I – A natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto, decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas. É um caso de extinção do recurso por inexistência de objeto. A única exceção são as questões de conhecimento oficioso.
II – A descaracterização do acidente exige a verificação de dois requisitos: que o acidente provenha de comportamento indesculpável, temerário em alto e relevante grau do sinistrado, e que esta sua conduta seja a causa exclusiva do mesmo.
III – Em matéria de acidentes de trabalho, o artigo 135º do Código de Processo do Trabalho contém um regime especial quanto a juros de mora, de acordo com o qual estes são devidos desde o vencimento da obrigação, sendo uma norma imperativa.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra
AA intentou a presente ação declarativa emergente de acidente de trabalho contra:
- Companhia de Seguros A..., S.A., (atualmente B..., S.A)
-C..., Lda., relativamente à qual suscitou incidente de intervenção principal provocada; pedindo que a presente ação seja julgada procedente por provada e em consequência seja a ré seguradora condenada:
a) a pagar ao autor a pensão anual e vitalícia que lhe vier a ser fixada (ou o respetivo capital de remição, caso este seja obrigatoriamente remível), com inicio na data que lhe for fixada; e
b) pagar ao autor a quantia de €1.282,37, em despesas obrigatórias feitas em deslocações ao Tribunal e ao GML;
Todas estas quantias deverão ser acrescidas de juros à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Para tanto, alegou em síntese que no dia 16/08/2021, cerca das 10h15m em ..., quando trabalhava para a firma C..., Lda., operando uma máquina ao serviço desta, foi o trabalhador vitima de um acidente de trabalho, em virtude de ter sofrido uma queda. Em consequência o autor sofreu um traumatismo do membro inferior direito, bem como da coluna lombar. Na altura, foi diagnosticado com fratura do calcâneo direito e fratura compressiva de L1, tendo sido submetido a tratamento cirúrgico da fratura do calcâneo (a 23 de agosto de 2021), com redução aberta e osteossíntese com placa e parafusos, fazendo tratamento conservador da fratura de L1. O autor exercia a sua atividade mediante o pagamento das remunerações descritas no processo estando a responsabilidade transferida para a ré seguradora através da apólice n º ...05, tendo participado o sinistro.
A ré seguradora, apresentou contestação, pugnando pela improcedência da ação, porquanto, na altura do sinistro o autor estava a trabalhar por conta e no cumprimento e instruções da interveniente, não estando, por isso, a exercer funções como trabalhador individual, pelo que, o sinistro em causa está excluído da apólice em causa. Acrescentou que, caso assim não se entenda, o sinistrado violou regras de segurança estando assim descaracterizado o acidente como acidente de trabalho.
Na sequência de despacho convite veio o autor requerer a intervenção principal provocada da sociedade C..., Lda., tendo o mesmo sido admitido por despacho de 19-04-2024.
A interveniente respondeu, dizendo que o autor na data do acidente prestava serviço como manobrador de máquinas na obra, no Prédio sito na Rua ..., em ... pelo que nada tem a ver com este processo, nem com o acidente que aconteceu.
Realizou-se audiência de julgamento.
Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Por tudo o exposto, julga-se a presente ação, improcedente por não provada e, em consequência absolve-se a ré e a interveniente dos pedidos formulados.
Atribuo aos presentes autos o valor indicado na petição inicial.
Custas, da presente ação a cargo do autor.
Notifique e registe. “
Inconformado com a decisão, o autor intentou o presente recurso, terminando as alegações com as seguintes conclusões:
(…).
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto junto deste Tribunal de recurso emitiu o parecer a que alude o artigo 87º, nº 3, do CPT no sentido de que que que a apelação deve(rá) ser julgada improcedente.
Não houve resposta a este parecer.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*** OBJETO DO RECURSO
Como é sabido, o objeto do recurso é delimitado nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art.º 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.
As questões suscitadas que importa decidir são as seguintes:
1. Alteração da decisão de facto.
2. Se existia um contrato de trabalho entre o sinistrado e a interveniente.
3. Descaraterização do sinistro como acidente de trabalho.
4. Atribuição de pensão pela IPP fixada.
5. Reembolso de despesas com deslocações obrigatórias.
6. Reembolso de despesas com as sessões de fisioterapia, consultas e exames médicos.
7. Juros de mora.
8. Valor da causa.
***
FUNDAMENTOS DE FACTO
A 1ª instância fixou a matéria de facto da seguinte forma:
“A- Factos Provados:
Perante o que resulta da instrução e discussão da causa, a matéria de facto processualmente adquirida, como provada é a seguinte:
1- O autor pelas 10h15m do dia 16 de agosto de 2021, numa obra num prédio sito na Rua ..., em ..., foi vitima de um acidente, quando procedia à remoção do soalho do primeiro andar, que consistiu em queda (parte do artigo 1º da petição inicial e artigo 9º da contestação).
2- Nas circunstâncias aludidas em 1) o autor encontrava-se no primeiro andar do prédio que se encontrava em demolição, acompanhado de um trabalhador da interveniente, removendo as tábuas do soalho, para posteriormente retirar a restante estrutura do pavimento do primeiro andar (parte dos artigos 10º e 21º ambos da contestação).
3- No soalho aludido em 2) existiam aberturas e mesmo locais onde não existia soalho, com risco de queda em altura, altura essa que era de cerca de 3 metros (restante parte do artigo 21º da contestação).
4- A certa altura, quando levantava um caibro, o autor desequilibrou-se e caiu por buraco no soalho do primeiro andar, numa altura de 3 metros (artigo 11º e parte do artigo 12º ambos da contestação).
5- No local aludido em 1) onde o autor veio a cair, não estavam colocados guarda corpos, guarda cabeças, nem traves fixadas sobre o soalho e por cima das aberturas, com vista a evitar o acesso às mesmas (parte do artigo 22º da contestação).
6- No piso inferior ao piso de onde o autor veio a cair não estava munido com uma rede de segurança que amparasse a queda, o que era possível ter sido colocado e seria idóneo a evitar as lesões sofridas pelo autor (artigo 23º da contestação).
7- Nas circunstâncias aludidas em 1) também não estavam montados ou instalados arnês de segurança e chicote para o arnês, que permitia a amarração do mesmo a um qualquer ponto fixo do local, o que era possível e teria evitado as lesões (artigo 24º da contestação) (alterado por este Tribunal para: Nas circunstâncias aludidas em 1) não estavam montados ou instalados arnês de segurança e chicote para o arnês, com o esclarecimento de que não existia no local ponto fixo para a sua amarração (sublinhado nosso).
8- A interveniente deixou em obra os equipamentos aludidos em 7), que poderiam ter sido utilizados pelo autor (alterado por este Tribunal para: A interveniente deixou em obra os equipamentos aludidos em 7 (sublinhado nosso).
9- Nas circunstâncias aludidas em 1) autor encontrava-se a exercer a atividade na obra adjudicada à firma C..., Lda., mediante o pagamento das quantias de €275 + €3.538 + €2.090, até à data do acidente (parte dos artigos 1º e 9º ambos da petição inicial e parte do artigo 1º da contestação).
10- Em consequência do acidente aludido em 1), o autor sofreu traumatismo do membro inferior direito, bem como da coluna lombar (artigo 2º da petição inicial e parte do artigo 1º da contestação).
11- Foi diagnosticado com fratura do calcâneo direito e fratura compressiva de L1, tendo sido submetido a tratamento cirúrgico da fratura do calcâneo, a 23 de agosto de 2021, com redução aberta e osteossíntese com placa e parafusos, fazendo tratamento conservador da fratura de L1 (artigo 3º da petição inicial e parte do artigo 1º da contestação).
12- Tendo posteriormente realizado cerca de 55 (cinquenta e cinco) sessões de reabilitação com fisioterapia ao pé/tornozelo direito, bem como à coluna lombar de 12/10/2021 a 21/01/2022 e ainda mais 13 sessões a partir de 16/03/2022, bem como consultas e exames médicos, no montante de cerca de € 1.114,13 (artigo 4º e 25º ambos da petição inicial e parte do artigo 1º da contestação).
13- O autor participou à ré o sinistro (parte do artigo 11º da petição inicial e parte do artigo 1º da contestação).
14- No dia 27 de setembro de 2023 realizou-se a tentativa de conciliação neste Tribunal, nos termos constantes de fls. 220/221 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (artigos 11º, 12º e 13º todos da petição inicial e parte do artigo 1º da contestação).
15- No apenso para a fixação de incapacidade foi decidido que o autor em consequência do acidente dos autos se encontra afetado com uma IPP de 12,64%, sendo 04/07/2022 a data da consolidação médico legal das lesões (fls. 37 do apenso A).
16- O relatório do GML de fls. 192 a 194 considerou que o autor esteve em situação de ITA 322 dias de 17/08/2021 a 04/07/2022.
17- O autor deslocou-se duas vezes ao GML para realização do exame médico (03/06/2022 e 23/11/2022) e duas vezes a Tribunal para comparência na tentativa de conciliação e exame médico em Junta médica (27/09/2023 e 01/10/2024).
18- A responsabilidade infortunistica do autor, como trabalhador independente, encontrava-se transferida para a ré através da apólice ...05 (parte do artigo 10º da petição inicial e parte do artigo 3º da contestação), sendo o capital seguro de €8.890,00 (aditado por este Tribunal com base no contrato de seguro).
19- O autor nasceu em ../../1975.
20- A responsabilidade infortunística encontrava-se transferida para a seguradora pela retribuição de €665,00 x 12 (aditado por este Tribunal com base no auto de tentativa de conciliação de 27-09-2023).
***
B) Factos não provados:
Não resultaram provados os demais factos constantes dos respetivos articulados, designadamente, os dos artigos 1º (restante matéria que não foi dada como provada), 28º, 29º, 30º, todos da petição inicial, e os artigos 3º (restante matéria que não foi dada como provada) e 10º (restante matéria que não foi dada como provada), ambos da contestação.
***
(…).
“C - Motivação:
(…)”.
***
FUNDAMENTOS DE DIREITO
1. Alteração da decisão de facto.
(…).
Em face destes depoimentos, julga-se parcialmente procedente a impugnação quanto à decisão de facto, e, em consequência, altera-se a redação dos pontos 7 e 8 dos factos provados:
7- Nas circunstâncias aludidas em 1) não estavam montados ou instalados arnês de segurança e chicote para o arnês, com o esclarecimento de que não existia no local ponto fixo para a sua amarração.
8- A interveniente deixou em obra os equipamentos aludidos em 7.
Aditam-se ainda os seguintes factos:
18- A responsabilidade infortunistica do autor, como trabalhador independente, encontrava-se transferida para a ré através da apólice ...05, sendo o capital seguro de €8.890,00 (sublinhado nosso- aditado com base no contrato de seguro).
20- A responsabilidade infortunística encontrava-se transferida para a seguradora pela retribuição de €665,00 x 14 (com base no auto de tentativa de conciliação de 27-09-2023, tendo em conta o artigo 9º, nº 1 do DL n.º 159/99, de 11/05: “A remuneração anual a considerar, para efeito do cálculo dos prémios e das prestações em dinheiro, corresponderá, no mínimo, a 14 vezes a remuneração mínima mensal mais elevada, ou a qualquer outro valor, à escolha do trabalhador”).
**
2. Se existia um contrato de trabalho entre o sinistrado e a interveniente.
Alega o recorrente que deve considerar-se a existência um vínculo laboral entre o sinistrado e a interveniente responsável, porque se verificam as características elencadas no art.º 12º do Código do Trabalho.
Vejamos.
Conforme refere o Ac. do TRE, de 24-10-2019[1] :
“1. A natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objeto, decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas. É um caso de extinção do recurso por inexistência de objeto.
2.A única exceção a esta regra são as questões de conhecimento oficioso”.
Ora no caso em apreço, não foi suscitado na fase dos articulados a existência do aludido contrato de trabalho, não tendo a sentença recorrida se pronunciado sobre esta questão.
Aliás, na petição inicial foi alegado:
9º.- Como referido e consta dos autos, à data do sinistro o A. trabalhador exercia a sua actividade mediante o pagamento das remunerações descritas no processo e que se dão igualmente por reproduzidas.
12º.- Em sede de tentativa de conciliação (e como consta expressamente dos autos), pela R. companhia de seguros foi dito que aceita e reconhece a existência de um contrato de seguro como trabalhador independente, pela retribuição de €665,00 x 12, bem como a existência e qualificação do acidente como de trabalho.
Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos:
9- Nas circunstâncias aludidas em 1) autor encontrava-se a exercer a atividade na obra adjudicada à firma C..., Lda., mediante o pagamento das quantias de €275 + €3.538 + €2.090, até à data do acidente.
18- A responsabilidade infortunistica do autor, como trabalhador independente, encontrava-se transferida para a ré através da apólice ...05.
Em conclusão: tratando-se de uma questão, não pode ser objeto de conhecimento por parte deste Tribunal, sendo certo que não estamos perante uma questão de conhecimento oficioso.
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3. Descaraterização do sinistro como acidente de trabalho.
Na sentença recorrida decidiu-se pela descaraterização do acidente, com a seguinte fundamentação, que se reproduz parcialmente:
“Ora, face à factualidade provada, dúvidas não restam que o autor podia e devia ter utilizado o arnês e chicote para o arnês, que permitia a amarração do mesmo a um qualquer ponto fixo do local, o que era possível e teria evitado as lesões, tanto mais que, a interveniente disponibilizou tal equipamento ao autor em obra, do qual o autor não fez uso, porque não quis.
Em suma da prova produzida, resultou que o autor violou as regras de segurança, sem causa justificativa, pelo que, o acidente terá de ser descaracterizado, absolvendo-se a ré dos pedidos formulados”.- Fim de citação.
Alega o recorrente que o acidente se produziu por culpa da interveniente C..., ao não haver adotado as medidas de segurança a que estava obrigada.
Analisemos.
Estabelece o artigo 283º do Código do Trabalho, que “1- O trabalhador e os seus familiares têm direito à reparação de danos emergentes de acidente de trabalho (…) 5- O empregador é obrigado a transferir a responsabilidade pela reparação prevista neste capítulo para entidades legalmente autorizadas a realizar este seguro (…)”.
Tal regime estende-se aos trabalhadores por conta própria através do artigo 4º, n º2 do diploma que aprova a revisão do Código do Trabalho (Lei 7/2009 de 12/02).
Atualmente o regime jurídico dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, encontra-se regulado pela Lei 98/2009 de 4 de setembro (NLAT).
Estabelece o artigo 2º da Lei 9/2009 de 4 de setembro que “O trabalhador e seus familiares têm direito à reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, nos termos previstos na presente lei”.
E, o artigo 3º, n º1 do mesmo diploma refere que “O regime previsto na presente lei abrange o trabalhador por conta de outrem de qualquer atividade, seja ou não explorada com fins lucrativos”.
Preceitua o artigo 14 da LAT – Descaracterização do acidente:
“1– O empregador não tem de reparar os danos decorrentes do acidente que:
a) For dolosamente provocado pelo sinistrado ou provier de seu ato ou omissão, que importe violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pelo empregador ou previstas na lei;
b) Provier exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado;
c) Resultar da privação permanente ou acidental do uso da razão do sinistrado, nos termos do Código Civil, salvo se tal privação derivar da própria prestação do trabalho, for independente da vontade do sinistrado ou se o empregador ou o seu representante, conhecendo o estado do sinistrado, consentir na prestação.
2– Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, considera-se que existe causa justificativa da violação das condições de segurança se o acidente de trabalho resultar de incumprimento de norma legal ou estabelecida pelo empregador da qual o trabalhador, face ao seu grau de instrução ou de acesso à informação, dificilmente teria conhecimento ou, tendo-o, lhe fosse manifestamente difícil entendê-la.
3– Entende-se por negligência grosseira o comportamento temerário em alto e relevante grau, que não se consubstancie em ato ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da confiança na experiência profissional ou dos usos da profissão”.
Na presente norma legal encontram-se previstas taxativamente as circunstâncias que determinam a descaracterização de um acidente como sendo de trabalho.
No caso em apreço, está apenas em causa a conduta do sinistrado resultante de negligência grosseira.
Carlos Alegre[2] sublinha que o legislador ao qualificar a negligência de grosseira está a afastar, implicitamente, a simples imprudência, inconsideração, irreflexão, impulso leviano que não considera os prós e os contras.
A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem sido consistente ao exigir que estejamos perante uma conduta do sinistrado que se possa considerar temerária em alto e relevante grau e que não se materialize em ato ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da confiança na experiência profissional ou dos usos e costumes da profissão competindo à entidade que invoca a descaracterização do acidente por negligência grosseira do sinistrado, alegar e provar os respetivos factos[3].
O Decreto-Lei n.º 50/2005, de 25-02, transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2001/45/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de junho, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho.
Em tal diploma legal estabelece-se a observância de condições de segurança na execução, entre outros, de trabalhos em altura (artigo 36.º).
Dispõe o art.º 36º- Disposições gerais sobre trabalhos temporários em altura:
“1- Na situação em que não seja possível executar os trabalhos temporários em altura a partir de uma superfície adequada, com segurança e condições ergonómicas apropriadas, deve ser utilizado equipamento mais apropriado para assegurar condições de trabalho seguras.
2- Na utilização de equipamento destinado a trabalhos temporários em altura, o empregador deve dar prioridade a medidas de proteção coletiva em relação a medidas de proteção individual.
3- O dimensionamento do equipamento deve corresponder à natureza dos trabalhos e às dificuldades que previsivelmente ocorram na sua execução, bem como permitir a circulação de trabalhadores em segurança”.
Preceitua o art.º 37º- Medidas de proteção coletiva:
“1- As medidas de proteção coletiva destinadas a limitar os riscos a que os trabalhadores que executam trabalhos temporários em altura estão sujeitos devem atender ao tipo e características dos equipamentos de trabalho a utilizar.
2- Sempre que a avaliação de riscos considere necessário, devem ser instalados dispositivos de proteção contra quedas, com configuração e resistência que permitam evitar ou suster quedas em altura.
3- Os dispositivos de proteção contra quedas só podem ser interrompidos nos pontos de acesso de escadas, verticais ou outras.
4- Se a execução de determinados trabalhos exigir, tendo em conta a sua natureza, a retirada temporária de dispositivos de proteção coletiva contra quedas, o empregador deve tomar outras medidas de segurança eficazes e, logo que a execução dos trabalhos termine ou seja suspensa, instalar esses dispositivos”.
Estabelece o art.º 11º da Portaria nº 101/96, de 3/04- Quedas em altura:
“1- Sempre que haja risco de quedas em altura, devem ser tomadas medidas de proteção coletiva adequadas e eficazes ou, na impossibilidade destas, de proteção individual, de acordo com a legislação aplicável, nomeadamente o Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil.
4. Quando, por razões técnicas, as medidas de proteção coletiva forem inviáveis ou ineficazes, devem ser adotadas medidas complementares de proteção individual, de acordo com a legislação aplicável”.
Estabelecem os artigos 40º e 41º do Decreto n.º 41821/58, de 11 de agosto (Regulamento de Segurança no Trabalho da Construção Civil) do capítulo I (Aberturas nos soalhos ou plataformas de trabalho semelhantes) do título II (Aberturas e sua proteção).
Artigo 40.º-
“As aberturas feitas no soalho de um edifício ou numa plataforma de trabalho para passagem de operários ou material, montagem de ascensores ou escadas, ou para qualquer outro fim, serão guarnecidas de um ou mais guarda-corpos e de um guarda-cabeças, fixados sobre o soalho ou a plataforma.
§ único. Os guarda-corpos, com secção transversal de 0,30 m pelo menos serão postos à altura mínima de.1 m acima do pavimento, não podendo, o vão abaixo deles ultrapassar a medida de 0,85 m.
A altura do guarda-cabeças nunca será inferior a 0, 14 m”.
Artigo 41.º
“Sempre que haja vigamentos a nu ou os elementos de enchimento não tenham adquirido ainda a necessária consistência, é obrigatório o emprego de estrados e outros meios que evitem a queda de pessoas, materiais e ferramentas”.
Atendendo ao caso concreto dos autos, vejamos a factualidade relevante, com vista a apurar se estamos perante uma situação em que o acidente deva ser descaracterizado nos termos do art.º 14, da Lei n.º 98/2009, de 4/09, ou seja, se o mesmo proveio exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado.
Resultou provado:
-o autor pelas 10h15m do dia 16 de agosto de 2021, numa obra num prédio sito na Rua ..., em ..., foi vitima de um acidente, quando procedia à remoção do soalho do primeiro andar, que consistiu em queda (facto 1);
-nas circunstâncias aludidas em 1) o autor encontrava-se no primeiro andar do prédio que se encontrava em demolição, acompanhado de um trabalhador da interveniente, removendo as tábuas do soalho, para posteriormente retirar a restante estrutura do pavimento do primeiro andar (facto 2);
-no soalho aludido em 2) existiam aberturas e mesmo locais onde não existia soalho, com risco de queda em altura, altura essa que era de cerca de 3 metros (facto 3);
-a certa altura, quando levantava um caibro, o autor desequilibrou-se e caiu por buraco no soalho do primeiro andar, numa altura de 3 metros (facto 4);
-no local aludido em 1) onde o autor veio a cair, não estavam colocados guarda corpos, guarda cabeças, nem traves fixadas sobre o soalho e por cima das aberturas, com vistaa evitar o acesso às mesmas (facto 5);
-no piso inferior ao piso de onde o autor veio a cair não estava munido com uma rede de segurança que amparasse a queda, o que era possível ter sido colocado e seria idóneo a evitar as lesões sofridas pelo autor (facto 6);
-nas circunstâncias aludidas em 1) não estavam montados ou instalados arnês de segurança e chicote para o arnês, com o esclarecimento de que não existia no local ponto fixo para a sua amarração (facto 7);
-a interveniente deixou em obra os equipamentos aludidos em 7 (facto 8).
Resulta desta factualidade prova que o acidente ocorreu quando o sinistrado estava a levantar um caibro, desequilibrou-se e caiu por buraco no soalho do primeiro andar, numa altura de 3 metros. O sinistrado não estava a usar o arnês no momento do acidente, o que não era possível, porque o mesmo seria passível de ser preso a nenhuma linha de vida ou de segurança, em virtude de não estar criada tal estrutura. O autor encontrava-se no primeiro andar do prédio que se encontrava em demolição, acompanhado de um trabalhador da interveniente, removendo as tábuas do soalho, para posteriormente retirar a restante estrutura do pavimento do primeiro andar; no soalho existiam aberturas e mesmo locais onde não existia soalho, com risco de queda em altura, altura essa que era de cerca de 3 metros
Acresce que no local onde o autor veio a cair, não estavam colocados guarda corpos, guarda cabeças, nem traves fixadas sobre o soalho e por cima das aberturas, com vista evitar o acesso às mesmas; no piso inferior ao piso de onde o autor veio a cair não estava munido com uma rede de segurança que amparasse a queda, o que era possível ter sido colocado e seria idóneo a evitar as lesões sofridas pelo autor.
A descaracterização do acidente exige, pois, a verificação de dois requisitos: que o acidente provenha de comportamento indesculpável, temerário em alto e relevante grau do sinistrado, e que esta sua conduta seja a causa exclusiva do mesmo.
Ora, estes dois requisitos não se verificam no caso presente, já que, desde logo, a conduta do sinistrado, não pode ser considerada temerária em alto e relevante grau ao ponto de se qualificar de negligência grosseira.
A responsabilidade prevista na LAT é independente de culpa, ou seja, estamos no domínio da responsabilidade objetiva. [existem casos especiais de reparação previstos no artigo 18.º da LAT, sob a epígrafe de “Atuação culposa do empregador”, situação que não pode perspetivar-se nos presentes autos quanto ao recorrente por se tratar de um trabalhador por conta própria/trabalhador independente][4].
E porque o autor tinha a respetiva responsabilidade infortunística validamente transferida para a ré/seguradora – é a esta que incumbe, a reparação legalmente devida pelo acidente.
**
4.Atribuição de pensão pela IPP fixada.
Não há, pois, qualquer dúvida, que o recorrente sofreu um acidente de trabalho, enquanto trabalhador independente, o que lhe confere o direito a reparação nos termos legalmente previstos.
Atendendo a data da ocorrência do acidente, é aplicável o regime de reparação de acidentes de trabalho previsto na Lei n.º 98/2009 de 4 de setembro (adiante designada por LAT). De facto, o legislador contemplou a reparação infortunística dos "trabalhadores independentes”, ou seja, daqueles que exercem uma atividade por conta própria, portanto sem estarem colocados numa posição de subordinação jurídica em termos idênticos aos trabalhadores por conta de outrem.
Nos termos do artigo 4.º, n.º 2 da Lei nº 7/2009 de 12 de fevereiro (que aprovou a revisão do Código de Trabalho), o trabalhador que exerça atividade por conta própria deve efetuar um seguro que garanta o pagamento das prestações previstas nos artigos 283.º e 284.º do Código de Trabalho e respetiva legislação regulamentar (LAT, no que respeita ao regime de reparação de acidentes de trabalho).
Assim, os trabalhadores que exerçam uma “atividade por conta própria”, beneficiam do regime de reparação de acidentes de trabalho, mas para tanto recaindo sobre eles o dever de efetuar um seguro, nos termos a definir em diploma próprio.
Dispõe o artigo 184.º da LAT que a regulamentação relativa ao regime do seguro obrigatório de acidentes de trabalho de trabalhadores independentes consta de diploma próprio que é o Decreto-Lei n.º 159/99, de 11/05.
Ora, como decorre do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 159/99 de 11/05, “através do seguro de acidentes de trabalho pretende-se garantir aos trabalhadores independentes e respetivos familiares, em caso de acidente de trabalho, indemnizações e prestações em condições idênticas às dos trabalhadores por conta de outrem e seus familiares”.
Para consecução desse objetivo, decorre do artigo 1.º do citado Decreto-Lei, sob a epígrafe “Obrigatoriedade do Seguro” que os trabalhadores independentes são obrigados a efetuar um seguro de acidentes de trabalho que garanta, com as devidas adaptações, as prestações definidas na Lei n.º 98/2009 de 4 de setembro, para os trabalhadores por conta de outrem e seus familiares (n.º 1).
No presente caso, a responsabilidade infortunistica do autor, como trabalhador independente, encontrava-se transferida para a ré através da apólice ...05.
Se atentarmos nas condições da apólice de seguro em causa, verificamos que estamos perante um seguro que cobre o risco profissional do próprio segurado por acidentes de trabalho de trabalhador independente, garantindo as prestações e indemnizações previstas na LAT, sendo a retribuição segura de €7.980,00 (ou seja, correspondente à retribuição anual auferida pelo sinistrado- €665,00 x 12).
Com efeito, a Norma Regulamentar n.º 3/2009-R de 8-01, publicada no Diário da República, 2ª Série, n.º 57, de 23-03-2009, que veio aprovar “a parte uniforme das condições gerais da apólice de seguro obrigatório de acidentes de trabalho para trabalhadores independentes”, na respetiva cláusula 3ª, sob a epígrafe “objeto do seguro”, estabelece o seguinte:
“1- O segurador, de acordo com a legislação aplicável e nos termos desta apólice, garante os encargos provenientes de acidentes de trabalho da pessoa segura, em consequência do exercício da atividade profissional por conta própria identificada na apólice.
2- São consideradas prestações em espécie as prestações de natureza médica, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida ativa.
3- Constituem prestações em dinheiro a indemnização por incapacidade temporária absoluta ou parcial para o trabalho, a indemnização em capital ou pensão vitalícia correspondente à redução na capacidade de trabalho ou de ganho, em caso de incapacidade permanente, o subsídio por situações de elevada incapacidade permanente, o subsídio para readaptação de habitação, a prestação suplementar por assistência de terceira pessoa, e, nos casos de morte, as pensões aos familiares do sinistrado, bem como o subsídio por morte e despesas de funeral.”
Atente-se que o contrato de seguro celebrado entre as partes não prevê nas respetivas condições um regime de reparação mais alargado em relação àquele que se mostra previsto na LAT.
Nesta conformidade, a reparação devida ao sinistrado é aquela que decorre da LAT.
Resultou provado:
-o acidente dos autos ocorreu no dia 16/08/2021 (facto 1);
-no apenso para a fixação de incapacidade foi decidido que o autor em consequência do acidente dos autos se encontra afetado com uma IPP de 12,64%, sendo 04/07/2022 a data da consolidação médico legal das lesões (fls. 37 do apenso A) (facto 15);
-o autor nasceu em ../../1975 (facto 19);
-a retribuição anual do sinistrado era de €9.310,00.
De harmonia com o disposto no artigo 48º, nº 3, al. c), da LAT “Se do acidente resultar redução na capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado, este tem direito por incapacidade permanente parcial – pensão anual e vitalícia correspondente a 70% da redução sofrida na capacidade geral de ganho ou capital de remição da pensão nos termos previstos no artigo 75º”.
No cálculo da prestação resultante da determinação de incapacidade permanente parcial, temos uma pensão anual e vitalícia que resulta da multiplicação do valor da retribuição anual pelo facto de 70%, pelo grau de IPP.
Segundo o artigo 75º, nº 1, da LAT “É obrigatoriamente remida a pensão anual vitalícia devida a sinistrado com incapacidade permanente parcial inferior a 30% e a pensão anual vitalícia devida a beneficiário legal desde que, em qualquer dos casos, o valor da pensão anual não seja superior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida, em vigor no dia seguinte à data da alta ou da morte”.
A remição extingue o direito à pensão até então devida, traduzindo-se o pagamento
do capital de remição na entrega de “uma quantia unitária correspondente à pensão que o sinistrado receberia até ao fim da vida”[5].
“Ora, o cálculo do capital de remição é efetuado com base em dois factores, que são o valor da pensão e a taxa correspondente à idade do sinistrado, conforme resulta do disposto no artigo 75.º da Lei 98/2009, de 04-09, e na Portaria n.º 11/2000, de 13-01. Desta Portaria decorre, ainda, que a idade do sinistrado a considerar não é a real, mas a correspondente ao aniversário mais próximo da data a que se reporta o cálculo. Importa precisar, recordando-o, que aquelas taxas vão diminuindo progressivamente na razão inversa do aumento da idade, pelo que quanto mais velho for o sinistrado, menor será a taxa aplicável em cada ano, conforme está expresso nas tabelas que integram o anexo à citada Portaria 11/2000, de 13-01”[6].
E esses fatores são os que se verificam na data em que se mostram reunidos os pressupostos da remição obrigatória, isto é, neste caso, o valor da pensão e a idade do sinistrado em 05/07/2022 (no dia seguinte ao da data da alta- art.º 50º, nº 2, da LAT).
O sinistrado nasceu em ../../1975, pelo que a idade do sinistrado a considerar é de 47 anos e a taxa que lhe corresponde é de 14,270.
Responsabilidade simples - arts.48º, nº 3, al. c) e 75º, nº 1, da LAT.
CR = P x T
P = RA x 0,7 x I
CR = Capital de remição
P = Pensão anual
T = Taxa prevista na Portaria nº 11/2000, de 13 de janeiro
I = Incapacidade
CR= €9.310 x 70% x 12,64%. x 14,270 = €11.754,90.
A pensão anual é de €823,75.
O valor do capital de remição seria assim de €11.754,90.
De harmonia com disposto no art.º 9º, nº 3 do citado Decreto-Lei n.º 159/99 “Não tendo sido exigida prova no momento da subscrição ou alteração do contrato de seguro, será sempre considerado, para efeitos de indemnização, o valor garantido”.
Dado que no caso presente, o capital seguro é de €8.890,00, a ré/seguradora só responde até este limite.
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5. Reembolso de despesas com deslocações obrigatórias.
O autor reclama a quantia de €66,24, a título de reembolso de custos com deslocações obrigatórias.
Para o efeito, alegou no artigo 23º da petição inicial:
Ao nível de deslocações obrigatórias a este Tribunal e ao G.M.L., o A. foi obrigado a fazer pelo menos as seguintes viagens, em carro próprio (atendendo à ausência de transportes públicos compatíveis com os horários a que teve de comparecer nos vários locais):
- Casa - - - > Tribunal (...): 3 vezes x 46 kms [por viagem, ida e volta] = 138 kms x €0,36 = €49,68.
- Casa - - - > G.M.L. (...): 1 vez x 46 kms [por viagem, ida e volta] = 46 kms x €0,36 =€ 16,56.
Resultou provado:
-o autor deslocou-se duas vezes ao GML para realização do exame médico (03/06/2022 e 23/11/2022) e duas vezes a Tribunal para comparência na tentativa de conciliação e exame médico em Junta médica (27/09/2023 e 01/10/2024) (facto 17).
Dispõe o artigo 39º da LAT- Transporte e estada
“1– O sinistrado tem direito ao fornecimento ou ao pagamento de transporte e estada, que devem obedecer às condições de comodidade impostas pela natureza da lesão ou da doença.
2– O fornecimento ou o pagamento referidos no número anterior abrangem as deslocações e permanência necessárias à observação e tratamento e as exigidas pela comparência a atos judiciais, salvo, quanto a estas, se for consequência de pedido do sinistrado que venha a ser julgado improcedente.
3– O sinistrado utiliza os transportes coletivos, salvo não os havendo ou se outro for mais indicado pela urgência do tratamento, por determinação do médico assistente ou por outras razões ponderosas atendíveis”.
(…).
Artigo 40º – Responsabilidade pelo transporte e estada
“1– Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a entidade responsável só é obrigada a despender o menor custo das prestações de transporte e estada que obedeçam às condições de comodidade impostas pela natureza da lesão.
2– A entidade responsável deve assumir previamente, perante os fornecedores de transporte e estada, a responsabilidade pelo pagamento das despesas ou adiantar a sua importância”.
Em face do exposto, e porque não resulta dos factos provados o motivo pelo qual o autor não se deslocou em transporte coletivo, assim como os quilómetros percorridos não é possível calcular as despesas de deslocação em transporte próprio.
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6. Reembolso de despesas com as sessões de fisioterapia, consultas e exames médicos.
O autor reclama a quantia global de €1.216,13 que despendeu em (pelo menos) 55 sessões de fisioterapia, consultas e exames médicos, reclamando o pagamento de tal valor da ora R., a este título.
Resultou provado:
-realizou cerca de 55 (cinquenta e cinco) sessões de reabilitação com fisioterapia ao pé/tornozelo direito, bem como à coluna lombar de 12/10/2021 a 21/01/2022 e ainda mais 13 sessões a partir de 16/03/2022, bem como consultas e exames médicos, no montante de cerca de €1.114,13 (facto 12).
Tem assim o autor a receber a quantia de €1.114,13, a título de reembolso pelas despesas que assumiu com as sessões de fisioterapia, consultas e exames médicos.
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7. Juros de mora.
Dispõe o artigo 135º do CPT:
“Na sentença final o juiz considera definitivamente assentes as questões que não tenham sido discutidas na fase contenciosa, integra as decisões proferidas no processo principal e no apenso, cuja parte decisória deve reproduzir, e fixa também, se forem devidos, juros de mora pelas prestações pecuniárias em atraso”. Em matéria de acidentes de trabalho, o artigo 135º do Código de Processo do Trabalho contém um regime especial quanto a juros de mora, de acordo com o qual estes são devidos desde o vencimento da obrigação, sendo uma norma imperativa.
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8. Valor da causa:
De harmonia com o disposto no artigo 120º, nº 1, do CPT “Nos processos de acidentes de trabalho, tratando-se de pensões, o valor da causa é igual ao do resultado da multiplicação de cada pensão pela respetiva taxa constante das tabelas práticas aplicáveis ao cálculo do capital da remição, acrescido das demais prestações”.
Assim sendo, o valor da presente causa é de €10.004,13 (€8.890,00 + €1.114,13).
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DECISÃO
Com fundamento no atrás exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida que se substitui por decisão com a seguinte redação:
1. Condena-se a ré/seguradora a pagar ao autor as seguintes quantias:
a) A quantia de €8.890,00 (oito mil, oitocentos e noventa euros), a título de capital segurado, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde o dia seguinte ao da alta e até à sua efetiva entrega.
b) A quantia de €1.114,13 (mil, cento e catorze euros e treze cêntimos), a título de título de reembolso pelas despesas que assumiu com as sessões de fisioterapia, consultas e exames médicos, acrescidos de juros de mora desde a data do seu vencimento até integral pagamento.
2. No mais, absolve-se a ré do mais peticionado.
Custas pela apelada/seguradora, atendendo ao seu vencimento- artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, todos do CPC ex vi do artigo 87º, nº 1, do CPT.
Fixo o valor da causa em €10.004,13- artigo 120º do C.P.T.
Coimbra, 20 de novembro de 2025
Mário Rodrigues da Silva- relator
Paula Maria Roberto- adjunta
Felizardo Paiva- adjunto
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Sumário (artigo 663º, nº 7, do CPC):
(…).
Texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, respeitando-se, no entanto, em caso de transcrição, a grafia do texto original
([1]) 1317/09, cujo relator é o atual relator, www.dgsi.pt.
([2]) Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, p. 63
([3]) Ac. do STJ, de 8-06-2021, 1059/13, Chambel Mourisco, www.dgsi.pt.
([4]) Cf. neste sentido, Ac. do TRP, de 19-12-2023, 1221/22, Germana Ferreira Lopes, www.dgsi.pt.
([5]) cfr. Ac. do TRL de 17-09-2008, 6006/2008-4, Ferreira Marques, www.dgsi.pt.
([6]) Viriato Reis, Pensão remida e revisão da incapacidade: valores da pensão e do capital remição, Revista do Ministério Público, 161, Janeiro: Março 2020, p. 239.