I - Na ação de divisão de coisa comum o autor não está onerado com a prova dos factos aquisitivos dos direitos em comunhão, não se estando perante uma ação real, mas uma ação destinada a fazer valer apenas o direito à divisão.
II - Considerando-se provado, por falta de contestação, e não tendo sido considerado inoperante a revelia, que Autores e Réus são os comproprietários do imóvel cuja divisão foi peticionada, assim como as respectivas quotas-partes, deve o Tribunal prosseguir para prolação da decisão prevista no art. 927º do CPC para fixação dos quinhões, seguida da realização da conferência de interessados para os fins consagrados no art. 929º do CPC.
(Sumário elaborado pela Relatora)
3. Foi proferido despacho com Ref Citius 127859373 com o seguinte teor:
“A presente acção declarativa sob a forma de processo especial de divisão de coisa comum tem como objecto por fim a comunhão resultante da compropriedade do prédio rústico, composto de pinhal e semeadura, com 1960 m2, que confronta de norte com KK, de sul com herdeiros de LL, de nascente com MM e de poente com vala, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...61 da freguesia ..., Concelho ..., o qual proveio do anterior artigo da matriz ...81.
Dos factos alegados pelos Autores e relativamente aos quais não foi deduzida contestação, considerando-se os mesmos confessados, atento o disposto nos artigos 566.º e 567.º, n.º 1 do C.P.C, não resulta a indivisibilidade dos prédios em causa.
01 – O prédio rústico ...61, com uma área registada na respetiva caderneta predial de 1.960m2 encontra-se, funcional e fisicamente, dividido em sete parcelas. Os limites dessas parcelas são, perfeitamente, identificáveis, como são, também, reconhecidos por todos os interessados. Essa possibilidade de divisão é, de certa forma, reconhecida e sustentada, na existência atual de três prédios, autonomizados e autónomos, e assim registados nos Serviços da Autoridade Tributária de Ílhavo. São os casos dos prédios urbanos ...16, ...46 e ...26.
02 – Regista-se, também, que para garantir o acesso às sete parcelas foi executado uma servidão de acesso, hoje, com características de arruamento público, pois dispõe de pavimentação [executada pela Junta de Freguesia com o conhecimento do município] e de todas as redes de infraestruturação pública. Cada uma das referidas sete parcelas dispõe de acesso, autónomo e autonomizado, às referidas redes de infraestruturação pública.
03 – Na prática, a divisão do prédio referido nos autos em sete parcelas autónomas e, fisicamente, individualizadas, e a execução do arruamento, designado por “Beco ...”, constitui uma operação em tudo semelhante a uma operação de loteamento, ainda que informal, com todas as obras de urbanização realizadas e com edificação já existente em quatro “lotes”, ainda que informais.
04 – Conclui-se, assim, que o prédio ...61 não só é passível de divisão como já se encontra, na realidade, dividido, física e funcionalmente, em sete parcelas autónomas das quais, três já constituem prédios urbanos autónomos [registados nas finanças e correspondentes a artigos urbanos autónomos].
05 – De acordo com o reconhecido, desde sempre, por todos os interessados, e de acordo com os limites físico evidentes, que se expressam no levantamento topográfico apresentado, a distribuição dos quinhões entre cada um dos comproprietários é a seguinte:
| Parcela e Proprietário Reconhecido | Área Levantamento Topográfico [m2] | Artigo Predial | Área Caderneta Predial [m2] |
| A – GG / HH B – NN C - OO D - KK | 261,08m2 215,15m2 212,10m2 204,85m2 | ...16 | 245 |
| E – EE F – EE | 191,35m2 207,55m2 | ...26 | 195,50 |
| G - II
H – Beco ... | 225,00m2 | ...46 | 153,86 |
| 200,05m2 1,717,13m2 | |||
6. Notificado o relatório às partes não houve reclamações ou pedidos de esclarecimentos, tendo o tribunal proferido o seguinte despacho:
“Em face das conclusões insertas no predito relatório pericial, afigura-se a possibilidade de se estar diante uma falta de interesse em agir dos autores - exceção dilatória inominada, de conhecimento oficioso - razão pela qual, por forma a evitar a prolação de decisões surpresa, garantindo o contraditório, notifique os autores e os requeridos para, querendo, em 10 dias, virem dizer o que tiverem por conveniente (artigo 3.º, n.º3 do CPC).”
7. Notificados desse despacho apenas os Autores se pronunciaram, sustentando que nunca foi possível aos Autores e Réus concretizar a divisão amigável/extrajudicial por falta de entendimento e por isso mesmo é que lançaram mão da presente acção judicial, caso contrário, e caso conseguissem a divisão da sua parcela por outra via, os Autores não teriam avançado para Tribunal, assim como nunca conseguiram obter parecer favorável junto da Câmara Municipal para construção de uma moradia na sua parcela precisamente por o prédio se encontrar em compropriedade, e que todos os Requeridos estão de acordo com a divisão nos termos propostos pelos Senhores Peritos, não tendo sido apresentadas quaisquer reclamações ao Relatório, aceitando a divisão do terreno em 7 parcelas (conforme documento junto como Doc. 2), pelo que entendem não existir falta de interesse em agir, nem da sua parte, nem da parte dos Requeridos (quanto a estes, a falta de contestação está até prevista na lei), estando os autos em condições de prosseguirem os seus termos para as consequentes adjudicações dos quinhões a cada comparte (cfr. art. 929.º do CPC) e essencialmente, para adjudicação da parcela com a área de 215,15 m2 aos Autores.
8. Foi proferida decisão sob a Ref. Citius 133130266 com o seguinte dispositivo:
“Em face do exposto, decido:
a) Julgar verificada a exceção dilatória de falta de interesse em agir dos requerentes AA e BB para a propositura da presente ação;
b) Consequentemente, absolver os requeridos CC; DD; EE e esposa FF; GG e esposa HH e II e esposa JJ da presente instância.
Fixa-se o valor da presente ação em € 5.000,01 (cinco mil euros e um cêntimo).
Custas a cargo dos requerentes.
Registe e notifique.
Após transito,
- Comunique o teor da presente decisão à Conservatória do Registo Civil (art. 3.º, n.º1 do Código do Registo Predial).”
9. Inconformados, os Autores interpuseram recurso de apelação da supra referida decisão, recurso esse que foi julgado totalmente procedente por este Colectivo de Juízes, tendo sido revogada a decisão recorrida e ordenado o prosseguimento da presente ação.
10. Recebidos os autos pelo Tribunal de 1ª Instância, este de imediato proferiu nova sentença, com o seguinte dispositivo:
“Nestes termos, tendo por base os preceitos legais supracitados, julga-se a ação improcedente, por não provada, absolvendo-se os Réus do pedido formulado pelos Autores.
Custas da ação pelos Autores.
Registe e notifique.”
11. Novamente inconformados, os Autores interpuseram recurso de apelação da decisão final, formulando as seguintes
CONCLUSÕES
A - Foi proferida 2.ª Sentença a 30-03-2025, a qual decidiu “Não provado que todas as partes em juízo são as comproprietárias do prédio em causa nos autos, extrai-se, porém, da alegação dos Autores que eles e os Réus exercem cada um a posse sobre uma concreta parcela do prédio que acordaram ficar a pertencer-lhe. No entanto, os Autores não invocaram os factos necessários ao reconhecimento de que cada um adquiriu a propriedade sobre a fração que lhe foi atribuída, por usucapião. Desta feita, a presente ação deve improceder por falecer no caso concreto, à luz da petição apresentada e da alegação e prova feita, os pressupostos supra enunciados, ou seja, conhecer-se todos os comproprietários do imóvel e a extensão do seu direito.
Nestes termos, tendo por base os preceitos legais supracitados, julga-se a ação improcedente, por não provada, absolvendo-se os Réus do pedido formulado pelos Autores. Custas da ação pelos Autores.” sendo desta Sentença que se recorre;
B - Com todo o respeito que se tem pelos Tribunais, todo este processo tem sido uma verdadeira “montanha russa”, com Despachos dilatórios, com Despachos a ordenar prosseguimento dos autos com realização de perícia, com pagamentos de honorários aos peritos, que afinal se revelaram sem interesse face às Sentenças que têm vindo a ser proferidas, com interposição de recurso que acabou por ser julgado totalmente procedente, com prolação de uma 2.ª Sentença que voltou novamente a julgar improcedente a acção dos ora Recorrentes…E o processo avança um passo, recua dois, volta a avançar e volta a recuar 2 passos…
C – O que os Autores/Recorrentes têm verificado ao longo deste processo é que, à medida que mudam os Mmos. Drs. Juizes – este processo já vai no 5.º Mmo. Juiz (e nada contra a mudança dos Ilustres Magistrados), mudam os Despachos/entendimentos/sentenças proferidos;
D - Não podem os Recorrentes conformar-se com o facto de: 1) em 18-07-2023 o Tribunal recorrido ter reconhecido que não houve contestação e por isso, se deram como provados os factos alegados na Petição; 2) O Tribunal recorrido ter decidido que dos factos alegados pelos Autores – que não foram contestados – não resultava a indivisibilidade do prédio em causa; 3) e por via disso, o Tribunal recorrido ordenou a realização de perícia com a finalidade de proceder à avaliação do bem imóvel e saber se o mesmo era ou não divisível em substância e em que termos se operava tal divisão; 4) terem sido elaborados 2 Relatórios Periciais que concluíram precisamente que o prédio é divisível e é possível separar a parcela de terreno dos Autores com a área de 215,15m2; 5) em 28-01-2025 é proferido Acórdão por esta Relação do Porto que determina a revogação da Sentença a quo e ordena o prosseguimento dos autos subsequentes à apresentação do relatório pericial; 6) em 30-03-2025 é, a final, proferida uma 2.ª Sentença que vai num sentido totalmente oposto a toda a tramitação dos autos e decide, para total surpresa dos Autores, que não foi provado nos autos que todas as partes são comproprietárias;
E – A contrario o Tribunal a quo já havia reconhecido – por Despacho de 18-07-2023 – que o prédio em causa era divisível. Ou melhor dizendo, dos factos alegados pelos Autores resultou que o prédio era susceptível de ser dividido, aliás, já na Petição Inicial os Autores alegaram que na prática e fisicamente, o prédio já se encontrava dividido em parcelas, em que cada uma delas já tinha uma construção, mas com esta Sentença proferida, uma vez mais, os Recorrentes chegam à conclusão que o Douto Tribunal andou a praticar actos meramente dilatórios e inúteis até agora, a nomear Peritos, a requerer elaboração de Relatórios, a expedir notificações às partes, com os Autores a ter de suportar encargos com Peritos, para, afinal, se concluir que não foi feita prova quanto à compropriedade do prédio;
F - Já haviam sido proferidos Despachos anteriores, com trânsito em julgado (porquanto não foram objecto de qualquer recurso e/ou reclamação), e tendo sido ordenado o prosseguimento dos autos para a fase executiva;
G – Já no douto Acórdão proferido por esta Relação, é referido que “o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635º, nº 3, e 639º, n.ºs 1 e 2, do CPC” e a verdade é que no 1.º recurso, a Relação não se pronunciou sobre a questão agora suscitada pelo Tribunal a quo – a Relação nada disse sobre a alegada falta de prova quanto à compropriedade;
H - Também, no Acórdão da Relação é mencionado que “Ora como decorre dos autos e se fez menção no relatório supra, a fase de índole declarativa desenrolou-se sem contestação dos Réus, tendo ficado definido por despacho judicial o direito à divisão invocado pelos aqui Apelantes, tendo o tribunal a quo determinado a realização de perícia para “determinar se o prédio em causa nos autos é suscetível de divisão e, em caso afirmativo, determinar as áreas dos mesmos e os quinhões de cada um dos comproprietários assim prosseguindo os autos para a fase de índole executiva”.
(…) bastando a mera alegação de que são titulares de um imóvel em compropriedade e não pretendem manter-se na indivisão.
(…)desconsiderando o alegado pelos aqui Apelantes quanto à causa de pedir invocada na petição inicial, assim como não tendo em devida conta qual é a necessidade de tutela jurisdicional no caso específico da ação de divisão de coisa comum, a sentença recorrida deverá ser totalmente revogada, para que os autos prossigam os seus regulares termos, com prosseguimento dos actos subsequentes à apresentação do relatório pericial.”
I - Todos os Réus foram devidamente citados e não deduziram qualquer Contestação, o que já havia sido consignado por Despacho de 09-02-2023 (ref.ª 125234557), sendo certo que ao longo de todo o processo sempre todos os Réus foram citados/notificados pelo Tribunal, assinando os avisos de recepção e nunca tiveram qualquer intervenção nos autos;
J – Foi proferido Despacho datado de 18-07-2023, ref.ª 127859373, onde a Mma. Dra. Juiz decidiu “Após melhor estudo, entende este Tribunal que assiste razão aos autores pelo que prosseguirão os autos os termos da acção de divisão de coisa comum.
A presente acção declarativa sob a forma de processo especial de divisão de coisa comum tem como objecto por fim a comunhão resultante da compropriedade do prédio rústico, composto de pinhal e semeadura, com 1960 m2, que confronta de norte com KK, de sul com herdeiros de LL, de nascente com MM e de poente com vala, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...61 da freguesia ..., Concelho ..., o qual proveio do anterior artigo da matriz ...81.
Dos factos alegados pelos Autores e relativamente aos quais não foi deduzida contestação, considerando-se os mesmos confessados, atento o disposto nos artigos 566.º e 567.º, n.º 1 do C.P.C, não resulta a indivisibilidade dos prédios em causa.
Assim, importará proceder à realização de perícia nos termos dos artigos 924.º do Código de Processo Civil, com a finalidade de proceder à avaliação do bem imóvel e saber se o mesmo é ou não divisível em substância e em que termos se opera tal divisão.
Destarte, cada uma das partes deverá, no prazo de 10 dias, indicar os respectivos peritos, sob cominação de nenhuma delas o fazendo, a perícia ser realizada por um único perito, designado pelo tribunal”;
K – Assim, considerou confessados os factos alegados na Petição em virtude da falta de contestação, considerou que dos factos confessados não resultou que o prédio não pudesse ser divisível, ordenando a realização de perícia por um único perito, para apurar a avaliação do prédio e saber se o mesmo era ou não divisível em substância e em que termos se devia operar tal divisão;
L - Aliás, se nessa fase se suscitavam duvidas ao Tribunal a quo quanto à prova (ou falta dela) acerca da titularidade/compropriedade dos Réus, nessa fase o Tribunal poderia ter notificado os Autores para aperfeiçoar a PI, ou juntar prova documental, ou até ter diligenciado pela marcação de diligência probatória que entendesse ser necessária…o que não foi feito nem houve sequer qualquer convite aos Autores ao aperfeiçoamento do articulado;
M - Portanto, o Despacho de 18-07-2023 – que não foi objecto de qualquer reclamação ou recurso – consolidou-se. Podendo afirmar-se que se encerrou a fase declarativa do processo de acção de divisão de coisa comum. E ordenou a realização de perícia com vista a determinar-se os termos da divisão;
N - Por Despacho de 18-10-2023 com a ref.ª 129431244, ordenou a Mma. Dra. Juiz que se “Notificasse os peritos nomeados para procederem à realização da perícia tendo em vista determinar se o prédio em causa nos autos é suscetível de divisão e, em caso afirmativo, determinar as áreas dos mesmos e os quinhões de cada um dos comproprietários e enviar o respetivo relatório, de acordo com o disposto nos artigos 483.º e 484.º do Código de Processo Civil.” o que resultou da Perícia:
“01 – O prédio rústico ...61, com uma área registada na respetiva caderneta predial de 1.960m2 encontra-se, funcional e fisicamente, dividido em sete parcelas. Os limites dessas parcelas são, perfeitamente, identificáveis, como são, também, reconhecidos por todos os interessados. Essa possibilidade de divisão é, de certa forma, reconhecida e sustentada, na existência atual de três prédios, autonomizados e autónomos, e assim registados nos Serviços da Autoridade Tributária de Ílhavo. São os casos dos prédios urbanos ...16, ...46 e ...26.
02 – Regista-se, também, que para garantir o acesso às sete parcelas foi executado uma servidão de acesso, hoje, com características de arruamento público, pois dispõe de pavimentação [executada pela Junta de Freguesia com o conhecimento do município] e de todas as redes de infraestruturação pública. Cada uma das referidas sete parcelas dispõe de acesso, autónomo e autonomizado, às referidas redes de infraestruturação pública.
03 – Na prática, a divisão do prédio referido nos autos em sete parcelas autónomas e, fisicamente, individualizadas, e a execução do arruamento, designado por “Beco ...”, constitui uma operação em tudo semelhante a uma operação de loteamento, ainda que informal, com todas as obras de urbanização realizadas e com edificação já existente em quatro “lotes”, ainda que informais. 04 – Conclui-se, assim, que o prédio ...61 não só é passível de divisão como já se encontra, na realidade, dividido, física e funcionalmente, em sete parcelas autónomas das quais, três já constituem prédios urbanos autónomos [registados nas finanças e correspondentes a artigos urbanos autónomos].
05 – De acordo com o reconhecido, desde sempre, por todos os interessados, e de acordo com os limites físico evidentes, que se expressam no levantamento topográfico apresentado, a distribuição dos quinhões entre cada um dos comproprietários é a seguinte:
O - Nesta fase, e como bem ordenou o Tribunal da Relação do Porto, tendo sido realizado o relatório pericial, se ainda persistissem dúvidas, nos termos do art. 927.º, n.º3 do CPC “3 - Seguidamente, o juiz decide segundo o seu prudente arbítrio, podendo fazer preceder a decisão da realização de segunda perícia ou de quaisquer outras diligências que considere necessárias, aplicando-se o disposto nos artigos 294.º e 295.º.”
P - Com a prolação da Douta Sentença a quo de 30-03-2025 – que foi uma total Decisão-surpresa – foi violado o princípio do contraditório, pois nem sequer foi dada a possibilidade às partes de se pronunciarem sobre a alegada falta de prova quanto aos titulares da compropriedade – “Decisão - surpresa é a solução dada a uma questão que, embora previsível, não tenha sido configurada pela parte, sem que a mesma tivesse obrigação de a prever”;
Q - Assim, a Sentença é nula – o Tribunal tomou conhecimento de questões das quais não podia pronunciar-se (até porque já estavam dados como provados os factos alegados na PI, mediante o Despacho de 18-07-2023) – violação do art. 615.º, n.º1 d) 2.ª parte do CPC;
R - Na apreciação da prova, o Tribunal a quo deveria ter-se socorrido de todos os elementos carreados para os autos, nomeadamente a prova documental junta e essencialmente os Relatórios Periciais juntos, primeiro o Relatório elaborado pelo único Perito Eng.º PP Ré e segundo, o Relatório elaborado pelos 3 Peritos, em que os 2 concluíram pela divisibilidade em substância do prédio e onde fixaram os quinhões de cada um;
S - Na verdade, com a PI os Autores alegaram a compropriedade de cada Réu, indicaram a sua percentagem/quota-parte, juntaram caderneta predial, certidão permanente, contrato-promessa relativamente à aquisição da parcela dos 5.ºs Réus, juntaram caderneta predial / certidão e IMI do prédio dos 5.ºs Réus, alegaram factos que levariam à usucapião, juntaram posteriormente, a 13-05-2024, uma declaração assinada por todos os Réus comproprietários que reconhecem a divisão do terreno tal como definido no relatório pericial e mesmo os Senhores Peritos, para a elaboração do relatório, contactaram as partes e analisaram as cadernetas prediais;
T - Entendem os Recorrentes que estão provados todos os factos da PI, incluindo a titularidade e respectiva quota-parte dos Réus enquanto comproprietários, pelo que os autos estavam em condições de prosseguir os seus termos para as consequentes adjudicações dos quinhões a cada comparte (cfr. art. 929.º do CPC) e essencialmente, para adjudicação da parcela com a área de 215,15 m2 aos Recorrentes;
U – Verifica-se uma contradição entre os factos provados e não provados pois não pode o Tribunal dar como provado e não provado, o mesmo facto, repare-se, que deu como provado que “Os 5.ºs Réus, II e JJ têm a sua moradia (correspondente ao urbano n.º ...46) construída sobre parte do prédio supra identificado em 1, porquanto a 20 de novembro de 2001 aquele celebrou um contrato promessa de compra e venda referente a 1/6 do prédio rústico referido em 1, e pagou o respetivo preço” e em simultâneo dá como não provado que “Os 5.ºs Réus, II e JJ são proprietários de 1/6 do prédio supra identificado em 1.” pois os 5.ºs Réus ou são proprietários de 1/6 ou não são;
V - Se deu como provado que os 5.ºs Réus são proprietários da moradia, que está construída numa parcela do terreno, que corresponde precisamente a 1/6 que estes compraram, pagando o preço, então não pode dar como não provado que não são (com)proprietários desse mesmo 1/6; assim, a alínea d) dos factos não provados deve ser eliminada. E o ponto 5 dos factos dados como provados deve ser alterado de modo a passar a ter a seguinte redacção:
“Factos provados
5. Os 5.ºs Réus, II e JJ têm a sua moradia (correspondente ao urbano n.º ...46) construída sobre parte do prédio supra identificado em 1, porquanto a 20 de novembro de 2001 aquele celebrou um contrato promessa de compra e venda referente a 1/6 do prédio rústico referido em 1, e pagou o respetivo preço, sendo que os 5.ºs Réus, II e JJ são proprietários de 1/6 do prédio supra identificado em 1.”
W - Dado que não houve contestação e se deram por provados os factos alegados na PI, deveriam constar dos factos provados todos estes, e tendo também por base a caderneta predial e certidão permanente juntas aos autos:
1. Os Autores são proprietários de 1/6 de um prédio rústico, composto de pinhal e semeadura, com 1960 m2, que confronta de norte com KK, de sul com herdeiros de LL, de nascente com MM e de poente com vala.
2. Tal prédio encontra-se inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...61 da freguesia ..., Concelho ..., o qual proveio do anterior artigo da matriz ...81,
3. E localiza-se nas ...,
4. Tem o actual valor patrimonial tributário de 53,31 €.
5. Está registado na Conservatória do Registo Predial de Ílhavo, freguesia ... sob a descrição n.º ...71, por onde se verifica que 1/6 está registado a favor dos Autores, pela AP. ...02 de 2018/08/29,
6. Os Autores adquiriram este prédio, na proporção de 1/6, mediante compra feita por escritura pública, a 23 de Agosto de 1993, com os anteriores proprietários QQ, RR, SS, TT e UU,
7. A 1.ª Ré CC é proprietária de 1/6 do referido prédio supra identificado em 1.º, 2.ºe 3.º,
8. Embora a sua parcela de 1/6 não se encontre registada na Conservatória do Registo Predial, estando omissa e estando a sua moradia construída sobre 1/6 do terreno aqui em causa,
9. A 2.ª Ré DD é proprietária de 1/6 do referido prédio supra identificado em 1.º, estando a sua moradia construída sobre 1/6 do terreno, embora a sua parcela não se encontre registada na Conservatória do Registo Predial, estando omissa,
10.Os 3.ºs Réus, EE e FF são proprietários de 2/6 do referido prédio identificado em 1.º, 2.º e 3.º, tendo adquirido a parcela de 1/6 por usucapião, encontrando-se registada a seu pela AP. ... de 2008/01/22, e aí têm 2 moradias construídas no total de terreno de 2/6,
11.Os 4.ºs Réus, GG e HH são proprietários de 1/6 do referido prédio supra identificado, tendo adquirido a parcela de 1/6 por compra, encontrando-se registada a favor dos 4.ºs Réus pela AP. ...12 de 2018/08/29,
12.Os 5.ºs Réus, II e JJ têm a sua moradia (correspondente ao urbano n.º ...46) construída sobre parte do prédio supra identificado em 1, porquanto a 20 de novembro de 2001 aquele celebrou um contrato promessa de compra e venda referente a 1/6 do prédio rústico referido em 1, e pagou o respetivo preço, sendo que os 5.ºs Réus, II e JJ são proprietários de 1/6 do prédio supra identificado em 1., não se encontrando essa parcela descrita na Conservatória do Registo Predial.
13.O prédio referido em 1 encontra-se dividido em 7 talhões desde há largos anos.
X - E deviam os factos não provados ser alterados de maneira a constar apenas e tão só o único facto (o qual por si só nunca poderia levar à total improcedência da acção):
“Factos não provados:
“a) A 2.ª Ré DD é proprietária de 2/6 do prédio supra identificado em 1.
Y - O Tribunal já tinha as quotas dos comproprietários definidas, e a conferência de interessados serviria precisamente para definir e fixar definitivamente os respectivos quinhões de cada um, mas ainda que o Tribunal entendesse não ter elementos suficientes para fixar as quotas de cada parte, a lei presume, iuris et iure, que tais quotas são iguais, pelo que, bastaria ao Tribunal determinar que cada parte teria 1/6;
Z - O que se verifica, ao ter dado como provados e como não provados os factos elencados, a Sentença a quo comete um erro de julgamento quanto ao mérito, entendendo os Recorrentes que o Tribunal violou o disposto nos arts. 388.º do Código Civil, 607.º, n.º4, o 926.º, n.º5 e o 929.º do CPC;
AA - Entendem os ora Recorrentes ter igualmente sido violado o art. 615.º, n.º1 c) e d), 2.ª parte do CPC, por, respectivamente, existir contradição entre a matéria de facto dada como provada e como não provada, e respectiva fundamentação quanto aos 5.ºs Réus (pois o Tribunal não pode dar como provado e não provado, em simultâneo que os 5.ºs Réus são proprietários e não são proprietários de 1/6) e ainda por ter decidido novamente quanto aos factos dados como provados que já estavam consolidados pelo Despacho de 18-07-2023;
BB - Tendo havido erro na apreciação das provas nos termos do 607.º, n.º4, do CPC, porquanto o Tribunal a quo não considerou toda a prova documental junta bem como os Relatórios dos Peritos, não analisou criticamente as provas.
Concluíram, pedindo que as presentes Alegações de Recurso sejam recebidas e julgadas totalmente procedentes por provadas, revogando-se a Sentença a quo e substituindo-a por outra que julgue totalmente procedente a petição inicial, prosseguindo-se os termos do processo de divisão de coisa comum com vista á conferência de interessados onde se fixem e adjudiquem os quinhões a todas as partes, com todas as consequências legais.
12. Não foram apresentadas contra-alegações pelos Apelados/Réus.
13. Foram observados os vistos legais.
Pelo tribunal de 1ª Instância foram considerados provados os seguintes factos:
1. Os Autores encontram-se registados como sendo proprietários, na proporção de 1/6, do prédio rústico, composto de pinhal e semeadura, com 1960 m2, sito em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Ílhavo sob o número sob o artigo ...71, da freguesia ..., Concelho ..., e inscrito na matriz da referida freguesia atualmente sob o artigo ...61.
2. Os Autores adquiriram este prédio, na proporção de 1/6, mediante compra, feita por escritura pública, a 23 de agosto de 1993, a QQ, RR, SS, TT e UU.
3. Os 3.ºs Réus EE e FF encontram-se registados como sendo também proprietários, na proporção de 1/6, do prédio rústico referido em 1.
4. Os 4.ºs Réus, GG e HH encontram-se registados como sendo também proprietários, na proporção de 1/6, do prédio rústico referido em 1.
5. Os 5.ºs Réus, II e JJ têm a sua moradia (correspondente ao urbano n.º ...46) construída sobre parte do prédio supra identificado em 1, porquanto a 20 de novembro de 2001 aquele celebrou um contrato promessa de compra e venda referente a 1/6 do prédio rústico referido em 1, e pagou o respetivo preço.
6. O prédio referido em 1 encontra-se dividido em 7 talhões desde há largos anos.
2. O Tribunal de 1ª instância julgou não provados os seguintes factos:
a) A 1.ª Ré CC é proprietária de 1/6 do prédio supra identificado em 1.
b) A 2.ª Ré DD é proprietária de 1/6 ou de 2/6 do prédio supra identificado em 1.
c) Os 3.ºs Réus EE e FF são proprietários de 2/6 do prédio supra identificado em 1.
d) Os 5.ºs Réus, II e JJ são proprietários de 1/6 do prédio supra identificado em 1.
____________________________
[1] A. Varela, Manual de Processo Civil, pág. 686.
[2] José Lebre de Freitas, CPC Anotado, 2º volume, 3ª edição, pág. 736-737. Vide, ainda, no mesmo sentido, AC RP de 29.06.2015, AC RP de 1.06.2015 ou, ainda, AC RG de 14.05.2015, todos www.dgsi.pt.
[3] Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas, 2016, pág. 86-94
[4] CPC Anotado, Vol II, pág. 381/382António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa
[5] Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª ed. -307
[6] Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 304
[7] Direito Processual Civil, A.A.F.D.L, 1980, III vol. pág. 276
[8] Estudos sobre o Novo Processo Civil, pág. 578
[9] Ac RP de Proc. Nº 1320/14.2TMPRT.P1, www.dgsi.pt
[10] Processos Especiais, Vol. I, Pág. 168-171.