Sumário elaborado pela relatora (artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil):
I – O despacho que convida o Autor a sanar a situação de ilegitimidade passiva, por preterição de litisconsórcio necessário passivo, sob pena de o Réu ser absolvido da instância, por não declarar a ilegitimidade passiva e, consequentemente, não determinar a absolvição do Réu da instância, não é, em si mesmo, suscetível de recurso.
II – Só com o referido despacho de convite ao suprimento da exceção dilatória de ilegitimidade passiva desconhece-se o futuro processual da referida questão, o qual sempre dependerá quer da posição adotada pelo Autor quer da prolação de um despacho definitivo sobre tal questão.
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1
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Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
O Autor AA veio reclamar para a conferência da decisão sumária proferida em 29-09-2025, que manteve a não admissão do recurso, nos termos que ora se transcreve:
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I – Relatório
Em sede de audiência prévia, realizada em 06-01-2025, foi proferido despacho com o seguinte teor decisório:
Pelo exposto, e antes de mais, nos termos do disposto nos art.º 6.º, n.º 2, do C.P. Civil e 27.º, n.º 2, al. a), do C.P. Trabalho, convida-se o A. a vir suprir, no prazo de 10 (dez) dias, a ilegitimidade passiva decorrente de preterição de litisconsórcio necessário passivo, requerendo a intervenção principal provocada da entidade empregadora para a qual A. e R. trabalhavam à data dos factos alegados na petição inicial, sob pena de o R. ser absolvido da instância.
Notifique.”
Inconformado com este despacho, o Autor AA veio, em 24-01-2025, interpor recurso.
Em 29-01-2025 tal recurso não foi admitido, nos seguintes termos:
Veio o A. AA interpor recurso do despacho proferido em sede de audiência prévia realizada no dia 06.01.2025 (cfr. Ata sob a Ref.ª Citius 101005967) no qual o tribunal, no âmbito do exercício do respetivo dever de gestão processual, lhe endereçou o convite ao suprimento da ilegitimidade decorrente de preterição de litisconsórcio necessário passivo.
Cumpre aferir da tempestividade do recurso apresentado (não estando em causa a sua extemporaneidade, mas a circunstância de o aludido despacho ser suscetível de recurso na presente data).
Nos termos do disposto no art.º 79.º-A do Código de Processo do Trabalho:
«1 - Cabe recurso de apelação:
a) Da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente;
b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou a alguns dos pedidos.
2 - Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância:
a) Da decisão que aprecie o impedimento do juiz;
b) Da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal;
c) Da decisão que ordene a suspensão da instância;
d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova;
e) Da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual;
f) Da decisão que ordene o cancelamento de qualquer registo;
g) Da decisão prevista na alínea a) do n.º 3 do artigo 98.º-J;
h) Do despacho que, nos termos do n.º 2 do artigo 115.º, recuse a homologação do acordo;
i) Da decisão prevista na alínea a) do n.º 5 do artigo 156.º;
j) De decisão proferida depois da decisão final;
k) Da decisão cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil;
l) Nos demais casos especialmente previstos na lei.
3 - As restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1.
4 - No caso previsto no número anterior, o tribunal só dá provimento às decisões impugnadas conjuntamente com a decisão final quando a infração cometida possa modificar essa decisão ou quando, independentemente desta, o provimento tenha interesse para o recorrente.
5 - Se não houver recurso da decisão final, as decisões interlocutórias que tenham interesse para o apelante independentemente daquela decisão podem ser impugnadas num recurso único, a interpor após o trânsito da referida decisão.»
O despacho recorrido não se enquadra em qualquer das alíneas do n.º 2 do referido preceito.
Assim, o despacho identificado no requerimento que antecede (Ref.ª Citius 8558697 de 24.01.2025) apenas pode ser impugnado “no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1” (cfr. n.º 3 do citado art.º 79.º-A do CPT).
Em face do exposto, por intempestivo, o tribunal não admite o recurso interposto.
Notifique.
Foi deste despacho que o Autor AA veio, em 17-02-2025, reclamar, por entender que o recurso interposto devia ter sido admitido nos termos do art. 79.º- A, n.º 2, al. K), do Código de Processo do Trabalho.
Uma vez que se mostra paga a multa, a presente reclamação é tempestiva.
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II – Objeto da Reclamação
O que importa apreciar é se o recurso deveria ter sido admitido.2
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III – Matéria factual relevante
A matéria factual relevante é a que consta do Relatório que antecede.
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IV – Fundamentação de Direito
Apreciemos, então.
O despacho recorrido não admitiu o recurso por o considerar intempestivo, visto que tal despacho apenas pode ser impugnado “no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1”, conforme art. 79.º-A, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho.
O despacho recorrido reporta-se a um convite endereçado ao Autor para suprir a exceção dilatória de ilegitimidade passiva decorrente de preterição de litisconsórcio necessário passivo, ou seja, de um convite formulado à parte nos termos do art. 27.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho, no âmbito do dever de gestão processual que compete ao juiz e que se mostra consagrado no n.º 1 desse artigo. Este artigo é, aliás, semelhante ao art. 6.º do Código de Processo Civil.
O despacho recorrido, diferentemente do que o reclamante alega, não declarou a ilegitimidade passiva “por falta de inclusão da entidade empregadora como parte no processo”, tendo apenas se limitado a convidar o Autor a sanar a situação de ilegitimidade passiva, por preterição de litisconsórcio necessário passivo, “sob pena de o R. ser absolvido da instância”. No caso de o Autor cumprir com o solicitado nunca seria declarada a ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio necessário passivo, com a consequente absolvição do Réu. E, mesmo que o Autor não cumprisse com o solicitado, só após a prolação de despacho a declarar a ilegitimidade passiva, caso o mesmo viesse a ser proferido, é que o Réu seria absolvido.
Na realidade, mesmo com a indicação da cominação em caso de não aceitação do convite para regularizar determinada situação, tal despacho, em si mesmo, apenas adverte a parte das eventuais consequências em caso de incumprimento, mas não as aplica, nem elas são aplicadas automaticamente após o seu incumprimento, visto que carecem sempre de um despacho a determinar a aplicação dessas consequências.
Exatamente porque o despacho que convida a parte a atuar em determinado sentido não é definitivo quanto ao que poderá ocorrer no futuro, sendo sempre a parte convidada a determinar tal futuro, não é tal despacho, em si mesmo, suscetível de recurso.3
Acresce que, por se tratar de um despacho proferido no âmbito do poder-dever do juiz de dirigir ativamente o processo, providenciando pelo seu andamento célere e promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao seu normal prosseguimento, também não seria de admitir o recurso nos termos do art. 630.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho.
Assim, ainda que por fundamentação diversa da que consta do despacho reclamado, é de indeferir a presente reclamação, por o despacho recorrido não ser suscetível de recurso.
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V – Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação apresentada pelo reclamante Autor AA, mantendo-se a não admissão do recurso, dada a natureza do despacho recorrido.
Custas pelo reclamante, que se fixa em 2 UC.
Notifique.
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Por tempestiva, admitiu-se a presente reclamação, tendo-se enviado o processo, nos termos dos arts. 643.º, n.º 4, e 652.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Civil, à Conferência.
Após os vistos, procedeu-se à análise da reclamação em Conferência.
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II – Objeto da Reclamação
O objeto da reclamação para a Conferência é o mesmo da reclamação da rejeição do recurso pela 1.ª instância para este tribunal de recurso.
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III – Enquadramento jurídico
Por se manter na íntegra a fundamentação expendida na decisão sumária proferida em 29-09-2025, que se deu por integralmente reproduzida, apenas nos resta concluir pela improcedência da presente reclamação, mantendo-se a não admissão do recurso, dada a natureza do despacho recorrido.
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IV – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em declarar improcedente a presente reclamação para a conferência e, em consequência, manter a decisão sumária de não admissão do recurso, dada a natureza do despacho recorrido.
Custas a cargo do Autor/reclamante (art. 527.º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil).
Notifique
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Évora, 27 de novembro de 2025
Emília Ramos Costa (relatora)
Paula do Paço
Mário Branco Coelho
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1. Relatora: Emília Ramos Costa; 1.ª Adjunta: Paula do Paço; 2.º Adjunto: Mário Branco Coelho.↩︎
2. Refira-se que todas as demais questões colocadas na reclamação, por se reportarem ao conteúdo do próprio recurso e não à questão atinente à sua admissão, não serão apreciadas.↩︎
3. Vide acórdãos do TRC proferido em 28-01-2025 no processo n.º 3082/21.8T8LRA-A.C1 e do TRE proferido em 30-01-2025 no processo n.º 826/23.7T8TNV-A.E1; consultáveis em www.dgsi.pt.↩︎