INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
QUESTÕES NOVAS
REJEIÇÃO DE RECURSO
DIREÇÃO DO INQUÉRITO
JUIZ PRESIDENTE DO JULGAMENTO
ACUSAÇÃO
CONSTITUCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
NULIDADE
ESCUTAS TELEFÓNICAS
FORMALIDADES DAS OPERAÇÕES
FACTOS
EXAME CRÍTICO DAS PROVAS
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
PERDÃO DA PENA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
CONTRADIÇÃO
ACAREAÇÃO
COAÇÃO AGRAVADA
DECLARAÇÕES DO ARGUIDO
CÓDIGO DA ESTRADA
MEDIDA DA PENA
PENA DE MULTA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
CONDIÇÕES
CUSTAS
Sumário

Sumário:
I. O requerimento de interposição de um recurso em processo penal deve conter a motivação (cfr. art.º 411.º, n.º 3, do C.P.P.), onde se enunciam especificadamente os fundamentos do recurso, as razões ou motivos que alicerçam e servem de esteio ao recurso, legitimando ou justificando o pedido formulado, e deve terminar com a formulação de conclusões deduzidas por artigos, e nas quais o recorrente resume as razões do pedido, sendo pois um resumo do que se explanou, permitindo uma imediata e fácil apreensão do âmbito do recurso e os seus fundamentos e, assim, das questões a decidir (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.);
II. Deste modo, as conclusões de um recurso não podem ser mais abrangentes que a própria motivação, pelo que o que não consta da motivação não pode constar das conclusões;
III. Os recursos são meios a usar para obter a reapreciação de uma decisão, mas não para obter decisões de questões novas, isto é, que não tenham sido suscitadas pelos sujeitos processuais perante o tribunal recorrido;
IV. Nada impede que a rejeição de um recurso (cfr. art.º 417.º, n.º 6, al. b), do C.P.P.) seja parcial e decidida, em primeira mão, em conferência;
V. Só é devida a importância sancionatória a que alude o disposto no art.º 420.º, n.º 3, do C.P.P. quando a rejeição do recurso seja total;
VI. Não é inconstitucional a norma constante do art.º 263.º, n.º 1, do C.P.P., de acordo com a qual “a direção do inquérito cabe ao Ministério Público, assistido pelos órgãos de polícia criminal”, por violação do art.º 32.º, n.º 4, da C.R.P.;
VII. Não é inconstitucional a norma constante do art.º 311.º do C.P.P. ao permitir ao juiz presidente do tribunal de julgamento um contacto prévio com a versão acusatória, por violação dos arts. 8.º e 32.º, n.ºs 2 e 5, da C.R.P. e 6.º, n.º 1, da C.E.D.H.;
VIII. Se é certo que todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da decisão condenatória (cfr. art.º 32.º, n.º 2, da C.R.P.), a imparcialidade pessoal do juiz também se presume até prova em contrário, cabendo ao sujeito processual com legitimidade para requerer a recusa daquele demonstrar, através de elementos concretos, a falta de imparcialidade pessoal do juiz;
IX. A expressão “nulidade” usada no art.º 190.º do C.P.P. para sancionar a inobservância dos requisitos e condições referidos nos arts. 187.º, 188.º e 189.º, do C.P.P., não abrange apenas as proibições de prova cuja consequência é a impossibilidade de utilização de prova;
X. Os prazos estabelecidos no art.º 188.º, n.ºs 3 e 4, do C.P.P. são regras procedimentais ou instrumentais, visando acautelar uma limitação constitucionalmente admissível, tolerável, não abusiva, nas comunicações e privacidade, pelo que a sua mera ultrapassagem, por si só, consubstancia uma nulidade dependente de arguição até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito (cfr. art.º 120.º, n.º 3, al. c), do C.P.P.);
XI. A falta de factos provados e da indicação e exame crítico das provas, a verificar-se, consubstancia a nulidade prevista no art.º 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P. e não a al. c), do n.º 1, do mesmo preceito legal;
XII. Fora da obrigação de enumeração dos factos provados e não provados decorrente do art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P. ficam as considerações meramente conclusivas ou conceitos de direito e todos aqueles factos que são inócuos, acessórios e/ou irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido, e bem assim aqueles que se mostram prejudicados com a solução dada a outros, por apenas os contrariarem, ou seja, representarem mera infirmação ou negação, de outros já constantes do elenco dos factos provados ou não provados, mesmo que alegados pela acusação e/ou pela defesa;
XIII. A utilização do verbo “dever”, com o sentido de “estar obrigado a”, em vez do verbo “poder”, com o significado de “ter a possibilidade de”, não é anódina, pelo que só verifica a nulidade da decisão condenatória prevista no art.º 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P., na vertente de omissão de pronúncia, quando o tribunal não aprecie e decida de questão que então devesse conhecer, ficando precludido o seu conhecimento em momento posterior, e não quando, embora a pudesse conhecer nesse momento, ainda o possa fazer em momento posterior;
XIV. Apesar de o perdão de penas a que aludem os arts. 2.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, da Lei nº 38-A/2023, de 02-08 se tratar de uma questão e ser até oficioso o seu conhecimento, podendo a sua apreciação ser equacionada tanto no acórdão condenatório como em momento posterior ao trânsito em julgado daquele, tal afasta a verificação da mencionada nulidade;
XV. Na impugnação ampla da matéria de facto a que se refere o art.º 412.º, n.ºs 3, 4 e 6, do C.P.P. a utilização do verbo impor (cfr. art.º 412.º, n.º 3, al. b), do C.P.P.), que aponta para a obrigação de impreterivelmente se aceitar algo, e não do verbo permitir, que admite a existência de várias hipóteses, legitima a conclusão de que não basta estar demonstrada a mera possibilidade de existir uma solução em termos de matéria de facto alternativa à fixada pelo tribunal, o que, aliás, é comum verificar-se, sendo necessário que o recorrente demonstre que a prova produzida no julgamento só poderia ter conduzido, em sede de matéria de facto provada e não provada, à solução por si (recorrente) defendida, e não àquela consignada pelo tribunal recorrido;
XVI. A existência de contradição entre depoimentos não determina, obrigatória e necessariamente, a realização de acareação (cfr. art.º 146.º do C.P.P.) pois para a efetivação de tal meio de prova não basta existir uma contradição nos depoimentos das testemunhas passíveis de serem acareadas, sendo necessário que a diligência se afigure útil à descoberta da verdade, o que não se verifica quando um dos depoimentos passível de ser acareado não merece qualquer credibilidade;
XVII. Sendo o objeto da coação uma omissão, caso o coagido, não obstante possuir capacidade de ação, na sequência do anúncio de um mal futuro sobre a sua integridade física e sobre a sua vida que lhe foi dirigido pelo agente, se abster de agir exatamente conforme pretendido por este, é inequívoco que o crime de coação agravado, p. e p. pelos arts. 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do C.P., cometido se consumou;
XVIII. As declarações elaboradas pelo arguido ao abrigo do art.º 171.º, n.º 3, do Código da Estrada representam um pensamento humano, apto e determinado a constituir um meio de prova, permitindo a identificação do seu suposto emitente (cfr. art.º 255.º, al. a), do C.P.), destinando-se a provar que o titular do documento de identificação do respetivo veículo em causa identificou junto da A.N.S.R., autoridade administrativa competente para o processamento das contraordenações rodoviárias a cujo Presidente, salvo delegação, compete aplicar as coimas e sanções acessórias (cfr. art.º 169.º, n.º 1, als. a) e b), do C.E.), uma outra pessoa como sendo o condutor responsável pela contraordenação respeitante ao exercício da condução daquele, o que tem como efeito imediato a suspensão do processo contraordenacional instaurado contra aquele e a instauração de novo processo contra a pessoa identificada como infratora (cfr. arts. 135.º, n.º 3, als. a) e b), e 171.º, n.ºs 2 a 4, do C.E.), pelo que se verifica o elemento típico do crime de falsificação de documento a alude a al. d), do n.º 1, art.º 256.º do C.P.;
XIX. Embora algumas diferentes declarações se referiram ao mesmo titular do documento de identificação do veículo em causa, mas cada uma delas a distinta contraordenação, não sendo claro que o agente tenha agido no mesmo momento temporal ou em diferentes ocasiões, nem tendo ficado demonstrado que, com a primeira atividade criminosa envolvendo a mesma pessoa, com ela tenha estabelecido uma certa relação ou um acordo que tenha preparado as coisas para a efetiva repetição da atividade criminosa, não poderá estar em causa qualquer crime continuado (cfr. art.º 30.º, n.º 2, do C.P.);
XX. O tribunal de recurso apenas deverá intervir alterando a medida das penas em casos de manifesta desproporcionalidade na sua fixação ou quando os critérios de determinação da pena concreta imponham a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção em face das circunstâncias do caso;
XXI. O limite mínimo do quantitativo diário da pena de multa deverá apenas ser aplicado às pessoas que vivam no mínimo existencial ou abaixo dele (cfr. art.º 47.º, n.º 2, do C.P.);
XXII. O cometimento sucessivo de crimes não obstante a aplicação de diferentes penas não privativas de liberdade, quer a título principal quer de substituição, nomeadamente a suspensão da execução de três penas de prisão aplicadas, quando alguns daqueles foram cometidos no período de diferentes suspensões, tendo uma outra sido revogada por infração, grosseira ou repetida, dos deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social homologado (cfr. art.º 56.º, n.º 1, al. a), do C.P.), é demonstrativo de uma maior indiferença às diferentes penas aplicadas, uma maior insusceptibilidade de ser por elas influenciado, uma reduzida capacidade de colaboração, um descomprometimento com a execução das regras, uma resistência ao seu cumprimento, uma indiferença face ao sistema de justiça e, assim, maiores exigências de socialização que inviabilizam a formulação de prognóstico favorável relativamente ao comportamento futuro do agente de um crime justificativo da não suspensão da execução de nova pena de prisão aplicada (cfr. art.º 50.º do C.P.);
XXIII. O elenco que o C.P. faz dos deveres a que pode ficar condicionada a suspensão da execução de uma pena de prisão e junto de quem devem eles ser cumpridos é meramente exemplificativo (cfr. art.º 51.º, n.º 1, als. a) a c), do C.P.), devendo o estabelecimento daquele e desta ser efetuado de forma adequada a fazer sentir ao condenado a responsabilidade pelo mal cometido e ao mesmo tempo reforçar o sentimento de paz ou conciliação comunitária;
XXIV. Quando o recorrente obtém provimento, apenas em parte, vendo ser eliminada do elenco dos factos provados, conforme pretendia, factualidade genérica concretizada em outros pontos da matéria de facto provada, decaindo no demais, tratando-se, assim, de uma verdadeira “vitória de Pirro”, que não teve qualquer repercussão na qualificação dos crimes por ele cometidos e para a graduação da sua responsabilidade, mantendo-se, quanto a isso, integralmente a decisão da primeira instância, deverá ser responsabilizado, na totalidade, pelas custas do recurso que interpôs (cfr. art.º 513.º, n.º 1, do C.P.P.).

Texto Integral

I. Relatório:
I.1. Da decisão recorrida:
No âmbito do processo comum coletivo n.º 589/15.0TELSB, que corre termos no Juízo Central Criminal de Loures – Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, em 29-11-2024 foi proferido e depositado acórdão pelo qual:
II foi absolvido de todos os crimes que lhe vinham imputados (1 crime de ofensa à integridade física qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 143.º, n.º 1, e 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, do Código Penal (C.P.), por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), do C.P. (autos principais – JJ), 1 crime de extorsão, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 73.º e 223.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – JJ), 1 crime de rapto, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 161.º, n.º 1, al. a), do C.P. (autos principais – JJ), e de 1 crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – JJ);
KK foi absolvido de todos os crimes que lhe vinham imputados (1 crime de exercício ilícito da atividade de segurança privada, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 57.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 34/2013 de 16-05 (51/16.3GATVD) e de 1 crime de denúncia caluniosa, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 365.º, n.ºs1 e 2, do C.P. (51/16.3GATVD);
LL foi absolvido de todos os crimes que lhe vinham imputados (2 crimes de exercício ilícito da atividade de segurança privada, na forma consumada, p.e p. pelo art.º 57.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 34/2013, de 16-05 (autos principais – segurança privada ilícita - II);
MM foi absolvido de todos os crimes que lhe vinham imputados (6 crimes de exercício ilícito da atividade de segurança privada, na forma consumada, p.e p. pelo art.º 57.º, n.ºs 2, 3 e 4, da Lei n.º 34/2013, de 16-05);
NN foi absolvido do crime de detenção de arma proibida, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 3.º, n.2, al. g), e 86.º, n.º 1, al. d), do R.J.A.M., que lhe vinha imputado;
OO e PP foram absolvidas do crime que lhes vinha imputado (um crime de tráfico de armas, p. e p. pelo art.º 87.º, n.º 1, do R.J.A.M.);
QQ foi absolvido do crime de detenção de arma proibida, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 2.º, n.º 1, als. p) e x), e 86.º, n.º 1, al. c), do R.J.A.M., que lhe vinha imputado;
RR foi absolvido do crime de tráfico de armas agravado, p. e p. pelo art.º 87.º, n.ºs 1 e 2, al. a), do R.J.A.M. que lhe vinha imputado;
SS foi absolvida do crime de falsificação de documento, p. e p. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, als. a), b), d) e e), do C.P., que vinha imputado;
TT foi absolvido do crime de falsificação de documento, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, als. a), b), d) e e), do C.P., que lhe vinha imputado;
UU foi absolvido dos crimes que lhe vinham imputados (1 crime de não cumprimento de obrigações relativas à proteção de dados, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 43.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 67/98, de 26-10, entretanto revogado pelo art.º 46.º, n.º 1, da Lei n.º 58/2019, de 08-08 – crime de utilização de dados de forma incompatível com a finalidade da recolha, de 1 crime de violação do dever de sigilo agravado, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 47.º, n.ºs 1 e 2, al. a), da Lei n.º 67/98, de 26-10, entretanto revogada pelo art.º 41.º, n.ºs 1 e 2, al. a), da Lei n.º 58/2019, de 08-08, e de 1 crime de falsificação de documento, como autor imediato e na forma consumada, p. e p. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, als. a), b), d) e e), do C.P.);
VV foi absolvido do crime de falsificação de documento, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, als. a), b), d) e e), do C.P., que lhe vinha imputado;
WW foi absolvido do crime de corrupção ativa para ato ilícito, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 374.º, n.º 1, do C.P., que lhe vinha imputado;
AA viu ser homologada a desistência da queixa apresentada e referente ao crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do C.P. para que foi convolado o crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a) e 2, do C.P., por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), do C.P. (XX), cuja prática lhe vinha imputada, foi absolvido da prática de 1 crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 143.º, n.º 1, e 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, do C.P., por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), do C.P. (autos principais – JJ), de 1 crime de extorsão, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22.º, 23.º, 73.º e 223.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – JJ), de 1 crime de rapto, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 161.º, n.º 1, al. a), do C.P. (autos principais – JJ), de 1 crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – JJ), de 1 crime de sequestro, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 158.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – XX), de 1 crime de ofensas à integridade física simples, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do C.P. (autos principais –XX), de 1 crime de denúncia caluniosa, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 365.º, n.ºs 1 e 2, do C.P. (51/16.3GATVD), de 1 crime de ofensas à integridade física simples, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do C.P. (235/16.4GCMFR), e foi condenado, como coautor, pela prática em 08-02-2016, de 1 crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 1, do C.P. (autos principais - ofendido XX), na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período, sujeita a regime de prova e à entrega, no prazo de 2 anos, a XX da quantia de EUR 500, em cujo pagamento foi também condenado nos termos dos arts. 1.º, al. l), 67.º-A, n.º 1, al. b), e n.º 3, 82.º-A do Código de Processo Penal (C.P.P.), e 16.º, n.º 2, do Estatuto da Vítima;
BB viu ser homologada a desistência da queixa apresentada e referente ao crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do C.P. para que foi convolado o crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a) e 2, do C.P., por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. c), do C.P. (YY), cuja prática lhe vinha imputada, foi absolvido da prática de 1 crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 143.º, n.º 1, e 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, do C.P., por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), do C.P. (autos principais – ofendido JJ), de 1 crime de extorsão, na forma tentada, p. e p. nos arts. 22.º, 23.º, 73.º e 223.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – JJ), de 1 crime de rapto, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 161.º, n.º 1, al. a), do C.P. (autos principais – JJ), de 1 crime de roubo, na forma consumada, p.e p. pelo art.º 210.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – JJ) e de 1 crime de denúncia caluniosa, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 365.º, n.ºs 1 e 2, do C.P. (51/16.3GATVD), e foi condenado, pela prática em 25-02-2017, em autoria imediata e na forma consumada, de 1 crime de coação agravado, p. e p. pelos arts. 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do C.P. (493/17.7PATVD – ZZ), na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, bem como no pagamento ao demandante Centro Hospitalar do Oeste, EPE da quantia de EUR 1 993, 96 e da quantia de EUR 867, 39 ao demandante Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE, ambas acrescidas de juros vencidos desde a data da notificação do respetivo pedido de indemnização civil e até efetivo e integral respetivo pagamento;
CC viu ser homologada a desistência da queixa apresentada e referente ao crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, do C.P. para que foi convolado o crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a) e 2, do C.P., por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), do C.P. (XX) cuja prática lhe vinha imputada, foi absolvido da prática de 1 crime de exercício ilícito da atividade de segurança privada, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 57.º, n.º 2, da Lei n.º 34/2013, de 16-05 (autos principais – XX), de 1 crime de sequestro, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 158.º, n.º 1, do C.P. (autos principais –XX), e foi condenado, como coautor, pela prática em 08-02-2016, de 1 crime de roubo, na forma consumada, do art.º 210.º, n.º 1, do C.P. (autos principais – XX) na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, cuja execução foi suspensa pelo mesmo período, sujeita a regime de prova e à entrega, no prazo de 2 anos e 6 meses, a XX, da quantia de EUR 500, em cujo pagamento foi também condenado nos termos dos arts. 1.º, al. l), 67.º-A, n.º 1, al. b), e n.º 3, 82.º-A do C.P.P., e 16.º, n.º 2, do Estatuto da Vítima;
DD foi absolvido da prática de 1 crime de exercício ilícito da atividade de segurança privada, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 57.º, n.ºs 2, 3 e 4, da Lei n.º 34/2013, de 16-05, e condenado na pena única de 2 anos de prisão, cuja execução foi suspensa pelo mesmo período, condicionada ao pagamento a favor do Estado da quantia de EUR 1 000, resultante de cúmulo das seguintes penas parcelares:
- 1 ano e 6 meses de prisão, pela prática entre 19 a 22-08-2015, em autoria imediata e na forma consumada, de 1 crime de exercício ilícito da atividade de segurança privada, p. e p. pelo art.º 57.º, n.ºs 2, 3 e 4, da Lei n.º 34/2013, de 16-05;
- 1 ano e 6 meses de prisão, pela prática em 21-11-2017, em autoria imediata e na forma consumada, de 1 crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 2.º, n.º 1, als. p), q) e s), e 3.º, n.ºs 4, al. b), e 5., al. a), e 86.º, n.º, 1, al. c), e 2, do Regime jurídico das armas e suas munições (R.J.A.M.);
EE foi condenado na pena de 200 dias de multa, à taxa diária de EUR 6, 50, pela prática entre 19 a 22-08-2025, como autor imediato e na forma consumada, de 1 crime de exercício ilícito da atividade de segurança privada, do art.º 57.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 34/2013, de 16-05;
FF foi absolvido da prática de 4 crimes de exercício ilícito da atividade de segurança privada, na forma consumada, ps. e ps. pelo art.º 57.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 34/2013, de 16-05, e de 1 crime de falsificação de documento, na forma consumada, p. e p. pelo 256.º, n.º 1, als. a), b), d) e e), do C.P., com referência ao art.º 255.º, al. a), do C.P., e condenado na pena única de 6 anos de prisão, resultante de cúmulo das seguintes penas parcelares:
- 1 ano de prisão por cada um dos 5 crimes de exercício ilícito da atividade de segurança privada, em autoria imediata e na forma consumada, ps. e ps. pelos arts. 57.º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 34/2013, de 16-05, praticados de 30-09 a 06-10-2016 e de 30-11 a 01-12-2016;
- 4 anos e 6 meses de prisão, pela prática em 08-10-2016, em autoria imediata e na forma consumada, de 1 crime de tráfico de armas agravado, p. e p. pelo art.º 87.º, n.ºs 1 e 2, al. a), do R.J.A.M.;
- 6 meses de prisão, pela prática em 21-11-2017, em autoria imediata e na forma consumada, de 1 crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. d), do R.J.A.M.;
AAA foi condenado pena de 150 dias de multa, à taxa diária de EUR 10, pela prática em 21-11-2017, como autor imediato, de 1 crime de detenção de arma proibida, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 3.º, n.º 2, al. g), e 86.º, n.º 1, al. d), do R.J.A.M.;
BBB foi condenado na pena de 200 dias de multa à taxa diária de EUR 6, pela prática, como autor imediato e na forma consumada, de 1 crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 2.º, n.º 1, als. p) e q), 3.º, n.º 3, al. a), e 86.º, n.ºs 1, al. c), e 2, do R.J.A.M.;
GG foi absolvido da prática de 4 crimes de falsificação de documento, na forma consumada, ps. e ps. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, als. a), b), d) e e), do C.P., 8 crimes de não cumprimento de obrigações relativas à proteção de dados, na forma consumada, ps. e ps. pelo art.º 43.º, n.1, al. c), da Lei n.º 67/98, de 26-10, entretanto revogado pelo art.º 46.º, n.º 1, da Lei n.º 58/2019, de 08-08 – crime de utilização de dados de forma incompatível com a finalidade da recolha, 8 crimes de violação do dever de sigilo agravado, na forma consumada, ps. e ps. pelos arts. 47.º, ns.1 e 2 al. a), da Lei n.º 67/98, de 26-10, entretanto revogada pelo art.º 41.º, n.ºs 1 e 2, al. a) ,da Lei n.º 58/2019, 08-08, 4 crimes de corrupção passiva para ato ilícito, na forma consumada, p. e p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do C.P., e condenado na pena única de 5 anos de prisão, cuja execução foi suspensa pelo mesmo período, condicionada ao pagamento, no mesmo prazo, da quantia de EUR 5 000 à Autoridade Nacional de Segurança Rodroviária (A.N.S.R.), resultante de cúmulo das seguintes penas parcelares:
- 6 meses de prisão por cada um dos 18 crimes de falsificação de documento, C.P., como autor e na forma consumada, ps. e ps. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, al. d), do C.P.;
- 10 meses de prisão por cada um dos 6 crimes de falsificação de documento, em autoria imediata e na forma consumada, ps. e ps. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, al. d), do C.P.,
todos praticados entre janeiro de 2015 e julho de 2017;
CCC foi condenada na pena única de 2 anos de prisão, cuja execução foi suspensa pelo mesmo período, condicionada ao pagamento, no mesmo prazo, da quantia de EUR 1 000 à A.N.S.R., resultante das penas parcelares de 6 meses de prisão por cada um dos 14 crimes de falsificação de documento, em coautoria e na forma consumada, ps. e ps. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, al. d), do C.P., praticados entre agosto de 2015 e junho de 2017; e
HH foi condenado na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de EUR 7, pela prática em 13-12-2016, em coautoria e na forma consumada, de 1 crime de falsificação de documento, p. e p. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, al. d), do C.P.
I.2. Dos recursos:
I.2.A. Do recurso interposto pelo arguido AA:
I.2.A.a. Do recurso:
Inconformado com a decisão, o arguido AA dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
A. O Acórdão recorrido é nulo, nos termos do artigo 2.º do artigo 374.º e do artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal, porque lhe falta a indicação, mesmo que sumária e concisa dos meios de prova subjacentes a cada um dos factos dados como provados e como não provados.
B. O Tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre factos essenciais à descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa, nomeadamente, sobre a questão abordada pelo Arguido, em fase de julgamento, da aplicação (ou não) da amnistia e do perdão, nos termos estabelecidos pela Lei n.º 38-A/2023 de 2 de agosto.
C. A não pronúncia sobre a aplicação ou não deste regime normativo, consubstancia uma nulidade por violação do disposto no artigo 374.º, n.º 2, 375.º, n.º 1 e 379.º, n.º 1, alínea c), todos do Código de Processo Penal.
D. Veja-se que a questão colocada (aplicação ou não do perdão nos casos de crime de roubo), trata-se de um problema concreto, de direito, o qual deveria ter sido alvo de decisão por parte do Tribunal a quo. Destarte, não o foi.
E. A questão da aplicação ou não do perdão previsto na Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, encontra-se pendente de uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça, para fixação de jurisprudência, desde o passado dia 16 de outubro de 202421, não existindo até à presente data (pelo menos, que seja do conhecimento do Recorrente), uma decisão final, ou seja, uma fixação de jurisprudência quanto à questão.
F. A falta de análise da aplicação, ou não, da amnistia e do perdão, previstos na Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto, quando tal questão foi devidamente levantada pelo Arguido, aqui Recorrente, em sede de alegações finais, determina a violação do preceituado no n.º 2 do artigo 374.º do Código de Processo Penal, e a nulidade do acórdão nos termos dos artigos 379.º, n.º 1, alínea c) e 120.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal.
Sem conceder,
G. Entende o Recorrente que serão sempre inconstitucionais as normas contidas no artigo 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal e nos artigos 2.º, 3.º, 4.º e 14.º da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto, quando interpretadas no sentido de que “Em caso de condenação em pena de prisão e reunidos que estejam os pressupostos referidos no artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, o tribunal não tem que se pronunciar sobre a aplicação, ou não, da amnistia e do perdão previsto na lei, não sendo tal omissão de pronúncia considerada como tal.” ou “Tendo o Arguido invocado a possível aplicação da amnistia, ou do perdão, nos termos previstos da Lei n.º 38-A/2023, de 2 agosto, não está o Tribunal obrigado a pronunciar-se expressamente sobre a aplicação, ou não, desse mesmo regime”, ou ainda, “Não padece de nulidade por omissão de pronúncia, o Acórdão proferido pelo Tribunal de 1.ª Instância, quando este não se pronuncie sobre as questões levantadas pelo Arguido, por requerimento, e em sede de alegações finais.”
H. Tais interpretações violam os artigos 2.º, 13.º, 205.º, n.º 1 e 32.º, n.º 5, 1.º e 18.º, n.º 2, todos da Constituição da República Portuguesa, e ainda o artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal.
I. Qualquer outra interpretação, de que não se verifica a aludida nulidade, comprime intoleravelmente os direitos do Arguido, ora Recorrente, inquinando de inconstitucionalidade material as normas no artigo 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal e nos artigos 2.º, 3.º, 4.º e14.º da Lei n.º 38-A/2023,de 02 de agosto, por violação dos artigos 2.º, 13.º, 205.º, n.º 1, 32.º, n.º 5, 1.º e 18.º, n.º 2, todos da Constituição da República Portuguesa, e ainda o artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal.
J. Inconstitucionalidade esta que desde já se argui para todos os devidos e legais efeitos.
K. Deverá assim proceder-se à revogação do Douto Acórdão proferido, e a sua substituição por outro que aplique o perdão da pena previsto na Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, à pena a que o Arguido, aqui Recorrente, foi condenado.
L. Ao valorar o depoimento do Ofendido, DDD, e da Testemunha, EEE, tal como fez, o Tribunal a quo, labora em erro de julgamento da matéria de facto.
M. Nomeadamente, porque a partir do referido entendimento, o Tribunal a quo, deu como provados nos pontos 3.º a 17.º, dos factos dados como provados, nomeadamente, no que concerne à prática de atos enquadrados no crime de roubo, pelo Arguido.
N. Contudo, cremos que a sua credibilidade e a dos reconhecimentos presenciais efetuados em fase de inquérito, ficam dependentes de outros meios de prova, que corroborem a participação do Arguido, aqui Recorrente, nos factos pelos quais foi pronunciado.
O. Nos presentes autos não existem quaisquer outras provas, para além dos já mencionados reconhecimentos presenciais, realizados pelo Ofendido e a sua amiga, que demonstrem que foi o Arguido, aqui Recorrente, um dos coautores dos factos praticados, pelos quais foi agora condenado.
P. Pelo contrário, toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento afasta essa possibilidade. A prova testemunhal é avassaladora e demonstra inequivocamente que o Arguido, ora Recorrente, não praticou qualquer roubo contra o Ofendido DDD.
Q. A Testemunha EEE, declarou perante o Tribunal, no decorrer da sua inquirição, a qual se encontra devidamente transcrita nas motivações, que não conhecia os Arguidos, nunca os tinha visto, e muito menos sabia os seus nomes. Identificou os Arguidos como autores da prática dos factos, porquanto, em conversas com amigos, nessa madrugada de carnaval, em ..., após saírem da festa, embriagados, conversaram sobre os factos e os amigos, que não os presenciaram, é que identificaram os nomes dos Arguidos, entre os quais, o agora Recorrente.
R. Por sua vez o Ofendido, DDD23, esclareceu no decorrer da sua inquirição – conforme transcrições que constam das motivações – que não conhecia os autores dos factos, nem conhecia os arguidos, diz que um deles era um “FFF” e o outro tinha a alcunha de “GGG”. Ora segundo a própria teoria tecida pelo Tribunal a quo, dois co-arguidos – que NÃO o agora Recorrente – eram conhecidos por estas alcunhas.
S. Posteriormente, o Ofendido acrescentou que não se recordava quem é que lhe haveria tirado a carteira.
T. Como é que o Tribunal a quo perante tudo isto, não ficou com uma dúvida inultrapassável quanto à participação do Arguido, aqui Recorrente, nos factos em causa!? Não se compreende.
U. Toda esta prova (ou a ausência dela) não foi devidamente apreciada pelo Tribunal a quo de acordo com as regras da experiência comum, uma das regras fundamentais do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
V. A livre convicção não é discricionária, e não pode deixar de ser fundamentada.
W. A livre apreciação de prova deve estar subordinada ao cumprimento de um dever - o dever de procurar a denominada verdade material -, de modo que tal apreciação, em cada caso concreto, seja reconduzível a critérios objetivos, devidamente fundamentados e passíveis de controlo.
X. Com base no supra referenciado, não poderia o Tribunal a quo, com base unicamente no referido reconhecimento presencial, ter dado como provado os factos dados como provados sob os números 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º, 16.º e 17.º.
Y. Efetivamente não se encontra provado que o Arguido, ora Recorrente, agindo em comunhão de vontades e em conjugação com outro arguido, tenha praticado um crime de roubo da quantia de 10,00€ (dez euros) ao Ofendido DDD.
Z. O próprio Ofendido, não admite, e por outro lado, nega, a participação do Arguido, ora Recorrente, na prática do crime de roubo. E, expressamente questionado, explica que lhe foi retirada a carteira (em momento que não se encontrava o Arguido presente), viram os seus documentos, e a posse de 10,00€ (dez euros), tendo-lhe sido tudo devolvido no próprio momento.
AA. Verifica-se que apenas a dualidade de critérios do Tribunal a quo é que lhe permitiu dar como provado que o Arguido participou nos factos dados como provados nos números 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º, 16.º e 17.º.
BB. Existiu assim um erro no julgamento, da prova por parte do Tribunal a quo, porquanto é evidente que foram violadas as regras da experiência e que se efetuou uma apreciação manifestamente incorreta, desadequada, baseada em juízo ilógicos, arbitrários e contraditórios.
CC. No caso dos autos, o Tribunal a quo não podia ter dados como provados os factos como provados sob os números 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º, 16.º e 17.º.
DD. A matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo é contrariada pelos depoimentos do Ofendido e da Testemunha da defesa, HHH.
EE. Estamos assim, perante um erro de julgamento da prova, e da sua valoração, por parte do Tribunal a quo que determina a anulação da referida decisão, nomeadamente, dando como não provada a matéria de facto ora impugnada pelo Recorrente.
FF. O princípio do in dúbio pro reo estabelece uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa pelo que a sua violação exige que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o Arguido.
GG. No caso em apreço, conjugando, nomeadamente a prova documental produzida, o depoimento das testemunhas e a fundamentação da matéria de facto dada como provada no acórdão recorrido, com as regras da experiência comum ter-se-á de concluir que houve uma violação do princípio in dubio pro reo pelo Tribunal a quo.
HH. O Tribunal a quo, em caso de dúvida, optou por não realizar prova adicional e decidiu sempre contra o Arguido, valorando unicamente o reconhecimento positivo efetuado em sede de inquérito.
II. Nestes termos e nos demais de direito deverá este recurso do julgamento da matéria de facto e da valoração da prova ser procedente e por via dele dar-se como não provados os factos dados como provados nos números 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º, 16.º e 17.º.
JJ. Admite-se que a referida matéria de facto possa ser total ou parcialmente revogada desde que da mesma se expurgue qualquer intervenção do Arguido nos referidos factos.
KK. Revogando-se a matéria de facto dada como provada nos números 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 15.º, 16.º e 17.º., total ou parcialmente, deverá concluir-se que o Arguido não participou nos factos ocorridos na madrugada do dia 0...de 2016.
LL. Neste âmbito, entende o Recorrente que serão sempre inconstitucionais as normas contidas nos artigos 26.º, 28.º e 210.º, n.º 1, todos do Código Penal, ainda que ao abrigo do princípio da livre apreciação de prova, consagrado no artigo 127.º do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que, “O Tribunal pode, ao abrigo do princípio da livre apreciação de prova, valorar o reconhecimento realizado durante a fase de inquérito, como prova suficiente e definitiva para condenação, ainda que, nenhuma outra prova exista nesse sentido, nem o autor desse reconhecimento, em sede de audiência de discussão e julgamento, o confirme.” Ou “O tribunal pode fundamentar a decisão condenatória unicamente com base em um reconhecimento realizado na fase de inquérito, mesmo que esse reconhecimento não seja confirmado em julgamento, nem corroborado por outros elementos probatórios.” Ou, ainda, “O reconhecimento realizado na fase de inquérito pode ser considerado prova plena e definitiva, dispensando a necessidade de outras diligências probatórias que confirmem ou validem esse reconhecimento.” Por violação nas normas consagradas 1.º, 2.º, 13.º, 18.º, 32.º, 204.º,205.ºtodosda Constituição da República Portuguesa e artigo 6.ºda Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Inconstitucionalidade essa que desde já se argui, para todos os devidos e legais efeitos.
MM. Quais outras interpretações que permitem ao Tribunal valorar, de forma exclusiva e definitiva, um reconhecimento realizado durante a fase de inquérito, sem confirmação em julgamento ou sem suporte de outras provas, são inconstitucionais. Essas abordagens violam os princípios fundamentais do Estado de Direito democrático, consagrados na Constituição da República Portuguesa, incluindo o contraditório, a presunção de inocência, a proporcionalidade, a legalidade processual, e o dever de fundamentação. A condenação penal deve ser baseada em elementos probatórios obtidos de forma legal, submetidos ao crivo do julgamento e avaliados de forma imparcial, assegurando o respeito pelos direitos fundamentais do arguido.
NN. ALIÁS, FICA POR COMPROVAR QUE OCORREU, TÃO POUCO, QUALQUER PRÁTICA DO CRIME DE ROUBO.
OO. A Testemunha EEE, declarou que não se recorda, mas acha que o Ofendido não comentou nada consigo sobre se algum objeto pessoal lhe houvesse sido roubado.
PP. A testemunha EEE admitiu que não viu nada a ser retirado, ou subtraído, do Ofendido, com ou sem recurso a violência.
QQ. Por sua vez, o Ofendido, III esclareceu que os autores da prática dos atos, lhe tiraram a carteira, a qual continha 10€ e os seus documentos, tendo sido tudo devolvido, no mesmo momento, e depõe claramente o seguinte – “Acho que era só isso que eles queriam ver… sinceramente.“
RR. Por fim, a Testemunha JJJ declarou que não presenciou qualquer ato de violência, nem, tão pouco, qualquer subtração de um qualquer objeto pessoal ou quantia monetária do Ofendido.
SS. São elementos do tipo de crime de roubo, uma ação de subtração de um bem que pertence ao ofendido.
TT. A verdade é que inexiste qualquer tipo de prova, aliás, nem o próprio Ofendido, nem a sua amiga, assim o mencionam, ou por outro lado, expressamente o negam, que tenha ocorrido qualquer subtração de qualquer bem da propriedade do Ofendido.
UU. Nada nos autos nos diz, nem tão pouco nos comprova, para além das declarações prestadas em fase de inquérito pelo Ofendido DDD, que lhe foi subtraída a quantia de 10,00€ nos factos ocorridos no dia 0...de 2016, elemento este absolutamente essencial para a tipicidade das condutas dos arguidos como um crime de roubo.
VV. O Ofendido, em sede de audiência de discussão e julgamento, como já se viu, negou que os Arguidos tivessem subtraído o montante mencionado.
WW. Existiu um erro de julgamento da prova e dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo, sendo que uma correta apreciação dos depoimentos, conjugados com as regras da experiência comum, impunha que se desse como não provados tais factos.
XX. Deverá assim dar-se como não provado os factos 12.º e 16.º dos factos dados como não provados ou, se assim não se entender, dar-se como não provada a expressão “retiraram uma nota do Banco Central Europeu com o valor facial de € 10,00, fazendo-a sua, restituindo-lhe a carteira”, e que “agiram com a intenção de integrarem no património do KKK” a nota de € 10,00€ que o mesmo retirou ao ofendido”.
Por fim, cumpre realçar uma última questão,
YY. A Testemunha EEE informa que, a par do facto de ser amiga pessoa do Ofendido, e ter sido neste sentido que aceitou prestar declarações no âmbito deste processo, na sua fase inicial, detinha outros motivos, mais pessoais, para se encontrar descontente com o LLL, ora Recorrente, o que talvez tenha influenciado, e muito, a sua versão dos factos…
Declarou, aliás, que momentos antes dos factos, tinha sido expulsa pelo aqui Recorrente, da discoteca.
ZZ. De realçar que o Tribunal a quo valorou de forma diferente o tempo decorrido desde a prática dos factos e a influência que esse decurso do tempo teve sobre a memória das testemunhas.
AAA. O Tribunal a quo baseou-se em opiniões subjetivas para dar como provados os referidos factos.
Esta é uma das razões pelas quais o Tribunal a quo não fundamentou a decisão de dar tais factos como provados.
BBB. Os referidos factos foram dados como provados sem que o Tribunal a quo na sua apreciação e valoração fizesse uso de raciocínios lógicos e das regras da experiência comum, violando o preceituado no artigo 127.º do Código de Processo Penal
CCC. Errou o Tribunal a quo ao dar como provados tais factos, pelo que os mesmos têm de ser dados como não provados.
DDD. Neste âmbito entende o Recorrente que serão sempre inconstitucionais as normas contidas nos artigos 127.º, 146.º e 128.º, todas do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que “Perante dois depoimentos, com conteúdo contraditório, opta o julgador, ao abrigo da livre apreciação de prova, pelo depoimento cujo resultado interpretativo é mais desfavorável ao arguido, sem oficiosamente ordenar a concretização da prova por acareação.” ou “Em situações de depoimentos contraditórios entre testemunhas, o julgador opta, ao abrigo da livre apreciação de prova, por valorizar o depoimento que mais prejudica o arguido, sem promover diligências adicionais de prova para esclarecer a contradição.” ou “O julgador decide em desfavor do arguido perante depoimentos contraditórios, presumindo implicitamente a culpabilidade do mesmo, em violação do princípio constitucional da presunção de inocência.” Por violação dos princípios estabelecidos e garantidos nos artigos1.º, 2.º, 13.º, 18.º,n.º 2, 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, 205.º da Constituição da República Portuguesa. Inconstitucionalidade essa que desde já se argui para todos os devidos e legais efeitos.
EEE. A condenação por roubo não se basta com a verificação de uma subtração (ou tentativa de subtração) física de um objeto. Carece de um elemento subjetivo específico – o animus furandi –, que deve estar clara e inequivocamente demonstrado.
FFF. Na ausência de prova consistente desse propósito de apropriação definitiva, não se encontra preenchido o tipo legal de roubo, nos termos do artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal, devendo o Arguido ser absolvido nessa parte.
GGG. Não tendo o Arguido participado nos factos ocorridos no dia 0...de 2016, não poderia ter sido condenado, como foi, pela prática de um crime de roubo, previsto e punido no artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal.
HHH. Existiu assim um erro de julgamento do Acórdão recorrido que deverá ser corrigido.
III. Nesta conformidade, e após o recurso da matéria de facto e de direito, que ora antecedem, ter-se-á de absolver o Arguido da prática do crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal.
JJJ. Não tendo quaisquer responsabilidades sobre o crime indicado, o Arguido também não poderá ser responsabilizado pelos danos patrimoniais dos mesmos.
KKK. Por outro lado, ao dar como provados factos que não resultaram da prova produzida em audiência de julgamento, violou ainda o disposto no artigo 355.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
LLL. Deverá assim ser revogada a sentença que condenou o Arguido, aqui Recorrente, no pagamento de uma indemnização no valor de 500,00€ (quinhentos euros) ao Ofendido, o qual foi decidido e imposto ao Arguido pelo Tribunal a quo.
Ainda que assim não se entenda, sem conceder, e porque “abundans cautella non nocet”
MMM. Sem prescindir do supra alegado e admitindo, por mera hipótese académica, como provados os factos em que assentou a sentença objeto de recurso, deverá, ainda assim, alterar a medida da pena aplicada pelo Acórdão recorrido.
NNN. O entendimento da jurisprudência tem sido de que a pena concreta terá de ser determinada através da ponderação da culpa do agente e das exigências de prevenção.
OOO. Entende-se assim que o Tribunal a quo fez uma interpretação e aplicação incorreta do artigo 71.º n.º 1 e 2 do Código Penal e aplicou uma pena excessiva ao Arguido.
PPP. A pena aplicar no caso em apreço deverá ser de um ano, ou muito próximo dessa, por referência aos artigos 70.º e 71.º, n.º 1 e 2 do Código Penal.
QQQ. Ao aplicar a pena de prisão de 2 anos pelo crime de roubo, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 40º, 70º, 71º e 77º, todos do Código Penal.
RRR. Verificamos supra que as exigências de prevenção especial são diminutas, nomeadamente porque o Arguido é primário, tem uma estrutura familiar sólida e encontra-se inserido socialmente.
SSS. Os crimes imputados ao Arguido ocorreram há mais de 7 anos e não se conhecem quaisquer outras condutas desviantes do mesmo, o que leva a concluir que muito dificilmente o Arguido voltará a cometer o referido crime.
TTT. Entende assim o Arguido que se o Tribunal lhe aplicar uma pena de prisão até ao limite de um ano de prisão esta pena deverá ser perdoada nos termos do disposto na Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.
21 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no dia 16 de outubro de 2024, no âmbito do processo n.º 1153/16.1PCBRG-B.G1-A.S1, que teceu a seguinte decisão sumária:
“I - Como se diz no acórdão do STJ n.º 5/2006, publicado no DR I-A Série de 06-06-2006, «A uniformização de jurisprudência tem subjacente o interesse público de obstar à flutuação da jurisprudência e, bem assim, contribuir para a certeza e estabilidade do direito.»
II - A admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência depende do preenchimento de requisitos formais e de requisitos materiais, que se extraem dos art. 437.º e 438.º do CPP.
III – Neste caso concreto, verificando-se, além dos apontados requisitos formais, igualmente todos os requisitos materiais, conclui-se pelo prosseguimento do presente recurso extraordinário, sendo a questão sobre a qual importa fixar jurisprudência a seguinte: saber se o crime de roubo p. e p. no art. 210.º, n.º 1, do CP integra ou não a exceção prevista no art. 7.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto (o mesmo é dizer se beneficia ou não do perdão previsto no mesmo diploma legal).” – realces e sublinhados nossos.
Disponível para consulta em: https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/24279a365bfd881280258bb9002e098e?OpenDocument
22 Testemunha inquirida, na 2.ª Sessão, da Audiência de Discussão e Julgamento que decorreu no dia 14 de junho de 2024, pelas 14 horas (veja-se a ata com referência citius n.º ...). A inquirição desta testemunha foi realizada através de videoconferência no Tribunal de Mafra. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14:47:00 horas e o seu termo pelas 15:54:10 horas. Ficheiro Áudio “Diligencia_589-15.0TELSB_2024-06-14_15-14-21.mp3”
23 Ofendido inquirido na qualidade de testemunha, na 6.ª Sessão de Audiência de Discussão e Julgamento que decorreu no dia 27 de setembro de 2024, pelas 09 horas e 30 minutos (veja-se a ata com referência citius n.º ...). A inquirição desta testemunha foi realizada por videoconferência com recurso ao programa “Webex”. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 10:06:09 horas e o seu termo pelas 10:31:00 horas. Ficheiro Áudio “Diligencia_589-15.0TELSB_2024-09-27_10-06-07 (1).mp3”
24 Testemunha inquirida, na 2.ª Sessão, da Audiência de Discussão e Julgamento que decorreu no dia 14 de junho de 2024, pelas 14 horas (veja-se a ata com referência citius n.º ...). A inquirição desta testemunha foi realizada através de videoconferência no Tribunal de Mafra. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14:47:00 horas e o seu termo pelas 15:54:10 horas. Ficheiro Áudio “Diligencia_589-15.0TELSB_2024-06-14_15-14-21.mp3”
25 Ofendido inquirido na qualidade de testemunha, na 6.ª Sessão de Audiência de Discussão e Julgamento que decorreu no dia 27 de setembro de 2024, pelas 09 horas e 30 minutos (veja-se a ata com referência citius n.º ...). A inquirição desta testemunha foi realizada por videoconferência com recurso ao programa “Webex”. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 10:06:09 horas e o seu termo pelas 10:31:00 horas. Ficheiro Áudio “Diligencia_589-15.0TELSB_2024-09-27_10-06-07 (1).mp3”
26 Testemunha inquirida, na 8.ª Sessão, da Audiência de Discussão e Julgamento que decorreu no dia 04 de outubro de 2024, pelas 14 horas (veja-se a ata com referência citius n.º ...). A inquirição desta testemunha foi realizada presencialmente. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14:29:31 horas e o seu termo pelas 14:59:38 horas. Ficheiro Áudio “Diligencia_589-15.0TELSB_2024-10-04_14-29-29.mp3”.
27 Testemunha inquirida, na 2.ª Sessão, da Audiência de Discussão e Julgamento que decorreu no dia 14 de junho de 2024, pelas 14 horas (veja-se a ata com referência citius n.º ...). A inquirição desta testemunha foi realizada através de videoconferência no Tribunal de Mafra. Prestou juramento legal e o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 14:47:00 horas e o seu termo pelas 15:54:10 horas. Ficheiro Áudio “Diligencia_589-15.0TELSB_2024-06-14_15-14-21.mp3
O referido recurso foi admitido por despacho de 24-01-2025.
I.2.A.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. Tendo presente o disposto no art.º 3.º, n.os 1, 2, al. d), e 3, da Lei n.º 38-A/2023, de 02.08, e uma vez que face à pena concreta não seria suscetível de aplicação o perdão de pena aí previsto, objetivamente o Tribunal “a quo” não estava obrigado a fundamentar a respetiva não aplicação por juridicamente inútil.
2. No que se reporta à impugnação da matéria de facto dado como provada, não foi apresentado qualquer fundamento ou concreta prova que imponha decisão diversa daquela que foi proferida pelo Tribunal “a quo” em sede da matéria de facto dada como provada.
3. De igual modo, não se vislumbra qualquer insuficiência ou omissão na fundamentação da matéria de facto dada como provada.
4. Dúvidas não restam de que os arguidos intervenientes, entre os quais se encontrava o recorrente, se comportaram como se a quantia apropriada fosse daquele que, entre eles, retirou o dinheiro e ficou com o mesmo, assim claramente se concretizando o facto relativo à ilegítima intenção de apropriação enquanto elemento subjetivo especial da ilicitude da prática pelo recorrente, em coautoria material, de um crime de roubo.
5. As inconstitucionalidades múltiplas suscitadas pelo recorrente nada têm a ver com o efetivamente sucedido, fundamentado e decidido no douto acórdão recorrido, sendo que, nas “interpretações” colocadas em causa, o recorrente confunde a existência de interpretações não constitucionais com situações objetivas de erro na apreciação da prova e omissão da realização de diligências probatórias obrigatórias, que possuem o seu próprio acervo normativo de reação legal e que, no caso concreto, não tiveram lugar.
6. Não colhe a argumentação do recorrente no que respeita a uma eventual desproporção e desadequação da pena aplicada, tendo em conta a própria fundamentação apresentada pelo Tribunal “a quo” para a respetiva determinação e fixação.
7. Deve, assim, a condenação do arguido recorrente manter-se nos seus precisos termos.
I.2.B. Do recurso interposto pelo arguido BB:
I.2.B.a. Do recurso:
Inconformado com a decisão, o arguido BB dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
A) O arguido aguardou longos 8 anos para ver a situação jurídico-processual dos presentes autos a ter, finalmente um encontro com a fase de julgamento para ser apreciada a sua responsabilidade criminal pelos crimes de que vinha acusado.
B) E foi o arguido submetido a julgamento pela prática dos seguintes ilícitos criminais:
- coautor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, na forma consumada, p.p. nos arts.143.º, n.1 e 145.º, ns.1, al. a) e 2, por referência ao art.132.º, n.2, al. h), todos do Código Penal (autos principais - ofendido JJ)
- coautor material de um crime de extorsão, na forma tentada, p.p. nos arts. 22.º, 23.º, 73.º e 223.º, n1 do Código Penal (autos principais - ofendido JJ);
- coautor material de um crime de rapto, na forma consumada, p.p. no arts.161.º, nº.1, al. a) do Código Penal (autos principais - ofendido JJ);
- coautor material de um crime de roubo, na forma consumada, p.p. pelo art. 210.º, n.1 do Código Penal (autos principais - ofendido JJ);
- coautor material de um crime de ofensas à integridade física simples, na forma consumada, p.p. no art.143.º, n.1 do Código Penal (autos principais – ofendido XX);
- coautor material de um crime de denúncia caluniosa, na forma consumada, p.p. no art.365.º, ns.1 e 2 do Código Penal (nuipc.51/16.3GATVD);
- autor material de dois crimes de ofensas à integridade física simples, na forma consumada, p.p. no art.143.º, n.1 do Código Penal (nuipc.166/16.8GCTVD);
- autor material de um crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma consumada, p.p. nos arts.143.º, n.1 e 145.º, ns.1, al. a) e 2, por referência ao art.132.º, n.2, al. c) todos do Código Penal (nuipc.166/16.8GCTVD);
- autor material de um crime de coação agravada, na forma consumada, p.p. nos arts.154.º. n.1, e 155.º, n.1, al. a), do Código Penal (nuipc.493/17.7PATVD).
C) Realizado o julgamento foi o arguido condenado pela prática como autor material de um crime de coação agravada, na forma consumada, p.p. nos arts.154.º. n.1, e 155.º, n.1, al. a), do Código Penal, na dura pena de 2 anos e 6 meses de prisão, pena essa que o Tribunal entendeu dever ser efetiva na sua execução.
D) Ora, o arguido com a sua peça de recurso, leva à consideração desse Venerando Tribunal, desde logo, a impugnação da matéria de facto dada como provada e inserida nos pontos 49 a 51 do douto Acórdão.
E) Como se fez referência em concreto na motivação supra, por indicação das concretas passagens do depoimento do ofendido MMM, colhido e registado na documentação informática da audiência no dia 28.06.2024, são várias as incongruências, contradições e imprecisões que se sublinham no depoimento da testemunha que não podem, de forma alguma deixar de abalar sua credibilidade.
F) Tanto o ministério público, aos minutos 11:40m a 12:30m, como o Tribunal ( Mmª Juiz Presidente) aos minutos 31:00m fizeram questão de directamente revelar que o depoimento da testemunha não estava a ser isento de críticas que, quanto a nós não foram afastadas de forma serena e indubitável.
G) Não podem deixar de notar que o Tribunal ajudou a testemunha a formular a sua resposta, como se esta fosse incapaz de o fazer, sendo certo que se prescindiu dos Princípios da Oralidade e Imediação que ficam, como ficaram irremediavelmente prejudicados quando a testemunha é ouvida por WEBEX.
H) Por esta razão e sendo o ofendido a única testemunha que compunha a prova testemunhal desta situação penal, deveria o Tribunal rodear-se de maior cautelas e cuidados por forma a não ficarem quaisquer dúvidas da bondade do seu depoimento e bem assim da clareza de memória sobre os factos que vivenciou.
I) E se quanto aos factos a testemunha não hesitou, com rigor absoluto de referência às palavras que lhe foram dirigidas ( e tal como o Ministério Público desconfiou, quiçá com recurso a auxiliar escrito de memória – algo que negou e impossível de confirmar tendo em conta a via usada para prestar depoimento) quanto a outros factos, tais como a sua vida profissional, nomeadamente duração de relações de trabalho e quando iniciou funções nas entidades patronais para as quais trabalhou, já o arguido afirmou não conseguir precisar.
J) Por essa razão entendemos que o Tribunal não avaliou bem a credibilidade da testemunha MMM e incorreu aqui num erro de julgamento, vício que se deixa invocado e que supra se deixou concretizado por referências às passagens concretas que impunham decisão diversa ( artigo 412º n.º 3 do C.P.P.)
K) Mas também a mesma matéria se dever ter impugnada uma vez que a testemunha admitiu que não obstante as expressões e ameaças a si dirigidas pelo arguido BB, continuou a celebrar contratos com empresas que até ali eram representadas pela empresa ..., sendo que apenas alterou a forma de contato, preferindo o contato diurno.
L) A testemunha, apenas alterou comportamentos, em questões que nunca foram sequer referidas pelo arguido na sua alegada mensagem ameaçadora ou na sua alega conduta coativa.
M) Ora a testemunha diz que deixou de ser segurança à noite, não deixando de ser comercial da empresa LB e efetuar os contactos que entendia, assim como, nesse ano não frequentou o Carnaval com as suas filhas.
N) Estas duas alterações comportamentais nunca foram as que, alegadamente, correspondiam às ameaças perpetradas pelo arguido recorrente que absolutamente nada referiu a esse respeito.
O) Por referências às concretas passagens do depoimento da testemunha a que sura se aludiu, devem ter-se por corretamente impugnados os pontos 49 a 52 da matéria de facto dada como provada.
P) Nessa mesma sequência, e tendo em conta o referido pela testemunha MMM, nomeadamente, e como supra já se referiu, a circunstância de ter continuado a desempenhar as suas funções de comercial da segurança e a celebrar contrato com empresa que até ali era “servidas” pela empresa ..., entendemos que, a revelar imperativa a condenação, deve o arguido ser condenado por um crime de coação na forma tentada.
Q) Ora, diz-nos o ofendido MMM, que por conta e ao serviço da empresa Free Segure veio a celebrar contrato de prestação de serviços com estabelecimento que até ali eram assistidos pela empresa “do” arguido recorrente.
R) Ou seja, tendo em conta a expressão dada como provada e atribuída ao arguido BB e dirigida ao ofendido, é notório que o visado da ameaça não omitiu o comportamento, apenas o concretizou de forma distinta.
S) Isto é o ofendido do crime de coação agravada não tendo omitido o comportamento anunciado como causador da violência anunciada, conduz a que o crime de coação seja, desta feita, praticado apenas na forma tentada.
T) O art.154.º, n.º 1, do Código Penal estatui que comete o crime de coação «Quem, por meio de violência ou de ameaça com mal importante, constranger outra pessoa a uma ação ou omissão, ou a suportar uma atividade (…).». O seu n.º 2 do acrescenta que «A tentativa é punível.».
U) O bem jurídico protegido é a liberdade de decidir e de atuar: liberdade de decisão (formação) e de realização da vontade. Numa perspetiva estrutural poder-se-á dizer que a liberdade pessoal se analisa em dois âmbitos essenciais: a liberdade de decisão e de ação e a liberdade de movimento.
V) Esta liberdade de decisão e liberdade de ação são como que o lado interno e o lado externo da liberdade de ação. Nesta medida, o crime de coação não só abrange as ações que apenas restringem a liberdade de (decisão) e de ação – as ações de constrangimento em sentido estrito, ou seja, a tradicional vis compulsiva –, mas também as ações que eliminam, em absoluto, a possibilidade de resistência – a chamada vis absoluta – bem como as ações que afetem os pressupostos psicológico-mentais da liberdade de decisão, isto é a própria capacidade de decidir.
W) O art.155.º, n.º1, do Código Penal, estabelece que a coação é agravada, designadamente, quando os factos previstos no art.154.º forem realizados por meio de ameaça com a prática de crime punível com pena de prisão superior a três anos.
X) Nos termos do art. 22.º, n.º1 do Código Penal, há tentativa quando o agente praticar atos de execução de um crime que decidiu cometer, sem que este chegue a consumar-se, sendo atos de execução, os que preenchem um elemento constitutivo do tipo ( al. a), os que forem idóneos a produzir o resultado típico (al. b), ou os que, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, forem de natureza a fazer esperar que se lhe sigam atos das espécies indicadas nas alíneas anteriores ( al. c).
Y) Ora, como supra se deixou expresso por referência às passagens concretas, o ofendido não se iniciou de atuar, mesmo após a ameaça, apenas tendo optado por uma ação distinta da implementada até ao momento.
Z) A condenação a revelar-se imperativa, deverá sempre ocorrer pela punição pelo crime de coação na forma tentada, este p.p. pelo artigo 154º n.º 1 e 2 do C.P.
AA) Quanto à medida da Pena e sua execução, o arguido deve também dizer o seguinte:
BB) Como amplamente se deixou referido na motivação acima apresentada, e para a qual não podemos deixar de referir entendo o arguido que a pena aplicada, que se situa, precisamente, a meio da moldura penal abstratamente aplicável é exagerada e desproporcional face à gravidade dos factos que cometeu e acima de tudo tendo em conta, praticamente nulas ou inexistentes as consequências a que deu aso.
CC) Ainda que não se aceite a condenação do arguido pela prática do mesmo ilícito penal, mas na forma tentada, o que não se concede, mas se admite, entende que uma pena a revelar-se imperativa e face os critérios do artigo 71º do C.P. deverá ser fixada, máxime, em 1 ano e seis meses de prisão.
DD) E tal pena, sempre com a mais subida vénia, deverá sempre ser suspensa na sua execução.
EE) O Tribunal apenas de quedou na análise do CRC do arguido, note-se posterior aos factos em apreço para fundamentar a decisão já proferida de que a pena aplicada não seria, jamais, suspensa na sua execução.
FF) Ora, o Tribunal não avaliou os demais pressupostos contidos no artigo 50º do C. Penal, entendendo ser unicamente de valorar o que extraída, com a mera observação, do CRC do arguido, após o ano de 2017.
GG) Referindo como “pedra de toque” que o arguido já beneficiara de uma pena suspensa que foi revogada, sugerindo como causa facto não verídico.
HH) A revogação deveu-se, não a prática de ilícios criminais no período de vigência da pena suspensa, mas sim a ausência do arguido as entrevistas com a DGRSP e à diligência marcada pelo Tribunal para a sua audição, unicamente pelo extravio de correspondência e alguma, é certo, negligência do arguido.
II) Desta feita, e tendo em conta o texto que o Tribunal a quo tão diretamente nos apresentou para não suspender, é por demais evidente que não revisitou, na verdade, todos os pressupostos do artigo 50º do C.P.
JJ) Ora, se todo o contexto de vida do arguido se alterou desde aquele momento até ao presente ( e 8 anos passaram ), se os factos foram praticados dentro de um concreto e isolado evento, sem quaisquer consequências significativas, tal não deveria também ter sido alvo de apreciação face aos pressupostos contidos no artigo 50º do C.P.
KK) Parece-nos líquido afirmar, até mesmo por todas as considerações expedidas ao longo do Douto Acórdão que foi alimentado sentimento quanto ao arguido que visava, como ocorreu, a final, uma condenação em pena de prisão efetiva.
LL) Ora, a decisão ora em crise, ao analisar a possibilidade de aplicar ao arguido o instituto da suspensão da pena, e não ter avaliado senão o CRC do arguido posterior à data dos factos, incorre num vício de fundamentação, manifestamente insuficiente, e que por essa razão viola o dever ínsito no artigo 374º n.º 2 e acarreta a nulidade prevista no artigo 379º n.º 1 al. a) do C.P.P. que aqui se deixa arguido.
MM) Para além disso, e como supra já se anunciou ser nosso pensamento, o arguido entende que ocorre aqui uma violação da nossa Lei constitucional.
NN) Neste âmbito, sempre serão inconstitucionais, as normas contidas nos artigos 40.º, 50.º e 71.º do Código Penal, quando interpretados no sentido que:
“Pode ser decidida a aplicação do instituto da suspensão da pena, unicamente pela avaliação do Certificado do Registo Criminal posterior do arguido, relativamente aos factos que estão a ser ajuizados, sem necessidade de analise de qualquer outro dos pressupostos identificado no artigo 50º do C. Penal”
E ainda,
“São determinantes as referências a bens jurídicos, abstratamente referidos, violados noutros processos pela prática de fatos posteriores aos em análise na pendência em análise para se determinar se a pena aplicada dever ou não ser suspensa na sua execução, sem análise de qualquer um dos outros pressupostos referidos no artigo 50º do C. Penal”
OO) Por violação dos artigos 18.º,n.º2,30.º,n.º1e32.º,n.º1,todos da Constituição da República Portuguesa.
Terminou pedindo que deve ter-se por impugnada a matéria vertida nos pontos 49 a 51 da matéria de facto dada como provada, e em consequência ser o arguido absolvido da prática do crime de coação agravada, na forma consumada, p.p. nos arts.154.º. n.1, e 155.º, n.1, al. a), do Código Penal, pelo qual foi condenado, sendo que, se assim não se entender, deve:
b) Considerar-se demonstrado que o ofendido MMM não omitiu qualquer comportamento dos referidos pelo arguido recorrente, e assim sendo, o arguido deverá ser condenado, máxima, pela prática do ilícito supra referido na forma tentada;
c) Sempre e sem prejuízo, e ainda que nenhuma das soluções seja adotada, deverá a pena aplicada ao arguido situar-se num quantum que não exceda 1 ano e seis meses de prisão.
d) E tal pena suspensa na sua execução, obedecendo-se com rigor ao preceituado no artigo 50º do C.P.
O referido recurso foi admitido por despacho de 24-01-2025.
I.2.B.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. No que se reporta à impugnação da matéria de facto dado como provada relativamente ao recorrente, não foi apresentado qualquer fundamento ou concreta prova que imponha decisão diversa daquela que foi proferida pelo Tribunal “a quo” em sede da matéria de facto dada como provada.
2. Tendo em conta que se concretizou o desiderato pretendido pelo arguido com a expressão que utilizou e dada como provada sob o n.º 49 do acórdão recorrido, deve ser considerado como consumado o crime de coação agravado em que o arguido ora recorrente foi condenado.
3. Não colhe a argumentação do recorrente no que respeita a uma eventual desproporção e desadequação da pena aplicada, tendo em conta a própria fundamentação apresentada pelo Tribunal “a quo” para a respetiva determinação e fixação.
4. As inconstitucionalidades suscitadas pelo recorrente relativamente à não suspensão da execução da pena de prisão em que foi condenado não são curiais no caso concreto, tendo em conta que o Tribunal apreciou devidamente da existência dos pressupostos necessários à aplicação, ou não, da pena substitutiva de suspensão da execução da pena de prisão no caso concreto.
5. Deve, assim, a condenação do arguido recorrente manter-se nos seus precisos termos.
I.2.C. Do recurso interposto pelo arguido CC:
I.2.C.a. Do recurso:
Inconformado com a decisão, o arguido CC dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
I – O presente recurso é interposto da Decisão proferida na douta Sentença que condenou o arguido, como autor material d crime de roubo, na forma consumada, do art.210.º, n.1 do Código Penal
II – O princípio do “in dubio pro reo” é exclusivamente probatório e aplica-se quando o tribunal tem dúvidas razoáveis sobre a verdade de determinados factos.
III- é manifesto que o Tribunal tem um excesso de dúvidas para poder formar a sua convição.
IV- Desde logo verificamos uma contradição entre a matéria dada como provada e a matéria dada como não provada, a saber: “DDD foi expulso da discoteca por um indivíduo cuja identidade não se apurou.”… “CC retorquiu “Estou a ser teu amigo e ainda estás a abusar. Vou-te é por na rua!”. De seguida, o mesmo arguido expulsou da “...” o XX.
V- A identidade do indivíduo que retirou o ofendido DDD da Discoteca nunca se apurou, como se constata pela contradição entre a matéria provada e não provada.
VI- Por outras palavras não se sabe quem foi. Logo existe visivelmente uma dúvida razoável.
VII- De igual forma da matéria dada como provada, indica que houve comunhão de esforços a praticar os factos.
VIII- autoria de um crime carece de prova, desde logo a existência de um plano comum. Não se logrou provar que parte da acção típica foi perpetrada e por quem.
IX: No que à prova cabal dos factos diz respeito esta sentença contradiz-se, baseando-se apenas nas regras de experiência comum.
X-A persistência de dúvida razoável após a produção da prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de não se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido
XI- O princípio in dubio pro reo foi desrespeitado quando o Tribunal, porquanto perante uma situação de dúvida irremovível na apreciação das provas, decidiu, em tal situação, contra o arguido.
XII- O princípio do “in dubio pro reo” é exclusivamente probatório e aplica-se quando o tribunal tem dúvidas razoáveis sobre a verdade de determinados factos.
O princípio in dubio pro reo estabelece que na decisão de factos incertos a dúvida favorece o arguido, ou seja, o julgador deve valorar sempre em favor do arguido um non liquet. A violação do princípio in dubio pro reo exige que o tribunal tenha exprimido, com um mínimo de clareza, que se encontrou num estado de dúvida quanto aos factos que devia dar por provados ou não provados.
XVII- Na perspetiva da impugnação ampla da matéria de facto, visando os chamados erros de julgamento, o enquadramento da violação do in dubio pro reo como erro de julgamento, postula uma concepção objectiva da dúvida quanto aos factos desfavoráveis ao arguido, que é, de resto, a que melhor se coaduna com os princípios da culpa e da livre apreciação da prova, perante as dúvidas sobre os factos desfavoráveis ao arguido, no sentido em que, se o Tribunal tem a máxima liberdade, mas também a máxima responsabilidade na forma como deve, com objectividade, efectuar o exame crítico e global das provas, adquirir a sua convicção quanto aos factos provados e fundamentar a sua decisão, também a dúvida relevante para a aplicação do princípio in dubio pro reo terá de ser motivada, segundo critérios de razoabilidade e de lógica, igualmente sindicáveis e passíveis de impugnação em via de recurso.
O referido recurso foi admitido por despacho de 24-01-2025.
I.2.C.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. Não foi apresentado qualquer fundamento ou concreta prova que imponha decisão diversa daquela que foi proferida pelo Tribunal “a quo” em sede da matéria de facto dada como provada.
2. De igual modo, não se vislumbra qualquer insuficiência ou omissão na fundamentação da matéria de facto dada como provada.
3. Deve, assim, a condenação do arguido recorrente manter-se nos seus precisos termos.
I.2.D. Do recurso interposto pelo arguido DD:
I.2.D.a. Do recurso:
Inconformado com a decisão, o arguido DD dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
1. A questão que ora se submete à arguta apreciação de V/Exas. é a da Medida da Pena, aplicada pelo Tribunal a quo, a qual o Recorrente preconiza como excessiva, peticionando, respeitosamente, outra mais benévola, sem todavia ter a pretensão de indicar qual.
2. Não o faz porque não descura que a fixação concreta da Pena é uma tarefa compósita, de pura aplicação do Direito, confluindo nela as notas de discricionariedade e de vinculação, nos mesmos termos que sucede com qualquer operação comum de aplicação do Direito, na qual relevam Regras de Direito escritas e não escritas, elementos descritivos e normativos, actos cognitivos e puras valorações só ao alcance de V/Ex.ªs.
3. Efectivamente, as Penas visam a protecção dos Bens Jurídicos (fim público) e a Reinserção do agente do crime no tecido social, por forma a impedir que o ostracize, de futuro, e que lesou (fim particular).
4. Certo é que, a maior ou menor necessidade de protecção dos bens jurídicos é, invariavelmente, aferida em função da sua importância, decalcada, de resto, na amplitude da moldura penal abstracta para o tipo legal, por razões de prevenção do crime e de defesa da ordem jurídica.
5. Donde na medida em que representa uma intromissão na esfera do cidadão, a compressão dela derivada, deve reduzir-se ao mínimo essencial à realização daquela teleologia, defrontando-se o julgador, nessa tarefa de determinação judicial, com regras nucleares de Direito, além de que não se pode ignorar que o acto decisório comporta, para além disso, uma “componente individual“ que não é controlável plenamente de modo racional, já que se trata de converter justamente a quantidade de culpabilidade em magnitudes penais, e os Princípios que regem a determinação da Pena não comportam a mesma concisão que os elementos do Tipo.
6. Pelo que a discricionariedade, na tarefa de fixação da Medida Concreta da Pena, é balizada por aquilo que não se mostra positivado na Lei, fora disso o Direito Penal moderno fornece regras centrais para a determinação da Pena, funcionando a Culpa como seu limite inultrapassável, devendo tomar-se em conta os seus efeitos sobre a pessoa do delinquente (prevenção especial) e sobre a Sociedade em geral (prevenção geral).
7. A Medida Concreta da Pena é um puro derivado da posição tomada pelo Ordenamento Jurídico-Penal e Constitucional em matéria de sentido, limites e finalidades das penas, cabendo à Culpa fornecer o limite máximo da pena a aplicar no caso concreto, tal como decorre do art.º 40.º do CP, sendo em função de considerações de Prevenção Geral e Especial de Ressocialização, que deve ser determinada abaixo daquela moldura máxima, e em função daquelas submolduras, a medida concreta.
8. Impõe-se ter presente que a Culpa ao funcionar como limite da Pena serve, ela mesma, de antagonista da Prevenção, pois quaisquer que sejam as necessidades de Prevenção jamais a poderão ultrapassar.
9. Há que não olvidar, igualmente, que existe um ponto óptimo de protecção dos Bens Jurídicos, reclamada pela colectividade, mas abaixo desse pode encontrar-se um outro, sempre inultrapassável, pois a Sociedade já não tolera a perda de eficácia preventiva da Pena, ainda consentâneo com tal eficácia e que integra o limiar mínimo da Pena encontrado em função das necessidades de prevenção especial onde se jogam aquelas circunstâncias que não fazendo parte do tipo depõem a favor ou contra o agente do crime tal como resulta do disposto no Art.º 71.º n.º 2, do CP.
10. É este o ponto em que assenta a pretensão do Recorrente, o qual pode ser sintetizado na inocente questão de ser, ou não, necessário para a tutela da Prevenção Geral, aplicar uma Pena tão elevada no caso concreto.
11. O ponto de partida e enquadramento geral da tarefa a realizar, na sindicância das Penas aplicadas, não pode deixar de se prender com o disposto no Art.º 40º do C. P., nos termos do qual toda a Pena tem como finalidade “a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”.
12. Isto porque em matéria de Culpabilidade, diz-nos o N.º 2 do preceito que, “Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.
13. Desta norma, fica-nos a indicação de que a Pena assume agora, e entre nós, um cariz utilitário, no sentido de eminentemente preventivo, não lhe cabendo, como finalidade, a retribuição qua tale da Culpa.
14. Do mesmo modo, a chamada “expiação da culpa” ficará remetida para a condição de consequência positiva, caso venha a ter lugar, mas não de finalidade primária da pena.
15. No pressuposto de que por expiação se entende uma interiorização do desvalor da ilicitude, e a aceitação da Pena que o condenado tem para cumprir, com o que tal significa enquanto consequente reconciliação voluntária com a Sociedade.
16. Deste modo, a ponderação da Culpa do agente serve propósitos que são fundamentalmente garantísticos e portanto do interesse dos próprios arguidos.
17. Com efeito, decorrente deste entendimento tem-se visto uma consonância com o imperativo constitucional do N.º 2 do Art.º 18º da Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.”
18. Na verdade, a defesa de Bens Jurídico-Penais é, ela mesma, em geral, o desiderato de todo o sistema penal globalmente considerado, e não um fim que se possa considerar privativo das Penas.
19. Já sabiamente Terêncio referia que Homo sum, humani nihil a me alienum puto.
20. Donde, falando de Penas aplicadas por homens a homens, não se pode deixar de afirmar, na esteira do pensamento de Anabela Miranda Rodrigues, que “...a pena deve ser medida basicamente de acordo com a necessidade de tutela de bens jurídicos que se exprime no caso concreto...alcançando-se mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada...”.
21. Por tudo isto, não se poderá deixar de afirmar que a Pena infligida ao Recorrente pelo Mui Douto Acórdão do Tribunal a quo, se afigura desproporcional e desadequada perante as necessidades de Prevenção Geral, Prevenção Especial e de Justiça que o caso de per si reclama.
22. O Recorrente acredita que outra Pena, em concreto mais benévola, logo mais Justa, será a adequada a satisfazer as premissas de tutela que o caso concreto reivindica, não se frustrando a Justiça com isso, antes pelo contrário, será ela indubitavelmente a sua grande vencedora.
Terminou pedindo a alteração da medida da pena aplicada, diminuindo-se os limites da mesma, e até absolvê-lo pois não cometeu qualquer ilícito.
O referido recurso foi admitido por despacho de 10-01-2025.
I.2.D.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. Atentos os fundamentos de facto e de direito expostos no douto acórdão recorrido, com cuja argumentação se concorda na íntegra, deve manter-se o douto acórdão proferido pelo Tribunal “a quo” relativamente ao recorrente nos seus precisos termos.
I.2.E. Do recurso interposto pelo arguido EE:
I.2.E.a. Do recurso:
Inconformado com a decisão, também o arguido EE dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
1. A questão que ora se submete à arguta apreciação de V/Exas. é a da Medida da Pena, aplicada pelo Tribunal a quo, a qual o Recorrente preconiza como excessiva, peticionando, respeitosamente, outra mais benévola, sem todavia ter a pretensão de indicar qual.
2. Não o faz porque não descura que a fixação concreta da Pena é uma tarefa compósita, de pura aplicação do Direito, confluindo nela as notas de discricionariedade e de vinculação, nos mesmos termos que sucede com qualquer operação comum de aplicação do Direito, na qual relevam Regras de Direito escritas e não escritas, elementos descritivos e normativos, actos cognitivos e puras valorações só ao alcance de V/Ex.as.
3. Efectivamente, as Penas visam a protecção dos Bens Jurídicos (fim público) e a Reinserção do agente do crime no tecido social, por forma a impedir que o ostracize, de futuro, e que lesou (fim particular).
4. Certo é que, a maior ou menor necessidade de protecção dos bens jurídicos é, invariavelmente, aferida em função da sua importância, decalcada, de resto, na amplitude da moldura penal abstracta para o tipo legal, por razões de prevenção do crime e de defesa da ordem jurídica.
5. Donde na medida em que representa urna intromissão na esfera do cidadão, a compressão dela derivada, deve reduzir-se ao mínimo essencial à realização daquela teleologia, defrontando-se o julgador, nessa tarefa de determinação judicial, com regras nucleares de Direito, além de que não se pode ignorar que o acto decisório comporta, para além disso, uma “componente individual” que não é controlável plenamente de modo racional, já que se trata de converter justamente a quantidade de culpabilidade em magnitudes penais, e os Princípios que regem a determinação da Pena não comportam a mesma concisão que os elementos do Tipo.
6. Pelo que a discricionariedade, na tarefa de fixação da Medida Concreta da Pena, é balizada por aquilo que não se mostra positivado na Lei, fora disso o Direito Penal moderno fornece regras centrais para a determinação da Pena, funcionando a Culpa como seu limite inultrapassável, devendo toma--se em conta os seus efeitos sobre a pessoa do delinquente (prevenção especial) e sobre a Sociedade em geral (prevenção geral).
7. A Medida Concreta da Pena é um puro derivado da posição tornada pelo Ordenamento Jurídico-Penal e Constitucional em matéria de sentido, limites e finalidades das penas, cabendo à Culpa fornecer o limite máximo da pena a aplicar no caso concreto, tal como decorre do art.º 40.° do CP, sendo em função de considerações de Prevenção Geral e Especial de Ressocialização, que deve ser determinada abaixo daquela moldura máxima, e em função daquelas submolduras, a medida concreta.
8. Impõe-se ter presente que a Culpa ao funcionar como limite da Pena serve, ela mesma, de antagonista da Prevenção, pois quaisquer que sejam as necessidades de Prevenção jamais a poderão ultrapassar.
9. Há que não olvidar, igualmente, que existe um ponto óptimo de protecção dos Bens Jurídicos, reclamada pela colectividade, mas abaixo desse pode encontrar-se um outro, sempre inultrapassável, pois a Sociedade já não tolera a poida de eficácia preventiva da Pena, ainda consentâneo com tal eficácia e que integra o limiar mínimo da Pena encontrado em função das necessidades de prevenção especial onde se jogam aquelas circunstâncias que não fazendo parte do tipo depõem a favor ou contra o agente do crime tal como resulta do disposto no Art.º 71.° n.º 2, do CP.
10. É este o ponto em que assenta a pretensão do Recorrente, o qual pode ser sintetizado na inocente questão de ser, ou não, necessário para a tutela da Prevenção Geral, aplicar urna Pena tão elevada no caso concreto.
11. O ponto de partida e enquadramento geral da tarefa a realizar, na sindicância das Penas aplicadas, não pode deixar de se prender com o disposto no Art.º 40° do C. P., nos termos do qual toda a Pena tem como finalidade "a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade".
12. Isto porque em matéria de Culpabilidade, diz-nos o N.º 2 do preceito que “Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa".
13. Desta norma, fica-nos a indicação de que a Pena assume agora, e entre nós, um cariz utilitário, no sentido de eminentemente preventivo, não lhe cabendo, como finalidade, a retribuição qua fale da Culpa.
14. Do mesmo modo, a chamada "expiação da culpa" ficará remetida para a condição de consequência positiva, caso venha a ter lugar, mas não de finalidade primária da pena.
15. No pressuposto de que por expiação se entende uma interiorização do desvalor da ilicitude, e a aceitação da Pena que o condenado tem para cumprir, co::: o que tal significa enquanto consequente reconciliação voluntária com a Sociedade.
16. Deste modo, a ponderação da Culpa do agente serve propósitos que são fundamentalmente garantístiços e portanto do interesse dos próprios arguidos.
17. Com efeito, decorrente deste entendimento tem-se visto uma consonância com o imperativo constitucional do N.º 2 do Art.º 18° da Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual "A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos .expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos."
18. Na verdade, a defesa de Bens Jurídico-Penais é, ela mesma, em geral, o desiderato de todo o sistema penal globalmente considerado, e não uni fim que se possa considerar privativo das Penas.
19. Já sabiamente Terêncio referia que Homo sum, humani nihil a me alienam puto.
20. Donde, falando de Penas aplicadas por homens a homens, não se pode deixar de afirmar, na esteira do pensamento de Anabela Miranda Rodrigues, pena deve ser medida basicamente de acordo com a necessidade de tutela de bens jurídicos que se exprime no caso concreto...alcançando-se mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada…”
21. Por tudo isto, não se poderá deixar de afirmar que a Pena infligida ao Recorrente pelo Mui Douto Acórdão do Tribunal a quo, se afigura desproporcional e desadequada perante as necessidades de Prevenção Geral, Prevenção Especial e de Justiça que o caso de per si reclama.
22. O Recorrente acredita que outra Pena, em concreto mais benévola, logo mais Justa, será a adequada a satisfazer as premissas de tutela que o caso concreto reivindica, não se frustrando a Justiça com isso, antes pelo contrário, será ela indubitavelmente a sua grande vencedora.
Terminou pugnando pela diminuição dos limites da pena e até absolve-lo, pois não cometeu qualquer ilícito, ou até suspender a pena na sua execução.
O referido recurso foi admitido por despacho de 10-01-2025.
I.2.E.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. Atentos os fundamentos de facto e de direito expostos no douto acórdão recorrido, com cuja argumentação se concorda na íntegra, deve manter-se o douto acórdão proferido pelo Tribunal “a quo” relativamente ao recorrente nos seus precisos termos.
I.2.F. Do recurso interposto pelo arguido FF:
I.2.F.a. Do recurso:
Inconformado com a decisão, o arguido FF dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
I. Antes de mais, no seu modesto entender, haver insuficiência da matéria de facto dada como provada para a condenação do recorrente - al. a) do n.º 2 do artigo 410º do C.P.P. Inexiste prova da alegada participação, a título de coautoria e/ou de cumplicidade, nos alegados factos dados como provados.
II. Por outro lado, por entender haver contradição insanável na fundamentação ou entre esta e a decisão a propósito dos factos provados (quanto ao recorrente) nos artigos 67º a 107º, 240º e 248º dos factos dados como provados, por um lado, e aos factos não provados - alínea b) do nº 2 do artigo 410º do C.P.P.
III. Acresce que o Tribunal a quo valorou erradamente a prova produzida em audiência quanto à matéria de facto tendente à formação da convicção de que o recorrente tenha participado nos factos descritos na acusação mostrando-se erradamente julgados a propósito dos factos provados (nomeadamente quanto aos factos dados como provados nos artigos 67º a 107º, 240º e 248º os quais devem ser revogados e dados como não provados) tanto mais que resulta dos depoimentos das testemunhas inquiridas em audiência e de demais prova indirecta que o recorrente não praticou os crimes de que foi condenado
IV. Por outro lado, ainda, o acórdão recorrido é nulo por falta de fundamentação relativamente à matéria assente dos factos provados (quanto ao aqui recorrente), quanto aos factos dados como provados nos artigos 67º a 107º, 240º e 248º os quais devem ser revogados e dados como não provados.
V. Adicionalmente, independentemente disso, o acórdão em crise enferma ainda do vício de insuficiência para a decisão, dos factos provados (quanto ao recorrente), por um lado, e aos factos não provados quanto à alegada participação do recorrente nos factos descritos na acusação, existindo erro de julgamento quanto àqueles factos também devendo, para o efeito, ser ordenado o reenvio do processo para julgamento.
VI. Em resultado da prova produzida em audiência de julgamento existiu errado enquadramento jurídico, por inexistência dos elementos objectivos e subjectivos do tipo de crimes de que o arguido foi condenado, nomeadamente no que diz respeito aos factos dados como provados nos artigos 67º a 107º, 240º e 248º os quais devem ser revogados e dados como não provados.
VII. Existência apenas de um crime de detenção de arma proibida.
VIII. Restrições probatórias quanto às intercepções telefónicas constantes dos autos.
IX. Restrições probatórias - proibição da valoração da prova resultante das intercepções telefónicas.
X. Pena excessiva - revogação do acórdão recorrido com a absolvição do arguido pela prática dos crimes de que foi condenado com excepção, no limite, pela prática de um crime de detenção de arma proibida impondo-se uma pena de multa ou, em caso negativo, de uma pena suspensa.
XI. Por último, sem prejuízo do que deixou dito, por entender que, em qualquer circunstância, a pena de 6 anos de prisão em que foi o arguido condenado mostra-se excepcionalmente severa devendo a mesma ser revogada e substituída por outra inferior a 1 ano e seis meses e a mesma suspensa na sua execução mediante o cumprimento de injunções.
Impõem solução diversa:
- uma melhor apreciação do conjunto da prova produzida, designadamente:
- Toda prova documental junta aos autos.
- E uma correcta apreciação daqueles elementos no cotejo com o teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas e declarações do arguido NNN.
- A correcta apreciação do conjunto da prova levará necessariamente a uma diferente resposta aos factos em crise, com as legais consequências, como é de justiça.
Requer:
- a realização de audiência para debate da matéria referida no ponto I a XI da presente motivação, o que faz nos termos e para os efeitos do n.º 5 do artigo 411º do C.P.P.
Em suma:
-há insuficiência da matéria de facto provada para a decisão de condenar o recorrente, assim como pelo preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do tipo de exercício ilícito de segurança privada, de tráfico de armas agravado.
- Há contradição insanável na fundamentação, entre os factos assentes e entre esses e a decisão (artigo 410º, n.º 2, alínea a) do C.P.P.)
- Há errada valoração do conjunto da prova produzida e, consequente, erro de julgamento quanto aos factos tendentes à formação da convicção de que o recorrente foi autor dos factos provados.
- Em qualquer circunstância, deve revogar-se o acórdão recorrido e substituí-lo por outro que, fazendo correcta apreciação e valoração da prova produzida, o absolva da prática de todos os crimes em que foi condenado.
O referido recurso foi admitido por despacho de 24-01-2025.
I.2.F.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. No que se reporta à impugnação da matéria de facto dado como provada, não foi apresentado qualquer fundamento ou concreta prova que imponha decisão diversa daquela que foi proferida pelo Tribunal “a quo” em sede da matéria de facto dada como provada.
2. Não existiu qualquer extemporaneidade na apresentação das interceções telefónicas realizadas no inquérito perante o Ministério Público.
3. Face à factualidade dada como provada, inexiste qualquer errónea qualificação jurídica dos ilícitos penais imputados ao recorrente.
4. Não existe qualquer fundamento para considerar a existência de crime continuado ou de uma única resolução criminosa relativamente à prática dos ilícitos penais de exercício ilícito da atividade de segurança privada e de tráfico de arma.
5. Não colhe a argumentação do recorrente no que respeita a uma eventual desproporção e desadequação da medida das penas parcelares e única em que foi condenado, tendo em conta a própria fundamentação apresentada pelo Tribunal “a quo” para a respectiva determinação parcelar e cumulada.
6. Deve, assim, a condenação do recorrente manter-se nos seus precisos termos.
I.2.G. Do recurso interposto pelo arguido GG:
I.2.G.a. Do recurso:
Inconformado com a decisão, o arguido GG dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
1. No que tange à matéria factual dada por provada há que assinalar múltiplos erros, muitos derivados talvez do uso do “copy - paste” e falta de tempo para uma revisão.
2. Por outro lado, os chamados “factos genéricos” são tão genéricos que nada têm de concreto, não tendo qualquer materialidade objectivada em factos ou situações concretizadas no espaço e no tempo.
3. Dizer que o arguido gizou um plano para ganhar dinheiro isentando condutores só tem sentido se houvesse ganho.
4. Sem vestígios de ganho apenas se fala de uma quimera, que nunca ser materializou.
5. Afirmar anúncios que não se concretizam nem localizam no tempo, feitos a amigos, conhecidos e familiares que não se identificam não é que uma conclusão intelectual baseada no numero de vezes que uma minuta foi usada.
6. Afirmar que o arguido GG contava intermediários “entre estes e o próprio arguido” é estranho.
7. Falar da intermediação de outro arguido sem que a este seja imputada uma só concreta intermediação é igualmente estranho.
8. Factos genéricos que não são mais que factos públicos irrelevantes para as situações concretas analisadas não devem ser chamados à factualidade.
9. Dá-se como provada a suspensão dos processos de contra-ordenação que se não vê plasmada nos autos, não sendo referido nenhum despacho de suspensão.
10. Dá-se como provado que “a arguida CCC foi detectada a conduzir em excesso de velocidade no mesmo dia, em dois locais, a quinhentos e dez metros de distância, com um intervalo de 2 minutos.
11. Afirma-se a “certeza de que foi GG quem submeteu o requerimento à ANSR em nome de OOO (fls. 45 e 45 v do apenso VII e fls. 122 a 147 e 163 a 173 do apenso VIII de perícias da escrita manual)” apesar disso não constar das referidas perícias.
12. O arguido assumiu, em sede de primeiro interrogatório judicial ter preenchido minutas com indicação de condutores fictícios, não revelando qualquer capacidade crítica.
13. A contestação foi elaborada e assinada por advogados, não se nos afigurando, sem quebra do muito e devido respeito por opinião adversa, competir ao julgador apreciar a forma do exercício do mandato ou transferir para o arguido o que é do mandatário.
14. Após o primeiro interrogatório judicial – e já vão passados largos anos – nunca mais o arguido elaborou qualquer minuta estradal, o que nem sequer foi valorado.
15. Não se pode exigir a um simples soldado da GNR, é certo com anos de experiência e muitos louvores, conhecimentos jurídicos finos e uma apreciação jurídica coincidente com a do Colectivo.
16. No decurso do processo não foi aplicada ao arguido medida de coacção para além de TIR, sendo excessivo que a final se afirme “as nossas forças policiais têm de ser expurgadas de elementos como o arguido que corrompem o sistema e o funcionamento das instituições que servem a Justiça e, em última instância, esta”
17. Quem não tem grande preparação jurídica e toma conhecimento, no exercício das suas funções que um colendo tribunal ensina que “o cidadão que, após um acidente de trânsito, informa o militar da Guarda Nacional Republicana, que era ele quem conduzia o veículo, no momento do embate, fazendo-o constar da participação do acidente, quando, na verdade, o condutor era outra pessoa não habilitada a conduzir, não comete o crime de falsificação de documento” possa pensar não haver qualquer falsificação quando se indica um terceiro condutor para ilidir a presunção estradal.
18. Daí que o arguido tenha tido dificuldade em compreender a censurabilidade da sua actuação, sendo certo que, após a sua primeira audição nunca mais tenha preenchido qualquer minuta de indicação de condutor.
19. Seja-nos permitido dizer que, pessoalmente, temos sérias dúvidas sobre a relevância jurídica de uma falsa declaração de condutor num requerimento, já que a mesma não faz prova de facto juridicamente relevante, apenas suspendendo (e nem sequer ilidindo) uma presunção e levando um processo contra-ordenacional a correr contra terceiro .
20. O severíssimo juízo de censura da personalidade do arguido ínsito na sentença em crise afigura-se-nos naufragar face a um manifesto dissídio sobre a apreciação jurídica da matéria, traduzida em arestos divergentes que são públicos.
21. A conduta do arguido, posto que censurável, não é de molde a por em crise valores essenciais da vida em comum, sendo as falsificações intelectuais em causa apenas de relevância processual, isto é, a nosso ver, situando-se numa zona limite da relevância jurídica.
22. Aapenas se poderá concluir por um juízo de censura leve, agravado pela reiteração das condutas e tendo em conta a falta de antecedentes penais e a exemplar conduta profissional como autoridade pública.
23. Considera a decisão em recurso que o arguido deverá ser punido por 24 crimes de falsificação de documento na forma simples
24. Logo a seguir diz que há dois blocos de crimes, os que foram a “solicitação do mesmo proprietário/infractor rodoviário porque terão sido contemporâneas entre si” e os demais.
25. No primeiro bloco é graduada uma pena parcelar sensivelmente menor.
26. Ora esta é a situação típica do crime continuado.
27. Daí que efectivamente se esteja perante, não um bloco de 18 crimes, mas de 3 crimes continuados .
28. Ou seja apenas haverá que considerar nove crimes de falsificação intelectual.
29. Para além disso e em sede de culpa há que se considerar que não houve do arguido qualquer interesse em obter contrapartidas materiais da sua conduta, tendo sempre actuado de forma altruísta, posto que censurável.
30. Por o arguido não ter a sofisticação intelectual que perpassa no aresto em análise, só tardiamente ter alcançado plenamente a censurabilidade das suas minutas e sentir uma injustiça no tratamento dos seus erros, tendo pleno conhecimento funcional dos viés da investigação é que, por decisão dos seus mandatários se manteve em silêncio.
31. Entendemos que o seu silêncio foi valorado muito negativamente, só assim se explicando a veemência da censura liminar da sua personalidade.
32. Analisando sem paixão, afigura-se-nos mediana a censura que merece a sua conduta.
33. A ausência de antecedentes criminais e o comportamento do agente posterior aos factos – e já passaram quase uma dezena de anos – permite concluir pela suficiência de uma pena de multa.
34. Tal multa deverá ser graduada em não mais do que 200 dias por cada crime.
35. Operando o cúmulo, deverá ser aplicada uma multa única de não mais que 720 dias
36. Considerando a situação económica do agente, o seu montante diário não deverá ser superior a 8 euros.
37. Se se entender não aplicar pena de multa, o que só por mera cautela de patrocínio se concebe, nesse caso a pena de prisão não deverá ser graduada em mais do que 3 meses por cada crime e, em cúmulo 1 ano e 3 meses de prisão, suspensos na sua execução.
38. Não se compreende o dever de pagar 5 000,00 € à ANSR nem conseguimos vislumbrar o seu fundamento.
39. Não se pode haver como “destinados a reparar o mal do crime”, não se refere a nenhuma entidade referida no artigo 51º do Código Penal pois a ANSR é um mero serviço central da administração directa do Estado cujas receitas são as expressamente previstas no artigo 8º do Dec. Reglm. n.º 28/2012, de 12 de Março na sua versão actual.
40. Foram, assim, violadas as normas do nº 1 do artigo 32º da Constituição Política, artigos 10º, 17º, 30º, 40º. 51º do Código Penal; e dos artigos 163º; 379º; 374º e 375º do CPP.
O referido recurso foi admitido por despacho de 24-01-2025.
I.2.G.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. As condutas do recorrente dadas como provadas integram a prática do ilícito penal consumado de falsificação de documento.
2. Face à factualidade dada como provada no douto acórdão recorrido, não foi aventada nenhuma circunstância exterior alheia ao agente que permita diminuir a culpa do recorrente, como exigido pelo art.º 30.º, n.º 2, do Código Penal, para que se possa ter em consideração a aplicação da figura do crime continuado, sendo que a contemporaneidade da atuação invocada pelo recorrente, só por si, não é fundamento para esse efeito.
2. Não existiu qualquer extemporaneidade na apresentação das interceções telefónicas realizadas no inquérito perante o Ministério Público.
3. Não colhe a argumentação do recorrente no que respeita a uma eventual desproporção e desadequação da medida das penas parcelares e única em que foi condenado, tendo em conta a própria fundamentação apresentada pelo Tribunal “a quo” para a respectiva determinação parcelar e cumulada.
4. Deve, assim, a condenação do recorrente manter-se nos seus precisos termos.
I.2.H. Do recurso interposto pelo arguido HH:
I.2.H.a. Do recurso:
Por fim, também inconformado com a decisão, o arguido HH dela interpôs recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões:
1-o processo penal português não respeita os ditames da Convenção Europeia dos Direitos Humanos que é direito positivo Português sob a égide do artº 8º da Lei Fundamental;
2-existe um contacto desequilibrado das provas quando o processo chega ao Juízo Central Criminal de Lisboa; na fase prévia ao Julgamento as MMas. Juízas Julgadoras tiveram contacto prévio com o caso da Acusação; o artigo 311 do CPP impõe o dever de sanear o processo o que propicia ao Julgador um “contacto parcial”, anómalo, com as provas trazidas pelo Ministério Publico…
3-todo o inquérito, de per si viciado por não ter sido realizado pelo JIC mas sim pelo MP/ Policias, foi levado ao gabinete da MMª. Juíza Julgadora que logo tomou contacto com a versão da Acusação/DCIAP/PJ!!! após o “saneamento” imposto pelo artº 311 do CPP, Sua Excelência notificou a defesa para em 20 dias apresentar a Contestação; dir-se-á que são estas as regras do Processo Penal mas, diz o arguido:- ESTE ESTADO DE COISAS ESTÁ MAL!!!!.....NÃO CUMPRE AS REGRAS DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS HUMANOS; na verdade,
4-o Tribunal de Julgamento, maxime a MMª. Juíza Presidente teve contacto prévio com todo o caso que lhe foi levado pelo DCIAP/Policia pelo que formou uma convicção prévia de culpabilidade do arguido; ao receber os autos, Acusação e provas documentais, o Tribunal teve contacto prévio com a versão acusatória; e só depois deste contacto é que notificou a defesa para contestar; todo este “sistema” viola os Princípios da Presunção de Inocência, da Igualdade de Armas e do Contraditório. Ostraciza in totum o artigo 6º- 1 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos: Direito a um processo equitativo. 1. Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei…
5-face a este imperativo comunitário que se impõe na nossa ordem jurídica sob o artº 8º da CRP há que concluir que o processo não é equitativo ao “conceder”, sob o artº 311 do CPP, que as MMªs Juízas Julgadoras tenham acesso prévio a toda a versão da Acusação;
6-o Tribunal violou o Principio da Presunção de Inocência do arguido, incorreu em prévia convicção de culpabilidade/ condenação ao tomar conhecimento inicial com toda a prova acusatória pelo que urge declarar esses vícios; acresce que,
7-o Tribunal é o Juiz e apenas o Juiz, Órgão de Soberania para a “ Justiça em nome do Povo”-artigo 202º da CRP; é anómala a promiscuidade na Domus Iustitiae com o Órgão Acusatório ( Procuradores da Republica e Polícias); não há Justiça quando um processo está contaminado ab initio e o Tribunal - que é apenas e somente o Juiz; urge declarar que a função Furisdicional in loco não está de acordo com os artigos 202º da CRP e 6º- 1 da CEDH;
8- o artº 311 do CPP é inconstitucional por violar o “processo equitativo/ Tribunal imparcial”- artº 6º- 1 da CEDH; a composição dos Tribunais no sistema judicial Português viola a CRP;
9-o processo não é conforme à Lei Fundamental pelo que é nulo desde que foi autuado e levado ao DCIAP!!!! o inquérito não respeita o Principio Comunitário “PRESCRIBED BY LAW”;
10-o artº 32º-4 da Lei Fundamental estipula que “ toda a instrução é da competência de um Juiz, o qual pode, nos termos da lei, delegar noutras entidades a pratica dos actos instrutórios que se não prendam directamente com os direitos fundamentais”.
11-no Codigo Processo Penal vigente até 1987, o artigo 171 sob a epigrafe “Direcção da Instrução Preparatória” impunha que “o Juiz, logo que lhe seja dada a participação, mandará proceder ao competente corpo de delito…:”.…
12-a direcção da Instrução Preparatória estava a cargo do JUIZ; assim o determinava a CRP no artº 32º- 4, norma nunca alterada pela Assembleia da Republica!!!! o artº. 330º-1 do CPP impunha ainda que “ a Direcção da Instrução Contraditória é sempre presidida pelo Juiz”
13-por sua vez o artº 341º do CPP atribuía ao Ministério Publico o dever de deduzir a Acusação.. Era assim o tempo da Instrução na vigência do DL 16489 de 15-2-1929…
14-em 1987 através do DL 78/87 de 17/2 o Ministério Publico “conquistou” os poderes atribuídos pelo artº. 32-4 da Lei Fundamental exclusivamente ao Juiz; no vulgo popular “açambarcou” os poderes conferidos ao JIC na feitura do Inquérito, ou seja, a “antiga” Instrução Preparatória.
15-todavia, a Constituição da Republica continua a impor ao Juiz o dever da presidir à Instrução mas não é isso que ocorre nos Tribunais !!! na verdade, artº 263º do CPP determina que a “direcção do inquerito cabe ao Ministerio Publico,”, cabendo ao Juiz apenas alguns atos de instrução; assim, o artº 263 do CPP contraria ostensivamente o artº. 32º-4 da CRP;
16- a Polícia e o Ministerio Publico não estão subordinados aos princípios da Independencia e da Isenção nem oferecem as mesmas garantias que o Juiz de Instrução.
17-o integral respeito pelas diretivas constitucionais sob os arts. 32º e 18º da Lei Fundamental impõem que a actividade de investigação e instrução criminal seja confiada aos Juízes; a forma mais perfeita de concretização pratica dos objetivos da Constituição da Republica é respeitar o que o Legislador Constituinte estatuiu no tocante às garantias a que deve obedecer o processo penal.
18-o voto de vencido no Acórdão 7/87, de 9/2 do Tribunal Constitucional diz muito da “incerteza jurisprudencial” ( quiçá batota processual) trazida ao processo penal quando nele se explanou o seguinte:
“….Quanto ao artigo 263.º, não vejo como é que é possível contestar com êxito a sua (a meu ver, flagrante) inconstitucionalidade.Dispõe o artigo 32.º, n.º 4, da CRP que «toda a instrução é da competência de um juiz». Aquando da elaboração da CRP, a instrução compreendia duas componentes (de acordo com o famigerado Decreto-Lei 35007, de 13 de Outubro de 1945): a «instrução preparatória», dirigida pelo MP, e a «instrução contraditória», dirigida por um juiz. Indo ao encontro de uma fortíssima corrente contra este regime, a CRP veio determinar a regra da jurisdicionalização integral da instrução (a qual só foi temperada a título temporário pela disposição transitória do artigo 301.º, n.º 3, da versão primitiva da CRP). Não sobraram dúvidas a ninguém de que, quando a CRP determinou que «toda a instrução é da competência de um juiz», quis dizer, aliás de forma enfática, que a instrução, que até aí não era da responsabilidade de um juiz, passava a sê-lo. Aquando da revisão constitucional de 1982, houve propostas no sentido de alterar aquela regra constitucional. Todavia, tais ideias não lograram aprovação, e a única alteração consistiu em dispor que o juiz de instrução pudesse delegar noutras entidades a prática de actos instrutórios, salvo dos que se não prendam directamente com os direitos fundamentais (2.ª parte do preceito na sua actual redacção). Foi portanto reafirmada a regra do carácter jurisdicional da instrução. Ora o presente CPP procede de novo a uma cisão da instrução em duas fases: uma, a que agora chama de «inquérito», que é, de novo, confiada ao MP e retirada portanto da competência judicial; outra, que agora detém em exclusivo o nome de «instrução», que continua confiada a um juiz.
Estruturalmente, voltou-se à situação pré-constitucional, definida no Decreto-Lei 35007. Ou seja: regressou-se a um sistema essencialmente idêntico àquele que a CRP quis abolir. Por isso, não pode ser mais flagrante a infracção à CRP que por essa via se efectua. É certo que o Código se guarda de considerar o tal «inquérito» como instrução, pretendendo, assim, solertemente, esquivar-se à condenação por inconstitucionalidade. Mas a «habilidade» é demasiado grosseira para merecer o sucesso com que o presente acórdão entendeu dever premiá-la. A verdade é que o legislador não pode pretender definir livremente os conceitos utilizados pela CRP. Se a lei fundamental utilizou indubitavelmente o conceito de instrução para abranger «toda a instrução» (isto é, na antiga nomenclatura, não apenas a «instrução contraditória», mas também a «preparatória»), não pode vir o legislador a rebaptizar de «inquérito» a antiga instrução preparatória para assim a furtar à competência do juiz.
Para efectuar as revisões constitucionais só valem as leis de revisão constitucional. As leis comuns, quando contrárias à CRP, essas devem ser declaradas inconstitucionais, para os devidos efeitos. Pelos motivos expostos, entendo que as disposições em causa não deveriam ter tido outra sorte.”
19-o arrazoado pelo DCIAP traduz ostensiva violação do Principio da Legalidade imposto pelo artº 7º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos;
20-a Lei Fundamental Portuguesa está plenamente em vigor, nunca foi alterada ou revogada e continua a impor no nº 4 do artº 32º que “ toda a instrução é da competência de um Juiz; porque razão MP autua, inicia e “cozeu” o inquérito em lume brando entre 2018 e 2023??? e NÃO o JUIZ de INSTRUÇÃO?- a resposta só pode ser a declaração de nulidade do processado. Em suma: o DCIAP usurpou um acto que é da competência do JIC sob o artº 32-4 da CRP pelo que urge declarar a nulidade do processado desde a autuação do inquérito.
21- na sessão de julgamento ocorrida em 27-9-2024 a testemunha PPP foi confrontada com a seguinte questão:
advogado do arguido HH: minuto:9H15: “ era ou não era possível à Policia investigar sem apelo inicial a escutas telefonicas?
Testemunha PPP: “possível geralmente é….mas os resultados..” ( sic)
22-a defesa do arguido tentou colocar mais questões mas o Tribunal, na pessoa da MMª. Juiz Presidente interrompeu o signatário relegando a questão para alegações;
23-a defesa apresentou requerimento e esperava tivesse uma Decisão fundamentada pelo Tribunal mas decisão foi esta a fls 38 do Acordão:
“Decidindo:
Preliminarmente refira-se que o arguido HH nunca esteve sob intercepção telefónica inexistindo qualquer sessão onde tivesse sido escutado por contacto com os alvos interceptados nestes autos.
Em consequência nenhuma legitimidade tem para arguir vícios processuais relativamente a um meio de prova que contra o mesmo inexiste, em nada por isso o afectando.”
24-estranha-se mas não se entranha a Decisão pois na Acusação sob os artigos 367 e ss consta que o recorrente GG telefonou do seu (dele, GG) telemóvel ... para a testemunha RRR….. Posteriormente o arguido HH contactou com o arguido GG…-artº 368… Agora, em sede de Acórdão não existem escutas….e não tem legitimidade ( sic)
25-todo o caso acusatório é iniciado com intercepções telefónicas e o arguido, falante ou não, tem direito e o dever de impugnar uma prova viciada a não ser que tudo se deva a deficit cognitivo do mandatário que não alcança o estado a que chegou o Estado de Direito em 2024/2025….
26-resulta dos autos que a PJ iniciou em 2015 a investigação sob intercepções telefónicas; o Sr. JIC validou e determinou a prorrogação das intercepções sem motivação concreta de facto e de direito; os Despachos não contêm factos limitando-se a repetir conclusões e generalidades sem especificação de facto e de direito; parece que os Srs Inspectores da PJ não tiveram necessidade de investigar “no terreno” limitando-se a ouvir tudo e todos à volta dos telefones “grimpados”…
27-os sucessivos Despachos Judiciais desde o “parto” dos autos até à véspera das detenções dos arguidos são reproduzidos ipsis verbis pelo MMº JIC acolhendo in totum o que MP dixit; os telefones de diversos suspeitos foram escutados/ vigiados sob SUCESSIVAS PRORROGAÇÔES que atingiram mais de um (1) ano;
28-ocorre VIOLAÇÃO da LEI COMUNITARIA sob NULIDADE INSANÁVEL; urge declarar a
- violação do Principio da Proporcionalidade insito ao artº 18º -2 da Lei Fundamental; - violação do artº 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem
- violação do Principio da Fundamentação do acto decisório;
- ausencia de motivação de facto nas sucessivas prorrogações de intercepções;
- violação do limite temporal “ case POPESCU contra Roménia” – TEDH # hudoc.coe.int
29-os despachos judiciais proferidos pelo Sr. JIC do TCIC violaram o Principio da proporcionalidade face à invasão do direito fundamental à privacidade e à inviolabilidade das comunicações - arts. 34º-1, 18º e 26º da Lei Fundamental; a intercepção e gravação é apenas ordenada ou prorrogada quando “houver razões para crer que a diligencia é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter” – artº 187-1 do CPP, estando assim subordinada ao Principio da Subsidariedade;
30-o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tem decidido que o Principio da Proporcionalidade se retira do segmento do artº 8- 2 da Convenção Europeia na parte em que exige que a medida seja necessária numa sociedade democrática; as escutas telefónicas não são nem podem ser um meio de manter sob vigilância ad eternum um suspeito na expectativa de vir a ser detectado um flagrante delito ou uma palavra “suspeita”; uma investigação iniciada com intercepções e conclusões genéricas traduz nulidade insanável e violação ostensiva dos Princípios por que se rege o Estado Português, porquanto a violação da privacidade traduz atentado contra o artigo 8º da Convenção Europeia, que a nossa Lei Fundamental acolheu no artigo 8º da CRP; e é contra os art- 47º. 48º e 54º da CARTA.
31-a praxis vertida nos autos traduz violação ostensiva do artº 8º da Convenção Europeia; os Despachos que ordenaram as intercepções telefónicas, desde o primeiro até ao último, não cumpriram o Principio da Substanciação; segundo este Principio não basta a indicação genérica do direito que se pretende fazer valer, sendo antes necessária a indicação especificada dos factos constitutivos desse direito: Prof. Alberto dos Reis, CPC anot, vol. II, p. 356, M. Andrade, ob. cit., p. 297, Castro Mendes, Manual de Processo Civil, p. 299 e Antunes Varela, Manual de Processo Civil, p. 692 ; Menezes Cordeiro, Direitos Reais, 1979, II; p. 84 e Anselmo de Castro, Direito Proc. Civ. , Almedina, Coimbra, 1981, I Vol.,. 207/208;
32-ora, “…o Juiz de Instrução deve “adaptar” a sua decisão final de autorização da ingerência ao novo circunstancialismo fáctico que lhe é sugerido e que, por si só, justifica, segundo os órgão de investigação (policia judiciária) uma prorrogação ou uma prorrogação e ampliação da medida inicial…Trata-se de uma fundamentação especifica que vai ao encontro dos novos factos que motivam o pedido de prorrogação…”- “ Das Escutas Telefónicas, Tomo 1- pág. 225-Sr Dr. Benjamim Silva Rodrigues, ed. Coimbra 2009
33-a investigação em Portugal incorreu em “travesti”: transformou a excepção em regra; o que é excepcional como meio de obtenção de prova vg. escutas telefónicas, travestiu-se em REGRA; a NORMALIDADE é escutar tudo e todos a ver “se cai alguma frase, uma palavra” para incriminar;
34-mais grave é o “REVIREMENT JURISPRUDENTIEL” que os Tribunais Superiores fazem ao agasalharem as escutas como a sacrossanta regra da investigação contra o artº. 8º da Convenção Europeia; o direito ao segredo das comunicações é lesado com a obtenção não apurada de dados privados do cidadão, cf. “Requette Malonne v. Reino Unido” - nº 8691/79, de 2-8-1984
35-mais grave ainda é o “livre arbítrio” da Policia na escolha, selecção e destruição do que melhor entende o que atenta contra o artº 8º da CEDH, como decidiram os Srs. Juízes de Estrasburgo no “ affaire Dumitru Popespu contra Roménia ( nº 2), proc nº 71525/01 de 26-4-2007;
36-a nulidade das primeiras escutas telefónicas, e todas as sucessivas, transforma-as em prova proibida, inquinam todo o processado, não podendo ser utilizadas para obtenção de outras provas, e para in fine perseguir e condenar o arguido; acresce que, os Despachos Judiciais que prorrogaram as intercepções telefónicas são nulos, por não conterem fundamentação autónoma do inicial: a sucessiva prorrogação / reinício das intercepçoes telefónicas reproduzindo ipsis verbis o teor dos anteriores Despachos Judiciais não contêm fundamentação autonoma da inicial; o regime das “escutas telefonicas” em Portugal vai contra a CARTA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIÂO EUROPEIA.
37-os Despachos são de cariz automático, sem factos, sem ponderação das razões para persistir na intercepção telefónica sucessivamente…. por anos e anos…na verdade: “…o Juiz de Instrução deve “adaptar” a sua decisão final de autorização da ingerência ao novo circunstancialismo fáctico que lhe é sugerido e que, por si só, justifica, segundo os órgão de investigação ( policia judiciária) uma prorrogaçã ou uma prorrogação e ampliação da medida inicial…Trata-se de uma fundamentação especifica que vai ao encontro dos novos factos que motivam o pedido de prorrogação…”- “ Das Escutas Telefonicas, Tomo 1- pag 225-Sr. Dr. Benjamim Silva Rodrigues, ed. Coimbra 2009.
38-oTribunal Europeu dos Direitos Humanos aponta no sentido de as legislações nacionais assegurarem a comunicação intacta e completa das gravações efectuadas, para efeito de controlo pelo juiz e pela defesa e estabelecerem as circunstâncias em que se pode operar o apagamento ou a destruição das gravações: Case Huvig v. França, de 24-4-1990- nº 34; Kruslin v. França- nº 35; case Valenzuela Contreras v. Espanha, de 30-7-1998- nº 59; Acórdão Prado Bugallo v. Espanha 18-2-2003- nº 30; o TEDH criticou os Países requeridos porque o sistema não oferece garantias contra os abusos a recear; o Órgão de Soberania JIC atentou contra os arts 8º da C.E.D.H. e 47º - 2 da CARTA; e não pode agora o Tribunal de recurso secundar tamanho erro que abala a base probatória !...
39-Uma questão mais relevante ainda é que em Portugal NÃO EXISTE LIMITE À PRORROGAÇÃO DAS INTERCEPÇÔES TELEFONICAS; podem ser 3 meses, 1 ano, 2 anos ou, pasme-se, SEIS (6) ANOS no caso Rómulo Costa, proc. 5/13.1JBLSB- Juiz 1 Central Criminal de Lisboa, acusado de “terrorismo”, até que a PJ no conforto do novo edifício da Rua 1 encontre “algo” para fundamentar o relatório que sirva de base à Acusação !!!!
40-no caso 99/17.0JBLSB investigado pelo DCIAP “ SSS e TTT” enjaulados no EP Monsanto ( condenados a 10 e 16 anos de prisão) privados de contacto escrito e telefónico com o mundo exterior - advogado signatário inclusivé- há mais de 3 anos, a PJ/DCIAP usou o “varrimento eletrónico” .. não previsto na Lei….e assim vai Portugal em 2024…2025….
41- a Lei não é clara nem previsível o que, à luz dos parâmetros da Convenção Europeia dos Direitos do Homem traduz uma ingerência sem justificação, não prevista na lei, sem qualidade e sem limite temporal: “case KOPP contra Suíça, 25-3-1998, recueil 1998-II, p 450§ 53
42-o artº 48º da CARTA é incompatível com normas nacionais que impedem o direito de Contraditório relativamente às diligências de investigação realizadas no inquérito e que envolvam a intercepção e gravação de comunicações telefónicas; impõe-se CLAREZA na LEI; um País que vigia, sem limite temporal, qualquer cidadão, colocando-o “ sob escuta”, anos e anos seguidos é um Estado que vive sob a égide de George Orwell “1948-1984” próprio de ditaduras de caracter persecutório ad eternum e sem limites !!! Nota relevante: daí a necessidade de questionar o Tribunal de Justiça da União Europeia sobre a interpretação da validade e compatibilidade da lei processual portuguesa com o artº 48-2 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e Directivas publicadas no JOCE que se impoem no nosso ordenamento jurídico…
43- a mentalidade medieval-carcerária que grassa em muitos cérebros Lusitanos necessita de ser iluminada pelas luzes que a Revolução Francesa trouxe ao mundo maxime sob a Convenção Europeia dos Direitos Humano, a CARTA e a Justiça do Luxemburgo; nos Tribunais Portugueses a Jurisprudência da União Europeia e da COUR é ignorada ostensivamente, salvo poucas mas honrosas excepções, como, por ex., na Relação de Évora, os notáveis Acórdãos do Senhor Juiz Desembargador João Gomes de Sousa, publicados na Revista Sub Judice e no site www.dgsi.pt. E a ainda as várias decisões de um Senhor Juiz do TCIC, agora no TRL, “crucificado” pela imprensa por decidir em consonância com os Princípios Comunitários….
44-a lei permite colocar ad eternum um cidadão sob suspeita anos e anos a ser ouvido pelas Policias !!!!! o telefone parece ser o único e primordial meio de investigação para a P.J., DCIAP, DIAP, TCIC e JIC; é caso para questionar se não existem meios menos lesivos da invasão da privacidade? -se o cidadão suspeito for mudo ou não usar telemóvel como investigam ?..??
45-ao abrigo dos artigos 8º -2 da CEDH, 48º da CARTA, 32º- 1 e 26º da CRP, 187º a 190º do CPP urge que V. Exas. se dignem declarar a nulidade dos Despachos Judiciais que determinaram e validaram as interceções telefónicas com as inerentes consequências;
46-a apreciação “crítica” proferida pelo Tribunal é inexistente, não satisfaz as exigências do ESTADO DE DIREITO; ocorre OMISSÂO DE PRONÚNCIA; o Tribunal não esclarece de forma esclarecida e em pormenor o processo de formação da convicção limitando-se a generalidades vagas, ocas e comuns; o Tribunal a quo limita-se a enumerar os meios de prova...
47-o art. 374- 2 C.P.P. é inconstitucional: viola o direito ao recurso sob o art 32-1 da CRP quando conjugado com o art 410- 2.b) e c) do CPP. entendida no sentido de que o exame crítico se basta com a mera enumeração dos meios de prova e a tecer generalidades, sem explicitar in extremis a formação da convicção do Tribunal;
48- parece evidente a OMISSÂO DE PRONÚNCIA e inexiste motivação concreta / exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal- vidé UUU ..in Jornadas de Direito Processual Penal, 229-230; TRL Ac. De 29-6-1995 in in Col. Jur. Ano III -T. 2 - 254; …”TRL 10-7-02- Proc. 3719/02 da 3ª SECÇÂO
49-o art 379 -1-C) do CPP fulmina com NULIDADE a Sentença quando deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar. O Tribunal Constitucional por Colendo Acórdãos nº 680/98 e 636/99 decidiu que é inconstitucional o art 374- 2 do CPP por violação do dever de fundamentação das Decisões Judiciais e do direito ao recurso - arts 32- 1 e 205 CRP quando entendido que não se exige o processo de formação da convicção do Tribunal para fundamentar a decisão em matéria de facto; nos factos dados como provados não se vislumbra o “iter criminis” entre os mesmos e a conduta do arguido. Não se provou qual a concreta e individual conduta do arguido, pelo que se verifica ausência de motivação e fundamentação.
50- o arguido não deve ser condenado; não existe “cordão umbilical” que ligue a conduta do arguido aos factos pelos quais foi condenado; a pena de multa é imerecida e injusta; o arguido deve ser absolvido; se assim não se entender a pena adequada será a multa por 20 dias x 5€ ou 100€ ( valor mínimo para aquisição de uns crustáceos (camarão tigre), prato de entrada habitual na Adega dos Fadistas, sita na Ermegeira- ...…)
O referido recurso foi admitido por despacho de 10-01-2025.
I.2.H.b. Da resposta:
Ao dito recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência, concluindo da seguinte forma:
1. Não existe qualquer inconstitucionalidade do art.º 311.º do Código de Processo Penal, por violação do “processo equitativo” previsto nos artigos 8.º e 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, e no art.º 6.º, n.º 1, da CEDH, na medida em que nessa fase processual o juiz não efetua qualquer juízo probatório sobre o caso concreto, mas unicamente verifica se processualmente existem os pressupostos ali legalmente consagrados para o recebimento da acusação.
2. Não existe qualquer inconstitucionalidade do art.º 263.º do Código de Processo Penal por violação do art.º 32.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, tendo em conta a motivação já estabelecida a esse propósito pelo Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 7/87.
3. Não existe qualquer nulidade dos despachos judiciais que determinaram a realização de interceções telefónicas e a subsequente validação.
4. Não existe, no caso concreto, qualquer inconstitucionalidade do art.º 374, n.º 2, do Código de Processo Penal, por violação do direito ao recurso previsto no art.º 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa “quando conjugado com o art 410- 2.b) e c) do CPP. entendida no sentido de que o exame crítico se basta com a mera enumeração dos meios de prova e a tecer generalidades, sem explicitar in extremis a formação da convicção do Tribunal, uma vez que, conforme resulta da motivação da matéria de facto do acórdão recorrido, existiu descrição e discussão crítica da prova produzida.
5. Igualmente os factos dados como provados sob os n.os 197 a 204 permitem determinar a concreta conduta do arguido ora recorrente e a sua motivação para a respetiva prática.
6. Não colhe a argumentação do recorrente no que respeita a uma eventual desproporção da pena aplicada, tendo em conta a própria fundamentação apresentada pelo Tribunal “a quo” para a respetiva determinação e fixação.
7. Deve, assim, a condenação do arguido recorrente manter-se nos seus precisos termos.
I.3. Da tramitação subsequente:
Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer através do qual propugnou pela improcedência dos recursos referentes aos arguidos AA, BB, CC, DD, EE, GG e HH, acompanhando as respostas apresentadas pelo Ministério Público em 1.ª instância, aponto o seu visto no que se refere ao recurso interposto pelo arguido FF.
Tendo sido dado cumprimento ao disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo penal (C.P.P.), nada foi acrescentado.
Foi indeferida a realização da audiência requerida pelo recorrente FF, do que não reclamou.
A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer através do qual propugnou pela improcedência do recurso interposto pelo arguido FF, acompanhando a resposta apresentada pelo Ministério Público em 1.ª instância.
Tendo sido dado cumprimento ao disposto no art.º 417.º, n.º 2, do C.P.P., apenas foi apresentada resposta ao dito parecer pelo recorrente GG que, contudo, não foi admitida.
Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos submetidos a conferência.
Nada obsta ao conhecimento do mérito, cumprindo, assim, apreciar e decidir.
II. Fundamentação:
II.1. Dos poderes de cognição do tribunal de recurso:
Está pacificamente aceite na doutrina (cfr., por exemplo, MESQUITA, Paulo Dá, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V, 2024, Livraria Almedina, pág. 217; POÇAS, Sérgio Gonçalves, in “Processo Penal – Quando o recurso incide sobre a decisão da matéria de facto, Julgar, n.º 10, 2010, pág. 241; SILVA, Germano Marques da, in Curso de Processo Penal, Vol. III, 2.ª edição, 2000, pág. 335) e jurisprudência (cfr., por exemplo, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-02-2024, processo n.º 105/18.1PAACB.S12) que, sem prejuízo do conhecimento oficioso de determinadas questões que obstem ao conhecimento do mérito do recurso (cfr., por exemplo, art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P.), são as conclusões que delimitam o seu objeto e âmbito, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19-10-1995, para fixação de jurisprudência, in Diário da República n.º 298, I Série A, de 28-12-1995, págs. 8211 e segs.3).
Na verdade, se o objeto do recurso constitui o assunto colocado à apreciação do tribunal de recurso e se das conclusões obrigatoriamente devem constar, se bem que resumidas, as razões do pedido (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.) e, assim, os fundamentos de facto e de direito do recurso, necessariamente terão de ser as conclusões que identificam as questões que a motivação tenha antes dado corpo, de forma a agilizar o exercício do contraditório e a permitir que o tribunal de recurso identifique, com nitidez, as matérias a tratar.
II.2. Das questões a decidir:
II.2.A. Da correção de um lapso:
Na parte da fundamentação jurídica exarada no acórdão recorrido referente à escolha e determinação da medida da pena, e aí identificada como “IV- Da escolha e determinação da medida da pena”, consta:
“11. VVV:”;
quando se queria dizer:
11. HH:
Nenhum dos arguidos nestes autos se chama VVV, sendo que da leitura do exarado naquele ponto do acórdão recorrido facilmente se conclui que aí foi escolhida e determinada a pena relativamente ao crime cometido pelo recorrente HH.
Trata-se, pois, de um mero lapso de escrita em que incorreu o tribunal recorrido, sendo o mesmo evidenciado pelo próprio texto do acórdão recorrido e que é suscetível de correção oficiosa por esta instância de recurso, nos termos do art.º 380.º, n.ºs 1, al. b), e 2, do C.P.P.
Pelo exposto e ao abrigo do citado preceito legal, na parte da fundamentação jurídica exarada no acórdão recorrido referente à escolha e determinação da medida da pena, e aí identificada como “IV- Da escolha e determinação da medida da pena”, onde consta:
“11. VVV:”;
deve passar a ler-se:
11. HH:
II.2.B. Do objeto dos recursos:
Não obstante o recorrente FF, na motivação (corpo) do recurso que interpôs, ter entendido que apenas deveria ser condenado por 1 crime de exercício ilícito da atividade de segurança privada cometido na forma continuada, e não por 5, em concurso efetivo, o certo é que não levou tal matéria às conclusões, pelo que, tendo em conta o carácter delimitador do objeto do recurso reconhecido às conclusões, na senda da doutrina e jurisprudência dos tribunais superiores, ter-se-á que entender que restringiu tacitamente o objeto do recurso (cfr. SIMAS SANTOS, Manuel e LEAL-HENRIQUES, Manuel, in Recursos Penais, 9.ª edição, Rei dos Livros, 2020, pág. 112 e nota 3 da pág. 113; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-02-2024, processo n.º 105/18.1PAACB.S14; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26-10-2023, processo n.º 309/22.2GDLLE.S15).
Assim, à luz dos poderes de cognição desta instância (cfr. II.1.), são as seguintes as questões a conhecer, pela ordem da prevalência processual sucessiva que revestem:
A. Se o art.º 263.º do C.P.P. é inconstitucional, por violação do art.º 32.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (C.R.P.), tornando o processado nulo desde a autuação do inquérito (cfr. II.4.A.);
B. Se o art.º 311.º do C.P.P. é inconstitucional por violação do disposto no art.º 8.º e 32.º, n.ºs 2 e 5, da C.R.P. e 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (C.E.D.H.) (cfr. II.4.B.);
C. Se são válidas as interceções e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas efetuadas (cfr. II.4.C.);
D. Se o acórdão recorrido é nulo (cfr. II.4.D.):
- por falta de fundamentação – elenco dos factos provados, indicação e exame crítico das provas ou dos motivos para aplicar uma pena de substituição (cfr. arts. 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P.) (cfr. II.4.D.a.);
- por omissão de pronúncia no que se refere ao perdão de penas previsto nos arts. 2.º e 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08 (cfr. art.º 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P.) (cfr. II.4.D.b.);
E. Se o acórdão recorrido padece dos seguintes vícios (cfr. II.4.E.):
- insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a que alude o art.º 410.º, n.º 2, al. a), do C.P.P (cfr. II.4.E.a.);
- contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, a que alude o art.º 410.º, n.º 2, al. b), do C.P.P. (cfr. II.4.E.b.);
F. Se há erro de julgamento, nos termos do art.º 412.º, n.º 3, als. a) e b), do C.P.P. (cfr. II.4.F.);
G. Se o enquadramento jurídico-penal de alguns dos factos apurados está correto (cfr. II.4.G.):
- Se o crime de coação agravado, p. e p. pelos arts. 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do C.P. cometido pelo recorrente BB, é tentado ou consumado (cfr. II.4.G.a.);
- Se os factos cometidos pelo recorrente GG consubstanciam a prática de algum crime de falsificação de documento, p. e p. pelos arts. 255.º, al. a), e 256.º, n.º 1, al. d), do C.P. e, na afirmativa, qual o seu número, bem como se alguns deles foram cometidos na forma continuada (cfr. II.4.G.b.);
H. Da escolha das penas no que se refere aos crimes de falsificação de documento cometidos pelo recorrente GG e ao crime de detenção de arma proibida cometido pelo recorrente FF (cfr. II.4.H.);
I. Da dosimetria das penas (cfr. II.4.I.);
J. Da aplicação do perdão de nos termos dos arts. 2.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08 (cfr. II.4.J.);
K. Se as penas de prisão aplicadas ao recorrente BB, ao recorrente EE e ao recorrente FF deveriam ser suspensas na sua execução (cfr. II.4.K.); e
L. Da condição da suspensão da execução da pena única aplicada ao recorrente GG (cfr. II.4.L.).
II.3. Ocorrências processuais com relevo para apreciar as questões objeto do recurso:
Ora, com relevo para o definido objeto do recurso, e resultante dos atos processuais a seguir assinalados, importa atentar no seguinte:
II.3.A. Da questão prévia decidida no acórdão recorrido (cfr. ref.ª 163104537 de 29-11-2024):
No acórdão recorrido, foi decidida a seguinte questão prévia:
No decurso da produção de prova em sede de audiência de julgamento veio a defesa do arguido HH (requerimento certificado no citius a 3.10.2024) suscitar a nulidade das intercepões telefónicas por os despachos judiciais que as determinaram, validaram e prorrogaram padecerem de fundamentação de facto e de direito.
Sem invocar um despacho concreto, uma intercepção telefónica específica, um auto, uma validação, a defesa, de forma genérica entra em teorização, recorrendo a citações doutrinárias, a jurisprudência do tribunal europeu e ao direito comparado que mais parece uma crítica legislativa do que um ataque à existência de vícios processuais que reputa de tão graves (sem os identificar) capazes de inquinar todo o processado.
Decidindo:
Preliminarmente refira-se que o arguido HH nunca esteve sob intercepção telefónica inexistindo qualquer sessão onde tivesse sido escutado por contacto com os alvos interceptados nestes autos.
Em consequência nenhuma legitimidade tem para arguir vícios processuais relativamente a um meio de prova que contra o mesmo inexiste, em nada por isso o afectando.
As proibições de prova dão lugar a provas nulas (artigo 32, nº 8, da Constituição da República). Porém, a nulidade das provas proibidas obedece a um regime próprio, distinto da nulidade insanável e da nulidade sanável. Trata-se de um regime complexo que distingue dois tipos de proibições de provas consoante atinjam a integridade física e moral da pessoa humana ou a privacidade da pessoa humana.
A nulidade processual vai ancorar em razões de índole processual que não estão directamente ligadas com a norma constitucional.
Concorda-se, assim, com WWW (Da autonomia do regime de proibições de prova em Prova Criminal e Direito de Defesa, Coimbra, Edições Almedina, 2010 pag 257 e seg.) quando refere que:
- a) As proibições de prova têm como fundamento básico o princípio da dignidade da pessoa humana, enquanto as nulidades se reportam à legalidade e a questões formais ou ligadas à economia processual;
b) O desvalor jurídico das proibições de prova produz-se ex lege, sem necessidade de qualquer acto posterior, o que não acontece com as nulidades, que têm de ser declaradas;
c) As proibições de prova resistem ao caso julgado, havendo lugar a recurso extraordinário de revisão quando se descubra que foi utilizada uma prova proibida, enquanto as nulidades, mesmo as insanáveis, se consolidam na ordem jurídica com o trânsito em julgado;
d) A arguição das proibições de prova não está sujeita a qualquer prazo, o que não sucede com as nulidades, que por vezes têm de ser arguidas em prazos muito curtos;
e) A concepção do regime das proibições de prova serve-se de conceitos indeterminados para abranger todo o tipo de situações que diminuam os bens jurídicos por elas tutelados, ao passo que o regime das nulidades é taxativo, sendo nulo apenas o acto que a lei cominar expressamente com a nulidade (artigo 118.°, nº 1).
Importa por isso efectuar uma destrinça, fundamental no caso, que se situa na diferença entre ilegalidade formal e substancial.
Como refere Carlos Adérito Teixeira (Escutas telefónicas: a mudança de paradigma e os velhos e novos problemas Revista do CEJ 1º Semestre de 2008 número 9 pag 293) o regime aplicável às intercepções é o das proibições de prova a que alude o nº3 do artigo 126, e que este convoca um regime diverso do número 1.Refere o mesmo que consequentemente, haverá que distinguir, caso a caso, à luz do parâmetro conceptual, os vícios que constituem verdadeiras proibições de prova ( 190.°,126.°, e nº3 3 do 118.° do CPP e art. 32.° nº 8 da CRP) das nulidades ou mesmo irregularidades. Na verdade, embora o legislador tenha cominado a nulidade para "os requisitos e condições" dos dispositivos que antecedem o art. 190.°, a verdade é que o art. 188.° mostra-se muito "regulamentador", havendo inúmeros aspectos formais que ali se subsumem e em face do que se afigura distorcer os conceitos, associando meras formalidades a violações de "limites materiais".
A separação de regimes que têm subjacente a substância e a forma está patente no domínio específico das escutas telefónicas, na diferenciação entre o desrespeito pelos arts 187º ou 188.° que deve conduzir à aplicação de um regime sancionatório diverso entre si.
Diversamente, no art. 188.° estamos apenas perante matéria procedimental que não contende com aqueles direitos. O momento decisivo em que estes foram colocados em causa surgiu com a autorização e verificação da existência dos respectivos pressupostos.
A primeira conclusão é, assim, a de que a existir uma irregularidade processual nas decisões proferidas nunca a mesma poderia ser equiparada a uma proibição de prova.
Importa salientar que a falta de fundamentação implica a inexistência dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e só a falta absoluta de fundamentação determina a sua nulidade. Efectivamente não padece desse vício a decisão que contém uma fundamentação deficiente, medíocre ou mesmo errada ou como referia Alberto dos Reis «o que a lei considera causa de nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou a mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz a nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.
A falta de fundamentação da decisão, seja ela um mero despacho ou uma sentença, há-de revelar-se por ininteligibilidade do discurso decisório, por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira. É pela fundamentação que a decisão se revela como um acto não discricionário e sim como uma operação lógica em cujas premissa a lei e os factos constituem o núcleo fundamental.
Deste modo, se conclui que a nulidade da decisão não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente, ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida a final.
O despacho de autorização da escuta deve, fundamentalmente, tornar perceptíveis as razões que, em face do artigo 187º do Código de Processo Penal, levam o juiz a autorizar a escuta, permitido o escrutínio da sua decisão.
Só o incumprimento de tal ónus de fundamentação dos requisitos legais da escuta pode justificar a sanção da nulidade do artigo 190º do mesmo diploma e não a existência de uma fundamentação deficiente, mas suficientemente explicita nos seus fundamentos.
Aqui chegados analisando-se os despachos judiciais que deferiram as intercepções telefónicas e todos subsequentes que as analisaram, validaram e prorrogaram não se detecta nenhuma decisão judicial que não esteja devidamente fundamentada.
Aliás, o Sr. Juiz de instrução foi sempre muito ponderado e cauteloso e contrariamente ao que vem sustentado (certamente por desconhecimento do teor dos despachos) nunca decidiu “como se promove”. Assim, no primeiro despacho que analisa o requerimento com vista ao deferimento das intercepções, a fls. 189 a 193, somente foi autorizada o registo de imagens dos suspeitos; no despacho de fls. 218 e ss, juntos aos autos as informações relativas à titularidade dos números de telefone a interceptar (de fls. 200 a 217) foi parcialmente deferida a realização das intercepções (quanto aos então suspeitos BB, XXX e AA) ponderando-se de forma criteriosa os crimes em investigação, a prova já colhida para aos autos e a que se impunha ainda recolher bem como as dificuldades de a obter sem recurso às intercepções já que se investigavam crimes cometidos em espaços interiores de diversão nocturna relacionados, além do mais com segurança privada ilícita. Com o avanço das investigações da mesma forma ponderada e fundamentada por despacho de fls. 340/346 foram deferidas as intercepções telefónicas relativamente a DD e somente por despacho de fls. 372 a 376, foi o então suspeito FF alvo de intercepção telefónica.
Todos os despachos foram sempre devidamente suportados na prova indiciária que ia sendo reunida nos autos e nas exigências e dificuldades de uma investigação criminal da natureza dos autos, tendo-se sempre em consideração a evolução e dinâmica da investigação no processo em causa.
De qualquer forma, mesmo a considerar-se o ou os referidos despachos insuficientemente fundamentados, tal revestiria apenas as vestes de meras irregularidades, já sanadas, porque não decretadas em tempo devido. É assim que a jurisprudência tem vindo a caracterizar a falta ou insuficiência de fundamentação dos despachos judiciais de autorização de intercepções telefónicas.
A saber:
“A falta de fundamentação das decisões judiciais, situação que se traduz na falta de especificação dos motivos de facto e de direito da decisão – art.º 205.º, n.º 1, da CRP e 97.º, n.º 4, do CPP – constitui mera irregularidade – art.º 118.º, n.ºs 1 e 2 – a menos que se verifique na sentença, acto processual que (…) a lei impõe obedeça a fundamentação especial sob pena de nulidade – arts. 379.º, n.º 1, al. a) e 374.º, n.º 2 do mesmo diploma legal “Ac. do STJ de 21/2/07, proc. 06P3932”.
“(…) contudo, a falta absoluta ou insuficiência de fundamentação do despacho decisório autorizando as intercepções telefónicas requeridas pelo M.P.) constitui apenas mera irregularidade sanável se não for impugnada atempadamente nos termos do artº 123º, nº 1, do CPP” Ac. do STJ, de 28/3/12, proc. 86/08.0GBOVR.P1.
Ou ainda, do acórdão do STJ, de 7/12/05, proc. 05P2942, “as eventuais nulidades pelo não cumprimento do disposto no artº 188º do CPP devem ser arguidas no prazo de cinco dias após a notificação do despacho que encerrou o inquérito, nos termos do artº 120º, nº 3, al. c) do CPP. Não o sendo devem considerar-se sanadas(…)”.
Não foi o que ocorreu no caso ora sub judice. Não obstante o conhecimento dos despachos judiciais relativos às intercepções telefónicas e o seu teor, só agora, em julgamento e mesmo após a fase da instrução, vem colocada tal questão sem razão e extemporaneamente.
Termos em que improcede a nulidade apontada pela defesa.
II.3.B. Da matéria de facto considerada no acórdão recorrido (cfr. ref.ª ... de 29-11-2024):
É a seguinte a matéria de facto considerada pelo tribunal de 1.ª instância:
II- Fundamentação:
Com relevo à boa decisão da causa, o tribunal dá como provados os seguintes factos:
(…)
autos principais (queixoso XX)

No dia ...de 2016, entre as 04H00 e as 05H00, XX dirigiu-se ao estabelecimento comercial de diversão noturna denominado de “...”, sito no …, acompanhado de EEE, a fim de festejarem o Carnaval.

Na “...” encontravam-se a desempenhar funções de … os arguidos AA e BB.

Também aí se encontrava o arguido CC, conhecido pela alcunha de “…”.

O arguido CC não era titular de cartão profissional de segurança, emitido pelo MAI/PSP, que o habilitasse a desenvolver a referida atividade.

A dada altura, a propósito de um desacato relativo ao consumo de uma garrafa de álcool, DDD foi expulso da discoteca por um indivíduo cuja identidade não se apurou.

A pulseira adquirida pelo ofendido que lhe permitia o acesso à discoteca no período festivo do carnaval foi-lhe retirada do pulso com recurso a força por um dos vigilantes do estabelecimento.

Já no exterior da discoteca, XX foi agarrado pelos arguidos AA e CC e empurrado para as traseiras da “...”, longe da estrada principal e onde não era provável que fossem vistos por transeuntes.
10º
De seguida, o arguido CC agarrou o ofendido pelo pescoço e projetou-o para o chão, onde o estrangulou apertando-lhe o pescoço com ambas as mãos. Em ato contínuo, os AA e CC desferiram vários socos e pontapés no corpo do ofendido, que estava deitado no solo e impedido de se defender.
11º
EEE, amiga do ofendido XX, ao ver o que se tinha passado em frente da porta da “...”, foi no encalço dos dois arguidos e do ofendido e presenciou as agressões de que este estava a ser vítima.
12º
A determinado momento, o ofendido XX foi revistado por um ou ambos os arguidos que lhe tiraram a carteira e do seu interior retiraram uma nota do Banco Central Europeu com o valor facial de € 10,00, fazendo-a sua, restituindo-lhe a carteira.
13º
Após os factos descritos, os arguidos AA e CC afastaram-se de volta para a “...”, deixando o ofendido com dores intensas e hematomas evidentes na cara e no tronco.
14º
Acorreu ao local uma patrulha da Guarda Nacional Republicana comandada pelo Guarda Principal YYY que identificou alguns dos intervenientes. XX foi ainda assistido pelos Bombeiros Voluntários de ..., que o transportaram ao Hospital de ....
15º
Os arguidos AA e CC, agindo em comunhão de vontades, sabendo que ao atuarem conjuntamente diminuíam a possibilidade de defesa do ofendido XX, representaram a possibilidade de atingirem a sua integridade física e agiram com a intenção de concretizar tal desiderato, o que lograram alcançar.
16º
Os arguidos AA e CC, agindo em comunhão de vontades e em conjugação, agiram com a intenção de integrarem no património do arguido AA a nota de € 10,00 que o mesmo retirou ao ofendido, sabendo que tal bem era pertença do ofendido e que não tinham autorização deste para os atos que praticaram.
17º
Os arguidos AA e CC, agindo em comunhão de vontades e em conjugação de esforços, representaram e quiseram, mediante a utilização de força física, agressões e intimidação, anular a capacidade de resistência do ofendido para lhes subtraírem o referido bem e agiram com a finalidade concretizar tal desejo, o que realizaram.
(…)
apenso 493/17.7PATVD
45º
No ano de 2017, ZZ trabalhava para a empresa de segurança privada com a denominação de “LB”, no qual desempenhava as funções de coordenador.
46º
Na mesma altura, o arguido BB trabalhava como ...na empresa de segurança privada denominada “…”, empresa que concorria no mesmo mercado da empresa para a qual trabalhava o ofendido. Na verdade, ambas as empresas disputavam o mercado da prestação de serviços de segurança em estabelecimentos de diversão noturna na área conhecida por zona ….
47º
Por motivos não apurados, gerentes de estabelecimentos de diversão noturna passaram a contratar a “LB”, rescindindo com a “…”, circunstância que desagradou o arguido BB.
48º
No dia … de 2017, entre as 02H00 e as 03H00, no interior do estabelecimento comercial de diversão noturna denominado “…”, sito na Rua 2, em ..., o arguido BB dirigiu-se ao ofendido ZZ e perguntou se lhe “podia dar duas palavras”, ao que o ofendido anuiu.
49º
De seguida, o arguido BB disse, dirigindo-se ao ofendido ZZ, “venho aqui avisar-te que se fores à Kikas novamente ou a alguma casa que seja minha vou-te rebentar todo, já que comeste a ... e o carnaval de .... Se voltar a acontecer alguma coisa do género vou-te matar. Viste bem o que fiz ao ZZZ na ... quando lá fui e já estive a falar com o AAAA, por isso se não quiseres que te aconteça a mesma coisa é melhor meteres-te fininho”.
50º
Com estas palavras queria o arguido BB transmitir ao ofendido que já tinha agredido um individuo mutuamente conhecido (o arguido BBBB) que também trabalhava para a “LB”, que já tinha ameaçado o AAAA (o arguido CCCC) também trabalhador da “LB” e que se predispunha a agredir o ofendido ou mesmo a tirar-lhe a vida no caso de mais estabelecimentos de diversão noturna trocarem a “...” pela “LB”.
51º
Devido às palavras proferidas pelo arguido BB o ofendido ZZ ficou receoso pela sua integridade física e vida e apesar de não ter abandonado totalmente a sua actividade, deixou durante pelo menos dois anos, a parte comercial nocturna da segurança de ... e o Carnaval da mesma localidade.
52º
O arguido BB representou a possibilidade de anunciar ao ofendido que o iria agredir e tirar-lhe a vida se não omitisse determinada conduta, para assim o levar a não celebrar novos contratos para prestação de segurança a estabelecimentos noturnos e a abandonar tal atividade na zona de ..., agindo com a intenção de concretizar tal desiderato, o que alcançou.
53º
O mesmo arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que as suas condutas não lhe eram permitidas por lei.
autos principais – segurança privada ilícita - I.
54º
Desde 15 de Junho de 2010 que o arguido DD assume, de facto, a gerência da sociedade comercial “... -”, a qual tem por objeto social a prestação de serviços de segurança e de vigilância. O mesmo arguido foi gerente desta sociedade entre … de 2010 e … de 2012, data em que a sua cônjuge assumiu a gerência, porém o arguido DD nunca deixou de ser o gerente de facto assumindo a direção e a tomada das decisões comerciais e outras da mesma sociedade. O arguido e a sua conjuge detêm, desde …/2014, cada um, uma quota de 50% do capital social da mesma sociedade.
55º
Nessa qualidade e função, o arguido DD gere todas as diferentes dimensões da sociedade, para o que contrata e despede trabalhadores, entre os quais aqueles que realizam os serviços de segurança/vigilância, recebe e paga os créditos e os débitos da sociedade, outorga os contratos de segurança a realizar para os clientes da sociedade e ordena quem são os trabalhadores que prestam a segurança/vigilância em cumprimento desses contratos.
56º
Por vezes o arguido DD contrata indivíduos para fazerem o trabalho de segurança/vigilância, sem que os mesmos tenham vínculo laboral à sociedade e sem serem possuidores da legal e devida habilitação legal para o efeito (cartão profissional emitido pela Policia de Segurança Pública/Ministério da Administração Interna).
57º
Para ocultar a utilização de indivíduos não credenciados como seguranças/vigilantes e, assim, não ser alvo de processos criminais e contraordenacionais, o arguido DD utilizava estratégias como colocar tais indivíduos nos estabelecimentos de diversão noturna fazendo-os passar por clientes, ou em festivais identificando-se como socorristas.
58º
Entre … e … de … de 2015, realizou-se o Festival de …, que decorreu na praia …e a segurança do mesmo festival foi contratada pela organização do festival à empresa “... - SERVIÇOS DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA LDA.”.
59º
O arguido DD, na qualidade de gerente da sociedade “... - SERVIÇOS DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA LDA”, contratou o arguido EE para desempenhar funções de vigilante/segurança
60º
Em execução das ordens que recebeu do arguido DD, o arguido EE esteve, entre os dias 19 e 22 de Agosto de 2015, na praia …, a realizar serviço de ...no Festival de ….
61º
Porque o arguido EE não era possuidor de cartão profissional de segurança/vigilante, o arguido DD entregou-lhe uma camisola com o escrito “staff”, que o mesmo utilizou durante o festival, por forma a não ser descoberto que realizava serviço de segurança/vigilante.
62º
No desempenho das funções de vigilante/segurança e no cumprimento das ordens do arguido DD, o arguido EE percorria todo o espaço interior do mencionado festival, vigiava os participantes e procurava ver eventuais desacatos entre os mesmos por forma a sanar os conflitos. O mesmo arguido também percorria o espaço exterior ao festival de forma a vigiar os veículos estacionados, verificar a aproximação de peões e as suas intenções, velando para que ninguém se introduzisse nos veículos, nem subtraísse os bens e valores que aí se encontravam. Por vezes o arguido EE ficava junto da porta de entrada do festival para controlar as entradas e as saídas do recinto do festival ou ficava junto dos palcos para evitar que os participantes no festival subissem aos palcos e interferissem com o trabalho dos artistas.
63º
O arguido EE não era titular de cartão profissional de segurança, emitido pelo MAI/PSP, que o habilitasse a desenvolver a referida atividade.
64º
O arguido EE, apesar de saber que não podia legalmente exercer a função de segurança/vigilante, por não ser titular de cartão profissional, idealizou e quis prestar serviços de segurança/vigilância no Festival de Paredes de Coura e agiu de forma a concretizar tal desiderato, o que alcançou.
65º
O arguido DD representou e quis contratar um indivíduo para realizar serviços de segurança/vigilante, apesar de saber que o mesmo não era titular de cartão profissional que o habilitasse à prestação de tal serviço, e agiu de forma a concretizar tal desiderato, o que alcançou.
66º
Os arguidos DD e EE agiram de forma livre, voluntária e conscientemente, sabendo que as suas condutas lhes eram proibidas e punidas por lei penal.
autos principais – segurança privada ilícita - II.
67º
O arguido FF não era titular de cartão profissional de segurança, emitido pelo MAI/PSP, que o habilitasse a desenvolver a referida atividade, mesmo porque era Agente da Polícia de Segurança Pública e não lhe era legalmente admissível a titularidade de tal cartão.
68º
Nas noites de …, … e … de 2016, no decorrer das Festas realizadas na localidade de …, que decorreram na Rua 3, em … - ..., o arguido FF exerceu serviço como ….
69º
No cumprimento dessa função, o arguido FF percorria todo o espaço da festa de …, vigiava os participantes na mesma festa e procurava ver eventuais desacatos entre os participantes por forma a sanar os mesmos. O mesmo arguido também percorria o espaço exterior ao local da festa de forma a vigiar os veículos estacionados, verificar a aproximação de peões e as suas intenções, velando para que ninguém se introduzisse nos veículos, nem subtraísse os bens e valores que aí se encontravam. Por vezes o arguido FF ficava junto da porta de entrada da festa para controlar as entradas e as saídas do recinto ou ficava junto do palco para evitar que os participantes na festa subissem ao palco e interferissem com o trabalho dos artistas.
70º
A segurança no mencionado evento foi assegurada pela sociedade comercial “…”, da qual era trabalhador o arguido MM.
71º
Entre as 22H00 do dia … de 2016 e as 08H00 do dia seguinte, o arguido FF trabalhou como ...no estabelecimento comercial de diversão noturna denominado “…”, sito na Rua 4. O serviço foi desempenhado de forma encoberta e sem qualquer fardamento ou identificação exterior.
72º
No cumprimento dessa função, o arguido FF percorria todo o espaço interior do “…”, vigiava os clientes e procurava ver eventuais desacatos entre clientes por forma a sanar os mesmos. Também percorria o espaço exterior ao “...” de forma a vigiar os veículos estacionados, verificar a aproximação de peões e as suas intenções, velando para que ninguém se introduzisse nos veículos, nem subtraísse os bens e valores que aí se encontravam. Por vezes o arguido FF ficava junto da porta de entrada do “...”, entregava os cartões de consumo aos clientes, permitia e/ou recusava a entrada de clientes e, à saída dos clientes, recebia destes os cartões de consumo, nos quais verificava a menção do respetivo pagamento, permitindo ou recusando a sua saída do estabelecimento.
73.º
Entre as 22H00 do dia … de 2016 e as 08H00 do dia seguinte, o arguido FF, trabalhou como ...no estabelecimento comercial de diversão noturna denominado “...”, sito na Rua 4. O serviço foi desempenhado de forma encoberta e sem qualquer fardamento ou identificação exterior.
74º
No cumprimento dessa função, o arguido FF percorria todo o espaço interior do “...”, vigiava os clientes e procurava ver eventuais desacatos entre clientes por forma a sanar os mesmos. O arguido também percorria o espaço exterior ao “...” de forma a vigiar os veículos estacionados, verificar a aproximação de peões e as suas intenções, velando para que ninguém se introduzisse nos veículos, nem subtraísse os bens e valores que aí se encontravam. Por vezes FF e ficava junto da porta de entrada do “...”, entregava os cartões de consumo aos clientes, permitia e/ou recusava a entrada de clientes e, à saída dos clientes, recebia destes os cartões de consumo, nos quais verificava a menção do respetivo pagamento, permitindo ou recusando a sua saída do estabelecimento.
75.º
Na noite referida decorrer no “...” a “…”, com a atuação do cantor DDDD.
76.º
O arguido FF, apesar de saber que não podia legalmente exercer a função de segurança/vigilante, por não ser titular do respetivo cartão profissional e de ser Agente da Polícia de Segurança Pública, idealizou e quis prestar serviços de segurança/vigilância cinco vezes distintas entre si e agiu de forma a concretizar tal desiderato, o que alcançou.
(…)
78.º
O arguido FF agiu de forma livre, voluntária e conscientemente, sabendo que as suas condutas lhes eram proibidas e punidas por lei penal.
autos principais – tráfico e mediação de armas, e detenção de armas.
79.º
Como modo de aumentar os seus proventos financeiros, o arguido FF, Agente da Polícia de Segurança Pública, adquiriu e revendeu armas, o que fazia por preço superior ao da aquisição assim obtendo lucro.
80.º
O arguido FF, para evitar ser detetado pelas entidades policiais, preferia a realização de encontros pessoais com os vendedores/adquirentes de armas e, quando utilizava comunicações telefónicas, recorria, por vezes, a linguagem codificada facilmente reconhecida pelos interlocutores o que lhe permitia encobrir os seus atos.
81.º
Em dia não concretamente apurado do mês de … de 2016 o arguido FF solicitou a EEEE também agente da Polícia de segurança pública que lhe fornecesse dois bastões extensíveis.
82.º
Tais bastões eram constituídos por vários segmentos tubulares de metal, sucessivamente menores em diâmetro do exterior para o interior, os quais se recolhiam para dentro do tubo exterior (maior em diâmetro), progressivamente até ao mais pequeno, assim dissimulando o seu verdadeiro comprimento. Os segmentos tubulares abriam por mero efeito de um golpe seco e rápido. Tais bastões tinham como única finalidade a utilização como arma de agressão, razão pela qual o segmento maior servia como punho para o seu portador ai agarrar.
83.º
Apesar dos bastões não serem à data dos factos passíveis de serem adquiridos a título pessoal mesmo por membros de forças de segurança o arguido FF informou EEEE que os referidos bastões se destinavam a serem entregues a outros Agentes da Polícia de Segurança Pública. EEEE aceitou o pedido do arguido FF e comprometeu-se a adquirir os dois bastões extensíveis através de um contacto seu.
84º
No dia … de 2016 por conversa telefónica EEEE confirmou ao arguido FF que lhe conseguia fornecer os dois bastões extensíveis e ficou acordado que o pagamento ocorreria aquando da entrega.
85º
Entre o dia … e o dia … de 2016 EEEE entregou um dos bastões extensíveis ao arguido FFFF e comprometeu-se a entregar-lhe o segundo bastão na semana seguinte. Em contrapartida pela entrega do bastão o arguido FF entregou a EEEE quantia monetária não determinada.
86.º
No dia … de 2016, FF entregou esse bastão extensível ao arguido AAA e, em contrapartida, dele recebeu quantia monetária não apurada.
87.º
Durante a noite de … de 2016 para o dia seguinte, o arguido AAA comentou com o seu colega ...o arguido GGGG o negócio que havia realizado com o arguido FF. De imediato, o arguido GGGG mostrou-se interessado em comprar o segundo bastão extensível e telefonou ao arguido FF para manifestar tal vontade.
88.º
Posteriormente o arguido FF encontrou-se com EEEE de quem recebeu outro bastão extensível tendo-lhe pago novamente uma quantia monetária indeterminada, destinando-o FF a terceiros cuja identidade não se apurou.
89.º
No dia … de 2017, pelas 09H30, o arguido FF guardava no interior da sua residência, sita naRua 5, em ..., quarenta e seis (46) munições de calibre .45 Auto e trinta (30) munições de calibre 7,62 x 39 Kalashnikov (apropriadas para espingardas de assalto). Todas estas munições estavam em bom estado e aptas a serem deflagradas.
90.º
No dia … de 2017, pelas 07H00, o arguido FF guardava no interior de móveis que lhe estavam adstritos (mesa de cabeceira e cacifo) na …Esquadra da Polícia de Segurança Pública, em ..., uma (01) pistola de alarme da marca Reck, modelo (PERFECTA) FBI 8000, calibre 8mm, que não se encontrava em condições de realizar deflagrações, dois (02) cartuchos de calibre 12, uma (01) caixa de cartão própria para acondicionar um bastão extensível da marca “Enforcer”, três documentos referentes à aquisição de armas de fogo e suas munições. Os dois cartuchos estavam em bom estado e aptos a serem deflagrados.
91.º
No dia … de 2017, pelas 07H45, o arguido AAA guardava no interior da sua residência, sita na Rua 6 …, em ..., um (1) bastão extensível, da marca FLY, com a inscrição “Hardened Police Baton”, o qual era constituído três segmentos tubulares de metal, sucessivamente menores em diâmetro do exterior para o interior, os quais se recolhiam para dentro do tubo exterior (maior em diâmetro), progressivamente até ao mais pequeno, assim dissimulando o seu verdadeiro comprimento. Os segmentos tubulares abriam por mero efeito de um golpe seco e rápido. Tal bastão media 53,5 cm quando aberto e 21 cm quando fechado, e tinha como única finalidade a utilização como arma de agressão, razão pela qual o segmento maior servia como punho para o seu portador aí agarrar.
(…)
94.º
No dia … de 2017, pelas 07H00, o arguido DD guardava no interior da sua residência, sita na Rua 8:
• uma (1) espingarda caçadeira de repetição, tipo “pump action”, de calibre 12, marca EGE (HHHH), com o número de série 54631, com 75 cm de comprimento total e com cano 50 cm de comprimento, em boas condições de funcionamento e apta a produzir deflagrações, propriedade da testemunha IIII;
• vinte e cinco (25) cartuchos de calibre 12, de diversas marcas, modelos e gramagens, todos em boas condições e aptos a serem deflagrados;
• um revólver da marca AMADEO ROSSI, calibre .32 Smith & Wesson Long, com o número de série rasurado, com 19,5 cm de comprimento total e com cano estriado de 7,6 cm de comprimento, em boas condições de funcionamento e apto a produzir deflagrações;
• cento e onze (111) munições de calibre .32 S&W Long, as quais em boas condições e aptas a serem deflagradas.
95.º
O revólver da marca AMADEO tinha o número de série rasurado.
96.º
No dia … de 2017, pelas 07H30, no interior das instalações da sociedade comercial “... – SERVIÇOS DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA LDA”, sitas na Rua 9, …, em Belas, encontrava-se uma (1) pistola semiautomática, originalmente de calibre 8mm e destinada a deflagrar apenas munições de alarme sem projétil e, após transformação, por retirada do cano e colocação de novo cano estriado, apta para disparar munições com projétil, de calibre 6,35mm Browning, de marca TANFOGLIO, modelo GT 28, com cano estriado com 5,9 cm de comprimento e com o comprimento total de 12 cm, em boas condições de funcionamento e apta a produzir deflagrações, bem como oito (8) munições de calibre 6,35mm Browning. Todas estas munições estavam em bom estado e aptas a serem deflagradas.
(…)
99.º
O arguido FF, não era titular de licença ou de alvará para a venda de bastões extensíveis.
100.º
O arguido FF apesar de saber que não o podia fazer por para tanto não estar autorizado pela Polícia de Segurança Pública e que, na sua qualidade de elemento policial da Polícia de Segurança Pública tinha o especial dever legal de prevenir e de reprimir a detenção ilegal de qualquer arma, representou e quis negociar a transação de bastões extensíveis, bem como transportar e entregar tais armas a terceiros, agindo com a intenção de concretizar tal desiderato, o que logrou alcançar.
101.º
O arguido FF não era titular de licença de uso e porte para qualquer arma onde pudesse utilizar as munições acima referidas (calibre .45 Auto, de calibre 7,62 x 39 Kalashnikov e cartuchos de calibre 12).
102.º
O arguido FF, sabendo que para tanto não estava autorizado, quis e conseguiu deter e guardar as munições acima referidas.
(…)
105.º
As armas acima referidas e que estavam na posse do arguido DD não estavam manifestadas nem registadas a seu favor, sendo que este não era titular de licença para o seu uso e porte.
106.º
O arguido DD, sabendo que para tanto não estava autorizado, quis deter e guardar as armas e as munições acima referidas, agindo com a intenção de concretizar tal desiderato, o que alcançou.
107.º
Os arguidos (…) FF (…) e DD agiram livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas diversas condutas lhes eram proibidas e censuradas pela lei penal.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (factos genéricos).
108.º
Como modo de aumentar os seus proventos financeiros, em data não concretamente apurada mas seguramente anterior a 2015, o arguido GG gizou um plano para isentar indivíduos que, tendo cometido infrações rodoviárias, recebiam as respetivas notificações devidamente remetidas para as moradas dos proprietários das viaturas utilizadas.
109.º
Este arguido elaborou o referido plano utilizando os conhecimentos e a experiência que adquiriu no desempenho das suas funções enquanto militar da Guarda Nacional Republicana e a desempenhar funções na Brigada de Trânsito, unidade encarregue da regularização e da fiscalização do trânsito rodoviário a nível nacional.
110.º
Na execução do referido plano, o arguido GG anunciava a amigos, conhecidos e familiares ser capaz de proporcionar a isenção do pagamento da coima e, quando aplicável, da sanção acessória de inibição de conduzir e da respetiva perda de pontos na carta de condução aos infratores rodoviários.
111.º
Para o efeito, o arguido GG predispunha-se a redigir requerimento, em nome do arguido no processo de contraordenação, no qual afirmava que quem conduzia a viatura aquando da infração seria outro indivíduo cuja identificação descrevia no requerimento, e não o verdadeiro condutor/proprietário, sendo tal requerimento dirigido à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária a fim de suspender o processo de contraordenação.
112.º
Como era do conhecimento funcional e profissional do arguido GG, quando um agente policial presencia uma infração rodoviária e não tem a possibilidade de identificar o infrator, elabora auto de notícia contra o proprietário do veículo, correndo contra ele o processo. De seguida, o proprietário é notificado para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator. Quando o proprietário indica terceiro individuo como sendo o condutor, o processo é suspenso e é instaurado novo processo contra o indicado infrator.
113.º
O arguido GG, na sua qualidade de militar da Guarda Nacional Republicana, frequentou vários cursos, em especial o Curso de Trânsito, ministrado da Escola da Guarda Nacional Republicana, por via do qual se tornou especialista nas questões rodoviárias e integrou a Brigada de Trânsito, razão pela qual conhecia de forma aprofundada o modo de processamento dos autos de contraordenação e da tramitação dos processos por contraordenação rodoviária, bem como as práticas seguidas pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
114.º
Nessa qualidade de militar da Guarda Nacional republicana, a exercer funções na Brigada de Trânsito, o arguido GG sabia que tinha a obrigação legal de recolher e de preservar os meios de prova dos factos suscetíveis de integrarem a prática de contraordenação, devendo mesmo exigir a identificação aos respetivos infratores.
115.º
No desenvolvimento e execução desta atividade, o arguido GG contava com a participação de indivíduos que, não sendo os arguidos dos processos de contraordenação, funcionavam como intermediários entre estes e o próprio arguido. O arguido FF era um destes intermediários que auxiliava o arguido GG.
(…)
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto II).
121.º
No dia …/2015, pelas 22H54, no …, no sentido sul/norte, em …, o veículo de matrícula ..-IA-.. e, ao quilómetro 3,6, foi detetado, por radar, a exceder o limite legal de velocidade.
122.º
Por essa razão, a Polícia de Segurança Pública elaborou o auto de notícia por contraordenação com o n.... no qual constava como arguida JJJJ, mãe da arguida SS e proprietária do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
123.º
O arguido GG, foi contactado por pessoa cuja identidade não se apurou, para que este isentasse a penalização pela supramencionada infração de trânsito, ao que o arguido GG anuiu.
124.º
O arguido GG redigiu em requerimento/contestação, onde escreveu todos os elementos de identificação de KKKK, que indicou como condutor da viatura com a matrícula ..-IA-.. aquando da infração em causa, facto que GG sabia não corresponder à verdade.
125.º
Posteriormente, o arguido GG fez chegar o referido requerimento/contestação a JJJJ, para que esta assinasse o documento e o enviasse à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, o que foi concretizado.
126.º
Recebida o mesmo requerimento/contestação na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contra ordenação no qual era arguida a JJJJ.
127.º
O arguido GG bem sabia que a base de dados de cartas de conduções do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, à qual tinha acesso exclusivamente na sua qualidade de militar da Guarda Nacional Republicana, tem dados de natureza pessoal dos titulares das cartas de condução os quais foram recolhidos como a finalidade exclusiva de auxiliar o exercício das funções públicas de quem acede, mormente para que as autoridades públicas saibam quem é titular de carta de condução.
128.º
O arguido GG bem sabia que, na sua qualidade de militar da Guarda Nacional Republicana, tem o dever de sigilo profissional no que concerne aos dados de que tomar conhecimento do exercício das suas funções ou por causa delas.
129.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de declarar a autoridade pública que o condutor do veículo de JJJJ foi conduzido por um terceiro individuo, KKKK, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que JJJJ fosse pela sancionada pela contraordenação.
130.º
O arguido GG agiu com o propósito de fazer um requerimento/contestação com factos que sabia não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que JJJJ não fosse sancionada com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto III).
131.º
Entre os dias …de … de 2015 e …de … de 2016, 22H54, a arguida CCC conduziu, em diversos locais, os veículos de matrícula ..-OT-.. e ..-NJ-.., e, por catorze vezes, foi detetada, por radar, a exceder o limite legal de velocidade.
132.º
Por essa razão, a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana elaboraram um auto de notícia por contraordenação por cada uma das infrações verificadas, nos quais constava como arguido LLLL, companheiro da arguida e proprietário de ambos os veículos, e remeteram-lhe os autos com as notificações para proceder ao pagamento das coimas pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
133.º
Assim, a arguida CCC foi detetada a conduzir em excesso de velocidade nas seguintes circunstâncias:
1. Dia .../.../2015 pelas 10H20, na A8, no sentido Norte/Sul, ao quilómetro 12,9, em Lousa, a conduzir o de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
2. Dia .../.../2016, pelas 10H20, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
3. Dia .../.../2016, pelas 06H51, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
4. Dia .../.../2016, pelas 22H15, no IC17, ao quilómetro 6,166, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
5. Dia .../.../2016, pelas 22H17, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
6. Dia .../.../2016, pelas 19H48, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
7. Dia .../.../2016, pelas 00H10, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
8. Dia .../.../2016, pelas 21H07, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
9. Dia .../.../2016, pelas 06H43, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
10. Dia .../.../2016, pelas 06H46, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
11. Dia .../.../2016, pelas 06H37, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-NJ-.. (Auto de Notícia n....);
12. Dia .../.../2016, pelas 01H50, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-NJ-.. (Auto de Notícia n....);
13. Dia .../.../2016, pelas 06H37, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....);
14. Dia .../.../2016, pelas 06H37, no IC17, ao quilómetro 6,676, em Benfica – Lisboa, a conduzir o veículo de matrícula ..-OT-.. (Auto de Notícia n....).
134.º
Todos estes autos ficaram na posse da arguida CCC a qual contactou o arguido GG, seu amigo, para que este a isentasse das devidas penalizações pelas supramencionadas infrações rodoviárias. O arguido GG anuiu.
135.º
O arguido GG informou a arguida CCC de que iria redigir um requerimento a imputar a responsabilidade pelas infrações a outro indivíduo. Porém, advertiu-a de que poderia utilizar alguns dados de identificação que se encontravam na sua posse, ou quaisquer outros que lhe fossem fornecidos, no sentido de imputar a responsabilidade a essa terceira pessoa.
136.º
De modo não apurado, o arguido GG obteve os dados identificativos de MMMM, com os quais arguido redigiu os catorze requerimentos/contestações indicando-o como condutor das viaturas com a matrícula ..-OT-.. e ..-NJ-.. aquando das catorze infrações em causa, facto que os arguidos CCC e GG sabiam não corresponder à verdade.
137.º
Posteriormente o arguido GG encontrou-se com a arguida CCC para lhe entregar os catorze requerimentos/contestações, que esta última tratou de levar ao seu companheiro, a testemunha LLLL, para que esta entregasse os requerimentos o seu companheiro e os assinasse. Após a assinatura dos requerimentos, a arguida CCC tratou de enviar os mesmos à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
138.º
Recebidos os mesmos requerimentos/contestações na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu os processos de contra ordenação nos quais era arguido a testemunha LLLL.
139.º
Os arguidos GG e CCC agiram em comunhão de vontades e em conjugação de esforços, catorze vezes, com o propósito concretizado de declararem a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era o companheiro da arguida, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que o proprietário LLLL fosse sancionado pela contraordenação.
140.º
Os arguidos GG e CCC agiram igualmente, catorze vezes, em comunhão de vontades e em conjugação de esforços, com o propósito concretizado de, por si, fazerem num requerimento/contestação factos que sabiam não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que o companheiro da arguida não fosse sancionado com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto IV).
141.º
No dia …/2016, pelas 20H20, a testemunha NNNN conduziu, na Estrada 11, concretamente na rotunda de acesso à …, o veículo de matrícula ..-..-RC e não cumpriu a indicação dada pelos sinais de passagem B1, ali colocados verticalmente à esquerda e à direita da faixa de rodagem em que circulava.
142.º
O arguido GGencontrava-se no local a desempenhar funções enquanto militar da Guarda Nacional Republicana – Brigada de Trânsito e verificou a mesma infração, razão pela qual elaborou o respetivo auto de contraordenação.
143.º
O arguido GG também elaborou outro auto de contraordenação no qual deu fé que tinha feito sinal de paragem ao condutor do veículo de matrícula ..-..-RC e o mesmo o havia desobedecido a esse sinal.
144.º
A Guarda Nacional Republicana remeteu à testemunha NNNN os dois autos de contra ordenação (com os ns.... e n.º ...) com a notificação para proceder ao pagamento das coimas pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
145.º
Quando a testemunha NNNN estava a ler as duas notificações reparou que o apelido do militar da Guarda Nacional Republicana que o autuara era ..., à semelhança de GG, amigo de NNNN e pai do arguido GG. A testemunha NNNN telefonou ao seu amigo GG e perguntou-lhe como se chamava o seu filho, constatando que de facto se tratava do militar que o havia autuado. Desta forma combinou com o seu amigo que iria falar com o arguido GG.
146.º
De seguida, a testemunha NNNN contactou com o arguido GG, que aceitou redigir dois requerimentos/contestação à ANSR com a identificação de um falso condutor do veículo de modo a ilibar aquele das mencionadas infrações.
147.º
No cumprimento de tal plano, o arguido GG redigiu dois requerimentos/contestações com os dados de identificação e carta de condução de PPPP que obteve de for não apurada, indicando-a como condutora da viatura com a matrícula ..-..-RC aquando das infrações em causa, facto o arguido GG sabia não corresponder à verdade.
148.º
Posteriormente o arguido GG encontrou-se com a testemunha NNNN para lhe entregar os referidos requerimentos/contestações, que este último tratou de assinar e enviar à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
149.º
Recebidos os mesmos requerimentos/contestações na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu os dois processos de contraordenação nos quais era arguido a testemunha NNNN.
150.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de declarar a autoridade pública, por duas vezes, que o condutor do veículo em causa não era a testemunha, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que a testemunha fosse condenada pela sancionada pela contraordenação.
151.º
O arguido GG agiu igualmente, por duas vezes, com o propósito concretizado de, por si, escrever num requerimento/contestação factos que sabia não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que a testemunha não fosse sancionada com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto V).
152.º
No mês de … de 2016, foi recebido na oficina da sociedade comercial de que era gerente o arguido TT, a “….”, com estabelecimento sito na Rua 12, o veículo automóvel de marca …, modelo …, com a matrícula ..-BO-.., a fim de ser reparado. Tal veículo era pertença da testemunha QQQQ.
153.º
No dia … de 2016, pelas 16H46, no IP7, no sentido norte/sul, o referido veículo … com a matrícula ..-BO-.. foi detetado, por radar, a circular em excesso de velocidade.
154.º
Por essa razão, a Polícia de Segurança Pública elaborou o auto de notícia por contraordenação com o n.... no qual constava como arguida QQQQ, proprietária do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
155.º
Ciente de que a responsabilidade pela infração não era da testemunha QQQQ, foi contactado o stand referido, tendo o mesmo, através de pessoa cuja identidade não se apurou, assumido a infracção, antecipando que a situação seria resolvida.
156.º
Ainda assim, a testemunha QQQQ enviou uma carta à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária a esclarecer o assunto.
157.º
De seguida, o arguido GG foi contactado por pessoa cuja identidade não se apurou, para que o mesmo isentasse a devida penalização pela supra mencionada infração de trânsito, ao arguido GG anuiu.
158.º
O arguido GG redigiu o mencionado requerimento/contestação, concretamente indicando RRRR como condutor da viatura com a matrícula ..-BO-.. e como GG sabia não corresponder à verdade.
159º
Posteriormente, o arguido GG entregou ao aludido indivíduo o referido requerimento/contestação para assinatura com o nome da testemunha QQQQ no local próprio para a assinatura da requerente/arguida, assim procurando dar a entender que tinha sido a mesma a elaborar e assinar o mesmo requerimento. Com o requerimento assim assinado, foi o mesmo enviado à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
160.º
Recebido o mesmo requerimento/contestação na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contra ordenação no qual era arguida a QQQQ.
161.º
O arguido GG agiu em comunhão de vontades e em conjugação de esforços, com o propósito concretizado de declarar a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era a sua proprietária, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que o verdadeiro infractor fosse condenado pela contraordenação.
162.º
O arguido GG agiu igualmente em comunhão de vontades e em conjugação de esforços, com o propósito concretizado de, por si, fazer um requerimento/contestação com factos que sabiam não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) e simular que a QQQQ tinha assinado tal documento para evitar que a mesma comprometesse o stand do arguido TT e designadamente que este fosse sancionado com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
(…)
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto VII).
169.º
No dia …/2016, pelas 19H45, a testemunha SSSS conduziu o veículo de matrícula ..-NB-.., no …, foi detetado, por radar, a ultrapassar o limite de velocidade.
170.º
Por essa razão, a Polícia de Segurança Pública elaborou o auto de notícia por contraordenação com o n.... no qual constava como arguido SSSS, proprietário do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
171.º
A testemunha SSSS conhecia o arguido GG pois era perito de seguros e costumava deslocar-se a Postos da Guarda Nacional Republicana para recolher informações sobre os acidentes de viação.
172.º
Em data posterior ao recebimento da mencionada notificação, a testemunha SSSS entrou em contacto com o arguido GG num café em ..., tendo comentado que tinha uma coima para pagar referente a uma infração de trânsito. De imediato o arguido GG prontificou-se a resolver a situação.
173.º
De seguida, o arguido GG redigiu um requerimento/contestação, concretamente indicando KKKK como condutor da viatura com a matrícula ..-NB-.. aquando da infração em causa, facto que sabia não corresponder à verdade.
174.º
Posteriormente, o arguido GG encontrou-se com a testemunha SSSS para que este assinasse o requerimento/contestação. Com o requerimento assinado, a testemunha SSSS tratou de enviar o referido texto/contestação à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
175.º
Recebida o mesmo requerimento/contestação na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contra ordenação no qual era arguido SSSS.
176.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de declarar a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era a testemunha SSSS, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que a testemunha SSSS fosse sancionado pela contraordenação.
177.º
O arguido GG agiu igualmente com o propósito concretizado de, por si, fazer constar num requerimento/contestação factos que sabia não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que a testemunha SSSS não fosse sancionado com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto VIII).
178.º
No dia …/2016, pelas 10H45, a testemunha TTTT conduziu no …, em …, o veículo de matrícula ..-RI-.. e, ao quilómetro 32,2, foi detetado, por radar, a ultrapassar o limite de velocidade.
179.º
Por essa razão, a Polícia de Segurança Pública elaborou o auto de notícia por contraordenação com o nº ... no qual constava como arguido TTTT, proprietário do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
180.º
Posteriormente o arguido GG foi contactado por pessoa cuja identidade não se apurou, para isentar TTTT da supramencionada infração de trânsito, ao que o arguido GG anuiu.
181.º
O arguido GG redigiu o mencionado texto/contestação, concretamente indicando PPPP como condutora da viatura com a matrícula ..-RI-.. aquando da infração em causa, facto que o arguido GG sabia não corresponder à verdade.
182.º
Posteriormente, o requerimento/contestação foi assinado por pessoa cuja identidade não se apurou, como se fosse TTTT e remetido à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
183.º
Recebida o mesmo requerimento/contestação na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contra ordenação no qual era arguido TTTT.
184.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de declarar a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era a testemunha TTTT, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que a testemunha TTTT fosse sancionado pela contraordenação.
185.º
O arguido GG agiu igualmente com o propósito concretizado de, por si, fazer constar num requerimento/contestação factos que sabia não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que a testemunha TTTT não fosse sancionado com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
(…)
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto X).
197.º
No dia …/2016, pelas 08H45, a testemunha UUUU conduziu na estrada nacional …, o veículo de matrícula ..-..-XG e foi detetado, por radar, a exceder o limite legal de velocidade.
198.º
Por essa razão, a Guarda Nacional Republicana elaborou o auto de notícia por contraordenação com o n.... no qual constava como arguido a testemunha UUUU, proprietário do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
199.º
O arguido HH soube desta situação através do próprio UUUU e disse-lhe que ia resolver o assunto. De seguida, contactou com GG, e solicitou-lhe que este isentasse a testemunha da penalização pela supramencionada infração de trânsito, o que o arguido GG anuiu.
200º
O arguido GG redigiu em requerimento/contestação, onde escreveu todos os elementos de identificação de KKKK, que indicou como condutor da viatura com a matrícula ..-..-XG aquando da infração em causa, facto que os arguidos HH e GG sabiam não corresponder à verdade.
201.º
Posteriormente, o referido requerimento/contestação foi entregue a UUUU, para que este o assinasse. Com o requerimento assinado, a testemunha UUUU tratou de enviar o referido texto/contestação à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
202.º
Recebida o mesmo requerimento/contestação na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contra ordenação no qual era arguido a testemunha UUUU.
203.º
Os arguidos GG e HH agiram em comunhão de vontades e em conjugação de esforços, com o propósito concretizado de declararem a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era a testemunha, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que a testemunha fosse condenada pela sancionada pela contraordenação.
204.º
Os arguidos GG e HH agiram igualmente em comunhão de vontades e em conjugação de esforços, com o propósito concretizado de, por si, fazerem num requerimento/contestação factos que sabiam não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que a testemunha não fosse sancionada com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto XI).
205.º
No dia …/2017, pelas 17H14, a testemunha VVVV conduziu o veículo automóvel de matrícula ..-RX-.., no …, no sentido de sul para norte e, ao quilómetro 8,5, foi detetado, por radar, a exceder o limite legal de velocidade.
206.º
Por essa razão, a Guarda Nacional Republicana elaborou o auto de notícia por contraordenação com o n.... no qual constava como arguido a testemunha VVVV, proprietário do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
207.º
O arguido GG foi contactado por pessoa cuja identidade não se apurou que lhe solicitou que isentasse WWWW da supra mencionada infração de trânsito, ao que o arguido GG anuiu.
208.º
O arguido GG redigiu em requerimento/contestação, onde escreveu todos os elementos de identificação de KKKK, que indicou como condutor da viatura com a matrícula ..-RX-.. aquando da infração em causa, facto que o arguido GG sabia não corresponder à verdade.
209.º
Posteriormente, foi entregue a VVVV o referido requerimento/contestação, que tratou de assinar e de enviar à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
210.º
Recebida o mesmo requerimento/contestação na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contra ordenação no qual era arguido a testemunha VVVV.
211.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de declarar a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era a testemunha, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que a testemunha fosse condenada pela sancionada pela contraordenação.
212.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de, por si, fazer num requerimento/contestação factos que sabiam não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que a testemunha não fosse sancionada com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto XII).
213.º
No dia …2017, pelas 16H44, individuo cuja identidade não se apurou, conduziu o veículo automóvel de matrícula ..-IV-.., na Estrada …, e, ao quilómetro 11,1, foi detetado, por radar, a exceder o limite legal de velocidade.
214.º
No dia …/2017, pelas 15H54, o mesmo veículo automóvel de matrícula ..-IV-.., circulava na …, e foi detetado, por radar, a exceder o limite legal de velocidade.
215.º
Por essa razão, a Autoridade Nacional de segurança Rodoviária elaborou dois autos de notícia por contraordenação com os ns.... e ... nos quais constava como arguida a testemunha XXXX, proprietária do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
216.º
Ao arguido GG foi solicitado por pessoa cuja identidade se desconhece que as mencionadas infrações de trânsito fossem imputadas a terceiro, isentando-se a proprietária do veículo, ao que o arguido GG anuiu.
217.º
O arguido GG redigiu dois requerimentos/contestações, onde escreveu todos os elementos de identificação de YYYY (num requerimento) e ZZZZ (noutro requerimento), que indicou como condutores da viatura com a matrícula ..-IV-.. aquando das infrações em causa, facto que o arguido GG sabia não corresponder à verdade.
218.º
Posteriormente, os requerimentos/contestações foram assinados em nome e com a imitação da assinatura de XXXX e remetidos à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
219.º
Recebidos tais requerimentos/contestações na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contra ordenação no qual era arguida a testemunha XXXX.
220.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de, por duas vezes, declarar a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era a testemunha, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que a testemunha fosse condenada pela sancionada pela contraordenação.
221.º
O arguido GG agiu igualmente com o propósito concretizado de, por duas vezes, fazer num requerimento/contestação factos que sabiam não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que a testemunha não fosse sancionada com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
autos principais – crimes conexionados com a procura da isenção de sanção a infratores rodoviários (facto XIII).
222.º
No dia …2017, pelas 18H30, na …, o condutor do veículo de matrícula ..-..-CA foi detetado, por um militar da Guarda Nacional Republicana a circular sem fazer uso do cinto de segurança.
223.º
Por essa razão, a Guarda Nacional Republicana elaborou o auto de notícia por contraordenação com o n.... no qual constava como arguido AAAAA, proprietário do veículo, e remeteu-lhe o auto com a notificação para proceder ao pagamento da coima pelo mínimo, apresentar defesa ou indicar quem era o infrator.
224.º
A GG foi solicitado auxilio, por indivíduo cuja identidade não se apurou, para que AAAAA fosse eximido das consequências da referida infração rodoviária, ao que o arguido GG anuiu.
225.º
O arguido GG redigiu um requerimento/contestação, onde escreveu todos os elementos de identificação de ZZZZ, que indicou como condutor da viatura com a matrícula ..-..-CA aquando da infração em causa, facto que sabia não corresponder à verdade.
226.º
Posteriormente, o referido requerimento/contestação foi entregue a AAAAA, que o assinou e remeteu à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
227º
Recebida o mesmo requerimento/contestação na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta suspendeu o processo de contraordenação no qual era arguido AAAAA.
228.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de declarar a autoridade pública que o condutor do veículo em causa não era o seu proprietário, mas sim terceiro individuo, bem sabendo que tal não correspondia à verdade e que dessa qualidade de condutor advinha eventual responsabilidade pela prática de infração e obstava a que o primeiro fosse sancionado pela contraordenação.
229.º
O arguido GG agiu com o propósito concretizado de, por si, fazer um requerimento/contestação com factos que sabia não serem verdade (indicação dos elementos de identificação de putativo condutor) para que o proprietário do veículo não fosse sancionado com coima e inibição de conduzir, sabendo que tal declaração importaria, nos termos legais, a suspensão do processo de contraordenação e a abertura de novo processo contra o suposto condutor, assim colocando em causa o valor probatório inerente a tal requerimento.
(…)
Mais se provou,
Dos antecedentes criminais dos arguidos:
236.º
O arguido BB foi condenado:
Por sentença proferida no processo 84/05.5GBMFR transitada em julgado em 22.01.2018, pela prática em 2.02.2005 de um crime de dano simples na pena de 100 dias de multa, a taxa diária de € 6,00.
No proc. 2026/10.7PASNT por sentença transitada em julgado em 27.11.2013 pela prática em 3.11.2010 de um crime de injúria agravada e um crime de ofensas à integridade física qualificada na pena de 60 dias de multa e na pena de 1 ano e 4 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período.
No proc. 332/14.0PATVD foi condenado por sentença transitada em julgado em 18.11.2015 pela prática em 14.05.2014 de um crime de simulação de crime na pena de 80 dias de multa.
Por sentença transitada em julgado em 16.05.2017 proferida no proc. 261/15.0GFVFX foi condenado pela prática em 31.08.2015 por crime de ofensa à integridade física simples na pena de 12 meses de prisão suspensa na sua execução pelo mesmo período e sujeita a condições.
No proc. 678/18.9PSLSB foi condenado por sentença transitada em julgado em 29.11.2021 pela prática em 12.04.2018 por crime de ofensa à integridade física simples e por crime de injúria na pena única de 190 dias de multa, à taxa diária de € 6,00.
No proc. 318/21.9PASNT foi condenado por sentença transitada em julgado em 17.10.2022 pela prática em 09.01.2021 por crime de ofensa à integridade física simples na pena de 1 ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos sujeita a regime de prova e a condições (pagamento ao ofendido da quantia de mil euros no prazo de um ano), a qual lhe viria a ser revogada, por decisão transitada em julgado em 1.02.2024, determinando-se o cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação com vigilância electrónica, que se encontra actualmente a cumprir.
No processo nº 160/19.7GCODM, por sentença transitada em julgado em 9.01.2024, foi condenado pela prática em 6.08.2019 de um crime de ameaça simples e por quatro crimes de ofensa à integridade física simples na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução pelo mesmo período e sujeita a regime de prova assente em plano de reinserção.
(…)
238.º
O arguido DD foi condenado:
No proc. 555/98.8SKLSB por decisão de 5.05.2003 pela prática em 3.11.1998 de crime de ofensa à integridade física simples na pena de 80 dias de multa
No proc. 550/07.8PTAVR por decisão de 10.02.2009, por crime de desobediência qualificada praticado em 30.12.2006, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de € 6,00.
No proc. 19/11.6JACBR por decisão de 12.06.2013 foi condenado por crime de exercício ilícito de actividade de segurança privada praticado em outubro de 2010, na pena de120 dias de multa, à taxa diária de € 8,00.
No processo 3763/11.4TASXL por decisão de 29.03.2014 foi condenado por crime de falsidade de testemunho cometido em 7.09.2011 na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 6,00.
No proc. 212/12.4TELSB por acórdão transitado em julgado em 7.10.2020 foi condenado pela prática em 2010 e em 2011 de um crime de abuso de confiança agravado, de um crime de fraude fiscal qualidade e de dois crimes de fraude fiscal na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão suspensa pelo mesmo período e sujeita a regime de prova.
No proc. 16/18.0ALSB por decisão de 20.01.2021 foi condenado por crime de exercício ilícito de actividade de segurança privada praticado em 16.08.2018, na pena de150 dias de multa, à taxa diária de € 8,00.
No proc. 8/15.1XBLSB por decisão de 4.01.2022 foi condenado por dois crimes de exercício ilícito de actividade de segurança privada praticados em 14 de maio de 2015 na pena única de 290 dias de multa, à taxa diária de € 8,00.
(…)
240.º
Os demais arguidos [AA, EE, FF, GG e HH] não têm antecedentes criminais.
Das condições sociais dos arguidos e respectivo percurso de vida, provou-se que:
241.º
AA:
Actualmente tem contrato de trabalho com a empresa “…”, e desempenha funções de segurança pessoal de um líder de um partido político português, em simultâneo tem um outro contrato de trabalho com a empresa “…, desempenha, em part time, funções de Book ofice, na organização e distribuição de horários dos vários seguranças da empresa.
No período a que se reportam os factos desenvolvia atividade profissional como segurança em estabelecimentos de diversão noturna e como vigilante em espetáculos e recintos desportivos.
Ocupava os tempos livres no ginásio, era praticante de artes marciais, Karaté, Kickboxing, local onde conheceu alguns dos coarguidos.
Desde os 21/22 anos idade, e após 3 anos de serviço militar, que desenvolve atividade profissional como segurança. Tentou o ingresso na Guarda Nacional Republicana, mas não foi bem-sucedido.
Possui uma situação económica equilibrada, porquanto não apresenta quaisquer despesas com habitação uma vez que reside com a avó na casa desta.
Aufere em média um rendimento mensal na ordem dos 1.430 euros líquidos.
Mantém ainda relações afectivas estáveis com os pais e o irmão.
Como despesas mensais realça as tidas com o tratamento ortodôntico no valor mensal de 47€, em telecomunicações no valor de 46€ e em deslocações a quantia de 250 €.
O arguido estrutura o seu quotidiano com exercício da atividade profissional. Ocupa os tempos livres no ginásio, local onde conheceu alguns dos coarguidos, com os quais mantém relação, é praticante de artes marciais (atividade que iniciou com 6 anos), Karaté, Kickboxing.
242º
BB:
O arguido reside com o cônjuge com quem mantém um relacionamento afetivo há cerca de cinco anos. Permanecem ainda na residência do casal, em regime parental de guarda partilhada em semanas alternadas, os filhos do cônjuge do arguido, de 18 e 8 anos de idade e os do arguido de 12 e 10 anos de idade, ao fim-de-semana.
O processo de socialização primário de BB, ocorreu numa zona urbana de características sensíveis, da BBBBB, num ambiente familiar que descreve como disfuncional, devido ao quadro de alcoolismo do padrasto, que de forma frequente exibiria comportamentos agressivos para com os vários elementos do agregado familiar. Ao nível afetivo, o arguido contraiu matrimónio aos 25 anos de idade, tendo este relacionamento, terminado cerca de 6 anos depois.
O arguido reside em habitação própria adquirida com recurso a crédito bancário.
Completou o 12.º ano de escolaridade, obtido em idade adulta, através do RVCC - Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências.
O arguido, exerce atividade profissional na empresa ... - Serviços de Vigilância e Segurança Lda, com contrato de trabalho celebrado em janeiro do corrente ano com a categoria de …, aferindo cerca de € 800,00 por mês (valor líquido).
O arguido ministra aulas de …, sem vinculo contratual.
Para além do exercício da atividade profissional, BB, exerce o cargo de
…, na área do desporto de combate, sendo treinador de Kickboxing/ Boxe e Muaythai auferindo a quantia líquida de € 730,00 por mês.
À data factos o arguido, era atleta profissional de alta competição no ….
BB, iniciou a prática de desportos de combate aos 14 anos de idade, durante a sua carreira de desportista profissional de alta competição, representou a seleção nacional e conquistou vários títulos, tanto a nível nacional como internacional. Em paralelo, desempenhou durante vários anos a atividade profissional de segurança privado em espaços de diversão noturna.
A sua cônjuge, aufere em média o valor mensal de 1500€, trabalhando por conta própria na área da ….
O casal suporta despesas com a prestação da habitação no valor mensal de 482,98€.
O arguido suporta ainda a pensão de alimentos devida aos filhos, no valor mensal de 200€.
(…)
246.º
DD:
O processo de crescimento de DD decorreu em …, no seio do agregado familiar, num contexto socioeconómico deficitário. No plano económico, a situação era precária ainda que se encontrassem satisfeitas as necessidades básicas, para o que contribuía a situação profissional do progenitor como dourador, a mãe era doméstica.
Ao nível escolar, o seu percurso terá sido afetado pelo seu temperamento rebelde, pela necessidade de se impor num estabelecimento de ensino onde predominariam elementos da classe média, o que fazia em regra pela força, aliando a sua compleição física a alguma impulsividade. A necessidade de ingressar o mercado de trabalho em tenra idade, cerca dos 15/16 anos, fê-lo abandonar a escola no 8º ano, tendo optado pelo ensino noturno, e já adulto, pelo Programa Novas Oportunidades, tendo terminado o 12º ano. No âmbito do seu projeto laboral, refere ter efetuado o curso de ...
DD trabalhou em diversas atividades indiferenciadas, mas ligou-se muito cedo à área da segurança, trabalhando como porteiro em discotecas. Deste modo iniciou conhecimentos na área dos eventos (concertos, festas, etc.), que lhe permitiu mais tarde, enveredar pela atividade de Segurança Privada. Teve uma parceria numa empresa e em 2010 adquiriu com o cônjuge a empresa “... Serviços de Vigilância Lda.” onde se mantém como …, com o restante agregado e dois filhos mais velhos.
A nível afetivo contraiu matrimónio em 1993, com 21 anos, com CCCCC, cuja relação perdura no presente e da qual nasceram 3 filhos.
Atualmente reside na casa da progenitora com o cônjuge e o filho mais novo de 18 anos, os filhos mais velhos atualmente com 30 e 26 anos estão autonomizados.
O arguido mencionou não conseguir precisar os rendimentos do agregado, que provêm da empresa de segurança privada “... – Serviços de Vigilância e Segurança Limitada”, que possui cerca de oitenta funcionários efetivos e onde trabalham os seus filhos mais velhos, sendo um deles, DDDDD, coarguido neste processo, diretor comercial. Tal facto advém, segundo o autorrelato do arguido, da empresa ter atravessado dificuldades financeiras e contraído dívidas com as Finanças e com a Segurança Social, que atribui a atrasos nos pagamentos dos clientes, tendo sido homologado um Plano de Revitalização desde setembro de 2019, tendo a empresa assumido os compromissos financeiros contratualizados.
247.º
EE:
O arguido encontra-se a residir na atual morada, propriedade do progenitor, desde o falecimento da mãe, há cerca de 4 anos, o que coincidiu com a venda da sua anterior habitação, segundo refere por não ter capacidade económica para suportar o encargo resultante do empréstimo contraído e ter elevadas dívidas fiscais que, com essa venda, regularizou.
Habita com o pai, com o cônjuge e as três filhas fruto do relacionamento conjugal que iniciou aos 18 anos de idade, as quais contam, presentemente, 21, 18 e 12 anos de idade. A relação com o cônjuge é estável, isenta de conflitos e gratificante. O seu pai sofreu recentemente um AVC, estando acamado. O cônjuge, assim como a filha mais velha, têm-se encontrado desempregadas, mas estão agora a reiniciar atividade profissional como ….
À data dos factos explorava um …, que manteve durante 5 anos e que cessou por não ser rentável economicamente, passando então a desenvolver outras atividades em paralelo. Desde agosto de 2018, conforme documento que nos exibiu, e após ter frequentado formação, encontra-se habilitado para o exercício de atividade profissional no âmbito da segurança privada, nas valências acima indicadas, a qual tem vindo a desempenhar. Durante 3 anos trabalhou para a empresa PSG, conforme menciona, e desde há cerca de dois anos tem vindo a desenvolver a atividade para diversos empregadores, conforme as oportunidades de trabalho que vão surgindo, não tendo empregador e atividade estável.
Frequentou a escola até aos 16 anos, tendo então concluído o 6.º ano de escolaridade, vindo já em adulto a obter certificação de competências que garantiu a obtenção de equivalência ao 9.º ano de escolaridade.
Com hábitos laborais regulares, começou a trabalhar aos 16 anos com o progenitor, pedreiro, tendo depois trabalhado num … durante cerca de 1 ano. Posteriormente, durante 5 anos trabalhou como … numa empresa de …, atividade que de seguida exerceria por conta própria ao longo de 6 anos, passando então a explorar o ….
Os seus rendimentos são incertos e variáveis, em função das horas em que efetivamente desempenha atividade, auferindo um salário que cifra, em média, entre os 200 e os 500 euros mensais. A este valor junta-se o recebido pelo progenitor a título de pensão de reforma, no valor de cerca de 600 euros mensais. Sem encargos com a habitação, apresenta como despesas fixas as relativas aos consumos de água e energia no valor de cerca de 230 euros mensais. Com o cônjuge e a filha mais velha desempregadas, a situação económica tem-se revelado frágil, sendo visíveis algumas dificuldades, nomeadamente em proceder aos pagamentos dos consumos de água e energia elétrica (valores em atraso, cortes do fornecimento). O arguido tem também contado com apoio económico pontual de uma irmã.
Tem sido seguido em consulta médica, verbalizando encontrar-se deprimido, tendo-nos indicado a medicação prescrita. Associa esse estado depressivo ao falecimento da mãe, o que o cônjuge nos confirma, que vivenciou com intensa angústia, à deterioração da sua situação económica, que o forçou a alienar a sua habitação, e ao presente processo, que encara com vergonha.
248.º
FF:
À data dos factos FF residia em ..., com uma companheira com quem coabitou durante cerca de 4 anos. Mantinha-se a exercer funções como Agente da PSP na Esquadra de ....
Natural de …, radicou-se com a família em Portugal na sequência do processo de descolonização, em 1975, fixando-se em …, onde decorreu o final da sua infância e adolescência.
Penúltimo de nove irmãos, os seus progenitores separaram-se ainda na sua infância. Refere que o pai vivenciava problemas de alcoolismo e que a relação entre os progenitores, já falecidos, foi marcada por um quadro de violência doméstica. A mãe manteve um segundo relacionamento afetivo, fruto do qual nasceu o seu irmão mais novo. FF manteve uma relação mais estreita com a mãe, com quem residiu até aos 23 anos.
Com esta idade autonomizou-se e iniciou coabitação com a sua primeira companheira, que se manteve durante cerca de 7 anos, relacionamento fruto do qual nasceu uma filha, agora com 21 anos de idade.
Após um período de cerca de 3 anos, em que reintegrou o agregado da progenitora, e na sequência do falecimento desta, iniciou coabitação com a segunda companheira, tendo nascido duas filhas deste relacionamento, no presente com 14 e 12 anos de idade, vindo o par a separar-se quando contava 39 anos de idade. Residiu então sozinho durante cerca de 1 ano, mantendo posteriormente a relação acima referida, existente à data dos factos de que é acusado. Iniciou há cerca de 3 anos uma nova relação afetiva, coabitando com a companheira há cerca de 3 meses.
Concluiu o 12.º ano de escolaridade com 18 anos de idade, após o que ingressou como voluntário na …, celebrando de seguida contrato, permanecendo nesse corpo militar durante perto de 4 anos.
Ingressou na PSP em 1998, tendo prestado serviço nas Esquadras … (1 ano), … (9 anos) e ... (8 anos, entre 2009 e 2017). No final de 2017, após os mais recentes factos que deram origem ao presente processo, foi afeto à Esquadra de … e a tarefas de natureza administrativa, situação que não se mostrou do seu agrado e contra a qual exprime revolta.
Encontra-se de baixa médica desde o início de 2018 com “diagnóstico psiquiátrico de Doença Depressiva com Transtorno de Adaptação”; a conclusão de que “pela falta de condições mínimas para o desempenho de funções profissionais foi colocado em regime de abstenção laboral e, posteriormente, requerida a sua incapacidade permanente para o serviço, que acabou por ser negada pela Caixa Geral de Aposentações“; e, ao longo do tempo, entre outras, “queixas depressivas (…) sempre intensas, referindo o doente a continuação da presença de tristeza marcada, ansiedade e angústia, irritabilidade, impulsividade e revolta, desmotivação profissional (…)”. A revolta sentida pelo arguido face à sua situação profissional e desmotivação foram-nos-também mencionadas pelo seu irmão, acima referido. Inativo profissionalmente, ocupa-se com atividades desportivas (nomeadamente kickboxing, que há muito pratica) e a frequência de ginásios, dando regularmente aulas de caráter particular.
As suas características pessoais apontam tendencialmente para alguma excessiva valorização da sua auto-imagem e para alguma auto-centração.
Em termos financeiros, na condição de incapacidade para desenvolver atividade profissional, aufere mensalmente a quantia de cerca de 850-900 euros líquidos, rendimento que complementa com o resultante da sua atividade de ensino na área desportiva e que ronda os 400 euros mensais. Partilha, agora, as despesas associadas à habitação com a companheira, as quais totalizam cerca de 410 euros e dizem respeito a renda, (200 euros) e despesas com consumos de água energia elétrica e gás (cerca de 120 euros mensais).
(…)
258.º
GG:
À data dos factos, o arguido vivia com a esposa, um filho do casal, e uma tia paterna, na morada indicada nos autos. Num anexo da habitação principal residiam os seus progenitores que embora observassem autonomia face ao agregado familiar do arguido mantinham com o mesmo uma relação de convívio diário, constituindo-se o conjunto como um núcleo familiar coeso e cooperante.
A habitação principal, corresponde a uma vivenda unifamiliar, construída pelo próprio e pela esposa em 2008 com recurso a empréstimo bancário, num terreno de que os seus pais eram proprietários, localizado numa pequena povoação próxima da …. No espaço murado onde a mesma foi construída encontra-se também o anexo onde os seus pais continuam a viver, existindo uma partilha de rotinas que se traduz numa entreajuda mutua. Neste contexto o arguido assume a manutenção dos espaços, bem como das despesas daí decorrentes, beneficiando do apoio dos progenitores, atualmente com 83 e 86 anos de idade e que se encontram reformados, nomeadamente no que se refere à prestação de cuidados assistenciais ao seu filho menor de idade.
GG assumiu ter sempre mantido grande proximidade afetiva e relacional com o seu agregado familiar de origem, constituído pelos pais, por uma irmã mais velha e uma tia paterna, atualmente com 96 anos de idade e que sempre integrou este agregado, sendo referida pelo arguido como uma “segunda mãe”. A dinâmica intrafamiliar foi descrita como afetivamente coesa, existindo grande entreajuda entre os elementos da família, sem referência à existência de carências materiais, trabalhando ambos os progenitores do arguido numa loja de móveis que exploravam por conta própria em Benfica.
Contudo, o arguido manifestou desde muito jovem a vontade de obter autonomia financeira face ao agregado familiar que integrava, tendo optado por abandonar a frequência escolar após conclusão do 9º ano de escolaridade. A frequência de um curso técnico de … permitiu-lhe passar a exercer funções nesta área assumindo ser a que lhe proporcionou maior realização profissional.
A instabilidade e falta de reconhecimento autoral na referida área determinou a opção pelo ingresso na carreira …aos 21 anos de idade. Nesta carreira integrou várias equipas, designadamente em …, … e …. Entre 2000 e 2005 integrou o pelotão de … da GNR, permanecendo em Lisboa, continuando depois na brigada de trânsito. Em 2009 foi colocado no mesmo serviço, mas em ....
GG refere-se ao seu percurso profissional com orgulho. No decurso da sua carreira militar destaca como sua principal motivação o serviço público e a ajuda ao próximo, assumindo paralelamente o gosto pela diversidade de vivências que o seu desempenho profissional lhe permitiu experienciar.
Por outro lado, a estabilidade laboral e económica decorrente da carreira militar permitiu-lhe constituir o seu próprio agregado familiar, mantendo desde há 21 anos relação afetiva com a sua esposa. O apoio ao filho atualmente com 11 anos de idade, com o qual tem mantém forte vinculação afetiva, assume particular relevância.
Economicamente descreve a sua situação como razoável, auferindo um vencimento mensal de aproximadamente €1.300,00 líquidos, valor que depende dos “gratificados” (serviços extras que realiza mensalmente). A sua esposa também mantém atividade laboral regular exercendo funções de gerente numa …, auferindo um valor mensal, sensivelmente na ordem dos €1.500,00, variável em função dos prémios de desempenho que recebe. Como despesas fixas suportam a mensalidade bancária decorrente do empréstimo para construção da habitação (€668,00), eletricidade (€274,00), água (€46,00), pacote da Nós (€87,00), escola futebol do filho (€52,50), apoio escolar do filho (€165,00) e consulta de psicologia do mesmo (€40,00).
(…)
262.º
HH:
O processo de socialização de HH decorreu no agregado familiar de origem, constituído pelos pais, de modesta condição social, agricultores e criadores de animais. O arguido caracteriza o seu agregado como tipicamente tradicional, com modelos patriarcais rígidos, num padrão educacional com práticas punitivas, algumas das vezes físicas.
Iniciou o seu percurso escolar em idade regular concluindo o 4ª ano com cerca de 13 anos. Justifica o abandono escolar pelas dificuldades económicas do agregado e pela necessidade de trabalhar com os progenitores, para atenuar as dificuldades.
Integrou o mercado de trabalho com cerca de 14 anos, tendo iniciado funções em oficinas de mecânica de veículos automóveis. Desenvolveu atividade em diversas oficinas, mantendo sempre esta área laboral. Com cerca de 38 anos optou por iniciar atividade por conta própria.
Iniciou relação afetiva com cerca de 27 anos, tendo contraído união matrimonial com 30 anos. Dois anos depois foi pai da única filha do casal.
Integra o agregado com o conjugue e a filha, atualmente com 25 anos, descreve o ambiente familiar como gratificante e estruturante.
A residência do casal, uma vivenda unifamiliar com um espaço envolvente composto por jardim e piscina, afigura-se com boas condições de habitabilidade.
Presentemente mantém a atividade laboral, como …, na mesma oficina, “…”, que adquiriu através de um crédito, sendo o progenitor que o suporta. Emprega cerca de 8 funcionários, sendo reconhecido no meio e beneficiando de uma imagem favorável.
A situação económica do arguido configura-se equilibrada, o arguido refere auferir um salário de 1200 euros. A esposa mantém atividade laboral por conta própria na área comercial de …, que investiu com o apoio dos pais, auferindo cerca de 800 euros. No que concerne às despesas domésticas, estas incluem o crédito habitação (400 euros), e despesas de eletricidade (80 euros), água (30 euros).
(…)
Da contestação do arguido EEEEE, provou-se que:
265.º
O arguido GG, abraçou a sua carreira de militar da GNR, como Soldado Provisório, em …1998, quando tinha 20 anos de idade, é estimado e considerado por amigos, colegas e superiores.
266.º
Tem 4 condecorações, respectivamente em …/2019 (… 2a série 30 Nov), …/2013 (… Cap II 2º serie), …/ 2009 (… no …/ 09 do Ministro) e …/2007 (… de …08) .
Assiduidade 2 estrelas
Comportamento exemplar - prata
Assiduidade 1 estrela
Comportamento exemplar – cobre
267.º
Está na 1a classe de comportamento desde 31-05-2001.
268.º
Nunca sofreu punições.
269.º.
Teve diversos louvores ao longo da sua carreira, destacando-se aqui:
Em … de 2001, louvado pelo Comandante do Regimento de Cavalaria de Lisboa, por ter "participado voluntariamente na Operação Ciclo 2000 - Reforço de patrulhamento à Brigada Territorial no 3, tendo aí revelado excelentes predicados técnicos, a par de uma exemplar conduta moral e profissional, correspondendo assim, de forma plena, quer à selecção quer à formação que lhe foi ministrada";
270.º
Em … de 2006, louvado por Sua Excelência o Presidente da República, …, "Louvo o soldado no ..., GG, do 2o Esquadrão do Regimento de Cavalaria da Guarda Nacional Republicana, que demonstrou grande empenhamento dedicação espírito de disciplina.
Deve ter-se em apreço a sua capacidade de adaptação a um desempenho de carácter inovador exigiu o recurso à inteligência, ao bom senso e à capacidade de decisão individual".
271.º
Em …-2010 (em conjunto com outros elementos da GNR), por, "em missão de serviço, no Destacamento de Trânsito de ...” ter “revelando excepcional interesse pela causa pública, qualidades e sacrifício exemplar total disponibilidade, dedicação e alto espírito de missão";
272º
O seu comportamento em serviço tem vindo a ser elogiado por intervenientes em acidentes, designadamente:
Boa noite, venho por este meio, deixar largo elogios aos agentes da GNR com quem contactei durante um acidente ocorrido antes da saída de …. Os guardas em questão são o guarda GG e o guarda FFFFF. Além de excelentes profissionais, têm um tracto e uma sensibilidade que os destaca claramente. Por isso mesmo, quis deixar aqui os meus elogios e saudá-los pela forma como me trataram. Com os melhores cumprimentos,
Sou … me chamo GGGGG, estava de férias em Portugal entre os dias 26 de Julho a 4 de Agosto com minha esposa e meus dois filhos neste País maravilhoso. Venho aqui relatar que exactamente há uma semana atrás sofri um acidente na rodovia entre …. e … no qual fui atingido por trás por um veiculo em alta velocidade, cuja a culpa foi assumida pelo condutor do veiculo e por um verdadeiro milagre não aconteceu absolutamente nada. O motivo deste email é para relatar a atitude dos policiais Guarda Principal Sr. GG e pelo HHHHH. Jamais irei esquecer a ajuda, o atendimento imparcial e todo o amparo que estes policiais deram a mim e a toda a minha família durante quase duas horas na rodovia. Não tenho palavras para agradecer tudo que eles fizeram por mim e por toda a minha família, principalmente pela minha esposa e meus filhos que estavam muito nervosos. Jamais irei esquecer !!! Aqui vai a minha gratidão eterna e mais uma vez o meu muito mais muito obrigado por tudo que eles fizeram. Jamais irei esquecer este dia. Desejo que Deus ilumine estes dois policias juntamente com suas famílias”,
273.º
Em 17-01-2019, foi o arguido objecto da seguinte informação por parte do seu superior hierárquico:
INFORMAÇÃO
Eu, IIIII, Capitão de Infantaria nº ..., Comandante do Destacamento de Trânsito de ..., nessa qualidade cumpre-me informar que o Guarda Principal de Cavalaria no ... GG, desempenha a função de patrulheiro nomeadamente da seguinte forma:
1. Revela ser um militar aprumado, pontual e extremamente educado sendo respeitado pelos seus pares e superiores hierárquicos.
2. Tem demonstrado ser um militar muito profissional sempre disponível para desempenhar o serviço que lhe compete e voluntario sempre que seja necessário colmatar alguma necessidade inerente ao serviço operacional.
3. Cumpre com todas as tarefas que lhes são atribuídas dentro dos prazos estipulados, não deixando de elaborar todo o expediente que lhe compete.
4. Demonstra ter conhecimentos acima da média, ao nível da Legislação Rodoviária sendo solicitado pelos seus parares quando necessitam de algum esclarecimento em alguma matéria.
5. Manifesta iniciativa nos serviços que tem desempenhado na actividade operacional revelando ser uma mais-valia para o Destacamento de Trânsito de ....
274.º
Como militar da GNR frequentou diversos cursos de formação profissional, demonstrando brio e aproveitamento:
. … – Curso específico de cavalaria
- … – Formação de patrulhamento
. … – Curso de restabelecimento de manutenção de ordem pública
. … – Curso de trânsito
- …– Curso de operador de balanças
B) Factos não Provados:
Não ficaram provados os demais factos descritos na acusação que aqui se dão como reproduzidos.
Assim, com interesse para a causa, não se provaram, designadamente os seguintes factos:
(…)
- No circunstancialismo descrito em 5º, o arguido CC estava a desempenhar funções de vigilante/segurança e que, no cumprimento dessa função, percorria todo o espaço interior da “...”, vigiava os clientes e procurava ver eventuais desacatos entre clientes por forma a sanar os mesmos. O mesmo arguido também percorria o espaço exterior à “...” de forma a vigiar os veículos estacionados, verificar a aproximação de peões e as suas intenções, velando para que ninguém se introduzisse nos veículos, nem subtraísse os bens e valores que aí se encontravam. Por vezes o arguido CC ficava junto da porta de entrada da “...”, entregava os cartões de consumo aos clientes, permitia e/ou recusava a entrada de clientes e, à saída dos clientes, recebia destes os cartões de consumo, nos quais verificava a menção do respetivo pagamento, permitindo ou recusando a sua saída do estabelecimento.
Quando já estava a amanhecer, no interior da “...”, o ofendido XX foi abordado por um indivíduo, que nunca tinha visto antes, o qual lhe ofereceu um trago de uma garrafa de Licor Beirão subtraída do bar do mesmo estabelecimento. O ofendido XX aceitou a oferta, porque já tinha consumido algumas bebidas alcoólicas e achou divertida a situação.
Enquanto se encontrava com a garrafa na mão, o ofendido XX foi abordado pelo arguido CC que lhe tirou a garrafa e disse que a ia repor no bar. Em tom de brincadeira o ofendido XX disse: “ao menos deixa-me ir bebendo da garrafa”. Logo o arguido CC retorquiu “Estou a ser teu amigo e ainda estás a abusar. Vou-te é por na rua!”. De seguida, o mesmo arguido expulsou da “...” o XX.
Já no exterior da “...”, junto à porta de entrada, o ofendido XX tentou convencer outro vigilante/segurança deixá-lo voltar a entrar na discoteca, o que este recusou.
Chegou, entretanto, ao local o arguido AA que abordou o ofendido XX e ordenou-lhe que lhe entregasse a pulseira que o mesmo trazia ao pulso e que lhe dava acesso à “...” todos os dias durante o período do Carnaval, visando impedi-lo de entrar no estabelecimento nos dias seguintes.
O ofendido XX recusou entregar a mencionada pulseira e o arguido AA insistiu que o ofendido lhe mostrasse o pulso. O ofendido XX mostrou o pulso oposto ao que trazia a pulseira, ao que o arguido AA reagiu dizendo: “Ó palhaço, estás a gozar? Mostra-me a pulseira”.
O ofendido XX retorquiu: “A pulseira é minha, não mostro.” E em ato contínuo o arguido AA agarrou com força no braço do ofendido, provocando-lhe dores, ao mesmo tempo que lhe arrancou a pulseira, com violência e pela força.
Esta pulseira, que era pertença do ofendido, tinha um valor comercial, por permitir a entrada na “...” todos os dias durante o período do Carnaval, não concretamente apurado, mas seguramente não inferior a € 75,00.
Durante estas agressões, o arguido CC perguntou ao ofendido quem lhe tinha dado a garrafa de Licor Beirão, ao que este respondeu que não conhecia o indivíduo e forneceu uma descrição do mesmo.
Também durante estas agressões, o arguido AA disse, dirigindo-se ao ofendido “O que acontecia se tivéssemos uma arma aqui? E se te matássemos agora?”.
Apercebendo-se da presença de EEE, o arguido AA dirigiu-se-lhe por duas vezes empurrou-a e disse-lhe que saísse dali pois “não estava ali a fazer nada”. Porém, a testemunha EEE esperou que o arguido AA regressasse para junto dos outros agressores, que continuavam a espancar o ofendido, e aproximou-se novamente.
Desde que, contra a sua vontade, o ofendido XX foi forçado a sair de junto da porta de entrada da “...” e a deslocar-se para as traseiras do mesmo estabelecimento, esteve privado da sua liberdade ambulatória por um período de cerca de meia hora.
O ofendido XX aproximou-se da testemunha EEE e permaneceram junto da discoteca, conversando sobre o que iriam fazer, tendo optado por chamar um táxi para ir para casa. Para o efeito, a testemunha EEE usou o seu telemóvel, tendo sido observada pelo arguido AA. De seguida dirigiram-se para o início da rua onde iriam aguardar a chegada do táxi.
Em ato contínuo, o arguido AA aproximou-se do ofendido XX e da testemunha EEE dizendo-lhes “Vocês estão a ligar para quem? Eu ligo já para a GNR”, ao mesmo tempo que agarrava no seu telemóvel.
O arguido CC, apesar de saber que não podia legalmente exercer a função de segurança/vigilante, por não ser titular de cartão profissional, idealizou e quis prestar serviços de segurança/vigilância na “...” e agiu de forma a concretizar tal desiderato, o que alcançou.
Os arguidos AA e CC, agindo em comunhão de vontades, previram e quiseram privar o ofendido XX da sua liberdade ambulatória, forçando-o a permanecer num local cerca de meia hora, sempre contra a vontade do XX e agiram com a intenção de concretizar tal desiderato, o que alcançaram.
(…)
- Entre as 22H00 do dia … de 2015 e as 08H00 do dia seguinte, o arguido FF exerceu serviço de ...no estabelecimento comercial de diversão noturna denominado “..”, sito na Rua 14, em …
No cumprimento dessa função, o arguido FF percorria todo o espaço interior da “…”, vigiava os clientes e procurava ver eventuais desacatos entre clientes por forma a sanar os mesmos. O mesmo arguido também percorria o espaço exterior à “…” de forma a vigiar os veículos estacionados, verificar a aproximação de peões e as suas intenções, velando para que ninguém se introduzisse nos veículos, nem subtraísse os bens e valores que aí se encontravam. Por vezes o arguido FF ficava junto da porta de entrada da “...”, entregava os cartões de consumo aos clientes, permitia e/ou recusava a entrada de clientes e, à saída dos clientes, recebia destes os cartões de consumo, nos quais verificava a menção do respetivo pagamento, permitindo ou recusando a sua saída do estabelecimento.
Nessa noite, a segurança do mencionado estabelecimento foi assegurada pela sociedade comercial “... - SERVIÇOS DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA LDA”, e o arguido DD, sabendo que o mesmo era Agente da Polícia de Segurança Pública e, como tal, estava legalmente impedido de exerce funções de segurança/vigilante, colocou o arguido FF, sem qualquer contrato ou registo formais, a desempenhar funções de vigilante/segurança, de forma encoberta e sem qualquer fardamento, ou identificação da referida empresa.
No circunstancialismo descrito em 70º, CCCC, à revelia e sem conhecimento da sua entidade empregadora, sabendo que o mesmo era Agente da Polícia de Segurança Pública e, como tal, estava legalmente impedido de exerce funções de segurança/vigilante, colocou, por três vezes, o arguido FF, sem qualquer contrato ou registo formais, a desempenhar funções de vigilante/segurança, de forma encoberta e sem qualquer fardamento, ou identificação da referida empresa.
(…)
- Entre as 22H00 do dia … de 2016 e as 08H00 do dia seguinte, as 22H00 do dia 8 de Outubro de 2016 e as 08H00 do dia seguinte, as 22H00 do dia … de 2016 e as 08H00 do dia seguinte, o arguido FF exerceu serviço como ...no estabelecimento comercial de diversão noturna denominado “…”, sito na Rua 15.
- No cumprimento dessa função, o arguido FF percorria todo o espaço interior da “…”, vigiava os clientes e procurava ver eventuais desacatos entre clientes por forma a sanar os mesmos. O mesmo arguido também percorria o espaço exterior à “...Club” de forma a vigiar os veículos estacionados, verificar a aproximação de peões e as suas intenções, velando para que ninguém se introduzisse nos veículos, nem subtraísse os bens e valores que aí se encontravam. Por vezes o arguido FF ficava junto da porta de entrada da “...Club”, entregava os cartões de consumo aos clientes, permitia e/ou recusava a entrada de clientes e, à saída dos clientes, recebia destes os cartões de consumo, nos quais verificava a menção do respetivo pagamento, permitindo ou recusando a sua saída do estabelecimento.
- A segurança no mencionado estabelecimento de diversão foi assegurada, em todos esses dias, pela sociedade comercial “….”, da qual era trabalhador o arguido MM, que à revelia e sem conhecimento da sua entidade empregadora, sabendo que o mesmo era Agente da Polícia de Segurança Pública e, como tal, estava legalmente impedido de exercer funções de segurança/vigilante, colocou, por três vezes, o arguido FF, sem qualquer contrato ou registo formais, a desempenhar funções de vigilante/segurança, de forma encoberta e sem qualquer fardamento, ou identificação da referida empresa.
(…)
- o arguido FF encontrou-se com o arguido GGGG a quem entregou este bastão e, em contrapartida, este arguido entregou-lhe quantia monetária não apurada, mas seguramente superior à quantia que o arguido FF entregara a EEEE.
Em … de 2016, a arguida OO e a sua mãe, a arguida PP, decidiram vender duas armas de fogo ilegais que possuíam. Para o efeito, no dia … de 2016, a arguida OO contactou telefonicamente com o arguido FF e solicitou-lhe que mediasse a venda das referidas armas, encontrando comprador para as mesmas.
O arguido FF aceitou a proposta da arguida OO e começou a tentar encontrar um comprador para as mencionadas armas. Assim, em ato contínuo o arguido FF contactou telefonicamente com o arguido BBB que se mostrou interessado na aquisição das armas e ambos acordaram em se deslocar à residência das duas arguidas para verem as armas.
No dia … de 2016, entre as 22h42 e as 23h17, em execução de prévio acordo entre ambos, os arguidos FF e BBB deslocaram-se para a residência das duas arguidas, sita na Av. 16, onde os aguardava a arguida PP. No local, a arguida PP mostrou as duas armas de fogo aos arguidos FF e BBB e este ofereceu o montante de € 500,00 pela compra de ambas.
De seguida, o arguido FF entrou em contacto telefónico com a arguida OO, informou-a como havia decorrido o encontro e aconselhou-a a não aceitar a oferta do arguido BBB por considerar que as armas tinham um valor superior. A arguida OO disse que tinha outro comprador que lhe havia oferecido o montante de € 1.000,00 e que ia tentar concretizar esse negócio.
No dia … de 2016, pelas 09h39, o arguido FF contactou telefonicamente a arguida OO para a questionar se já havia concretizado o negócio de venda das armas e ofereceu-se para tentar encontrar outros compradores para as armas de fogo. A arguida OO informou que o negócio não estava concluído e aceitou a proposta para o arguido FF continuar a mediar a venda das duas armas de fogo.
Nesse mesmo dia, o arguido FF encontrou-se com o arguido EE e, posteriormente, com a testemunha JJJJJ (de alcunha KKKKK), informando-os que estava a mediar um negócio de venda de duas armas de fogo, concretamente as duas armas acima referidas e que as poderia vender pelo preço de € 1.000,00.
No dia … de 2016, pelas 09h55, a testemunha JJJJJ informou o arguido FF que estava disposto a comprar as armas de fogo pela quantia de € 1.000,00. Posteriormente, o arguido FF contactou com a arguida OO para lhe dar conhecimento de que já tinha um comprador para as armas de fogo. Porém, a arguida OO explicou que já não tinha na sua posse as armas porque um primo seu tinha tentado concretizar o negócio com terceiros e lhe haviam subtraído as armas.
Desta forma, a venda das duas armas não se concretizou, por motivos totalmente alheios à vontade dos arguidos mencionados que desenvolveram esforços no sentido de finalizar a transação.
(…)
A arma e munições encontradas nas instalações da ... pertenciam a QQ.
O arguido QQ, sabendo que para tanto não estava autorizado, quis deter e guardar a arma e as munições acima referidas, agindo com a intenção de concretizar tal desiderato, o que alcançou.
(…)
Relativamente aos factos imputados a SS, não se provou que:
A arguida tenha tido qualquer participação nos factos que a acusação descrevia e que tivesse agido concertadamente com GG.
Que o serviço descrito foi praticado pelo arguido GG a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
O arguido GG teve acesso aos elementos de identificação de KKKK uma vez que, no dia …/2014, por via do sistema informático da Guarda Nacional Republicana, acedeu à base de dados do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, na qual constam todas as cartas de conduções emitidas em Portugal.
O arguido GG, apesar de saber que não o podia fazer por estar sujeito a sigilo profissional e que, para tanto, não tinha autorização do titular dos elementos identificativos, representou e quis utilizar os dados de identificação de um titular de carta de condução, que tinha obtido pela consulta de uma base de dados a que teve acesso no âmbito da sua missão pública, para os colocar em requerimento dirigido à Autoridade de Segurança Rodoviária, assim contrariando a finalidade da mesma base de dados, e agiu com a intenção de concretizar tal desiderato, o que concretizou.
O arguido GG beneficiou vários indivíduos arguidos em processos de contraordenação rodoviária com o objetivo de deles receber uma contrapartida de natureza patrimonial. Os indivíduos beneficiados retribuíam o auxílio prestado pelos arguido GG com promessas que, em alguns casos, se concretizaram em jantares e em percentagens de lucro relativas a investimentos na empresa ... (mormente em instrumentos financeiros denominados “clouds”), empresa da qual os arguidos FF e GG eram agentes/promotores.
A ... era uma empresa de origem austríaca que rapidamente se expandiu pelo mundo e a mesma centrava o seu negócio na venda de instrumentos financeiros de participação no seu próprio negócio que denominava de “clouds”. Cada “cloud” tinha um valor e o cliente da empresa pagava esse valor pela sua aquisição na expetativa que a …s expandisse o seu negócio. Decorridos 36 meses sobre a data da aquisição da “cloud” o seu proprietário poderia começar a receber a devolução do seu investimento, sendo a devolução proporcional ao nível de lucro apresentado pela ... no pais onde a “cloud” tinha sido vendida.
A ... tinha angariadores, entre os quais os arguidos GG e FF, cuja missão era aliciarem clientes para adquirirem as “clouds” e, por cada uma destas aquisições, os angariadores recebiam uma percentagem do valor da respetiva venda. Os angariadores também recrutavam outros indivíduos para serem angariadores e recebiam uma percentagem por todas as vendas que estes realizassem, e assim sucessivamente, num esquema de pirâmide conhecido por “esquema Ponzi”.
Para dar a imagem de licitude da sua atividade e ocultar o “esquema Ponzi”, mesmo porque a empresa já fora alvo de vários processos judiciais e administrativos relacionados com tal atividade, a … atribuía aos seus clientes cartões de descontos em várias lojas e empresas. Mediante a apresentação do cartão da … o seu portador tinha desconto imediato nas lojas e empresas associadas e aderentes ao cartão, para além de acumularem pontos que, no futuro, poderiam ser transformados em valor para aquisição de bens e produtos.
Os clientes titulares de cartão da … recebiam, ainda, parte do montante pago nas compras por si efetuadas em lojas e empresas associadas, vulgo cash back.
Na sua qualidade de angariadores da ... os arguidos GG e FF recebiam pagamentos em montante não concretamente apurado de cada vez que vendiam “clouds”, recrutavam empresas para aderirem aos descontos ou clientes para aquisição do cartão de descontos.
Por referência aos factos da arguida LLLLL, não se provou que:
O serviço descrito foi praticado pelo arguido GG na perspetiva que a arguida CCC e o seu companheiro, a testemunha LLLL, realizassem investimentos na empresa ..., concretamente comprando os instrumentos financeiros denominados por “clouds” para, desta forma, obter ele próprio compensação financeira na sua qualidade de colaborador/angariador da ..., auferindo uma percentagem em dinheiro do total do investimento realizado pela arguida e/ou pelo seu companheiro.
Nos dias subsequentes à elaboração à remessa dos requerimentos à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, o arguido GG contactou repetida e sucessivamente com a arguida CCC e com a testemunha LLLL insistindo para que estes investissem nas referidas “clouds” e para lhe apresentarem amigos e conhecidos a quem o arguido pudesse apresentar o negócio da ... e conseguir mais clientes, assim obtendo ganhos monetários.
A arguida CCC e o seu companheiro LLLL nunca chegaram a concretizar os mencionados investimentos na ..., todavia, o arguido GG continuou a insistir pelo menos até Julho de 2018, tendo chegado a verbalizar à arguida CCC “Eu te ajudei, você tem que me ajudar!”.
O arguido GG solicitou à arguida CCC e o seu companheiro LLLL que investissem na aquisição de “clouds” da ... a fim de lhe pagarem o favor que lhes tinha feito de elaborar os catorze requerimentos acima referidos e, desse modo, os eximir de lhes serem aplicadas as coimas, as sanções de inibição de conduzir e de lhes serem retirados pontos da carta de condução.
A testemunha NNNN entregou ao arguido GG uma fotocópia da carta de condução de PPPP, que havia comprado pela quantia de € 125,00.
O serviço prestado a MMMMM foi praticado pelo arguido GG a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
O arguido GG prestou o referido serviço a TT a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
O arguido GG teve acesso aos elementos de identificação de RRRR uma vez que, no dia …/2011, por via do sistema informático da Guarda Nacional Republicana, acedeu à base de dados do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, na qual constam todas as cartas de conduções emitidas em Portugal.
O arguido GG, apesar de saber que não o podia fazer por estar sujeito a sigilo profissional e que, para tanto, não tinha autorização do titular dos elementos identificativos, representou e quis utilizar os dados de identificação de um titular de carta de condução, que tinha obtido pela consulta de uma base de dados a que teve acesso no âmbito da sua missão pública, para os colocar em requerimento dirigido à Autoridade de Segurança Rodoviária, assim contrariando a finalidade da mesma base de dados, e agiu com a intenção de concretizar tal desiderato, o que concretizou.
(…)
O arguido GG teve acesso aos elementos de identificação de KKKK uma vez que, no dia …/2014, por via do sistema informático da Guarda Nacional Republicana, acedeu à base de dados do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, na qual constam todas as cartas de conduções emitidas em Portugal.
Nos dias subsequentes à elaboração à remessa do requerimento à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, em nome de SSSS, o arguido GG contactou repetida e sucessivamente com a testemunha SSSS insistindo para que este investisse nas referidas “clouds”, assim obtendo ganhos monetários.
A testemunha SSSS nunca chegou a concretizar os mencionados investimentos na ..., todavia, o arguido GG continuou a insistir.
O arguido GG solicitou à testemunha SSSS que investisse na aquisição de “clouds” da ... a fim de lhe pagar o favor que lhe tinha feito de elaborar o requerimento em causa e, desse modo, o eximir de lhe ser aplicada a coima, a sanção de inibição de conduzir e de lhe serem retirados pontos da carta de condução.
O arguido GG, apesar de saber que não o podia fazer por estar sujeito a sigilo profissional e que, para tanto, não tinha autorização do titular dos elementos identificativos, representou e quis utilizar os dados de identificação de um titular de carta de condução, que tinha obtido pela consulta de uma base de dados a que teve acesso no âmbito da sua missão pública, para os colocar em requerimento dirigido à Autoridade de Segurança Rodoviária, assim contrariando a finalidade da mesma base de dados, e agiu com a intenção de concretizar tal desiderato, o que concretizou.
O arguido GG representou e quis solicitar à testemunha SSSS que investisse na aquisição de “clouds” da ..., para ele próprio obter vantagem patrimonial consubstanciada em percentagem desse investimento, como contrapartida de elaborar o requerimento acima mencionado para isentar à mesma testemunha de lhe serem aplicadas a coima e sanção de inibição de conduzir, e de lhe serem retirados pontos da carta de condução, sabendo que tal ato era antagónico com os deveres da sua condição de militar da Guarda Nacional Republicana e agiu com o fim de concretizar tal desiderato, o que alcançou.
Na situação relativa a NNNNN, o arguido GG, apesar de saber que não o podia fazer por estar sujeito a sigilo profissional e que, para tanto, não tinha autorização do titular dos elementos identificativos, representou e quis utilizar os dados de identificação de um titular de carta de condução, que tinha obtido pela consulta de uma base de dados a que teve acesso no âmbito da sua missão pública, para os colocar em requerimento dirigido à Autoridade de Segurança Rodoviária, assim contrariando a finalidade da mesma base de dados, e agiu com a intenção de concretizar tal desiderato, o que concretizou.
(…)
O serviço descrito relativo a UUUU foi praticado pelo arguido GG a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
O arguido GG teve acesso aos elementos de identificação de KKKK uma vez que, no dia …/2014, por via do sistema informático da Guarda Nacional Republicana, acedeu à base de dados do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, na qual constam todas as cartas de conduções emitidas em Portugal.
O serviço descrito e relativo a VVVV foi praticado pelo arguido GG a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
O serviço descrito e relativa às infracções imputadas a XXXX foi praticado pelo arguido GG a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
O serviço descrito e relativo à infracção imputada a AAAAA foi praticado pelo arguido GG a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
(…)
O arguido GG teve acesso aos elementos de identificação de ZZZZ uma vez que, no dia …/2011, por via do sistema informático da Guarda Nacional Republicana, acedeu à base de dados do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, na qual constam todas as cartas de conduções emitidas em Portugal.
O arguido GG, apesar de saber que não o podia fazer por estar sujeito a sigilo profissional e que, para tanto, não tinha autorização do titular dos elementos identificativos, representou e quis utilizar os dados de identificação de um titular de carta de condução, que tinha obtido pela consulta de uma base de dados a que teve acesso no âmbito da sua missão pública, para os colocar em requerimento dirigido à Autoridade de Segurança Rodoviária, assim contrariando a finalidade da mesma base de dados, e agiu com a intenção de concretizar tal desiderato, o que concretizou.
(…)
Da contestação do arguido GG não se provou a matéria que ali se alegava e que se mostra em contradição com a matéria que se deu como provada, dando-se aqui a mesma como reproduzida.
II.3.C. Dos motivos de facto, indicação e exame crítico das provas exarados no acórdão recorrido (cfr. ref.ª ... de 29-11-2024):
É a seguinte a motivação da decisão de facto apresentada pelo tribunal de 1.ª Instância:
C) Motivação:
Vigora entre nós o princípio da livre apreciação da prova, de acordo com o qual as provas são apreciadas pelo julgador segundo a sua livre convicção, não uma convicção arbitrária, subjetiva, baseada em critérios meramente pessoais, mas uma convicção racional e crítica, baseada em critérios objetivos, ou seja, nas regras da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica (OOOOO, in Código de Processo Penal Anotado e Comentado, 12. ª edição 339).
Por outro lado, na valoração da prova atenderá o julgador aos chamados meios de prova/prova direta e à credibilidade que os mesmos lhe mereçam – tendo em conta, designadamente, o modo e as circunstâncias como essa prova é transmitida ao tribunal e os eventuais interesses conflituantes dos intervenientes processuais – e à prova indireta/indiciária, onde intervêm as deduções e induções que o julgador realiza a partir dos factos probatórios, de acordo com as regras da experiência, da lógica e os critérios da normalidade da vida.
Assim, no processo de formação da sua convicção valeu-se o tribunal da prova pré-constituída de que processual e legalmente se podia socorrer que conjugou com a que veio a ser trazida a julgamento, fragilizada e até desmotivada pelo lapso temporal decorrido desde a ocorrência dos episódios cuja necessidade de recordação, agora em julgamento, foi novamente suscitada.
Particularizando, passamos a explicitar por blocos de factos, seguindo de perto o esquema e agrupamento optado pela peça acusatória para melhor compreensão, a prova em que o tribunal se sustentou.
(…)
5. Nuipc 493/17.7PATVD – MMM arguido BB:
PPPPP trabalhava na LB, uma empresa concorrente da ... (que etimologicamente, apenas por curiosidade, corresponde ao grito de guerra dos comandos e significa “estamos prontos para o sacrifício”), na qual BB desempenhava funções de coordenação, supervisão e de angariação de clientes, concretamente de casas de diversão nocturna que necessitassem de vigilantes/seguranças. Eram concorrentes no ramo e também na área já que ambas disputavam o mercado nocturno, designadamente de ... e sobretudo por ocasião das festas de Carnaval, atenta a sua rentabilidade.
Neste contexto e por razões que não se apuraram a “LB” começou a ganhar terreno e a ... a perder clientes para aquela o que terá motivado a conduta do arguido BB (cfr. queixa fls. 2 e ss do nuipc 493/17.7PATVD, quanto à data dos factos e local da ocorrência).
Com efeito, recordou MMM que no final … de 2017, o arguido surge-lhe dizendo que precisava de lhe dar umas palavrinhas avisando-o de que se fosse novamente “À Kikas” (uma casa nocturna em …) k o ia rebentar todo. Acusando-o de ter ficado com o “...” e com o carnaval de Torres e que o iria matar caso não parasse de lhe roubar as casas. Deu aliás como exemplo do que tinha feito ao ZZZ ( o arguido BBBB) e ao AAAA (CCCC), ambos seguranças da “LB”, que MMM sabia que tinham sido, respectivamente, agredido e, pelo menos, ameaçado pelo arguido, até porque presenciara tal agressão.
Em consequência de tais palavras, porque temeu o que o arguido lhe pudesse fazer, conhecendo o seu temperamento e sabendo que o mesmo recorria à violência como modo de solucionar os seus problemas e de arrumar os seus opositores, esta testemunha garantiu ter deixado de fazer noites de carnaval, largando a parte comercial nocturna de ... (durante pelo menos dois anos) para não ter que se cruzar mais com o arguido ou alguém da .... Assim, sendo óbvio que não deixou de trabalhar totalmente, pelo menos o mercado mais lucrativo de ..., incluindo o carnaval, deixou de o efectuar para a LB, pelo que, nesta medida a pretensão do arguido foi conseguida já que MMM, acusado pelo arguido de lhe ter “roubado” casas, tendo efectivamente a “...” deixado de ser ... para passar a ser LB, deixou de angariar mais clientes naquele mercado específico.
A rivalidade entre as empresas e a disputa de “casas”, incluindo a “…” e revanchismo de BB, ficou patenteada nas sessões 568519, 568610, 569100, 589781, 589782 do apenso III B, nas quais, além do mais, BB se gaba de ter agredido BBBB na ..., já depois de ter perdido esta “casa” para a LB e de ter desafiado os seguranças da LB que ali estavam, incluindo o Francês, o chefe deles, referindo-se a MMM.
Neste conspecto irrelevam as declarações finais prestadas pelo arguido no sentido de delatar que MMM andaria a “roubar” o patrão QQQQQ, algo que apenas a este certamente interessaria, mas que não coloca em causa a isenção da testemunha.
(…)
7. Segurança privada ilícita – tomo II- FF, RRRRR, SSSSS, TTTTT
Enquadramento prévio:
BB era um dos braços direitos de..., seu colaborador no terreno que organizava as escalas e distribuía os seguranças pelos estabelecimentos nocturnos a cargo da empresa. Para além disso também visava conseguir que mais clientes aderissem aos serviços da ..., tendo aqui também um papel comercial (cfr. informação de fls. 2309 – da mesma constando que o arguido tem, entre outras, a especialidade de segurança porteiro, que desenvolvia pelo menos desde 23 de janeiro de 2014 na ...).
Contava com AA, um dos seus poucos homens de confiança, o qual para além de segurança era também seu amigo – vide informação da PSP de fls. 2306 e ss – o arguido tem a especialidade de segurança porteiro e de director de segurança.
Mas contou ainda durante um determinado período de tempo (enquanto não se chatearam) pelo menos até sensivelmente ao … de 2016, com FF, agente da PSP então em exercício de funções. FF não era somente um simples assíduo cliente nocturno dos bares e discotecas da zona de .... Invariavelmente também colaborava com a equipa dos seguranças da ... e depois também da LB, desempenhando as funções que um vigilante de tais locais desempenha, na medida do que lhe era possível e certamente evitando contacto directo com os clientes uma vez que não tinha nem farda nem identificação de vigilante como aliás jamais lhe poderia ser atribuída, o que sabia plenamente.
As cautelas que todos tinham em falar nas comunicações telefónicas de forma expressa sobre este seu outro trabalho, optando por vezes por contactos através de redes encriptadas, evidenciam que FFnão combinava encontros para sair à noite, mas para trabalhar à noite e que não se relacionava com seguranças da noite, estabelecendo com estes contactos telefónicos frequentes, apenas por os conhecer e frequentarem os mesmos locais de diversão.
Do lado da LB temos o arguido BBBB (primo em segundo grau de FFcomo aquele esclareceu em julgamento) que também era vigilante/segurança (vide infomação de fls. 2315) e VVVVV (de alcunha AAAA) que coordenava os seguranças da LB (vide informação de fls. 2312).
NN foi também segurança porteiro da LB – cfr. informação de fls. 2311.
Chegamos às conclusões elencadas, através da leitura extensa das intercepções telefónicas transcritas no Apenso III.
Com destaque para as seguintes que sumariamos:
Sessão 568519, do apenso III B, a ….2016, em que BB fala para o segurança WWWWW no dia 8.10.2016 e dos tempos em que trabalhou na … que colocou lá um bófia, que sempre comprou guerras por causa dele pois não o queriam lá a trabalhar, só queriam fardados e que depois acabou por ter de tirar os “paisanas” mas que não lhe disse nada para ele não fazer uma asneira e agora sabe que começou a fazer trabalhos para a LB.
Na sessão 568610, do mesmo apenso III B, o arguido volta a falar do bófia de ... que se meteu naquilo e por isso perdeu a ..., acabando por dizer que tal bófia é o UUUUU (FF) que levou o XXXXX Francês da LB (MMM) à ....
Na sessão 589781, fls. 133 e ss do mesmo apenso, a fls. 137 BB relata a conversa que teve quando foi ao ... falar com o chefe da LB e fala do UUUUU e do primo que o levaram lá com o pacote da ....
Sessão 108350 de ….2016, apenso III-A, FF fala com o primo BBBB e da agressão que BB fez a este na .... NNN diz que falou com YYYYY que disse que eles (UUUUU e NNN) tinham pressionado o ZZZZZ da ... para mudar para a LB.
Sessão 108531, de ….2016, apenso III-A, FF fala com BB, BB acusa-o a ele e a BBBB de ter desviado clientela por causa da ... e por isso ter perdido a ... para a LB, acabando a conversa por voltar aos tempos em que ambos estavam na ... e que BB o tirou de lá, sustentando este que sempre o protegeu até onde pôde apesar de não o quererem lá a trabalhar, já que o arguido FF, para além de trabalhar “à paisana”, muitas vezes bêbado, era considerado um terror em ... e entrava em todas as discotecas com o “canhão” (arma de fogo) na mão.
Nas sessões 589781 e 589782, de ….2016, do apenso III-B, BB fala com AAAAAA e relata-lhe a conversa que teve com FF, dizendo-lhe que este era seu amigo, colega, fechavam juntos, que lhe deixou de falar a ele e ao BBBBBB, começando a trabalhar na LB.
Na sessão 106707 – fls. 66 do apenso III-A, em ….2016, na qual FF liga para CCCCCC que atende dizendo: ..., percebendo-se por isso que o número do destinatário se trata do escritório daquela empresa. Nesta conversa, UUUUU diz que esteve a trabalhar de noite deitou-se às 8h00 e veio entrar ao meio dia e meio e diz que logo à noite (dia 5.10.2016) vai beber um copo ao “...” com o DDDDDD.
Sessão 107021 em ….2016, do apenso III-A, FF fala com EEEEEE e queixa-se de trabalhar muito e o FFFFFF diz “trabalhar nos 2 lados né?” e UUUUUdiz nos 3, na ... , na polícia e “mais qualquer coisa”, diz EEEEEE. FF refere que tem ajudado os gajos na festa do ... na barraca das bifanas.
Um apontamento apenas quanto à ocupação de FF na .... Ao que se sabe, de fonte apenas pública, esta empresa funcionaria como uma empresa designada de marketing multinível muitas vezes próxima ou coincidente até com um esquema piramidal (cuja prática é proibida por violar normas de concorrência e de protecção do consumidor), sem que a mesma tivesse sido investigada quanto ao seu produto e forma de funcionamento para se chegar a tal conclusão. Das sessões interceptadas infere-se que FF, assim como GGGGGG, investiram nesta empresa e pretendiam ganhar dinheiro pelo recrutamento de novos investidores que teriam de adquirir “clouds”, que lhes permitiria em contrapartida e em teoria, usufruir de descontos na aquisição de produtos junto, nomeadamente, de empresas que tivessem cartão ....
Aliás, como se percebe do teor das conversas mantidas entre BB e FF aquele nunca acreditou no negócio ... e quer ele quer BBBBBB estavam fartos da propaganda insistente que acerca do negócio ... lhes fazia.
Posto isto,
É inegável que FF trabalhou, além do mais, no ... com BB e que as funções que ali exerceu não eram outras senão as de um ...de discoteca.
FF mantinha contactos com pessoas que geriam a segurança noctura dos estabelecimentos e eventos de ..., seja através da ..., seja pela LB, e aproveitava o seu tempo disponível das suas funções de agente da PSP para fazer segurança privada.
Assim, conhecendo-se que FF se dedicava à actividade de segurança privada, vejamos em concreto os factos que se lhe imputavam relacionados com aquela e que prova os sustentam.
Discoteca ... – … de 2015:
Mostram-se juntos aos autos a fls. 2343 e ss umas publicações de fotografias extraídas do perfil de FB da Dancetaria ....
Das mesmas infere-se que ali estiveram os arguidos FF e RRRRR nos dias … e … de junho de 2015.
A fls. 2346 surge o arguido AA no evento de … de 2015 (8º aniversário do clube) e a fls. 2347, na mesma noite, também o arguido FF.
A fls. 2348 surge o arguido RRRRR em 18 de junho e em 23 de junho de 2015 (data das publicações no FB) também no ....
Foi inquirido HHHHHH que explorou o estabelecimento ... entre 2010 a 2019 e contratou empresas de segurança entre as quais a ... tendo tido problemas com esta já que o arguido BB lhe estaria a cobrar a mais pelo serviço prestado, designadamente pelo trabalho de FF que, no entanto, nunca viu desempenhar, sendo este, para ele, um cliente apenas que cumprimentava, nunca o tendo visto a fazer qualquer serviço de vigilância, nem de controle à porta, nem qualquer abordagem a clientes, nem mesmo que ali estivesse a cumprir qualquer horário.
Inexiste qualquer vigilância nem outro elemento probatório que implique o arguido no circunstancialismo acusatório.
A acusação na verdade apenas se baseou nas publicações do FB para imputar ao arguido a actividade de segurança privada na ... entre … e … de 2015, sendo que a tal conclusão não se chegaria apenas pelo facto prévio conhecido de que efectivamente FFexerceu ali funções de vigilante/segurança, sendo que certamente não o efectuou todas as noites nem se pode presumir que todas as noites em que ali esteve desempenhasse tais funções.
Assim, estas publicações nada o comprometem criminalmente. Apenas colocam o agente no local e tempo descrito. E a comprometer, então também comprometeriam RRRRR que também não estava habilitado ao exercício de tal actividade pelo que não se compreende o critério usado, nem as suas conclusões.
… – … a … de 2016:
Foram juntas aos autos as fotos postadas no FB da “…” com o respectivo cartaz e programa, tratando-se de uma festa anual que decorreu de … a … de 2016, com concertos a partir das 22h00, em espaço aberto.
Das juntas a fls. 2350, 2351 e 2352, constata-se a presença de IIIIII como vigilante da LB, de FFe por fim de CCCC também fardado como vigilante da LB.
Até aqui nada ou pouco mais nada de comprometedor relativamente a FF que até poderia estar ali como um visitante.
Inexiste é um facto qualquer diligência que em tempo real pudesse ter constatado a actividade que a acusação sustenta que tenha ocorrido.
No entanto considera o tribunal que efectivamente FFnão esteve na festa de … em puro lazer nem a grelhar bifanas mas esteve a desempenhar funções de vigilante por conta da LB a cargo da qual estava o serviço de segurança de tal evento.
E a tal conclusão se chega com base na conjugação dos factos já expostos com as seguintes sessões telefónicas:
Apenso III- A, sessão 104233 a fls. 29: BBBB liga a FF a 30.09.2016. …pergunta a NNN se ele vai ao … – evento do JJJJJJ - e aquele diz que vai à festa dos ....
Sessão 105126 – de ….2016, fls. 59 do mesmo apenso:
... recebe chamada de RRRRR que lhe pergunta se pode na terça e na quarta. UUUUU diz que se comprometeu nos ... na sexta, sábado e terça (dias 30 de setembro, 1 e 4 de outubro) mas que quarta (5 de outubro), pode. DDDDDD diz que então a quarta fica para o UUUUU.
Sessão 106504 – fls. 61, a ….2016, às 23h19:
UUUUU envia sms para o arguido GG em que lhe diz vou agora trabalhar para os .... Correu bem?
Depois, na sessão já mencionada supra com o nº 107021, em que fala dos seus três trabalhos, em ….2016, fala na festa dos ... e diz que tem ajudado os “gajos na festa dos ..., lá na barraca das bifanas”.
Decorre por isso que nos dias referidos o arguido esteve na festa de ... a trabalhar como vigilante e não no desempenho de qualquer outra actividade ou função, ficando, no entanto, por determinar quem o cooptou para tais funções por parte da LB, não existindo qualquer prova que permita concluir inequivocamente que foi CCCC (o AAAA), apesar de este se encontrar no mesmo evento, por não ser o único funcionário da LB que poderia tomar tais decisões.
KKKKKK – … de 2016 e … de 2016:
Nas fotos publicadas no FB do ..., (fls. 2353 e ss) conclui-se que no dia ….2016 o arguido DDDDDD frequentou tal espaço, apresentando-se ao lado de pessoas que tudo aparentam serem clientes comuns já que se encontram a consumir a sua bebida.
Do mesmo perfil de FB a ….2016 surge FFao lado de RRRRR e mais dois indivíduos, sendo que nenhum deles usa qualquer farda de vigilante.
RRRRR surge ainda nas fotos publicadas a ….2016 e a ….2016 e não é por aparecer numa delas com as mãos atrás das costas que se presume que estivesse a exercer funções de vigilante.
No dia … de 2016 no mesmo KKKKKK decorreu o espectáculo musical de DDDD anunciado no cartaz de fls. 2356 da “…”.
A prova está assente nas seguintes intercepções do apenso III-A:
UUUUU troca mensagens escritas com DDDDDD – fls. 62, a ….2016 combinam hora de encontro, entre as 23h30 e 24h00 e RRRRR diz que lhe abre o portão quando ele chegar.
Sessão 106633 – dia ….2016 – fls. 63 – ... recebe chamada de DDDDDD combinando o encontro dessa noite e depois DDDDDD pergunta se UUUUU está livre no sábado (…), ele diz que sim e DDDDDD responde então que ele pode contar já.
A fls. 68 – UUUUU avisa DDDDDD que está a sair de Torres – … 2016 às 23h18 – sessão 106902.
Na sessão 106909 em ….2016 às 23h27 UUUUU fala com LLLLLL e diz que em cinco horas está em casa e que está à espera ainda do DDDDDD, perguntando à namorada se pode dançar um “kizombazinho”.
Ora, como se mencionou na sessão 106707 – fls. 66 do apenso III-A, ocorrida a ….2016, FFanuncia o encontro com RRRRR, nessa noite, no “…”
De todo exposto concluiu o tribunal sem margem para dúvidas de que na noite de …de 2016 o arguido FF exerceu funções de vigilante/segurança no bar ..., de ....
Se esta conclusão se extrai quanto a FF, já quanto a RRRRR o mesmo não pode ser transposto. Este arguido apenas surge nestas conversas fugazes com FF (nunca foi um alvo directo das intercepções) desconhecendo-se o que faz e qual a sua relação com o estabelecimento nocturno em questão, nada nos permitindo concluir que também fosse um segurança “à paisana”, apesar de se saber que nunca esteve autorizado a exercer tais funções.
Relativamente à noite de … para … de 2016 a prova que existe é bastante porque segura e inabalável, a saber: a sessão 135980 de ….2026, transcrita a fls. 164 e ss do apenso III- A, quando FF fala com o primo BBBB e este e diz-lhe que a MMMMMM (namorada de ...) o questionou se tinha estado a trabalhar com ele. ... disse que lhe disse a verdade que tinha ido ao .... ... desabafa e diz que ela não gosta que ele trabalhe na noite e para NNN lhe dizer que o DDDDDD ligou para saber se alguém podia fazer o resto da noite no ... e que ele ... aceitou desenrascar a situação e que pode aproveitar e dizer à MMMMMM que o rapaz (referindo-se ao próprio) foi trabalhar para ganhar dinheiro. Ora, não duvidamos disto, nem que FFtenha estado nesta noite no bar ... à paisana com vigilante. Já o mesmo não se pode inferir quanto a RRRRR. E quanto à intervenção de CCCC na contratação de FF também nada se concluiu. Todas as conversas foram mantidas com DDDDDD cujo papel na LB ou noutro se desconhece e apesar de CCCC ser pelo menos um dos responsáveis pela gestão dos vigilantes da LB nada garante que esta decisão e escolha de FF tivesse sido dele directamente.
...– …, … de outubro de 2016:
Do perfil do FB de NNNNNN, então gerente da ...Club (fotos de fls. 2357 a 2359) anuncia-se a inauguração do espaço a … de 2016 com a actuação de artistas convidados – OOOOOO e PPPPPP e outro evento a 12 de novembro das cantoras “Dj´s QQQQQQ”
Não se vislumbra qualquer prova que sustente esta factualidade certamente não assente apenas na conversa correspondente à sessão ... do apenso III A, do dia ….2016, sumariada supra.
Da sessão 107632, de …, a fls. 74 do mesmo apenso FF fala com GGGG e pergunta a que horas é que ele quer que esteja operacional, a que horas em casa, desconhecendo-se a que casa se relacionava IIIIII (que se sabia ser vigilante) e se FF lá prestou serviços de vigilância.
A tal conclusão não se chega através da sessão 108207 de …, às 23h03 – a fls. 81/82, na qual ... fala com RRRRRR e pergunta-lhe se quer casaco ou sobretudo e que lhe leva o que ele quiser que vai estar frio melhor o sobretudo - antecipando que tem um da LB, percepcionando-se que este vai trabalhar na noite mas ignorando-se se também FF o efectuou e em que local, na certeza de que na véspera esteve no mesmo estabelecimento e com o AAAA (CCCC).
Nenhuma prova existe ainda relativamente à noite de …para … de 2016, a tanto sendo inconcludentes as sessões destacadas pela acusação: 123833, 123931 e123962 do apenso III-A, sendo aventuroso presumir que as cantoras que ali se mencionam sejam as anunciadas no cartaz da ...e que o arguido FF ali tenha estado como vigilante.
Da prova testemunhal produzida também nada mais se logrou apurar.
Foi inquirido SSSSSS, que confirmou que o arguido CCCC foi segurança na sua ...(na noite de abertura, o local não tinha movimento pelo que só tinha uma pessoa na porta de segurança) e que contratou uma empresa de segurança, a … - cfr- 3957/3960: contrato prestação de serviços de vigilância e segurança privada celebrado entre a … e TTTTTT para a ...– Club, em ... pelo prazo de 6 meses desde 7 de setembro de 2016
Referiu que o arguido FFfrequentava a discoteca mas nunca lá trabalhou e que ficava próximo dos seguranças por ser amigo dos mesmos.
Por seu turno, NNNNNN, também trabalhador no local e, à data companheiro de TTTTTT confirmou que o arguido CCCC seria quem lidava com as empresas segurança mormente com a … que os prestava para o Imperium, nada mais tendo esclarecido, nem se FFali trabalhou como vigilante (vendo-o por lá apenas) recordando vagamente que TTTTTT acharia que estava a pagar em demasia pelos serviços de segurança.
O então sócio gerente da … – UUUUUU, confirmou que o AAAA, o arguido CCCC foi seu funcionário, era também segurança porteiro não conseguindo precisar em que período e mencionou que FFnunca para o mesmo trabalhou.
8. Tráfico de armas e detenção de armas:
Relativamente aos factos que eram imputados ao arguido VVVVVV:
EEEE, agente da PSP, (outrora também arguido, alvo de despacho de não pronúncia e por isso indicado como testemunha) referiu que à data era comum entre agentes da PSP adquirirem bastões extensíveis e confirmou que arranjou dois ao arguido FFque lhos pagou, não recordando o valor, desconhecendo qual o destino que lhos deu.
Ora, pelo menos um dos referidos bastões foi entregue por FFa BBBB, conforme decorre das seguintes sessões telefónicas do apenso III-A:
Mensagens escritas de fls. 21, em … de 2016, trocadas entre ... e BBBB (ZZZ):
Este diz que precisa de um extensível para levar para a festa de WWWWWW que tinha havido lá mocada.
Na sessão 98692 no mesmo dia às 14h56, – NNN diz que tinha um (ainda referindo-se ao extensível) mas estava no carro que está na oficina – fls- 23 e ss.
Sessão 100474, a … – ... fala com XXXXXX e encomenda-lhe 2 bastões dizendo-lhe que está sempre a desenrascar os outros - que, entretanto, houve um colega que precisou de um urgente (referindo-se no entanto a BBBB) – fls. 25 e 26 ; sessão 102178 fls. 27 e 28 – falam ainda dos bastões (características e tamanho).
... recebe um Sms de XXXXXX, a … de 2016, sessão 107587, a fs. 73 a dizer que já tem um extensível e o outro vem para a semana.
... fala com NNN a dizer que lhe tinha mandado uma mensagem no FB por causa daquilo que ele lhe tinha pedido, que depois ele ligou logo ao colega e que já tem um e o outro virá entretanto- referindo-se ao bastão extensível que XXXXXX lhe arranjou.– sessão 108073 em ….2016.
Na sessão 108196 nesse mesmo dia 8.10.2016, pelas 22h23m, GGGG liga a FF e diz-lhe que falou com “ZZZ” e que a “coisa” que o ... tem que era para um amigo dele, que fica com isso, dizendo-lhe FF que fica guardado para ele e que lho entrega no dia seguinte.
Daqui decorre que apesar de a intenção deste negócio com IIIIII estar assente, nada foi apreendido ao mesmo que o comprometesse com a posse do bastão que afinal se desconhece se acabou por lhe ser entregue por FF ou não.
No entanto, FF entregou um bastão a BBBB que não se sabe se foi o que lhe viria a ser apreendido – cfr. auto de busca de fls. 2588 e ss a 2592, salientando-se que este desde logo admitiu que trazia o bastão sempre consigo quando efectuava serviço de vigilante – cfr. ainda fls. 160 e fotos de fls. 163/167, auto de exame de fls. 181/182, tudo do apenso V.
O que aliás encontra sentido face à motivação subjacente ao pedido do bastão a FF
Acaso tal bastão lhe tivesse sido doado pelo pai, guarda prisional reformado, então não faria sentido o arguido solicitar outro bastão a FF como inegavelmente efectuou. Aliás, esta versão sustentada em julgamento e corroborada pelo pai do arguido é desprovida de sentido lógico e de razoabilidade. Com efeito, YYYYYY, sustentou que deu o bastão ao filho quando se reformou como guarda prisional a título de recordação. Ora, é caso para dizer se não seria esta testemunha que teria gosto e interesse em guardar o bastão a esse título, não se vislumbrando porque razão o filho quereria uma “recordação” da actividade profissional do pai.
Em qualquer caso, a BBBB apenas vinha imputada a situação de detenção de um bastão extensível e essa é incontornável.
Ademais é completamente inconcebível que o arguido desconhecesse a proibição da posse de um instrumento como um bastão extensível, consabidamente usado pelas forças policiais e que não se vende ao público no supermercado, desde logo até pelo facto de o seu pai ter sido guarda prisional e de o próprio ter sido vigilante
8. Tráfico de armas e detenção de armas:
Relativamente aos factos que eram imputados ao arguido VVVVVV:
EEEE, agente da PSP, (outrora também arguido, alvo de despacho de não pronúncia e por isso indicado como testemunha) referiu que à data era comum entre agentes da PSP adquirirem bastões extensíveis e confirmou que arranjou dois ao arguido FFque lhos pagou, não recordando o valor, desconhecendo qual o destino que lhos deu.
Ora, pelo menos um dos referidos bastões foi entregue por FFa BBBB, conforme decorre das seguintes sessões telefónicas do apenso III-A:
Mensagens escritas de fls. 21, em … de 2016, trocadas entre UUUUU e BBBB (ZZZ):
Este diz que precisa de um extensível para levar para a festa de WWWWWW que tinha havido lá mocada.
Na sessão 98692 no mesmo dia às 14h56, – NNN diz que tinha um (ainda referindo-se ao extensível) mas estava no carro que está na oficina – fls- 23 e ss.
Sessão 100474, a … – ... fala com XXXXXX e encomenda-lhe 2 bastões dizendo-lhe que está sempre a desenrascar os outros - que, entretanto, houve um colega que precisou de um urgente (referindo-se no entanto a BBBB) – fls. 25 e 26 ; sessão 102178 fls. 27 e 28 – falam ainda dos bastões (características e tamanho).
... recebe um Sms de XXXXXX, a … de 2016, sessão 107587, a fs. 73 a dizer que já tem um extensível e o outro vem para a semana.
... fala com NNN a dizer que lhe tinha mandado uma mensagem no FB por causa daquilo que ele lhe tinha pedido, que depois ele ligou logo ao colega e que já tem um e o outro virá entretanto- referindo-se ao bastão extensível que XXXXXX lhe arranjou.– sessão 108073 em ….2016.
Na sessão 108196 nesse mesmo dia 8.10.2016, pelas 22h23m, GGGG liga a FF e diz-lhe que falou com “ZZZ” e que a “coisa” que o ... tem que era para um amigo dele, que fica com isso, dizendo-lhe FF que fica guardado para ele e que lho entrega no dia seguinte.
Daqui decorre que apesar de a intenção deste negócio com IIIIII estar assente, nada foi apreendido ao mesmo que o comprometesse com a posse do bastão que afinal se desconhece se acabou por lhe ser entregue por FF ou não.
No entanto, FF entregou um bastão a BBBB que não se sabe se foi o que lhe viria a ser apreendido – cfr. auto de busca de fls. 2588 e ss a 2592, salientando-se que este desde logo admitiu que trazia o bastão sempre consigo quando efectuava serviço de vigilante – cfr. ainda fls. 160 e fotos de fls. 163/167, auto de exame de fls. 181/182, tudo do apenso V.
O que aliás encontra sentido face à motivação subjacente ao pedido do bastão a FF.
Acaso tal bastão lhe tivesse sido doado pelo pai, guarda prisional reformado, então não faria sentido o arguido solicitar outro bastão a FF como inegavelmente efectuou. Aliás, esta versão sustentada em julgamento e corroborada pelo pai do arguido é desprovida de sentido lógico e de razoabilidade. Com efeito, YYYYYY, sustentou que deu o bastão ao filho quando se reformou como guarda prisional a título de recordação. Ora, é caso para dizer se não seria esta testemunha que teria gosto e interesse em guardar o bastão a esse título, não se vislumbrando porque razão o filho quereria uma “recordação” da actividade profissional do pai.
Em qualquer caso, a BBBB apenas vinha imputada a situação de detenção de um bastão extensível e essa é incontornável.
Ademais é completamente inconcebível que o arguido desconhecesse a proibição da posse de um instrumento como um bastão extensível, consabidamente usado pelas forças policiais e que não se vende ao público no supermercado, desde logo até pelo facto de o seu pai ter sido guarda prisional e de o próprio ter sido vigilante
Quanto aos factos relacionados com as arguidas ZZZZZZ e a mãe AAAAAAA:
A única prova em que a acusação se sustentava foi a que se adquiriu através das intercepções telefónicas.
É evidente que ZZZZZZ e a mãe não tinham para vender nem uma, nem duas bicicletas, dificilmente o arguido FFse mostraria tão interessado num negócio de tal género, atento o afinco e empenho que desenvolveu para que BBBBBBB conseguisse realizar a tão almejada venda. Sucede que esta acabou por se frustrar, por CCCCCCCter sido “ganancioso” e ter oferecido um preço muito abaixo do valor “comercial”, nenhuma proposta ao que parece ter sido apresentada por EE e, entretanto, ZZZZZZ ter ficado sem nada para vender, tendo sido enganada e desapossada.
As sessões telefónicas que infra se destacam acompanham os acontecimentos descritos.
Assim,
Na sessão 128617 em ….2016, fls. 119 do apenso III-A, FFfala com ZZZZZZ e esta diz-lhe que se quer desfazer de uma coisa do pai. UUUUU diz que há 2 pessoas interessadas em comprar a bicicleta e ela diz que tem uma pessoa interessada também. Como UUUUU não sabe a marca nem o modelo e o preço, refere, varia muito, sendo que ela diz que do assunto nada percebe apesar de preferir vender “a bicicleta” a alguém desconhecido mas que não queria ser enganada.
FF fala de seguida com CCCCCCC– sessão 128662 – a propósito da bicicleta e combinam encontro.
Nas sessões a fls. 123 e 124 são trocadas mensagens trocadas entre UUUUU, DDDDDDD e BBBBBBB para encontro à porta da casa da mãe desta, que se concretiza como se infere das sessões 129119 e 129121. Na sessão 129148, a fls. 134, ... liga a BBBBBBB e diz que ele (referindo-se a …) dá 500, o k ele acha pouco já que as duas bicicletas valem mais, sendo que BBBBBBB refere que já tinha uma proposta pelo dobro, ao que ... diz para ela aceitar.
Na sessão 130068, ... insiste e volta a falar com BBBBBBB dizendo que o outro (…) queria para vender e fazer dinheiro mas que tem outro interessado.
Nesta sequência, na sessão 130075, em ….2016, ... fala com EE e diz que há uns tempos lhe pediu uma situação e que tem uma coisa porreira e combinam encontro.
Depois troca mensagens com BBBBBBB a ….2016, juntas a fls. 171 e percebe-se que alguém a terá enganado no negócio, nada mais havendo para vender.
Do exposto, como que se antecipou, infere-se que FF foi um mediador de um negócio longe certamente de ser lícito, mas cujo objecto apesar de se suspeitar relacionar-se com armas de fogo na posse das arguidas, não se apurou por a prova apenas se alicerçar nas aludidas conversações interceptadas.
Como assim deu-se a respectiva factualidade como não provada.
Factos relacionados com as apreensões:
FF não tem registada qualquer arma nem licenciamento – cfr. informação PSP – fls. 1904 e 1905 e 4273 e 3181 a 3189 (foi proprietário de duas armas de fogo que vendeu sendo que uma delas era do mesmo calibre das munições que detinha -.45).
No decurso das buscas realizadas constantes do apenso V – Fls. 6 a 27 – na 74º esquadra de ... no quarto e cacifo do arguido foi apreendida uma pistola de alarme incapaz de realizar disparos e dois cartuchos de caça calibre 12.
No domicílio do arguido foram apreendidas 46 munições calibre .45 e 30 munições calibre 7,32 x 39 – cfr. ainda fotos de fls. 29/37 da busca na esquadra e no seu domicílio a fls. 40/49 e exame às apreensões de fls. 57 a 65 (apenso V), bem como exame pericial às munições e armas fls. 3206 a 3225.
(…)
9. Das infracções rodoviárias e da actividade levada a cabo para a sua ilibação:
Quanto a esta matéria saliente-se que em termos de prova pré-constituída, a actividade do arguido GG apenas cuidou de ser apurada com base nas intercepções que estavam em curso relativamente a FF, para além das apreensões efectuadas, nunca tendo sido GG um alvo directo das escutas telefónicas.
Assim, para além dos exames periciais à escrita manual aposta nos documentos remetidos à ANSR – Cfr. Apenso VIII (cujas minutas se encontravam guardadas digitalmente no computador do arguido – Cfr. Apenso VII) alegadamente assinados pelos proprietários alvos das infracções, nenhum outro exame foi efectuado, capaz, designadamente de averiguar quem ou através de que User foram obtidos os prints extraídos da base de dados do IMT que vieram a ser apreendidos na posse do arguido.
Também se desconhece a forma como os demais documentos de identificação e cartas de condução (fotocópias) também apreendidos, foram obtidos pelo arguido, não se podendo excluir que tenham sido disponibilizados pelos próprios titulares de forma voluntária ou por alguém a seu pedido.
Diga-se que, havendo suspeitas de corrupção não foi analisado património, contas bancárias, nada que pudesse corroborar as suspeições de que o arguido andaria a fazer da actividade em questão uma fonte de rendimentos adicional, livre de impostos e que lhe permitiriam manter, além do mais, uma vivenda com piscina, apetrechada de parque infantil e espaço de churrasqueira, algo que qualquer militar da GNR (e não só) certamente almejaria, dificilmente o conseguindo somente com o salário de tais funções, sendo que, em face do que declarou à reinserção social que elaborou o seu relatório social, não herdou qualquer herança, nem o mesmo é aplicável à sua mulher – cfr. Reportagem fotográfica da busca à residência do arguido de fls. 83 a 90.
Tal conspecto, aliada à tática acusatória de isentar de responsabilidade penal os supostos condutores e infractores rodoviários, indicando-os como testemunhas, não surtiu certamente os almejados efeitos já que não houve um único que reconhecesse que tenha acordado com GG para retribuição dos seus préstimos, um pagamento, um favor, uma refeição, uma adesão à ..., ou mesmo, alguma contrapartida a acordar ulteriormente, numa das fórmulas optadas pela acusação, atestando que nada o arguido lhes pediu em troca e que nada ao mesmo entregaram.
Assim, apesar de ser evidente que GG não despenderia do seu tempo e de toda a sua base de dados de condutores fictícios a custo zero, porque afinal citando o próprio arguido “uma mão lava a outra” – cfr. sessão 171283, a fls. 189 do apenso III-A, quando o arguido cobra de FF por causa de negócios da ... e diz que também não lhe cobra nada pelas cartinhas que este pede quando alguém está entalado e anuncia que quando precisar de uma carta vai pagar e são 100 paus – certo é que tal prova não se efectuou, não se podendo tal dar como assente apenas numa base intuitiva.
Sendo evidente que conhecendo pela sua experiência profissional e em razão das suas funções, os procedimentos em matéria de procedimento contraordenacional, mais conhecia as fragilidades do sistema, a sobrecarga da ANSR e a incapacidade de dar resposta e de analisar todas as contestações, averiguando situações de fraude, sobretudo quando as infracções não são presenciadas por agente autuante em que se permite que o proprietário do veículo (que a lei presume ser o infractor) identifique o condutor do mesmo, com a consabida instauração de novo procedimento contraordenacional relativamente ao condutor identificado, cuja notificação obviamente nunca se logra (por serem cidadãos estrangeiros não residentes em Portugal), até a prescrição se encarregar de pôr cobro ao procedimento.
Ora, não podemos deixar de manifestar incredulidade quando um militar da GNR, afinal digno de tantos louvores, se apresenta como uma espécie de “advogado” que faculta “minutas” e dados de identificação de alternativos condutores, sabendo-os falsos, para assim ludibriar a ANSR, não reputa tal procedimento de desonesto, nem de ilegítimo, afinal porque age ao abrigo da defesa “do arguido” naquele processo de contra-ordenação e que qualquer pessoa poderia fazer tais contestações – cfr. declarações prestadas em sede de primeiro interrogatório judicial e a própria contestação.
É caso para dizer então quando o arguido levantava autos de contra-ordenação na sua fiscalização rodoviária também mandava em simultâneo uma “minuta” ao proprietário do veículo acompanhada da listagem de nomes ao seu dispor que poderia indicar como alternativo condutor, para querendo o utilizar a seu belo prazer? Ou será que só o fazia a pedido de amigos? E porque despenderia tempo com isso se nada tivesse a ganhar?
Note-se que o arguido guardava um portfólio de identificações, de cartas de condução de cidadãos estrangeiros (impressos da base de dados do IMT ou fotocopiados dos documentos originais), que obteve de forma não apurada, é certo, para dos mesmos se ir servindo (até à exaustão para não levantar suspeições) para “ajudar” amigos ou amigos de amigos que lho solicitassem.
Para além disso, guardava ainda em pastas informáticas e em suportes digitais requerimentos “tipo” para serem utilizados por infractores rodoviários nas mais diversas infracções, com coima liquidada ou não.
Além disso, o arguido guardava diversos documentos impressos num dossiê na zona do seu escritório com cópias de cartas de condução de cidadãos estrangeiros que nunca foram localizados em Portugal nas moradas indicadas como aliás era do conhecimento do arguido – apesar das diligências externas efectuadas a tal propósito – cfr. autos de fls. 3308 3309, 3340, 3547, 3935 e 3936, 3938, 3939, 3940.
Veja-se, designadamente o que foi apreendido e junto ao apenso V, os documentos em nome de:
EEEEEEE; fls. 71:
FFFFFFF – fls. 72;
GGGGGGG (… e cartão de identidade) – fls. 73:
E o que foi junto, após impressão, ao Apenso VII- que se encontrava digitalmente guardado no computador do arguido:
47 (quarenta e sete) documentos preparados para remessa à ANSR com indicação do condutor- com identidades usadas coincidentes com as impressões de consultas na base de dados do IMT e dos demais documentos apreendidos.
73 (setenta e três) contestações a infracções diversas;
Uma pasta informática com o nome: “Nomes para contestações” onde surgem diversos documentos por referência a autos distintos onde é identificado MMMM e HHHHHHH.
Documentos esses em nome dos infractores tais como: LLLL, NNNN, UUUU, QQQQ, TTTT, IIIIIII, WW – cfr. exame directo de fls. 3 a 10 e fls. 38/62 do apenso VII.
Pastas informáticas com contestações diversas nomeadamente com os nomes: contestações álcool homem pagamento; não identificação do condutor; já para tribunal; outro condutor top; pessoa errada; velocidade/firma; velocidade/homem; velocidade/homem com pagamento e contestações com vista à suspensão da sanção acessória – (vide auto de fls. 11 e fls. 64 a 222 do apenso VII).
Os autos relativos às contraordenações identificadas pela acusação mostram-se juntos a fls. 2256/2294 e a fls. 333/3336.
Atendeu-se às fichas de registo automóvel juntas a fls. 2295/2305 quanto à propriedade dos veículos alvo de infracção rodoviária.
Posto isto, vejamos cada uma das situações imputadas ao arguido, de acordo com a ordem descrita pela acusação:
(…)
A situação da arguida SS:
Desconhece-se quem cometeu a infracção constatada, se a arguida, a sua mãe JJJJJJJ em nome de quem se encontrava registada a propriedade do veículo infractor, ou um terceiro. E também não podemos dar como provado, com base unicamente nas declarações do arguido que foi a arguida quem procurou “ajuda” junto de GG até porque o requerimento que acabou por ser remetido à ANSR com indicação de outro condutor foi assinado por JJJJJJJ e não pela arguida (fls. 175 a 187 e ss do apenso VIII – perícia de escrita manual e fls. 53 do apenso VII extraído do ficheiro informático guardado no computador do arguido), o que também comprometeria, diga-se, aquela nos factos.
Mas conhece-se que KKKK, cujos documentos (carta de condução imprimida da base de dados do IMT a 19.07.2014, cópias de passaporte deste cidadão brasileiro, cartão de contribuinte e titulo de residência) foram apreendidos no escritório da residência do arguido guardados num dossier com a inscrição “diplomas e contestações” e juntos ao apenso V- fls. 75 e ss, não era efectivamente o condutor do IA pois que aquele há muito que abandonara o território nacional retornando ao país da sua naturalidade tendo deixado ou não os seus documentos com o arguido para que este de forma autorizada os usasse para “safar” condutores.
Acredite-se ou não nesta tese (nenhuma credibilidade se tendo atribuído ao testemunho prestado por KKKKKKK que afinal nem tomou conhecimento do que o seu antigo empregado cidadão brasileiro lá deixou num envelope que terá ido parar às mãos do arguido ..., apesar de não saber quem o foi levantar) que até apontaria para que o arguido pudesse comprar dados, dificilmente alguém lhos facultando a custo zero, certo é que o documento extraído do IMT relativo à carta de condução somente alguém com credenciais de pesquisa o poderia obter. No entanto, também não se pode presumir que pelo facto de o mesmo se encontrar na sua posse tenha sido o arguido a efectuar tal pesquisa com as suas credenciais de militar da GNR, fossem elas partilhadas ou não.
Assim, tendo redigido o referido documento, no mesmo fazendo constar a identidade de quem sabia nunca poder ter conduzido o veículo em apreço, o arguido sabia que estava a consignar um facto falso e que o mesmo tinha relevância na tramitação ulterior do procedimento contraordenacional em curso, já que o suspenderia.
Relativamente às infracções rodoviárias imputadas à arguida LLLLLLL:
Às mesmas é comum a utilização dos veículos ..-OT-.. e ..-NJ-.. registados em nome de LLLL. É certo que o excesso de velocidade constatado não permitiria autonomizar todas as infracções (veja-se por exemplo a de ….2016 velocidade registada pelo radar às 22h15 e também às 22h17 que deu origem a duas infracções). No entanto, não se colocou em causa a substância da infracção, a sua existência, explicável desde logo pela incorrecta localização dos radares, colocados muito próximos um do outro, mas a identidade do seu infractor.
Ora, LLLL, era, à data, casado com a arguida MMMMMMM e recordou ter sido notificado de diversas coimas por excesso de velocidade. A arguida, que circulava com o seu carro, disse-lhe que o tinha emprestado a um indivíduo que seria cabeleireiro.
Alegou que a mulher lhe apresentou uns papéis e que os assinou apenas, sem questionar (como o comprovam a perícia à sua assinatura junta a fls. 27/105 do apenso VIII).
Nunca comprou nada a GGque nem sabe quem é e ao que sabe MMMMMMM também nada lhe adquiriu, apesar de esta ainda ter participado numas reuniões numa empresa que funcionaria num esquema de pirâmide, nada mais a este propósito concretizou, por desconhecer.
Desconhece-se quem forneceu os dados de MMMM (já que não foram localizadas quaisquer cópias relativas aos seus documentos de identificação) indicado como sendo o condutor em todas as infracções, sendo que os requerimentos remetidos à ANSR em nome de LLLL estavam guardados digitalmente no computador do arguido – fls. 16 a 41 do apenso VII.
É certo que foi o arguido quem elaborou as missivas que foram remetidas à ANSR.
De acordo com a informação da divisão de trânsito da PSP, a fls. 2246 a 2305, MMMM tinha a carta apreendida desde … de 2015 para garantia de pagamento de uma contra-ordenação; contando ainda o histórico de outras infracções.
Mas mais, na sessão 104776 do apenso III-A, FFliga a NNNNNNN e diz que é melhor pôr outro nome porque falou com o tal amigo (GG e esse nome já está batido, já foi usado muitas vezes e que depois lhe manda mensagem com os novos dados que ele ficou de lhe dar. – cfr. fls 46 e ss.
UUUUU troca então mensagem com OOOO e pede-lhe os dados, o que este envia: MMMM, bem como a morada, carta … e passaporte e ainda diz “tem k pagar um jantar à gente” – fls. 48.
Na sessão 104817 fls. 50 e ss, do mesmo apenso III-A, ... liga-lhe de seguida e diz que esse gajo é parecido com o outro até o número da carta é igual, a morada também. O arguido OOOO diz que tem uma amiga zuca apanhada 13 vezes no IP7 e tem 13 contestações para fazer (referindo-se claramente à arguida MMMMMMM), a dada altura enquanto OOOO analisa as infracções diz que estão em duplicado, passadas às 6h07, às 6h08, às 22h37, às 22h39, às 21h56, que estão doidos.
Daqui decorre que também o nome MMMM já estaria a ser facultado para ser usado noutras situações, sendo quiçá mesmo fictício ante as suspeitas de FF, o que leva o tribunal a concluir que não foi manifestamente o visado e indicado condutor o autor das infracções de que a arguida MMMMMMM tratou com o arguido …, mas antes esta, o que ambos sabiam.
Apesar de não se ter apurado quantas vezes a arguida se encontrou com o arguido GG, tal não terá ocorrido catorze vezes como a acusação ficcionava, existindo requerimentos remetidos à ANSR onde foi aposta a mesma data e que foram expedidos na mesma ocasião (cfr. novamente fls. 27/105 do apenso VIII), o que se explica se atentarmos a que a maioria das infracções ocorreu em dias consecutivos pelo que a arguida terá recebido as notificações praticamente em simultâneo.
Os factos relativos a MMMMM:
Ficou inconformado sobretudo com uma autuação no seu entender injusta por ter desobedecido ao sinal de paragem do agente de fiscalização de trânsito, alegando que nem o viu e quando reparou no nome do autuante “...”, como conhecia o pai deste, chegou ao contacto com o arguido que lhe disse que iria resolver a questão da “multa”, que acabou por não pagar.
Ora, tenha sido a testemunha ou o arguido a indicar o nome e demais dados da falsa condutora FFFFFFF (a cópia da carta de condução da mesma foi apreendida na pasta do escritório de GG e consta a fls. 72 do apenso V), certo é que o arguido confirmou que redigiu os dois requerimentos à ANSR em nome de MMMMM que aliás se encontravam em suporte informático apreendido no seu computador e juntos a fls. 42 e 43 do apenso V, os quais foram assinados por MMMMM (apesar das declarações que prestou) como aliás seria o habitual procedimento em face até da perícia de escrita manual junta a fls. 251/269 do apenso VIII.
O arguido sabia que não tinha sido a dita OOOOOOO a conduzir o veículo de MMMMM.
Por outro lado, este negou ter pago ao arguido qualquer importância, nada lhe tendo sido solicitado.
Factos relativos ao arguido PPPPPPP:
Quanto a esta matéria procedeu-se à inquirição de QQQQQQQ e do marido RRRRRRR que confirmaram a aquisição do veículo ..-BO-.. e que receberam uma “multa” rodoviária quando o carro não estaria sequer na sua posse já que se encontrava em reparação à guarda do stand que lhes tinha vendido o carro. O stand foi contactado e assumiu a responsabilidade pela multa (sem recordarem com quem terão falado) e ainda assim SSSSSSS, em nome de quem ficou o veículo registado, remeteu uma carta à ANRS junta e analisada pericialmente quanto à sua assinatura a fls. 122/147 do apenso VIII, através da qual esclareceu nada ter a ver com a infracção que lhe era imputada.
Efectivamente da missiva subscrita por SSSSSSS a fls. 130 e ss do apenso VIII, ali alude-se ao facto de o veículo à data da infracção se encontrar para reparação na …& Alfama automóveis, Lda, onde também o adquiriu (vide declaração de fls. 132 do mesmo apenso). No entanto, na mesma missiva não se identifica o “sócio” com quem aquela proprietária falou, sendo que da conversa que mantiveram nem o dito sócio saberia quem teria sido o funcionário que teria conduzido o veículo aquando da infracção. É certo que aquele stand recebeu também a interpelação da advogada de SSSSSSS no sentido de identificarem junto da ANSR o condutor responsável pela infracção (fls. 132 do apenso VIII), sem que se tenha apurado quem do aludido stand recepcionou tal carta.
Desconhece-se ainda, quem, do stand em questão, cuja gerência estaria a cargo do arguido TT, vendeu o carro a este casal e quem terá abordado o arguido GG para se desonerar da responsabilidade contra-ordencional que afinal teria sido assumida junto dos compradores, na certeza de que foi GGquem submeteu o requerimento à ANSR em nome de OOO (fls. 45 e 45 v do apenso VII e fls. 122 a 147 e 163 a 173 do apenso VIII de perícias da escrita manual) não se tendo apurado com um grau de certeza suficientemente seguro, apenas se concluiu ser provável que aquela seja a letra do arguido, de que tenha sido o arguido PPPPPPP a imitar a assinatura de OOO no aludido requerimento.
Aliás, na posse do arguido foi apreendido um print extraído da base dados do IMT, desconhecendo-se quem a esta acedeu, guardado numa pasta do seu escritório com a inscrição Documentos de cartas de condução, relativo à carta de condução de TTTTTTT (junto a fls. 71 do apenso V) indicada como sendo o condutor do veículo de SSSSSSS, o que manifestamente sabia também não corresponder à verdade (aliás o referido Silfarley também já constava com condutor fictícia noutras situações – cfr. fls. 33 e ss do apenso VIII) .
(…)
Factos relativos a SSSS:
Esta testemunha referiu conhecer o arguido Sr. UUUUUUU já que foi várias vezes perito avaliador em sinistros.
Confirmou que o ..-NB-.. era da sua propriedade e que foi autuado por excesso de velocidade tendo pago a coima.
No entanto, temeu ficar sem carta e falou com o arguido que encontrou num café e que se prontificou a ajudá-lo, dizendo-lhe que tratava do assunto. Sabe que depois assinou um “papel” que o OOOO lhe entregou que seria para remeter à ANSR e depois não recebeu mais nada da ANSR a tal propósito.
No mais, referiu que nada ao arguido pagou nem nada lhe foi exigido e que ouviu falar da ..., sabendo que o arguido estava envolvido em tal negócio mas que nunca foi aliciado para aderir ao mesmo.
O arguido admitiu que “ajudou” mais um amigo sendo tal inegável já que guardava no seu computador o requerimento que foi remetido em nome daquele à ANSR, no qual se identificava como condutor da viatura e por isso infractor, KKKK – já usado anteriormente pelo arguido (fls. 52 e 52 v do apenso VII e fls. 75 e ss do apenso V, bem como o original de flls. 271 e ss do apenso VIII sujeito a exame à escrita e até em benefício particular como se depreende dos requerimentos juntos a fls 25 e ss do apenso VIII).
Factos relativos a NNNNN:
TTTT, já aposentado da PSP, alegou nada recordar sobre a situação sob referência, queixando-se de problemas de saúde que lhe terão levado memórias e nem conhecer o arguido ....
GG também o referiu, apesar de admitir que poderia ser conhecido de FF a quem já havia disponibilizado os dados de PPPP, o que é verdade (veja-se ainda a Sessão 166030 do apenso III-A e as mensagens trocadas entre ambos, transcritas de fls. 179 a 184). Certo é que também o requerimento relativo à infracção de TTTT estava guardado no computador de GG (fls. 46 e 46 v do apenso VII, constando o original do apenso VIII e exames de fls. 7 a 24, não tendo sido possível apurar a autoria da assinatura ali aposta por imitação da de TTTT).
Ora, independentemente de conhecer ou não NNNNN, foi o arguido quem redigiu o referido requerimento sabendo que a condutora PPPP, já usada para outras ocasiões idênticas, não tinha sido quem conduzira o veículo da infracção.
(…)
Factos relativos a VVVVVVV:
Esta testemunha, inspector automóvel, referiu que conhece o arguido HH e confirmou que recebeu uma “multa” por excesso de velocidade na altura em que se encontrava junto do arguido (então bate-chapas) comentando com o mesmo os seus receios por perder pontos na carta ao que o arguido lhe transmitiu que resolvia a situação.
Ora, tendo sido apreendido um documento guardado no computador de GG e relativo ao requerimento remetido à ANSR em nome de UUUU (fls. 44 e 44v do apenso VII) indicando como condutor novamente KKKK, cujo original foi assinado por VVVVVVV – vide fls. 204 a 217 do apenso das perícias e exame à escrita (VIII) é manifesto que foi HH quem solicitou a GG a elaboração do referido documento e que depois o levou para assinatura a VVVVVVV, ambos sabendo o destino daquele documento e que o condutor que ali era identificado era mais um nome fictício para ilibar VVVVVVV.
VVVV:
Apesar desta testemunha invocar não conhecer o arguido GG, o próprio arguido admitiu que conhecia o irmão do mesmo e que foi assim que estabeleceu contacto com aquele, ajudando-o nos termos habituais o que explica que também guardasse o requerimento que fez em nome daquele para ser remetido à ANSR com a indicação do já conhecido condutor (falso) KKKK – cfr. fls. 55 e 56 do apenso VII e 284 a 300 do apenso VIII (exame à escrita), prova essa mais que bastante para também o comprometer com a prática destes factos.
XXXX:
Confirmou ser a proprietária do veículo em questão que, no entanto, não conduz sendo utilizado pelos funcionários que trabalham para a mesma no ramo da hotelaria.
Nunca recebeu a notificação das contra-ordenações em questão e por isso não as contestou clarificando que YYYY e ZZZZ (cujos dados o arguido detinha no seu escritório em pasta própria – vide apenso V, fls. 76, desconhecendo-se como aos mesmos acedeu, já que se trata de uma impressão de uma consulta na base de dados do IMT sem possibilidade de se aferir onde a mesma foi efectuada e por quem, mas que também já havia usado e até em benefício pessoal –cfr. 27 a 32 do apenso VIII ), indicados como condutores do seu veículo nas contestações remetidas à ANSRS, nunca foram seus funcionários pelo que nunca poderiam ter conduzido o seu veículo.
Daqui decorre que alguém terá contactado com GG a quem solicitou o preenchimento dos dois requerimentos em nome de WWWWWWW a remeter à ANSR indicando como responsável da infracção pessoa que não conduzira o veículo. Estes requerimentos, não foram assinados por WWWWWWW e estavam guardados no computador do arguido – fls. 49 e 50 do apenso VII e fls. 302 a 317 do apenso VIII pelo que também não se suscitam dúvidas de que foi o arguido que os redigiu bem sabendo a que finalidade se destinava.
XXXXXXX:
Do apenso V consta uma impressão extraída do IMT a 16.12.2011 da carta de condução de ZZZZ que o arguido guardava no escritório do seu domicílio em pasta própria – e que foi junta a fls. 76.
O arguido elaborou um requerimento em nome de AAAAA que foi remetido à ANSR para identificação do condutor do veículo do mesmo por referência a uma infracção que adiantou ter sido ZZZZ, o que sabia não ser verdade, como o mesmo admite ter feito – cfr. fls. 51 e 51 v do apenso VII e fls. 107 a 120 do apenso VIII e fls. 3803 dos autos principais, daqui se concluindo pericialmente que aquele requerimento foi efectivamente assinado por YYYYYYY.
Ora, o arguido ZZZZZZZ é genro de AAAAAAAA, sendo que nem este nem os seus familiares prestaram declarações.
Como assim, não é possível extrair da prova que tenha sido o arguido a solicitar a GG a produção de tal documento.
(…)
No mais,
Atendeu ainda o tribunal aos testemunhos prestados pela defesa de GG, incluindo à prova documental que juntou relativa à sua carreira profissional.
Assim, valoraram-se os depoimentos de BBBBBBBB que foi comandante do arguido entre 2018 e 2019, de CCCCCCCC, colega do arguido que com este trabalhou no mesmo destacamento entre 2014 e 2018, de DDDDDDDD, sargento ajudante que conhece o arguido desde 2009, de EEEEEEEE, militar da GNR na área de trânsito de ..., que conhece o arguido pelos desde 2015, de FFFFFFFF, militar da GNR no destacamento trânsito de ... e de GGGGGGGG, já reformado de militar da GNR, mas que até 2013 trabalhou com o arguido.
Todos revelaram conhecer as funções profissionais que o arguido desempenhou ao longo da sua carreira profissional, considerando-o um profissional exemplar e de bom trato com os demais.
A restante prova testemunhal produzida revelou-se supérflua e de nenhum relevo para o apuramento dos factos.
Foi desconsiderada a matéria conclusiva e de considerandos de direito contida na contestação do arguido GG.
Para prova da factualidade relativa às condições de vida dos arguidos e respectivo percurso, atendeu o tribunal aos relatórios sociais juntos aos autos porquanto elaborados por técnico habilitado ao efeito e por terem sido estruturados com base em informações disponibilizadas pelos próprios arguidos.
(…)
Analisaram-se os certificados de registo criminal dos arguidos juntos de forma actualizada aos autos, sendo ainda do meu conhecimento funcional o estado dos autos nº 318/21.9PASNT (já que cumulo funções em tal juízo local criminal) e execução da pena que o arguido BB se encontra a cumprir.
A factualidade que se deu como não provada assim se deu, por um lado, por se tratar de matéria que se antagoniza com a dada como provada e, por outro, por relativamente à mesma não ter sido efectuada qualquer prova, ou prova segura, suficientemente concludente e válida, cuja respectiva realidade demonstrasse.
II.3.D. Do enquadramento jurídico-penal exarado no acórdão recorrido (cfr. ref.ª 163104537 de 29-11-2024):
É a seguinte a fundamentação da qualificação jurídico-penal dos factos provados no acórdão recorrido:
III- O Direito:
Vistos os factos, passamos a analisar o Direito aplicável.
(…)
5. Do crime de coacção agravada: factos relativos a MMM:
Por referência aos factos do nuipc 493/17.7PATVD vinha ao arguido BB imputada a prática de um crime de coacção agravada dos artigos 154º nº 1 e 155º, nº 1, al. a) do CP.
Dispõe o tipo base do crime em referência que:
Quem, por meio de violência ou de ameaça com mal importante, constranger outra pessoa a uma acção ou omissão, ou a suportar uma actividade, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.
Por seu turno,
Quando os factos forem praticados:
a) Por meio de ameaça com a prática de crime punível com pena de prisão superior a três anos;
(..)
o agente é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. – Artigo 155º nº 1, al. a) do CP.
O crime de coação é um crime de resultado, em que o bem jurídico tutelado é a livre determinação do indivíduo.
Os meios de coação são a violência, física ou psíquica, ou a ameaça de um mal importante.
Tem por objecto imediato a própria pessoa do coagido, ou de terceiros, ou sobre coisas, quer do coagido quer de terceiros, desde que o mal causado nas coisas seja idóneo a afetar sensivelmente a liberdade de ação do coagido, de forma a constranger este a adotar o comportamento visado pelo agente.
A tentativa é punível, em conformidade com o disposto no nº 2 do artigo 154º do Código Penal.
Quanto ao que deve ser entendido por ameaça (isto é, mal futuro dependente da vontade do agente) com mal importante “há uma larga margem de indefinição a ser preenchida pelo prudente arbítrio do julgador. Não se quis, evidentemente, tornar punível toda a actividade social susceptível de causar um mal, mas só a actividade susceptível de causar um mal importante, ou seja, um mal que tenha um acentuado relevo, um mal que a comunidade repele e censura pelo dano relevante que causa ou pode causar” (cfr. Maia Gonçalves, in Código Penal Anotado, comentário ao artigo 154º).
Para a verificação do crime de coação é necessário que alguém, através de ameaças ou violências injustas, force, obrigue, constranja outrem a praticar actos ou a incorrer em omissões ou situações que não é obrigado a suportar e que não quer, diminuindo-o na sua liberdade de ação, bastando que “o mal ameaçado (coacção) influencie a vontade da pessoa a quem se dirige, sendo também suficiente que pareça injusto relativamente ao fim a que se destina (não é preciso que seja)” (cfr. Leal Henriques e Simas Santos in Código Penal, anotação ao art. 156º, pág. 165).
Como refere Taipa de Carvalho (in Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo I, pág. 358) “para haver consumação, não basta a adequação da acção (isto é, a adequação do meio utilizado: violência ou ameaça com mal importante) e a adopção, por parte do destinatário da coacção, do comportamento conforme à imposição do coactor, mas é ainda necessário que entre este comportamento e aquela acção de coacção haja uma relação de efectiva causalidade. Se a conduta (acção, omissão ou tolerância de uma determinada acção) do sujeito passivo, isto é, do destinatário da coacção - apesar de coincidente com a que o coactor impunha - foi livremente decidida ou devida a apelo de terceiros (p. ex., forças policiais, familiares ou amigos) e, não consequência ou resultado directo da acção de coacção, isto é, do medo da concretização da ameaça (o que se verifica, quando o sujeito passivo estava decidido a não ceder às exigências comportamentais do coactor), não há consumação, mas apenas tentativa”.
Quanto ao elemento subjetivo do tipo, exige o artigo 154.º, n.º 1 do Código Penal o dolo (direto, necessário ou eventual), não sendo, todavia, necessário que o agente vise, especificamente, humilhar ou constranger o coagido (dolo específico), bastando que o agente, sejam quais forem as suas motivações, tenha consciência que a violência que exerce ou a ameaça que faz é susceptível de constranger e com tal se conforme (cfr., neste sentido, Taipa de Carvalho, ob. cit., pág. 359).
Revertendo para o caso em apreço, provou-se que o arguido dirigiu-se a MMM, à data coordenador da segurança da LB, empresa rival da ... sobretudo em ... e para a qual o arguido trabalhava, como aliás ainda trabalha, dizendo-lhe que o rebentava todo e que o matava caso voltasse a ficar com algum dos estabelecimentos de diversão nocturna cuja segurança estava a cargo da ... (como sucedeu com o ...), recordando-lhe ainda a agressão que tinha feito a BBBB e que lhe aconteceria o mesmo. Mais se provou que em consequência de tal conduta, MMM deixou de fazer a área comercial nocturna de modo a evitar sequer cruzar-se com o arguido ou com alguém da ..., reduzindo por isso o seu mercado de trabalho possivelmente concorrente com o da ..., como aliás o arguido pretendeu, por temer pela sua integridade e vida, conhecendo o temperamento violento do arguido e sabendo do que o mesmo era capaz, tendo estado por isso afastado, durante dois anos, desse meio e mercado.
Daí que o tribunal considere que a conduta do arguido foi bem-sucedida face aos seus propósitos. A conversa que manteve com o ofendido foi determinante para este abandonasse uma parte significativa do seu trabalho e provavelmente a mais lucrativa, como o carnaval de .... O ofendido tomou esta decisão porque a sua vontade foi condicionada, constrangida pela pressão anímica, ameaçadora, de forte intimidação do arguido de atentar contra a sua vida e saúde.
Mostra-se consumado o crime na sua forma qualificada ante a moldura penal prevista para o homicídio do artigo 131º do CP, já que na sua actuação, um dos resultados anunciados pelo arguido, foi a ocorrência da morte do ofendido.
(…)
10. Da procura da isenção dos infractores rodoviários e crimes conexos:
Ao arguido GG vinha imputada a prática de 29 (vinte e nove) crimes de falsificação de documento do artigo 256º, nº 1, als. a), b), d) e e) do CP, em concurso aparente com outros tantos crimes de falsas declarações do artigo 348-A, nº 1 do CP.
O referido tipo, refere que:
“1 - Quem, com intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo, ou de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime:
a) Fabricar ou elaborar documento falso, ou qualquer dos componentes destinados a corporizá-lo;
b) Falsificar ou alterar documento ou qualquer dos componentes que o integram;
c) Abusar da assinatura de outra pessoa para falsificar ou contrafazer documento;
d) Fizer constar falsamente de documento ou de qualquer dos seus componentes facto juridicamente relevante;
e) Usar documento a que se referem as alíneas anteriores; ou
f) Por qualquer meio, facultar ou detiver documento falsificado ou contrafeito;
é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.
Com as modalidades de acção previstas no tipo, visa-se punir:
- A contrafacção total, na al. a);
- A contrafacção parcial e a alteração, na al. b);
- O fabrico de documento falso por abuso de assinatura de outrem, na al. c);
- A falsificação por desconformidade entre o documento e a declaração ou a realidade, na al. d);
- O uso de documento falsificado por outras pessoas, nas als. e) e f).
São, pois, elementos integradores deste tipo objectivo de ilícito:
- A existência de um documento – que é o objecto da acção - no sentido do artº 255º/CPP;
- A acção do agente, subsumida a qualquer uma das modalidades de falsificação descritas no tipo (ou seja, fabricando documento falso, adulterando documento legítimo, usando documento forjado ou alterado, ou abusando da assinatura de outrem para elaborar documento falso).
O artº 255º/a), do CP, fornece a noção de documento para efeitos penais, como uma declaração de vontade ou de ciência, corporizada ou registada, inteligível para a generalidade das pessoas ou para um certo círculo de pessoas (manifestação da função de perpetuação) que, sendo idónea para provar facto juridicamente relevante (manifestação da função e destinação probatórias, mesmo que só seja conferida em momento posterior ao da emissão), permite reconhecer o emitente (manifestação da função de garantia documental).
A definição implica, necessariamente, um suporte material que exprima ou incorpore dados, factos ou uma simples narração, com qualquer tipo de relevância jurídica (designadamente, eficácia probatória), desde que cumpra a tríplice função que lhe é exigida para que de documento se possa falar ( ), a saber:
- A função de perpetuação ou de persistência do conteúdo do pensamento do autor do documento, o que lhe confere o especial valor enquanto meio de prova (força probatória);
- A função probatória (que não deve ser confundida com a sua força probatória) ou idoneidade probatória, isto é, a idoneidade para provar facto juridicamente relevante, subsumível a avaliação segundo critérios objectivos;
- A função de garantia, enquanto aptidão para tornar cognoscível a identidade do emitente, no sentido de autor intelectual.
Por outro lado, um documento pode ser:
- Público (quando exarado por funcionário público competente nos limites das suas atribuições) ou particular (em todas as demais situações);
- Autêntico ou com igual força (autenticado) ou não autêntico. A noção de documento autêntico compreende aquele que, nos termos da lei civil, seja exarado, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência, ou dentro do círculo de actividade que lhe é atribuído, pelo notário ou pelo oficial público provido de fé pública (artºs 369º/1, 370º/1 e 363º/2, do CC), bem como aquele que tenha origem numa autoridade pública - entendimento que se tem por imposto em face da especial perigosidade que a falsificação de certo tipo de documentos comporta ( ), e que é especialmente relevante para efeitos da agravação penal consignada no nº3 do artº 256º/CP;
- Narrativo (aqueles que contém uma declaração de ciência) ou dispositivo (os que exprimem uma declaração de vontade). O primeiro atesta ou certifica um facto enquanto o segundo declara uma vontade.
A distinção releva para aquela outra que opõe falsificação ideológica e falsificação material, sustentando a doutrina tradicional que só pode haver falsificação (falsidade) ideológica nos documentos narrativos.
A falsidade ideológica pode ocorrer de forma activa, através da inserção em documento de declaração falsa ou diversa daquela que deveria ter lugar, e por omissão, através da não inclusão, em documento, de declaração de vontade que dele deveria constar. A falsidade ideológica traduz-se numa mentira, e mente-se quando se atesta ou certifica algo que não aconteceu.
A falsidade material verifica-se quando se forja, total ou parcialmente, o documento ou quando se alteram os termos de documento já existente.
O bem jurídico protegido por esta incriminação, é a tutela da confiança, segurança e fiabilidade, no tráfico jurídico. Quer-se proteger a confiança social de relações juridicamente relevantes e assegurar a correspondência entre a realidade e os símbolos que a representam.
Ao nível do tipo subjectivo, o crime de falsificação é de natureza necessariamente dolosa, dolo esse que carece de se reportar a todos os elementos objectivos do tipo de ilícito.
Ou seja, para que se mostre preenchido o elemento subjectivo do tipo, o agente tem que actuar dolosamente – com conhecimento e a vontade de falsificar o documento - podendo o dolo assumir qualquer das suas modalidades (dolo directo, necessário ou eventual) e, simultaneamente, com um dolo específico de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, ou de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo.
Este tipo configura um crime de perigo abstracto ou presumido, na medida em que se basta com a motivação do falsificador e com a falsidade do documento para que o agente seja punido, independentemente de o utilizar ou o colocar no tráfego jurídico.
A este propósito com relevância para o caso dos autos, são ainda convocáveis as normas do código da estrada que se passam a citar:
Estabelece o artigo 135º do Código da Estrada (sob a epígrafe “Responsabilidade pelas infrações”):
«1- São responsáveis pelas contraordenações rodoviárias os agentes que pratiquem os factos constitutivos das mesmas, designados em cada diploma legal, sem prejuízo das exceções e presunções expressamente previstas naqueles diplomas.
(…).
3- A responsabilidade pelas infrações previstas no Código da Estrada e legislação complementar recai no:
a) Condutor do veículo, relativamente às infrações que respeitem ao exercício da condução;
b) Titular do documento de identificação do veículo relativamente às infrações que respeitem às condições de admissão do veículo ao trânsito nas vias públicas, bem como pelas infrações referidas na alínea anterior quando não for possível identificar o condutor;
(…).».
E, quanto à identificação do arguido, dispõe o artigo 171º do Código da Estrada:
«1- A identificação do arguido deve ser efectuada através da indicação de:
a) Nome completo ou, quando se trate de pessoa colectiva, denominação social;
b) Domicílio fiscal;
c) Número do documento legal de identificação pessoal, data e respectivo serviço emissor ou, quando se trate de pessoa colectiva, do número de pessoa colectiva;
d) Número do título de condução e respectivo serviço emissor;
e) (Revogada.)
f) Número e identificação do documento que titula o exercício da actividade, no âmbito da qual a infracção foi praticada.
2- Quando se trate de contra-ordenação praticada no exercício da condução e o agente de autoridade não puder identificar o autor da infracção, deve ser levantado o auto de contra-ordenação ao titular do documento de identificação do veículo, correndo contra ele o correspondente processo.
3- Se, no prazo concedido para a defesa, o titular do documento de identificação do veículo identificar, com todos os elementos constantes do n.º 1, pessoa distinta como autora da contra-ordenação, o processo é suspenso, sendo instaurado novo processo contra a pessoa identificada como infractora.
4- O processo referido no n.º 2 é arquivado quando se comprove que outra pessoa praticou a contra-ordenação ou houve utilização abusiva do veículo.
(…).».
De acordo com os citados preceitos, a responsabilidade do titular do documento de identificação do veículo (na versão do DL n.º 2/98, de 3Jan., art. 152º, n.º 1, o proprietário ou possuidor) resulta de uma presunção que apenas pode ser ilidida quando se provar que foi outra pessoa (identificada nos termos do n.º 1 do art. 171º do CE) que praticou a contra-ordenação ou que houve utilização abusiva do veículo.
Trata-se, assim, de uma presunção juris tantum, ilidível mediante prova em contrário.
Conhecedor da tramitação relativa à matéria contraordenacional referida, o arguido GG delineou um esquema para procurar isentar infractores rodoviários das coimas e das sanções acessórias de inibição de condução que teriam de cumprir. Para o efeito tinha uma carteira de dados de cidadãos estrageiros não residentes em Portugal, nos quais se incluía o nome, documento de identificação, carta de condução e morada e título de residência, os quais sendo fictícios em parte ou totalmente, utilizava para contestar as infracções não presenciadas por agente autuante, na sua maioria, infracções às regras de velocidade detectadas por radar. Dessa forma o arguido sabia que indicando tais cidadãos como condutores de veículos alvos de infracções ao código da estrada, que os processos contra-ordenacionais despoletados iriam ficar suspensos, provavelmente eternamente à espera da prescrição e que um novo procedimento seria accionado contra o condutor identificado, o qual, jamais viria a ser localizado para poder responder pelo processo contra-ordenacional contra si instaurado. Assim, nem o proprietário do veículo, o condutor efectivo nem o condutor fictício seriam punidos pela infracção cometida, violando-se assim o cumprimento da lei e os interesses do Estado bem como a realização da Justiça.
E o arguido, militar da GNR e adstrito até à área de trânsito, aceitou redigir contestações ou como pretende apelidar “minutas” (o que está longe de minimizar o gravame da sua actução) a pedido de amigos, de conhecidos, fossem eles directa ou indirectamente afectados com a infracção, agindo sempre no interesse de terceiros a quem disponibilizava identidades boas para serem usadas nas peças dirigidas à ANSR que fariam congelar o avanço contra-ordenacional em curso, porque tal é automático e decorre da lei, até averiguação ulterior, impensável de ser alcançada pelo desconhecimento do paradeiro do condutor identificado, o que significava na prática a absoluta impunidade. Impunidade pretendida por um militar da GNR que elaborava diariamente autos de contra-odenação, desde que não abrangessem certamente amigos ou conhecidos ou amigos de amigos.
Deste modo ao redigir as defesas dos arguidos em processo contra-ordenacional a seu pedido ou a pedido de terceiros fossem os mesmos ou não os efectivos responsáveis das contra-ordenações subjacentes indicando em todos identidade e demais dados que possuísse relativamente a quem sabia nada ter a ver com a infracção, o arguido sabia que estava a elaborar um documento dotado de consequências jurídicas, eivado de falsidade o que quis sempre levar a cabo para beneficiar um terceiro sabendo da relevância de tal declaração e o que a mesma acarretaria num processo de contra-ordenação não ignorando que assim lesava os interesses do Estado na procura da responsabilização do infractores rodoviários, com o que se conformou.
Como assim é manifesto que tendo agido ou não em representação dos arguidos não pode agora pretender a sua própria isenção de responsabilidade como se ao abrigo de qualquer espécie de mandato forense estivesse protegido.
Deste modo considera por isso o tribunal que cometeu tantos crimes de falsificação de documento do artigo 256º, n 1, al. d) do CP quantos os documentos que elaborou e cujo teor sabia ser falso independentemente de os ter redigido a favor do mesmo infractor ou não. Neste conspecto a cada documento terá de corresponder uma vontade única de ilibar o infractor da contra-ordenação à qual se responde pelo que não se podem suscitar dúvidas quanto à renovação criminosa constante à medida que se elaboram documentos distintos para resposta a diversas infracções.
(…)
Transpondo os considerandos de direito mencionados quanto ao crime de falsificação de documento, vejamos agora cada uma das situações em que o arguido redigiu os documentos tipo contestação, com indicação de um fictício condutor relativas as infracções rodoviárias imputadas a:
(…)
2. JJJJ:
Vinha imputado o mesmo crime de falsificação à filha da proprietária, SS sem que, no entanto, se tivesse apurado factualidade da qual dependesse a sua responsabilidade penal.
Em consequência a arguida HHHHHHHH é absolvida, mas o arguido terá de ser responsabilizado já que IIIIIIII não foi quem conduziu a viatura identificada conforme o arguido bem sabia, tendo-o consignado no requerimento que foi remetido à ANSR para ilibar a proprietária do veículo de qualquer responsabilidade, o que sabia ser contrário à lei lesando o Estado desde logo na sua missão punitiva.
3. CCC:
Sendo irrelevante que tenha contactado catorze vezes ou apenas numa ocasião com arguido GG, certo é que o contactou para lhe resolver catorze infracções rodoviárias, o que o arguido fez já que submeteu tal número de respostas à ANSR por tantos serem os autos de contra-ordenação imputados ao veículo da propriedade do então marido da arguida.
Sabiam ambos os arguidos que as infracções em questão não tinham sido praticadas por MMMM e que ao consignarem tal facto nos requerimentos dados a assinar a JJJJJJJJ e remetidos à ANSR atestavam a falsidade do cometimento de catorze infracções rodoviárias visando beneficar o ou os verdadeiros responsáveis e prejudicar o Estado.
Em consequência, cometeram os arguidos em co-autoria material e na forma consumada, relativamente à qual é indiferente o desfecho final dos processos de contra-ordenação, catorze crimes de falsificação de documento na forma simples.
(…)
4. NNNN:
O arguido redigiu os dois requerimentos à ANSR relativos aos autos de contraordenação que lhe foram entregues por MMMMM e que aliás até tido sido o próprio arguido o seu agente autuante. Assim e a pedido do próprio infractor endereçou dois requerimentos à ANSR indicando que aquando das infracções constatadas, o condutor da viatura de MMMMM não era este mas PPPP, o que sabia ser falso. Fê-lo novamente para ilibar MMMMM das consequências do cometimento das contra-ordenações em causa e em prejuízo para o Estado.
Conclui por isso que cometeu assim dois crimes de falsificação de documento na forma simples.
5. QQQQQQQ:
Relativamente a esta matéria como se motivou não se demonstrou que tenha sido o arguido TT a solicitar a GG que elaborasse o requerimento relativo à contra-ordenação do veículo que o seu stand vendera a SSSSSSS e que à data da infracção estava na disponibilidade do stand, em reparação, desconhecendo-se quem em concreto o conduziu. Terá sido alguém do stand contactado por SSSSSSS mas não se podendo presumir que tenha sido o seu gerente ou alguém a mando deste. Em conformidade absolvido será PPPPPPP do crime de falsificação por não se ter ainda demonstrado com segurança que tenha sido o próprio a assinar o requerimento remetido à ANSR imitando a assinatura de SSSSSSS. No entanto GG foi o autor do documento em questão cujo teor (indicação do condutor) e assinatura sabia serem falsos, mais sabendo que através de tal requerimento beneficiava o verdadeiro infractor da contra-ordenção com a correspetiva lesão dos interesses punitivos do Estado.
(…)
7. SSSS:
Mais uma vez para “ajudar” um conhecido, o arguido GG, a pedido de KKKKKKKK, assumidamente responsável pela infracção rodoviária do qual foi notificado, redigiu o requerimento à ANSR com vista à suspensão do procedimento contra-ordenacional em curso contra KKKKKKKK e sua ulterior ilibação ainda que por efeitos de prescrição, indicando novamente KKKK como sendo o condutor infractor. O arguido conhecia a falsidade de tal declaração e relevância do requerimento apresentando e que através do mesmo beneficiava o infractor KKKKKKKK e lesava os interesses do Estado e da Justiça.
Não se apurou que como forma de pagamento do favor que o arguido prestou a KKKKKKKK que a este tivesse solicitado um investimento na ..., mediante aquisição de “clouds”, pelo que falece a imputação da corrupção passiva, deste crime se impondo a absolvição do arguido, em face dos considerandos já expostos relativamente aos elementos típicos do crime.
8. TTTT:
Provou-se que foi o arguido o autor do requerimento remetido à ANSR relativo a tal proprietário alvo de infracção rodoviária. Da mesma sorte sabia o arguido que era falsa a identidade do condutor que indicou pois PPPP funcionava como uma condutora fictícia usada até à exaustão e partilhada com amigos para desonerar os infractores rodoviários, o que o arguido sabia e quis.
Com tal actuação, cometeu o arguido mais um crime de falsificação de documento.
(…)
10. UUUU:
O documento remetido à ANSR foi da lavra do arguido GG que novamente recorreu à sua carteira de condutores fictícios para libertar um infractor da sua punição. Fê-lo ciente da falsidade do documento que elaborou e das suas consequências já mencionadas nas outras situações. E fê-lo a pedido do arguido HH que o motivou a tal prática, sendo ter tido qualquer intervenção material no documento, surgindo aqui como um verdadeiro instigador/autor, dono, dominador, se não do ilícito típico como tal, ao menos seguramente da decisão do instigado de o cometer (sobre a questão da instigação, pode ver-se Figueiredo Dias, in La instigación como autoria. Un requiem por la ‘participación’ como categoria de la dogmática juridico-penal portuguesa?”, Homenage al Profesor Dr. Gonzalo Rodríguez Mourullo, Thomso/Civitas, 2005, p. 352.), para depois contribuir decisivamente para a consumação do crime, entregando o documento elaborado por GG para assinatura a UUUU e remessa à ANSR.
Conheciam os arguidos o carácter ilícito das suas condutas pelo que ambos serão condenados pelo crime de falsificação de documento.
11. VVVV:
Não foi KKKK quem conduziu o veículo de NNNNNNNN alvo de infracção rodoviária, mas o próprio como era do conhecimento do arguido, o qual, quis, novamente induzir em erro as autoridades competentes em matéria contraordenacional desta natureza ao emitir um documento com os dados do referido falso condutor com destino à ANSR, com os consabidos efeitos ilícitos pretendidos pelo arguido, a saber: beneficiar o infractor e lesar os interesses punitivos do Estado.
Também terá de ser condenado pelo crime de falsificação de documento relativamente a esta situação.
12. XXXX:
Provou-se que relativamente a duas infracções rodoviárias levantadas contra a proprietária do ..-IV-.., o arguido GG elaborou as contestações remetidas à ANSR, identificando dois condutores distintos que nunca poderiam ter tido acesso ao veículo de WWWWWWW, tendo agido a pedido de terceiros cuja identidade não se apurou para novamente isentar o(s) verdadeiro(s) responsáveis das infracções, algo que o arguido, militar da GNR e na área da fiscalização de trânsito, sabia ser ilícito.
13. AAAAA:
Esta situação vinha também imputada ao arguido VV cuja participação nos factos no entanto não se apurou o que implica que tenha de ser absolvido do crime de falsificação.
No entanto foi GG quem redigiu mais uma contestação à ANSR com o nome de um falso condutor, ZZZZ e que levada à assinatura do proprietário do veículo alvo da infracção viria a suspender o processo contra-ordenacional contra este instaurado.
Também, ante o já exposto terá o arguido de ser condenado por mais um crime de falsificação de documento. (…)”
II.3.E. Da fundamentação jurídica exarada no acórdão recorrido no que se refere à escolha e determinação da medida da pena (cfr. ref.ª ... de 29-11-2024):
Por fim, é a seguinte a fundamentação da decisão recorrida no que respeita à escolha e determinação da medida pena:
IV- Da escolha e determinação da medida da pena:
(…)
1. AA:
Praticou em co-autoria com CC um crime de roubo simples do artigo 210º, nº 1 do CP cuja moldura penal abstracta é de 1 a 8 anos de prisão.
Não regista antecedentes criminais. Praticou os factos enquanto desempenhava funções de vigilante o que é particularmente desvalioso e censurável uma vez que lhe incumbia um especial dever de assegurar a protecção e ordem do local e pessoas onde trabalhava. É elevado o grau de ilicitude e de culpa com que agiu já que se concertou com CC e arredou o ofendido da discoteca, em local onde sabia ser dificilmente detectável para que ambos o pudessem agredir e revistar retirando os bens que entendessem sem serem impedidos.
Apesar de tudo as consequências da sua actuação não são particularmente gravosas do ponto de vista da lesão da saúde e do património do ofendido.
As necessidades de prevenção geral subjacentes as estas tipologias de crime são bastante elevadas sobretudo em contexto de diversão nocturna onde são consabidos os conflitos que ocorrem entre clientes e seguranças que originam invariavelmente abusos e violência física, algo que urge combater, desde logo ao nível da repressão de qualquer utilização da força desnecessária e desproporcional por parte de tais agentes.
O arguido mantém-se profissionalmente inserido na mesma área profissional da segurança, considerando-se que no mais estará socialmente inserido.
A circunstância de os factos terem sido cometidos em 2016 não diminui a necessidade da pena para que atenuássemos especialmente a pena, até porque o arguido não quis revelar qualquer sinal de arrependimento que em seu favor pudéssemos valorar.
Tudo visto e ponderado reputa o tribunal como ajustado ao grau de culpa com que agiu fixar a pena em 2 (dois) anos de prisão.
(…)
3. BB:
Cometeu o crime de coacção agravada, punido apenas com pena de prisão, de 1 a 5 anos.
Os factos são graves.
O arguido nem sequer os quis admitir em julgamento, procurando-se dos mesmos se desresponsabilizar.
O arguido regista um percurso criminal onde se evidenciam crimes de natureza violenta praticados contra as pessoas, denotando-se assim um padrão de condutas penais que tem vindo a desenvolver ao longo dos anos, seja por factos cometidos anteriormente aos destes autos seja por factos cometidos posteriormente.
Salienta-se a impulsividade violenta do arguido, evidenciada na globalidade dos factos. O arguido recorre invariavelmente ao uso da violência, seja física, seja moral, para lograr os seus intentos revelando sentimentos desvaliosos sem denotar qualquer arrependimento, nem mudança de padrão de condutas.
Pelo contrário, o arguido gaba-se perante terceiros não só das suas conquistas como atleta mas dos seus feitos criminosos como se fossem mais um troféu ou um cinto de combate ganho.
Os factos evidenciam ainda que o arguido se faz valer da sua qualidade de segurança e das suas capacidades físicas para continuar a testar a sua energia de combate mas sem cumprir quaisquer regras, não resolvendo conflitos, antes os agravando. O arguido está por isso nos antípodas de qualquer Super Herói.
Por outro lado, continua ligado à área da segurança, ante o vínculo mantido com a ..., pelo que também por tal circunstância, ante o facto de revelar não saber gerir conflitos sem recorrer à violência, são também elevadas as necessidades de prevenção especial, aliás já reflectidas nos antecedentes criminais do arguido.
O arguido recorre sistematicamente como sabe fazer, à violência contra os seus potenciais adversários para lograr os seus intentos. E, estando MMM a ganhar terreno de forma legítima ou não no que concerne à expansão do mercado da LB, em prejuízo da ..., nada justificaria a conduta do arguido disposto a no mínimo agredir o mesmo caso se atravessasse no seu caminho comercial. Com tal conduta o coordenador de segurança da LB arrepiou caminho e desistiu de tal mercado receando qualquer investida de BB, como as anunciadas. A conduta é grave e reveladora de falta de escrúpulos.
Como assim, ponderando os factores já referidos, mostra-se adequado fixar a pena de 2 anos e 6 meses de prisão.
Aqui chegados impõe-se analisar se ainda é possível obstar ao cumprimento de uma pena efectiva de prisão mediante a sua substituição por uma pena de prisão suspensa na sua execução.
Revisitando os pressupostos do artigo 50º do CP, conclui-se ser de negar ao arguido a suspensão da execução da pena de prisão.
Desta vez o tribunal considera que somente com o cumprimento efectivo da pena de prisão se mostram salvaguardados de forma cabal os bens jurídicos que o arguido tem vindo teimosamente a violar, apesar da censura das condenações sofridas (que certamente na sua concepção consistiram em impunidade).
Indiferente à violação dos bens jurídicos por que tem pautado a sua carreira, o arguido coleciona medalhas e condenações penais, continuando a desafiar a lei, sem demonstrar vontade em cumprir a normatividade, nem qualquer alteração de padrão de conduta.
O arguido já beneficiou do regime de suspensão de execução da pena, que fracassou os seus propósitos já que não o demoveu de voltar a praticar crimes atentando contra os mesmos bens jurídicos, revelando ainda o arguido incapacidade de cumprir regras a que estava adstrito por sentença penal que culminaram na revogação da suspensão da execução da pena e no cumprimento de uma pena de prisão, actualmente a ser cumprida em regime de permanência na habitação.
Deste modo o juízo de prognose que efectuamos quando ao futuro comportamento do arguido é negativo, em face da sua personalidade que o impele ao crime e que demonstra desprezo pelas normas e bens jurídicos violados e pelas penas que a Justiça lhe tem vindo a aplicar.
Terá por isso o arguido a cumprir uma pena 2 anos e 6 meses de prisão efectiva.
4. EE:
Vai condenado pela prática de exercício ilícito de actividade de segurança privada.
Não tem antecedentes criminais.
A sua condição económica é humilde e sempre trabalhou. Aliás as dificuldades económicas que sentiu no passado e com as quais ainda se confronta no presente tê-lo-ão conduzido ao cometimento dos factos. Afinal esteve o arguido a trabalhar de forma ilegal por necessidades económicas o que não justifica a sua conduta mas de certa forma mitiga o seu grau de culpa. Por outro lado, está habilitado ao exercício da actividade de segurança privada, que continua a desenvolver ainda que com alguma precariedade laboral invariavelmente associada a tais funções.
É por isso justificável a opção pela aplicação ao arguido de uma pena de multa, salvaguardando-se com esta as finalidades da punição.
Assim,
Para a determinação da medida da pena a aplicar ao arguido, nos termos do artigo 71.º do Código Penal caberá ponderar:
a)- a ilicitude do facto (elevada) - relevando o modo da sua execução e o período em que os factos decorreram, num festival de música de verão;
b)-a intensidade do dolo –definido como directo.
c)-a condição pessoal do arguido – está empregado, social e familiarmente inserido.
d) as necessidades de prevenção geral – as quais são elevadas, atendendo à recorrência deste tipo de crimes, à clandestinidade laboral, à precariedade e a tudo o que tal gera lesando os interesses do Estado e também interesses de ordem social e de igualdade no acesso ao trabalho.
g) as necessidades de prevenção especial- mostram-se mitigadas pelos facto de não se conhecerem antecedentes criminais ao arguido a que acresce a circunstância de se encontrar actualmente habilitado ao exercício da actividade de segurança privada.
Por tudo, entende-se ser de aplicar a pena - 200 (duzentos) dias de multa.
(…)
5. FF:
Apesar de os crimes de exercício de actividade de segurança privada ilícita e de detenção de arma proibida serem punidos com pena alternativa de prisão ou de multa, em face da gravidade global dos factos e da persistência criminosa não será de aplicar ao arguido outra pena que não a privativa da liberdade, não reputando o tribunal que a mera condenação do arguido numa pena de multa satisfaça as necessidades de punição que no caso se reputam de fortes.
Assim,
Entre … e … de 2016 o arguido cometeu cinco crimes de exercício da actividade de segurança privada ilícita, desempenhando tais funções como ...em eventos públicos como a festa dos ... e em estabelecimentos de diversão nocturna, à paisana, para evitar que a sua actividade clandestina fosse detectada. Fê-lo com o escopo de obter dividendos financeiros de tal actividade apesar das funções que exercia como agente da PSP em simultâneo e que jamais poderia conciliar com as de segurança privada.
É por isso particularmente gravosa a sua actuação neste mercado criminal desde logo pela implícita quebra de confiança que se transmite à comunidade face às responsabilidades de um órgão de polícia criminal, atribuições legais bem como estatuto que lhe foram concedidas como agente da PSP.
Com feito, atenta a sua qualidade, incumbia ao arguido um particular dever de cumprir a lei, para além de a fazer cumprir, compactuando e participando em crimes na área da segurança privada matéria essa que aliás também incumbe à própria PSP fiscalizar e combater.
Em abono do arguido apenas podemos valorar a sua ausência de antecedentes criminais, já que se tendo remetido ao silêncio não nos quis transmitir qualquer sinal de arrependimento nem de autocensura, o que não o desfavorece, mas também não o beneficia.
Reforçando a ideia que já se aludiu de serem elevadas as exigências de prevenção e de punição deste tipo de crimes, aliado às circunstâncias já mencionadas e ainda à condição actual do arguido, estará afastado das funções como agente da PSP, dedicando-se a outras na área do desporto, mostra-se proporcional ao grau de culpa com que actuou, fixar em termos de pena parcelar, um ano de prisão por cada crime de exercício de actividade segurança privada ilícita.
Quanto ao crime de tráfico de armas agravado considerando que se provou que o arguido adquiriu dois bastões extensíveis para ulterior cedência e revenda e que tais objectos são afectos exclusivamente às forças policiais, contribuiu de forma que não se pode ter como diminuta para a proliferação do mercado de armas ilegais, afectando tais armas, designadamente a pessoas com quem se relacionava em razão da sua outra “profissão”, que nunca as poderiam deter de forma lícita, nem utilizar na actividade de segurança privada, sujeita além do mais ao regime legal geral de uso e porte de arma – cfr. artigos 32º e 34º, nº 4 da Lei 34/2013.
Deste modo é ajustado aplicar-lhe a pena de 4 anos e 6 meses de prisão relativamente a este crime.
Por fim, quanto ao crime de detenção de arma proibida o arguido detinha um total de 76 munições de dois de tipo de calibre e dois cartuchos de calibre 12.
Como agente da PSP tinha um especial dever de cumprir a lei sobretudo a relativa a matéria de armas e munições que por força do exercício das suas funções bem conhecia.
Temos por isso como especialmente censurável a sua actuação em conformidade com o que se decide fixar a pena parcelar por este crime em 6 meses de prisão.
Cúmulo jurídico e pena única aplicável:
(…)
A moldura abstracta do cúmulo tem um limite mínimo de 4 anos 6 meses de prisão e máximo de 10 anos.
Dando-se aqui como analisados os pressupostos no artigo 77º, nºs 1 e 2 do CP como supra exposto e considerando que os factos e a personalidade do agente não revelam apenas uma plurocasionalidade, revelando o arguido uma clara inclinação para organizar o seu modo de vida no campo da ilicitude penal, com desrespeito pela integridade de bens jurídicos de grande importância na convivência social, sendo os factos de elevado grau de ressonância ética negativa no tecido social.
Como assim, mostra-se ajustado aplicar a pena única de 6 anos de prisão.
6. DD:
O seu passado penal e sobretudo pela prática de crimes de exercício ilícito da actividade de segurança privada inviabiliza a aplicação de uma pena pecuniária, somente a prisão sendo agora capaz de cumprir as finalidades da punição.
O arguido estando há vários anos à frente de uma empresa na área de segurança é perfeitamente conhecedor das regras que regem o sector e apesar disso continua a recorrer a mão de obra ilegal por quem não está habilitado ao exercício da actividade e que, por dependência económica se arrisca, sujeitando-se ao trabalho ilícito. Do ponto de vista do empregador, a situação é claramente aliciante em termos do real custo de tal trabalhador com tudo o que isso implica de prejuízo para o Estado, em matéria fiscal mas sobretudo pela precariedade laboral inerente.
Posto isto, a sua conduta ao recorrer a mão de obra ilegítima não deixa de ser mais censurável, porquanto quem decide a contratação é o arguido e não o trabalhador.
O arguido mantem um cargo de responsabilidade na ... não lhe sendo conhecidas circunstâncias posteriores aos factos praticados nestes autos que em seu desfavor sejam de valorar, o que atenua de certa forma as exigências de prevenção especial.
Assim, considerando o período de tempo em que EE exerceu funções de vigilante/segurança para o arguido e para a ..., reputa-se ajustado graduar a pena em 1 ano e 6 meses de prisão pelo crime de exercício ilícito da actividade de segurança privada.
Quanto ao crime de detenção de arma proibida note-se que o arguido detinha uma arma que tinha sido subtraída ao seu proprietário, 25 cartuchos para essa caçadeira, um revólver com o número de série rasurado e 111 munições aptas a e deflagrar no mesmo.
E consequência, considera-se que em face do número de armas e munições que detinha, bem como das respectivas características é ajustado fixar a pena em 1 ano e 6 meses de prisão.
Pena única:
A moldura abstracta da pena única aplicável tem um mínimo de 1 ano e seis meses de prisão e um máximo de 3 anos.
Revisitando os factos, a personalidade do agente algo propensa ao cometimento desta tipologia de crimes, é ajustado fixar a pena em 2 anos de prisão.
Pena esta que não se substitui por trabalho a favor da comunidade por desadequada à salvaguarda das finalidades da punição mas que se suspende na sua execução pelo mesmo período por o agente ter mantido uma postura conforme às regras, reportando-se os factos já aos anos de 2016 e 2017, crendo-se ser ainda possível formular um juízo positivo relativamente ao mesmo revelando-se por isso a ameaça do cumprimento de uma pena privativa da liberdade suficiente a acautelar as finalidades da pena.
No entanto considera-se ser de aplicar uma condição a tal regime de suspensão da execução da pena que in casu se afigura ser razoável condicionar o agente ao pagamento da quantia de mil euros a favor do Estado, por depósito autónomo à ordem dos autos, cujo cumprimento o arguido é perfeitamente capaz em face da sua condição económica (ainda que a tenha pretendido ocultar do tribunal atento o teor do relatório social) nos termos dos artigos 50º, 51º, nº 1, al. c) e nº 2 do CP.
(…)
9. GG:
Durante mais de dois anos contribuiu significativamente para a deturpação e desacreditação do regime sancionatório das contraordenações rodoviárias, o que transmitiu à comunidade em que se inseria e que ia conhecendo ao que se dedicava. Sendo um militar da GNR com conhecimentos na matéria, valendo-se do estatuto social inerente ao cargo e a um vasto conhecimento da população onde reside, tal facilitou a reiteração das suas condutas. O arguido mantinha em funcionamento um autêntico escritório ao serviço dos amigos e de conhecidos contribuindo para a impunidade de infracções chegando mesmo a efectuá-lo relativamente a autos de contraordenação que o próprio tinha levantado. Enquanto ao serviço como militar da GNR, nas vestes de autoridade pública, fazia por cumprir a lei, aplicando-a relativamente aos infractores rodoviários, já no seu domicílio redigia peças processuais de vários tipos consoante as infracções, que armazenava digitalmente recorrendo a dados de identificação de terceiros que sabia não poderem ser localizados em Portugal, facultando-as aos autuados para que fossem ilibados. Se já é censurável que um condutor se tente eximir à sua responsabilidade procedendo à identificação por exemplo de um familiar como sendo o responsável pela infracção, o que dizer quando é o próprio autuante, um militar da GNR, a ajudar terceiros a recorrer a tal expediente?
Consideramos por isso ser globalmente gravosa a actuação do arguido, os bens jurídicos que violou, contrariando os deveres que estava obrigado a cumprir por força das suas funções, do seu estatuto profissional como militar da guarda, desprestigiando a própria corporação e as instituições que devia servir ao invés de trair.
O arguido não dignifica a Guarda Nacional Republica que afinal tantos louvores lhe atribuiu por desconhecer esta faceta ao arguido e actividade paralela eivada de deslealdade e de desonestidade.
As nossas forças policiais têm de ser expurgadas de elementos como o arguido que corrompem o sistema e o funcionamento das instituições que servem a Justiça e, em última instância, esta.
Através das suas actuações o arguido não só violou os bens jurídicos protegidos pela lei que as proíbe, mas ainda os referentes às infracções rodoviárias que por força daquela actuação acabaram por não ser punidas, com o que tal acarreta de danosidade social desde logo em matéria de prevenção e de segurança rodoviária, permitindo que condutores levianos e imprudentes continuassem a desenvolver a actividade de condução, apesar de desmerecedores.
Em abono do arguido valora-se tão somente a ausência de antecedentes criminais, já que nem mesmo as declarações que prestou (limitadas a primeiro interrogatório judicial) e a versão que sustentou em sede de contestação traduzem qualquer capacidade crítica pela desvaliosa actuação que imprimiu pelo menos ao longo de um par de anos.
É por isso elevado o grau de ilicitude e de culpa com que agiu, mantendo-se a necessidade da pena apesar do tempo já decorrido desde a prática dos factos, não havendo quaisquer circunstâncias atenuativas a aplicar, em face da personalidade evidenciada pelo arguido decorrente dos factos e da postura que quando confrontado com os mesmos revelou.
Assim, feitas as contas o arguido deverá ser punido por 24 crimes de falsificação de documento na forma simples que em abstracto prevê como alternativo à sua punição a aplicação da multa. No caso é manifestamente inviável a punição do arguido com esta tipologia de pena pecuniária em face da globalidade gravosa dos factos somente ficando acauteladas as necessidades da punição com a aplicação de uma pena de prisão.
Posto isto, ponderando-se as circunstâncias já referidas que se valoram negativa e positivamente, temos como ajustado graduar as penas parcelares por dois blocos de situações que entendemos ser de distinguir. Assim relativamente às situações ocorridas a solicitação do mesmo proprietário/infractor rodoviário porque terão sido contemporâneas entre si haverá que punir o agente com uma pena inferior à das demais por se considerar que nestas presidiu uma renovação criminosa mais intensa, mais culposa. São aquelas situações as referentes à arguida MMMMMMM (catorze infracções, catorze crimes de falsificação), as duas relativas a MMMMM e as outras duas relativas a WWWWWWW.
Por tais crimes, num número total de 18 (dezoito) e por cada um deles, mostra-se ajustado fixar a pena parcelar de 6 (seis) meses de prisão.
Relativamente aos demais crimes de falsificação, num total de 6 (seis) e por cada um deles, decide o tribunal fixar a pena de 10 (dez) meses de prisão.
Pena única:
Conforme se expendeu, a pena única do concurso de crimes, assente no sistema de pena conjunta e que parte das várias penas parcelares aplicadas pelos vários crimes (princípio da acumulação), deve ser fixada dentro da moldura do cúmulo, tendo em conta os factos e a personalidade do agente.
Na consideração do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso, está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, devendo ter-se em conta a possível conexão existente entre os factos em concurso.
Na consideração da personalidade do agente, tal como se manifesta na globalidade dos factos, devem ser avaliados e determinados os termos em que a personalidade se projecta nos factos e é por estes revelada, ou seja, aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, ou antes se se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente.
A determinação da pena do concurso exige, pois, um exame crítico de ponderação conjunta sobre a conexão e interligação entre todos os factos praticados, acentua-se, todos os factos, e a personalidade do seu autor.
Impõe-se, portanto, que se proceda a uma nova reflexão sobre os factos, em conjunto com a personalidade do condenado, em ordem a adequar a medida da pena à personalidade que se revelou em toda a factualidade.
A moldura abstracta do cúmulo fixa-se desta forma entre um limite mínimo de 10 meses a um máximo de 14 anos de prisão.
Revisitando os factos, a reiteração das condutas, o sentimento de impunidade que as mesmas traduzem à comunidade em geral, a sua gravidade e afronta aos bens jurídicos tutelados directa e reflexamente, bem como a qualidade do agente, um militar da GNR que devia ser o exemplo no cumprimento da lei e que a desvirtua corrompendo o sistema sancionatório das infracções rodoviárias, mostra-se ajustado ainda assim fixar a pena em 5 anos de prisão.
Ponderação da suspensão da execução da pena de prisão:
Não obstante a circunstância de formalmente o legislador português nunca ter consagrado a suspensão da execução da pena como uma "pena autónoma", é indubitável, quer a nível doutrinal, quer jurisprudencial, ter a suspensão emergido como uma espécie de pena de substituição.
A suspensão da pena constitui um meio autónomo de reacção jurídico-penal com uma pluralidade de possíveis efeitos. É pena na medida em que na sentença se impõe uma privação da liberdade. Tem o carácter de um meio de correcção se acompanhada de tarefas orientadas no sentido de reparar o ilícito cometido, como as indemnizações, multas administrativas ou benefícios para beneficio da Comunidade. Aproxima-se de uma medida de assistência social quando são impostas regras de conduta que afectam a vida futura do arguido especialmente se for colocado sob supervisão. Finalmente, oferece uma faceta pedagógico social activo na medida em que estimula o mesmo arguido a engajar-se na sua ressocialização aproveitando o período de prova.
Transpondo ainda os demais considerados já mencionados relativamente aos pressupostos do artigo 50º do CP, crê-se que, apesar da gravidade dos factos, olhando para a distância temporal em que os mesmos ocorreram e para a condição social do arguido, estamos ainda em condições de acreditar que a ameaça do cumprimento de uma pena de prisão efectiva seja ainda suficiente para demover o arguido de voltar a delinquir, a tal não se opondo razões de prevenção geral.
Em conformidade decide-se suspender a pena de 5 anos de prisão na sua execução pelo mesmo período nos termos do artigo 50º, nºs 1 e 5 do CP, a qual no entanto deve ficar sujeita ao cumprimento de condições por parte do arguido mostrando-se adequado ao caso e também à situação económica do condenado determinar que o mesmo entregue a favor da ANSR a quantia de cinco mil euros, por depósito à ordem destes autos e no período da suspensão fixada, atento o disposto no artigo 51º, nº 1, al. c) e nº 2 do CP.
(…)
11. HH:
Vai condenado por um crime de falsificação de documento na forma simples cuja moldura pena admite a punição em alternativa à prisão, com multa até 360 dias.
À luz do comando do artigo 70º do CP, não tendo o arguido antecedentes criminais, o tribunal opta pela aplicação ao mesmo de uma pena de multa, por a punição e censura dos factos ficar acautelada atentas as finalidades da punição.
Nesta situação, também o infractor rodoviário em face da posição adoptada pela magistratura acusatória, acabou por ser beneficiado duplamente, logrou eximir-se da respectiva responsabilidade contraordenacional através da falsificação de um documento que no seu interesse usou e ainda foi premiado com o arquivamento criminal por tal ilícito, sendo apenas os demais co-autores que o coadjuvaram para aquele propósito, além do mais por questões de amizade, perseguidos e responsabilizados, o que é manifestamente gerador de sentimentos de injustiça que não deixamos de expressar.
Posto isto a conduta do arguido consistiu efectivamente em solicitar a GG o fabrico da contestação indicada a remeter à ANSR e que ilibasse o infractor rodoviário, o seu amigo VVVVVVV, como certamente o arguido sabia que aquele a tanto se vinha dedicando. Assim, o contributo do arguido funcionou como um intermediário entre os dois autores materiais do documento, tendo-o entregue para assinatura a VVVVVVV.
Não se provou que tivesse obtido qualquer contrapartida ou benefício com a sua actuação, para além de beneficiar um amigo.
O arguido mantém uma vida focada no trabalho e organizada em função da sua família, o que se valora positivamente.
Tudo visto e ponderado, reputa-se ajustado ao grau de culpa com que agiu fixar a pena em 120 (cento e vinte) dias.
Quanto ao quantitativo diário da multa, sob ponderação do disposto e já citado artigo 47º nº 2 do CP, mantendo o arguido uma vida confortável em termos financeiros, contando o seu agregado familiar com os rendimentos do seu trabalho, acima do ordenado médio nacional e ainda com os da sua mulher, tendo o foco ainda no sacrifício financeiro que deve implicar o pagamento de qualquer pena de multa, decide-se fixar tal quantitativo em 8€ (oito euros), o que perfaz o valor de € 960,00 (novecentos e sessenta euros).
II.3.F. Do perdão de penas (cfr. 01h21min26s a 01h20min50s da gravação da totalidade das alegações orais efetuadas6):
Apesar de o recorrente AA ter suscitado a questão em alegações, o acórdão recorrido não equacionou a aplicação do perdão a que alude os arts. 2.º, n.º 1 e 3.º, n.º 1, da Lei nº 38-A/2023, de 02-08.
II.4. Da apreciação das questões objeto do recurso:
Cumpre agora analisar as já elencadas questões suscitadas pelos recorrentes (cfr. II.2.B.):
II.4.A. Da direção do inquérito:
O recorrente HH pugna pela nulidade do processado desde a atuação do inquérito, uma vez que entende que o Ministério Público teria usurpado uma competência que é do juiz de instrução, dado que o art.º 263.º do C.P.P. é inconstitucional por violação do art.º 32.º, n.º 4, da C.R.P. (cfr. I.2.H.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que não existe qualquer inconstitucionalidade do art.º 263.º do C.P.P. por violação do art.º 32.º, n.º 4, da C.R.P., tendo em conta a motivação já estabelecida a esse propósito pelo Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 7/87 (cfr. I.2.H.b.)
Em rigor trata-se de questão que nunca foi levantada junto do tribunal recorrido.
Ora, os recursos são meios a usar para obter a reapreciação de uma decisão, mas não para obter decisões de questões novas, isto é, de questões que não tenham sido suscitadas pelos sujeitos processuais perante o tribunal recorrido. As questões novas não podem ser apreciadas em recurso, quer em homenagem ao princípio da preclusão, quer por desvirtuarem a finalidade dos recursos: destinam-se a reapreciar questões e não a decidir questões novas, por a apreciação destas equivaler a suprimir um ou mais graus de jurisdição, prejudicando o sujeito processual que ficasse vencido (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24-05-2006, processo n.º 06P7987), pelo que, nesta parte, impõe-se a rejeição do recurso interposto (cfr. arts. 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, al. b), e 420.º, n.º 1, al. b), do C.P.P.).
Acresce que nada impede que a rejeição seja decidida, em primeira mão, em conferência, daí não redundando qualquer dano para a defesa, uma vez que é precisamente a reclamação para a conferência (cfr. art.º 417.º, n.º 8, do C.P.P.) o direito que é conferido ao recorrente para impugnar a decisão sumária com idêntico fundamento (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-06-2023, processo n.º 121/08.1TELSB.L1.S18).
Pela rejeição do recurso, porque parcial, não é devida qualquer outra importância sancionatória, uma vez que o disposto no art.º 420.º, n.º 3, do C.P.P. pressupõe que a rejeição do recurso seja total.
Seja como for, dispõe o art.º 263, sob a epigrafe “direção do inquérito” que:
1 - A direção do inquérito cabe ao Ministério Público, assistido pelos órgãos de polícia criminal.
2 - Para efeito do disposto no número anterior, os órgãos de polícia criminal atuam sob a direta orientação do Ministério Público e na sua dependência funcional.
Por sua vez, dispõe o art.º 32.º, n.º 4, da C.R.P., sob a epigrafe “garantias de processo criminal”, que:
Toda a instrução é da competência de um juiz, o qual pode, nos termos da lei, delegar noutras entidades a prática dos atos instrutórios que se não prendam diretamente com os direitos fundamentais.
Embora se aceite que a anterior configuração do C.P.P. de 1929, distinguindo a instrução preparatória da contraditória, possa ter contribuído para algumas dúvidas interpretativas, o certo é que, no atual desenho do C.P.P., vigente desde o século passado, não faz qualquer sentido entender que a expressão “instrução” é usada no citado preceito constitucional como toda a atividade de produção de prova, o que demandaria que se entendesse que o monopólio da primeira fase de investigação tivesse que ser entregue a um juiz (cfr. LEITE, André Lamas, in “O Ministério Público: o seu estatuto e a promoção da ação penal no quadro da legalidade democrática”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 34, n.º 3, págs. 398 e 399).
Seja como for, o próprio Tribunal Constitucional, em vários arestos, se tem pronunciado, de forma homogénea, no sentido da não inconstitucionalidade do art.º 263.º do C.P.P. (cfr. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 7/1987, de 09-01-19879; acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/1990, de 31-01-199010; decisão sumária do Tribunal Constitucional n.º 428/2015, de 06-07-201511; acórdão do Tribunal Constitucional n.º 379/2015, de 06-08-201512, que versou sobre a reclamação àquela decisão sumária), tanto mais que, tal direção pelo Ministério Público, não exime que qualquer atividade de produção de prova no inquérito contundente com direitos fundamentais tenha que passar pelo crivo de um juiz de instrução criminal, o que se acha garantido pelos arts. 268.º e 269.º do C.P.P.
Assim, este segmento do recurso interposto pelo arguido HH (cfr. I.2.H.a.) sempre estaria condenado ao fracasso.
II.4.B. Do saneamento do processo:
O recorrente HH pugna pela inconstitucionalidade do art.º 311.º do C.P.P., por o mesmo ter propiciado ao juiz presidente do tribunal de julgamento um contacto prévio com a versão acusatória, tendo formado uma convicção prévia da culpabilidade do recorrente HH, e só depois é que notificou a defesa para contestar, o que entende ser violador do princípio da presunção de inocência, da igualdade de armas e do contraditório e, assim, do disposto nos arts. 8.º e 32.º, n.ºs 2 e 5, da C.R.P. e 6.º, n.º 1, da C.E.D.H., na parte referente a um processo equitativo por parte de um tribunal independente e imparcial (cfr. I.2.H.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que não existe qualquer inconstitucionalidade do art.º 311.º do C.P.P., por violação do “processo equitativo” previsto nos arts. 8.º e 32.º, n.º 2, da C.R.P. e no art.º 6.º, n.º 1, da C.E.D.H., na medida em que nessa fase processual o juiz não efetua qualquer juízo probatório sobre o caso concreto, mas unicamente verifica se processualmente existem os pressupostos ali legalmente consagrados para o recebimento da acusação (cfr. I.2.H.b.).
Embora seja evidente que o recorrente HH se insurge contra a arquitetura do processo penal português vigente, por referência ao caso em causa nos presentes autos, não menciona um único acontecimento histórico e concreto que materialize as imputações genéricas que efetua, pese embora a gravidade de algumas delas.
Seja como for, mesmo que se entendesse ter o referido recorrente, nesta parte, enunciado especificamente os fundamentos do recurso (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.), trata-se, novamente, de questão que nunca foi levantada junto do tribunal recorrido, pelo que tratando-se de questão nova, nos termos já expostos (cfr. II.4.A.), condena o recurso interposto, nesta parte, à sua rejeição (cfr. arts. 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, al. b), e 420.º, n.º 1, al. b), do C.P.P.), sendo que, como também resulta do já exposto (cfr. II.4.A.), nada impede que a rejeição parcial seja decidida, em primeira mão, em conferência, não sendo devida qualquer outra importância sancionatória.
Não obstante, cumpre salientar que, no que se refere ao recorrente HH, o caso jurídico-penal em que se viu acusado da prática de um crime, foi processualmente levado à apreciação de um tribunal judicial que declarou a existência da sua responsabilidade penal e lhe aplicou uma sanção criminal formalmente qualificada pelo legislador como uma pena, tudo assim tendo decorrido perante o órgão competente para tal, enquanto representante da comunidade jurídica e do poder oficial do Estado em que aquela se constitui, assim se tendo observado os ditames constitucionais (cfr. 202.º, n.º 1, e 211.º, n.º 1, da C.R.P.).
Por outro lado, não há notícia, nem o recorrente HH refere ter ocorrido qualquer interferência dos restantes poderes do Estado, de quaisquer grupos da vida pública, da administração judicial e dos outros tribunais, pelo que o princípio da independência judicial foi observado (cfr. arts. 203.º e 216.º, n.ºs 1 e 2, da C.R.P., 4.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário – L.O.S.J., e 4.º, 5.º e 6.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais – E.M.J.).
Sendo a prática de atos inúteis proibida por lei (cfr. art.º 4.º do C.P.P. e 130.º do Código de Processo Civil – C.P.C.), é absolutamente lógico que recebidos os autos no tribunal, caiba ao juiz presidente do tribunal do julgamento o saneamento do processo a que alude o art.º 311.º do C.P.P., que tem precisamente como escopo impedir o prosseguimento do processo para a audiência de julgamento por se verificar qualquer causa que possa obstar ao conhecimento do mérito do pleito remetido a juízo e de que possa conhecer-se no estado em que então se encontra o processo (cfr. LATAS, António, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo IV, Almedina, 2022, pág. 39).
Contudo, para tal aquilatar, é evidente que o juiz presidente do tribunal de julgamento toma contacto com o acervo probatório reunido e com o decidido nas fases anteriores do processo, sem que daí derive, por si só, uma predisposição no sentido da condenação de qualquer uma das pessoas nele acusadas da prática de um crime.
Na verdade, se é certo que todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação (cfr. art.º 32.º, n.º 2, da C.R.P.) o recorrente HH parece esquecer que a imparcialidade pessoal do juiz também se presume até prova em contrário, conforme tem sido afirmado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (cfr. caso Piersack c. Bélgica (30.)13, caso De Cubber c. Bélgica (25.)14 e caso Hauschildt c. Dinamarca (47.)15), e implica que é ao arguido que cumpre demonstrar, através de elementos concretos, a falta de imparcialidade pessoal do juiz (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo e BRANDÃO, Nuno, in Direito Processual Penal – Os sujeitos processuais, Gestlegal, 2022, pág. 62, nota 103), o que aquele manifestamente nunca fez. Aliás, datando o saneamento do processo de 16-09-2022 (cfr. ref.ª ...), se o recorrente HH possuísse elementos concretos que algum dos juízes que compunha o tribunal coletivo recorrido logo aí teria formado uma convicção prévia da culpabilidade do recorrente HH, não teria deixado de lançar mão do incidente de recusa de juiz destinado precisamente a recusar a intervenção de qualquer um daqueles por suspeita de falta de imparcialidade (cfr. art.º 43.º, n.ºs 1 e 3, do C.P.P.).
Seja como for, constatado que nada então impedia o conhecimento do mérito da causa remetida a juízo, para conseguir as bases necessárias à sua decisão, o julgador passou então a ouvir, para o efeito, quer as razões da acusação quer as da defesa, sendo esse o sentido e conteúdo do princípio do contraditório (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Processual Penal, 1988-1989, § 165, pág. 108), garantia de defesa constitucionalmente consagrada (cfr. art.º 32.º, n.º 1 e 5, da C.R.P.), o que então se materializou de imediato no cumprimento do disposto no art.º 311.º-A, do C.P.P. e culminou na apresentação pelo recorrente HH de uma contestação apelidada pelo próprio de “resumida” onde se limitou a negar a prática dos factos imputados e a indicar como testemunhas as já arroladas pelo Ministério Público (cfr. ref.ª 12877121 de 12-10-2022).
Assim, este segmento do recurso interposto pelo arguido HH (cfr. I.2.H.a.) sempre estaria condenado ao fracasso.
II.4.C. Das interceções e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas:
O recorrente FF afirma que as sessões de conversações ou comunicações telefónicas a si referentes e que foram intercetadas e gravadas foram levadas ao conhecimento do Ministério Público para além do prazo de 15 dias a que alude o art.º 188.º, n.º 3, do C.P.P., pelo que são nulas nos termos do art.º 190.º do C.P.P., entendendo que se verifica uma proibição de valoração de prova (cfr. I.2.F.a.).
Por outro lado, também refere ter ocorrido extemporaneidade da apresentação ao juiz dos suportes técnicos, bem como dos respetivos autos e relatórios de conversações ou comunicações telefónicas a si referentes e que foram intercetadas, gravadas e validadas por despachos de 12-10-2016 e 04-12-2016, o que constituiria uma nulidade insanável.
Pese embora os termos genéricos da alegação, no que se refere à primeira situação, omissa quanto a datas e aos concretos atos processuais em causa, mesmo que se entendesse ter o referido recorrente, nesta parte, enunciado especificamente os fundamentos do recurso (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.), o certo é que a expressão “nulidade” usada no art.º 190.º do C.P.P. para sancionar a inobservância dos requisitos e condições referidos nos arts. 187.º, 188.º e 189.º, do C.P.P. não abrange apenas as proibições de prova, cuja consequência é a impossibilidade de utilização de prova (cfr. MILHEIRO, Tiago Caiado, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo II, Almedina, 2019, págs. 849 e segs.).
De facto, dispõe o art.º 188.º, n.ºs 3 e 4, do C.P.P. que:
3 - O órgão de polícia criminal referido no n.º 1 leva ao conhecimento do Ministério Público, de 15 em 15 dias a partir do início da primeira interceção efetuada no processo, os correspondentes suportes técnicos, bem como os respetivos autos e relatórios.
4 - O Ministério Público leva ao conhecimento do juiz os elementos referidos no número anterior no prazo máximo de quarenta e oito horas.
O estabelecimento de prazos na matéria em causa visa cumprir uma imposição constitucional (cfr. arts. 18.º, n.º 2, 32.º, n.º 8 e 34.º, n.ºs 1 e 4, da C.R.P.) no sentido de um acompanhamento próximo, efetivo e contínuo por um juiz, para evitar a manutenção de escutas ilegais, desnecessárias, desadequadas, desproporcionais ou excessivas (cfr. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 446/2008, de 23-09-200816).
Contudo, tais prazos, não deixam de ser regras procedimentais ou instrumentais, visando acautelar uma limitação constitucionalmente admissível, tolerável, não abusiva, nas comunicações e privacidade, pelo que não é a sua mera ultrapassagem que ditará por si uma proibição de utilização de prova.
Aliás, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2018, de 30-11-2017, in Diário da República n.º 30/2018, I Série A, de 12-02-2018, págs. 938 e segs.17, fixou jurisprudência no sentido de que “a simples falta de observância do prazo de 48 horas, imposto no n.º 4 do art.º 188.º do CPP, para o M.º P.º levar ao juiz os suportes técnicos, autos e relatórios referentes a escutas telefónicas, constitui nulidade dependente de arguição, nos termos dos arts. 190.º e 120.º, ambos do Código de Processo Penal.
Ora, contrariamente ao que acontece quanto às nulidades de sentença, as quais devem ser arguidas em recurso (cfr. art.º 379.º, n.º 2, do C.P.P.), a nulidade aqui em causa, a existir, deveria ter sido arguida até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito (cfr. art.º 120.º, n.º 3, al. c), do C.P.P.), pelo que, não o tendo sido, ficou sanada (cfr. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 476/2015, de 30-09-201518; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-11-2016, processo n.º 63/10.0P6PRT.P1.S119).
Improcede, pois, neste segmento, o recurso interposto pelo arguido FF (cfr. I.2.F.a.).
Por outro lado, apesar de o recorrente HH imputar ao acórdão recorrido, quanto a outros segmentos do mesmo, “generalidades, vagas, ocas e comuns”, para sustentar a nulidade insanável dos despachos judiciais que autorizaram e/ou renovaram a realização de interceções e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas, acaba por tecer, agora na sua peça recursiva, considerações gerais e teóricas que, contudo, uma vez mais não aplica ao caso por reporte a um concreto despacho que tenha autorizado que ele próprio fosse alvo de interceção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas ou a uma concreta conversação ou comunicação telefónica que o tenha envolvido (cfr. II.3.A. e I.2.H.a.).
Acresce que, conforme resulta da motivação da decisão de facto (cfr. “factos relativos a VVVVVVV”, do ponto 9. da motivação da decisão de facto (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.), o tribunal recorrido não se baseou em qualquer conversação ou comunicação telefónica que tivesse sido intercetada e gravada na parte referente aos factos que considerou provados quanto ao recorrente HH (cfr. factos provados sob os pontos 197. a 204. – II.3.B.).
Assim, em rigor, nem na motivação (corpo) do recurso que interpôs nem nas conclusões que o rematam o recorrente “enuncia especificamente os fundamentos do recurso” (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.), ou seja, não é claro nem completo quanto às razões de facto e de direito do seu inconformismo, assim impedindo a tarefa de aquilatar se foi violada alguma proibição de prova ou regra de produção de prova e, neste último caso, qual a sua subsunção legal, desde logo, do ponto de vista da sua classificação, arguição e efeitos.
Ora, tal deficiência estrutural é irremediável, sendo insuscetível de aperfeiçoamento, apenas previsto para as conclusões (cfr. art.º 417.º, n.º 3, do C.P.P.) que, em todo o caso, tem como limite o texto da motivação, o que conduz, atento o princípio da cindibilidade (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 10/92, de 24-06-1992, para fixação de jurisprudência, in Diário da República n.º 180, I-A Série, de 06-08-1992, págs. 3709 e segs.20), à rejeição parcial (cfr. arts. 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, al. b), e 420.º, n.º 1, al. b), do C.P.P.; SIMAS SANTOS, Manuel e LEAL-HENRIQUES, Manuel, in Recursos Penais, 9.ª edição, Rei dos Livros, 2020, págs. 131 e 132; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31-10-2027, processo n.º 07P321821) do recurso interposto pelo arguido HH (cfr. I.2.H.a.).
Acresce que, como resulta do já exposto (cfr. II.4.A.), nada impede que a rejeição seja decidida, em primeira mão, em conferência, sendo que, pela rejeição do recurso, porque parcial, não é devida qualquer outra importância sancionatória.
II.4.D. Da nulidade do acórdão recorrido:
II.4.D.a. Da nulidade do acórdão recorrido por falta de fundamentação (cfr. art.º 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P.):
O recorrente AA, apenas nas conclusões do recurso que interpôs, refere que “o acórdão recorrido é nulo, nos termos do artigo 2.º do artigo 374.º e do artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal, porque lhe falta a indicação, mesmo que sumária e concisa dos meios de prova subjacentes a cada um dos factos dados como provados e como não provados” (cfr. I.2.A.a.).
O Ministério Público, na resposta, pugna que o acórdão recorrido não padece de qualquer insuficiência ou omissão na fundamentação da matéria de facto dada como provada (cfr. I.2.A.b.).
No que se refere ao recurso interposto pelo recorrente AA cumpre salientar que a falta da indicação e exame crítico das provas, a verificar-se, consubstanciaria a nulidade prevista na al. a), do n.º 1, do art.º 379.º, do C.P.P. e não a al. c), do n.º 1, do mesmo preceito legal erroneamente indicada pelo recorrente AA (cfr. LOPES, José Mouraz, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo IV, Almedina, 2022 pág. 797).
Seja como for, sobre tal ponto, o recorrente não expõe, na motivação (corpo) do recurso que interpôs, as razões de facto e de direito que, no seu entender, tal fundamentam (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.).
Na verdade, o requerimento de interposição de um recurso em processo penal deve conter a motivação (cfr. art.º 411.º, n.º 3, do C.P.P.), onde se enunciam especificadamente os fundamentos do recurso (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.), e deve terminar com a formulação de conclusões deduzidas por artigos, e nas quais o recorrente resume as razões do pedido (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.).
Assim, os fundamentos a desenvolver na motivação (corpo) do recurso são as razões ou motivos que alicerçam e servem de esteio ao recurso, legitimando ou justificando o pedido formulado. Já as conclusões são um resumo do que se explanou, permitindo uma imediata e fácil apreensão do âmbito do recurso e os seus fundamentos e, assim, das questões a decidir (cfr. SIMAS SANTOS, Manuel e LEAL-HENRIQUES, Manuel, in Recursos Penais, 9.ª edição, Rei dos Livros, 2020, págs. 108 a 114).
Ora, assim sendo, as conclusões não podem ser mais abrangentes que a própria motivação, pelo que o que não consta da motivação não pode constar das conclusões.
Deste modo, relativamente a tal questão, verifica-se uma falta de motivação do recurso interposto pelo arguido AA, insuscetível de aperfeiçoamento, apenas previsto para as conclusões (cfr. art.º 417.º, n.º 3, do C.P.P.), e que conduz, como resulta do já exposto (cfr. II.4.C.), à rejeição parcial do recurso (cfr. arts. 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, al. b), e 420.º, n.º 1, al. b), do C.P.P.).
Acresce que, como resulta do também já exposto (cfr. II.4.A.), nada impede que a rejeição seja decidida, em primeira mão, em conferência, sendo que, pela rejeição do recurso, porque parcial, não é devida qualquer outra importância sancionatória.
Por sua vez, o recorrente BB também entende estar o acórdão recorrido ferido da nulidade prevista no art.º 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P. por apresentar uma “fundamentação manifestamente insuficiente” quando aquilatou da possibilidade de suspender a execução da pena de prisão que lhe foi aplicada, concluindo pela não suspensão (cfr. I.2.B.a.).
Já o recorrente FF entende também que o acórdão recorrido é nulo, por falta de fundamentação, relativamente aos factos dados como provados sob os pontos 67. a 107., 240. e 248. (cfr. II.3.B.) e, assim, aí incluindo factos que nem sequer a ele dizem respeito (cfr. factos provados sob os pontos 91. a 98.e 103. a 106. – II.3.B.) (cfr. I.2.F.a.).
Finalmente, o recorrente HH pugna que, relativamente ao crime pelo qual foi condenado, o acórdão recorrido é omisso quanto à concreta e individual conduta por ele praticada e ao exame crítico das provas, o que entende consubstanciar a nulidade prevista no art.º 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P., defendendo que é inconstitucional o art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P. quando entendido no sentido de que não se exige o processo de formação da convicção do tribunal para fundamentar a decisão em matéria de facto, por violação do dever de fundamentação das decisões judiciais (cfr. art.º 205.º da C.R.P.) e do direito ao recurso (cfr. art.º 32.º, n.º 1, da C.R.P.) (cfr. I.2.H.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que o acórdão recorrido contém, no elenco dos factos provados, a concreta conduta praticada pelo recorrente HH, bem como a descrição e discussão crítica da prova produzida, não se verificando a inconstitucionalidade assacada (cfr. I.2.H.b.).
O art.º 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P. prevê a nulidade do acórdão (cfr. art.º 97.º, n.ºs 1, al. a), e 2, do C.P.P.) que não contiver as menções referidas no art.º 374.º, n.º 2, e n.º 3, al b), do C.P.P.
Deste modo, como em parte já resulta do exposto, a falta de factos provados e da indicação e exame crítico das provas, a verificar-se, consubstanciaria a nulidade prevista na al. a), do n.º 1, do art.º 379.º, do C.P.P. e não a al. c), do n.º 1, do mesmo preceito legal também erroneamente indicada pelo recorrente HH (cfr. LOPES, José Mouraz, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo IV, Almedina, 2022 pág. 797).
Ora, “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei” (cfr. art.º 205.º, n.º 1, da C.R.P.), sendo que “os atos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão” (cfr. art.º 97.º, n.º 5, do C.P.P.).
Em decorrência do disposto no art.º 205.º, n.º 1, da C.R.P., e em coerência com o disposto no art.º 97.º, n.º 5, do C.P.P., o art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P. estipula que “ao relatório segue-se a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”.
O dever de fundamentação das decisões judiciais é, sob o ponto de vista endoprocessual, um instrumento de racionalização técnica da atividade decisória do tribunal, com um triplo objetivo: fornecer ao julgador um meio de verificação e autocontrole crítico da lógica da decisão, permitir aos sujeitos processuais o perfeito conhecimento da situação objeto da decisão, habilitando-os a dela recorrerem, se tal entenderem, bem como, por fim, garantir que o tribunal superior, em caso de recurso, se encontra em posição de poder exprimir, em termos mais seguros, um melhor juízo sobre a decisão de 1.ª instância. Contudo, tal dever assume também uma finalidade extraprocessual, tornando possível um controlo externo sobre a decisão, garantindo a transparência do processo e da decisão, fazendo emergir o carácter legitimador do órgão que a profere, implicando prestação de contas e a responsabilização dos juízes (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19-05-2022, processo n.º 1063/19.0GCALM.L2.S122).
Assim, devem ser elencados os factos provados e não provados tendo por referência a factualidade imputada na acusação ou na pronúncia, a alegada nos pedidos de indemnização civis deduzidos e nas contestações apresentadas e a que resulte da prova produzida em audiência. Acresce que, ainda que de uma forma concisa, mas tanto quanto possível completa, devem ser expostas as razões que estiveram na base da convicção do tribunal segundo a qual é correta a versão dos factos por si acolhida e que ditou a escolha entre os factos que ficaram provados e aqueles que não ficaram provados. Para tal deverão ser indicadas e examinadas criticamente as provas que sustentaram a convicção do tribunal, o que impõe que sejam expostas as razões que estiveram na base das opções tomadas pelo tribunal sobre cada uma das provas produzidas e, assim, os motivos pelos quais atendeu a determinadas provas e aqueles pelos quais não atendeu a eventuais provas em sentido contrário.
Acresce que, no caso das penas de substituição, se admissíveis, deverá o tribunal, de forma suficiente, coerente e razoável, ainda que concisamente, referir os fundamentos para a sua aplicação ou afastamento, em função de razões concretas (cfr. (cfr. art.º 375.º, n.º 1, do C.P.P.; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 09-02-2023, processo n.º 80/21.5PCLRS.L1-923).
Contudo, só existe violação do art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P., se houver uma falta absoluta de tal fundamentação, isto é, se faltar qualquer um dos elementos estruturais elencados no citado preceito legal, não se verificando a nulidade em causa perante uma fundamentação deficiente (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-06-2023, processo n.º 8013/19.2T9LSB.L1.S124; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-09-2020, processo n.º 2774/17.0T8STR.E1.S125; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24-01-2018, processo n.º 388/15.9GBABF.S126; MENDES, António Jorge de Oliveira, in Código de Processo Penal Comentado, Almedina, 2014, pág. 1181).
No presente caso, no que se refere aos factos dados como provados e referentes apenas ao recorrente FF, incluindo o respeitante à ausência de antecedentes criminais (cfr. facto provado sob o ponto 240. – II.3.B.) e os relativos às suas condições pessoais (cfr. facto provado sob o ponto 248. – II.3.B.), da motivação da decisão de facto exarada no acórdão proferido em 1.ª instância constam não só os meios de prova em que se alicerçou o tribunal recorrido, como a conjugação que fez dos mesmos e, assim, as concretas razões pelas quais os considerou demonstrados (cfr., nomeadamente os pontos 7. e 8., aí incluindo a parte dos “factos relacionados com as apreensões”, da motivação da decisão de facto (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.).
Por seu turno, no que se refere ao crime de falsificação de documento pelo qual foi condenado o recorrente HH, basta ler o acórdão recorrido para se concluir que o tribunal recorrido elencou os factos que considerou provados (cfr. factos provados sob os pontos 197. a 204.– II.3.B.) e não provados27, tendo por referência, desde logo, a factualidade imputada no despacho de acusação (cfr. factos sob os pontos 425 a 437), negada na contestação apresentada (cfr. ref.ª ... de 12-10-2022), e expôs as razões pelas quais efetuou tal seleção, tendo dado conta dos motivos das opções tomadas sobre cada uma das provas produzidas, que conjugou entre si, bem como da sua relevância para considerar provado ou não provado determinado facto ou conjunto de factos (cfr. factos relativos a VVVVVVV, do ponto 9. da motivação da decisão de facto (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.).
Deste modo, tendo sido cumprido o dever de fundamentação, nenhum preceito constitucional foi violado.
Por outro lado, e no que concerne ao recorrente BB, o tribunal de 1.ª instância também elencou as razões pelas quais não suspendeu a execução da pena de prisão que lhe aplicou (cfr. ponto 3. de “IV – Da escolha e determinação da medida da pena” do acórdão recorrido – II.3.E.).
Lendo os mencionados recursos o que fica evidente é que o recorrente BB não concorda com a não suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada e os recorrentes FF e HH com a apreciação da prova feita pelo tribunal de 1.ª instância e, assim, que todos eles não concordam com a fundamentação do tribunal recorrido. Contudo, uma fundamentação em desacordo com a argumentação expendida pelos recorrentes também não conduz à nulidade em apreço (cfr. LOPES, José Mouraz, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo IV, Livraria Almedina, 2022, pág. 798). Acresce que, no caso do recorrente BB, a mera discordância com tal decisão não significa que o acórdão recorrido padeça do vício que lhe é assacado, sujeitando-o, nessa parte, ao risco de ser revogado ou alterado, uma vez que o recurso que aquele interpôs também versa sobre a não aplicação da referida pena de substituição (cfr. II.4.K.).
Assim, não se verifica a nulidade prevista nos arts. 97.º, n.ºs 1, al. a), e 2, 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, al. a), do C.P.P.
Improcedem, pois, nesta parte, os recursos interpostos pelo arguido BB (cfr. I.2.B.a.), pelo arguido FF (cfr. I.2.F.a.) e pelo arguido HH (cfr. I.2.H.a.).
O recorrente GG insurge-se contra a inclusão nos factos provados dos aí elencados sob os pontos 108. a 115. (cfr. II.3.B.), por genéricos, referentes a explicações psicológicas ou públicos, entendendo que “não devem ser chamados à factualidade” (cfr. I.2.G.a.).
Ora, independentemente de as realidades internas, do foro interno, da vida psíquica, sensorial ou emocional do recorrente GG, não deixarem de constituir matéria de facto, o certo é que dos factos dados como provados sob os pontos 121. a 162., 169. a 185., 197. a 229. – II.3.B.) se concretizam, nomeadamente no tempo, modo de atuação e sujeitos envolvidos, o que alguns daqueles factos, contra os quais o recorrente GG se insurge, se limitavam a pretender servir de introito.
Seja como for, sendo aqueles factos dados como provados sob os pontos 121. a 162., 169. a 185., 197. a 229., 258. e 265. a 274. (cfr. II.3.B.) os essenciais, relevantes e bastantes para a qualificação dos crimes e para a graduação da responsabilidade do recorrente GG, por conclusivos ou acessórios, deverão ser eliminados do elenco dos factos provados os que aí constam sob os pontos 108. a 115. (cfr. II.3.B.) que, em rigor, são irrelevantes para a condenação do recorrente.
Na verdade, de fora da obrigação de enumeração dos factos provados e não provados decorrente do art.º 374.º, n.º 2, do C.P.P. ficam as considerações meramente conclusivas ou conceitos de direito e todos aqueles factos que são inócuos, acessórios e/ou irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido, e bem assim aqueles que se mostram prejudicados com a solução dada a outros, por apenas os contrariarem, ou seja, representarem mera infirmação ou negação, de outros já constantes do elenco dos factos provados ou não provados, mesmo que alegados pela acusação e/ou pela defesa (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20-10-2011, processo n.º 36/06.8GAPSR.S128; acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 27-05-2020, processo n.º 825/18.0PBMAI.P129).
II.4.D.b. Da nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia (cfr. art.º 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P.):
O recorrente AA pugna que o acórdão recorrido está ferido de nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P., dado que não se pronunciou sobre a aplicabilidade ou não do perdão de penas previsto nos arts. 2.º e 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08 à pena de prisão que lhe foi aplicada pelo crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 1, do C.P., único crime pelo qual foi condenado (cfr. I.2.A.a.), apesar de tal ter requerido em sede de alegações orais (cfr. II.3.F.).
Por seu turno, o Ministério Público pugna que, uma vez que a pena aplicada não era suscetível de beneficiar do perdão de penas, face disposto no art.º 3.º, n.ºs 1, 2, al. d), e 3, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08, o tribunal recorrido não estava obrigado a fundamentar a respetiva não aplicação por juridicamente inútil (cfr. I.2.A.b.).
De facto, o acórdão recorrido não se debruçou expressamente sobre a questão da aplicação do perdão a que aludem os arts. 2.º, n.º 1, 3.º, n.ºs 1, 2, al. d), e 3, e 7.º, n.º 1, al. g), da Lei nº 38-A/2023, de 02-08, que estabeleceu o perdão de penas e amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude, à pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período, sujeita a regime de prova e à entrega, no prazo de 2 anos, a XX da quantia de EUR 500, que foi aplicada ao recorrente AA pela prática em 08-02-2016, de 1 crime de roubo, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 1, do C.P., não a equacionando sequer (cfr. II.3.F.).
No entanto, só será nulo o acórdão quando, na parte que agora importa, o tribunal deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar (cfr. arts. 97.º, n.º 1, al. a), n.º 2, e 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P.).
Deste modo, a omissão de pronúncia ocorrerá quando o tribunal não aprecie e decida de questões que devesse conhecer, quer tenham sido suscitadas pelos sujeitos processuais, quer sejam de conhecimento oficioso (cfr. LOPES, José Mouraz, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo IV, Almedina, 2022, págs. 800 e 801).
Contudo, cumpre salientar que a utilização do verbo “dever”, com o sentido de “estar obrigado a30, em vez do verbo “poder”, com o significado de “ter a possibilidade de31, não é anódina.
Assim, só se verifica a nulidade do acórdão prevista nos arts. 97.º, n.ºs 1, al. a), 2, e 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P., na vertente de omissão de pronúncia, quando o tribunal não tenha apreciado e decidido de questão que então devesse conhecer, ficando precludido o seu conhecimento em momento posterior, e não quando, embora a pudesse conhecer nesse momento, ainda a possa conhecer em momento posterior.
Ora, apesar de o perdão de penas a que aludem os arts. 2.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, da Lei nº 38-A/2023, de 02-08 se tratar de uma questão e ser até oficioso o seu conhecimento, o certo é que a sua apreciação tanto pode ser equacionada no acórdão condenatório como em momento posterior ao trânsito em julgado daquele, o que desde logo afasta a verificação da mencionada nulidade (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17-06-2025, processo n.º 1093/23.8PBSNT.L1-532; acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 11-12-2024, processo n.º 9/22.3PEPRT-M.P133).
Não estando afastada a possibilidade de o tribunal recorrido ainda se pronunciar sobre tal questão, permitindo ao recorrente AA o exercício do seu direito de defesa, nomeadamente o de recurso da decisão que, sobre o assunto, venha a ser proferida (cfr. art.º 32.º, n.º 1, da C.R.P.), não se vislumbra como se possa ter por violado qualquer um dos direitos que lhe assiste, não tendo sido infringido qualquer preceito legal ou constitucional, nomeadamente os por si referidos no recurso que interpôs.
Improcede, pois, neste segmento, o recurso interposto pelo arguido AA (cfr. I.2.A.a.).
II.4.E. Dos vícios a alude o art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P.:
As relações conhecem de facto e de direito (cfr. art.º 428.º do C.P.P.).
A decisão da matéria de facto pode ser sindicada em sede de recurso, desde logo, pela verificação dos vícios previstos no art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P. que, de resto, são de conhecimento oficioso, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19-10-1995, para fixação de jurisprudência, in Diário da República n.º 298, I Série A, págs. 8211 e segs.34).
Tais vícios prendem-se com a matéria de facto que, no caso de verificação de algum deles, é ostensivamente insuficiente, assente em premissas contraditórias ou fundada em erro de apreciação, o que impede uma correta solução de direito (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29-10-2015, processo n.º 230/10.7JAAVR.P1.S135; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08-10-2008, processo n.º 08P306836).
Contudo, tratam-se de vícios que, nos termos da lei de processo (cfr. art.º 410.º, n.º 2, do C.P.P.), têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.
Assim, neste caso, a apreciação da matéria de facto circunscreve-se ao que consta do texto da decisão recorrida, por si só considerada ou em conjugação com as regras da experiência comum, que assim servem para interpretar aquela, sem possibilidade de apelo a outros elementos estranhos àquela, mesmo que constem do processo (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14-05-2009, processo n.º 1182/06.3PAALM.S137; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12-06-2008, processo n.º 07P437538).
II.4.E.a. Da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (cfr. art.º 410.º, n.º, al. a), do C.P.P.):
O recorrente FF entende que o acórdão recorrido padece do vício de “insuficiência da matéria de facto dada como provada para a condenação” (cfr. I.2.F.a.).
A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, vício a que alude o art.º 410.º, n.º 2, al. a), do C.P.P., ocorrerá quando os factos dados como provados sejam insuficientes para fundamentar a decisão de direito, não tendo, assim, o tribunal investigado toda a matéria de facto com interesse para a decisão, tendo em conta o objeto do processo, apesar de o poder e dever fazer (cfr. TRIUNFANTE, Luís Lemos, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V, 2024, págs. 192 a 195; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05-12-2007, processo n.º 07P340639).
Contudo, o recorrente FF não especifica quais os factos que, em seu entender, eram necessários para a decisão condenatória e estão em falta. Acresce que do elenco dos factos provados constante da decisão recorrida e referentes ao mesmo (cfr. factos provados sob os pontos 67. a 90., 99. a 102. e 107. – II.3.B.), não se vislumbra que algum falte para a decisão condenatória proferida quanto a ele.
Acresce que, em rigor, é evidente que o referido recorrente não aceita a apreciação da prova levada a efeito pelo tribunal recorrido, que considera insuficiente, o que não se confunde com o aludido vício do art.º 410.º, n.º 2, al. a), do C.P.P. (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-10-2011, processo n.º 88/09.9PESNT.L1.S140), prendendo-se já com a impugnação da matéria de facto nos termos do art.º 412.º, n.º 3 do C.P.P. (cfr. II.4.F.)
Improcede, pois, neste segmento, o recurso interposto pelo arguido FF (cfr. I.2.F.a.).
II.4.E.b. Da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão (cfr. art.º 410.º, n.º 2, al. b), do C.P.P.):
A contradição insanável na fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão apenas ocorrerá quando exista uma incompatibilidade, insuscetível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados, entre os meios de prova invocados na fundamentação de facto ou entre a fundamentação e a decisão (cfr. SIMAS SANTOS, Manuel e LEAL-HENRIQUES, Manuel, in Recursos Penais, 9.ª edição, Rei dos Livros, 2020, pág. 78).
Assim, tal vício resulta da oposição entre factos provados entre si incompatíveis, entre a matéria de facto provada e a não provada, quando se dá como provado um determinado facto e da motivação da convicção resulta, face à valoração probatória e ao raciocínio dedutivo explanado, que seria oposta a decisão de facto correta ou quando a fundamentação de facto e de direito conduzem a uma determinada decisão final e no dispositivo da sentença ou acórdão consta decisão de sentido inverso (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, 14-09-2021, processo n.º 436/18.0T9LRS.L1-541).
Entende o recorrente CC verificar-se uma contradição no que se refere ao facto provado sob o ponto 7. (cfr. II.3.B.) e um facto considerado não provado42 quanto à identidade da pessoa que expulsou DDD da discoteca (cfr. I.2.C.a.).
Nada disto se passa no presente caso. Na verdade, como resulta evidente da matéria de facto provada sob o ponto 7, não foi possível apurar a identidade da pessoa que expulsou DDD da discoteca e, assim, coerentemente, foi dado como não provado que essa pessoa tivesse sido o recorrente CC (cfr. II.3.B.).
O recorrente FF entende verificar-se uma contradição insanável na fundamentação ou entre esta e a decisão a propósito dos factos provados (quanto ao recorrente) sob os pontos 67. a 107., 240. e 248. dos factos dados como provados, por um lado, e aos factos não provados (cfr. I.2.F.a.).
Para além de se referir a factos provados referentes a outros que não ele (cfr. factos provados sob os pontos 91. a 98. e 103. a 106. – II.3.B.), à ausência de antecedentes criminais da sua parte e às suas próprias condições pessoais (cfr. factos provados sob os pontos 240. e 248. – II.3.B.), o certo é não identifica com clareza qual, afinal, a matéria da contradição, isto é, aquilo que está em contradição, sendo que não se vislumbra do texto da decisão recorrida que esta, quanto ao referido recorrente, esteja assente em premissas contraditórias.
Por seu turno, o recorrente GG (cfr. I.2.G.a.), na motivação (corpo) do recurso que interpôs, sugere ocorrer uma contradição entre o facto dado como provado sob o ponto 133. e o facto dado como provado sob o ponto 139 (cfr. II.3.B.) que importa apreciar uma vez que, como resulta do já exposto (cfr. II.1. e II.4.E.), se trata de questão e conhecimento oficioso.
Lendo a totalidade dos factos dados como provados quanto ao episódio em causa (cfr. factos provados sob os pontos 131. a 140. – II.3.B.) não restam quaisquer dúvidas que apesar de a condenada LLLLL ser a efetiva condutora daqueles veículos em todas as 14 vezes mencionadas, os respetivos autos foram emitidos em nome do titular do documento de identificação do respetivo veículo em causa (cfr. facto provado sob o ponto 132. – II.3.B.). Assim, é natural que, tendo os respetivos processos contraordenacionais sido instaurados contra este (cfr. art.º 171.º, n.º 2, do Código da Estrada – C.E.), a conduta do recorrente GG e da condenada LLLLL tenha sido idónea a obstar à responsabilização daquele (cfr. art.º 171.º, n.º 3, do C.E.).
Sugere o mesmo recorrente também alguma contradição entre os factos dados como provados sob os pontos 159. e 162. (cfr. II.3.B.). No entanto, tais factos tratam, obviamente, da elaboração fraudulenta da declaração a indicar o falso condutor como tendo sido subscrita por outra pessoa, que o recorrente GG sabia não corresponder à verdade e a que estava e foi destinada, sendo, pois, complementares um do outro. Acresce que em nenhum dos factos deste episódio é dado como provado que tenha sido o arguido GG a enviar à A.N.S.R. a dita declaração (cfr. factos dados como provados sob os pontos 152. a 162. – II.3.B.).
Deste modo, como os referidos factos não se excluem mutuamente, nem são incompatíveis, inexiste qualquer contradição.
Improcedem, pois, neste segmento, os recursos interpostos pelo arguido CC (cfr. I.2.C.a.), pelo arguido GG (cfr. I.2.G.a.) e pelo arguido FF (cfr. I.2.F.a.).
II.4.F. Do erro de julgamento:
A decisão da matéria de facto pode também ser sindicada em sede de recurso pela designada impugnação ampla da matéria de facto a que se refere o art.º 412.º, n.ºs 3, 4 e 6, do C.P.P.
O erro de julgamento, não estando restringido ao texto da decisão recorrida, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova produzida em audiência de julgamento, ocorre quando o tribunal considere provado um determinado facto, sem que dele tivesse sido feita prova, pelo que deveria ter sido considerado não provado, ou quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado.
Contudo, o recurso da matéria de facto é um remédio jurídico para obviar a eventuais erros ou incorreções da decisão recorrida no processo de formação da convicção, erros claros de julgamento, incluindo eventuais violações de regras e princípios de direito probatório, rigorosamente delimitado pela lei de processo aos pontos de facto que o recorrente entende erradamente julgados (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23-11-2011, processo n.º 158/09.3GBAVV.G2.S143).
Efetivamente, no sistema processual penal nacional o recurso é configurado como remédio jurídico processual referido a vícios concretos da decisão recorrida e não, no que concerne a decisões finais, como uma repetição do julgamento da primeira instância ou segundo julgamento, como se não tivesse existido o primeiro (cfr. MORÃO, Helena, in Direito Processual dos Recursos, Almedina, 2024 pág. 213).
Por isso mesmo é que, quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) As provas que devem ser renovadas (cfr. art.º 412.º, n.º 3, do C.P.P.).
Sendo que, com relação às duas últimas especificações, quando as provas invocadas tenham sido gravadas, as mesmas devem ser feitas com referência ao consignado na ata, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens (das gravações) em que se funda a impugnação (cfr. art.º 412.º, n.º 4, do C.P.P.), pois são essas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo tribunal, sem prejuízo de outras relevantes (cfr. art.º 412.º, n.º 6, do C.P.P.). Sobre esta indicação que impende sobre o recorrente, o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão n.º 3/2012, de 08-03-2012, fixou jurisprudência no sentido de “visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, basta, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do C.P.P., a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas, na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações44.
Assim, é desde logo exigida a indicação dos factos individualizados que constam da decisão recorrida e que se consideram incorretamente julgados.
Por outro lado, é também exigida a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa da recorrida, com a explicitação da razão pela qual assim se entende. Na verdade, a utilização do verbo impor, com o sentido de “obrigar a”, não é anódina (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19-05-2010, processo n.º 696/05.7TAVCD.S145). A utilização do verbo impor (cfr. art.º 412.º, n.º 3, al. b), do C.P.P.), que aponta para a obrigação de impreterivelmente se aceitar algo, e não do verbo permitir, que admite a existência de várias hipóteses, legitima a conclusão de que não basta estar demonstrada a mera possibilidade de existir uma solução em termos de matéria de facto alternativa à fixada pelo tribunal, o que, aliás, é comum verificar-se, sendo necessário que o recorrente demonstre que a prova produzida no julgamento só poderia ter conduzido, em sede de matéria de facto provada e não provada, à solução por si (recorrente) defendida, e não àquela consignada pelo tribunal recorrido (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 01-07-2025, processo n.º 114/24.1GASXL.L1-546). Deste modo, deve ser estabelecida uma relação entre o conteúdo específico de cada meio de prova ou de obtenção de prova suscetível de impor decisão diversa com o facto individualizado considerado incorretamente julgado (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16-11-2021, processo n.º 1229/17.8PAALM.L1-5). “Esta exigência corresponde, de algum modo, àquela que é exigida ao julgador para fundamentar os factos provados e não provados, porque do mesmo modo que o julgador tem o dever de fundamentar as decisões, também o recorrente tem que fundamentar o recurso” (cfr. acórdão do tribunal da Relação de Coimbra, de 12-07-2023, processo n.º 982/20.6PBFIG.C147).
Por fim, é exigido ainda que o recorrente refira as concretas passagens/excertos das declarações/depoimentos que, no seu entender, obrigam à alteração da matéria de facto, transcrevendo-as (se na ata da audiência de julgamento não se faz referência ao início e termo de cada declaração ou depoimento gravados) ou mediante a indicação do segmento ou segmentos da gravação áudio que suportam o seu entendimento divergente, com indicação do início e termo desses segmentos (quando na ata da audiência de julgamento se faz essa referência – o que não obsta a que, também nesta eventualidade, o recorrente, querendo, proceda à transcrição dessas passagens) (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 28-05-2013, processo n.º 94/08.0GGODM.E148).
O recurso da matéria de facto assim formulado permite que os poderes de cognição do tribunal de recurso se estendam à matéria de facto e que, sendo o recurso, nessa parte, procedente, venha a ser modificada a decisão quanto a ela tomada na 1.ª instância (cfr. art.º 431.º, al. b), do C.P.P.).
Por seu turno, o não cumprimento do ónus imposto pelo art.º 412.º, n.º 3, do C.P.P. obsta a que este tribunal de recurso possa reapreciar a matéria de facto.
Cumpre esclarecer que, caso a deficiência se verificar quer na motivação (corpo) do recurso quer nas respetivas conclusões, não é sequer viável o aperfeiçoamento das conclusões do recurso interposto. Na verdade, nesse caso, trata-se de uma deficiência da estrutura da motivação, equivalente a uma falta de motivação, que coloca em crise a delimitação do âmbito do recurso. De facto, nesse caso, não se trata de uma omissão de levar as especificações constantes do texto da motivação às conclusões, o que justificaria o convite à correção (cfr. art.º 417.º, n.º 3, do C.P.P.), mas sim de uma deficiência resultante da omissão na motivação dessas especificações, tratando-se, pois, de um vício que é insanável. Na verdade, o texto da motivação constitui o limite à correção das respetivas conclusões. Ora, nessas circunstâncias, dirigir, quanto à referida omissão, um convite de aperfeiçoamento do recurso interposto equivaleria à concessão ilegítima de novo prazo para recorrer, o que não pode considerar-se compreendido no próprio direito ao recurso (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05-06-2008, processo n.º 08P188449; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 02-02-2006, processo n.º 05P440950; acórdão do Tribunal Constitucional n.º 259/2002, de 18-06-200251; acórdão do Tribunal Constitucional n.º 140/2004, de 10-03-200452).
O recorrente AA especifica os factos provados sob os pontos 9. a 17. como incorretamente julgados, pugnando que deveriam ser dados como não provados ou, pelo menos, deles expurgada a referência à sua intervenção, uma vez que o tribunal recorrido se baseou unicamente nos reconhecimentos pessoais presenciais efetuados por parte de EEE e DDD (cfr. I.2.A.a.).
Na verdade, segundo refere, resultaria do depoimento prestado por EEE que a mesma foi expulsa da discoteca pelo recorrente AA, não o conhecia, nunca o tinha visto e não sabia o seu nome que só soube mais tarde em conversas com amigos, não tendo assistido a qualquer subtração de qualquer objeto. Por seu turno, segundo também refere, resultaria do depoimento prestado por DDD que o mesmo não conhecia os autores dos factos de que deu conta, a cujo nome ou alcunha se referiu, sendo que nem por aquele nem por esta é conhecido o recorrente AA, não se recordando quem lhe teria tirado a carteira, sendo que aquela e o seu conteúdo lhe teria sido devolvido. Por fim, resultaria do depoimento da testemunha HHH que o mesmo não presenciou qualquer ato de violência ou qualquer subtração de qualquer quantia monetária do referido DDD, não tendo ocorrido qualquer acareação com aquelas outras testemunhas (cfr. I.2.A.a.).
Por seu turno, o Ministério Público, na resposta apresentada, pugna que não foi apresentado qualquer fundamento ou concreta prova que imponha decisão diversa daquela que foi proferida pelo tribunal recorrido em sede da matéria de facto dada como provada (cfr. I.2.A.b.).
Resulta da motivação da decisão de facto que o tribunal recorrido atendeu aos autos de reconhecimento pessoal pelos quais o recorrente AA foi presencialmente reconhecido, quer por DDD quer por EEE, como sendo uma das pessoas que interveio nos factos ocorridos em 08-02-2016 e que vitimaram aquele (cfr. ponto 2. da motivação da decisão de (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.).
Cumpre destacar que na prova por reconhecimento o facto probando consiste na identidade de uma pessoa percecionada no passado pela fonte de prova e cujo esquema de formação passa por um ato de confrontação visual para comparação de perceções contemporâneas com perceções passadas a fim de apurar se as mesmas têm o mesmo objeto e que obedece a um procedimento tipificado e regulado na lei de processo (cfr. art.º 147.º do C.P.P.).
Assim, trata-se de uma prova pré-constituída especialmente relevante já que cumprido o formalismo legal é transmissível às fases subsequentes do processo, tendo o Tribunal Constitucional já tido oportunidade de se pronunciar sobre a constitucionalidade da solução (cfr. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 532/2006, de 27-09-200653).
Tal prova é documentada em auto que, enquanto documento autêntico (cfr. arts. 99.º e 169.º, do C.P.P.), atesta que o reconhecimento que dele consta corresponde ao efetuado pela pessoa que procedeu àquele. Claro que a prova por reconhecimento está sujeita à livre apreciação da prova, nos termos do disposto no art.º 127.º, do C.P.P., e deve ser conjugada com a demais prova, dado que a mesma não prova, por si só, o crime (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28-01-2021, processo n.º 727/17.8PASNT.L1.S154).
Cumpre também salientar que DDD e EEE, as duas testemunhas que reconheceram presencialmente o recorrente AA, foram inquiridas em audiência de julgamento, à distância, com recurso a equipamento tecnológico que permitia a comunicação, por meio visual e sonoro, em tempo real, conforme resulta das respetivas atas (cfr. ref.ªs ... de 14-06-2024 e ... de 27-09-2024), não tendo sido, então, confrontados visualmente com o recorrente AA que, não obstante, se encontrava presente.
Em audiência de julgamento a testemunha EEE que foi perentória em dar conta de que DDD foi agredido por duas pessoas, entre as quais o recorrente AA, que até então não conhecia e a que se referiu pelo nome55, tendo dado conta de como, a partir das características físicas daquele, posteriormente e junto de colegas e amigos, apurou como se chamava56. Ora, não só esse procedimento de tentar descobrir o nome de um dos agressores do seu amigo é absolutamente normal, como não invalida que, a partir do que percecionou no dia …-2016 e, assim, antes de saber o nome de um dos agressores, tenha apreendido as características físicas de tal pessoa, o que lhe permitiu reconhecer como um dos autores dos factos de que deu conta o recorrente AA quando este foi colocado ao lado de outros indivíduos que apresentavam com ele as maiores semelhanças possíveis, não estando nem aquele nem estes identificados pelo respetivo nome.
Por outro lado, a testemunha EEE foi também perentória em referir que não se recordava de o seu amigo DDD se ter então queixado de lhe ter sido retirado alguma coisa57, o que é diferente deste não se ter queixado. Contudo, mesmo que DDD não se tivesse então queixado, por si só, tal não é idóneo a concluir que nada lhe havia sido retirado.
É certo também que a testemunha EEE deu conta de ter sido expulsa da discoteca em causa pelo recorrente AA. Contudo, não só a testemunha deu mostras de ter acatado tal decisão, como em nenhum momento do seu depoimento resultou que tal facto lhe retirou isenção dado que, por várias vezes, afirmou não se recordar de diversos aspetos que lhe foram perguntados.
Por seu turno, em audiência de julgamento, a testemunha DDD, que localizou os factos no espaço e no tempo59, afirmou que não conhecia as pessoas que o agrediram, embora se lembrasse delas60. Desta forma, e independentemente do nome ou alcunha que atribuiu a um deles, é evidente que o único fator fiável quanto à identificação daquele não é o nome ou a alcunha que a testemunha lhe atribuiu mas as suas características físicas e que a testemunha apreendeu de tal forma que lhe permitiu reconhecer o recorrente AA como um dos autores dos factos de que foi vítima quando o mesmo foi colocado ao lado de outras pessoas que apresentavam com ele as maiores semelhanças possíveis.
Por outro lado, e embora não tenha conseguido precisar qual das duas pessoas que o abordaram lhe retirou a carteira, foi perentório em referir que tal ocorreu quando estava a ser imobilizado, à força, por outra pessoa, bem como que do interior daquela foi retirada a quantia de EUR 10, só lhe tendo sido devolvida a carteira com os seus documentos e, assim, sem aquela quantia61.
Ora, de tais comportamentos objetivos ter-se-á que extrair não só que os mesmos foram cometidos em conjunto, com a consciência e vontade de colaboração na execução dos mesmos, como a eles presidiu uma ilegítima intenção de apropriação, de acordo com as regras da experiência e da normalidade do acontecer, tendo em conta os padrões racionais de comportamento, os critérios de normalidade social e a consciência por parte da comunidade em geral do carácter ilícito e censurável de semelhantes comportamentos (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 24-04-2024, processo n.º 229/22.0GCTND.C262¸ acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 04-03-2025, processo n.º 4/13.3TBSAT.C163; acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 19-12-2012, processo n.º 497/08.0GAMCN.P164).
Por fim o depoimento da testemunha HHH é insuscetível de infirmar o que resulta da prova por reconhecimento, conjugada com os depoimentos das testemunhas EEE e DDD. De facto, a testemunha HHH admitiu não se recordar da concreta situação em causa e assumiu ter sido abordado pelo recorrente AA, já na pendência do processo, sobre estes factos65. Ora, assim sendo, das próprias palavras da referida testemunha resulta evidente que o relato que fez, não se podendo basear no que se recordava da situação, teve por base a conversa que sobre o episódio posteriormente manteve com o recorrente AA quando este o abordou sobre o tema, o que lhe retira qualquer credibilidade. A confirmar isso mesmo, apesar de salientar que se tratou de uma situação pouco comum de um furto de uma garrafa66, confirmou que por causa disso a polícia não foi chamada ao local67, não soube explicar qual a garrafa em causa68 ou dar conta da identidade dos outros dois seguranças que, juntamente com recorrente AA, teriam acompanhado a pessoa em causa à porta da discoteca69, imputando a outras pessoas que não o recorrente AA o afastamento do DDD daquela porta sem nunca a todos identificar70. Por outro lado, apesar de ter referido não ter presenciado qualquer agressão71, convém não esquecer que a testemunha estava, a acreditar no que afirmou, a exercer funções de porteiro72, sendo que na respetiva porta, conforme chegou a referir, se chegaram a aglomerar 100 pessoas73. Ora, como é evidente, o exercício das suas funções necessariamente o impedia de atentar em tudo o se passava à sua volta, pelo que é evidente não podia garantir que aquelas agressões não tivessem ocorrido.
O recorrente AA acaba por se insurgir contra o facto de não ter sido efetuada uma acareação entre as referidas três testemunhas (cfr. art.º 146.º do C.P.P.).
De facto, o recurso pode ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, à inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada (cfr. art.º 410.º, n.º 3, do C.P.P.).
Por outro lado, a omissão de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade constitui uma nulidade dependente de arguição (cfr. art.º 120.º, n.º 1, al. d), do C.P.P.).
Ora, contrariamente ao que acontece quanto às nulidades do acórdão, as quais devem ser arguidas em recurso (cfr. art.º 379.º, n.º 2, do C.P.P.), a nulidade aqui em causa, porque respeitante à prova a produzir em audiência de julgamento, deveria ter sido arguida antes do encerramento da produção da prova (cfr. art.º 360.º, n.º 1, do C.P.P.), ou seja, antes das alegações orais, na medida em que se trata de nulidade cometida em ato ao qual o recorrente AA assistiu (cfr. art.º 120.º, n.º 3, al. a), do C.P.P.), tal como é reafirmado pela jurisprudência dos tribunais superiores (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19-05-2022, processo n.º 739/20.4JAFUN.L1-974; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 09-12-2020, processo n.º 200/19.0GCVRL.G175; acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 14-02-2010, processo n.º 368/07.8TASLV.E176).
Não o tendo feito, qualquer nulidade com tal fundamento, a existir, sempre se teria que considerar sanada, conforme resulta da lei processual penal (cfr. art.º 120.º, n.º 1, n.º 2, al. d), e n.º 3, al. a), do C.P.P.).
Ora, uma vez que o arguido, legitimamente e de acordo com a opção por si tomada, não exerceu faculdade que detinha, não se poderá considerar que tenha existido uma violação de qualquer direito seu, nomeadamente de defesa (cfr. art.º 32.º, n.º 1, da C.R.P.).
Contudo, não deixa de se assinalar que em nenhum momento da audiência de julgamento o recorrente AA requereu a efetivação de tal diligência de prova.
Seja como for, a existência de contradição entre depoimentos não determina, obrigatória e necessariamente, a realização de acareação (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 06-11-2024, processo n.º 157/23.2PCLRA.C177). Acresce que para a efetivação de tal meio de prova não basta existir uma contradição nos depoimentos das testemunhas passíveis de serem acareadas, sendo necessário, como requisito adicional, a utilidade da diligência para a descoberta da verdade. Assim, se para admitir este meio de prova é também necessário que se anteveja que se tratava de uma diligência pertinente para apurar a veracidade dos factos imputados, um dos casos em que não teria qualquer utilidade a produção de tal meio de prova é precisamente quando um dos depoimentos passível de ser acareado não merece qualquer credibilidade (cfr. Tiago Caiado, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo II, Almedina, 2019, pág. 318), como é, basicamente, o caso do depoimento prestado pela testemunha HHH.
Assim, tendo em conta a prova por reconhecimento, conjugada com a demais prova referida, outra não poderia ter sido a decisão do tribunal recorrido, sendo a prova indicada pelo recorrente AA inidónea para impor decisão diversa da recorrida no diz respeito à mencionada factualidade, pelo que não cumpre efetuar qualquer modificação à referida matéria de facto provada.
O recorrente AA não indica qualquer dimensão normativa que tenha sido, de facto, acolhida na decisão do tribunal recorrido que pudesse reputar-se desconforme à C.R.P., o que conduz a que esta instância não esteja vinculada a conhecer de uma qualquer inconstitucionalidade reportada à concreta decisão (e não às normas por esta aplicadas), o que necessariamente afasta a possibilidade de se concluir (ou não) por um juízo de inconstitucionalidade.
Seja como for, não tendo sigo seguida qualquer uma das interpretações referidas pelo recorrente AA, não foi infringido qualquer preceito legal, constitucional ou da C.E.D.H., nomeadamente os por si referidos no recurso que interpôs.
O recorrente BB especifica como tendo sido incorretamente julgados os factos provados sob os pontos 49. a 52. (cfr. I.2.B.a.), mas em nenhum momento esclarece se os mesmos deveriam ser dados como não provados na totalidade ou só em parte e, nesta última hipótese, a concreta modificação que entende que deveria ser introduzida.
Reconhecendo que a factualidade em causa foi considerada provada unicamente com base no depoimento de MMM, o referido recorrente entende que o mesmo padeceu de “incongruências, contradições e imprecisões” que “não podem, de forma alguma deixar de abalar sua credibilidade”, sendo que por ter sido inquirida através do sistema webex ficaram irremediavelmente prejudicados os princípios da oralidade e imediação.
O Ministério Público, na resposta que apresentou, pugna que o recorrente não apresentou qualquer fundamento ou concreta prova que imponha decisão diversa daquela que foi proferida pelo tribunal recorrido em sede da matéria de facto dada como provada (cfr. I.2.B.b.).
Resulta efetivamente da ata da sessão de 28-06-2024 da audiência de julgamento que a testemunha MMM foi inquirida à distância, através de equipamento tecnológico que permitia a comunicação, por meio visual e sonoro, em tempo real, vulgarmente conhecido por webex (cfr. ref.ª ... de 28-06-2024).
Cumpre recordar o seguinte:
No dia 19-04-2024 foi designado o dia 28-06-2024 para inquirição da testemunha MMM (cfr. ... de 19-04-2024).
No dia 27-06-2024, pela dita testemunha foi apresentado o seguinte requerimento (cfr. ref.ª... de 27-06-2024):
Meritíssimos Juizes do Juizo Central Criminal de Loures - Juiz 2
Eu, ZZ, portador do documento de identidade n.º ..., emitido pela Conservatória do Registo Civil de ..., válido até … de 2029, com o NIF ..., residente em Rua 17, …, ..., vem requerer junto de VV. Exas. na
qualidade de Ofendido e de Testemunha indicado pelo Ministério Público (anexo 1), para ser ouvido via Webex ...) ou em alternativa por WhatApp (...), pelas razões que se seguem:
1. Sou cuidador da minha mãe TTTTTTTT de 90 anos de idade, e a mesma tem fisioterapia no Espaço de …, sito em …, Município de ..., na sexta-feira …/2024, conforme anexo 2, não tendo ninguém que a possa acompanhar nesse dia sem ser eu; e
2. Confesso que estar na presença dos arguidos me causa medo, inquietação e desconforto pelas ameaças já proferidas, assim como pela tentativa de contacto telefónico que o Sr. BB tem vindo a realizar (anexos 3 e 4) e de suas tentativas de contacto através de pessoas mutuamente conhecidas.
Por tudo o suprarreferido, e tendo em conta que resido fora do Município de Loures, local onde se situa o Tribunal, solicito a VV. Exas. que autorizem ser ouvido, preferencialmente, via Webex, conforme o estabelecido no n.º 1, do artigo 318.º, do Código de Processo Penal. Ressalvo, ainda, que para realizar um depoimento sem que haja inibição da minha parte na presença dos arguidos, demando ser ouvido via Webex, ou como alternativa que o Tribunal ordene o afastamento dos arguidos da sala de audiência, durante a prestação de declarações, nos termos da alínea a), do n.º 1, do artigo 352.º, do mesmo diploma legal. (…)
Na expectativa e aguardando notícias, apresento os meus cordiais cumprimentos,
MMM
Em 27-06-2024 foi proferido o seguinte despacho (cfr. ref.ª ... de 27-06-2024):
Requerimento da testemunha MMM:
Atenta a proximidade da data designada para a inquirição da testemunha, em face dos motivos invocados que certamente não merecerão oposição dos sujeitos processuais, defiro a sua inquirição por webex.
Notifique e DN.
Na sessão de 28-06-2024 da audiência de julgamento, onde se encontravam presentes, entre outros, quer o recorrente BB quer o seu ilustre mandatário, após terem os presentes sido informados que a testemunha MMM se encontrava disponível para ser inquirida à distância, mediante o referido equipamento tecnológico, tal não mereceu qualquer oposição parte de nenhum dos sujeitos processuais, incluindo daqueles (cfr. ref.ª ... de 28-06-2024). Ora, de facto, a dita testemunha foi inquirida através daquele meio, tendo sido através dele que o ilustre mandatário do recorrente BB a contrainterrogou, conforme resulta da audição integral do depoimento então prestado por aquela.
Contudo, nunca foi arguido qualquer vício relativamente à inquirição da dita testemunha, sendo que só agora, no recurso que interpôs, o recorrente BB refere que os princípios da oralidade e imediação ficaram irremediavelmente prejudicados pelo meio de efetivação daquela.
Não residindo a testemunha no estrangeiro (cfr. art.º 318.º, n.º 8, do C.P.P.), mesmo que se considerasse terem sido preteridas as formalidades estabelecidas em alguns dos restantes n.ºs do art.º 318.º do C.P.P. e, assim, algum vício tivesse sido cometido, não estando previsto como uma nulidade, só poderia tratar-se de irregularidade que, não tendo sido oportunamente arguida, sempre se teria que considerar sanada (cfr. arts. 118.º, n.ºs 1 e 2, 119.º, 120.º e 123.º, n.º 1, do C.P.P.).
Na verdade, “qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio ato ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado” (cfr. art.º 123.º, n.º 1, do C.P.P.).
É certo que “pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afetar o valor do ato praticado” (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do C.P.P.). Contudo, tal pressupõe que a irregularidade ainda não esteja sanada, sob risco de, a admitir-se reparação de irregularidades já sanadas, se introduzir grave entorse no sistema qual seja a de, relativamente ao menos solene dos vícios formais se admitir, afinal, um regime de reparação não só mais permissivo do que o das nulidades relativas (cfr. art.º 120.º do C.P.P.), como equiparável, até, ao das nulidades insanáveis (cfr. art.º 119.º do C.P.P.) (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27-01-2022, processo n.º 303/12.1JACBR.P1-B.P1.S178).
Por outro lado, apesar de ser possível invocar uma irregularidade em sede de recurso, tal também pressupõe que a mesma ainda não esteja sanada (cfr. CORREIA, João Conde, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo I, Almedina, 2019, pág. 1299).
É também certo que a dado passo da inquirição da referida testemunha, o magistrado do Ministério Público manifestou estranheza pelo facto de a testemunha MMM nem sempre estar a olhar para o ecrã e perguntou-lhe diretamente se a mesma tinha algum papel à sua frente79. Cumpre salientar que, até então, a testemunha não se limitou a relatar, de forma corrida, o que o recorrente BB lhe anunciou, tendo descrito a abordagem deste paulatinamente, contextualizando-a, por vezes até se centrando em pormenores que extravasavam o objeto da prova80. Ora, tal é demonstrativo de uma espontaneidade pouco compatível com o relato que ocorreria caso se estivesse a socorrer de um guião escrito. Seja como for, não só a testemunha imediatamente negou que tivesse à sua frente qualquer papel81, como desviou a câmara do equipamento utilizado para o demonstrar, tendo o próprio magistrado do Ministério Público concluído que, afinal, nenhum existia ao referir “é isso que nós precisávamos de ver82. Acresce que, seguidamente, a testemunha continuou a relatar a abordagem do recorrente BB, descrevendo distintos pormenores da mesma, nomeadamente outras expressões que então lhe foram dirigidas pelo recorrente BB e às quais ainda não se havia referido, tudo de acordo com o mesmo estilo por si adotado anteriormente à interpelação do magistrado do Ministério Público 83.
Do depoimento da testemunha MMM resulta que o recorrente BB não se limitou a identificar a “…”, que recorria aos serviços da sociedade “...”, onde o referido recorrente exercia funções, como o único estabelecimento comercial que a testemunha MMM se deveria abster de angariar para a sociedade “…”, onde exercia funções. Na verdade, segundo foi expressamente referido pela testemunha, o recorrente BB também lhe transmitiu que idêntica postura deveria assumir em relação a qualquer outro estabelecimento comercial que fosse dele84, ou seja, qualquer outro que recorresse aos serviços daquela sociedade “...” e, assim, independentemente da sua localização geográfica.
Aliás, o facto de já então muitos outros estabelecimentos comerciais na zona de ..., que ficou evidente ser a zona de disputa entre as duas sociedades, que antes recorriam aos serviços da sociedade “...”, terem passado a recorrer aos serviços da sociedade “LB”85, confere até consistência à versão apresentada pela testemunha MMM. De facto, tal circunstância conferia ao recorrente BB uma motivação para a adoção do comportamento que lhe foi imputado pela testemunha MMM, que seria tanto maior quanto maior já fosse até então a perda de mercado por parte da sociedade “...” a favor da sociedade “…”, independentemente da localização geográfica dos estabelecimentos comerciais em causa, sobretudo quando se desconhece o que cada um deles representava em termos de faturação e a sequência cronológica de tal mudança.
Por outro lado, a testemunha MMM esclareceu que, embora responsável pela parte comercial, também fazia vigilância, tendo acabado por dar conta que, por força da atuação do recorrente BB, naquela principal zona de disputa entre as duas sociedades, deixou de efetuar vigilância noturna e celebrar contratos de segurança noturna durante uns tempos, pese embora, passados uns anos e, assim, pelo menos dois, já para outra empresa, tal tenha retomado, mas ainda assim em moldes diferentes86.
Visando o recorrente BB evitar que estabelecimentos comerciais de diversão noturna deixassem de recorrer à sociedade “...” e passassem a recorrer à sociedade “LB” em matéria de vigilância por ação da testemunha MMM, a explicação dada pela testemunha é coerente e lógica, demonstrando até isenção, assim se tendo dissipado a aparente contradição detetada pela juiz presidente87 durante a audiência de julgamento.
Por outro lado, tendo a testemunha MMM exercido as mesmas funções, mas para diferentes empresas, é absolutamente normal que não tenha conseguido precisar as datas em que trabalhou para cada uma delas88.
Acresce que embora nada impedisse o tribunal recorrido de se basear unicamente no depoimento da testemunha MMM (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 24-06-2008, processo n.º 437/08-189, acórdão do Tribunal de Coimbra, de 17-05-2017, processo n.º 430/15.3PAPNI.C190), não estando sujeito a uma “contabilidade de provas”, o certo é que conjugou o seu depoimento com outros meios de prova que conferiram credibilidade à sua versão, conforme resulta expressamente da motivação da decisão de facto (cfr. ponto 5. da motivação da decisão de facto (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.).
Assim, a prova indicada pelo recorrente BB é inidónea para impor decisão diversa da recorrida no que diz respeito à mencionada factualidade, pelo que não cumpre efetuar qualquer modificação à referida matéria de facto provada, improcedendo, neste segmento, o recurso que interpôs (cfr. I.2.B.a.).
Por seu turno, é evidente que o recorrente CC não concorda com a apreciação da prova levada a efeito pelo tribunal recorrido. Contudo, o certo é que, quer na motivação (corpo) quer nas conclusões do recurso que interpôs, não especificou os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados (cfr. I.2.C.a.).
Por outro lado, mesmo que se entendesse que o recorrente GG se insurge contra os factos dados como provados sob os pontos 126., 133., als. 4 e 5, 138., 149., 160., 175., 183., 202., 210., 219. e 227., por ele identificados, não pelo respetivo número sequencial com que estão elencados no acórdão recorrido, mas pelo respetivo conteúdo, o certo é que quer na motivação (corpo) quer nas conclusões do recurso que interpôs nada diz quanto à modificação que deveria ser introduzida em cada um deles, ou se todos deveriam sequer ser dados como não provados, sendo que, em todo o caso, não indica qualquer meio de prova que imponha decisão diversa (cfr. I.2.G.a.).
Desta forma, não tendo quer o recorrente CC quer o recorrente GG cumprido o ónus que sobre eles impendia, a consequência de tal deficiência estrutural irremediável não pode, pois, deixar de ser, nessa parte, a rejeição do respetivo recurso interposto (cfr. arts. 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, al. b), e 420.º, n.º 1, al. b), do C.P.P.), nada impedindo que a rejeição seja decidida, em primeira mão, em conferência, sendo que, pela rejeição do recurso, porque parcial, não é devida qualquer outra importância sancionatória.
É evidente que o recorrente FF discorda da apreciação da prova levada a cabo pelo tribunal recorrido, entendendo que “a correta apreciação do conjunto da prova levará necessariamente a uma diferente resposta aos factos em crise”, correspondendo aquela à sua visão pessoal sobre a valoração da prova e estes, que correspondem aos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os factos provados sob os pontos 67. a 107., 240. e 248. que, no seu entender, deveriam ser dados como não provados (cfr. I.2.F.a.).
Não pode deixar de se salientar que o referido recorrente chega a especificar como incorretamente julgados factos que não lhe dizem respeito (cfr. factos provados sob os pontos 91. a 98. e 103. a 106. – II.3.B.), que lhe são favoráveis (cfr. facto provado sob o ponto 240. – II.3.B.) e outros relativos às suas próprias condições pessoais (cfr. facto provado sob o ponto 248. – II.3.B.).
Analisando a motivação e as conclusões do recurso interposto constata-se que o recorrente FF não alega, no que concerne aos factos provados e que considera incorretamente julgados, que a descrição que o acórdão faz do conteúdo dos meios de prova em que se baseou, não corresponda ao que, na realidade, dos mesmos resulta.
Por outro lado, por referência a cada dos factos individualizados que considera incorretamente julgados não especifica o específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa da recorrida, com a explicitação da razão pela qual assim se entende.
É evidente que o recorrente pretende substituir a sua leitura da prova pela efetuada pelo tribunal recorrido, sem que aquela se imponha a esta, ao contrário do que a propósito é estabelecido na lei processual penal.
Acresce que embora na sua valoração pessoal da prova produzida o recorrente FF faça referência a segmentos de declarações e de depoimentos prestados que entende suportarem o seu entendimento divergente, quer na motivação (corpo) quer nas conclusões do recurso que interpôs, não só na larguíssima maioria dos casos não identifica a quem se refere, como também não indica, por referência à respetiva gravação áudio, o início e termo desses segmentos, deste modo incumprindo o ónus que sobre si impendia, de acordo com a lei de processo e conforme já exposto.
Ainda assim se dirá que a sessão 98692, correspondente a conversação intercetada, gravada e transcrita, porque referente ao dia 18-09-2016, por si só, desligada das demais, nomeadamente das mencionadas na motivação da decisão de facto (cfr. ponto 8. da motivação da decisão de facto (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.), obviamente não é suscetível de fazer concluir que o recorrente FF não entregou ao condenado BBBB um bastão extensível (cfr. facto provado sob o ponto 86. – cfr. II.3.B.), dado que esta entrega ocorreu em 08-10-2016 e, assim, em data muito posterior àquela conversação.
Por outro lado, também é evidente que pouco relevo tem o facto de a caixa de um bastão extensível guardada no interior de móveis que estavam adstritos ao recorrente FF na esquadra da P.S.P. onde prestava serviço ser referente a marca distinta do bastão extensível encontrado na residência do condenado BBBB (cfr. factos provados sob os pontos 90. e 91. – II.3.B.). Na verdade, não foi dada como provada a marca do bastão extensível entregue pelo recorrente FF ao condenado BBBB (cfr. facto provado sob o ponto 86. – II.3.B.), sendo que, em coerência, na motivação da decisão de facto o tribunal recorrido exarou “(…) FF entregou um bastão a BBBB que não se sabe se foi o que lhe viria a ser apreendido (…)” (cfr. ponto 8. da motivação da decisão de facto (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.).
Finalmente, no que se refere à conduta do recorrente FF na Festa dos ... (cfr. factos provados sob os pontos 67. a 70. – II.3.B.) da motivação da decisão de facto resulta claro que não foi a fotografia do recorrente FF no evento (cfr. fls. 2351), que permitiu ao tribunal recorrido concluir a atividade que o mesmo aí levou a cabo e em que dias, mas sim as conversações e comunicações intercetadas, gravadas e transcritas e aí identificadas, interpretadas e conjugadas entre si (cfr. ponto 7. da motivação da decisão de facto (C.) do acórdão recorrido – II.3.C.).
Ou seja, as parcas provas que indica não são idóneas a impor decisão diversa da alcançada pelo tribunal recorrido, razão pela qual não cumpre a esta instância introduzir qualquer alteração na referida matéria de facto provada.
Cumpre ainda salientar que, “salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente” (cfr. art.º 127.º do C.P.P.).
Fora dos casos em que se está em presença de limitações probatórias legalmente impostas (cfr. arts. 126.º, 129.º, 130.º, 163.º, 169.º, do C.P.P.), possibilita-se, assim, ao julgador um âmbito de liberdade na apreciação de cada uma das provas atendíveis que suportam a decisão, norteado pelo princípio da descoberta da verdade material, mas tendo que ser guiado pelas regras da ciência, da lógica e da argumentação que permita objetivar a apreciação feita.
Lido o acórdão recorrido mostra-se nela suficientemente objetivado e motivado o percurso adotado para a formação da convicção alcançada pelo tribunal recorrido (cfr. II.3.C.).
Na verdade, no âmbito da sua decisão sobre a matéria de facto, o tribunal recorrido expôs de forma criteriosa e completa o processo de formação da sua convicção, o que se traduziu não apenas na indicação dos meios de prova utilizados, como na enunciação das razões de ciência, da lógica e da experiência, reveladas ou extraídas da conjugação das provas produzidas, permitindo que um qualquer homem médio estranho ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas, compreenda o percurso de formação da convicção do tribunal recorrido quanto à verificação ou não dos vários factos objeto do processo, mesmo que com ele não concorde.
Assim, ao contrário do referido pelo recorrente AA (cfr. I.2.A.a.), o acórdão recorrido não violou o princípio da livre apreciação da prova.
Por outro lado, o princípio do in dubio pro reo, manifestação do princípio da presunção de inocência (cfr. art.º 32.º, n.º 2, da C.R.P.), constitui um limite normativo do princípio da livre apreciação da prova na medida em que impõe orientação vinculativa para os casos de dúvida razoável sobre os factos. Na verdade, nesses casos, impõe-se decisão a favor do arguido (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 03-06-2015, processo n.º 12/14.7GBSRT.C191).
Contudo, a dúvida em causa não é aquela que o respetivo recorrente entende que deveria ter permanecido no espírito do julgador após a produção da prova, mas antes e apenas a dúvida que este não logrou ultrapassar (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10-12-2014, processo n.º 155/13.4PBLMG.C192).
Exigindo o referido princípio que o julgador se pronuncie de forma favorável ao arguido quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa, a sua violação exige que o mesmo tenha ficado na dúvida razoável sobre factos relevantes e, nesse estado, tenha decidido contra o arguido.
Mas, se assim é, a deteção da violação do referido princípio passa pela sua notoriedade, face aos termos da decisão, isto é, deve resultar inequivocamente do texto da decisão que o julgador, tendo ficado na dúvida sobre a verificação de determinado facto desfavorável ao arguido, o considerou provado ou, inversamente, tendo ficado na dúvida sobre a verificação de determinado facto favorável ao arguido, o considerou não provado.
Ora, analisada a matéria de facto julgada provada e não provada (cfr. II.3.B.), bem como a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto (cfr. II.3.C.), não se deteta qualquer estado de dúvida, antes dela resultando uma convicção segura, sendo que também não se vislumbra que, na concreta situação dos autos, o tribunal recorrido devesse ter tido qualquer dúvida, pelo que não havia que lançar mão do princípio in dubio pro reo.
Acresce que o facto de se desconhecer a identidade da pessoa que expulsou DDD da discoteca, não conduz necessariamente a um estado de dúvida sobre a identidade de quem, no seu exterior, agrediu DDD para se apropriar de quantia de este era detentor.
Assim, ao contrário do que é propugnado pelos recorrentes AA (cfr. I.2.A.a.) e CC (cfr. I.2.C.a.) o acórdão recorrido não desrespeitou o princípio do in dubio pro reo.
Improcedem, pois, nesta parte, os recursos interpostos pelos arguidos AA (cfr. I.2.A.a.), CC (cfr. I.2.C.a.), FF (cfr. I.2.F.a.) e GG (cfr. I.2.G.a.).
II.4.G. Do enquadramento jurídico-penal dos factos apurados:
Apesar de o recorrente FF, nas conclusões do recurso que interpôs, se referir à inexistência dos elementos objetivos e subjetivos dos crimes pelos quais foi condenado, entende que tal ocorre “em resultado da prova produzida em audiência de julgamento” e, assim, baseia-se no pressuposto da procedência da impugnação da matéria de facto (cfr. I.2.F.a.), pretensão que não obteve provimento (cfr. II.4.F.).
II.4.G.a. Do crime de coação agravado, p. e p. pelos arts. 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do C.P. cometido pelo recorrente BB: tentado ou consumado:
O recorrente BB pugna que apenas teria incorrido, na prática, em autoria imediata e sob a forma tentada, de 1 crime de coação agravado, p. e p. pelos arts. 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do C.P., dado que MMM, sujeito passivo da atuação daquele, “não se iniciou de atuar, mesmo após a ameaça, apenas tendo optado por uma ação distinta da implementada até ao momento” (cfr. I.2.B.a.).
Em resposta, o Ministério Público pugnou que tendo em conta que se concretizou o desiderato pretendido pelo recorrente BB, o crime por ele cometido ter-se-ia consumado (cfr. I.2.B.b).
A referida posição do recorrente BB pressupunha uma modificação da matéria de facto, nomeadamente quanto aos factos provados sob os pontos 50. e 51. que, como resulta do já exposto, não foi efetuada por esta instância (cfr. II.4.F.).
Seja como for, sendo o objeto da coação uma omissão (cfr. factos provados sob os pontos 49. e 50. – II.3.B.), não obstante MMM possuir então capacidade de ação, o certo é que, na sequência do anúncio de um mal futuro sobre a sua integridade física e sobre a sua vida que lhe foi dirigido pelo recorrente BB, absteve-se de agir, exatamente conforme pretendido por aquele (cfr. factos provados sob os pontos 51. a 53. – II.3.B.). Desta forma, é inequívoco que o crime de coação agravado, p. e p. pelos arts. 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do C.P., cometido se consumou, sendo que, quanto à razão para a agravação, embora referente ao crime de ameaça, é perfeitamente transponível para o crime de coação, o entendimento do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/2013, de 20-02-2013, para fixação de jurisprudência, in Diário da República n.º 56, 1.ª série, de 20-03-201393.
Improcede, pois, neste segmento, o recurso interposto pelo arguido BB (cfr. I.2.B.a.).
II.4.G.b. Dos crimes de falsificação de documento imputados ao recorrente GG:
No recurso que interpôs o recorrente GG parece defender que não teria cometido qualquer crime de falsificação de documento uma vez que a indicação de um terceiro como autor de um ilícito contraordenacional, praticado no exercício da condução e cujo real condutor o agente de autoridade não conseguiu identificar, não faz prova de facto juridicamente relevante, apenas suspendendo, nem sequer ilidindo, a presunção de que o mesmo é da responsabilidade do titular do documento de identificação do veículo em causa, e levando um processo contraordenacional a correr contra aquele terceiro (cfr. I.2.G.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que foi feito constar nas mencionadas declarações factos juridicamente relevantes, com o efeito jurídico imediato de suspender o respetivo processo contraordenacional instaurado contra diferente pessoa, pelo que se verifica tal elemento típico do crime de falsificação de documento (cfr. I.2.G.b.).
Resulta da lei que a responsabilidade pelas contraordenações respeitantes ao exercício da condução de um veículo recaí, em primeira linha, sobre o respetivo condutor e, quando não for possível identificar quem era o condutor, sobre o titular do documento de identificação do veículo (cfr. art.º 135.º, n.º 3, als. a) e b), do C.E.).
Por isso mesmo, tratando-se de contraordenação praticada no exercício da condução e o agente de autoridade não puder identificar o autor da infração, deve ser levantado o auto de contraordenação ao titular do documento de identificação do veículo, correndo contra ele o correspondente processo (cfr. art.º 171.º, n.º 2, do C.E.). Acresce que, se no prazo concedido para a defesa, o titular do documento de identificação do veículo identificar, indicando:
a) Nome completo ou, quando se trate de pessoa coletiva, denominação social;
b) Domicílio fiscal;
c) Número do documento legal de identificação pessoal, data e respetivo serviço emissor e número de identificação fiscal;
d) Número do título de condução e respetivo serviço emissor;
identificar pessoa distinta como autora da contraordenação, o processo é suspenso, sendo instaurado novo processo contra a pessoa identificada como infratora (cfr. art.º 171.º, n.º 3, do C.E.), sendo o primeiro processo arquivado quando se comprove que outra pessoa praticou a contraordenação ou houve utilização abusiva do veículo (cfr. art.º 171.º, n.º 4, do C.E.).
Ora, um dos elementos objetivos do crime de falsificação de documento é “fizer constar falsamente de documento ou de qualquer dos seus componentes facto juridicamente relevante” (cfr. art.º 256.º, n.º 1, al. d), do C.P.).
Deste modo, não basta que se trate de uma declaração destinada a provar um facto falso, tem que ter relevância jurídica e, assim, por si ou ligado a outros, ser apto a constituir, modificar ou extinguir uma relação jurídica (cfr. MONIZ, Helena, in Comentário Conimbricense ao Código Penal, Tomo II, Coimbra Editora, 1999, § 11, págs. 666 e 667 e. § 26, pág. 683).
No presente caso, da matéria de facto provada sob os pontos 121. a 162., 169. a 185. e 197. a 229. – II.3.B.) resulta que as ditas declarações representam um pensamento humano, apto e determinado a constituir um meio de prova, permitindo a identificação do seu suposto emitente (cfr. art.º 255.º, al. a), do C.P.), destinando-se a provar que o titular do documento de identificação do respetivo veículo em causa identificou junto da A.N.S.R., autoridade administrativa competente para o processamento das contraordenações rodoviárias a cujo Presidente, salvo delegação, compete aplicar as coimas e sanções acessórias (cfr. art.º 169.º, n.º 1, als. a) e b), do C.E.), uma outra pessoa como sendo o condutor responsável pela contraordenação respeitante ao exercício da condução daquele, o que tem como efeito imediato a suspensão do processo contraordenacional instaurado contra aquele e a instauração de novo processo contra a pessoa identificada como infratora (cfr. arts. 135.º, n.º 3, als. a) e b), e 171.º, n.ºs 2 a 4, do C.E.), pelo que se verifica o referido elemento típico do crime em causa (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31-10-2024, processo n.º 18/18.7GTCBR.C1.S194).
O recorrente entende que relativamente a 18 situações, dado que 14 delas ocorreram a pedido de 1 pessoa, 2 delas a pedido de 1 outra e as restantes 2 a pedido de 1 terceira pessoa, por cada situação referente a cada 1 dessas 3 pessoas terem sido contemporâneas entre si, consubstanciariam, por isso mesmo, a prática de 3 crimes continuados (cfr. I.2.G.a.), pretensão que é rejeitada pelo Ministério Público dado que, segundo entende, tal não consubstancia qualquer circunstância exterior alheia ao agente que permita diminuir a sua culpa, como exigido pelo art.º 30.º, n.º 2, do C.P. (cfr. I.2.G.b.).
Ora, de facto, para o crime continuado (cfr. art.º 30.º, n.º 2, do C.P.), entre outros pressupostos, a realização plúrima terá que ser executada dentro do quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminuía sensivelmente a culpa do agente (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal – Parte Geral, Tomo I, 2.ª edição, 2.ª reimpressão, Coimbra Editora, 2012, pág. 1031).
Não se desconhece o entendimento segundo o qual uma situação exterior típica que diminuiria consideravelmente a culpa do agente reside na circunstância de se ter criado, através da primeira atividade criminosa envolvendo a mesma pessoa, uma certa relação ou um acordo entre os sujeitos que prepare as coisas para a efetiva repetição da atividade criminosa (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal – Parte Geral, Tomo I, 2.ª edição, 2.ª reimpressão, Coimbra Editora, 2012, pág. 1032; CORREIA, Eduardo, in Direito Criminal, Volume II, Almedina, 1993, pág. 210).
Contudo, da matéria de facto provada (cfr. factos provados sob os pontos 131. a 151. e 213. a 221. – II.3.B.) não resulta sequer claro que, relativamente a cada uma das 3 pessoas em causa, o recorrente GG tenha atuado no mesmo momento temporal ou em diferentes ocasiões, sendo que, em todo caso, não foi dado como provado qualquer facto demonstrativo do estabelecimento de semelhante relação ou acordo com qualquer uma dessas pessoas após ter sido levada a cabo, relativamente também a cada uma delas, a primeira atividade criminosa por parte do recorrente GG e no que concerne a situações semelhantes futuras.
Deste modo, não resulta da matéria de facto provada que, no caso dessas 3 pessoas, o recorrente GG tenha atuado no âmbito de uma qualquer situação a ele exterior que, de fora e de maneira considerável, tivesse facilitado a repetição da atividade criminosa, tornado cada vez menos exigível que ele se comportasse de maneira diferente, pelo que, em cada um dos correspondentes episódios, não poderá estar em causa qualquer crime continuado (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31-10-2024, processo n.º 18/18.7GTCBR.C1.S195).
Improcede, pois, neste segmento, o recurso interposto pelo arguido GG (cfr. I.2.G.a.).
II.4.H. Da escolha das penas no que se refere aos crimes de falsificação de documento cometidos pelo recorrente GG e ao crime de detenção de arma proibida cometido pelo recorrente FF:
Entende o recorrente GG que, por cada um dos crimes de falsificação de documento que cometeu, deveria ter sido aplicada uma pena de multa, atenta a ausência de antecedentes criminais e a circunstância de, sobre os factos, terem passado quase uma dezena de anos (cfr. I.2.G.a.).
Por seu turno, o recorrente FF entende que pelo crime de detenção de arma proibida que cometeu deveria ter sido aplicada uma pena de multa dado que ter-se-ia provado a origem das munições em causa, decorreram 8 anos sobre a data dos factos sem que tenha cometido outros crimes, foi aplicada pena de multa a outros arguidos pela prática do mesmo tipo criminal quando estavam em causa em armas de fogo (municiadas) e em face das “circunstâncias que rodearam a alegada prática do crime” e “a personalidade do agente” (cfr. I.2.F.a.).
No entanto, apesar de cada um dos 24 crimes de falsificação de documentos, ps. e ps. pelo art.º 256.º, n.º 1, al. d), do C.P., que o recorrente GG ... cometeu entre … de 2015 e … de 2017, ser punido com uma pena de prisão ou, em alternativa, com uma pena de multa, e aquele não possuir antecedentes criminais, a opção por aquela (pena de prisão) impõe-se.
Do mesmo modo, apesar de o crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. d), do R.J.A.M., na redação vigente à data dos factos, decorrente da Lei n.º 50/2013, de 24-07, que o recorrente FF cometeu em …-2017, ser punido com uma pena de prisão ou, em alternativa, com uma pena de multa, e aquele não possuir antecedentes criminais, a opção por aquela (pena de prisão) também se impõe. Acresce que tal opção pela pena de prisão continua a impor-se à luz da lei atualmente vigente, decorrente das alterações introduzidas pela Lei n.º 50/2019, de 24-07, na parte que agora interessa, no art.º 86.º, n.º 1, als. d) e e), do R.J.A.M., e quer a conduta do recorrente seja atualmente subsumida à primeira alínea ou à segunda96.
É certo que no sistema jurídico-penal português as reações criminais não privativas da liberdade assumem preferência sobre as penas detentivas, mas tal preferência só será de operar desde que as primeiras satisfaçam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, isto é, a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente de um crime na sociedade (cfr. arts. 40.º e 70.º, do C.P.).
Assim, a preferência pelas penas não privativas da liberdade, quando previstas em alternativa à de prisão, constituindo uma inegável aquisição civilizacional e clara opção de política criminal do nosso ordenamento jurídico, em vista dos reconhecidos malefícios das penas curtas de prisão, não se confunde com a sua obrigatoriedade ou automaticidade aplicativa.
Ora, serão exclusivamente finalidades preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, que justificam a preferência por uma pena alternativa e a sua efetiva aplicação, sendo considerações atinentes à culpa estranhas a este procedimento de escolha da pena.
Prevalência decidida não pode deixar de ser atribuída a considerações de prevenção especial de socialização, por serem sobretudo elas que justificam, na perspetiva político-criminal, todo o movimento de luta contra a pena de prisão. Deste modo, deve ser negada a aplicação de uma pena alternativa à pena de prisão quando a execução desta se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquela.
Contudo, mesmo que imposta ou aconselhada à luz de exigências de socialização, a pena alternativa não detentiva não será fixada se a aplicação de uma pena de prisão se mostrar indispensável para a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafática das expectativas comunitárias (cfr. ANTUNES, Maria João, in Penas e Medidas de Segurança, Almedina, 3.ª edição, 2024, págs. 94 e 95).
No presente caso, afigura-se serem elevadas as exigências de prevenção geral que se fazem sentir, demandando a aplicação, a título principal, de uma pena de prisão.
Na verdade, quanto ao recorrente GG, a criminalidade em causa contende diretamente com o processamento das infrações rodoviárias e a sua responsabilização, sendo que aquele, agente dos crimes em causa, era e é um militar da Guarda Nacional República (G.N.R.), frequentou curso específico de trânsito e desempenhava funções na Brigada de Trânsito (cfr. factos provados sob os pontos 258. e 274. – II.3.B.). Ora, enquanto tal, competia-lhe precisamente velar pelo cumprimento das leis e regulamentos relativos à viação terrestre e aos transportes rodoviários e promover e garantir a segurança rodoviária, designadamente, através da fiscalização, do ordenamento e da disciplina do trânsito (cfr. art.º 3.º, n.º 1, al. f), da Lei Orgânica da G.N.R.) e, assim, garantir que fosse responsabilizado pelas várias infrações rodoviárias relativas ao exercício da condução o seu efetivo condutor.
Por outro lado, e quanto ao recorrente FF, a criminalidade em causa contende diretamente com o controlo de armas e munições, sendo que aquele, agente do crime em causa, era e é agente da Polícia de Segurança Pública (P.S.P.) (cfr. facto provado sob o ponto 248. – II.3.B.), sendo atribuição desta licenciar, controlar e fiscalizar o fabrico, armazenamento, comercialização, uso e transporte de armas, munições e substâncias explosivas e equiparadas que não pertençam ou se destinem às Forças Armadas e demais forças e serviços de segurança (cfr. art.º 3.º, n.º 3, al. a), da Lei Orgânica da P.S.P.), competindo-lhe a organização e manutenção do cadastro de armas e fiscalização das armas classificadas no artigo 3.º do R.J.A.M. e suas munições (cfr. art.º 106.º, n.º 1, do R.J.A.M.).
Não consta da matéria de facto provada a proveniência das munições detidas pelo recorrente FF que, apesar de ter imputado diversos vícios à decisão recorrida, não lhe imputou a falta de tal facto no elenco dos factos provados (cfr. factos provados sob os pontos 89., 90., 101., 102. e 107. – II.3.B.).
O recorrente FF não esclarece a que se refere quando menciona “as circunstâncias que rodearam a alegada prática do crime de detenção de arma proibida”. Contudo, dos factos provados resulta que o mesmo detinha 78 munições de 3 calibres distintos, e embora a maioria delas se encontrasse na sua residência, outra encontrava-se no interior de móveis que lhe estavam adstritos na esquadra da P.S.P. onde exercia funções, o que dificilmente é idóneo a atenuar aquelas elevadas exigências de prevenção geral que no caso se fazem sentir (cfr. facto provado sob os pontos 89., 90., 102. e 107. – II.3.B.).
É certo que, da mesma forma, o referido recorrente não esclarece que facetas da sua personalidade pretendia destacar, sendo certo que a “excessiva valorização da sua autoimagem” e “auto-centração” (cfr. facto provado sob o ponto 248. – II.3.B.), não são propriamente características valiosas ou que diminuam as exigências preventivas.
Por fim, não fazendo parte do objeto do presente recurso a escolha das penas aplicadas aos condenados AAA e BBB, dado que nem o Ministério Público nem estes interpuseram recurso do acórdão proferido em 1.ª instância, é evidente que não pode esta instância de recurso tomar por certa ou por referência a opção efetuada quanto àqueles para aquilatar da correção da escolha da pena quanto ao referido recorrente FF. Na verdade, a operação de escolha da pena é levada a cabo tendo em conta as circunstâncias fácticas referentes a cada arguido na medida em que relevem para as exigências de prevenção e que, como é óbvio, podem diferir entre eles.
Seja como for, a atividade criminosa levada a cabo pelos referidos recorrentes gera na comunidade um forte sentimento de reprovação demandando uma solene punição do agente a fim de ser recuperada a confiança na vigência da norma violada e que não esmoreceu com o tempo decorrido.
Ora, em face de tais elevadas exigências de prevenção geral, afigura-se que só a opção por uma pena privativa de liberdade, em detrimento da pena de multa estabelecida em alternativa, permite satisfazer o sentimento jurídico da comunidade quanto à reprovação dos crimes cometidos.
Deste modo, não merece qualquer reparo a escolha efetuada pelo tribunal recorrido pela pena de prisão, em alternativa à pena de multa, no que se refere aos 24 crimes de falsificação de documento cometidos pelo recorrente GG e também relativamente ao crime de detenção de arma proibida cometido pelo recorrente FF.
Improcedem, pois, também nesta parte, os recursos interpostos pelo arguido GG (cfr. I.2.G.a.) e pelo arguido FF (cfr. I.2.F.a.).
II.4.I. Da dosimetria das penas:
Entende o recorrente AA que a pena aplicada é excessiva e que deveria ser reduzida a um ano, ou muito próximo de tal medida concreta, tendo em conta que são diminutas as necessidades de prevenção especial uma vez que é primário, está inserido social, familiar e profissionalmente, não tendo cometido qualquer outro crime, não obstante o período de tempo decorrido (cfr. I.2.A.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que a pena de prisão fixada não é desproporcional nem desadequada (cfr. I.2.A.b.).
Também o recorrente BB entende que a pena aplicada é exagerada e desproporcional “face à gravidade dos factos que cometeu e acima de tudo tendo em conta, praticamente nulas ou inexistentes as consequências a que deu aso” e, na sequência da modificação da matéria de facto que defendeu e, assim, na alteração da qualificação jurídica do crime cometido de consumado para tentado que dela decorria, pugna por uma pena de prisão que não ultrapassasse 1 ano e 6 meses (cfr. I.2.B.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que não se verificar qualquer desproporção e desadequação da pena aplicada (cfr. I.2.B.b.).
Também o recorrente EE pugna que a pena que lhe foi aplicada é “desproporcional e desadequada perante as necessidades de Prevenção Geral, Prevenção Especial e de Justiça que o caso de per si reclama”, pugnando por uma mais benévola (cfr. I.2.E.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que deve ser mantido o acórdão recorrido nos seus precisos termos (cfr. I.2.E.b.).
O recorrente GG entende que deveria ser aplicada uma pena de 3 meses de prisão por cada crime de falsificação de documento, e uma pena única de 1 ano e 3 meses de prisão, dado que não possui antecedentes criminais, passaram largos anos sobre os factos sem que tenha voltado a cometer semelhantes atos, é um militar da G.N.R. com anos de experiência e muitos louvores, admitiu parcialmente os factos em 1.ª interrogatório judicial, entendendo que o seu silêncio em audiência de julgamento foi valorado negativamente (cfr. I.2.G.a.).
Em resposta, o Ministério Público rejeita qualquer desproporção e desadequação da medida das penas parcelares e única (cfr. I.2.G.b.).
Por fim, também o recorrente HH entende ser a pena aplicada é injusta, tendo em conta a distância temporal a que remontam os factos, considerando adequada e proporcional, a pena de 20 dias de multa à taxa diária de EUR 5 (cfr. I.2.H.a.), pretensão que é rejeitada pelo Ministério Público na resposta apresentada (cfr. I.2.H.b.).
Cumpre salientar que o tribunal de recurso apenas deverá intervir alterando a medida das penas em casos de manifesta desproporcionalidade na sua fixação ou quando os critérios de determinação da pena concreta imponham a sua correção, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção em face das circunstâncias do caso (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 197; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-12-2024, processo n.º 2103/22.1T9LSB.S197; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31-10-2024, processo n.º 2390/18.0T9AVR.P1-S198; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08-11-2023, processo n.º 808/21.3PCOER.L1.S199; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-05-2022, processo n.º 1537/20.0GLSNT.L1.S1100; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-04-2022, processo n.º 192/19.5JAPDL.S1101).
Incorrendo o recorrente AA numa pena de 1 a 8 anos de prisão (cfr. art.º 210.º, n.º 1, do C.P.), o tribunal recorrido condenou-o numa pena de 2 anos de prisão (cfr. ponto 1. de IV- Da escolha e determinação da medida da pena – II.3.E.).
Não tendo o recorrente BB obtido provimento na modificação da matéria de facto (cfr. II.4.F.) e na alteração da qualificação jurídica (cfr. II.4.G.a.), incorrendo numa pena de 1 a 5 anos de prisão (cfr. arts. 154.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, al. a), do C.P.), o tribunal recorrido condenou-o numa pena de 2 anos e 6 meses de prisão (cfr. ponto 3. de IV- Da escolha e determinação da medida da pena – II.3.E.).
Não tendo o recorrente GG obtido provimento na modificação da matéria de facto (cfr. II.4.F.) e na alteração da qualificação jurídica (cfr. II.4.G.b.), incorrendo, por cada um dos 24 crimes que cometeu, numa pena de prisão de 1 mês até 3 anos (cfr. arts. 41.º, n.º 1, e 256.º, n.º 1, do C.P.), o tribunal recorrido, por 18 deles, condenou-o numa pena de 6 meses para cada um deles e, por cada um dos restantes 6, numa pena de 10 meses de prisão (cfr. ponto 9. de IV- Da escolha e determinação da medida da pena – II.3.E.).
Por fim, no que refere ao recorrente HH, não vindo questionada a opção pela pena de multa, incorrendo pelo crime de falsificação de documento numa pena de multa de 10 dias a 360 (cfr. arts. 47.º, n.º 1, e 256.º, n.º 1, do C.P.), o tribunal recorrido condenou-o numa pena de 120 dias de multa (cfr. ponto 11. de IV- Da escolha e determinação da medida da pena – II.3.E.).
O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena (cfr. art.º 72.º, n.º 1, do C.P.). Para esse efeito, entre outras, deve ser considerada pelo tribunal a circunstância de ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta (cfr. art.º 72.º, n.º 2, al. d), do C.P.).
Desta forma, resulta com suficiente clareza da lei penal que mesmo verificando-se uma das circunstâncias enumeradas não possui a mesma o efeito automático de atenuar especialmente a pena, só o possuindo se e na medida em que desencadeie uma acentuada diminuição da culpa ou das exigências de prevenção, suscetível de fazer com que a imagem global do facto se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em tais hipóteses quanto estabeleceu os limites normais da moldura abstrata do tipo de crime em causa (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português – as consequências jurídicas do crime, Aequitas Editorial Notícias, 1993, pág. 306).
Ora, não obstante os anos volvidos, apesar de diminuto o prejuízo patrimonial causado e de o recorrente AA auferir um rendimento líquido mensal 143 vezes superior (cfr. factos provados sob os pontos 12. e 241. – II.3.B.), o certo é que nem um cêntimo restituiu até hoje, pelo que, neste contexto, o decurso do tempo e o bom comportamento não chegam para fazer funcionar a atenuante.
Na motivação (corpo) do recurso que interpôs, também o recorrente BB aborda a passagem do tempo como militando a seu favor.
Ora, não obstante os anos volvidos, remontando o crime por ele cometido a 25-02-2017 (cfr. facto provado sob o ponto 48. – II.3.B.), o certo é que, desde então, em 12-04-2018, 06-08-2019 e 09-01-2021, voltou a cometer vários crimes, 6 deles contra à integridade física simples e 1 outro contra a liberdade pessoal (cfr. facto provado sob o ponto 236. – II.3.B.), não se vislumbrando como se possa afirmar verificar-se uma acentuada diminuição da ilicitude ou da culpa.
Por seu turno, também os recorrentes GG e HH pretendem que a passagem do tempo seja valorada a seu favor, acrescentando aquele que, nesse período, não cometeu crimes.
Contudo, não obstante os anos volvidos, remontando a … de 2016 os factos cometidos pelo recorrente HH (cfr. factos provados sob os pontos 197. a 204. – II.3.B.) e o último dos crimes cometidos pelo recorrente GG a …de 2017 (cfr. factos provados sob os pontos 222. a 229. – II.3.B.), estando em causa, quanto a este último, 24 crimes da mesma natureza no total (cfr. factos provados sob os pontos121. a 162., 169. a 185. e 197. a 229. – II.3.B.), o certo é que não ficou demonstrado que qualquer um dos recorrentes tenha sequer procurado repor a verdade nos respetivos processos contraordenacionais em causa, não se vislumbrando como se possa afirmar verificar-se uma acentuada diminuição da ilicitude ou da culpa.
Na verdade, para efeitos do art.º 72.º, n 2, al. d), do C.P. não basta ter o crime sido cometido há muito tempo e haver o agente mantido boa conduta, sendo fundamental que isso tenha mexido profundamente no facto ou no agente e que, por exemplo, o alvoroço social se tenha esfumado ou a personalidade se tenha modificado para muito melhor (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08-05-1991, processo n.º ...).
No que se refere ao recorrente EE, perante a possibilidade de lhe ser aplicada uma pena de prisão de 1 mês a 4 anos ou, em alternativa, uma pena de 10 a 480 dias de multa, foi o mesmo condenado na pena de 200 dias de multa (cfr. ponto 4. de IV- Da escolha e determinação da medida da pena – II.3.E.).
Ora, no que se refere aos recorrentes AA, BB, EE e GG ..., afigura-se que se mostram observados os critérios da culpa dos referidos agentes e das exigências de prevenção a que se terá que atender na tarefa de determinação da medida de cada uma das referidas penas, de acordo com a chamada teoria da moldura da prevenção ou da defesa do ordenamento jurídico (cfr. art.º 71.º, n.º 1, do C.P. e ANTUNES, Maria João, in Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2013, pág. 41 e segs.), onde:
- A prevenção geral de integração está incumbida de fornecer o limite mínimo, que tem como fasquia superior o ponto ótimo de proteção dos bens jurídicos e inferior o ponto abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr em causa a sua função tutelar (cfr. art.º 40.º, n.º 1, do C.P.);
- A culpa, entendida em sentido material e referida à personalidade do agente expressa no facto, surge como limite inultrapassável de toda e qualquer consideração preventiva (cfr. art.º 40.º, n.º 2, do C.P.);
- Cabendo à prevenção especial, dentro dos referidos limites assim definidos, a determinação da medida concreta da pena, sendo de atender à socialização do agente.
Na verdade, outra não pode ser a conclusão caso se atenda a todas as circunstâncias que não fazendo parte do respetivo tipo legal de crime, deponham a favor ou contra os referidos recorrentes, na medida em que se mostrem relevantes para a culpa ou para exigências preventivas (cfr. art.º 71.º, n.º 2, do C.P.).
No presente caso, são acentuadas as exigências de prevenção geral que se fazem sentir para se restabelecer a confiança na vigência e validade das normas violadas e que, assim, apontam para um mais severo sancionamento dos agentes deste género de criminalidade.
Na verdade, a criminalidade cometida em contexto de diversão noturna, a propósito da disputa de mercado de segurança em tais ambientes ou entre seguranças e clientes tem particular eco e ressonância social, sendo geradora de forte alarme social e de um profundo sentimento de intranquilidade e insegurança.
No que se refere ao crime de roubo cometido pelo recorrente AA (cfr. factos provados sob os pontos 3. a 17. – II.3.B.) é elevado o grau de ilicitude dos factos cometidos, grave o modo de execução, sendo elevado o desvalor da ação. Na verdade, verificou-se uma desproporção entre o número de agressores e a vítima, o que lhe diminuía fortemente a possibilidade de defesa e/ou resistência, tendo sido praticadas diversas condutas violentas caracterizadas por elevada agressividade, denotando os factos cometidos uma forte desproporção entre a conduta coativa ou constrangedora praticada e a quantia de que se apropriaram.
As consequências causadas pelo referido crime de roubo cometido pelo recorrente AA, embora diminutas do ponto de vista patrimonial, são já consideráveis atentas as lesões físicas causadas em diferentes partes do corpo e as dores que, naturalmente, perduraram.
A culpa com que o recorrente AA atuou é também elevada. Na verdade, atuou com a modalidade mais intensa do dolo, que se mostra direto, revelando os factos cometidos uma forte resolução criminosa, persistência na resolução tomada e reflexão sobre os meios empregues, uma personalidade altamente desfasada do viver em sociedade, porque cometidos no exercício de funções de segurança, que continua a desempenhar embora em diferente contexto (cfr. facto provado sob o ponto 241. – II.3.B.), e das quais era expectável maior contenção e serenidade e, assim, um comportamento oposto ao assumido, o que necessariamente é revelador de maiores exigências de socialização.
É certo que à data dos factos o recorrente AA mantinha boa inserção, o que não pode deixar de militar a seu favor. Contudo, tal circunstância não foi suficientemente contentora, não o tendo impedido de praticar o crime aqui em causa.
Milita também a favor do recorrente AA o facto de não possuir antecedentes criminais (cfr. facto provado sob o ponto 240. – II.3.B.), circunstância que, contudo, é o expectável a todo o cidadão como modo de viver em sociedade (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-09-2021, processo n.º 1306/19.0JALRA.C1.S1103; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31-10-1995, processo n.º ...).
Assim, em conclusão, as circunstâncias referidas pelo recorrente AA não assumem um peso atenuativo justificativo da aplicação de pena de prisão mais baixa, sobretudo quando no caso confluem outros fatores de sinal contrário.
No que se refere ao recorrente BB é elevado o grau de ilicitude dos factos cometidos e grave o modo de execução, uma vez que foram vários, diferenciados e graves os males anunciados como forma de constrangimento do ofendido MMM (cfr. factos provados sob os pontos 45. a 53. – II.3.B.).
Acresce que o recorrente BB não só agiu com a modalidade mais intensa do dolo, que se mostra direto (cfr. art.º 14.º, n.º 1, do C.P.), como os factos cometidos evidenciam persistência e forte resolução criminosa. Na verdade, o recorrente BB não se inibiu de se dirigir, de noite, a um estabelecimento de diversão noturna onde MMM se encontrava e cuja segurança era feita por sociedade concorrente daquela onde exercia funções. Por outro lado, o recorrente BB já não era primário à data dos factos, tendo já sido condenado pela prática de 1 crime de ofensa à integridade física qualificada e 1 crime de injúria agravada, sendo que já havia cometido 1 outro crime de ofensa à integridade física simples, pelo qual foi posteriormente condenado, o que, obviamente, funciona como índice de culpa mais grave (cfr. facto provado sob o ponto 236. – II.3.B.). Aliás, inserindo os factos aqui em causa no percurso criminal do recorrente é evidente que daqueles transparece que se trata de uma pessoa impulsiva, o que milita contra si, sobretudo tendo em conta a capacidade e os conhecimentos que possui a nível de combate físico (cfr. facto provado sob o ponto 242. – II.3.B.).
Por outro lado, pese embora a sua boa inserção familiar, já existente à data dos factos, o certo é que a mesma não foi suficientemente contentora, continuando o recorrente a trabalhar na mesma sociedade, na parte comercial, não lhe sendo, pois, indiferente a angariação de clientes para aquela, tendo sido precisamente esse o contexto em que os factos aqui em causa foram cometidos.
O número e a natureza dos crimes que o recorrente BB vem sucessivamente cometendo (1 crime de ofensa à integridade física qualificada, 7 crime de ofensa à integridade física simples, 1 crime de injúria agravada, 1 crime de injúria, 1 crime de ameaça, 1 crime de dano e 1 crime de simulação de crime), denota resistência ao cumprimento das regras sociais e um sentimento de impunidade.
Assim, são elevadas as exigências de socialização que o caso denota.
No que se refere ao recorrente EE, embora em grau menor, são também elevadas as exigências de prevenção geral no que se refere ao exercício clandestino de segurança privada que fomenta a precariedade laboral.
É também considerável a ilicitude dos factos que foram cometidos pelo recorrente EE que se prolongaram por vários dias e durante um festival de música onde o ambiente descontraído e de convívio é frequentemente interrompido por desacatos que se pretendem resolvidos de forma serena e por pessoas habilitadas (cfr. factos provados sob os pontos 58. a 64. e 66. – II.3.B.).
Não obstante ter agido com a modalidade mais intensa do dolo, que se mostra direto, o certo é que à sua conduta não terá sido alheia a sua precária situação económica, sendo que da mesma não resultaram consequências extratípicas, o que não pode deixar de militar a seu favor.
Não lhe sendo conhecidos antecedentes criminais (cfr. facto provado sob o ponto 240. – II.3.B.) e dispondo de boa inserção familiar, milita também a seu favor o facto de se encontrar atualmente habilitado para o exercício de atividade profissional no âmbito da segurança privada, a qual tem vindo a desempenhar (cfr. facto provado sob o ponto 247. – II.3.B.).
Resultando do já exposto que, no caso do recorrente GG, são elevadas as exigências de prevenção geral, há também que atender ao elevado grau de ilicitude dos factos cometidos, sendo grave o modo de execução, nefastas as consequências extratípicas causadas e elevado o grau de violação dos deveres que sobre si impendiam (cfr. factos provados sob os pontos121. a 162., 169. a 185. e 197. a 229. – II.3.B.).
Na verdade, o recorrente GG, de forma reiterada, imputou a outros a autoria de infrações rodoviárias que sabia não terem sido os seus autores, prolongando a sua conduta por mais de 2 anos, fazendo-o de uma forma sistemática, acabando necessariamente por, no mínimo, entorpecer o sistema sancionatório das contraordenações rodoviárias, sendo que, por ser militar da G.N.R. e com formação específica na área do trânsito, onde exercia funções, dele era expectável postura oposta, apoiando, cooperando e coadjuvando a A.N.S.R. (cfr. art.º 16.º, al. d), do Estatuto dos Militares da G.N.R. e 169.º, n.º 5, do C.E.), sendo, por isso mesmo, merecedor de mais elevada censura.
Por outro lado, não só atuou com a modalidade mais intensa de dolo, que se mostra direto (cfr. art.º 14.º, n.º 1, do C.P.), como dos factos cometidos transparece, face também à sua reiteração e ao período de mais dois anos em causa, uma firme resolução criminosa, persistência na resolução tomada, reflexão sobre os meios empregues, indiferença quanto à própria veracidade da fiscalização rodoviária que lhe cabia levar a cabo, dado que chegou a dirigir a sua conduta criminosa relativamente a um auto por si lavrado, e até um sentimento de impunidade e, assim, de características de personalidade bastante desvaliosas, o que não pode deixar de militar contra ele.
É certo que não se demonstrou que dessa atividade tenha retirado benefício económico, bem como que o arguido admitiu em sede de primeiro interrogatório judicial parcialmente os factos, procurando, contudo, minimizar a sua conduta, não se verificando, desde logo, motivo para qualquer atenuação da pena (cfr. art.º 72.º, n.º 2, al. c), do C.P.).
Finalmente, milita a seu favor a boa inserção familiar e profissional (cfr. factos provados sob os pontos 248. e 265. a 274. – II.3.B.). Contudo, aquela não foi suficientemente contentora e foi a propósito desta que cometeu os crimes pelos quais foi condenado.
Finalmente, milita a seu favor a ausência de antecedentes criminais (cfr. facto provado sob o ponto 240. – II.3.B.), mas perante o cometimento de crimes tão distanciados do que lhe era exigível como militar da G.N.R., tal circunstância não pode ter um efeito particularmente atenuante dado que, como resulta do já exposto, é até o expectável a todo o cidadão como modo de viver em sociedade.
Cumpre salientar que do acórdão recorrido não resulta minimamente que o silêncio do recorrente GG em audiência de julgamento tenha sido sequer valorado, muito menos contra si. Sendo, contudo, inequívoco que o silêncio de um arguido, sendo um direito que lhe assiste, não o pode prejudicar (cfr. arts. 61.º, n.º 1, al. d), 343.º, n.º 1, e 345.º, n.º 1, do C.P.P.), o certo é que também não pode pretender dele colher benefícios. Na verdade, a proibição do desfavorecimento traduz-se, desde logo, na impossibilidade de extrair do silêncio do arguido, seja ele total ou parcial, ilações de prova ou presunção judicial de culpabilidade, o que não foi feito no presente caso. Não obstante, quando um arguido prescinde, com o seu silêncio, de esclarecer e dar a sua visão pessoal sobre os factos que ficaram demonstrados pela prova produzida, assim impedindo o afastamento da culpabilidade, não pode depois pretender que foi prejudicado pelo seu silêncio (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10-01-2008, processo n.º 07P3227105). Na verdade, o arguido que exerça tal direito não pode esperar que o seu silêncio reforce a presunção de inocência, anulando o valor das outras provas demonstrativas da culpabilidade, sendo certo que, em geral, uma prova não contraditada, não obstante a oportunidade de o ter sido, é até mais credível e persuasiva (cfr. SOARES, UUUUUUUU, in “Proibição de desfavorecimento do arguido em consequência do silêncio em julgamento – a questão controversa das ilações probatórias desfavoráveis”, Julgar, n.º 32, Livraria Almedina, pág. 37 e 38).
No que concerne ao recorrente HH, tendo em conta a sua concreta intervenção que, na prática, consistiu em determinar dolosamente o recorrente GG à prática de um crime doloso de falsificação de documento, não é elevado o grau de ilicitude da sua atuação, nem grave o seu modo de atuação, nem elevada a culpa com que atuou, sendo que não se demonstrou ter obtido qualquer benefício próprio, beneficiando ainda se se tratar de caso único de uma vida aparentemente fiel ao Direito, beneficiando de boa inserção (cfr. factos provados sob os pontos 197. a 204., 240. e 262. – II.3.B.).
Tudo ponderado, afigura-se que os critérios de determinação das referidas penas não impõem a sua correção a favor dos referidos recorrentes, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção em face das circunstâncias do caso acima elencados.
Por outro lado, para a determinação do montante diário da multa deverá atender-se à situação económica e financeira do arguido e aos seus encargos pessoais (cfr. art.º 47.º, n.º 2, do C.P.), devendo o mesmo ser fixado dentro dos limites legais em termos daquele constituir um sacrifício real para o arguido sem, no entanto, deixar de lhes serem asseguradas as disponibilidades indispensáveis ao suporte das suas necessidades.
O quantitativo diário deve ser fixado entre EUR 5 e EUR 500 (cfr. art.º 47.º, n.º 2, do C.P.), devendo ter-se presente que o limite mínimo deverá apenas ser aplicado às pessoas que vivam no mínimo existencial ou abaixo dele (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 04-05-2016, processo n.º 246/14.4TACVL.C1106; acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 18-10-2010, processo n.º 22709/6TABCL.G1107).
Ora, atentos os factos provados (cfr. facto provado sob o ponto 262. – II.3.B.), uma vez que o recorrente HH aufere rendimento próprio, vive com a mulher, que também aufere rendimento próprio, contribuindo ambos para suportar as despesas fixas que ficaram demonstradas, a taxa diária fixada não se mostra desadequada em face da situação económica e financeira daquele e aos seus encargos pessoais.
Convém ter presente que “a pena de multa, se não quer ser um andrajoso simulacro de punição, tem de ter como efeito o causar ao arguido, pelo menos algum desconforto se não, mesmo, um sacrifício económico palpável” (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-06-2004, processo 04P1266108) e que “como a multa é uma pena, o montante diário da mesma deve ser fixado em termos de tal sanção representar um sacrifício real para o condenado, sob pena de se estar a desacreditar esta pena, os tribunais e a própria Justiça, gerando um sentimento de insegurança, de inutilidade e de impunidade (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 02-10-1997, in Coletânea de Jurisprudência, Ano V, Tomo III, págs. 183 e 84).
A multa enquanto sanção penal, não pode deixar de ter um efeito preventivo e, portanto, não pode deixar de ter uma natureza de pena ou sofrimento, isto é, por outras palavras, não pode o condenado a multa deixar de a “sentir na pele” (cfr. CARVALHO, Taipa de, in “As Penas no Direito Português após a Revisão de 1995, Jornadas de Direito Criminal-Revisão do Código Penal, Centro de Estudos Judiciários, Lisboa, 1998, Vol. II, pág. 24).
Na verdade, a pena de multa não pode representar uma forma disfarçada de absolvição ou o Ersatz de uma dispensa ou isenção de pena que se não tem a coragem de proferir, antes devendo representar uma censura suficiente do facto e, simultaneamente, uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada (cfr. VVVVVVVV, WWWWWWWW, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, 1993, pág. 119).
O recorrente DD pugna que a pena única que lhe foi aplicada é “desproporcional e desadequada perante as necessidades de Prevenção Geral, Prevenção Especial e de Justiça que o caso de per si reclama”, pugnando por uma mais benévola (cfr. I.2.D.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que o deve ser mantido o acórdão recorrido nos seus precisos termos (cfr. I.2.D.b.).
Por seu tuno, o recorrente FF insurge-se contra a pena única alcançada entendendo que, no máximo, a mesma deveria ser fixada em 1 ano e 6 meses de prisão (cfr. I.2.F.a.), pretensão que é rejeitada pelo Ministério Público na resposta apresentada que defende não ocorrer qualquer desproporção ou desadequação na pena única fixada (cfr. I.2.F.b.).
Cumpre salientar que, relativamente ao crime de detenção de arma proibida por ele cometido, mesmo que se considerasse ser a conduta do recorrente FF atualmente subsumível ao tipo de crime p. e p. pelo art.º 86.º, n.º 1, al. e), do R.J.A.M., na redação decorrente da Lei n.º 50/2019, de 24-07, apesar de ser menor a moldura abstrata aplicável, pelas mesmas razões exaradas pelo tribunal recorrido (cfr. ponto 5 de IV – Da escolha e determinação da medida da pena – II.3.E.), continuaria a afigurar-se perfeitamente adequada a pena de 6 meses de prisão.
A pena única tem, considerando para o efeito as penas aplicadas parcelarmente, como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (cfr. art.º 77.º, n.º 1 e n.º 2 do C. P.).
Deste modo, a pretensão do recorrente FF está condenada ao fracasso dado que o limite mínimo da moldura do concurso se cifra em 4 anos e 6 meses, correspondente à mais elevada das penas concretamente aplicadas, é em muito superior à pena única pretendida.
No que se refere ao recorrente DD, tendo a moldura do concurso como limite mínimo 1 ano e 6 meses de prisão e como limite máximo 3 anos de prisão, foi condenado na pena única de 2 anos de prisão (cfr. I.1.).
Por seu turno, e quanto ao recorrente GG, tendo a moldura do concurso como limite mínimo 10 meses de prisão e como limite máximo 14 anos de prisão, foi condenado na pena única de 5 anos de prisão (cfr. I.1.).
Estabelecida a moldura penal do concurso, deve determinar-se a pena conjunta do concurso, dentro dos limites daquela. Tal pena será encontrada em função das exigências de culpa e de prevenção, tendo o legislador fornecido, para além dos critérios gerais estabelecidos no art.º 71.º do C. P., um critério especial: “Na determinação concreta da pena serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente” (cfr. art.º 77.º, n.º 1, 2.ª parte, do C.P.).
Importa, pois, detetar a possível conexão e o tipo de conexão que intercede entre os factos concorrentes, tendo em vista a totalidade da atuação do respetivo arguido como unidade de sentido, que possibilitará uma avaliação global e a “culpa pelos factos em relação” (cfr. MONTEIRO, Cristina Líbano, in “A Pena “Unitária” do Concurso de Crimes”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 16, n.º 1, págs. 162 e segs.). Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial de Notícias, pág. 286).
Na avaliação desta personalidade unitária do agente, releva, sobretudo a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência, ou eventualmente mesmo a uma carreira criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, sendo que só no primeiro caso será de atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. No entanto, não pode ser esquecida a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do respetivo agente.
A concreta circunstância que deva servir para determinar a moldura penal aplicável ou para escolher a pena não deve ser de novo valorada para quantificação da culpa e da prevenção relevantes para a medida da pena, nisso se traduzindo o princípio da proibição de dupla valoração (cfr. art.º 71.º, n.º 2, do C.P. e DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 237).
Contudo, apesar de os princípios da culpa e da prevenção se refletirem na imagem global do facto para determinação da moldura penal aplicável, nada impede que tais princípios entrem de novo em conta, sem qualquer restrição, na operação de determinação da medida concreta da pena única em caso de concurso de crimes. Neste contexto o princípio da proibição de dupla valoração não pode dizer-se violado (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 238).
Ora, no presente caso, o recorrente DD cometeu dois distintos ilícitos, de diferente natureza, separados entre si por 2 anos, 2 meses e 30 dias, período durante o qual cometeu crime da mesma natureza a um dos aqui em causa e pelo qual veio a ser condenado (cfr. factos 54. a 66., 94. a 96., 105. a 107., 238. e 246. - II.3.B.).
Acresce que é de relevo a ilicitude dos factos cometidos e grave o modo de execução. No que se refere ao exercício ilícito da atividade de segurança privada, cumpre salientar que o recorrente DD desempenhou um papel preponderante e de destaque, tendo sido ele quem contratou e instruiu a pessoa que desempenhou tais funções no referido festival de verão. Exercendo funções na área da segurança há muitos anos, era expectável que seguisse as regras vigentes em tal sector de atividade. Contudo, optou por se dedicar a este género de criminalidade ao longo dos anos. Na verdade, à data dos factos já havia sido condenado por factos ilícitos semelhantes, o que inegavelmente eleva a sua culpa. Como se não bastasse, já então havia praticado idênticos crimes pelos quais veio a ser posteriormente condenado, tendo voltado a cometer factos semelhantes após o cometimento dos factos aqui em causa.
Por outro lado, e no que se refere ao crime de detenção de arma proibida, não obstante estar em causa conduta que não é das mais graves previstas no tipo de crime, não pode deixar de se ter em conta o número das diferentes armas e munições em causa, de diferentes classes, sendo caracterizadas pela sua elevada capacidade de provocar lesões, até mesmo mortais, quando usadas como armas de agressão.
Acresce que o recorrente agiu sempre com a modalidade mais intensa do dolo, que se mostra direto (cfr. art.º 14.º, n.º 1, do C.P.). Por outro lado, o longo período de tempo que separa as duas situações aqui em causa e o seu percurso criminal, pautado também pela prática de outros crimes de distinta natureza aos aqui em causa, bem como o facto de se manter inserido profissionalmente no mesmo sector de atividade, é revelador de uma indiferença às anteriores penas aplicadas, de uma insusceptibilidade de ser por elas influenciado, de uma resistência ao cumprimento de regras, de um sentimento de impunidade e falta de preparação para manter uma conduta lícita e, assim, maiores exigências de socialização (cfr. factos provados sob os pontos 238. e 246. – II.3.B.).
Assim, da imagem global dos crimes aqui em causa afigura-se que o conjunto dos factos em apreço não é reconduzível a uma mera pluriocasionalidade, sendo já demonstrativo de uma personalidade reveladora de uma facilidade para delinquir.
Deste modo, sendo de atribuir à pluralidade de crimes cometidos um efeito mais agravante dentro da moldura penal conjunta, afigura-se que a pena única fixada pelo tribunal recorrido em 2 anos de prisão não é manifestamente desproporcional, não impondo os critérios de determinação da pena única a sua correção a favor do recorrente, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção, em face das circunstâncias do caso acima elencados.
Não obstante o já exposto quanto ao recorrente FF, sempre se dirá que situando-se o limite máximo da moldura do concurso em 10 anos, verifica-se que o tribunal recorrido ao fixar a pena única em 6 anos não conferiu à pluralidade de crimes um efeito particularmente agravante, pese embora a globalidade dos factos por ele cometidos seja demonstrativa de uma personalidade reveladora de uma facilidade para delinquir, não se reconduzindo aqueles a uma mera pluriocasionalidade.
Na verdade, não obstante a ausência de antecedentes criminais e as suas boas condições de vida, em pouco mais de um ano cometeu um número considerável de crimes, todos com elevado grau de ressonância ética negativa no tecido social, deles transparecendo um aproveitamento da sua profissão de P.S.P., um sentimento de impunidade, forte resolução e persistência criminosa, face à sua reiteração ou ao número de armas transacionadas ou munições detidas, parte delas na esquadra onde prestava serviço. Acresce que, não obstante os anos volvidos, a revolta que sente pelos reflexos que a situação por si causada lhe trouxe é demonstrativa de que os factos cometidos não mexeram profundamente com ele, não tendo ocorrido, para melhor, modificações na sua personalidade (cfr. factos provados sob os pontos 67. a 76., 78., 79. a 90., 99., 100. a 102., 107., 240. e 248. – II.3.B.).
No que se refere ao recorrente GG ponderando os fatores acima apontados, dos quais se destaca o número do crimes cometidos, a estreita conexão existente entre todos eles, quer porque integram a mesma categoria jurídico-penal, quer porque foram executados através do mesmo modo de atuação, o período de tempo em causa, a circunstância de dos factos provados transparecer que a única vítima foi o próprio Estado, o contexto em que foram praticados, a desvaliosa personalidade do recorrente que deles resulta, mas na qual não radica uma tendência criminosa, mas ainda uma mera pluriocasionalidade, o concurso de crimes não deve funcionar como agravante na determinação da medida da pena única.
Ora, de facto não funcionou, tendo o tribunal recorrido considerado adequada a pena de 5 anos de prisão, não se impondo a correção a favor do recorrente, atentos os parâmetros da culpa e da prevenção, em face das circunstâncias do caso acima elencados.
Improcedem, pois, neste segmento, os recursos interposto pelos arguidos AA (cfr. I.2.A.a.), BB (cfr. I.2.B.a.), DD (cfr. I.2.D.a.), EE (cfr. I.2.E.a.), GG (cfr. I.2.G.a.), FF (cfr. I.2.F.a.) e HH (cfr. I.2.H.a.).
II.4.J. Da aplicação do perdão de nos termos dos arts. 2.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08:
O recorrente AA entende que beneficia do perdão de penas a que alude o art.º 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08 (cfr. I.2.A.a.), pretensão que o Ministério Público entende estar afastada em face do disposto no art.º 3.º, n.ºs 2, al. d), e 3, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08 (cfr. I.2.A.b.).
Tendo a referida Lei entrado em vigor em data anterior à prolação do acórdão recorrido (cfr. art.º 15.º da referida Lei), não se encontrando então sequer o processo nesta instância de recurso, não se colocando assim a questão de saber se é aplicável ou não o disposto no art.º 474.º, n.º 2, do C.P.P., face ao já exposto (cfr. II.4.D.b.), uma vez que a decisão que sobre o assunto venha a ser proferida em 1.ª instância é impugnável (cfr. arts. 399.º e 400.º, n.º 1, do C.P.P.), não pode esta instância apreciar e decidir agora tal questão que, assim, fica prejudicada, até para não coartar ao recorrente AA qualquer direito, nomeadamente o do recurso (cfr. art.º 32.º, n.º 1, da C.R.P. e 400.º, n.º 1, al. f), do C.P.P.).
II.4.K. Da suspensão da execução das penas aplicadas ao recorrente BB, ao recorrente EE e ao recorrente FF
O recorrente BB pugnou pela suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada (cfr. I.2.B.a.), o que é rejeitado pelo Ministério Público, na resposta que apresentou (cfr. I.2.B.b.).
Ora, o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. art.º 50.º, n.º 1, do C.P.).
Uma vez que, no caso, está preenchido o pressuposto formal de que a suspensão da execução de uma pena de prisão está dependente, tendo em conta a medida concreta da fixada ao referido recorrente, cumpre averiguar se igualmente se verifica o pressuposto material de que fica dependente a aplicação de tal pena de substituição.
Na verdade, é necessário que, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias do caso, se conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento futuro do agente de um crime, ou seja, que se conclua que a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão, acompanhadas ou não da imposição de deveres (cfr. art.º 51.º do C.P.), regras de conduta (cfr. art.º 52.º do C.P.) e/ou regime de prova (cfr. art.º 53.º do C.P.), bastarão para o afastar da prática futura de crimes.
São particularmente elevadas as exigências de prevenção geral que se fazem sentir para se restabelecer a confiança na vigência e validade das normas violadas e que, assim, apontam para um mais severo sancionamento dos agentes deste género de atuação violenta, face ao particular eco e ressonância social de enorme repulsa que provoca na comunidade, sendo suscetível de gerar forte alarme social e um profundo sentimento de intranquilidade e insegurança.
É inegável que, atenta a cadência com o que o recorrente BB comete crimes (02-02-2005, 03-11-2010, 14-05-2014, 31-08-2015, 12-04-2018, 06-08-2019 e 09-01-2021) e, assim, antes e depois dos factos aqui em apreço (25-02-2017), não se pode concluir, sem mais, que os factos pelos quais foi condenado neste processo se insiram num particular período da sua vida já ultrapassado e que definitivamente deixou para trás. Na verdade, cumpre salientar que os crimes por ele cometidos são maioritariamente caracterizados por agressões físicas e verbais, sendo certo que o recorrente possui formação e conhecimentos a nível de combate físico que, embora do ponto de vista desportivo, é evidente que deles se tem servido para um fim oposto. Por outro lado, o cometimento sucessivo de crimes não obstante as diferentes penas não privativas de liberdade que, a título principal e de substituição, lhe foram sendo aplicadas, é demonstrativo de uma maior indiferença às diferentes penas aplicadas, uma maior insusceptibilidade de ser por elas influenciado, mantendo-o afastado de crimes e, assim, maiores exigências de socialização (cfr. factos provados sob os pontos 236. e 242. – II.3.B.).
O recorrente já beneficiou, por 4 vezes distintas, da suspensão da execução de diferentes penas de prisão que lhe foram aplicadas, sendo que 3 delas não surtiram qualquer efeito em o afastar da prática de crimes.
Na verdade, o recorrente cometeu o crime de simulação de crime, pelo qual foi condenado no âmbito do processo n.º 332/14.0PATVD, em 14-05-2014 e, assim, no período da suspensão da execução da primeira pena de prisão que lhe foi aplicada no processo n.º 2026/10.7PASNT que decorreu de 27-11-2013 a 27-03-2015.
Por outro lado, os crimes de ofensa à integridade física e injúria em causa no processo 678/18.9PSLSB, foram cometidos em 12-04-2018 e, assim, no período da suspensão da execução da segunda pena de prisão que lhe foi aplicada no processo 261/15.0GFVFX por 1 crime de ofensa à integridade física simples e que decorreu de 16-05-2017 a 16-05-2018.
Por outro lado, a suspensão da execução da terceira pena de prisão que foi aplicada ao recorrente BB no âmbito do processo 318/21.9PASNT foi-lhe revogada, por decisão transitada em julgado em 09-01-2021, o que determinou o cumprimento desta, em regime de permanência na habitação, que atualmente decorre. É certo que não se alcança dos factos provados que o motivo da revogação tenha sido o cometimento de crime pelo qual o recorrente BB tenha sido condenado e que revelasse que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas (cfr. art.º 56.º, n.º 1, al. b), do C.P.). Contudo, pese embora o discurso minimizador adotado no recurso sobre tal revogação, uma vez que decorre da lei penal que apenas existem dois motivos para a revogação da suspensão da execução de uma pena de prisão (cfr. art.º 56.º, n.º 1, als. a) e b), do C.P.), não tendo sido aquele o fundamento para tal revogação, então o mesmo só pode ter sido a infração, grosseira ou repetida, dos deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social homologado (cfr. art.º 56.º, n.º 1, al. a), do C.P.), o que evidencia uma reduzida capacidade de colaboração, um descomprometimento com a execução das regras, uma resistência ao seu cumprimento, o que inevitavelmente faz elevar ainda mais as exigências de socialização.
De facto, as anteriores sanções penais não obtiveram até à data a desejada ressonância em termos de interrupção da trajetória criminal. A personalidade do recorrente e a sua completa indiferença face ao sistema de justiça, elevam a fasquia das necessidades de prevenção especial positiva, na medida em que a socialização do recorrente se revela meta muito difícil de alcançar, e não permitem ignorar as de prevenção especial negativa, pela necessária advertência individual.
Nestas condições, suspender a execução da pena de prisão aplicada ao recorrente BB seria criar no mesmo e na comunidade em geral um sentimento de impunidade. Revelando-se aquele, em termos de personalidade, uma pessoa refratária a uma convivência social de acordo com as regras do direito, afigura-se que a tutela dos bens jurídicos em causa, a estabilização das expectativas da comunidade na validade e vigência da norma violada e as exigências de socialização que o caso denota não se bastam com a ameaça da pena de prisão e, assim, com a aplicação de pretendida pena de substituição não privativa de liberdade, sendo certo que o próprio recorrente BB já deu mostras de tal ser insuficiente e inadequado para o dissuadir da prática futura de crimes.
Ora, todos esses fatores elevam quer as exigências de prevenção especial, no sentido de inviabilizar a formulação de um juízo de prognose favorável ao recorrente, quer as exigências de prevenção geral, no sentido de a comunidade não tolerar a sua manutenção em liberdade.
O recorrente BB não indica qualquer dimensão normativa que tenha sido de facto acolhida na decisão do tribunal recorrido que pudesse reputar-se desconforme à C.R.P., o que conduz a que esta instância não esteja vinculada a conhecer de uma qualquer inconstitucionalidade reportada à concreta decisão (e não às normas por esta aplicadas), o que necessariamente afasta a possibilidade de se concluir (ou não) por um juízo de inconstitucionalidade.
Seja como for, sempre se dirá que não tendo o tribunal recorrido acolhido qualquer uma das interpretações que o recorrente BB lhe imputa quando ponderou da suspensão da execução da pena de prisão, não se pode ter por violado qualquer direito ou preceito constitucional, nomeadamente os por si indicados.
O recorrente EE termina pedindo a suspensão da execução da pena (cfr. I.2.E.a.).
Em rigor, nem na motivação (corpo) do recurso que interpôs nem nas conclusões que o rematam o referido recorrente “enuncia especificamente os fundamentos do recurso” (cfr. art.º 412.º, n.º 1, do C.P.P.), ou seja, não especifica qualquer razão para fundamentar o dito pedido, deficiência estrutural irremediável, insuscetível de aperfeiçoamento, o que conduz, como resulta do já exposto, à rejeição parcial do recurso (cfr. arts. 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 6, al. b), e 420.º, n.º 1, al. b), do C.P.P.), nada impedindo que a rejeição parcial seja decidida, em primeira mão, em conferência, não sendo devida qualquer outra importância sancionatória.
Seja como for, tendo sido condenado numa pena de multa (cfr. I.1.), não está atualmente prevista na lei penal a suspensão da sua execução (cfr. arts. 47.º e 50.º do C.P.).
Na verdade, a partir da reforma do C.P. operada pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15-03, a pena de multa deixou de ser abrangida pela suspensão, determinando até o art.º 7.º daquele diploma que “enquanto vigorarem normas que prevejam cumulativamente penas de prisão e multa, a suspensão da execução da pena de prisão decretada pelo tribunal não abrange a pena de multa”.
Assim, nesta parte, o recurso interposto sempre estaria condenado ao fracasso (cfr. I.2.E.a.).
Por seu turno, o recorrente FF também pugnou pela suspensão da execução da pena única (cfr. I.2.F.a.).
Não tendo obtido provimento a pretensão do recorrente FF na redução da pena única (cfr. II.4.I.), tendo em conta a medida da pena única aplicada (6 anos de prisão), uma vez que a suspensão da execução da pena de prisão só é aplicável a penas de prisão aplicadas em medida não superior a 5 anos (cfr. art.º 50.º, n.º 1, do C.P.), é manifesto que não é legalmente possível suspender a execução daquela.
Improcedem, pois, também nesta parte, os recursos interpostos pelo arguido BB (cfr. I.2.B.a.), pelo arguido EE (cfr. I.2.E.a.) e pelo arguido FF (cfr. I.2.F.a.).
II.4.L. Da condição da suspensão da execução da pena única aplicada ao recorrente GG:
O recorrente GG insurge-se contra a imposição do dever de entregar, no período de cinco anos, a quantia de EUR 5 000 à A.N.S.R., a que ficou condicionada a suspensão da execução da pena única de prisão que lhe foi aplicada, entendendo que a mesma não está destinada a reparar o mal do crime, que a A.N.S.R. não é nenhuma das entidades mencionadas no art.º 51.º do C.P., sendo um mero serviço central da administração direta do Estado cujas receitas são as expressamente previstas no art.º 8.º do decreto Regulamentar n.º 28/2012, de 12-03 (cfr. I.2.G.a.).
Em resposta, o Ministério Público entende que a condenação do recorrente manter-se nos seus precisos termos (cfr. I.2.G.b.).
A suspensão da execução da pena de prisão pode ficar subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime, nomeadamente:
a) Pagar dentro de certo prazo, no todo ou na parte que o tribunal considerar possível, a indemnização devida ao lesado, ou garantir o seu pagamento por meio de caução idónea;
b) Dar ao lesado satisfação moral adequada;
c) Entregar a instituições, públicas ou privadas, de solidariedade social ou ao Estado, uma contribuição monetária ou prestação de valor equivalente (cfr. art.º 51.º, n.º 1, als. a) a c), do C.P.).
Como é evidenciado pelo uso do advérbio “nomeadamente”, o elenco que a lei penal faz dos deveres a que pode ficar condicionada a suspensão da execução de uma pena de prisão e junto de quem devem eles ser cumpridos é meramente exemplificativo.
Ora, a A.N.S.R. é um serviço central da administração direta do Estado, dotado de autonomia administrativa (cfr. art.º 1.º do Decreto Regulamentar n.º 28/2012, de 12-03). A mesma tem como missão, entre outras, a aplicação do direito contraordenacional rodoviário (cfr. art.º 2.º, n.º 1, do Decreto Regulamentar n.º 28/2012, de 12-03). Acresce que prossegue várias atribuições, entre as quais fiscalizar o cumprimento das disposições legais sobre trânsito e segurança rodoviária e assegurar o processamento e a gestão dos autos levantados por infrações ao Código da Estrada e legislação complementar (cfr. art.º 2.º, n.º 2, al. e), do Decreto Regulamentar n.º 28/2012, de 12-03). Por fim, dispõe, como receitas próprias, do produto ou parte do produto das coimas aplicadas nos processos de contraordenação rodoviária no âmbito das competências da A.N.S.R., nos termos da afetação que for determinada pelos diplomas legais que as instituem ou regulamentam, bem como o produto das custas fixadas nos processos de contraordenação (cfr. art.º 8.º, n.º 2, als. b) e c), do Decreto Regulamentar n.º 28/2012, de 12-03).
Ora, a atividade criminosa do recorrente GG (cfr. factos provados sob os pontos 121. a 162., 169. a 185., 197. a 229. – II.3.B.), pelo menos, entorpeceu o processamento pelas infrações rodoviárias em causa, pelo que a entrega de uma quantia ao serviço do Estado precisamente responsável pela aplicação do direito contraordenacional rodoviário, que se requer rápida e correta, se afigura adequada para reparar o mal causado, dado que faz sentir ao dito recorrente a responsabilidade pelo mal cometido e ao mesmo tempo reforça o sentimento de paz ou conciliação comunitária (cfr. acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 26-10-2016, processo n.º 653/14.2GAVCD.P1109).
Não se desconhece que os deveres impostos como condição da suspensão da execução da pena de prisão não poderão representar para o condenado uma obrigação cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir (cfr. art.º 51.º, n.º 2, do C.P.), prevendo-se ainda a modificação dos deveres por ocorrência de circunstâncias relevantes supervenientes (cfr. art.º 51.º, n.º 3, do C.P.).
Ora, o recorrente GG aufere mensalmente a quantia líquida de EUR 1 300 (cfr. facto provado sob o ponto 258. – II.3.B.). Não obstante a sua mulher auferir mensalmente rendimento líquido de EUR 1 500 e, assim, superior àquele, mesmo admitindo que metade das despesas mensais fixas demonstradas são suportadas pelo recorrente, ainda lhe resta um rendimento líquido mensal de EUR 633, 75. Ora, tomando este por referência, correspondendo o prazo de 5 anos, durante o qual a referida quantia de EUR 5 000 deverá ser entregue, a 60 meses, verifica-se que aquele dever representa mensalmente menos de 14 % daquele rendimento líquido mensal disponível, sendo assim perfeitamente proporcional.
Improcede, pois, também neste segmento o recurso interposto pelo recorrente GG (cfr. I.2.G.a.).
II.5. Das custas:
Só há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso (cfr. art.º 513.º, n.º 1, do C.P.P.), sendo o arguido condenado em uma só taxa de justiça, ainda que responda por vários crimes, desde que sejam julgados em um só processo (cfr. art.º 513.º, n.º 2, do C.P.P.), devendo a condenação em taxa de justiça ser sempre individual e o respetivo quantitativo ser fixado pelo juiz, a final, nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais (R.C.P.) (cfr. art.º 513.º, n.º 3, do C.P.P.).
Assim, tendo ocorrido decaimento total, beneficiando ou não de apoio judiciário (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14-05-2025, processo n.º 165/13.1GAMMV-A.C1-A.S1110), nos termos do art.º 8.º, n.º 9, do R.C.P. e da Tabela III a ele anexa, cada um dos recorrentes deve ser condenado entre 3 UC e 6 UC a título de taxa de justiça, tendo em vista a complexidade da causa.
Ora, nessa ponderação, no presente caso, haverá que ter em conta o número de questões colocadas, particularmente menor no caso do recorrente DD, mas ainda reduzidas no caso dos recorrentes EE e CC, bem como a média complexidade de algumas delas. No entanto, também se terá que ter em conta a falta de rigor técnico evidenciada, particularmente nos recursos interpostos pelos arguidos DD e EE que terminam pedindo a absolvição sem que sequer tenham impugnado a matéria de facto dada como provada ou o enquadramento jurídico-penal, sendo que outros pugnaram por posição contrária à posição maioritária da doutrina e jurisprudência dos tribunais superiores.
É também certo que, em parte, o recorrente GG obteve provimento (cfr. II.4.D.a.). Mas trata-se de uma verdadeira “vitória de Pirro” dado que não teve qualquer repercussão na qualificação dos crimes em causa e para a graduação da responsabilidade do recorrente GG No entanto, não só tal foi efetuado oficiosamente, não tendo sido desencadeada pelo referido recorrente, como não teve qualquer repercussão na medida da pena parcelar e da pena única aplicadas.
Assim, afigura-se que deverá ser responsabilizado, na totalidade, pelas custas do recurso que interpôs.
Tudo ponderado, julga-se adequado fixar a taxa de justiça em 3 UC para o recorrente DD, 4 UC para cada um dos recorrentes CC e EE e 5 UC para cada um dos demais.
III. Decisão:
Para além:
III.1.
Da correção do aludido lapso na fundamentação jurídica exarada no acórdão recorrido já ordenada e de acordo com a qual, na parte referente à escolha e determinação da medida da pena, e aí identificada como “IV- Da escolha e determinação da medida da pena”, onde consta:
“11. VVV:”;
deve passar a ler-se:
11. HH: (cfr. II.2.A.);
III.2.
De se eliminarem do elenco dos factos provados os que aí constam sob os pontos 108. a 115. (cfr. II.4.A.a.);
III.3.
No mais, rejeitam-se, parcialmente, os recursos interpostos pelos arguidos:
AA(cfr. II.4.D.a.);
CC (cfr. II.4.F.);
GG (cfr. II.4.F.); e
HH (cfr. II.4.C.);
julgando-se, na parte restante, totalmente improcedentes;
Julgam-se totalmente improcedentes os recursos interpostos pelos arguidos:
BB;
DD;
EE; e
FF;
mantendo-se o acórdão recorrido.
Condenam-se cada um dos referidos recorrentes no pagamento das custas da sua responsabilidade, fixando-se a taxa de justiça devida pelo recorrente DD em 3 UC, para cada um dos recorrentes CC e EE em 4 UC e por cada um dos demais em 5 UC.
Caberá ao tribunal recorrido aquilatar se o recorrente AA beneficia ou não do perdão de penas a que aludem os arts. 2.º, n.º 1, e 3.º, n.ºs 1, 2, al. d) e 3, da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08.
Dê conhecimento da presente decisão ao Comandante Territorial Guarda Nacional Republicana de Lisboa (cfr. ref.ª 766122 de 03-07-2025).

Lisboa, 18-11-2025
Pedro José Esteves de Brito
João António Filipe Ferreira
Sandra Oliveira Pinto
_______________________________________________________
1. https://julgar.pt/wp-content/uploads/.../10/021-037-Recurso-mat%C3%A9ria-de-facto.pdf
2. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/458ff4110b557ba080258ac5002d2825?OpenDocument
3. https://files.dre.pt/1s/1995/12/298a00/82118213.pdf
4. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/458ff4110b557ba080258ac5002d2825?OpenDocument
5. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8970d70d6923abef80258a55002dea71?OpenDocument
6. Sendo que a forma contínua de registar as alegações se afigura incorreta, dado que, determinando a lei de processo que são objeto do registo áudio ou audiovisual as alegações orais (cfr. art.º 364.º, n.º 2, do C.P.P.) e sendo estas efetuadas, sucessivamente, pelo Ministério Público, pelos advogados do assistente e das partes civis e por cada dos defensores (cfr. art.º 360.º, n.º 1, do C.P.P.), obviamente cada uma delas tem que ser individualmente identificada na gravação, o que no caso não aconteceu.
7. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/44B7A077108570098025721F004CF184
8. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/c7e5ce62886e3e83802589c900398b8a?OpenDocument
9. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19870007.html
10. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19900023.html
11. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/decsumarias/20150428.html
12. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20150379.html
13. https://hudoc.echr.coe.int/fre#{%22itemid%22:[%22001-57557%22]}
14. https://hudoc.echr.coe.int/eng#{%22itemid%22:[%22001-57465%22]}
15. https://hudoc.echr.coe.int/eng#{%22itemid%22:[%22001-57500%22]}
16. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20080446.html
17. https://files.diariodarepublica.pt/1s/.../02/03000/0093800952.pdf
18. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20150476.html
19. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/f7ad029eab0fb929802581720030f13e?OpenDocument
20. https://files.dre.pt/gratuitos/1s/1992/08/180a00.pdf
21. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/ac1eea1f870c2bf98025739a0037bfc8?OpenDocument
22. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/90c6da39f801d65f8025884b00348994?OpenDocument
23. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/e60ebd1019873e7180258957004e1770?OpenDocument
24. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d6878c2bc7f7366d802589c9002c619e?OpenDocument
25. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/3df566a8bf3ab44580258640005ae93a?OpenDocument
26. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d311fcdd7d64134a802582200055e046?OpenDocument
27. “O serviço descrito relativo a UUUU foi praticado pelo arguido GG a título de favor pessoal, ficando por definir eventual contrapartida.
O arguido GG teve acesso aos elementos de identificação de KKKK uma vez que, no dia 19/07/2014, por via do sistema informático da Guarda Nacional Republicana, acedeu à base de dados do IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, na qual constam todas as cartas de conduções emitidas em Portugal.” (cfr. II.3.B.)
28. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/5bc6203699db7c1380257949005720cc?OpenDocument
29. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/d76cfde457d10b56802585930031fa89?OpenDocument
30. https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/dever
31. https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/poder
32. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/b3059ec6a349334280258cb400479b8e?OpenDocument
33. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/b3c1193a3ee5333d80258c0c004059cb?OpenDocument
34. https://files.dre.pt/1s/1995/12/298a00/82118213.pdf
35. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb0548fc65976b3780257f56003708fe?OpenDocument
36. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9299baa044ce77f8802574f10034758d?OpenDocument
37. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/dfe0c3bfcb71d086802575e10056f0dc?OpenDocument
38. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bd130c74d9153bf280257478005bb232?OpenDocument
39. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/854dfd19bd3f78b3802573e000363505?OpenDocument
40. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d69b3ff056cd3f6480257943005307d7?OpenDocument
41. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/f0c25a9b3537c76f802587670035d4d5?OpenDocument
42. “Enquanto se encontrava com a garrafa na mão, o ofendido XX foi abordado pelo arguido CC que lhe tirou a garrafa e disse que a ia repor no bar. Em tom de brincadeira o ofendido XX disse: “ao menos deixa-me ir bebendo da garrafa”. Logo o arguido CC retorquiu “Estou a ser teu amigo e ainda estás a abusar. Vou-te é por na rua!”. De seguida, o mesmo arguido expulsou da “...” o XX.” (cfr. II.3.B.).
43. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/47eb7e0849111c6580257998003d0cef?OpenDocument
44. https://files.diariodarepublica.pt/1s/2012/04/07700/0206802099.pdf
45. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9ef00b0801a870188025773c004a035a?OpenDocument
46. https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/e199bed9a8ea1bd280258cc300469742?OpenDocument
47. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/a9590b9e5e74c3c7802589fd0039aad7?OpenDocument
48. https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/8aea34f28f7f126780257de10056fbdc?OpenDocument
49. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a64f4961e6c64dd880257460002d2ac5?OpenDocument
50. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0ae30252aba119ee8025710f00448a14?OpenDocument
51. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20020259.html
52. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20040140.html
53. https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20060532.html?impressao=1
54. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/3a0c6311e2b783b88025866b0030cf69?OpenDocument
55. cfr. 00min36s a 00min54s, 06min04s a 06min08s, 16min33s a 18min09s, da gravação do seu depoimento prestado na sessão de 14-06-2024 da audiência de julgamento.
56. cfr. 17min56s a 19min07s da gravação do respetivo depoimento.
57. cfr. 02min36s a 02min40s da gravação do referido depoimento.
58. cfr. 12min30s a 13min12s e 37min50s a 38min12s da gravação do referido depoimento.
59. cfr. 00min06s a 00min51s da gravação do seu depoimento prestado na sessão de 27-09-2024 da audiência de julgamento.
60. cfr. 03min08s a 03min17s da gravação do referido depoimento.
61. cfr. 04min28s a 06min09s da gravação do referido depoimento.
62. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/29ead76469b7dd2580258b230051dd22?OpenDocument
63. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/b21b50009ad2a80380257e0600422332?OpenDocument
64. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/a4c4b27f8c7f93d180257af0003feb9a?OpenDocument
65. cfr. 05min14s a 06min06s da gravação do depoimento prestado pela testemunha na sessão de 04-10-2024 da audiência de julgamento.
66. cfr. 09mon03s a 09min09s da gravação do referido depoimento.
67. cfr. 09min40s a 09min44s da gravação do referido depoimento.
68. cfr. 09min09s a09min19s da gravação do referido depoimento.
69. cfr. 07min44s a 07min55s da gravação do referido depoimento.
70. cfr. 13min30s a 17min53s da gravação do referido depoimento.
71. cfr. 18min44s a 19min03s da gravação do referido depoimento.
72. cfr. 17min53s a 18min18s da gravação do referido depoimento.
73. cfr. 12min48s a 13min01s da gravação do referido depoimento.
74. https://www.dgsi.pt/Jtrl.nsf/e6e1f17fa82712ff80257583004e3ddc/e9806bfa20a094e08025885a002de42b?OpenDocument
75. https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/04a12b72e7498f5980258655004cf69f?OpenDocument
76. https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/-/75CEDD8E125278D280257DE100574FFE
77. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/9fd3b20a669bdc4180258bdb005045b8?OpenDocument
78. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/73ad50e5aadfd1ff802587e3003d0399?OpenDocument
79. cfr. 11min39s a 12min06s da gravação do respetivo depoimento.
80. cfr. 06min21s a 11min39s da gravação do respetivo depoimento.
81. cfr. 11min56s a 11min57s da gravação do respetivo depoimento.
82. cfr. 12h57s a 13min05s da gravação do respetivo depoimento.
83. cfr. 14min58s a 17min10s da gravação do respetivo depoimento.
84. cfr. 09min49s a 09min55s e 25min15s a 25min24s da gravação do respetivo depoimento.
85. cfr. 18min18s a 22min52s da gravação do respetivo depoimento.
86. cfr. 14min39s a 14min58s, 18min35s a 18min48s, 25min24s a 25min34s, 29min00s a 29min45s e 30min22s a 30min30s, da gravação do respetivo depoimento
87. Cfr. 31min02 a 34min06s da gravação do respetivo depoimento
88. cfr. 17min34s a 17min58s e 25min53s a 27min45s da gravação do respetivo depoimento.
89. https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/-/E56638C8EAD44B8E80257DE100574D67
90. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/3f579ea77edb132180258128005456ef?OpenDocument
91. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/e5eed034eb473c2380257db3004dbb26?OpenDocument https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/f97055e17739201d80257e62003405ff?OpenDocument
92. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/e5eed034eb473c2380257db3004dbb26?OpenDocument
93. https://files.dre.pt/1s/.../03/05600/0177601782.pdf
94. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/afeb0630c45d240280258bcb00515c05?OpenDocument
95. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/afeb0630c45d240280258bcb00515c05?OpenDocument
96. O art.º 86.º, n.º 1, al. d), do R.J.A.M., na redação decorrente da Lei n.º 50/2013, de 24-07, vigente à data dos factos (21-11-2017) punia a detenção de munições de armas de fogo independentemente do tipo de projétil utilizado, com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias.
Com a Lei n.º 50/2019, de 24-07, a detenção de munições de armas de fogo passou a ser punida pelo art.º 86.º, n.º 1, al. d), do R.J.A.M., com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias, se referente às constantes do art.º 3.º, n.º 2, als. q) e r), do R.J.A.M., e pelo art.º 86.º, n.º 1, al. e), do R.J.A.M., com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias, se referentes às demais munições de armas de fogo.
97. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4f8f78e27d6cebf180258bea00384a26?OpenDocument
98. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8d23bfe6933133c680258bcb0050fff2?OpenDocument
99. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/cd6d98b804277dc080258a6200375c3b?OpenDocument
100. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/deea6d084a733dfa802588470031b727?OpenDocument
101. http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a04a546a8b81bb3b8025881d00304eca?OpenDocument
102. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/420a969449c83d0f802568fc003a2892?OpenDocument
103. http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/d26ab26fbc63e75e8025875600336a27?OpenDocument
104. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/eef98c5812e6c1d5802568fc003b02d6?OpenDocument
105. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/5694dd5a9db5ffd0802573cc0044a3e6?OpenDocument
106. https://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/1af5e3eec8eddecb80257fae004e7860?OpenDocument
107. https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/cda318f4b73d384a802577d9005b3fc1?OpenDocument
108. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1b61cc6e20ff462380256ee50027f224?OpenDocument
109. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/-/D39BE4CC4BF7BC418025806E004EA324
110. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/5417ca4afdbcc7a780258c9600521d3f?OpenDocument