SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CESSAÇÃO DO PRAZO DA SUSPENSÃO
Sumário

Decretada a suspensão da instância, por um determinado prazo, a requerimento das partes, a suspensão cessa quando esse prazo tiver decorrido, sem necessidade despacho a determinando o prosseguimento dos autos.

Texto Integral

Acordam os Juízes que constituem a 1.ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

RELATÓRIO

No inventário para partilha dos bens do extinto casal constituído pelas ora partes, cujo o casamento foi dissolvido por divórcio, veio o ora Autor Á… reclamar da relação de bens apresentada pela ora Ré, A…, defendendo que o bem sob a verba n.º 13, um prédio com rés-do-chão e andar sito na freguesia de Arcozelo, Ponte de Lima, não é em comum do casal, pois que lhe foi doado por seus pais.

No mesmo processo de inventário, decidiu-se remeter os interessados para os meios comuns, no que concerne á exclusão da dita verba n.º 13, nos termos do art.º 1350.º n.º 1 do CPC.

Na sequência de tal decisão foi instaurado o presente processo sumário pelo Autor, que demandou a Ré, pedindo, para além do mais, que se declare que o prédio de rés-do chão e andar, sito na freguesia de Arcozelo, Ponte de Lima é bem próprio dele Autor.

A Ré veio então requerer a suspensão da instância do presente processo sumário, uma vez que, no âmbito do processo de inventário os interessados acordaram na suspensão da instância, por seis meses, quer do inventário quer da presente acção, conforme certificado na acta da conferência.

Sobre tal requerimento foi proferido o seguinte despacho:

“ Se assim é, suspendo a presente instância por 6(seis meses), com início em 6 de Junho de 2013.sic”.

A 3 de Março de 2014, veio o Autor requerer o prosseguimento dos autos.

Sobre tal requerimento recaiu o seguinte despacho:

Dê-se cumprimento ao previsto no n.º 4 do art.º 5.º da Lei n.º 41/2013 de 26 de Junho.

Por entender que a instância ainda estava suspensa uma vez que tal suspensão só cessaria quando for levantada, defendeu a Ré que ainda não tinha terminado a fase dos articulados requerendo que se desse sem efeito o despacho anterior e que se declarasse o levantamento e o prosseguimento da instância, começando então o prazo legal para a Ré deduzir a sua contestação.

Sobre tais requerimentos foi proferido o seguinte despacho:

Na verdade assim é.

Enveredamos pela posição assumida pela Ré.

“Efetivamente entendemos que tribunal deveria proferir despacho expresso no sentido de que a instância deixou de ficar suspensa.

Assim para que dúvidas não restem, decido declarar a instância não suspensa. Dou sem efeito o despacho proferido a fIs. 170.

Tudo isto em abono dos princípios processuais da certeza, segurança e igualdade de armas.”

Notifique.

Inconformado, o Autor interpôs recurso de apelação apresentando alegações de onde se extrem as seguintes conclusões:

1) Vem o presente recurso interposto do Douto Despacho proferido noautos em 26/03/2014, na parte em que decidiu considerar a instâncianão suspensa, deu sem efeito o despacho proferido a fls. 170 e, econsequência, admitiu a contestação apresentada pela Ré.
2) Por notificação electrónica expedida via Citius em 01/07/2013, foram apartes notificadas do despacho com o seguinte teor: “Se assim ésuspendo a presente instância por 6 (seis) meses com início em 6 dJunho de 2013. Sic.”
3) Tal como resulta do despacho acima referido, em 06/06/2013 iniciou-se o período de suspensão da instância, por um período de 6 (seis) meses.
4) Por estar em causa um período de suspensão igual a 6 (seis) meses, a contagem desse período de suspensão não se suspendeu no período deférias judiciais, por força do disposto no art. 144.º, n.º 1 do CPC 201(actual art. 138.º, n.º 1 do CPC 2013).
5) O período de suspensão terminou, pois, em 6 de Dezembro de 2013.
6) Ora, o Recorrente entende que, tendo terminado o período de suspensão em 06/12/2013, retomou-se no dia seguinte a contagem do prazo para aRé apresentar a contestação, já que um tal facto não dependia ddespacho prévio a decretar o termo do período de suspensão.
7) E entende, por isso, que a apresentação da contestação, pela Ré, e31/03/2014 peca por extemporânea.
8) Com efeito, de acordo com o disposto no art. 284.º, n.º 1, al. c) do CP2012 – actual art. 276.º, n.º 1, al. c) do CPC 2013 -, quando o Tribunadecreta a suspensão da instância a requerimento das partes, a suspensão cessa “quando tiver decorrido o prazo fixado”.
9) Assim, ao considerar que o tribunal deveria “proferir despacho expresso no sentido de que a instância deixou de ficar suspensa” e ao “declararainstância não suspensa”, o Douto Despacho recorrido violou adisposições do art. 284.º, n.º 1, al. c) do CP 2012 – actual art. 276.º, n.1, al. c) do CPC 2013.
10) Deve, pois, ser revogado, mantendo-se o despacho de fls. 170, quordenou a notificação das partes para apresentarem prova, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 4 do art. 5.º da Lei n.º 41/2013, de 26 deJunho, com o consequente desentranhamento da contestação apresentada pela Ré.

A Ré respondeu às alegações, defendendo que não cabe apelação autónoma do despacho recorrido. Sem prescindir, pugna pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO
OBJECTO DO RECURSO
Considerando que o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, as questões a decidir são as seguintes:
Admissibilidade do recurso;
Quando cessa a suspensão da instância decretada nos autos.

A factualidade a ter em conta na decisão é a descrita no relatório.

DECIDINDO
1.Da admissibilidade do recurso.
Ao presente recurso aplicam-se as regras do Novo Código de Processo Civil (art.º 5.º n.º da Lei 41/2013, de 26 de Junho).
Nos termos do art.º 644.º do n.º 1 do CPC em vigor, cabe recurso de apelação da decisão da primeira instância que ponha termo á causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente e ainda do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou alguns dos réus, quando a algum ou alguns dos pedidos.
São também susceptíveis de recurso de apelação autónoma, as decisões tipificadas no n.º 2 do mesmo artigo.
As demais decisões apenas podem ser impugnadas juntamente com o recurso da decisão final, ou se este não existir (por não ser admissível ou por não ter sido deduzido) em recurso único a interpor depois de a mesma transitar em julgado, se a impugnação tiver interesse autónomo para a parte ( n.º 4).
No caso concreto, a impugnação da decisão em crise, pode por em causa, directamente, a admissibilidade ou a rejeição da contestação deduzida pela Ré, pois que, a questão de saber se a contestação foi deduzida no prazo legal está intimamente ligada á questão objecto do recurso, ou seja, saber quando cessa a suspensão da instância.
Assim, entendemos, como defendeu o apelante, que o despacho em causa pode ser impugnado autonomamente, nos termos da alínea d) do n.º 2 do art.º 644.º segundo o qual cabe recurso de apelação do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado.
Deve pois admitir-se o recurso.

2.Quando cessa a suspensão da instância decretada nos autos a que se refere o presente recurso.

A suspensão da instância foi decretada ainda na vigência do pretérito Código de Processo Civil.
O regime da suspensão estava então regulado nos art.ºs 276 a 284.º.
O art.º 276.º do pretérito CPC elencava os casos em que a instância se suspende. Para além do mais dispõe a al c) do n.º 1 desta norma, que, “A instância suspende-se… quando o tribunal ordenar a suspensão. Por sua vez o art.º 279.º prevê precisamente os casos em qua a suspensão é determinada pelo juiz, aí se incluindo, a existência de causa prejudicial (n.º 1) e a suspensão da instância por acordo das partes( n.º 4).
Alega a recorrida que a suspensão da instância em causa se fundou na existência de causa prejudicial ainda pendente, a saber, o processo de inventário, em que são interessados as ora partes.
Não podemos concordar com tal entendimento.
Dispunha o art.º 279 n.º 1 do CPCque tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver pendente do julgamento de outra já proposta.

. Como refere Alberto dos Réis citando Manuel Andrade (Comentário… Vol III pag.269) só há verdadeira prejudicialidade e dependência quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental como teria de o ser, desde que a segunda causa não seja a reprodução, pura e simples da primeira. Mas nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos. Assim pode considerar-se prejudicial, em relação a um outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal

Por outras palavras, uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode destruir o fundamento ou a razão de ser desta.

Ora, tendo em conta que esta acção tem como finalidade apurar se um determinado bem é ou não património do extinto casal constituído pelo Autor e a Ré, parece-nos claro que, ao contrário do que defende a Ré, é o processo de inventário que depende do julgamento da presente causa, uma vez que a decisão a proferir interfere na partilha.

Ademais, o requerimento de suspensão da instância, fundou-se no acordo das partes.

A suspensão por acordo das partes deve ser decretada pelo Juiz, a requerimento daquelas. Em nosso entender, o despacho não é meramente homologatório, pois que, não obstante o acordo das partes, não fica precludido o poder-dever que o art.º 665.º do CPC de aferir a existência de um uso anormal do processo, quando disponha de elementos seguros no sentido de concluir que, através da paralisação da causa, se pretende obter um fim proibido por lei (cf. Lopes do Rego, Código de Processo Civil anotado, 2.ª edição, pag 281).
Ora, a pretérita leiprocessual previao “como e quando cessa a suspensão da instância, no n.º 1 alínea c)do art.º 284.º” quedeterminavaque a suspensão cessa, no caso da alínea d) do art.º 276, ou seja, quando a suspensão é decretada pelo juiz e não havendo causa prejudicial, quando tiver decorrido o prazo fixado, que no caso é de seis meses.
Acresce que, para a contagem do prazo há que ter em conta o disposto no art.º 144.º n.º 1, segundo o qual, “O prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do Juiz, é contínuo, suspendendo-se no entanto, durante férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processo que a lei considere urgentes.
O regime do Novo Código de Processo Civil, no que se refere á cessação da suspensão da instância, não difere do regime anterior conforme art.s269.º n.º 1 alínea c) e 276.º n.º 1 alínea c), sendo que, para a contagem do prazo deve ter-se em conta o actual art.º 138.º correspondente ao artigo 144. Do pretérito CPC.
Neste sentido já se decidiu no Acórdão do STJ de 22-01-2004 relatado pelo conselheiro Santos Bernardino publicado em www.dgsi.pt

Em face do exposto, e em conclusão:
Decretada a suspensão da instância, por um determinado prazo, a requerimento das partes, a suspensão cessa quando esse prazo tiver decorrido, sem necessidade despacho a determinando o prosseguimento dos autos.

DECISÃO
Por tudo o exposto, acordam os juízes desta secção cível em julgar a apelação procedente, determinando-se que a decretada suspensão da instância cessa quando o prazo de seis meses fixado pelo juiz tenha decorrido, contagem essa que deve ter em conta o disposto no art.º 144 do CPC, actualmente no art.º 138.º do NCPC, devendo o Tribunal recorrido retirar daíasdevidas consequências.
Custas pela apelada.
Guimarães, 23 de outubro de 2014
Isabel Rocha
Moisés Silva
Jorge Teixeira