CASO JULGADO
IDENTIDADE OBJECTIVA
CAUSA DE PEDIR
Sumário


I. Apesar de grande parte dos factos – todos aqueles que dizem respeito à dinâmica do sinistro, aos danos resultantes do mesmo, ao nexo de causalidade entre o sinistro e os danos sofridos, e à ilicitude do facto, ou à culpa do condutor da máquina,– serem os mesmos e não se pretendem ver novamente discutidos, aceitando-se os mesmos, vem-se alegar de novo e pretende-se ver discutido se caberia à ré a obrigação de segurar a máquina que se viu envolvida no sinistro, e se a mesma incumpriu o dever de a segurar, dever imposto por força do estabelecido em sede de artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto.
II. Daqui se concluí que as pretensões deduzidas nos dois processos não procedem dos mesmos factos jurídicos, sendo diferentes as respetivas causas de pedir, sem prejuízo de parte dos factos alegados na presente ação respeitarem ao anterior processo, sendo os mesmos aceites e sendo enquadramento da nova causa e pedir.
III. Não se verifica assim o terceiro dos requisitos do caso julgado, ou seja, a identidade da causa de pedir, o que conduz à não verificação da exceção de caso julgado.

Texto Integral


Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. Relatório:

EMP01... Company, melhor identificada nos autos veio instaurar ação declarativa comum de condenação contra EMP02..., SA e AA, ali melhor identificados, pedindo a condenação dos réus a pagarem à autora a quantia de € 7.516,44 (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento, alegando, para tanto e em resumo que, no âmbito da ação judicial n.º 398/21.7T8CBT, peticionou ser ressarcida pela quantia global de € 8.351,60, sucede que, atendendo ao teor do Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, os ora réus somente foram condenados no pagamento da quantia de € 835,16, encontrando-se por regularizar, a quantia de € 7.516,44, quantia esta pela qual se pretende ver ressarcida, não pretende discutir a dinâmica do sinistro ocorrido em 11 de agosto de 2020, nem sobre os danos resultantes do mesmo, ou o nexo de causalidade entre o sinistro e os danos sofridos, nem discutir a ilicitude do facto, ou a culpa do condutor da máquina, ora réu, questões já decididas naquela ação, tendo a autora, com o Acordão proferido naquela, tomado conhecimento de que sobre a ora ré EMP02... recaía a obrigação de segurar a máquina que se viu envolvida no sinistro, e que, por isso, o sinistro em questão não se encontrava abrangido pela apólice de responsabilidade civil exploração celebrada pela mesma com a EMP03... – Companhia de Seguros, S.A, tendo a presente ação como objeto, o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., do dever de segurar a máquina envolvida no sinistro, imposto por força do estabelecido em sede de artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, uma vez que à data dos factos, sobre a máquina envolvida no sinistro não havia sido celebrado qualquer contrato de seguro automóvel, incumprindo a ré o seu dever de segurar o veículo em questão. Assim, tanto a Ré EMP02..., enquanto proprietária da máquina, como o Réu AA, enquanto condutor à data do acidente, deverão indemnizar a Autora pelos danos sofridos em consequência do sinistro em questão, o que desde já se requer para todos os efeitos legais.

Na sua contestação veio a ré EMP02..., SA, invocar a exceção dilatória do caso julgado, alegando, em síntese, que a autora já propôs neste mesmo tribunal uma ação idêntica contra os aqui réus e a seguradora EMP03..., com decisão já transitada em julgado, visando o pagamento de uma indemnização com fundamento em responsabilidade civil extracontratual emergente do sinistro que fundamenta a presente ação, concluindo que entre a ação anterior 398/21.7T8CBT e a ação presente se verifica identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir.

Após convite formulado pelo Tribunal, veio a autora responder, pugnando pela improcedência da exceção dilatória invocada pela ré, alegando, em suma, que não existe total identidade entre as causas de pedir e os pedidos formulados nesta e naqueloutra ação.
Foi ordenada a junção de certidão aos autos da sentença proferida na ação 398/21.7T8CBT, com nota de trânsito em julgado.

Em sede de despacho saneador foi proferida decisão que julgou verificada a exceção dilatória do caso julgado e, em consequência, absteve-se o Tribunal a quo de conhecer da presente causa, absolvendo os réus EMP02..., SA e AA da instância, com custas pela autora.

Inconformada com a decisão veio a autora recorrer da mesma formulando as seguintes conclusões:

1 - Vem o presente recurso interposto do douto despacho saneador, o qual julgou verificada a exceção dilatória do caso julgado e em consequência absteve-se o Tribunal de conhecer do mérito da causa, absolvendo os réus EMP02..., SA e AA da instância.
2 - Em 18.11.2021, deu entrada, neste douto Tribunal Judicial da Comarca de Braga (Juízo de Competência Genérica de Celorico da Beira), uma ação judicial intentada pela ora Autora, em que eram Réus A EMP03... – Companhia de Seguros, S.A.; AA e EMP02..., S.A, à qual, após distribuição do processo, à referida ação foi atribuído o número judicial: 398/21.7T8CBT.
3 - Nos termos da Petição Inicial apresentada, a ora Autora peticionou que fossem os Réus condenados no pagamento da quantia global de € 8.351,60 (oito mil, trezentos e cinquenta e um euros e sessenta cêntimos), acrescida de juros de mora, contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
4 - A ora Autora alegou, em síntese, que, no dia 11.08.2021, o veículo de matrícula ..-XZ-.., por si seguro, e conduzido por BB, encontrava-se, em virtude de uma visita profissional, devidamente estacionado nas instalações da Ré EMP02..., em local destinado para o efeito,
5 - Quando o Réu AA, ao deslocar-se para o pavilhão de tratamento de resíduos, com uma escavadora, propriedade da Ré EMP02... e segura na Companhia de Seguros EMP03..., embateu na traseira do veículo ligeiro, seguro na Autora, com a pá da referida máquina, por ter efetuado uma manobra desatenta e descuidada,
6 - O que causou danos no veículo seguro pela A., no valor de € 7.302,53 (sete mil, trezentos e dois euros e cinquenta e três euros) e de € 1.049,07 (mil e quarenta e nove euros e sete cêntimos) para aluguer de um veículo de substituição durante o tempo de imobilização.
7 - Em 26.07.2022, proferida Sentença, nos termos da qual foi a ação julgada procedente, por provada e, em consequência: - Foi a então Ré EMP03... – Companhia de Seguros, S.A., condenada no pagamento à Autora da quantia de € 7.516,44 (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos); - Foi a Ré EMP02..., S.A. e o Réu AA, solidariamente condenados no pagamento à Autora da quantia de € 835,16 (oitocentos e trinta e cinco euros e dezasseis cêntimos).
8 – O Tribunal enquadrou a pretensão formulada pela Autora no âmbito da responsabilidade civil por factos ilícitos, tal como consagrada no artigo 483.º, do Código Civil, norma que impõe a quem, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, a obrigação de indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
9 - A Sentença proferida considerou verificados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, com a obrigação de indemnizar a cargo do Réu AA, manobrador da máquina, e da Ré EMP02..., esta nos termos do disposto no artigo 500.º, n.º 1, do Código Civil, por se ter demonstrado que o condutor da máquina escavadora era trabalhador da Ré EMP02... e encontrava-se a exercer a sua atividade, ao serviço daquela e nas suas instalações. 10 - Entendeu o douto Tribunal que o acidente em causa estava coberto pelo seguro de exploração/laboração celebrado entre a Ré EMP02... e a então Ré EMP03..., pois entendeu que o mesmo ocorreu quando o condutor da máquina, trabalhador da EMP02..., se encontrava na realização de um trabalho relacionado com a atividade de exploração da EMP02... – regresso ao pavilhão da Triagem para efetuar novo transporte de materiais recicláveis após ter despejado no aterro resíduos rejeitados por essa unidade.
11 - Pelo que, decidiu pela condenação da então Ré EMP03... no pagamento, à Autora, ao abrigo do contrato de seguro celebrado, do pagamento da quantia de € 7.516,44 (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), relativa aos danos sofridos pela Autora na sequência do sinistro em discussão.
12 - Contra tal decisão insurgiu-se a então Ré EMP03..., discordando da responsabilidade que lhe foi assacada de garantir o pagamento da indemnização à Autora, nos moldes decididos pelo douto Tribunal de 1.ª Instância.
13 - Pugnou a EMP03... que os danos reclamados pela Autora não estariam cobertos pelo contrato de seguro celebrado com a Ré EMP02..., o qual garantia a responsabilidade por danos patrimoniais e/ou não patrimoniais, resultantes de lesões materiais e/ou corporais causadas acidentalmente a terceiros no decurso da exploração da atividade da empresa segurada, na qual se incluíam todos os trabalhos realizados dentro ou fora das instalações da empresa, desde que relacionados com a mesma.
14 - A ora Autora/aqui Recorrente apresentou as respetivas Contra-alegações de Recurso, tendo pugnado pela improcedência do entendimento defendido pela Ré EMP03....
15 - Na sequência do recurso, em 09.02.2023, foi proferido Acórdão pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, o qual veio julgar o Recurso apresentado pela EMP03... totalmente procedente e, em consequência, revogou a Sentença recorrida no correspondente ao segmento do dispositivo em que condenou a “Ré EMP03... - Companhia de Seguros, S.A. no pagamento, à Autora EMP01... Company, da quantia 7.516,44€ (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), a que acrescem juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento”, absolvendo a ré/apelante do pedido formulado na ação e confirmando, no mais a sentença recorrida.
16 - Não obstante o Recurso, e conforme resulta, aliás, do próprio Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, a matéria de facto provada permaneceu inalterada, dado que o recurso recaiu somente sobre a matéria de Direito.
17 - Tendo, o aludido e douto Acórdão, a final, concluído que: “Em consequência, nenhuma responsabilidade poderá ser assacada à recorrente/ré EMP03..., Companhia de Seguros, S.A., uma vez que o acidente em apreciação não tem relação direta com os riscos específicos que decorrem da titularidade da exploração de estabelecimento industrial, incluindo o que resulte da utilização das respetivas instalações e do exercício das inerentes atividades desenvolvidas pela 1.ª ré, antes derivando exclusivamente dos riscos próprios da circulação da referida máquina, estando como tal abrangido pelo regime do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.”
18 - O Venerando Tribunal da Relação de Guimarães manteve a condenação dos Réus EMP02... e AA no pagamento, à ora Autora, da quantia de € 835,16.
19 - Pelo que, encontrava-se, ainda, por regularizar, a quantia de € 7.516,44, quantia esta pela qual a Autora, pretendendo ver-se ressarcida quanto à mesma, intentou nova acção contra os referidos RR. para reembolso de tal valor.
20 - Foi somente com a prolação do Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no âmbito do processo n.º 398/21.7T8CBT, que a ora Autora, aqui Recorrente, tomou conhecimento de que sobre a ora Ré EMP02... recaía a obrigação de segurar a máquina que se viu envolvida no sinistro,
21 - E que, por isso, o sinistro em questão não se encontrava abrangido pela apólice de responsabilidade civil exploração celebrada pela mesma com a EMP03... – Companhia de Seguros, S.A., motivo pelo qual, a aqui Recorrente não pode ver o seu direito de se reembolsar juntos dos RR., coartado.
22 - A presente acção, nos termos da qual foi proferido o despacho saneador ora posto em crise, teve, precisamente, como objeto, o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., do dever de segurar a máquina envolvida no sinistro, imposto por força do estabelecido em sede de artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto.
23 - Tendo a ora Ré EMP02... incumprido com o dever de segurar o veículo, tanto esta, enquanto proprietária da máquina, como o Réu AA, enquanto condutor à data do acidente e causador dos danos em apreço, deverão indemnizar a Autora, aqui Recorrente, pelos danos sofridos em consequência do sinistro em questão.
24 - Inexistindo contrato de seguro celebrado que cubra os riscos inerentes à circulação da máquina em questão, a entidade que satisfaça a reparação dos danos – neste caso, a ora Autora –, goza do exercício de direito de regresso contra o responsável civil do acidente, bem como sobre quem impenda a obrigação de o segurar, ao abrigo do disposto no n.º 2 e 4, do artigo 51.º, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto.
25 - Na acção que correu termos sob o n.º de processo 398/21.7T8CBT discutiu-se o acidente ocorrido em 11.08.2021, que envolveu o veículo de matrícula ..-XZ-.., seguro pela ora Autora, e conduzido por BB, e uma máquina escavadora, propriedade da ora Ré EMP02... e, à data, manobrada pelo Réu AA,
26 - E, bem assim, os danos sofridos pela ora Autora em consequência desse acidente, na qualidade de Seguradora do veículo de matrícula ..-XZ-.. e ao abrigo da cobertura de danos próprios contratada nos termos da Apólice de seguro n.º ...58.
27 - A pretensão formulada pela Autora enquadrava-se, naqueloutra ação, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, tal como consagrado no artigo 483.º, do Código Civil, norma que impõe a quem, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, a obrigação de indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
28 - Na anterior ação judicial consideraram-se verificados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, com a obrigação de indemnizar a cargo do Réu AA, na qualidade de manobrador da máquina, e da Ré EMP02..., por se ter demonstrado que o condutor da máquina escavadora era trabalhador da Ré EMP02... e se encontrava a exercer a sua atividade, ao serviço  daquela e nas suas instalações (cf. artigo 500.º, n.º 1, do Código Civil).
29 - Não obstante a absolvição da EMP03..., o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães confirmou, no mais, a Sentença recorrida, nomeadamente, no que diz respeito à condenação dos Réus EMP02... e AA e, bem assim, a matéria de facto dada como provada, a qual permaneceu inalterada.
30 - No Recurso interposto pela EMP03... discutiu-se, somente, matéria de Direito, em concreto, a questão de saber se o acidente ora em discussão tinha relação direta com os riscos específicos que decorriam da titularidade da exploração de estabelecimento industrial ou se, pelo contrário, o sinistro se enquadrava no âmbito dos riscos próprios da circulação da máquina, caso em que esta estaria abrangida pelo regime do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel,
31 - Tendo o Tribunal de 2.ª Instância concluído que o sinistro se enquadrava no âmbito dos riscos próprios da circulação da máquina e que, por esse facto, esta se encontrava abrangida pelo seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, absolvendo a Ré EMP03... do pedido, na medida em que o sinistro não estava, afinal, abrangido pela Apólice de RC Exploração contratada com a Ré EMP02....
32 - Com a nova ação que ora se propôs a ora Autora não pretendeu discutir a dinâmica do sinistro ocorrido em 11.08.2020, nem os danos resultantes do mesmo e o respetivo nexo causal, ou a questão da ilicitude ou da culpa, isto porque, a bem dizer, esta matéria ficou devidamente assente na anterior ação.
33 - Os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual encontram-se devidamente assentes e provados, pelo que não existem dúvidas de que os ora Réus são civilmente responsáveis pelos danos sofridos pela ora Autora em consequência do sinistro ocorrido em 11.08.2020.
34 - A questão que aqui se coloca, por via da nova acção que se intentou, tem a ver, única e exclusivamente, com o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., do dever de segurar a máquina que provocou este sinistro, imposto por força do estabelecido em sede de artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto e esta questão só ficou esclarecida com o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães.
35 - O que está em causa não é verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, mas sim, o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., do dever de segurar o veículo, incumprimento esse que gera o dever, da Ré EMP02..., na qualidade de proprietária, e do Réu AA, na qualidade de condutor, de indemnizar a ora Autora pelos danos sofridos em consequência do sinistro ocorrido em 11.08.2020.
36 - A presente ação nada tem que ver com a dinâmica do sinistro, com os danos sofridos pela ora Autora em consequência do mesmo ou com o preenchimento dos pressupostos constantes do artigo 483.º, do Código Civil, mas antes com a responsabilidade que decorre do incumprimento do disposto no artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto,
37 - Importa concluir que, não se encontra verificada a excepção de caso julgado, porquanto a presente ação não preenche os requisitos previstos no artigo 581.º do CPC.
38 - Na verdade, inexiste identidade de sujeitos, porquanto, a presente ação foi interposta somente contra a Ré EMP02... e contra o Réu AA, contrariamente à anterior ação, na qual foi demandada, para além destes dois sujeitos, a Ré EMP03....
39 - Mesmo o pedido é diferente, pois que, na presente ação peticiona-se o montante de € 7.516,44 e não o montante de € 8.351,60 da anterior ação,
40 - E na presente ação não importa a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual (tal como importava na anterior ação), mas sim, o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., do dever de segurar o veículo, pelo que, falha, igualmente, o requisito de identidade de causa de pedir
41 - A presente ação cinge-se somente à responsabilidade que decorre do incumprimento do disposto no artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto e não quanto à dinâmica do sinistro, com os danos sofridos pela ora Autora em consequência do mesmo ou com o preenchimento dos pressupostos constantes do artigo 483.º, do Código Civil (como se reportava a anterior ação).
42 - Na anterior ação, a ora Autora pretendia que fossem os Réus condenados a pagar-lhe uma indemnização pelos danos sofridos em consequência de um acidente de viação, partindo do pressuposto que inexistia, por parte da Ré EMP02..., a obrigação de segurar a máquina responsável pelo acidente, sendo, consequentemente, a EMP03..., ao abrigo do contrato de seguro de RC exploração celebrado com aquela, civilmente responsável pelos danos sofridos pela ora Autora.
43 - Na primeira ação, discutiu-se, efetivamente, o preenchimento dos pressupostos do instituto da responsabilidade civil extracontratual e a exata medida da responsabilidade de cada um dos Réus, atendendo ao tipo de contrato de seguro celebrado entre a Ré EMP02... e a EMP03....
44 - Contrariamente, na presente ação, já não se discute a responsabilidade civil extracontratual dos Réus EMP02... e AA nem o acidente de viação ou os danos sofridos pela ora Autora em consequência do mesmo, aquilo que se discute na presente ação é, precisamente, o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., de uma obrigação imposta legalmente, incumprimento esse que faz com que a Ré EMP02..., na qualidade de proprietária, e o Réu AA, na qualidade de condutor, sejam responsáveis pelos danos sofridos pela ora Autora em consequência daquele acidente.
45 - É este o facto jurídico que fundamenta a pretensão da ora Autora na presente ação, o qual não se verificava na ação anterior.
46 - Na ação anterior, a responsabilidade de cada uma das Partes demandadas dependia do que havia sido estabelecido no contrato de seguro celebrado entre a Ré EMP03... e a Ré EMP02..., motivo pelo qual, na Sentença proferida pelo Tribunal, os Réus EMP02... e AA somente foram condenados no pagamento do valor relativo à franquia contratual prevista naquele contrato.
47 - Tendo o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães decidido que aquele contrato de seguro não tinha aplicabilidade ao sinistro ora em discussão, pelo facto de a máquina envolvida não se encontrar em laboração aquando do acidente, a medida da responsabilidade de cada uma das Partes deixa de estar dependente das condições previstas em tal contrato, resultando, antes, do incumprimento, por parte da Ré EMP02... de segurar aquele veículo.
48 – Note-se, esta questão nunca foi discutida na anterior ação e resultou da decisão que foi proferida pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães – uma vez mais inexistindo repetição da causa anterior.
49 - Contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, em sede de despacho saneador, não estamos perante uma situação de caso julgado, na medida em que jamais se discutiu o incumprimento da Ré do dever de segurar o seu veículo numa ação anterior à presente.
50 - Inexiste, qualquer risco, de este douto Tribunal contradizer ou reproduzir uma decisão anterior, na medida em que inexiste qualquer decisão, transitada em julgado, que se pronuncie sobre esta questão, não se verificando, no caso sub judice, a tríplice identidade de sujeitos, causa de pedir e pedido, conforme exigido por lei.
51 - Pelos motivos que acima se aduzem andou mal o Tribunal ao ter decidido como decidiu, ao ter julgado a excepção de caso julgado procedente por provada e em consequência absolvendo os RR, da instância, abstendo-se de conhecer do mérito da causa, porquanto tal decisão revela-se contrária ao disposto no normativo legal (tríplice identidade de sujeitos, causa de pedir e pedido) que, conforme acima se expos, não tem, nem pode ter, qualquer aplicação ao caso vertente.
52 - Desta feita, a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 580.º e 581.º do CPC.
53 – Assim, decidiu mal o Tribunal ao ter aplicado o referido à situação em discussão nos presentes autos, pelo que se requer que seja a mesma revogada e substituída por outra que julgue improcedente, por não verificada/provada a exceção de caso julgado, mantendo a demanda dos RR na presente instância e o prosseguimento ulterior dos trâmites do processo, para todos os efeitos e com todas as consequências legais.
54 - Deve o despacho saneador, proferido pelo douto e ilustre Tribunal a quo, ser revogado e substituído por outro que decida pela improcedência da exceção de caso julgado e que, em consequência, mantenha a demanda dos RR. na instância e consequente prosseguimento dos autos –, o que, expressa e muito respeitosamente, se requer a V. Exas,
Nestes termos e nos melhores de Direito, que V. Exas. mui doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência ser o douto despacho saneador recorrido revogado e substituído por outro que julgue pela improcedência da exceção de caso julgado, só assim se fazendo a acostumada, habitual e sã JUSTIÇA!

Veio a ré EMP02... contra alegar formulando as seguintes conclusões:

A. Resulta cristalino, que não merece provimento o recurso apresentado pela Recorrente, não cabendo atenção aos argumentos aduzidos, e cujo último fim sempre acabaria por repetir, quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir, a referida ação de processo comum n.º 398/21.7T8CBT, que correu também termos naquele Tribunal de 1ª Instância, e na qual foi já proferida decisão final, transitada em julgado.
B. A repetição de uma causa já julgada, consubstanciaria inelutavelmente, que o Tribunal a quo conhecesse novamente da mesma causa de pedir, inclusive, correndo o risco de proferir julgamento diverso, assim prejudicando o prestígio dos Tribunais e ferindo o princípio da segurança e certeza jurídica.
C. A Recorrente desmemoria, que na ação anterior (398/21.7T8CBT) peticionou já a indemnização nos mesmos termos em que o fez nesta ação.
D. Tal como pretende fazer esquecer, que nessa anterior ação pagou à sua segurada os danos próprios relativos ao veículo ligeiro de passageiros com matrícula ..-XZ-.., tal como era sua obrigação atento o contrato de seguro celebrado entre si a sua segurada, com a apólice ...58, em consonância com o Acórdão transitado em julgado.
E. As partes nesta ação, são também partes naquela ação que correu termos sob o n.º 398/21.7T8CBT, existindo identidade de sujeitos.
F. No âmbito do processo n.º 398/21.7T8CBT a Recorrente peticionou a condenação dos réus, incluindo a aqui Recorrida a pagarem-lhe o valor de € 8.351,60 e tendo os réus sido condenados naquela ação no pagamento da quantia de € 835,16, e nesta ação, a Recorrente formulou o pedido de condenação dos réus, onde se inclui a Recorrida, a pagarem-lhe o remanescente, ou seja, a quantia de € 7.516,44 [€ 8.351,60 - € 835,16], verificando-se existir identidade entre os pedidos formulados numa e noutra ação.
G. A Recorrente visou assim nesta ação obter o mesmo efeito jurídico que pretendeu já obter na outra ação anterior.
H. Existe total identidade entre os factos jurídicos que consubstanciam a causa de pedir nesta e naquela ação que correu termos sob o n.º 398/21.7T8CBT.
I. Não tem razão de ser a apelação porquanto, o peticionado pela Recorrente nesta e naquela ação procede ou funda-se nos mesmos factos jurídicos.
J. A Recorrente não alegou nestes autos, qualquer outro facto jurídico novo que não tivesse já alegado na outra ação.”, devendo, por isso, manter-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo.
K. O Saneador/Sentença de 16/04/2025 proferido pelo Tribunal a quo é claro e conciso ao demonstrar, que entre a ação anterior 398/21.7T8CBT e a ação presente 346/24.28(CBT, verifica-se identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, sendo a consequência a verificação da exceção dilatória do caso julgado, aplicando corretamente o direito, mormente os artigos 580º e 581º do Código de Processo Civil, não sendo merecedora de reparo.
L. Ademais, com o Saneador/Sentença de 16/04/2025, o Tribunal a quo acautelou a segurança jurídica e a certeza do direito e, bem assim, preveniu o risco de uma decisão inútil, evitando-se que o Tribunal “seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior”
M. O Tribunal a quo concluiu corretamente, que a presente ação repete, quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir, a referida ação de processo comum n.º 398/21.7T8CBT, que correu também termos neste Tribunal e na qual foi já proferida decisão final, transitada em julgado, o que impede que o Tribunal conheça novamente da mesma causa de pedir, correndo o risco de proferir julgamento diverso, assim prejudicando o prestígio dos tribunais.
N. E, nessa conformidade, o Tribunal a quo decidiu bem pela verificação da exceção dilatória do caso julgado, abstendo-se de conhecer do mérito desta causa e absolver os réus EMP02..., SA e AA da instância, em conformidade com o disposto nos artigos 278.º, n.º 1, alínea e), 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º, alínea i), 578.º, 580.º, n.ºs 1 e 2, e 581.º, n.ºs 1 a 4, todos do CPC, ao absolver os Réus da Instância, devendo, por isso, ser mantida;
Termos em que se conclui pela improcedência do recurso interposto pelo Recorrente EMP01... COMPANY, e sustentação da decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo de Competência Genérica de Celorico de Basto no Saneador/Sentença de 16/04/2025, com a referência ...69, com as legais consequências, fazendo-se assim JUSTIÇA!

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

*
II. Do objeto do recurso:

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, impondo-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes, bem como as que sejam de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas, cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, sendo certo que o tribunal não se encontra vinculado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e que visam sustentar os seus pontos de vista, isto atendendo à liberdade do julgador na interpretação e aplicação do direito.
Assim sendo, tendo em atenção as alegações/conclusões apresentadas pela recorrente importa aos autos aferir, se, a decisão em causa que julgou procedente a exceção de caso julgado, incorreu em qualquer erro porquanto não se verifica a identidade de sujeitos, causa de pedir e pedido.
*
III. Fundamentação de facto:

Com relevo para a decisão, são os seguintes os factos apurados:

1. A EMP01... Company intentou ação declarativa com processo comum contra EMP02..., S.A.; AA; EMP03... - Companhia de Seguros, S.A.; que correu os seus termos sob o nº 398/21.7T8CBT Juízo de Competência Genérica de Celorico de Basto.

2. Pedindo a condenação dos réus no pagamento à autora da quantia de € 8.351,60, acrescida de juros de mora, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

3. Alegando, em síntese, que se encontra sub-rogada na posição da sua segurada, a tomadora do seguro do veículo ..-XZ-.., podendo reclamar dos réus os valores atinentes à indemnização que pagou à sua segurada pelos prejuízos sofridos no referido veículo, por força do contrato de seguro que abrange a responsabilidade por danos próprios e a que aquela tinha direito a título de compensação pelos danos patrimoniais decorrentes do sinistro ocorrido no dia 11 de agosto de 2021, nas instalações da 1.ª ré, nas circunstâncias alegadas, e que causou danos no veículo no valor de 7.302,53€ e de 1.049,07€ pelo aluguer de viatura de substituição durante o tempo de imobilização.

4. Entre outros, vieram os réus EMP02... e AA alegar estar o sinistro abrangido no âmbito do contrato de seguro de responsabilidade civil extracontratual, celebrado pela 1.ª ré com a ré EMP03.... Mais alegaram que o acidente ocorreu dentro das instalações da 1.ª ré, que são de acesso condicionado, não tendo o 2.º réu, apesar de conduzir com a máxima atenção e cuidado, previsto a presença do veículo ligeiro naquele local, que se tratava de uma zona de circulação e não de estacionamento.

5. A 3.ª ré - EMP03..., S.A., - também apresentou contestação, alegando que o acidente ocorreu numa via destinada ao trânsito de veículos e aberta ao trânsito público, quando a máquina, obrigada a matricular, se encontrava em circulação, recaindo sobre a 1.ª ré a obrigação de segurar a máquina industrial no seguro automóvel obrigatório, âmbito que está excluído do contrato de seguro celebrado. Além disso, sempre há que descontar o valor correspondente à franquia, da responsabilidade do segurado, e ainda os danos indiretos, causados, como seja, o dano resultante do aluguer de viatura de substituição.

6. Foi proferida sentença que julgou procedente a ação, por provada, e, em consequência:
- Condenou a Ré EMP03... - Companhia de Seguros, S.A. no pagamento, à Autora EMP01... Company, da quantia 7.516,44€ (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), a que acrescem juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento;
- Condenou a Ré EMP02..., S.A. e o Réu AA, solidariamente, no pagamento, à Autora EMP01... Company, da quantia de 835,16€ (oitocentos e trinta e cinco euros e dezasseis cêntimos), a que acrescem juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Custas pelos Réus, por terem ficado vencidos, na proporção do decaimento, o qual se fixa em 90% para a Ré EMP03... e 10% para os Réus EMP02... e AA (art. 527º, nº 1 e 2 do CPC).

7. Inconformada, recorreu a 3.ª ré - EMP03... - Companhia de Seguros, S.A. da sentença proferida, tendo sido proferido Acordão, transitado em julgado que julgou procedente o recurso interposto pela ré EMP03..., Companhia de Seguros, S.A., e em consequência, revogou a sentença recorrida no correspondente segmento do dispositivo em que condenou a « EMP03... - Companhia de Seguros, S.A. no pagamento, à Autora EMP01... Company, da quantia 7.516,44€ (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), a que acrescem juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento», absolvendo a ré/apelante do pedido formulado na ação e confirmando, no mais a sentença recorrida.
Custas da apelação pelos recorridos, sendo as da ação da responsabilidade da autora/apelada e dos réus/apelados EMP02... e AA.

8. Veio a EMP01... Company, instaurar ação declarativa comum de condenação contra EMP02..., SA e AA, que corre os seus termos sob o nº 346/24.2T8CBT, no Juízo de Competência Genérica de Celorico de Basto, pedindo a condenação dos réus a pagarem à autora a quantia de € 7.516,44 (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.

9. Alega a autora, em resumo que, no âmbito da ação judicial n.º 398/21.7T8CBT, peticionou ser ressarcida pela quantia global de € 8.351,60, sucede que, atendendo ao teor do Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, os ora réus somente foram condenados no pagamento da quantia de € 835,16, encontrando-se por regularizar, a quantia de € 7.516,44, quantia esta pela qual se pretende ver ressarcida, não pretende discutir a dinâmica do sinistro ocorrido em 11 de agosto de 2020, nem sobre os danos resultantes do mesmo, ou o nexo de causalidade entre o sinistro e os danos sofridos, nem discutir a ilicitude do facto, ou a culpa do condutor da máquina, ora réu, questões já decididas naquela ação, tendo a autora, com o Acordão proferido naquela, tomado conhecimento de que sobre a ora ré EMP02... recaía a obrigação de segurar a máquina que se viu envolvida no sinistro, e que, por isso, o sinistro em questão não se encontrava abrangido pela apólice de responsabilidade civil exploração celebrada pela mesma com a EMP03... – Companhia de Seguros, S.A, tendo a presente ação como objeto, o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., do dever de segurar a máquina envolvida no sinistro, imposto por força do estabelecido em sede de artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, uma vez que à data dos factos, sobre a máquina envolvida no sinistro não havia sido celebrado qualquer contrato de seguro automóvel, incumprindo a ré o seu dever de segurar o veículo em questão. Assim, tanto a Ré EMP02..., enquanto proprietária da máquina, como o Réu AA, enquanto condutor à data do acidente, deverão indemnizar a Autora pelos danos sofridos em consequência do sinistro em questão, o que desde já se requer para todos os efeitos legais.
*
IV. Do direito:

Importa aos autos aferir se se verifica nos autos uma situação de caso julgado ou se, como refere a recorrida tal se traduz numa questão nova uma vez que a recorrente apenas em sede de recurso vem alegar a mesma.

Vejamos.

Resulta do nº 1 do artº 627º do Código de Processo Civil que “as decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recurso”, sendo pois, os recursos o principal instrumento de impugnação de decisões judiciais, permitindo-se a sua reapreciação por um tribunal hierarquicamente superior, como refere o Dr Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 6ª edição Atualizada, Almedina, pág 21.
Refere ainda o mesmo autor, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, páginas 28 e 29 que “Na fase de recurso, as partes e o Tribunal Superior devem partir do pressuposto de que a questão já foi objecto de decisão, tratando-se apenas de apreciar a sua manutenção, alteração ou revogação. Por outro lado, a demanda do Tribunal Superior está circunscrita às questões já submetidas ao tribunal de categoria inferior, sem prejuízo da possibilidade de se suscitarem ou de serem apreciadas questões de conhecimento oficioso, como a inconstitucionalidade de normas, a nulidade dos contratos, o abuso de direito ou a caducidade em matéria de direitos indisponíveis, relativamente às quais existam nos autos elementos de facto suficientes”.
Daqui decorre que a instância de recurso tem em vista a reapreciação das questões de facto e de direito que foram suscitadas pelas partes e decididas pelo tribunal a quo, e não apreciar e decidir questões novas, podendo ver-se neste sentido ainda, os Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de julho de 2016, relatado pelo Sr Conselheiro Gonçalves Rocha e de 8 de outubro de 2020, relatado pelo Sr Conselheiro Ilídio Sacarrão Martins, ambos em www.dgsi.pt.
Lidos os articulados apresentados pelas partes, com relevância, resulta ter sem mais, ter a ré, ora recorrida, suscitado ao Tribunal a quo, a questão do caso julgado, questão que tendo sido pelo mesmo apreciada no sentido da sua verificação, foi agora impugnada pela recorrente que entende não se verificar a identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir.

Vejamos.
Dispõe o nº 1 do artº 580º, do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Conceitos de litispendência e caso julgado” que “as excepções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à excepção do caso julgado», resultando do nº 2 deste preceito que as referidas exceções tem por fim evitar que o tribunal seja colocado perante a posição de contradizer ou reproduzir decisão anterior.
Como referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, pág, 684, 2ª edição “A litispendência e o caso julgado pressupõem a repetição de uma causa, divergindo quanto ao estado em que ambas se encontram: se numa delas foi proferida decisão final transitada em julgado, verifica-se a exceção do caso julgado; na situação oposta há litispendência”.

Estabelece o artº 581º do Código de Processo Civil que, sob a epígrafe “Requisitos da litispendência e do caso julgado que:

“1. Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2. Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3. Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4. há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico. Nas ações reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real;(…)”.

Ora, no que ao caso julgado diz respeito, exceção que importa aos autos conhecer, pressupõe, como referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, na obra citada, pág. 685, nota 1, uma tripla identidade crucial entre sujeitos, causa de pedir e pedido, assumindo, como se refere na sentença em crise “um efeito negativo ou excludente, pois que determina a inadmissibilidade de qualquer ulterior indagação sobre a relação material controvertida definida em anterior decisão definitiva”.
Como referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, na obra citada, pág. 685, nota 2 “A identidade de sujeitos não supõe a mera identidade física ou nominal, verificando-se ainda quando as partes sejam as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica, ou seja, não apenas aquelas que intervieram formalmente no processo, mas ainda, designadamente “aquelas que assumiram, mortis causa ou inter vivos, a posição jurídica de quem foi parte na causa depois de a sentença ter sido proferida e transitada em julgado”.
Quanto à identidade de causas de pedir, referem os autores citados, na obra citada, pág. 687, nota 7 que “A identidade de causas de pedir verifica-se quando as pretensões deduzidas nas ações derivam do mesmo facto jurídico, analisado à luz da substanciação consagrada no nº 4”.
Quanto à identidade de pedidos referem os mesmos autores, na mesma obra, pág. 686, nota 5 que “(…) afere-se pela circunstância de em ambas as ações se pretender obter o mesmo efeito prático-jurídico, não sendo de exigir uma adequação integral das pretensões”.
Verificada a exceção de caso julgado que, constitui uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso, obsta-se ao conhecimento do mérito da causa e conduz-se à absolvição do réu da instância, conforme resulta dos artºs 576º, nºs 1 e 2, 577º, al. i) e 578º do Código de Processo Civil.

Tal como refere o D. Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de outubro de 2022, relatado pela Srª Conselheira Maria Clara Sottomayor, in www.dgsi.pt, “Como ensina Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, 318), a força obrigatória reconhecida ao caso julgado material, impõe-se por razões de certeza ou segurança jurídica e tem por finalidade, “obstar a decisões concretamente incompatíveis (que não possam executar-se ambas sem detrimento de alguma delas), a que em novo processo o juiz possa validamente estatuir de modo diverso sobre o direito, situação ou posição jurídica concreta definida por anterior decisão e, portanto, desconhecer no todo ou em parte os bens por ela reconhecidos e tutelados”.
Do caso julgado decorrem, essencialmente, dois efeitos, a saber: impossibilidade de qualquer tribunal voltar a pronunciar-se sobre a questão decidida (efeito negativo ou exceção de caso julgado) e vinculação do mesmo tribunal ou de outros tribunais à decisão proferida (efeito positivo ou autoridade de caso julgado).
Como tem sido reiterado pela jurisprudência deste Supremo Tribunal, a exceção dilatória de caso julgado (efeito negativo) pressupõe a identidade de sujeitos, de causas de pedir e de pedidos entre os processos em confronto - cfr., entre outros, os acórdãos de 22-02-2018 (Proc. n.º 18091/15.8T8LSB.L1.S1), de 18-02-2021 (Proc. n.º 3159/18.7T8STR.E1.S1) e de 23-02-2021 (Proc. n.º 2445/12.4TBPDL.L1.S1).
Por seu turno, “a autoridade de caso julgado formado por decisão proferida em processo anterior, cujo objecto se insere no objecto da segunda, obsta que a relação ou situação jurídica material definida pela primeira decisão possa ser contrariada pela segunda, com definição diversa da mesma relação ou situação, não se exigindo, neste caso, a coexistência da tríplice identidade mencionado no artigo 581º do Código de Processo Civil” – ac. do STJ, de 13-09-2018 (Proc. n.º 687/17.5T8PNF.S1).
Nas palavras de Lebre de Freitas e de Isabel Alexandre (Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, Almedina, 4.ª edição, Reimpressão, pp. 599-590), o efeito positivo do caso julgado conferido pela figura da autoridade “assenta numa relação de prejudicialidade: o objeto da primeira decisão constitui questão prejudicial na segunda ação, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida (…) ou o fundamento da primeira decisão, excecionalmente abrangido pelo caso julgado (…) é também questão prejudicial na segunda ação”.
Aqui chegados importa pois aferir se, como decidiu o Tribunal a quo, se verificaria a situação de caso julgado que conduz à extinção da instância, inviabilizando assim uma pronúncia de mérito.
Ora, a recorrente, autora insurge-se contra este entendimento e julgamos que bem.
Vejamos.

Conforme ressalta do relatório e da fundamentação de facto, veio EMP01... Company, ora recorrente, instaurar ação declarativa comum de condenação contra EMP02..., SA e AA, pedindo a condenação destes a pagarem à autora a quantia de € 7.516,44 (sete mil, quinhentos e dezasseis euros e quarenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento, alegando, para tanto e em resumo que, no âmbito da ação judicial n.º 398/21.7T8CBT, peticionou ser ressarcida pela quantia global de € 8.351,60, sucede que, atendendo ao teor do Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, os ora réus somente foram condenados no pagamento da quantia de € 835,16, encontrando-se por regularizar, a quantia de € 7.516,44, quantia esta pela qual se pretende ver ressarcida, não pretendendo discutir a dinâmica do sinistro ocorrido em 11 de agosto de 2020, nem os danos resultantes do mesmo, ou o nexo de causalidade entre o sinistro e os danos sofridos, nem discutir a ilicitude do facto, ou a culpa do condutor da máquina, ora réu, questões já decididas naquela ação, mas sim, tendo a autora, com o Acordão proferido naquela ação, tomado conhecimento de que sobre a ora ré EMP02... recaía a obrigação de segurar a máquina que se viu envolvida no sinistro, e que, por isso, o sinistro em questão não se encontrava abrangido pela apólice de responsabilidade civil exploração celebrada pela mesma com a EMP03... – Companhia de Seguros, S.A, tendo a presente ação como objeto, o incumprimento, por parte da Ré EMP02..., do dever de segurar a máquina envolvida no sinistro, imposto por força do estabelecido em sede de artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, uma vez que à data dos factos, sobre a máquina envolvida no sinistro não havia sido celebrado qualquer contrato de seguro automóvel, incumprindo a ré o seu dever de segurar o veículo em questão. Assim, tanto a Ré EMP02..., enquanto proprietária da máquina, como o Réu AA, enquanto condutor à data do acidente, deverão indemnizar a Autora pelos danos sofridos em consequência do sinistro em questão, o que desde já se requer para todos os efeitos legais.

Ora, efetivamente, apurado ficou que, anteriormente, a EMP01... Company intentou ação declarativa com processo comum contra EMP02..., S.A.; AA; EMP03... - Companhia de Seguros, S.A.; que correu os seus termos sob o nº 398/21.7T8CBT Juízo de Competência Genérica de Celorico de Basto, pedindo a condenação dos réus no pagamento à autora da quantia de € 8.351,60, acrescida de juros de mora, desde a citação e até efetivo e integral pagamento, alegando, em síntese, que se encontra sub-rogada na posição da sua segurada, a tomadora do seguro do veículo ..-XZ-.., podendo reclamar dos réus os valores atinentes à indemnização que pagou à sua segurada pelos prejuízos sofridos no referido veículo, por força do contrato de seguro que abrange a responsabilidade por danos próprios e a que aquela tinha direito a título de compensação pelos danos patrimoniais decorrentes do sinistro ocorrido no dia 11 de agosto de 2021, nas instalações da 1.ª ré, nas circunstâncias alegadas, e que causou danos no veículo no valor de 7.302,53€ e de 1.049,07€ pelo aluguer de viatura de substituição durante o tempo de imobilização, sendo certo que na sua contestação, a 3ª ré - EMP03..., S.A., alegou que o acidente ocorreu numa via destinada ao trânsito de veículos e aberta ao trânsito público, quando a máquina, obrigada a matricular, se encontrava em circulação, recaindo sobre a 1.ª ré a obrigação de segurar a máquina industrial no seguro automóvel obrigatório, âmbito que está excluído do contrato de seguro celebrado, posição que, veio a ser acatada pelo Acordão desta Relação de Guimarães e que levou à absolvição desta ré e ora recorrida, do pedido.
 
Dos factos atrás referidos e dos respeitantes aos presentes autos, constata-se que, efetivamente são as mesmas (em parte) as partes em ambas as ações, sendo autora a EMP01... Company e como réus EMP02..., S.A.; AA, pelo que se verifica uma identidade de sujeitos processuais.
Como afirma Rui Pinto (“Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas
Provisórias”, Julgar Online, novembro de 2018, http://julgar.pt/wp-content/uploads/2018/11/20181126-ARTIGO-JULGAR-Exce%C3%A7%C3%A3o-e-autoridade-do-caso-julgado-Rui-Pinto) “para este efeito, não releva o estrito conceito formal de parte, mas, na verdade, um conceito material de parte. Este apura-se pelo âmbito de eficácia material do objeto processual e não pela estrita e literal titularidade da instância (…) pode ser gerada uma coincidência parcial entre sujeitos nos casos de litisconsórcio e coligação voluntários quanto àqueles que concretamente estiveram na causa: havendo duas ações litisconsorciais ou coligatórias que coincidam quanto a alguns dos litisconsortes ou coligados, há exceção de caso julgado quanto aos sujeitos coincidentes”.
Ou seja, apesar da presente ação ser instaurada apenas contra dois dos réus do processo que sob o nº 398/21.7T8CBT correu termos no Juízo de Competência Genérica de Celorico de Basto, entendemos que tal não afeta a verificação da necessária identidade de sujeitos, pois o facto de existirem outros sujeitos na ação anterior não constitui obstáculo à verificação da exceção de caso julgado, a qual existirá quanto aos sujeitos coincidentes (neste sentido o Acordão da Relação de Guimarães de 25 de novembro de 2021, relatado pela Srª Desembargadora  Raquel Baptista Tavares, no processo 255/20.4T8PTL.G1.

Diga-se ainda que existe uma identidade de pedido e isto porque, conforme já atrás se referiu a mesma se verifica quando em ambas as ações se pretende o mesmo efeito prático-jurídico, sendo relevante que a segunda ação seja proposta para exercer o mesmo direito que se exerceu mediante a primeira.
Conforme refere este último Aresto citado “O pedido é, por isso, “o efeito jurídico que a parte ativa pretende obter pela decisão do tribunal e que ela retira materialmente da causa de pedir que invoca (…) Esse efeito jurídico tem por objeto certo e determinado bem jurídico a que se refere a causa de pedir. Em termos simples, o pedido tem por objeto imediato determinado efeito jurídico que se retira da causa de pedir e por objeto mediato o bem jurídico a que se refere a causa de pedir. Donde, há identidade de pedido quando em causas diferentes a parte ativa pretende uma sentença com idêntico efeito jurídico para um mesmo e determinado bem jurídico” (Rui Pinto, “Exceção e autoridade de caso julgado - algumas notas Provisórias”, Julgar Online, novembro de 2018,http://julgar.pt/excecao-e-autoridade-de-caso-julgado-algumas-notas provisorias/).
De referir ainda que, conforme se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19/09/2019 (Relatora Conselheira Catarina Serra, disponível em www.dgsi.pt) “(…) a exigível identidade de pedidos não implica uma absoluta coincidência dos concretos pedidos, ou seja, não implica que o pedido feito na ação proposta em segundo lugar corresponda exatamente ao pedido feito na ação proposta em primeiro lugar. Para efeitos da exceção de caso julgado, não interessa, assim, que a extensão do pedido formulado e decidido na primeira ação seja maior do que oformulado na segunda; basta que possa considerar-se que o pedido formulado na segunda ação está contido, incluído ou englobado no pedido formulado e decidido na primeira. Numa palavra: a identidade de pedidos pode ser parcial (…)”.
Ora, da leitura dos pedidos formulados e atrás referidos, resulta sem mais que a autora e ora recorrente pretende obter dos ora réus, o montante indemnizatório que não conseguiu obter na primeira das ações instauradas.
O efeito prático e jurídico pretendido pela autora ora recorrente é o do pagamento da quantia indemnizatória não obtida na primeira das ações. Efetivamente, na primeira das ações que instaurou contra EMP02..., S.A.; AA; EMP03... - Companhia de Seguros, S.A, pedia a mesma a condenação dos réus no pagamento à autora da quantia de € 8.351,60, acrescida de juros de mora, desde a citação e até efetivo e integral pagamento, sendo certo que, pelo Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, os ora réus somente foram condenados no pagamento da quantia de € 835,16, encontrando-se por regularizar, a quantia de € 7.516,44. Já na presente ação pretende a mesma autora a condenação dos réus EMP02..., SA e AA, a a pagarem à autora a quantia de € 7.516,44, acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento, ou seja, a quantia por regularizar.
Entendemos, por isso, que na presente e na anterior ação pretende-se obter o mesmo efeito jurídico, verificando-se, pois uma identidade de pedido.

Relativamente à identidade da causa de pedir é que julgamos não se verificar a mesma.
Na verdade verifica-se identidade de causas de pedir, conforme referem os Drs  Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol I, 2ª edição, pág. 687, “(…) quando as pretensões deduzidas nas ações derivam do mesmo facto jurídico, analisado à luz da substanciação consagrada no n.º 4”
Dispõe o nº 4 do artº 581º do Código de Processo Civil que “há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico. Nas ações reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real, nas ações constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido”.
Por causa de pedir, conforme refere o Acordão da Relação de Guimarães, acima referido entende-se “(…)o ato ou facto jurídico em que o autor se baseia para enunciar o seu pedido, ou o facto constitutivo da situação jurídica material que se quer fazer valer, ou ainda o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido (v. Alberto dos Reis, obra citada, Vol. I, p. 309, Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, 2.ª Edição, Vol. I, p. 343 e Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, p. 245).
Podemos ainda salientar aqui que tendo presente que o objetivo do caso julgado é impedir a repetição de decisões “a exigível identidade de causas de pedir não implica uma absoluta coincidência das causas de pedir concretamente invocadas, sendo suficiente que os factos que integram o núcleo essencial das normas jurídicas que se pretendem aplicáveis na segunda ação já tenham sido invocados na ação anterior, ainda que a par de outros factos e em posição instrumental relativamente a eles”.
Na presente ação a causa de pedir é constituída pelo conjunto de factos alegados pela autora, ora recorrente, dos quais resulta a verificação de um acidente de viação, causado pelo 2º réu ao serviço da 1ª ré, e do qual resultaram danos. Todos estes factos foram também alegados e foram dados como provados na primeira das ações instaurada.
Mas se naquela ação, foi invocado um contrato de seguro titulado pela apólice de responsabilidade civil exploração celebrada pela mesma com a EMP03... – Companhia de Seguros, S.A, que se verificou não abranger aquele evento, nesta presente ação, invoca-se a obrigação da 1ª ré a celebrar um seguro de responsabilidade civil que abrangesse os eventos provocados pela circulação da máquina em causa e a sua não celebração.
Ou seja, embora grande parte dos factos – todos aqueles que dizem respeito à dinâmica do sinistro ocorrido em 11 de agosto de 2020, aos danos resultantes do mesmo, ao nexo de causalidade entre o sinistro e os danos sofridos, e à ilicitude do facto, ou à culpa do condutor da máquina, ora 2º réu – são os mesmos e não se pretendem ver novamente discutidos, aceitando-se os mesmos, o que de novo se vem alegar e pretende ver discutido é que, cabendo à ré EMP02... a obrigação de segurar a máquina que se viu envolvida no sinistro, a mesma incumpriu o dever de a segurar, dever imposto por força do estabelecido em sede de artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, uma vez que à data dos factos, sobre a máquina envolvida no sinistro não havia sido celebrado qualquer contrato de seguro automóvel, incumprindo a ré o seu dever de segurar o veículo em questão.
Daqui concluímos que as pretensões deduzidas nos dois processos não procedem dos mesmos factos jurídicos, sendo diferentes as respetivas causas de pedir, sem prejuízo de parte dos factos alegados na presente ação respeitarem ao anterior processo, sendo os mesmos aceites e sendo enquadramento da nova causa e pedir.
Assim sendo, não se verifica o terceiro dos requisitos do caso julgado, ou seja, a identidade da causa de pedir, o que conduz à não verificação da exceção de caso julgado.
Assim, e em face do exposto outra solução não vislumbramos que a revogação da decisão recorrida na medida em que julgou verificada a exceção de caso julgado e se absteve de conhecer do mérito, determinando-se o prosseguimento dos autos.
*
VI. Decisão:

Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente o recurso, revogando-se a decisão proferida na medida em que julgou verificada a exceção de caso julgado e se absteve de conhecer do mérito, determinando-se o prosseguimento dos autos.

Custas pela recorrida EMP02....
               
Guimarães, 4 de dezembro de 2025

Relatora: Margarida Pinto Gomes
Adjuntos: Elisabete Moura Alves
João Paulo Pereira