirente, não habilitado de direito ou coisa litigiosa. No entanto, trata-se apenas de uma aparente divergência com os autores anteriores. É que este autor sustenta e, a nosso ver, bem, que nos casos de intervenção principal provocada, a partir do momento em que o terceiro é chamado, sendo citado para a ação, a fim dela intervir como interveniente, aquele perda a qualidade de “terceiro” e passa a ter o estatuto processual de “parte”, logo, conclui este autor, o preceito não o abrange, porque como “parte” que é, independentemente de ter intervindo ou não na ação para que foi chamado, a sentença que venha a ser proferida nesses autos, é-lhe oponível e opera caso julgado quanto ao mesmo. Logo, acaba por sustentar a mesma posição que os anteriores autores, com esta anotação semântica. 9. RG. de 12/09/2013. Proc. 342/12.2TJVNF.G1, in base de dados da DGSI. 10. José Lebre de Freitas, in “A Ação Executiva Depois da Reforma”, 5ª ed., 2009, pág. 27 e 28, onde escreve: “Tal com o huisser francês, o solicitador de execução é um misto de profissional liberal e funcionário público, cujo estatuto de auxiliar da justiça implica a detenção de poderes de autoridade no processo executivo”. Miguel Teixeira de Sousa, “Aspetos Gerais da Reforma da Acção Executiva”, Cadernos de Direito Privado, n.º 4, Outubro/Dezembro de 2003,págs. 3-25, onde se lê: “Deste enquadramento legal podem retirar-se várias conclusões. Uma delas – diretamente decorrente da circunstância de o solicitador de execução – é a de que este solicitador, apesar de ser uma entidade privada, exerce funções públicas, pelo que se está perante um dos casos de exercício privado de funções públicas”. Ac. RG. de 25/10/2012, Proc. 294/10.3TBCT.G1, in base de dados da DGSI: “o solicitador de execução é um auxiliar da justiça (…). Os atos ilícitos cometidos na referida atuação implicam a responsabilidade civil do Estado; Já no Ac. do STJ. de 11/04/2013, Proc. 5548/09.9TVLSNB.L1.S1, na mesma base de dados, pondera-se: “Embora as atribuições do agente de execução não se circunscrevam às que são típicas de um profissional liberal, envolvendo também atos próprios de oficial público, para efeitos de responsabilidade civil emergem os aspetos de ordem privatística que resultam, nomeadamente, da forma de designação, do grau de autonomia perante o juiz do regime de honorários, das regras de substituição e de destituição, da obrigatoriedade de seguro ou do facto de o recrutamento, a nomeação, a inspeção e a ação disciplinar serem da competência de ima entidade que não integra a Administração” e onde se conclui, contrariamente ao que se tinha concluído no acórdão anteriormente referido, “a responsabilidade civil que aos agentes de execução for imputada, no âmbito do exercício da sua atividade, obedece ao regime geral, e não ao regime da responsabilidade civil do Estado e demais entidades públicas previsto no Dec. Lei n.º 48.051, de 21/11/1967 (entretanto substituído pela Lei n.º 67/07, de 31/12)”.Note-se que o atual vigente Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, aprovado pela Lei n.º 154/2016, de 14/01, veio dar cobertura expressa à posição por nós perfilhada e acima explanada, ao estatuir expressamente no art. 162º, n.º 1 que “o agente de execução é o auxiliar da justiça que na prossecução do interesses público, exerce poderes de autoridade pública no cumprimento das diligências que realiza nos processos de execução, nas notificações, nas citações, nas apreensões, nas vendas e no âmbito de processos judiciais, ou em atos de natureza similar que, ainda que não tenham natureza judicial, a estes podem ser equiparados ou ser dos mesmos instrutórios”, acrescentando expressamente no seu n.º 3, que “o agente de execução, ainda que nomeado por uma das partes processuais, não é mandatário deste, nem o representa”.