OBRAS
LINHA ARQUITECTÓNICA
PROPRIEDADE HORIZONTAL
AUTORIZAÇÃO
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
ABUSO DE DIREITO
Sumário

Sumário:
1. Das obras que prejudicam a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício, previstas na alínea a) do n.º 2 do artigo 1422.º Código Civil, distinguem-se aquelas que, nos termos do n.º 3 do mesmo preceito, modificam a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício, pois estas, ao contrário das primeiras, podem ser autorizadas por deliberação dos condóminos aprovada por maioria qualificada de 2/3 do valor total do prédio.

2. Qualquer obra com impacto na linha arquitetónica ou no arranjo estético do edifício em propriedade horizontal, por mínima que pareça, terá de ser autorizada pela assembleia de condóminos, sob pena de o prédio, “de "obra pequena" em "pequena obra", vir a assumir uma configuração totalmente diferente da originária”, como se afirmou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.12.2006.

3. Nas palavras do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.06.2004, “A modificação que produz desarmonia no conjunto do edifício constitui uma alteração das suas características e da sua estética.”

4. Assim, não tendo sido autorizada em assembleia de condóminos a obra consistente na instalação de painéis de vidro que correm como cortinados na varanda da fração da A., deve tal obra ser considerada ilegal.

5. Estando provado que foram integradas na ordem de trabalhos da assembleia de condóminos questões relacionadas com irregularidades em diversas frações; que quanto a um outro condómino foi deliberado instaurar uma ação civil; e que as demais questões só não foram objeto de deliberação por falta de quórum, decorrente do prolongamento da assembleia, em consequência do tempo que demorou o debate do caso da A., não pode afirmar-se que a A. seja tratada de forma desigual relativamente aos demais condóminos, não ocorrendo abuso de direito.

(Sumário da responsabilidade da Relatora, nos termos do artigo 663.º, n.º 7 do Código de Processo Civil)

Texto Integral

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Apelação n.º 2117/23.4T8LLE.E1


(1ª Secção)


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Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:


I - Relatório


1. AA veio intentar a presente ação constitutiva, sob forma de processo comum, contra:


1) CONDOMÍNIO DO PRÉDIO BB;


2) CC;


3) DD;


4) EE e FF;


5) GG e HH;


6) II e JJ;


7) KK e LL;


8) MM e NN;


9) OO;


10) PP;


pedindo que seja declarada a anulação da deliberação, respeitante à fração I, de qual a A. é proprietária, tomada na Assembleia Geral de Condóminos de 16 de junho de 2023.


Alega, em síntese, que pelo anterior proprietário havia sido instalada uma cortina de vidro, sendo que na Assembleia supramencionada foi deliberado que a autora deveria remover a cortina de vidro.


Sucede que a cortina de vidro não prejudica a linha arquitetónica/ o arranjo estético do edifício, existem outras irregularidades nas frações que o Condomínio decidiu não apreciar, parte dos condóminos que aprovaram a deliberação não compreenderam as suas consequências jurídicas, uma vez que não falam português e dois foram representados através de procuração.


2. Em sede de contestação, os RR. vieram defender-se por exceção, alegando a sua ilegitimidade passiva e a caducidade do direito de ação, bem como por impugnação, alegando que a cortina de vidro prejudica a linha arquitetónica do edifício, que já tinha sido um problema debatido ao longo de vários meses e que os condóminos que votaram favoravelmente tinham pleno conhecimento do conteúdo da deliberação e suas consequências.


Vieram ainda deduzir pedido reconvencional, requerendo a condenação da A. a remover os painéis de vidros instalados e a pagar ao R. Condomínio uma sanção pecuniária compulsória de € 50,00 por cada dia que assim não faça.


3. A A. veio apresentar réplica, tendo exercido o contraditório relativamente às exceções invocadas e apresentado defesa, por impugnação, relativamente aos factos alegados no pedido reconvencional.


4. Foi admitido o pedido reconvencional, proferido despacho saneador, onde foi julgada procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva dos condóminos e, consequentemente, foram absolvidos os RR. condóminos da instância, tendo a ação prosseguido os seus termos contra o R. Condomínio, representado pela sua administração, e mais foi considerada improcedente a exceção perentória de caducidade, tendo sido fixados o objeto de litígio e os temas da prova.


5. Foi realizada a audiência final, após o que foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:


“Nestes termos, pelo exposto e de harmonia com o disposto nos preceitos legais supracitados, julgo o pedido reconvencional formulado pelo réu CONDOMÍNIO DO PRÉDIO BB parcialmente procedente e, em consequência:


a) condeno a autora QQ a remover os painéis de vidro instalados na varanda [vide ponto 4. dos factos dados como provados] da fração designada pela letra I [correspondente ao rés-do-chão, do prédio constituído sob o regime da propriedade horizontal sito em Lote 11 - I.P.P. 4 - Zona 2 - Subzona 2, Vila A, na Rua 1, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cidade B, sob o n.º 9435/20080729], no prazo de trinta dias a contar do trânsito em julgado.


b) absolvo a autora do demais peticionado pelo réu.”


6. Inconformada com a Sentença, a A. apelou da mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:


“1. Considera a Recorrente que de toda a prova produzida nos presentes autos, não pode resultar provado que “O vão da varanda da fração I foi convertido, pela colocação de quatro painéis em vidro, num espaço fechado, não obstante poder ser ocasionalmente aberto, uma vez que são deslizantes, recolhendo de modo semelhante a uma cortina.” (ponto 5 da matéria de facto provada);


2. Não resulta provado que o vão da varanda foi convertido num espaço fechado que ocasionalmente pode ser aberto, tal seria uma marquise, o que não é o caso descrito nos presentes autos;


3. Do depoimento da testemunha RR decorre que se trata apenas de um vidro amovível, uma cortina de vidro, que tanto pode estar totalmente recolhida, como se nada lá estivesse, como fechada;


4. Tal foi referido, por diversas vezes, pela testemunha RR, a única com conhecimento exacto do local e da instalação existente (depoimento registado em suporte digital disponível na aplicação informática em uso no Tribunal a quo, de 10h13 a 11h21);


5. Uma marquise serve para fechar um espaço, uma vez que as janelas desta se encontram sempre fechadas e apenas se abrem ocasionalmente, enquanto que uma cortina de vidro pode estar totalmente aberta, como se não existisse qualquer vidro naquela varanda e por isso se diz ser amovível.


6. Decorre do Regulamento do Condomínio (art. 7º, nº 2, alínea j)) que a apenas a construção de marquises é proibida, porém nada é dito quanto às cortinas de vidro, uma vez que não se pode considerar que alterem o aspecto exterior do edifício;


7. A este propósito, importa fazer referência ao Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo 0035226, Relator Nascimento Gomes, “Uma estrutura metálica, amovível, susceptível de a todo o tempo poder ser retirada, que envidraça uma varanda, pode não afectar a linha arquitectónica ou arranjo estético do edifício”;


8. Aliás, decorre das fotografias juntas com a Réplica que quando os painéis estão abertos parece não existir qualquer estrutura colocada no local;


9. Pelo que, não pode a Recorrente concordar com o referido pelo Tribunal a quo de que “Dito isto, das imagens que foram juntas com a petição inicial é possível verificar que a estrutura instalada é visível quer de dentro para fora quer de fora para dentro”;


10. Não houve qualquer inspecção ao local que possibilitasse que a Mma. Juiz tivesse conhecimento das características da cortina vidro para aferir se a mesma é ou não visível do lado de fora;


11. Contrariamente ao referido na douta Sentença, não é pela análise das fotografias juntas nos autos que se pode atestar se é, ou não, visível o vidro colocado na fracção da Recorrente;


12. Não pode o Tribunal a quo considerar provado que o vão da varanda foi convertido num espaço fechado, uma vez que em momento algum tal foi referido em sede de Audiência de Julgamento;


13. Para motivar a decisão tomada, na douta Sentença, o Tribunal a quo limitou-se a referir que “os factos elencados nos pontos 4 a 6 foram dados como provados através da prova produzida em Audiência de Julgamento, bem como da documentação junta aos autos.”;


14. Em momento algum a Mma. Juiz refere como alcançou tal conclusão;


15. Deve ser considerado provado que “No vão da varanda da fração I foram colocados quatro painéis em vidro deslizantes, recolhendo de modo semelhante a uma cortina, que não prejudicam a linha arquitetónica do edifício”.


16. O Tribunal não pode dar como não provado que “D) O réu Condomínio apenas considerou que as duas situações de incumprimento existentes que necessitaram de ser corrigidas respeitavam à fração B e à fração I.”;


17. Da matéria de facto dada como provada decorre:


“13. Após a mencionada análise, foi aprovado “por maioria, dar um prazo de 60 à proprietária da fração I, [aqui autora], para regularizar a situação e, caso não o faça a administração deverá avançar com uma ação cível”, bem como “15. Na Assembleia Extraordinária de 16/06/2023, foi ainda deliberado, por maioria, avançar com uma ação civil contra os proprietários da fração B, relativamente ao ponto 1, b) da ordem de trabalhos”;


18. Existe uma clara contradição entre o ponto D) dado como não provado e a matéria de facto dada como provada nos pontos 13 e 15, na medida em que nestes é referido que as únicas fracções identificadas com irregularidades são a fração B e I, as quais foram já referenciadas para proceder às correções;


19. Quanto às outras fracções autónomas e às irregularidades verificadas nada foi discutido ou deliberado, não tendo sequer essas irregularidades sido identificadas;


20. A Recorrida sabe que existem fracções que contrariam o disposto no Regulamento do Condomínio, uma vez que têm floreiras, toldos, estruturas em acrílico nos terraços… e estas sim, violam grosseiramente não só o disposto no Regulamento do condomínio, como a linha arquitetónica dos diversos edifícios;


21. O depoimento da testemunha SS, também condómina, no identificado Condomínio, (depoimento registado em suporte digital disponível na aplicação informática em uso no Tribunal a quo, de 11h25 a 11h38) revelou-se fulcral para se perceber que só existem dois visados (4’56” – Testemunha – “(…) depois porque pareceu-me injusto porque havia e há outras situações de alegada incorrecção do ponto de vista urbanístico e eu achei que se era para tirar, tinham que tirar todos, não se pode estar a apontar o dedo a um ou dois quando há mais.”);


22. Também a testemunha RR atestou a existência de diversas situações desconformes com o regulamento (37’14” – (…) Testemunha – “não, principalmente os casos mais gritantes eram as pérgulas nos terraços (…) aqueles toldos retratáveis que ao serem fechados traziam uma imagem terrível para o condomínio e depois questões menores…”.);


23. Existe uma dualidade de critérios no tratamento da situação existente, se, por um lado, a Recorrente tem sido perseguida para regularizar a situação existente, os outros condóminos continuam impunes;


24. A Recorrida age em manifesto abuso de direito – “Por tudo isto, não nos repugna considerar que o condomínio-autor ao exigir, apenas dos RR, e não aos demais condóminos que possuem no imóvel construções idênticas à sua e realizada também sem qualquer autorização da assembleia de condóminos, está a agir em abuso de direito, ou seja, excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, na modalidade de venire contra factum proprium, o que obstaculiza o exercício do seu direito (…)”, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, processo 895/08-2, Relator Pires Robalo;


25. Deve assim considerar-se como matéria de facto provada que “Não obstante existirem diversas situações de incumprimento, o réu Condomínio apenas considerou que as duas situações de incumprimento existentes que necessitaram de ser corrigidas respeitavam à fração B e à fração I.”


26. Verifica-se, ainda, omissão de pronúncia, pelo Tribunal a quo, quanto à valoração da prova junta pelo Recorrente na Audiência de Julgamento, uma vez que na sessão de julgamento, foram juntas fotografias pela testemunha RR, as quais foram admitidas pela Mma. Juiz a quo , como decorre da Acta.


27. Embora a Mma. Juiz tenha admitido a junção das fotografias ao processo, não se pronunciou quanto ao conteúdo das mesmas na Sentença proferida.


28. Verifica-se uma clara omissão de pronuncia pelo Tribunal a quo.


29. Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento enferma a Sentença de Nulidade, o que desde se invoca para todos os efeitos legais.


30. Por fim, como é notório do depoimento prestado pela testemunha RR, mais do que “fechar o vão da varanda”, o que a Recorrente pretende é que os seus sobrinhos possam estar em segurança na casa de férias da família.


31. Deve, assim, ser revogada a Decisão proferida e, consequentemente, ser revogado o pedido reconvencional apresentado pela Recorrida.


32. Por último, deverá ser declarada nula a deliberação tomada na Assembleia de Condóminos, realizada em 16.07.2023, por ser manifestamente ilegal e abusiva.”


7. O R. apresentou contra-alegações, onde pugnou pela improcedência do recurso e requereu a ampliação do objeto do recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, na parte atinente à ampliação do objeto do recurso:


“(…) xxxi. Já no ponto B) al. b), a sentença deve ser substituída por outra que condene a recorrente no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, como se deixou peticionado em reconvenção.


xxxii. Pelo que se requer a ampliação do objeto do recurso.


xxxiii. A absolvição da recorrente deste pedido deriva da consideração do tribunal a quo de que a remoção da estrutura em acrílico em causa é facto fungível.


xxxiv. Não se concorda com a referida consideração, na medida em que a estrutura se encontra instalada, como provado, por meio de uma calha no interior da varanda (fechada), a qual é propriedade exclusiva da recorrente, cf. título constitutivo junto aos autos, e só acessível a partir do interior da fração.


xxxv. A prestação a realizar tem, pelo exposto, natureza infungível.


xxxvi. Há que condenar a recorrente na sanção pecuniária peticionada.”


8. A A. não respondeu à requerida ampliação do objeto do recurso.


9. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


II – Questões a Decidir


1. O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, não sendo objeto de apreciação questões novas suscitadas em alegações, exceção feita para as questões de conhecimento oficioso (artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).


Não se encontra também o Tribunal ad quem obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, sendo livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3 do Código de Processo Civil).


2. Da ampliação do objeto do recurso


2.1. Nos presentes autos veio a A. recorrer da decisão que julgou improcedente a ação e procedente o primeiro pedido reconvencional, condenando-a na remoção dos painéis de vidro instalados na sua varanda.


O R. Condomínio requereu a ampliação do objeto do recurso, solicitando que seja revogada a sentença recorrida na parte relativa ao segundo pedido reconvencional e, nessa conformidade, que seja condenada a A. no pagamento de sanção pecuniária compulsória.


A ampliação do objeto do recurso mostra-se prevista no artigo 636.º do Código de Processo Civil, onde se estabelece que:


“1 - No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.


2 - Pode ainda o recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas.”


Assim, esta figura reconduz-se aos casos em que a parte vencedora invocou mais do que um fundamento em suporte do pedido e este foi julgado procedente com base no primeiro fundamento indicado, mas tendo desta sentença sido interposto recurso pelo vencido e prevenindo a hipótese de uma reversão da decisão, o vencedor requer a apreciação dos demais fundamentos de suporte do pedido ao Tribunal ad quem, com a intenção de garantir a procedência do pedido.


Constata-se, deste modo, que a situação em causa não corresponde a uma ampliação do objeto do recurso, mas antes à figura do recurso subordinado, à qual respeita o artigo 633.º do Código de Processo Civil, em cujo n.º 1 se preceitua que:


“Se ambas as partes ficarem vencidas, cada uma delas pode recorrer na parte que lhe seja desfavorável, podendo o recurso, nesse caso, ser independente ou subordinado.”


Explica, a este propósito, Abrantes Geraldes (Recursos em Processo Civil, 8ª ed., Coimbra, 2024, p. 139, nota 222) que “Para além de serem diferentes os objetivos que se pretendem alcançar com um e com outro instrumento processual, são diversas as circunstâncias que os motivam, já que o recurso subordinado implica que a parte ficou vencida em relação ao resultado declarado na sentença, ao passo que a ampliação do objeto do processo pressupõe apenas que não foi acolhido o fundamento (ou fundamentos) invocado pela parte ou a verificação de alguma nulidade da decisão”.


2.2. A questão que se coloca de seguida é a de saber se é suscetível de ser convolado em recurso subordinado o requerimento do Recorrido de ampliação do objeto do recurso.


Abrantes Geraldes (ibidem) refere que a diversidade dos meios “não deve obstar, porém, a que, verificados os requisitos formais, se proceda à requalificação do meio processual utilizado (art. 193.º, n.º 3), desde que não existam outros obstáculos legais”.


Efetivamente, nos termos do n.º 3 do indicado artigo 193.º do Código de Processo Civil, “O erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados”.


Trata-se de uma manifestação do princípio do aproveitamento dos atos, visando assegurar a prevalência da substância sobre a forma (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª ed., reimp., Coimbra, 2024, p. 257).


Contudo, há “limitações naturais” a esta convolação, a saber, o esgotamento do prazo previsto para a prática do ato convolado; a circunstância do ato praticado não reunir os requisitos específicos essenciais do ato para o qual seria convolado; a circunstância da convolação implicar uma diminuição das garantias de defesa, nos termos do n.º 2 do artigo 193.º citado, onde se diz que “Não devem, porém, aproveitar-se os atos já praticados, se do facto resultar uma diminuição de garantias do réu” (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., pp. 258-259).


Ora, nos termos do artigo 638.º, n.º 8 do Código de Processo Civil, “Sendo requerida pelo recorrido a ampliação do objeto do recurso, nos termos do artigo 636.º, pode o recorrente responder à matéria da ampliação, nos 15 dias posteriores à notificação do requerimento.”


Diversamente, no que tange ao recurso subordinado, o respetivo prazo de resposta afere-se pelo prazo de interposição, o qual, quando não tenha por objeto a reapreciação de prova gravada, como sucede no caso em apreço, é de 30 dias (artigo 638.º, n.ºs 1, 5 e 7 do Código de Processo Civil).


Assim, a convolação implicaria prejuízo para as garantias de defesa da parte contrária, na medida em que o prazo de que a Recorrente dispôs para apresentar a sua defesa representou metade do prazo a que tem direito em face da correta tramitação como recurso subordinado.


Consideramos, deste modo, não ser legalmente admissível a convolação, pelo que não será apreciada a questão submetida a juízo sob a denominação de ampliação do objeto do recurso.


3. Consequentemente, cumpre apreciar:


a) se a sentença é nula por omissão de pronúncia;


b) se deve ser alterada a decisão de facto quanto aos pontos 5. e D);


c) se deve ser revogada a sentença e, em conformidade, anulada a deliberação da assembleia de condóminos impugnada nesta ação.


III – Fundamentação


A) Nulidade da sentença


Veio a A. invocar a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, com fundamento em que “Embora a Mma. Juiz tenha admitido a junção das fotografias ao processo, não se pronunciou quanto ao conteúdo das mesmas na Sentença proferida.”


Importa, assim, ponderar o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil: “É nula a sentença quando: (…) d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (…)”.


A norma em evidência apresenta conexão com o disposto no n.º 2 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, onde se impõe ao Tribunal que exponha as questões de que deve conhecer, e no n.º 2 do artigo 608.º do mesmo compêndio legal, no qual se estabelece que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação”.


Por outro lado, as questões de que o Tribunal deve conhecer não são os argumentos esgrimidos pela parte em defesa da solução que advoga como sendo a correta, antes correspondem aos pedidos formulados pelo autor, ou pelo réu em sede de reconvenção, ou às exceções deduzidas contra os pedidos do autor ou do réu.


Constitui, deste modo, orientação jurisprudencial pacífica que “I — Só há nulidade por omissão de pronúncia quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar [cf. artigo 615.º, n.º 1, alínea d), primeira parte, do Código Civil].


II — O Supremo Tribunal de Justiça tem declarado, constantemente, que deve distinguir-se as autênticas questões e os meros argumentos ou motivos invocados pelas partes, para concluir que só a omissão de pronúncia sobre as autênticas questões dá lugar à nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08.02.2024 (Nuno Pinto Oliveira), Processo n.º 995/20.8T8PNF.P1.S2, e, no mesmo sentido, entre outros, os Acórdãos de 23.01.2024 (Maria Clara Sottomayor), Processo n.º 7962/21.2T8VNG.P1.S1, e de 11.10.2022 (Isaías Pádua), Processo n.º 602/15.0T8AGH.L1-A.S1, todos in http://ww.dgsi.pt/).


Do ora exposto decorre, com clareza, que não consubstancia omissão de pronúncia a circunstância de não ser apreciado ou valorado um determinado meio de prova, podendo, quando muito, constituir erro de julgamento.


Sem prejuízo, assinale-se que o Tribunal a quo escreveu na motivação da decisão de facto que “teve-se em consideração quer as fotografias constantes da petição inicial, da réplica e juntas em Audiência Final”, pelo que o meio de prova em causa foi efetivamente ponderado.


Assim, em bom rigor, o que se extrai daqui é a discordância da A. quanto à apreciação da prova efetuada pelo Tribunal a quo, o que deve ser conhecido a propósito da impugnação da decisão de facto.


Improcede, assim, a invocada nulidade.


B) Fundamentação de facto


1. O Tribunal a quo julgou provados os seguintes factos:


“1. Através da ap. 3665, de 31/05/2021, encontra-se inscrita em nome da autora [compra] a fração autónoma designada pela letra I, correspondente ao rés-do-chão, do prédio constituído sob o regime da propriedade horizontal sito em Lote 11 - I.P.P. 4 - Zona 2 - Subzona 2, Vila A, na Rua 1, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cidade B, sob o n.º 9435/20080729.


2. No documento complementar anexo à escritura de constituição da propriedade horizontal, a fração “I” do edifício consta descrita nos seguintes termos: “Bloco Dois, corpo A, rés-do-chão direito, de tipologia T dois, destinada a habitação, composta por hall, sala, dois quartos com instalações sanitárias, cozinha, instalação sanitária de serviço, espaço de estendal e duas varandas. Com o uso exclusivo de dois lugares de estacionamento na cave com os números 26 (vinte e seis) e 27 (vinte e sete), e uma arrecadação com o número 25 (vinte e cinco), e com a permilagem de dezasseis vírgula setenta e dois, com o valor correspondente de cento e cinquenta mil quatrocentos e oitenta euros”.


3. Nos termos do artigo 7.º do Regulamento de Condomínio, “1 – O uso das frações autónomas que constituem o prédio está condicionado aos fins consignados na escritura de constituição de propriedade horizontal, sendo expressamente proibidas outras utilizações que nesta não se encontrem contempladas. 2 – Os condóminos estão expressamente proibidos de: a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício. (…) j) Acrescentar qualquer tipo de estrutura exterior que altere o aspeto exterior do edifício, nomeadamente transformar os terraços em marquises (…)”.


4. Antes da aquisição da fração pela autora, o anterior proprietário procedeu à instalação de quatro painéis de vidro, na varanda que se situa na parte frontal do prédio descrito no ponto 3..


5. O vão da varanda da fração I foi convertido, pela colocação de quatro painéis em vidro, num espaço fechado, não obstante poder ser ocasionalmente aberto, uma vez que são deslizantes, recolhendo de modo semelhante a uma cortina.


6. Para o efeito, o anterior proprietário da fração I instalou uma calha deslizante localizada no teto na parte interna da varanda.


7. Antes da aquisição da fração pela autora, o anterior proprietário retirou a grade/ corrimão existente na varanda.


8. O anterior proprietário colocou ainda um cortinado opaco que impossibilitava que qualquer transeunte visse do exterior o interior da habitação, uma vez que a fração se situa no rés-do-chão.


9. Em 23/03/2022, na Assembleia Geral de Condóminos do prédio descrito no ponto 1. ficou a constar em ata o seguinte: “Foi solicitado um ponto de situação sobre a aplicação de um vidro na varanda da fração I. A administração passou a palavra ao novo proprietário da fração I que herdou o problema e estava presente. O proprietário disse que quando comprou não tinha conhecimento do problema e que lhe agradou o facto de ter uma proteção para os netos, de seguida expôs a sua interpretação dos factos, documento que anexamos à data como ANEXO I. Vários condóminos manifestaram a sua indignação pela alteração que foi efetuada, sem consentimento. Adiantaram ainda que para além do vidro existe um perfil de alumínio e um cortinado o que dá um aspeto descuidado. Foi também retirado o gradeamento da varanda o que descarateriza a fração. O Sr. RR informa que também não gosta do cortinado e que lhe foi dito pelo anterior proprietário que o gradeamento estava guardado numa arrecadação comum do condomínio na possa da administração. A TT considera essa afirmação estranha, uma vez que a administração não foi consultada, nem informada esta alteração. De qualquer modo a administração vai verificar e informar o proprietário de acordo. Face ao descontentamento, o proprietário alertou a assembleia para 17 outras alterações de fachada, que existem no condomínio. Os restantes proprietários ficaram indignados com o número de alterações que nunca foram identificadas. O Sr. RR irá enviar fotos que serão depois circuladas pelos restantes condóminos. Após análise de todas as alterações, dever-se-á numa próxima assembleia, deliberar sobre os diferentes incumprimentos de acordo com a lei e regulamento”.


10. Quando adquiriu o imóvel, a autora procedeu à remoção do cortinado opaco e recolocou a grade retirada pelo anterior proprietário com o propósito de harmonizar a sua varanda com as outras varandas existentes do prédio urbano.


11. Os condóminos do prédio descrito no ponto 1. foram convocados para uma Assembleia Extraordinária a ocorrer em 16/07/2023, pelas 17h30, com a seguinte ordem de trabalhos:


“1 – Análise discussão e votação dos seguintes incumprimentos ao regulamento e, respetivas medidas a tomar: a) Fecho da varanda da fração I; b) Fecho da varanda e instalação de um alpendre com estrutura de metal e vidro na fração B; c) Toldos retrácteis; d) Treliças no gradeamento varandas”


2 – Análise discussão e votação para colocação de uma espécie de barreira para delimitar o perímetro da piscina/ moradias.


3 – Adequação das regras e normas do condomínio à nova lei do alojamento local com votação da proposta de incremento de quotas para aquelas frações que se encontram neste regime;


4 – Análise, discussão e votação para criação de fundo para a futura reabilitação e pintura geral do condomínio.


5 – Análise, discussão e votação de orçamentos para: a) Sistema dissuasor de Pombos; b) Reparação betoneira intercomunicado do Bloco 2ª; c) Reparação do problema de infiltração da fração AQ causado pelo terraço da fração BE;


6 – Decisão sobre uniformização: a) Da cor floreiras situadas nas varandas; b) Das proteções de acrílico/ vidro à altura do gradeamento das varandas e em pérgulas”


12. Em 16/06/2023, na Assembleia Geral de Condóminos do prédio descrito no ponto 1., com início às 17h30 ficou a constar em ata o seguinte: “Ponto um da ordem de trabalhos: Análise, discussão e votação dos seguintes incumprimentos ao regulamento e respetivas medidas a tomar: a) "Fecho da varanda fração I". Este assunto já foi amplamente discutido e face à falta de colaboração do proprietário em retirar a estrutura que resulta no fecho da varanda da fração I, não resta outra alternativa senão avançar com uma ação cível. Após o início dos trabalhos, e antes de se iniciar a varandas e terraços. A advogada respondeu que quando falamos em terraço normalmente estamos a falar no terraço de cobertura e quando falamos em varandas, referimo-nos aos terraços intermédios, isto é, ao nível dos pisos inferiores. Acrescentou que tanto as alterações no terraço, como as alterações nas varandas estão sujeitas à maioria de 2/3, como decorre do anteriormente exposto. A administração informou que no final da última assembleia, os proprietários mencionaram que deveria voltar a ser incluídos na agenda apenas os que causam mais impacto. No que respeita ao envio das fotos facultadas pelo representante da proprietária da fração I, a afirmação está incorreta, uma vez que as mesmas foram enviadas aos proprietários por email. Os restantes Itens que considerem pertinentes poderão ser discutidos no futuro. O Sr. UU informou que acha que deveríamos de seguir a ordem de trabalhos e que caso algum proprietário queira discutir novos pontos, que poderão enviá-los à Administração, para discussão numa futura Assembleia. A D. Sílvia, informou que na sua opinião não deveriam avançar para as vias judiciais, como condomínio deveriam de chegar a um consenso em relação ao fecho das varandas, e que caso fosse permitido o fecho das varandas, que fossem todas do mesmo modelo. Foi questionado o valor da ação cível e os proprietários foram informados que o valor aproximado para avançar com a ação é de 1000€ e cada intervenção adicional terá um custo de 250€.


Várias opções foram adiantadas por alguns proprietários, nomeadamente: Possibilidade de alterar o regulamento de modo a permitir algumas destas alterações. A Administração informou que para alteração do regulamento que foi elaborado em conjunto com a PH terá de haver uma aprovação por unanimidade. Regulamentar uma solução estandardizada dos vidros nas varandas, tendo sublinhado a existência de várias varandas similares na Rua 1, nomeadamente nos condomínios vizinhos. A Administração informou que por exemplo no condomínio em frente existiam várias varandas fechadas sem consentimento do condomínio e contrariamente ao estipulado pelo regulamento do referido condomínio. Neste momento existe uma ação civil contra os proprietários que fecharam as varandas e, algumas frações enfrentam igualmente processos na CML. Dar um prazo máximo de 60 dias ao condómino da fração I para retirar o vidro, findo este prazo deverá avançar a ação cível; Que na próxima Assembleia seja apresentada pela LDC a lista de todas as situações que não cumprem o regulamento. Providenciar um período para que todos os condóminos possam corrigir as situações irregulares. Posteriormente, avançar com ações cíveis para aqueles que não cumprirem. Até aquela data a fração I deve retirar os vidros da varanda", e assim serviria de EXEMPLO. Foi também mencionado que o representante da proprietária da fração I é uma pessoa sensata e que deveria voluntariamente retirar o vidro dando o exemplo aos vizinhos.


O representante da proprietária da fração I, tendo presente o princípio da "promoção da boa convivência e vizinhança", apresentou a seguinte proposta: "compromete-se retirar os vidros, após a AG ordinária a realizar no início de 2024, e desde que fosse adotado o principio de igualdade de tratamento de todos os condóminos que não cumprem com o RC. Evidentemente que está totalmente em desacordo e não compreende o principio de ser o exemplo para os outros porque é contrária ao princípio da "promoção da boa convivência e vizinhança”.


13. Após a mencionada análise, foi aprovado “por maioria, dar um prazo de 60 à proprietária da fração I, [aqui autora], para regularizar a situação e, caso não o faça a administração deverá avançar com uma ação cível”.


14. A deliberação mencionada no ponto 13. registou os seguintes votos: contra das frações I, Z e J com permilagem total de 50,28. abstenção das frações F, N, BJ, AX e BB com permilagem total de 91,51. Favor das frações X, Q, R, AS, S, U, AQ, AH e BD com a permilagem total de 187,83.


15. Na Assembleia Extraordinária de 16/06/2023, foi ainda deliberado, por maioria, avançar com uma ação civil contra os proprietários da fração B, relativamente ao ponto 1, b) da ordem de trabalhos.


16. Ficou ainda a constar em ata que: “Devido à saída da maioria dos proprietários reduzindo o quórum de tal forma, que não havia quórum deliberativo para discussão dos restantes pontos, a Assembleia terminou às 21h10”.


17. A discussão do ponto 1. a) até à tomada da deliberação demorou por volta de três horas.


DA PROPOSITURA DA AÇÃO


18. Em 16/08/2023, a autora propôs a presente ação.”


2. E julgou não provados os seguintes factos:


“A) Cinco dos nove condóminos que votaram a favor da deliberação desconheciam o enquadramento jurídico da situação.


B) Cinco dos nove condóminos que votaram favoravelmente, não conseguiram compreender o que foi discutido nem a deliberação que tomaram uma vez que não compreendiam a língua portuguesa e a tradução não foi feita da forma correta.


C) Os condóminos das frações Q e U que votaram favoravelmente através de procuração não deram poderes à ré para a deliberação que foi tomada tendo em consideração a ordem de trabalhos indicada.


D) O réu Condomínio apenas considerou que as duas situações de incumprimento existentes que necessitaram de ser corrigidas respeitavam à fração B e à fração I.”


3. No n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, norma atinente à “modificabilidade da decisão de facto”, prescreve-se que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”


E no artigo 640.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, estabelece-se que:


“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:


a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;


b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;


c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.


2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:


a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;


b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”


A ideia fundamental que se extrai da norma transcrita é a de que deve o recorrente delimitar de forma clara o objeto do recurso, identificando os segmentos da decisão de facto que pretende impugnar e os meios de prova que impõem decisão diversa.


A razão desta exigência encontra-se na circunstância dos recursos se destinarem à reapreciação das decisões proferidas em 1ª instância e não à prolação de uma decisão inteiramente nova (entre outros, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 28.06.2018 (Jorge Teixeira), Processo n.º 123/11.0TBCBT.G1, e do Tribunal da Relação do Porto de 08.03.2021 (Fátima Andrade), Processo n.º 16/19.3T8PRD.P1, ambos in http://www.dgsi.pt/).


Constata-se que a Recorrente indicou os pontos de facto de cuja decisão discorda, bem como os meios de prova que, no seu entendimento, impõem decisão diversa, apontando ainda a decisão que se lhe afigura que seria a mais correta em face desses meios de prova.


Importa ainda assinalar que, por força do atual regime de recursos compete ao Tribunal da Relação apreciar a prova sindicada pelo recorrente, de acordo com as regras legais pertinentes, em ordem a formar a sua própria convicção, “por isso, a Relação poderá e deverá modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a livre apreciação da prova, um resultado diferente que seja racionalmente sustentado.” (Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7ª ed., Coimbra, 2022, p. 348).


Não se trata, no entanto, de um poder de modificação irrestrito, precisamente porque não se visa proferir uma decisão inteiramente nova, mas apenas de reapreciar a decisão proferida pela 1ª Instância, assim, “se a Relação, procedendo à reapreciação dos meios de prova postos à disposição do Tribunal a quo, conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, a convicção acerca da existência de erro, deve proceder à correspondente modificação da decisão.” (Abrantes Geraldes, ob. cit., p. 350).


No mesmo sentido se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02.11.2017 (Maria João Matos) (Processo n.º 501/12.8TBCBC.G1, in http://www.dgsi.pt/) que:


“I. O uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados, nomeadamente por os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, imporem uma conclusão diferente (prevalecendo, em caso contrário, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova).”


4. Passamos à impugnação da decisão de facto, assinalando apenas, como questão prévia, que existe um manifesto lapso de escrita no facto 11., onde se alude à Assembleia de condóminos de “16/07/2023”, quando a data em causa é o dia “16/06/2023”, pelo que se determina a retificação do sobredito lapso de escrita no sentido exposto.


4.1. Facto 5.


O Tribunal a quo julgou provado sob 5. que “O vão da varanda da fração I foi convertido, pela colocação de quatro painéis em vidro, num espaço fechado, não obstante poder ser ocasionalmente aberto, uma vez que são deslizantes, recolhendo de modo semelhante a uma cortina.”


A A. dissente desta decisão, advogando que deve o facto evidenciado ser alterado, passando a constar que “No vão da varanda da fração I foram colocados quatro painéis em vidro deslizantes, recolhendo de modo semelhante a uma cortina, que não prejudicam a linha arquitetónica do edifício”.


A impugnação assenta no depoimento da testemunha RR, que é parcialmente transcrito nas alegações, bem como nas fotografias juntas aos autos na audiência.


Ora, a redação proposta pela A. contém duas modificações à redação adotada pelo Tribunal a quo: a retirada da menção ao facto de que os painéis de vidro implicam o fechamento da varanda; a introdução da referência à ausência de prejuízo dessa estrutura sobre a linha arquitetónica do edifício.


Alega, então, a A. que o Tribunal a quo não explicou como alcançou a conclusão de que os painéis de vidro fecham a varanda e que, de todo modo, só através de uma inspeção ao local poderia pronunciar-se sobre este aspeto, mas não foi realizada tal diligência.


Da motivação da decisão de facto decorre, como se disse acima, que o Tribunal a quo ponderou todas as fotografias juntas aos autos, das quais se extrai, com clareza, que os painéis de vidro fecham a varanda.


Aliás, é esse o efeito dos cortinados, imagem aplicada aos painéis com a qual a A. concorda.


Assinala-se ainda que é também essa a conclusão que se alcança quando se pondera a finalidade apontada pela A. para conservar os ditos painéis, a saber, pretende que os seus sobrinhos possam estar protegidos quando brincam nessa varanda. Ora, a segurança das crianças advém precisamente do facto dos painéis de vidro fecharem a varanda, impedindo que as crianças se debrucem e corram o risco de cair.


Assim, não se afigura necessária uma inspeção ao local, sublinhando-se, de todo o modo, que a A. não requereu a realização dessa diligência.


Diz ainda a A. que: “uma marquise sim, serve para fechar um espaço, uma vez que as janelas desta se encontram sempre fechadas e apenas se abrem ocasionalmente.


Contrariamente, uma cortina de vidro pode estar totalmente aberta, como se não existisse qualquer vidro naquela varanda”.


Do exposto decorre, pois, que na realidade a A. disputa a equiparação entre os painéis de vidro existentes na sua varanda e uma marquise.


Porém, independentemente da discussão em redor do que sejam as características de uma marquise, o que importa é descrever as características dos painéis de vidro instalados na fração da A., o que resulta do teor dos factos 5. e 6., pelo que nada há a alterar a este respeito.


Quanto à referência à linha arquitetónica do edifício, trata-se de um conceito de direito, consagrado no artigo 1422.º, n.º 1, alínea a) do Código Civil.


A relevância da distinção entre questão de facto e questão entronca nos vetustos § 3º do artigo 647.º do Código de Processo Civil de 1939 e o artigo 653.º do Código de Processo Civil de 1961, onde se fixava que se consideravam não escritas as respostas do tribunal sobre questões de direito.


A este respeito foram sendo avançados “critérios gerais de orientação”, cuja adoção se cristalizou, enunciando Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 4ª ed., reimp., Coimbra, 1985, pp. 206 a 207) os seguintes:


- a questão de facto reporta-se a “quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior”;


- e a questão de direito contende antes com a “interpretação e aplicação da lei”.


Depurando ainda mais os conceitos expostos, conclui o Insigne Professor que é questão de facto “determinar o que aconteceu”, e é questão de direito “determinar o que quer a lei, ou seja a lei substantiva, ou seja a lei de processo” (ibidem).


Já a matéria de direito diz respeito à interpretação e aplicação das normas jurídicas, pelo que o juízo aqui formulado aponta antes para a correção da subsunção dos factos provados aos institutos jurídicos a que as partes apelam.


Rodrigues Bastos (Notas ao Código de Processo Civil, vol. III, 3ª ed., Lisboa, 2001, p. 160) expende, a este propósito, que uma questão será de direito quando para lhe responder for necessário recorrer a um conceito jurídico-normativo.


Nos últimos anos tem-se verificado uma transformação acentuada no processo civil, no sentido de um modelo mais flexível, que determinou a substituição do rigorismo do questionário e factos assentes pela base instrutória e, por fim, pelo objeto do litígio e temas da prova, aprofundando uma visão do processo menos formalista.


Temos presente que neste contexto têm surgido perspetivas mais abertas sobre a referida distinção entre facto e direito, propugnando mesmo o seu abandono, aqui avultando, em particular, Miguel Teixeira de Sousa, citado por António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª ed., reimp., Coimbra, 2024, pp. 775).


Não se trata, no entanto, de uma perspetiva inteiramente consensual, como decorre, designadamente, do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.04.2024 (Mário Belo Morgado) (Processo n.º 823/20.4T8PRT.P1.S1, in http://www.dgsi.pt/), de cuja fundamentação consta o seguinte:


“A matéria de facto “não pode conter qualquer apreciação de direito, isto é, qualquer valoração segundo a interpretação ou a aplicação da lei ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica”, pelo que as questões de direito que constarem da seleção da matéria de facto devem considerar-se não escritas (embora o NCPC não contenha norma correspondente à ínsita no art. 646º, n.º 4, 1ª parte, do anterior CPC, chega-se à mesma conclusão interpretando a contrario sensu o atual art. 607.º, n.º 4, segundo o qual na fundamentação da sentença o juiz declara os “factos” que julga provados).


Embora só acontecimentos ou factos concretos possam integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão (“o que importa não poderem aí figurar nos termos gerais e abstratos com que os descreve a norma legal, por que tanto envolveria já conterem a valoração jurídica própria do juízo de direito ou da aplicação deste”), são ainda de equiparar aos factos os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa e latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes.


Vale isto por dizer, também na expressão de Anselmo de Castro, que “a linha divisória entre facto e direito não tem carácter fixo, dependendo em considerável medida não só da estrutura da norma, como dos termos da causa; o que é facto ou juízo de facto num caso, poderá ser direito ou juízo de direito noutro. Os limites entre um e outro são flutuantes”.


Identicamente - e com o mesmo critério, como tem sido sustentado pela jurisprudência -, são de afastar expressões de conteúdo puramente valorativo ou conclusivo, destituídas de qualquer suporte factual, que sejam suscetíveis de influenciar o sentido da solução do litígio, ou seja, na expressão do Ac. de 09.12.2010 deste Supremo Tribunal (Proc. 838/06.5TTMTS.P1.S1), que invadam o domínio de uma questão de direito essencial.”


Argumentação esta que foi vertida em sumário, com o seguinte teor:


“Só acontecimentos ou factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, sendo, embora, de equiparar aos factos os conceitos (jurídicos) geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, verificado que esteja um requisito: não integrar o conceito o próprio objeto do processo ou, mais rigorosa e latamente, não constituir a sua verificação, sentido, conteúdo ou limites objeto de disputa das partes.”


Revertendo ao caso concreto, vemos que a presente ação tem como objeto uma deliberação da assembleia de condóminos relativa à fração da A., na qual lhe foi concedido o prazo de 60 dias para a remoção de uma estrutura em vidro instalada na varanda, com fundamento em que esta prejudica a linha arquitetónica do edifício.


O entendimento da A. sobre a aludida estrutura de vidro é o oposto da deliberação, pretendendo a A., através desta ação, que seja anulada tal deliberação.


Assim, no caso em apreço, a questão de facto corresponde ao apuramento das características da estrutura instalada na fração da A. e a questão de direito reconduz-se a saber se essa estrutura prejudica a linha arquitetónica do edifício, o que implica apreciar se a situação de vida descrita na decisão de facto é subsumível à previsão do referido artigo 1422.º, n.º 1, alínea a) do Código Civil.


Deste modo, não cabe no âmbito da fundamentação de facto a afirmação ou rejeição do prejuízo para a linha arquitetónica do edifício, pois essa apreciação pertence à fundamentação de direito da sentença, a que acresce a circunstância desse ser o objeto da presente ação, não podendo na fundamentação de facto conter-se a decisão da causa.


Não deve, pois, ser integrada no facto 5. a expressão alusiva ao prejuízo para a linha arquitetónica do edifício.


Em conclusão, mantém-se a redação do facto 5..


4.2. Facto D)


O Tribunal a quo julgou não provado sob D) que “O réu Condomínio apenas considerou que as duas situações de incumprimento existentes que necessitaram de ser corrigidas respeitavam à fração B e à fração I.”


A A. dissente desta decisão, advogando que deve o facto evidenciado ser alterado, passando a constar que “Não obstante existirem diversas situações de incumprimento, o réu Condomínio apenas considerou que as duas situações de incumprimento existentes que necessitaram de ser corrigidas respeitavam à fração B e à fração I.”


Sustenta, então, a A. que ocorre contradição entre o facto D) e os factos 13. e 15..


Ora, lidos estes factos conjugadamente com o teor da convocatória para a Assembleia de 16.06.2023 (facto provado 11.) conclui-se que havia outros incumprimentos em discussão, a saber, “c) Toldos retrácteis; d) Treliças no gradeamento varandas” (ponto 1. da ordem de trabalhos), assim como questões ao nível da “uniformização: a) Da cor floreiras situadas nas varandas; b) Das proteções de acrílico/ vidro à altura do gradeamento das varandas e em pérgulas” (ponto 6. da ordem de trabalhos).


Contudo, em virtude de vários condóminos terem saído no decurso da Assembleia, os trabalhos foram interrompidos, quando eram 21h10, tendo sido debatidos apenas os incumprimentos indicados nas alíneas a) e b) do ponto 1. da ordem de trabalhos, ou seja, os relativos às frações I e B (facto provado 16.).


Aliás, o Tribunal a quo sublinhou, com respeito ao depoimento da testemunha CC, que “de forma bastante espontânea e, por esse motivo, credível, este condómino também mencionou que a Assembleia terá terminado por volta das 21h00 (em conformidade com o que está declarado em ata) uma vez que o Sr. RR levantou vários problemas relativamente à sua cortina de vidro (mais de três horas) – por esse motivo apenas se logrou apreciar as primeiras duas questões da ordem de trabalhos. Assim, constata-se que as outras irregularidades suscitadas na ordem de trabalhos apenas não foram apreciadas atendendo ao adiantar da hora (uma vez que a discussão do primeiro ponto da ordem de trabalhos ocorreu por período superior a três horas).”


Não pode, consequentemente, afirmar-se que só foram objeto de sanção os incumprimentos das frações I e B, uma vez que os demais alegados incumprimentos ainda não foram apreciados em Assembleia.


Em conclusão, deve permanecer inalterado o facto não provado sob D).


C) Fundamentação de direito


1. No caso em apreço peticiona a A. a anulação da deliberação da Assembleia de condóminos do dia 16.06.2023, na qual foi concedido à A. o prazo de 60 dias para remover os painéis de vidro que se mostram colocados na sua varanda.


Assentou esta deliberação na circunstância de se ter entendido que os painéis de vidro prejudicam o arranjo estético do edifício e de não se ter logrado obter uma maioria de 2/3 que aprovasse esta alteração.


O R. Condomínio deduziu reconvenção, pedindo a condenação da A. a remover os painéis de vidros instalados e a pagar-lhe uma sanção pecuniária compulsória de € 50,00 por cada dia em que assim não faça.


O Tribunal julgou a ação improcedente e procedente a reconvenção, exceto quanto ao pedido de condenação da A. no pagamento de sanção pecuniária compulsória.


No recurso a A. pugna pela revogação da sentença, com a procedência da ação e a improcedência da reconvenção.


O R. Condomínio requereu a ampliação do objeto do recurso, peticionando a condenação da A. no pagamento da sanção pecuniária compulsória.


2. Da anulação da deliberação


2.1. Nos termos do artigo 1433.º, n.º 1 do Código Civil, as deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado.


No caso em apreço, o R. Condomínio invoca, em suporte da deliberação em causa, o disposto nos artigos 1425.º, n.º 1 e 1422.º, n.º 2, alínea a) do Código Civil, e no artigo 7.º do Regulamento do Condomínio.


Dispõe-se nos primeiros normativos indicados que “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio”, e que “É especialmente vedado aos condóminos: (…) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício”, respetivamente.


Por sua vez, no indicado preceito do Regulamento estabelece-se que “2 – Os condóminos estão expressamente proibidos de: a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício. (…) j) Acrescentar qualquer tipo de estrutura exterior que altere o aspeto exterior do edifício, nomeadamente transformar os terraços em marquises (…)”.


2.2. Inovações


As regras que regulam a propriedade horizontal estabelecem a harmonização entre o direito de propriedade privada sobre a fração e o direito de propriedade que incide sobre as áreas comuns e que pertence em conjunto a todos os condóminos (artigo 1420.º, n.º 1 do Código Civil).


Assim, apesar do direito de propriedade ser, por princípio, pleno (artigo 1305.º do Código Civil), os condóminos estão sujeitos às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis, bem como a outras que se justificam em face das particularidades da propriedade horizontal, com o desiderato de “conciliar os interesses dos proprietários das diversas unidades autónomas” (artigo 1422.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil; Ana Taveira da Fonseca, Comentário ao Código Civil: direito das coisas, coord. de Henrique Sousa Antunes, Coimbra, 2021, p. 452).


Relativamente às inovações, sublinha-se que o seu conceito não consta da lei, devendo entender-se que se definem, essencialmente, por oposição às obras de conservação, ainda que a linha delimitadora não seja, por vezes, fácil de traçar (Rui Pinto Duarte, Curso de Direitos Reais, 4ª ed., Lisboa, 2020, p. 170; Ana Taveira da Fonseca, ob. cit., p. 464).


As inovações de que se cura aqui são apenas aquelas que incidem sobre as partes comuns (Rui Pinto Duarte, ob. cit., p. 176; Ana Taveira da Fonseca, ob. cit., p. 463; ambos perfilhando a orientação de Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. III, 2ª ed., Coimbra, 1987, pp. 433-434; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.11.2022 (Jorge Arcanjo), Processo n.º 9/17.5T8VRM.G1.S1, in http://www.dgsi.pt/).


A imposição de uma maioria qualificada para aprovação das sobreditas inovações radica na necessidade de “encontrar um ponto de equilíbrio entre o princípio da prevalência da maioria e o da proteção dos interesses dos minoritários”, atendendo a que “as inovações podem ter impactos funcionais, estéticos e económicos significativos e não consensuais” (Rui Pinto Duarte, ob. cit., pp. 170-171).


Com efeito, podem tais inovações traduzir modificações na forma ou substância das partes comuns, bem como na sua afetação ou destino, como assinalam Pires de Lima e Antunes Varela (ob. cit., p. 434).


2.3. Obras que prejudicam / modificam a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício


No que respeita às obras que prejudicam a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício, há quem entenda que estas respeitam apenas às frações autónomas (Ana Taveira da Fonseca, ob. cit., p. 452), e há quem sustente, diversamente, que também aqui estão abrangidas as obras realizadas nas partes comuns (Rui Pinto Duarte, ob. cit., p. 176).


Por outro lado, não se diz na lei a que se reconduzem a linha arquitetónica e o arranjo estético do edifício.


Segundo Pires de Lima e Antunes Varela (ob. cit., p. 425), as obras aludidas na citada alínea a) do n.º 2 do artigo 1422.º do Código Civil são as “visíveis do exterior (porta ou portas de acesso, janelas, persianas, varandas, etc.). Um condómino, por exemplo, não pode vedar a sua varanda, transformando-a num compartimento fechado, ou substituir as janelas por outras que não se harmonizem com as demais fracções.” (em sentido contrário, defendendo que a proteção da linha arquitetónica pode prolongar-se para o interior do edifício, ainda que “em termos muito limitados”, v. Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2ª ed., reimp., Coimbra, 2004, p. 126).


Por sua vez, Sandra Passinhas (ob. cit., p. 123) aponta a unicidade do conceito composto pela linha arquitetónica e o arranjo estético do edifício, o qual define assim: “A linha arquitectónica é um bem comum a todos os condóminos, cuja diminuição pode alterar o valor comercial do edifício e, em consequência, o valor da fração autónoma. Resulta do conjunto do traçado e dos elementos ornamentais que constituem as notas uniformes e dominantes do edifício e que imprimem às várias partes do edifício no seu conjunto, do ponto de vista estético, uma determinada fisionomia unitária e harmónica, do ponto de vista arquitectónico mais ou menos valiosa e mais ou menos aprazível”.


Nas palavras do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.06.2004 (Afonso de Melo) (Processo n.º 04A2054, in http://www.dgsi.pt/), “A modificação que produz desarmonia no conjunto do edifício constitui uma alteração das suas características e da sua estética.”


Não obstante, Abílio Neto (Manual da Propriedade Horizontal, 3ª ed., Lisboa, 2006, p. 183) separa as duas figuras, entendendo que no caso da linha arquitetónica há uma alteração física ou volumétrica do edifício, enquanto no segundo caso a alteração é tão somente estética.


Tem vindo também a afirmar-se que não altera o juízo de ilegalidade das obras o facto destas serem licenciadas (Ana Taveira da Fonseca, ibidem), sublinhando-se que foi decidido, no Acórdão do Tribunal Central Administrativo de 03.12.2021 (Antero Pires Salvador) (Processo n.º 00440/14.8BEVIS, in http://www.dgsi.pt/) que “Estando em causa a linha arquitectónica ou arranjo exterior do prédio - n.º3 do art.º 1422.º e n.º 1 do art.º 1425.º, ambos do Código Civil - mostra-se necessária a autorização maioritária da Assembleia de Condóminos para a legalização da obra pela câmara municipal.”


Destas obras que prejudicam a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício se distinguem aquelas que, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo 1422.º do Código Civil, modificam a linha arquitetónica ou o arranjo estético do edifício, pois estas, ao contrário das primeiras, podem ser autorizadas por deliberação dos condóminos aprovada por maioria qualificada de 2/3 do valor total do prédio.


Para Abílio Neto (ibidem) o prejuízo reside nas consequências negativas da obra: “adulterar ou destruir a harmonia que caracterizava aquela [linha arquitetónica] ou este [arranjo estético], nomeadamente porque introduziu elementos construtivos novos (aumento de volumetria), ou dissonantes (alteração física), ou porque destruiu alguns dos existentes”.


Diversamente, as obras modificativas serão “todas as que tenham impacto na linha arquitectónica ou no arranjo estético do edifício, tanto de forma negativa como positiva, ou seja, ainda que delas resulte, objectivamente, uma beneficiação.” (ibidem) (no mesmo sentido, Sandra Passinhas, ob. cit., p. 124).


Sendo reiteradamente apreciados na jurisprudência casos relacionados com varandas, enunciamos brevemente alguns arestos mais recentes a este propósito (todos in http://www.dgsi.pt/):


- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20.06.2017 (Luís Espírito Santo) (Processo n.º 1986/08.2TVLSB.L1-7):


“II - As obras levadas a cabo pelo condómino Réu que abrangeram, para além do interior da sua fracção autónoma, três das fachadas do prédio, bem como a sua cobertura, onde o réu mandou retirar e substituir as placas de mármore que constituíam o pavimento da cobertura; mandou construir uma parede isolada em alvenaria no terraço; fechou uma segunda varanda existente na fachada virada para a Rua Embaixador Teixeira de Sampaio, bem como as varandas das fachadas viradas para o Palácio das Necessidades e para o rio Tejo, afectam as partes comuns (vide artigo 1421º, nº 1, alínea b), do Código Civil) do edifício constituído em propriedade horizontal e devem ser qualificadas como inovações.


III - Não tendo sido tais obras submetidas ao veredicto da Assembleia de Condóminos, é evidente que as edificações, modificando a linha arquitectónica e o arranjo estético do edifício, terão que ser consideradas ilícitas, legitimando qualquer outro condómino a pedir a respectiva eliminação.”


Ficou provado nos autos que as varandas foram fechadas “U) (…) umas com vidro e alumínio, outras com parede de alvenaria.”


- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07.06.2021 (Manuel Domingos Fernandes) (Processo n.º 3106/20.6T8PRT.P1):


“II - A marquise construída pela ré no terraço de cobertura do prédio configura uma alteração na substância e na forma de uma parte comum do edifício e, por isso, só mediante aprovação da maioria dos condóminos (2/3 do valor total do prédio) poderia ser erigida (cfr. artigo 1425.º, nº 1 do CCivil). (…)


IV - A construção duma marquise constitui sempre uma modificação da linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, pelo que a sua realização depende da autorização prevista no art.º 1422 n.º 3 do CCivil, tomada em assembleia de condóminos.”


Está em causa neste aresto uma estrutura com as seguintes características, conforme resulta da matéria de facto aí provada:


“6) (…) a ré realizou obras no terraço que consistiram na construção de uma estrutura, vulgarmente designada de marquise, com pelo menos 12,45m2, e que consistiu na colocação de caixilharias envidraçadas na fachada frontal do prédio que suportam um telhado próprio.


7) Trata-se de uma construção visível da rua.”


- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21.10.2024 (Mendes Coelho) (Processo n.º 742/23.2T8PRT.P1):


“II – A colocação de rede numa varanda e janelas da fração integra uma obra levada a cabo pelo condómino na sua própria fração, sendo-lhe aplicável o regime previsto nos nºs 2 e 3 do art. 1422º do C. Civil.


III – Prejudicando aquela obra o arranjo estético do edifício, a mesma está vedada ao condómino [art. 1422º nº2 a) do C. Civil]; por outro lado, só podendo o condómino realizar obras que modificam o arranjo estético do edifício com prévia autorização da assembleia de condóminos aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio (nº3 do art. 1422º), a deliberação da assembleia de condóminos que, por maioria, ordenou a retirada da rede, está em consonância com a lei, não havendo fundamento para a sua anulação.”


- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09.01.2025 (Paulo Duarte Teixeira) (Processo n.º 175/23.3T8VNG.P1):


“III - A construção de uma marquise ou parede de vidro numa varanda, no caso concreto, afecta a linha arquitectónica do imóvel e a harmonia estética da fachada.”


Está em causa neste aresto uma estrutura com as seguintes características, conforme resulta da matéria de facto aí provada:


“2) Na referida fracção autónoma existe uma varanda, de uso exclusivo da fracção autónoma titulada pelo réu;


3) O réu procedeu à construção e colocação de painéis de vidro, permitindo o fecho e cobertura da varanda, varanda afecta à respectiva fracção autónoma, em data não concretamente apurada, mas que terá ocorrido no decurso do mês de Março de 2021;(…)


5) Foram realizados pontos para fixação à fachada e pavimento da varanda dos painéis implantados pelo réu;


6) Os vidros são do tecto ao chão da varanda pelo lado de dentro do parapeito de segurança que existe, não existe nenhum caixilho e o vidro é 100% transparente;


7) Construção e colocação o que o autor designa como marquise e que réu designa como cortinas de vidro”.


2.4. Revertendo ao caso em apreço, está provado que a instalação de que se cura foi feita no interior da varanda da fração da A..


Ora, a varanda integra a propriedade privada do condómino, por estar afeta ao seu uso exclusivo, isto é, “as varandas são projecções acessórias da fracção autónoma” (Sandra Passinhas, ob. cit., p. 33).


No entanto, os painéis de vidro instalados na varanda repercutem-se na fachada do edifício, sendo discutido se as fachadas dos edifícios constituem partes comuns (Ana Taveira da Fonseca, ob. cit., p. 448).


Com efeito, o artigo 1421.º, n.º 1, alínea a) do Código Civil só qualifica expressamente como partes comuns as paredes mestras, no entanto, há quem entenda que as paredes e revestimentos exteriores do edifício, ainda que não constituam paredes mestras, são partes imperativamente comuns, pois “delimitam a superfície coberta, determinando a consistência volumétrica do edifício e delineando o seu perfil arquitectónico” (Sandra Passinhas, ob. cit., p. 33), ou seja, “constituem um elemento estrutural deste” (Ana Taveira da Fonseca, ob. cit., p. 448).


Tendo presente tudo o que ficou acima exposto, verifica-se que a orientação geral da jurisprudência vai no sentido de considerar que qualquer alteração com impacto na linha arquitetónica ou no arranjo estético do edifício deve ser sujeita a autorização da assembleia de condóminos, não se exigindo, para esse efeito, que a repercussão seja forte, isto é, que produza uma grande desarmonia no conjunto.


A este propósito escreveu-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.12.2006 (Urbano Dias) (Processo n.º 06A4300, in http://www.dgsi.pt/) que “A concretização de qualquer obra que afecte a linha arquitectónica ou o arranjo estético do prédio em propriedade horizontal, por mínima que pareça, terá também de ser aprovada pela assembleia de condóminos através de uma maioria representativa de dois terços do valor total do prédio; se concretizada, a mesma terá também de ser destruída, caso aquela maioria qualificada não dê o seu agrement: a não ser assim, o prédio pode, de "obra pequena" em "pequena obra", vir a assumir uma configuração totalmente diferente da originária e contra aquela maioria qualificada que a lei exige para a alteração do prédio.”


O caso emblemático desta orientação é o relatado no citado aresto do Tribunal da Relação do Porto de 09.01.2025, onde está em causa uma instalação que se diferencia das abordadas nos demais casos, revestindo-se de semelhança, aliás, com o nosso caso, pois também ali se trata de uma cortina de vidro, isto é, de uma instalação sem estrutura metálica de encaixe dos vidros, que é aquilo que caracteriza uma marquise.


Não estamos, pois, em presença de uma marquise, admitindo-se ainda que o impacto visual e estético da cortina de vidro é inferior ao de uma marquise.


Não obstante, como se acabou de dizer, qualquer alteração na linha arquitetónica ou no arranjo estético do edifício, por menor que seja, deve ser sujeita à autorização da assembleia de condóminos, e, se não se lograr obter autorização para a mesma, deve tal alteração ser considerada ilegal.


Sustenta ainda a A. que os painéis de vidro não estão abrangidos pelo Regulamento do Condomínio, onde apenas se proíbe a colocação de marquises.


Todavia, a referência às marquises que consta do Regulamento é exemplificativa e não taxativa, quer dizer, não se diz no Regulamento que só a construção de marquises está vedada, antes se reproduz, no citado artigo 7.º, n.º 2, o teor do artigo 1422.º, n.º 2, alínea a) do Código Civil, e depois alude-se, na respetiva alínea j), “a qualquer estrutura exterior que altere o aspeto exterior do edifício, nomeadamente transformar os terraços em marquises”.


Acresce que o Regulamento não pode afastar o que decorre de lei imperativa (neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., p. 425).


2.5. Abuso de direito


2.5.1. Invoca, por último, a A. o abuso de direito, aduzindo o seguinte:


“Considera a Recorrente que existe uma dualidade de critérios no tratamento da situação existente.


Se, por um lado, a Recorrente tem sido perseguida para regularizar a situação existente, os outros condóminos continuam impunes.”


Em abono da sua pretensão, aponta o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 18.09.2008 (Pires Robalo) (Processo n.º 895/08-2, in http://www.dgsi.pt/) - o qual, aliás, foi citado na sentença recorrida -, cujo sumário reza assim:


“I - As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tanto se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.


II – A construção duma marquise constitui sempre uma modificação da linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, pelo que a sua realização depende da autorização prevista no art.º 1422 n.º 3 do CC, tomada em assembleia de condóminos.


III – O condómino que exige, apenas dos RR., e não aos demais condóminos que possuem no imóvel construções idênticas à sua e realizadas também sem qualquer autorização da assembleia de condóminos, está a agir em abuso de direito, ou seja, excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, na modalidade de “venire contra factum proprium”, o que obstaculiza o exercício do seu direito.”


2.5.2. Ora, diz-se no artigo 334.º do Código Civil que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito.


Antunes Varela (in RLJ, 128, 241) refere, a este propósito, que o abuso de direito “aponta de modo inequívoco para as situações concretas em que é clamorosa, sensível, evidente, a divergência entre o resultado da aplicação do direito subjectivo, de carga essencialmente formal, e alguns valores impostos pela ordem jurídica para a generalidade dos direitos ou, pelo menos, de direitos de certo tipo”.


Por outro lado, como explica Menezes Cordeiro (Tratado de Direito Civil Português, I, tomo IV, Coimbra, 2007, pp. 239-241), procedendo à exegese do normativo em causa, a referência legal à ilegitimidade do exercício do direito aponta para a ilicitude da atuação do sujeito; e quanto aos critérios aferidores dessa ilicitude somos remetidos, sucessivamente, para a boa fé, entendida em sentido objetivo, e por isso concretizada através dos princípios fundamentais da tutela da confiança e da primazia da materialidade subjacente, para as regras da moral social, e para o fim social ou económico do direito.


A primazia da materialidade subjacente implica a ponderação das consequências práticas da aplicação das normas, em termos que permitam averiguar se está a ser alcançada a tutela visada com as mesmas, ou se, pelo contrário, os resultados produzidos no caso concreto não correspondem aos fins de proteção ou regulação intencionados (Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 2ª ed., Coimbra, 2002, pp. 54-55).


Sem prejuízo da unidade e coerência interna da figura do abuso de direito, a sua construção tem vindo a ser efetuada através da identificação de concretas e específicas situações em que se manifesta este exercício disfuncional das posições jurídico-subjetivas, a saber: exceptio doli; venire contra factum proprium; inalegabilidades formais; suppressio e surrectio; tu quoque; desequilíbrio no exercício (Menezes Cordeiro, ob. cit., pp. 265-349).


2.5.3. No caso em apreço a A. não reconduz o abuso de direito que invoca a qualquer figura específica, mas ponderando a jurisprudência que cita nas suas alegações, ter-se-á presente a figura do venire contra factum proprium, que se traduz no exercício de uma posição jurídica em contradição direta com uma conduta antes assumida ou proclamada pelo agente, pelo que a trave mestra é aqui a tutela da confiança (Menezes Cordeiro, ob. cit., p. 280).


Ora, antes de mais, esta pretensão da A. assenta na requerida alteração do facto não provado sob D), a qual não mereceu acolhimento.


Assim, não se encontra provado que:


“D) O réu Condomínio apenas considerou que as duas situações de incumprimento existentes que necessitaram de ser corrigidas respeitavam à fração B e à fração I.”


Por outro lado, não foi apenas o caso da A. que foi merecedor de censura pela assembleia de condóminos, pois tal também sucedeu com o caso da fração B, relativamente ao qual foi deliberado avançar com uma ação civil contra os respetivos proprietários (facto provado sob 15.).


Acresce que constavam da ordem de trabalhos outros casos de irregularidades, como se extrai dos respetivos pontos 1., alíneas c) e d), e 6. (facto provado sob 11.), os quais não foram apreciados tão somente por falta de quórum deliberativo, atento o prolongamento da assembleia até às 21h10, tendo a discussão do caso da A. demorado por volta de três horas (factos provado sob 16. e 17.).


Refira-se ainda que, como também sublinhado pelo Tribunal a quo, “não obstante referir que existem outras 16 frações que não mantêm a fachada original, a autora não elenca essas irregularidades na sua petição inicial. Verifica-se que foi a autora, através do seu legal representante em Assembleia, que chamou a atenção da Administração do Condomínio para essas irregularidades, sendo que, neste momento se desconhece os atos que estão a ser praticados pela Administração do Condomínio para regularizar estas indicadas, mas não demonstradas irregularidades.”


Comparando, deste modo, o caso dos autos com aquele versado no aresto citado nas alegações, constatamos que existe uma diferença muito relevante, a saber, no caso do aresto ficou provado que “No mesmo prédio existem outras marquises, noutros apartamentos.”


Foi esta específica factualidade que conduziu o julgador naquele aresto a concluir que o mesmo “incutiu nos RR. a confiança legítima de que se eregessem na sua fracção, como fizeram, uma marquise idêntica às pré-existentes no imóvel, mesmo sem solicitar, para o efeito, prévia autorização à assembleia de condóminos, o condomínio não iria exercer, contra si, os direitos de acção”.


O caso dos autos não é, pois, semelhante ao versado naquele aresto.


Ou seja, nada se retira da matéria de facto provada que indicie um tratamento desigual da A. relativamente aos demais condóminos, o mesmo é dizer, não se vislumbram factos que permitam afirmar a atuação em abuso de direito por parte do R. Condomínio.


2.6. Tudo visto, conclui-se que apesar dos painéis de vidro instalados na varanda da fração da A. possuírem um impacto visual e estético menor, quando comparados com outras estruturas, maxime marquises, não deixam de envolver uma alteração à linha arquitetónica e arranjo estético do edifício, pelo que não tendo sido autorizada a sua permanência na assembleia de condóminos, devem ser retirados, como decidiu o Tribunal a quo.


Ou seja, a deliberação de 16.06.2023 não contraria a lei, pelo que se impõe julgar improcedente a ação, confirmando-se a sentença recorrida.


3. Custas


As custas do recurso são da responsabilidade da A., em virtude da improcedência do recurso (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).


IV – Dispositivo


Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Cível deste Tribunal da Relação em:


1. Julgar inadmissível a ampliação do objeto do recurso;


2. Julgar improcedente a apelação, mantendo a decisão recorrida.


Custas pela A..


Notifique e registe.


Sónia Moura (Relatora)


Ana Pessoa (1ª Adjunta)


Maria João Sousa e Faro (2ª Adjunta)