PERSI
EXCEPÇÃO DILATÓRIA INOMINADA
PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
ADEQUAÇÃO E PROPORCIONALIDADE
Sumário

1. A falta de integração obrigatória do cliente bancário no PERSI, quando reunidos os pressupostos para o efeito, constitui impedimento legal a que a instituição de crédito, credora mutuante, intente acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito.
2. Este incumprimento do regime legal traduz-se numa falta de condição objectiva de procedibilidade que é enquadrada, com as necessárias adaptações, no regime jurídico das excepções dilatórias e que conduz à absolvição da instância.
3. O juiz deve rejeitar oficiosamente a execução, quando se aperceba da existência de uma situação susceptível de fundar o indeferimento liminar. Este controlo judicial pode ter lugar, até ao “primeiro acto de transmissão de bens penhorados”. Se concluir pela existência de um vício abrangido pela previsão a execução deve ser rejeitada e declarada extinta.
4. O princípio da confiança é um conceito jurídico que baseia a expectativa de que as outras pessoas (ou o Estado) agirão de forma previsível, dentro dos limites da normalidade ou do razoável.
5. O fair process é um princípio base da sã convivência social, da transparência e da ética nas relações, relativamente às quais os tribunais e as partes se encontram vinculados.
6. Se a parte deposita num “acto do juiz, que lhe foi notificado, e em função do qual definiu a sua actuação processual” essa expectativa tem de ser tutelada, sob pena de infracção de princípios processuais tão relevantes como o da confiança, da boa fé ou da cooperação.
7. A aliança entre os princípios da confiança e da boa-fé pode ter um efeito correctivo de normas cuja aplicação no caso concreto atentem contra vectores fundamentais do sistema jurídico.
8. Em sede de finalização de uma transmissão judicial de bens, não havendo qualquer pronuncia em sentido contrário e existindo uma prévia expressa adesão do Tribunal a esse acto aquilo que seria expectável para todos os destinatários é que fosse concretizada a venda ou exercitado o invocado direito de remição.
9. Por violação dos princípios da segurança jurídica, da protecção da confiança legítima e da transparência decisória, conjugados com os princípios da proporcionalidade e da adequação, não obstante a eventual violação da obrigação de comprovação da inserção dos executados no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), numa situação em que a execução se iniciou há 11 anos, num momento em que a entidade bancária – primitiva exequente – ou o credor cessionário já não estavam vinculados a conservar os processos individuais e a fornecer assim as cartas de integração nesse procedimento, quando as partes já haviam concordado expressamente com o valor da venda e com o exercício do direito de remição e o Tribunal tinha já adiantado ser esse o sentido da sua decisão, não é razoável que, o julgador ignorando todo o precedente itinerário processual, venha a declarar verificada excepção dilatória inominada por falta de cumprimento do PERSI relativamente aos executados. Nesta situação a confiança e a lealdade impõem-se, enquanto garantes da noção de equidade e, como tal, deve ser “repristinada” a decisão tomada a 24/05/2023, prosseguindo os autos com a conclusão da venda ou do exercício do direito de remição.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Processo n.º 311/14.8TBCTX.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo de Execução do Entroncamento – J3
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
Na presente execução para pagamento de quantia certa intentada por “Banco (…), SA” contra (…) e outros, a credora cessionária não se conformou com o teor do despacho que declarou a excepção dilatória inominada por falta de cumprimento do PERSI relativamente aos executados, absolvendo-os da instância, determinando a extinção da execução.
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A execução deu entrada em 14/03/2014 e destinava-se ao pagamento do empréstimo garantido por hipoteca sobre a nua propriedade do prédio descrito sob o n.º 8 da freguesia de (…), na Conservatória do Registo Predial de Cartaxo, inscrito na matriz predial sob o artigo (…), devidamente registada na Conservatória pela inscrição Ap. (…), de (…).
Apesar de interpelados para proceder ao pagamento das quantias a que se tinham obrigado, os Executados não o fizeram, encontrando-se, à data da entrada da petição inicial, em dívida o capital de € 157.795,88, acrescido de juros remuneratórios e moratórios no total de € 184.171,18.
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Citados, os executados não apresentaram oposição.
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A sociedade “(…), S.A.R.L.” foi habilitada como cessionária.
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A execução foi sustada por existir penhora anterior num processo de execução fiscal.
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A interessada … adquiriu o direito de usufruto do imóvel hipotecado e penhorado nos autos de execução fiscal.
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Após a adjudicação do usufruto no processo de execução fiscal, a presente acção retomou a venda da nua propriedade do imóvel.
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A nua propriedade imóvel foi colocada em venda na plataforma e-leilões.
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O imóvel foi, por diversas vezes, a leilão sem nunca ter obtido propostas satisfatórias.
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Após algumas tentativas frustradas, foi finalmente obtida uma proposta para compra no imóvel no valor de € 72.000,00.
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Por a proposta apresentada ser de valor mais baixo do que aquele que foi fixado para venda, foram as partes notificadas para se pronunciarem, nos termos do n.º 3 do artigo 821.º do Código de Processo Civil.
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Exequente e executados concordaram com a referida proposta.
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(…) é filha do executado (…) e neta dos executados (…) e (…) e usufrutuária do bem imóvel penhorado nestes autos.
Em 19/01/2022, a referida (…) informou que pretendia exercer o direito de remição sobre o bem penhorado.
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Não foi apresentada qualquer oposição ao exercício do direito remição.
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A Agente de Execução aceitou a proposta e, em 24/05/2023, o Tribunal despachou que se desse contraditório às partes, consignando «expressamente que, em caso de falta de resposta, será aceite a adjudicação ou venda pelo valor proposto».
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Em 04/04/2024, o Tribunal a quo notificou a agente de execução para, em 10 dias, informar «quanto a vendas/adjudicações realizadas, e quantias penhoradas que já tenham sido entregues ao exequente em pagamento, esclarecendo a que executados tais pagamentos, vendas/adjudicações respeitam».
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Em 05/04/2024, a agente de execução veio informar que não efectuou qualquer venda, nem entregou quaisquer quantias ao exequente.
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A 15/05/2024, o Tribunal a quo ordenou a notificação da exequente para, em 10 dias, «esclarecer se os títulos executivos se referem aos seguintes contratos de crédito com clientes bancários e/ou respetivos fiadores:
(…)
Nessa eventualidade, a exequente deverá juntar aos autos o respetivo PERSI no prazo de 10 dias, bem como juntar aos autos os documentos comprovativos do envio das referidas cartas do PERSI, designadamente registos postais (e/ou comprovativo do registo no site dos CTT), e/ou avisos de receção, bem como ainda os contratos subjacentes.
Notifique a exequente para, em 10 dias, esclarecer/identificar qual o número concreto das operações/créditos exequendos nas cartas de PERSI, já que aos créditos objeto de execução corresponderá um número concreto (refletido nos contratos e escritos de PERSI).
Suspende-se a venda (designadamente quanto à aceitação de propostas, exercício de preferência e/ou remição, e/ou emissão de título de transmissão), e/ou quaisquer atos de transmissão, e/ou pagamentos, à exequente, até demonstração pela exequente do PERSI, nos termos ordenados.
Notifique o AE».
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A credora habilitada veio informar que o DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, é posterior ao incumprimento dos executados, sustentando que o PERSI não se aplica ao presente processo.
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Os executados (…), (…) e (…) vieram defender que ocorria uma excepção dilatória insuprível, que determinava a extinção da instância executiva.
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Em 14/10/2024, o Tribunal a quo notificou a exequente para vir juntar cópia das cartas de denúncia/resolução dos contratos em causa.
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A exequente pronunciou-se dizendo que «segundo o n.º 2 do artigo 11.º-C (PARI) “As instituições de crédito devem conservar os processos individuais durante os cinco anos subsequentes ao termo da adoção dos procedimentos do PARI”. Pelo que passados 10 anos, o m/constituinte já não dispõe das cartas de resolução remetidas aos executados». Em função disso, pugna pelo indeferimento do pedido de absolvição da instância por si apresentado.
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Em 27/11/2024, o Tribunal a quo determinou a notificação dos executados para juntarem os elementos em causa.
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Os executados (…), (…) e (…) vieram informar que não tinham «em seu poder tais documentos, por nunca terem recebido tais cartas».
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Em 19/02/2025, o Juízo de Execução proferiu o seguinte despacho: «Face ao requerimento que antecede, insista junto do exequente pelos elementos solicitados e em falta, sob pena, em caso de silêncio, se considerar verificada a excepção de falta de cumprimento do PERSI».
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A sociedade exequente veio informar que a «carta de resolução foi junta com o requerimento executivo».
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Exercido o contraditório, os executados vieram afirmar que «tendo a resolução do contrato ocorrido em 26.07.2013, conforme decorre da carta junta com o requerimento executivo, deveriam ter sido automaticamente integrados no PERSI».
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Em 13/05/2025, na sua parte mais relevante, o Tribunal a quo proferiu a seguinte decisão:
«(…) O Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, veio instituir o Plano de Acção para o Risco de Incumprimento (PARI) e regulamentar o PERSI como uma forma de promover a concessão responsável de crédito pelas instituições financeiras.
(…)
O referido DL entrou em vigor em 01 de Julho de 2013, nos termos do disposto no artigo 40.º deste diploma.
Ora, como o exequente assume, o contrato foi resolvido a 26 de Julho de 2013, numa altura em que já era aplicável o PERSI.
Posto isto, a lei exige que a integração dos executados no PERSI e a extinção deste sejam devidamente comunicadas aos executados.
Na situação em apreço, o exequente não juntou as cartas do PERSI.
Assim sendo, é forçoso concluir que o exequente/embargado não evidenciou, conforme lhe competia, o cumprimento do PERSI relativamente ao executado, designadamente a extinção do PERSI, sendo que este procedimento, configurando uma condição objectiva de procedibilidade da acção executiva, conduz à procedência de excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do mérito da causa e conduz à absolvição da instância de todos os executados, tudo conforme resulta da conjugação das disposições legais contidas nos artigos 18.º, n.º 1, alínea b) e 21.º do Decreto-lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro e artigos 576.º, n.º 1 e 2, 577.º, 578.º e 573.º, n.º 2, parte final, do Código de Processo Civil.
Pelo exposto, e decidindo: Face ao exposto, declara-se evidenciada a excepção dilatória inominada por falta de cumprimento do PERSI relativamente aos executados, e, subsequentemente, absolve-se os mesmos da instância, determinando a extinção da execução com o consequente levantamento, após trânsito, de quaisquer penhoras realizadas no processo de execução (artigo 732.º, n.º 4, do Código de Processo Civil)».
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A recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações de recurso apresentavam as seguintes conclusões:
«a) A presente ação executiva deu entrada no dia 19/03/2014, contra o executado (…) e (…) e seus filhos, (…) e (…).
b) Os executados foram citados ainda em 2014, e não apresentaram qualquer oposição.
c) Num dos processos de Execução fiscal, com penhora anterior ao presente processo, a sra. (…), filha e neta dos executados, comprou o direito de usufruto do imóvel hipotecado e penhorado nos presentes autos.
d) Após a adjudicação do usufruto no PEF, a presente ação retomou a venda da nua propriedade do imóvel.
e) No decorrer da presente ação foram encetados vários contactos entre as partes para tentativa de acordo, o que demonstra que a ora recorrente sempre se mostrou disponível para negociar o pagamento da dívida com os executados, sendo este o principal objetivo da inserção no PERSI, a negociação da dívida.
f) Não obstante, a nua propriedade imóvel foi colocada em venda na plataforma e-leilões, após a ausência de resposta dos Executados aos contactos da exequente.
g) O imóvel foi por diversas vezes a leilão sem nunca ter obtido propostas satisfatórias, dada a limitação de venda da nua propriedade.
h) Após algumas tentativas frustradas, foi finalmente obtida uma proposta para compra no imóvel no valor de € 72.000,00.
i) Proposta essa que os executados vieram prontamente aceitar, tal como o ora recorrente.
j) Pelo que se entende que a proposta era do agrado de todas as partes envolvidas, dado que permitia que o imóvel continuasse na família, e reunisse na mesma pessoa a nua propriedade e o usufruto.
k) Assim veio a Agente de Execução tomar a decisão de venda no dia 15-05-2023.
l) Após a aceitação da proposta, o tribunal despachou que se desse contraditório às partes, estranhamento, uma vez que as partes já se tinham pronunciado, e consignou-se expressamente que, em caso de falta de resposta, será aceite a adjudicação ou venda pelo valor proposto.
m) Pelo que as partes nunca poderiam prever não ser esse o desfecho.
n) Ora é neste momento que os autos tomam um caminho inesperado que configura uma decisão surpresa.
o) Sublinhe-se que o Tribunal age sem qualquer requerimento dos Executados.
p) O Tribunal decide suspender a venda, num despacho – ref.ª 96445918 – em que convida a exequente a esclarecer mais detalhes sobre o título executivo e que termina com a seguinte frase – “Suspende-se a venda (designadamente quanto à aceitação de propostas, exercício de preferência e/ou remição, e/ou emissão de título de transmissão), e/ou quaisquer atos de transmissão, e/ou pagamentos, à exequente, até demonstração pela exequente do PERSI, nos termos ordenados”.
q) E inicia-se desta forma a perseguição do Tribunal com a matéria do PERSI.
r) O que deixou o ora recorrente perplexo, uma vez que, mais de 10 anos depois do início do processo, finalmente o mesmo teria um fim em vista, com uma solução que não implicava a perda do imóvel pela família e que era desejada por todas as partes que se manifestaram a favor.
s) A douta sentença violou flagrantemente o princípio dispositivo. O Tribunal excedeu os seus poderes ao conhecer de uma exceção que não foi arguida pelas partes a quem cabia fazê-lo e cuja arguição não é de v) Se o PERSI fosse aplicado, os Executados seriam, em teoria, compelidos a negociar o pagamento do valor total em dívida, que é substancialmente superior ao valor da remissão acordada.
t) Com efeito, no decurso da presente ação executiva, os Executados apresentaram uma proposta de remissão de bens, a qual foi aceite pelo ora Recorrente. Esta proposta de remissão configura uma redução muito significativa do valor em dívida, permitindo, ademais, que o imóvel não seja vendido a terceiros em sede de execução e que permaneça na propriedade dos próprios Executados.
u) Ora, se a execução prosseguisse e fosse concretizada a remissão nos termos acordados, os Executados ficariam numa situação manifestamente mais favorável do que aquela que resultaria de um eventual cumprimento do PERSI.
v) Se o PERSI fosse aplicado, os Executados seriam, em teoria, compelidos a negociar o pagamento do valor total em dívida, que é substancialmente superior ao valor da remissão acordada.
w) A decisão do douto Juiz a quo, ao extinguir a ação para que se cumpra o PERSI, mostra-se assim manifestamente desproporcional e contraproducente para os executados, os quais se beneficiariam mais da solução já negociada e aceite nos autos.
x) A atuação judicial, neste contexto, configura um excesso de pronúncia sobre uma questão não invocada, em prejuízo do princípio da estabilidade da lide, da autonomia das partes na condução do processo e, em última análise, do interesse dos próprios Executados na solução menos gravosa já alcançada.
y) Conclui-se, assim, que a douta sentença padece de nulidade por violação do princípio dispositivo, excesso de poderes do Juiz a quo, e por ter adotado uma solução que, prejudica todas as partes envolvidas – Exequente e Executados devendo ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento da execução para concretização da remissão de bens já acordada.
z) E mais, vem ainda configurar uma decisão surpresa.
aa) A sua atuação violou a confiança das partes na coerência e previsibilidade processual e, ironicamente, resultou num desfecho menos favorável aos próprios executados, que o Tribunal alegadamente visava proteger.
bb) Foi num momento em que o processo se encontrava maduro para a decisão de venda e remição, após um percurso longo e consensualizado, que o Tribunal, por sua própria iniciativa e sem qualquer alteração substancial dos pressupostos processuais ou factuais por parte dos Executados, introduziu a questão do PERSI como fundamento para a extinção da ação. Verificamos, portanto, uma alteração radical do rumo processual previamente estabelecido e legitimamente esperado, numa fase tão avançada da execução.
cc) A decisão de extinguir a execução, nesta fase, revela-se desproporcional e desnecessária.
dd) Em suma, a decisão de extinção da execução, é uma decisão surpresa por não se coadunar com o rumo previsível do processo, as expetativas legítimas das partes construídas ao longo de anos e o consenso já alcançado. Esta abrupta inversão do percurso processual, numa fase tão avançada e decisiva, viola os princípios da tutela da confiança e da boa-fé processual, justificando a sua nulidade e revogação, o que se requer.
Pelo que não assiste razão ao Tribunal a quo uma vez que estamos perante uma decisão surpresa e também perante uma clara violação dos princípios da tutela da confiança e da boa-fé processual. Nestes termos e nos mais de direito, que V. Exa. doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, devendo ser revogado a douta sentença de que se recorre (…)».
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Não houve lugar a resposta.
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Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre decidir.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento universal que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da interpretação do Tribunal recorrido quanto à possibilidade de verificação do incumprimento formal da extinção do Persi, na vertente da existência de uma decisão surpresa e na dimensão se o decidido viola o princípio da confiança.
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III – Matéria de facto:
A matéria de facto com interesse para a justa resolução da causa está referida no relatório inicial, aqui se dando por integralmente reproduzida.
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IV – Fundamentação:
3.1 – Do enquadramento jurídico da questão e da (in)existência de uma decisão surpresa:
O Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, veio instituir o Plano de Acção para o Risco de Incumprimento (PARI) e regulamentar o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) como uma forma de promover a concessão responsável de crédito pelas instituições financeiras.
A integração de cliente bancário no PERSI é obrigatória, quando verificados os seus pressupostos e a acção judicial destinada a satisfazer o crédito só poderá ser intentada pela instituição de crédito contra o cliente bancário, devedor mutuário, após a extinção do PERSI , conforme decorre do disposto no artigo 18.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 227/2012.
A omissão da informação ou a falta de integração do devedor no PERSI, pela instituição de crédito, constituí violação de normas de carácter imperativo, que configuram, também, excepções dilatórias atípicas ou inominadas, por falta de pressuposto (antecedente) da instauração da acção.
O regime em discussão entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2013, face ao consignado no artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro.
A decisão do Juízo de Execução do Entroncamento julgou verificada a excepção dilatória inominada por falta de cumprimento do PERSI relativamente aos executados, declarando extinta a execução.
A credora habilitada veio sustentar que o despacho de extinção da execução é uma decisão surpresa por não se coadunar com o rumo previsível do processo.
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A doutrina [1] [2] [3] [4] [5] [6] [7] [8] [9] [10] [11] [12] [13] [14] e jurisprudência nacionais[15] associam as decisões surpresa ao princípio do contraditório, que surge como decorrência do princípio do processo equitativo consagrado no n.º 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa e que impõe que o julgador permita às partes que se pronunciem sobre os fundamentos de facto e de direito de uma determinada pretensão.
Na leitura de Lebre de Freitas e Isabel Alexandre o princípio do contraditório «é hoje entendido como corolário duma concepção mais geral da contraditoriedade, como garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação, directa ou indirecta, com o objecto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão»[16].
Abrantes Geraldes (et alii) defende que repugnam ao nosso sistema processual civil decisões tomadas à revelia de algum dos interessados[17] e o princípio do contraditório actua como instrumento destinado a evitar decisões surpresa.
Como projecção do princípio do contraditório e da igualdade das partes precipitado nos artigos 3.º[18] e 4.º[19] do Código de Processo Civil, não se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida.
Neste enquadramento, uma decisão-surpresa é um vício que afecta a própria decisão, tornando-a nula nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, na medida em que através dela o tribunal pronuncia-se sobre algo de que não podia conhecer antes de ouvir as partes interessadas sobre a matéria[20].
Tratam-se, assim, de pronúncias insólitas ou imprevisíveis em que é afastado o exercício do contraditório prévio e onde as partes, agindo com a diligência devida, não podiam prever e antecipar a decisão do juiz. Nesta ordem de ideias, «só há decisão-surpresa se o juiz, de forma absolutamente inopinada e sem alicerce na matéria factual ou jurídica, enveredar por uma solução que os sujeitos processuais não tinham a obrigação de prever»[21].
Na situação vertente, apesar de uma inflexão no sentido decisório, as partes foram confrontadas com os despachos proferidos a 15/05/2024 (esclarecimento se os títulos estavam abrangidos pela obrigação PERSI), 14/10/2024 (notificação para junção de cópia das cartas de denúncia/resolução dos contratos em causa), 27/11/2024 (notificação dos executados para juntarem os elementos em causa) e 19/02/2025 (insistência junto do exequente pelos elementos solicitados e em falta, sob pena, em caso de silêncio, se considerar verificada a excepção de falta de cumprimento do PERSI). E, assim, não se pode considerar que a solução jurídica aplicada na decisão recorrida (datada de 13/05/2025) não foi participada e que a mesma face ao quadro legal vigente constituía uma decisão imprevisível.
Questão diversa é a de apurar se, face à inflexão processual sucedida em 15/05/2024, ocorre uma violação do princípio da confiança e da boa-fé processual relacionada com a suposição que as partes possam ter concebido quanto ao destino final do pleito.
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3.2 – Da violação do princípio da confiança e da boa-fé processual:
A falta de integração obrigatória do cliente bancário no PERSI, quando reunidos os pressupostos para o efeito, constitui impedimento legal a que a instituição de crédito, credora mutuante, intente acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito.
Este incumprimento do regime legal traduz-se numa falta de condição objectiva de procedibilidade que é enquadrada, com as necessárias adaptações, no regime jurídico das excepções dilatórias e que conduz à absolvição da instância. Esta é a solução que está consolidada na jurisprudência nacional e que vem sendo afirmada por nós desde a prolação de acórdão datado de 06/10/2016[22].
A recorrente começa por contestar a natureza oficiosa da pronúncia quando afirma [conclusão o)] que o Tribunal agiu sem qualquer requerimento dos executados. Porém, este argumento esbarra na letra do artigo 734.º do Código de Processo Civil[23].
Efectivamente, o juiz deve rejeitar oficiosamente a execução, quando se aperceba da existência de uma situação susceptível de «fundar o indeferimento liminar»[24]. Este controlo judicial pode ter lugar, até ao “primeiro acto de transmissão de bens penhorados”[25]. Se concluir pela existência de um vício abrangido pela previsão a execução deve ser rejeitada e declarada extinta.
Na síntese de Abrantes Geraldes essa intervenção está legitimada quando «os mesmos motivos que deveriam ter determinado o indeferimento liminar do requerimento executivo (art. 726.º[26]) servem para provocar a rejeição da execução, com efeitos na sua extinção total ou parcial»[27].
Todavia, aquilo que é relevante neste caso é outra realidade – a do princípio da confiança.
Vejamos.
O princípio da confiança é um conceito jurídico que baseia a expectativa de que as outras pessoas (ou o Estado) agirão de forma previsível, dentro dos limites da normalidade ou do razoável.
A determinado momento processual, após a frustração sucessiva de actos de venda, surgiu uma proposta de aquisição do bem penhorado. E exequente e executados acordaram na negociação pelo preço oferecido e uma familiar dos executados pretendeu exercer o direito de remição, algo que também teve a anuência de todos os sujeitos processuais.
Nesse desenvolvimento, a Agente de Execução aceitou a proposta e, em 24/05/2023, embora já tivesse sido transmitido aos autos que existia essa concertação de posições, o Tribunal concedeu de novo às partes o exercício do contraditório, consignando expressamente que «em caso de falta de resposta, será aceite a adjudicação ou venda pelo valor proposto».
Não havendo qualquer pronúncia em sentido contrário, aquilo que era expectável para todos os destinatários é que fosse concretizada a venda pelo preço proposto ou exercitado o direito do remição nos termos previstos para a realização da venda.
Sucede que, após uma insistência do credor para que fosse concluída a transmissão do bem, decorrido cerca de um ano, o Tribunal a quo – embora por Juiz distinto – mudou o enquadramento expectável do processo e centrou a sua atenção na questão da prova no cumprimento do PERSI.
Não obstante a eventual violação da obrigação de comprovação da inserção dos executados no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), estamos perante um caso em que aquilo que seria mais razoável seria a de autorizar a venda nos termos propostos, hipótese que pacificaria e colocaria termo ao litígio, ao invés de se iniciar de novo todo o procedimento executivo, cerca de 11 anos após o início da execução. Aliás, estávamos num momento em que a entidade bancária – primitiva exequente – ou o credor cessionário já não estavam vinculados a conservar os processos individuais, tal como decorre da obrigação impressa nos artigos 11.º-C[28] e 20.º[29] do DL n.º 227/2012, de 25 de Outubro, o que, em abstracto, poderia constituir um obstáculo intransponível à prova do envio da comunicação de integração no PERSI.
As partes já tinham exercido o seu direito ao contraditório, concordando expressamente com o valor da venda e o Tribunal tinha já adiantado o sentido da sua decisão, sendo expectável que ou através da venda ou da remição fosse depositado o valor de € 72.000,00.
Nestes termos, excepcionalmente, temos aqui de seguir a linha de pensamento e de orientação presente no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência de 31/03/2009, depois reproduzida no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/05/2013.
Estamos perante um caso em que a confiança que a parte deposita num “acto do juiz, que lhe foi notificado, e em função do qual definiu a sua actuação processual” tem de ser tutelada, sob pena de infracção de princípios processuais tão relevantes como o da boa fé ou da cooperação[30].
Olhando para outro acórdão de fixação de jurisprudência, a lealdade, a boa fé, a confiança, o equilíbrio entre o rigor das decisões do processo e as expectativas que delas decorram são elementos fundamentais a ter em conta quando seja necessário interpretar alguma sequência que, nas aparências, possa exteriormente apresentar-se com algum carácter de disfunção intraprocessual[31].
Tal também é evidenciado pelo Tribunal Constitucional[32] que assinala que o fair process é o princípio base da sã convivência social, da transparência e da ética nas relações, relativamente às quais os tribunais e os seus «operadores» – quiçá por maioria de razão – de modo algum se podem considerar como meros espectadores.
Nesta dimensão, também o artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem implica o reconhecimento, a título de garantias não explicitas, de um princípio geral de lealdade processual que constitui fundamento de um processo justo.
Um dos corolários do principio da boa-fé consiste no principio da protecção da confiança legítima. Nesta sede, os Tribunais terão sempre de valorar as condicionantes que se tenham produzido e que sejam suficientemente concludentes para um destinatário normal e onde seja razoável ancorar a invocada confiança.
A decisão de 24/03/2023 criou a convicção legítima de que as coisas se passariam de determinado modo e a inflexão processual ocorrida é, casuisticamente, atentatória da ideia de justiça e do princípio da boa-fé. Neste parâmetro, note-se que, de acordo com o comentário de Lebre de Freitas[33], neste caso, a prevalência da confiança e da boa fé sobre o rigor formal impõe-se. Assim, ainda que haja uma norma legal impositiva, como já escrevemos noutro aresto, essa vinculação legal tem de ceder, se a parte deposita confiança num acto do Tribunal e definiu a sua actuação processual com base nessa decisão[34].
Esta aliança entre os princípios da confiança e da boa-fé pode ter um efeito correctivo de normas cuja aplicação no caso concreto atentem contra vectores fundamentais do sistema jurídico e assim, nos seus efeitos limitadores, não existe espaço para, nesta fase do processo, decorridos 11 anos sobre o início do autos, para julgar extinta a execução, quando existia uma solução consensualizada nos autos que era susceptível de satisfazer os interesses de todos os sujeitos processuais e demais envolvidos na causa.
Assim, é à luz do paradigma avançado por Barbas Homem que se impõe a anulação da determinação judicial recorrida. Diz o autor que «a validade de uma noção mínima de injustiça como limite absoluto de validade do direito, mesmo quando se apresenta expressa por outros vocábulos, como arbitrariedade, irrazoabilidade, irracionalidade, desproporcionalidade»[35].
Desta sorte, por violação dos princípios da segurança jurídica, da protecção da confiança legítima e da transparência decisória, conjugados com os princípios da proporcionalidade e da adequação, nesta situação a lealdade deve prevalecer, enquanto garante da noção de equidade. Consequentemente, de forma excepcional, tal implica a “repristinação” da decisão tomada a 24/05/2023, prosseguindo os autos com a conclusão da venda ou do exercício do direito de remição.
Julga-se, assim, procedente o recurso apresentado, revogando-se a decisão recorrida.
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V – Sumário: (…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida.
Tributação a cargo dos executados, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil, por com a sua conduta posterior terem dado causa ao presente recurso.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 27/11/2025
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Maria Isabel Calheiros
Mário João Canelas Brás


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[1] Pereira Baptista, reforma do Processo Civil, Princípios Fundamentais, Lex, Lisboa, 1997, págs. 37-38.
[2] Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2004, pág. 33.
[3] António Pais de Sousa e Cardona Ferreira, Processo Civil, Rei dos Livros, Porto, 1997, pág. 169.
[4] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2014, pág. 32.
[5] José Lebre de Freitas, “Em torno da revisão do direito processual civil”, Revista da Ordem dos Advogados, 1995, Vol. I, pág. 10.
[6] José Lebre de Freitas, Direito Civil e Processo Civil, Vol. I, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2010, págs. 17-29.
[7] José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e princípios gerais à luz do novo código, 3.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2013, págs. 124/125.
[8] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil, Anotado, Vol. I, 3.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2014.
[9] José Lebre de Freitas, O novo processo civil à Luz da convenção europeia dos direitos do Homem e da constituição da república portuguesa, Balanço do Novo Processo Civil, CEJ, Lisboa, 2017.
[10] Isabel Alexandre, Provas ilícitas em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 1998.
[11] Miguel Teixeira de Sousa, Apreciação de alguns aspectos da «revisão do processo civil — projecto”, Revista da Ordem dos Advogados, 1995, ano 55, Vol. II, pág. 354.
[12] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2.ª ed., Lex, Lisboa, 1997, pág. 60 e seguintes.
[13] Miguel Teixeira de Sousa, Poderes do juiz no processo do trabalho: algumas notas On the powers of the court in labor proceedings: some remarques, Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Homenagem ao Professor José de Oliveira Ascensão, Ano LXIV 2023, número 1, tomo III, págs. 1689-1702.
[14] Luís Correia de Mendonça, O Contraditório e a proibição das decisões-surpresa, in https://portal.oa.pt.
[15] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12/07/2018, 08/09/2020, 12/01/2021, 14/01/2021, 01/07/2021, 14/09/2021, 27/10/2021, divulgados em www.dgsi.pt.
[16] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 7.
[17] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado – Vol. I (Parte Geral e Processos de Declaração), 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2023, pág. 21
[18] Artigo 3.º (Necessidade do pedido e da contradição):
1 - O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
2 - Só nos casos excecionais previstos na lei se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida.
3 - O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
4 - Às exceções deduzidas no último articulado admissível pode a parte contrária responder na audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final.
[19] Artigo 4.º (Igualdade das partes):
O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.
[20] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 20/04/2023, visitável em www.dgsi.pt.
[21] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12/01/2021, proc. 3325/17.2T8LSB.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[22] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 06/10/2016, publicitado em www.dgsi.pt.
[23] Artigo 734.º (Rejeição e aperfeiçoamento):
1 - O juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo.
2 - Rejeitada a execução ou não sendo o vício suprido ou a falta corrigida, a execução extingue-se, no todo ou em parte.
[24] José Lebre de Freitas, Armando Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 484.
[25] Rui Pinto, A Ação Executiva, AAFDL, Lisboa, 2018, pág. 356.
[26] Artigo 726.º (Despacho liminar e citação do executado):
1 - O processo é concluso ao juiz para despacho liminar.
2 - O juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando:
a) Seja manifesta a falta ou insuficiência do título;
b) Ocorram exceções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso;
c) Fundando-se a execução em título negocial, seja manifesta, face aos elementos constantes dos autos, a inexistência de factos constitutivos ou a existência de factos impeditivos ou extintivos da obrigação exequenda de conhecimento oficioso;
d) Tratando-se de execução baseada em decisão arbitral, o litígio não pudesse ser cometido à decisão por árbitros, quer por estar submetido, por lei especial, exclusivamente, a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, quer por o direito controvertido não ter caráter patrimonial e não poder ser objeto de transação.
3 - É admitido o indeferimento parcial, designadamente quanto à parte do pedido que exceda os limites constantes do título executivo ou aos sujeitos que careçam de legitimidade para figurar como exequentes ou executados.
4 - Fora dos casos previstos no n.º 2, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º.
5 - Não sendo o vício suprido ou a falta corrigida dentro do prazo marcado, é indeferido o requerimento executivo.
6 - Quando o processo deva prosseguir, o juiz profere despacho de citação do executado para, no prazo de 20 dias, pagar ou opor-se à execução.
7 - Se o exequente tiver alegado no requerimento executivo a comunicabilidade da dívida constante de título diverso de sentença, o juiz profere despacho de citação do cônjuge do executado para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 741.º.
8 - Quando deva ter lugar a citação do executado, a secretaria remete ao agente de execução, por via eletrónica, o requerimento executivo e os documentos que o acompanhem, notificando aquele de que deve proceder à citação.
[27] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol. II – Processo de Execução, Processos Especiais e Processo de Inventário Judicial, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 100.
[28] Artigo 11.º-C (Processos individuais):
1 - As instituições de crédito devem criar, em suporte duradouro, processos individuais para os clientes bancários abrangidos pelos procedimentos previstos no PARI, os quais devem conter todos os elementos relevantes, nomeadamente as comunicações entre as partes, o relatório de avaliação da capacidade financeira desses clientes e, quando aplicável, as propostas apresentadas aos mesmos, bem como o registo das razões que conduziram à não apresentação de propostas, e ainda a avaliação relativa à eficácia das soluções acordadas.
2 - As instituições de crédito devem conservar os processos individuais durante os cinco anos subsequentes ao termo da adoção dos procedimentos do PARI.
[29] Artigo 20.º (Processos individuais):
1 - As instituições de crédito devem criar, em suporte duradouro, processos individuais para os clientes bancários abrangidos pelos procedimentos previstos no PERSI, os quais devem conter todos os elementos relevantes, nomeadamente as comunicações entre as partes, o relatório de avaliação da capacidade financeira desses clientes e, quando aplicável, as propostas apresentadas aos mesmos, bem como o registo das razões que conduziram à não apresentação de propostas, e ainda a avaliação relativa à eficácia das soluções acordadas.
2 - As instituições de crédito devem conservar os processos individuais durante os cinco anos subsequentes ao termo da adoção dos procedimentos do PERSI.
[30] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08/05/2013, consultável em www.dgsi.pt.
[31] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/2011, de 27/01/2011.
[32] Segundo o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 36/04, de 14 de Janeiro, in Diário da República, 2.ª série, n.º 43, de 20 de Fevereiro de 2004.
[33] José Lebre de Freitas, Armando Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, págs. 169-170.
[34] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 23/05/2024, consultável em www.dgsi.pt.
[35] Pedro Barbas Homem, O Justo e o Injusto, AAFDL, Lisboa 2001, pág. 141.