APELAÇÃO AUTÓNOMA
REJEIÇÃO DE MEIO DE PROVA
Sumário


1. As vicissitudes que surjam no âmbito da prova já deferida e produzida e decisões que sobre as mesmas sejam proferidas (como a título de exemplo acontece com o indeferimento de reclamações a um relatório pericial), não constituem a rejeição de um meio de prova, pois só as decisões que consubstanciam a admissão ou a rejeição da prova em si mesma, ou seja, aquelas em que se julga a admissão ou não de um meio de prova para o processo, podem ser objecto de apelação autónoma e não as que são proferidas no âmbito das vicissitudes que ocorram na sua produção.
2. Não estando em causa na decisão recorrida a “rejeição de um meio de prova”, o qual foi deferido, mas apenas esclarecimentos às informações já fornecidas, a mesma não é susceptível de apelação autónoma nos termos do artigo 644º n.2 al. d) do CPC.

Texto Integral


ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 3ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES
 
I. RELATÓRIO 
 
Na acção declarativa em que é autor EMP01..., Ld.ª e são réus AA (advogado em causa própria) e BB, e no qual é peticionada a condenação destes no pagamento à autora da quantia de € 6.024,44, acrescida dos juros vincendos,  no decurso dos autos, veio a ser proferido pelo tribunal a quo, o despacho com o teor que se passa a transcrever, referência ...27, na sequência de um requerimento apresentado pelo réu: 

«Os Réus vêm requerer que o Conselho Disciplinar Nacional da O.E.T. se pronuncie nos termos seguintes: 
“Dado os serviços prestados e nomeadamente descritos nos artigos 18, 19, 26, 27 e 30 da Petição Inicial ; 
E dada a falta de utilidade de tais serviços para o cliente conforme consta nomeadamente nos artigos 31, 32, 33, 34, 35 e 36 da Petição Inicial; Foi ou não adequada a fixação da remuneração no valor de €5.719,50, constante na fatura n.º ...99 ? 
E, no caso negativo, qual o valor adequado para a respetiva remuneração dos serviços prestados considerando a falta de utilidade de tais serviços para o cliente?” 
Compulsados os autos, verifica-se que a Ordem dos Engenheiros Técnicos já respondeu ao Ofício datado de 30/08/2024. 
Ora, a pretensão dos réus vertida no requerimento de 27/09/2024 não tem interesse para o objeto em causa nos presentes autos, não sendo este o meio adequado para aferir de qualquer responsabilidade disciplinar. 
Deverão os réus lançar mão do procedimento adequado aos seus intuitos.»  Inconformado com tal despacho veio o réu interpor o presente recurso. 
Por despacho proferido nos autos ref.ª ...22, foi o recurso admitido como apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo nos termos dos artigos 644, nº2, al. d), 638, n. º1, 645, n.º 2 e 647, n.º 1 todos do CPC). 

*
Subidos os autos a este Tribunal da Relação foi proferido despacho ao abrigo do disposto pelos artigos 655º n.1 e 3º, n.3 ambos do CPC, determinando a notificação das partes para que, querendo, se pronunciassem sobre a falta dos pressupostos legais para admissão de apelação autónoma do despacho sindicado.
Apenas o recorrente se pronunciou, arguindo “que se afigura evidente que o recurso visa a realização / concretização do respetivo meio de prova requerido.”
*
Foi então proferida decisão sumária, que não admitiu o recurso interposto pelo apelante, por considerar não ser susceptível de apelação autónoma.
*
Dessa decisão veio o apelante interpor reclamação para o S.T.J. a qual foi convolada em reclamação para a conferência, nos termos do artigo 652º n.1 e n.3, do CPC.

Na reclamação que apresentou, o apelante, para fundamentar a sua admissão, e depois de descrever as vária incidências processuais sobre os pedidos de informação e esclarecimentos que tem vindo a requerer nos autos, conclui (transcrição): (…)  
«C. Fica assim plenamente demonstrado que a Decisão sub judice, (da M.ma Juiz de primeira Instância), põe em causa o meio de prova requerido pelos ora reclamantes sob a al. B) da sua Contestação! ISTO É,
A Decisão sub judice impede que a O.E.T. preste as informações requeridas pelos ora reclamantes como meio de prova requerido pelos ora reclamantes sob a al. B) a sua Contestação.
D. A Decisão sub judice “anula” ou “impede” a execução do meio de prova requerido sob a al. B) da Contestação!
E. O pedido de informação feita à O.E.T., que foi indeferido pela M.ma Juiz na primeira Instância, cuja Decisão é objeto de Recurso sub judice, foi assim feita à O.E.T. como esclarecimento do pedido constante na al. B) da Contestação.
Como esclarecimento e para execução do meio de prova requerido sob a al. B) da Contestação do ora reclamantes.
F. Pelo que a Decisão do Tribunal da Relação de Guimarães se traduz numa clara injustiça, ao rejeitar o Recurso interposto ao abrigo do disposto no artigo 644.º, n.º 2, al. d) do C.P.C.
G. Foi violado o disposto no artigo 644.º, n.º 2, al. d) do C.P.C.
Tal disposição deveria ter sido interpretada e aplicada e com o sentido de que o pedido de esclarecimento objeto do Recurso visou precisamente o esclarecimento da execução do meio de prova requerido sob a al. B) da Contestação dos ora reclamantes – o que põe em causa ou rejeita esse meio de prova requerido pelos ora reclamantes sob a al. B) da sua Contestação.

Termos em que requer a V. Exc.ªs a procedência da presente RECLAMAÇÃO, admitindo-se o Recurso interposto. »
 
-II- Objecto

A única questão a decidir consiste em saber se se verificam os requisitos para admissão do recurso interposto nos termos do artigo 644º n.2 al. d), do C.P.C. 
* Colhidos os vistos, cabe apreciar.
*
III. Fundamentação de facto:

i. As incidências fáctico-processuais a considerar são as descritas no relatório.
Apelações em processo comum e especial (2013)
Acrescem as seguintes, que resultam da consulta electrónica dos autos:
 
ii. no despacho saneador proferido em 11.07.2023, o qual foi notificado às partes
em 11.07.2023, foram apreciados e admitidos os requerimentos probatórios apresentados pelas partes, entre os quais e como aí se refere: «a prova pericial
requerida pelos réus (cfr. artigos 475.º e 476.º, n.º 1 do Código de Processo Civil), a ser solicitada à Ordem dos Engenheiros Técnicos, tendo como objecto os actos apresentados pela autora na sua nota de honorários e respectivo valor, devendo ser remetidos àquele Organismo os elementos processuais que entenda pertinentes, se necessário com solicitação aos processos em que os serviços foram prestados (melhor identificados na petição inicial).» 
iii. Em resposta apresentada nos autos em 29.08.2023, veio a OET
(Ordem dos Engenheiros Técnicos) apresentar a seguinte resposta: 
«OET – Ordem dos Engenheiros Técnicos, associação de direito público, aqui representada pelo Presidente da Direção da Seção Regional ..., Eng.º Tec.º CC, notificado do despacho do MM Juiz, de fls., vem informar: 
A OET não avalia, nem se pronuncia, relativamente à fixação de honorários por parte de serviços prestados pelos seus membros. 
De acordo com as regras comunitárias de concorrência no mercado de serviço está restringida a fixação de honorários, pelo que, a Ordem dos Engenheiros Técnicos não tem competência para tecer qualquer recomendação a não ser a de alertar os seus membros para cumprirem nesta matéria o estabelecido na alínea d) do art.º 56º do Estatuto da Ordem, anexo à Lei 157/2015, de 17 de setembro, foi criada pela Lei 47/2011, de 27 de Junho, i.e., “Fixar uma remuneração adequada ao serviço prestado”.» 
iv. Na sequência da referida resposta, foi proferido nos autos o seguinte despacho em 14.09.2023: 
«Notifique as partes para, em 10 dias, se pronunciarem sobre o requerimento apresentado pela ordem dos engenheiros, com a cominação de que nada dizendo ficará prejudicada a realização da perícia.» 
 
v. Perante o referido despacho e em resposta veio o réu, em 9.10.2023, arguir e requerer: 
«1. Conforme carta de Notificação constante na referência CITIUS 186089661 de 20-...23 foi solicitado à Ordem dos Engenheiros Técnicos orçamento para realização de Perícia sobre o seguinte objeto: 
“Os atos apresentados pela Autora na sua nota de honorários e respetivo valor”. 
2. Mas erradamente, pois na Contestação não foi requerida a realização de qualquer
Perícia… 
3. E muito menos sobre qualquer Nota de Honorários, que não existe (!). 
4. Trata-se de evidente erro ou lapso havido na redação da Notificação remetida para a Ordem dos Engenheiros Técnicos, constante na referência CITIUS 186089661 de 20-07-2023. 
5. NA REALIDADE, conforme se constata na página 9 da Contestação, sob a al. “B”, os Réus apenas requereram que a Ordem dos Engenheiros Técnicos prestasse informações (!), (conforme aqui se reproduz): 
“B – REQUER a V. Exc.ª seja solicitado à ORDEM DOS ENGENHEIROS TÉCNICOS, com sede na Rua ..., ... ..., sendo remetida para o efeito cópia da presente petição inicial, informação sobre quais os valores que os Engenheiros Técnicos Civis deverão cobrar pela prestação dos seus serviços, ou indicação das respetivas tabelas de remuneração, Bem como informação ou parecer sobre a justeza do valor peticionado e se o mesmo está ou não em conformidade com tabelas de remuneração ou outros elementos ou critérios que devem obedecer os Engenheiros Técnicos Civis na fixação dos valores a cobrar pela prestação dos seus serviços.”. 
6. EM CONSEQUÊNCIA do erro ou lapso constante na redação da indicada Notificação remetida para a Ordem dos Engenheiros Técnicos não pôde a Ordem dos Engenheiros Técnicos apreciar os indicados pedidos de informação formulados pelos Réus, (constantes da página 9 da Contestação) – e apenas indicou, (embora indicando erradamente o artigo 56º em vez do artigo 97º do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos), que os seus membros devem aos seus clientes: 
“Fixar uma remuneração adequada ao serviço prestado”. 

REQUER A V. EXC.ª seja de novo notificada a Ordem dos Engenheiros Técnicos para prestar as exatas informações requeridas sob o ponto “B” do requerimento de PROVA dos Réus, (constante da página 9 da sua Contestação) e que aqui se transcrevem: 

“B – REQUER a V. Exc.ª seja solicitado à ORDEM DOS ENGENHEIROS TÉCNICOS, com sede na Rua ..., ... ..., sendo remetida para o efeito cópia da presente petição inicial, informação sobre quais os valores que os Engenheiros Técnicos Civis deverão cobrar pela prestação dos seus serviços, ou indicação das respetivas tabelas de remuneração, 
Bem como informação ou parecer sobre a justeza do valor peticionado e se o mesmo está ou não em conformidade com tabelas de remuneração ou outros elementos ou critérios que devem obedecer os Engenheiros Técnicos Civis na fixação dos valores a cobrar pela prestação dos seus serviços.”. 
MAIS REQUER A V. EXC.ª seja solicitado à Ordem dos Engenheiros Técnicos que informe qual o órgão competente para controlar / fiscalizar se a remuneração fixada por um dos seus membros a um cliente é ou não adequada ao serviço prestado – conforme prescreve o artigo 79º, al. d), do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos.» 
 
vi. Apreciando este requerimento do réu, o tribunal a quo, proferiu em
14.11.2023, o seguinte despacho: 
«Com cópia do requerimento do réu de 9.10.2023, solicite os esclarecimentos requeridos à Ordem dos Engenheiros Técnicos.» 
 
vii. Em 11.12.2023, a OET respondeu a tal notificação nos seguintes termos: 
«OET – Ordem dos Engenheiros Técnicos, associação de direito público, aqui representada pelo Presidente da Direção da Secção Regional ..., Eng.º Tec.º CC, tendo sido novamente notificada do despacho do MM Juiz, de fls., vem informar: 
Reitera a informação prestada ao MM Tribunal a quo, no passado dia 18 de agosto, do seguinte teor: 
A OET não avalia, nem se pronuncia, relativamente à fixação de honorários por parte de serviços prestados pelos seus membros. 
De acordo com as regras comunitárias de concorrência no mercado de serviço está restritíssima a fixação de honorários, pelo que a Ordem dos Engenheiros Técnicos não tem competência para fazer qualquer recomendação, a não ser a de alertar os seus membros para cumprirem nesta matéria o estabelecido na alínea c) do art.º 56º do Estatuto da Ordem, anexo à Lei 157/2015, de 17 de setembro, foi criada pela Lei 47/2011, de 27 de Junho, i.e., "fixar uma remuneração adequada ao serviço prestado". 
Conforme melhor elenca a alínea c) do artigo 79º (artigo 56.º da anterior versão), do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos, sob a epígrafe, "Deveres do engenheiro técnico para com a entidade empregadora e para com o cliente", que parte dos deveres (deontológicos) dos engenheiros técnicos, a fixação uma remuneração adequada ao serviço prestado. 
Atentas as referidas regras comunitárias, não é possível por parte da OET a referida avaliação, sob pena da Ordem dos Engenheiros Técnicos vir a ser condenada pela Autoridade de Concorrência Nacional ou pelas instituições comunitárias no pagamento de uma coima e compelida a publicitar tal condenação junto dos seus membros. 
Contudo, poderá consultar o Regulamento de honorários para arquitetos e engenheiros – HOAI, publicado no site da Ordem dos Arquitetos, com a respetiva autorização, alertando que o referido documento não constitui nenhuma orientação específica da OET para os seus membros relativamente ao estabelecimento de uma tabela de honorários, pretendendo antes constituir um elemento informativo relativamente a organizações suas congéneres no espaço europeu.  É quanto cumpre informar.» 
 
viii. Na sequência desta resposta veio novamente o réu, em 16.1.2024, apresentar requerimento no qual, após extensa alegação, conclui no ponto 11. desse requerimento, nos seguintes termos: 
«11. A Ordem dos Engenheiros Técnicos diz que não fiscaliza / controla a fixação adequada realizada pelos Engenheiros Técnicos dos honorários relativos aos serviços por eles prestados… 
Mas, a ser assim, poderá a Ordem dos Engenheiros Técnicos certamente informar, COM CLAREZA qual a entidade que controla / fiscaliza a fixação dos honorários dos Engenheiros Técnicos pelos serviços por eles prestados,… 
(Porque não acreditamos que o estabelecido na al. d) do artigo 79º do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos constitua letra morta !). 
É este o esclarecimento complementar que se pretende seja prestado pela Ordem dos Engenheiros Técnicos, DE FORMA CLARA, para que seja dado cabal cumprimento ao que foi requerido pelo R. e deferido por V. Exc.ª. Esclarecimento complementar que requer a V. Exc.ª seja solicitado à Ordem dos Engenheiros Técnicos.» 
 
ix. Na sequência deste requerimento o tribunal a quo, em 15.02.2024, proferiu o seguinte despacho: 
«Ref. ...27: Com cópia do requerimento de 16-01-2024, notifique a OET para, em 10 dias, esclarecer se em caso de necessidade de se apurar se a remuneração fixada por um dos seus
Apelações em processo comum e especial (2013)
membros é ou não adequada, nos termos fixados pelo artigo 79.º, al. d) do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos, se dispõem de algum mecanismo de aferição (laudo) e qual a entidade que o realiza. 
Notifique.» 
 
x. Na sequência da notificação efectuada, veio a OET em 18.04.2024, apresentar resposta nos seguintes termos: 
«OET – Ordem dos Engenheiros Técnicos, associação de direito público, aqui representada pelo Presidente da Direção da Secção Regional ..., Engº Técº CC, vem informar, na sequência do constante aos autos de 05 de dezembro de 2023 que não dispõe de mecanismo de aferição (laudo) nem de qualquer entidade que o realize.
» 
xi. Perante a resposta da OET, veio mais uma vez o réu em 6.05.2024, requerer agora: 
«1. No requerimento do requerente de 16/01/2024, constante na referência CITIUS
...27 de 16/01/2024, (cuja cópia foi remetida à OET, em conformidade do Douto Despacho de V. Exc.ª de 20/03/2024, constante na referência CITIUS 189792485 de 20/03/2024), foi solicitada à OET que informasse qual a entidade que fiscaliza / controla a justeza da fixação dos honorários realizada por um seu membro, (que conforme prescrito no artigo 79º, al. d) do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos deverá ser adequada ao serviço prestado) – tudo conforme está narrado claramente nomeadamente nos artigos 4 e 5 do referido requerimento do requerente de 16/01/2024. 
2. Respondendo veio agora a OET dizer que não dispõe de mecanismo de aferição (laudo) nem de qualquer entidade que o realize. 
3. Mas a OET não respondeu à pergunta que lhe foi feita e constate no indicado Douto Despacho de V. Exc.ª de 20/03/2024, e que se transcreve: “Qual a entidade que realiza a fiscalização / controlo do cumprimento do artigo 79º, al. d) do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos”. 
4. A OET não alega não poder prestar a informação nem desconhecer qual é a entidade que realiza a indicada fiscalização / controlo – mas não presta a informação requerida, deixando assim de colaborar com o Tribunal. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
5. A omissão desta informação – “qual é a entidade que controla / fiscaliza a justeza dos honorários fixados por um dos seus membros” – consubstancia uma recusa ilegítima, em desobediência do dever de colaboração com o Tribunal. 
6. Mas o Tribunal tem “força” para fazer cumprir as suas determinações. 
Termos em que deverá a OET ser notificada para, sob pena de multa, informar nos autos qual a entidade que controla / fiscaliza o dever deontológico dos Engenheiros Técnicos de “fixar uma remuneração adequada ao serviço prestado”. 
 
xii. Em 2.07.2024 o tribunal a quo proferiu despacho, deferindo o requerido nos seguintes termos:
«Com cópia do requerimento que antecede notifique a Ordem dos Engenheiros Técnicos para, em 10 dias, informar qual a entidade que controla/fiscaliza, em cumprimento do artigo 79º
al. d) do Estatuto da Ordem dos Engenheiros Técnicos , o dever deontológico dos Engenheiros Técnicos “de fixar uma remuneração adequada ao serviço prestado”.
 xiii. Em resposta, a 11.09.2024, a OET apresentou informação aos autos, com o seguinte teor:
«1. A Ordem dos Engenheiros Técnicos é, nos termos do artigo 1º do estatuto, anexo à Lei nº 157/2015, de 17 de setembro, alterada pela Lei nº 70/2023, de 12 de dezembro, a associação pública profissional representativa dos profissionais que exercem a profissão de engenheiro técnico.
2. Conforme disposto nos artigos 2º e 3º, alínea d), do estatuto, respetivamente, a Ordem tem por missão exercer o poder disciplinar sobre os engenheiros técnicos e, por atribuição, promover a defesa e o respeito pelos princípios deontológicos dos seus membros.
3. Sendo certo que, estas missão e atribuição da Ordem dos Engenheiros Técnicos são-lhe conferidas em regime de exclusividade pela lei, ou seja, pelo seu próprio estatuto, e pela Lei nº 2/2013, de 10 de janeiro, alterada pela Lei nº 12/2023, de 28 de março, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais.
4. A ação disciplinar da Ordem sobre os seus membros, de acordo com o disposto no argo 90º, nº 1 do respectivo estatuto, é desencadeada pelo órgão competente para a instauração do processo disciplinar (o Conselho Disciplinar Nacional, artigo 37ºA, nº 2, alínea a), do estatuto), mediante os factos suscetíveis de integrarem infração disciplinar que cheguem ao seu conhecimento, oficiosamente ou tendo por base queixa, denúncia ou participação apresentada por pessoa devidamente identificada.
5. Do exposto nos pontos anteriores, e tendo em conta os precisos termos da questão colocada, conclui-se o seguinte:
a. A Ordem dos Engenheiros Técnicos exerce a ação disciplinar sobre os seus membros
através do Conselho Disciplinar Nacional, e mediante os factos suscetíveis de integrarem infração disciplinar de que tenha conhecimento;
b. A Ordem dos Engenheiros Técnicos, e tampouco qualquer outra entidade, dispõe da atribuição ou da competência para controlar/fiscalizar, isto no sentido de planear e ou executar ações de controlo ou inspetivas, sobre o cumprimento dos deveres deontológicos dos seus membros, designadamente o dever de fixar uma remuneração adequada ao serviço prestado, estabelecido no argo 79º, alínea d), do estatuto da Ordem.»
 
xiv. Na sequência da referida resposta, veio o réu apresentar novo requerimento em 27.09.2024, com os seguintes termos:
« A- Dispõe o artigo 82.º, n.º 1 do Estatuto da O.E.T., (Lei n.º 157/2015 de 17 de setembro, alterada pela Lei n.º 70/2023 de 12 de dezembro), que:
“1- Considera-se infração disciplinar toda a ação ou omissão de qualquer membro da Ordem que viole os deveres consignados no presente Estatuto ou nos respetivos regulamentos.”, (sublinhado nosso).
E entre os deveres de qualquer membro da O.E.T., dispõe o artigo 79.º al. d) do Estatuto da O.E.T., (Lei n.º 157/2015 de 17 de setembro, alterada pela Lei n.º 70/2023 de 12 de dezembro), que:
“São deveres do engenheiro técnico para com a entidade empregadora e o cliente:
d) Fixar uma remuneração adequada ao serviço prestado.”, (sublinhado nosso).
B- E sobre o exercício da respetiva ação disciplinar, dispõe o n.º 2 do artigo 88.º do citado estatuto da O.E.T., que:
“2- Os tribunais e quaisquer autoridades devem dar conhecimento à Ordem da prática, por membros, de factos suscetíveis de constituírem infração disciplinar.”, (sublinhado nosso).
C- Compete ao Conselho Disciplinar Nacional, ao abrigo do disposto no artigo 37.º-A, n.º 2, al. a) do Estatuto da O.E.T., que estatui:
“a) Instruir e julgar os processos disciplinares que digam respeito aos membros da Ordem, às pessoas coletivas e aos profissionais em livre prestação de serviços, sem prejuízo dos que são da competência do conselho jurisdicional”.
E assim, considerando que “os factos” suscetíveis de constituir infração disciplinar são os constantes da Petição Inicial, nomeadamente nos artigos 18, 19, 26, 27, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36 e
37, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, requer a V. Exc.ª que seja remetida à O.E.T., (Conselho Disciplinar Nacional), cópia deste requerimento e da Petição Inicial e dos documentos nela juntos, a fim de que o Conselho Disciplinar Nacional da O.E.T. se pronuncie nos termos seguintes:
Dado os serviços prestados e nomeadamente descritos nos artigos 18, 19, 26, 27 e 30 da Petição Inicial ;
E dada a falta de utilidade de tais serviços para o cliente conforme consta nomeadamente nos artigos 31, 32, 33, 34, 35 e 36 da Petição Inicial ;
Foi ou não adequada a fixação da remuneração no valor de €5.719,50, constante na fatura n.º ...99 ?
E, no caso negativo, qual o valor adequado para a respetiva remuneração dos serviços prestados considerando a falta de utilidade de tais serviços para o cliente ? »
 
xv. Em apreciação deste novo requerimento, foi proferido o
despacho recorrido que indeferiu o requerido nos termos transcritos no relatório.  
*
i. Fundamentação: 
 
Está em causa na presente reclamação para a conferência, aferir se deve ser mantido o despacho proferido pela ora relatora que rejeitou o recurso interposto pelo apelante da decisão que indeferiu o requerimento por si apresentado (indicado no ponto xiv.), por deste não caber apelação autónoma, nos termos do artigo 644º n.2 al. d) do C.P.C.
 
O reclamante reitera a admissão da apelação, sustentando-a no artigo 644º n.2 al.
d) do CPC, por, em seu entender, o indeferimento do novo esclarecimento por si pretendido impedir a prestação de informações pela OET e a execução do meio de prova por si requerido.

Vejamos:
Diz-nos este normativo (644º n.2 al.d)), que cabe recurso de apelação do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova.
Analisada a descrição factual sobre as sucessivas incidências processuais dos autos relativamente à prova requerida pelo réu na sua contestação (al.B), ressalta, a nosso ver, de forma evidenciadora, a manifesta improcedência da reclamação.
De facto, como resulta claramente, desde logo, dos pontos indicados em ii. a vi., o tribunal a quo deferiu o meio de prova requerido pelo réu, inicialmente e por assim ter interpretado o por aquele requerido, a realização de uma perícia e, depois, perante o esclarecimento daquele de que o que pretendia com o requerido era a prestação de informações sobre a justeza do valor peticionado na acção a título de honorários e sua conformidade com as tabelas de remuneração ou outros critérios a que a mesma deva obedecer (vide ponto v.), o tribunal voltou a deferir o requerido e notificou a entidade requerida (OET) para prestar as ditas informações.
Em suma, a diligência probatória requerida pelo réu foi deferida pelo tribunal a quo. 
O facto de o réu não aceitar as reiteradas informações prestadas pela OET (mormente, sobre a inviabilidade de poder apreciar e pronunciar-se sobre a fixação de honorários pelos seus membros e, no caso, sobre os da A.), na sequência do deferimento pelo tribunal dos sucessivos (durante cerca de um ano) pedidos de esclarecimento feitos pelo réu na sequência das respostas que iam sendo dadas por aquela Ordem (vide pontos vii., xi. e xiii.), não converte o indeferimento de mais um pedido de esclarecimentos (aliás, já respondido por aquela instituição) em rejeição de meio de prova.
De facto, o que está em causa no despacho recorrido não é um “despacho de rejeição de meio de prova” que seja susceptível de apelação autónoma nos termos do disposto pela al. d) do artigo 644º n.1 do C.P.C., já que os meios de prova requeridos (entre os quais a prestações de informações por esta entidade terceira) há muito foram admitidos pelo tribunal a quo. 
O despacho recorrido limitou-se, tão só, no âmbito das respostas já fornecidas por aquela entidade (OET), a indeferir o requerimento do réu, que, não aceitando mais uma vez, a resposta/ informação dada por aquela entidade, pretende novamente a sua notificação, agora com a cominação de multa, para que aquela preste a informação que pretende, não obstante a resposta já dada, aliás, reiteradamente e de forma fundamentada, quanto às questões solicitadas (esclarecendo que não as podia dar, que não era a entidade competente para o efeito e que não tinha mecanismo de aferição (laudo) nem qualquer entidade que o realize). 
Ora, o indeferimento deste último requerimento, não configura a rejeição de um meio de prova, mas um acto de gestão processual no âmbito das sucessivas questões que, com todo o respeito, vêm sendo reiteradamente suscitadas pelo réu quanto à informação que a mesma já prestou nos autos (no âmbito do deferimento da sua notificação para o efeito) e, bem assim, sobre a sua inutilidade para o objecto da lide. 
As vicissitudes que surjam no âmbito da prova já deferida e produzida e decisões que sobre as mesmas sejam proferidas (como a título de exemplo acontece com o indeferimento de reclamações a um relatório pericial), não constituem a rejeição de um meio de prova, pois só as decisões que consubstanciam a admissão ou a rejeição da prova em si mesma, ou seja, aquelas em que se julga a admissão ou não de um meio de prova para o processo, podem ser objecto de apelação autónoma e não as que são proferidas no âmbito das vicissitudes que ocorram na sua produção, como é amplamente exposto na jurisprudência a propósito de diverso  tipo de provas, de que a título de exemplo citamos: Ac. R.C. de  09 Janeiro 2024 processo 58/19.9T8GRD-A.C1;  Ac. RL 2.05.2023,
752/21.4T8LSB-B.L1-7; RP 12.07.2023, processo 15877/20.5T8PRT-A.P1, in www.dgsi.pt. 

Desta forma, não estando em causa na decisão recorrida a “rejeição de um meio de prova”, a mesma não é susceptível de apelação autónoma nos termos do artigo 644º n.2 al. d) do CPC, nem nas demais alíneas previstas no referido normativo
Termos em que o recurso interposto teria de ser rejeitado, por não ser admissível apelação autónoma, o que conduz à improcedência da reclamação para a conferência e manutenção do despacho reclamado.
*
III - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em manter a decisão de não admissão do recurso interposto, por o mesmo não ser susceptível de apelação autónoma, indeferindo-se a reclamação apresentada.
Custas pelo Reclamante.
 
Guimarães, 20 de Novembro, de 2025

Elisabete Coelho de Moura Alves (relatora)
Conceição Sampaio
Paula Ribas