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DESPEJO IMEDIATO
Sumário
A tramitação processual do incidente de despejo imediato, previsto no artigo 58 do Regime do Arrendamento Urbano e regulado genericamente nos artigos 302 e seguintes do Código de Processo Civil, não contempla "oposição" ou "resposta" à oposição deduzida pelo arrendatário ao requerimento que suscite o incidente.
Texto Integral
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto:
I - Nos autos da acção sumária nº..., pendentes no 1º Juízo Cível da Comarca de Gondomar, em que é Autor Ernesto... e são Réus Laurentino... e mulher Lucinda..., onde se pede a declaração de resolução de um contrato de arrendamento e o consequente despejo, apresentou o Autor um requerimento, ao abrigo do disposto no artigo 58º do RAU, a pedir o despejo imediato do local arrendado, com o fundamento de que os depósitos constituídos pelos Réus são irregulares e ineficazes perante o Autor, não podendo produzir, pois, a eficácia liberatória a que se propõem.
Notificados os Réus, vieram estes pugnar pela improcedência do incidente deduzido, tendo procedido à notificação do Autor, nos termos dos artigos 229º-A, nº 1, e 260º-A, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (CPC).
Veio, então, o Autor "responder" à resposta dos Réus, defendendo que "deve o requerimento apresentado pelos requeridos ser julgado improcedente, por não provado, e, consequentemente, ser decretado o despejo imediato e ordenada a entrega do locado ao requerente, livre de pessoas e bens".
Foi, de seguida, proferido despacho a ordenar o desentranhamento e a devolução deste "requerimento" do Autor, após o trânsito em julgado do despacho, pelo facto de a tramitação processual do incidente de despejo imediato, especialmente previsto no artigo 58º do RAU, e genericamente regulado nos artigos 302º e seguintes do CPC, não contemplar "oposição" ou "resposta" à oposição deduzida ao requerimento que suscite o incidente.
Inconformado com tal decisão, dela veio o Autor interpor recurso de agravo, o qual foi admitido.
O agravante apresentou as suas alegações, formulando conclusões que podemos sintetizar no seguinte:
1ª - O Réu tem vindo a efectuar dois depósitos, um definitivo e um condicional, sendo certo que o depósito tem que ser uno, indivisível e, na dúvida, pela importância mais alta.
2ª - O Réu, na oposição deduzida, alegou um facto que, a ser verdade, faz caducar o direito alegado pelo Autor, tendo-se, pois, defendido por excepção.
3ª - Os incidentes da instância devem seguir a tramitação prevista nos artigos 302º e seguintes do CPC.
4ª - O nº 3 do artigo 303º do CPC equipara as regras aplicáveis ao incidente quanto à falta de oposição tempestiva à matéria do deste, designadamente o efeito cominatório, às regras aplicáveis à causa em que aquele incidente se insere.
5ª - No caso dos autos, o incidente insere-se num processo comum, que segue a forma sumária, o qual é, sem dúvida, o processo cominatório pleno - artigo 784º do CPC.
6ª - Sendo certo que, no caso de o Réu se defender por excepção - como o Réu se defendeu na oposição -, tem o Autor o direito de responder, sob pena de a matéria excepcional se ter por confessada.
7ª - Resulta, pois, evidente que o Autor podia (e devia) ter respondido à oposição deduzida pelo Réu, requerendo que esta fosse julgada improcedente, por não provada, sob pena de a alegada excepção de caducidade ser julgada procedente.
8ª - Assim, deveria a resposta apresentada pelo Autor ser julgada admissível e considerada, assim fazendo-se a correcta aplicação do previsto no artigo 303º, nº 3, do CPC e no artigo 58º do RAU.
Contra-alegaram os agravados, defendendo a manutenção do despacho impugnado.
Foi proferido despacho de sustentação.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II - 1. A única questão aqui a dirimir é saber se pode ou não haver "resposta" à oposição apresentada pelos requeridos no incidente de despejo imediato deduzido ao abrigo do disposto no artigo 58º do RAU.
Como é por demais evidente, a resposta a esta questão só pode apontar no sentido negativo.
Desde logo, o próprio texto do citado artigo 58º conduz-nos a tal conclusão.
Segundo o seu nº 1, "Na pendência da acção de despejo, as rendas vencidas devem ser pagas ou depositadas, nos termos gerais".
"O senhorio pode requerer o despejo imediato com base no não cumprimento do disposto no número anterior, sendo ouvido o arrendatário" - nº 2.
"O direito a pedir o despejo imediato nos termos deste preceito caduca quando o arrendatário, até ao termo do prazo para a sua resposta, pague ou deposita as rendas em mora e a importância de indemnização devida e disso faça prova, sendo, no entanto, condenado nas custas do incidente e nas despesas de levantamento do depósito, que serão contadas a final" - nº 3.
Como diz o Juiz Conselheiro Pais de Sousa (Anotações ao Regime do Arrendamento Urbano, 4ª edição actualizada, pág. 154), este preceito corresponde, com várias alterações, ao artigo 979º do CPC, mas a sua razão de ser é a mesma. Com efeito, uma acção de despejo pode arrastar-se por bastantes meses. Um arrendatário menos sério, ou porque soubesse antecipadamente a sua falta de razão, ou por outro motivo, podia aproveitar-se da demora da lide para não pagar as rendas, que, entretanto, se fossem vencendo, mas sem deixar de se aproveitar do prédio. É para obviar a esse possível inconveniente que existe este artigo 58º. Cria ele uma nova acção de despejo imediato, fundada na falta de pagamento de renda, que se insere ou enxerta na acção pendente, com trâmites muito simples.
Depois, refere: "O esquema do incidente é o seguinte: petição do senhorio, audiência do arrendatário e decisão".
Por seu lado, o Juiz Conselheiro Aragão Seia (Arrendamento Urbano, Anotado e Comentado, 2ª edição, pág. 268) escreve: "A prova do pagamento ou do depósito é a única defesa admissível, não sendo relevante qualquer justificação, como a recusa do senhorio receber a renda ou de não se encontrar em casa quando se quis pagá-la, de se invocar a compensação, etc., que não se coadunam com a simplicidade do incidente".
2. Se o próprio texto do artigo 58º não oferece quaisquer dúvidas de que este incidente apenas pode comportar o requerimento do senhorio a pedir o despejo imediato, a audição do arrendatário (a resposta do arrendatário) e a decisão, à mesma conclusão teremos forçosamente de chegar se analisarmos as disposições gerais dos incidentes da instância (cfr. artigos 302º a 304º do CPC.
Resulta de forma inequívoca dos nºs 1 e 2 do artigo 303º que, num incidente da instância, apenas há o requerimento em que se suscita o incidente e a oposição, a deduzir no prazo de 10 dias.
Não entendemos bem o raciocínio do agravante ao chamar à colação o estatuído no nº 3 deste preceito legal.
O que este normativo legal prescreve é que "a falta de oposição no prazo legal determina, quanto à matéria do incidente, a produção do efeito cominatório que vigore na causa em que o incidente se insere".
Trata-se aqui - como é demasiadamente óbvio - de prevenir as consequências que advirão para o requerido que, citado ou notificado para deduzir oposição ao requerimento onde o incidente foi suscitado, o não faça.
Nada tem a ver, portanto, com a situação dos autos.
Relevaria - isso sim - para os arrendatários, quando foram notificados para se pronunciarem (deduzirem oposição ou responderem) ao requerimento a suscitar a questão do despejo imediato, apresentado pelo aqui recorrente.
Estamos, assim, perante situações completamente distintas.
Aliás, lendo a resposta dos arrendatários, não vislumbramos a invocação de qualquer excepção de caducidade (aqui, nem sequer se está perante a caducidade prevista no nº 3 do artigo 58º), ao contrário do que alega o recorrente, pois o que aqueles defendem é o carácter liberatório dos depósitos efectuados, questão a apreciar no despacho a proferir sobre o incidente e em que as partes assumem posições antagónicas.
3. Infere-se, pois, do exposto que é manifesta a falta de razão do agravante, pelo que, não colhendo as suas conclusões, tendentes ao provimento do recurso, terá de concluir-se que o despacho recorrido não merece qualquer censura.
III - Nos termos expostos, acorda-se em pegar provimento ao agravo e, em consequência, em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo agravante.
Porto, 12 de Dezembro de 2002.
Camilo Moreira Camilo
António Domingos Ribeiro Coelho da Rocha
Estevão Vaz Saleiro de Abreu