MATÉRIA DE FACTO
PERSI
QUESTÃO NOVA
Sumário


I - A parte que impugne a decisão da matéria de facto não está dispensada de indicar os meios de prova em que se suporta e de efetuar a análise crítica da prova, já que pretendendo contrariar a apreciação crítica da prova feita pelo Tribunal terá de apresentar razões objetivas para contrariar a prevalência dada a um meio de prova sobre outro ou a sua concreta valoração, não bastando a mera indicação do que considera que ficou provado.
II - Mesmo no caso de o cliente bancário ter sido anteriormente integrado em PERSI já extinto não existe obstáculo a que venha novamente a beneficiar desse regime, caso se encontrem reunidos os necessários pressupostos normativos para esse efeito.
III - Os recursos têm por escopo a reapreciação de decisões já proferidas e não a sindicância de questões novas, exceto, conforme tem vindo a ser entendido, estas sejam de conhecimento oficioso e o processo tenha todos os elementos necessários para a sua apreciação.

Texto Integral


Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. Relatório (com base no relatório da sentença recorrida)

AA, Executada nos autos principais de que os presentes constituem apenso, deduziu embargos de executado à execução intentada por EMP01..., S.A., pedindo, a final, que sejam julgados procedentes, e em consequência seja a Embargante absolvida do pedido exequendo.
Invoca, para tanto, em síntese: [i] a ilegitimidade ativa da Exequente; [ii] a ineptidão do requerimento executivo; [iii] a falta de integração no PERSI; [iv] o pagamento de todas as quantias em dívida à cedente Banco 1..., S.A.; [v] sem prescindir da verificação do pagamento alegado, a prescrição do crédito exequendo e respetivos juros; [vi] a nulidade das cessões de créditos por ter sido realizada sem a prévia intervenção dos mutuários no PERSI.
Cumulou com os Embargos de Executado a oposição à penhora, alegando que a penhora da fração autónoma designada pela letra ..., destinada a habitação, sita no ......, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...56, e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo ...77, é ilegal por excessiva e em flagrante violação do princípio da proporcionalidade, tratando-se, ademais, da habitação da Embargante.

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A Embargada/Exequente EMP01..., S.A. apresentou contestação, pugnando pela improcedência dos embargos deduzidos bem como da oposição à penhora. Excecionou ainda o abuso de direito da Embargante ao invocar a falta de integração no PERSI, alegando que apesar de até ter sido cumprido o procedimento de Extrajudicial de regularização de situações de incumprimento, já antes existiu negociação da dívida com o credor originário, tendo sido mesmo alcançado acordo.
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A Embargante exerceu o contraditório quanto à exceção de abuso de direito, na audiência prévia, tendo a mesma pugnado pela improcedência da exceção. Foi proferido despacho saneador no âmbito do qual foram julgadas improcedentes as exceções de ilegitimidade ativa e de ineptidão do requerimento executivo.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e   foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“A) Julgo a verificada a excepção dilatória de falta de comunicação da integração no PERSI dos Executado(a)(s) mutuários e em consequência absolvo a Embargante AA e os Co- Executados (habilitados no lugar do Co-Executado mutuário BB), da instância executiva, ordenando a extinção da execução, bem como o consequente levantamento das penhoras efectuadas.
B) Condeno a Exequente/ Embargada nas custas devidas quer dos presentes Embargos de Executado, quer da execução. ”.

Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso de apelação a embargada, a qual, a terminar as respetivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):

“A. A recorrente impugna a matéria de facto, porquanto considera dever considerar-se provados os seguintes factos:
- O envio da carta pelo Banco Mutuante aos Executados, de integração no PERSI e posterior extinção, logo impõe-se decisão diferente quanto à procedência da exceção dilatória inominada.
B. De facto, verificando-se o cumprimento pelo Banco mutuante de integração dos Executados no PERSI, deverão os embargos improceder quanto a esta alegação.
C. De todo o modo, e sem prescindir do alegado supra, entende a ora Recorrente que, mesmo sem a prova de integração dos Executados no PERSI, não deverá a oposição à execução proceder.
D. Ficou provado o incumprimento dos Embargantes/Executados, sendo que, existem provas de reestruturação dos créditos.
E. Foram realizados acordos de regularização já aqui referidos e junto com a petição inicial - a 29.05.2012, um acordo adicional ao contrato de mútuo com hipoteca a contrato de créditos à habitação – Aquisição – Regime de Crédito Bonificado, no qual as partes acordaram alterar as cláusulas relativas ao “Reembolso” e “Alterações” constantes do Documentos Complementar anexo à escritura – pelo que foi apresentada uma proposta de regularização pela Banco 1... adequada à necessidade da Embargada e dos mutuários na altura, tendo as condições sido renegociadas.
F. Certo é que não existem quaisquer pagamentos por parte dos Executados para regularização do crédito ou prova de entrega de documentação pertinente.
G. Também deverá exigir-se aos clientes bancários a gestão das suas obrigações de crédito de forma responsável, devendo estes colaborar na procura de soluções extrajudiciais para o cumprimento das suas obrigações.
H. Acresce que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 17.º do referido diploma legal, o PERSI pode ser extinto pela instituição de crédito se existir penhora a favor de terceiros sobre bens do devedor.
I. Sucede que, encontravam-se registadas penhoras a favor da Fazenda Nacional, bem como a favor de terceiro (CC), sobre o prédio objeto de garantia, conforme certidão predial junta com o requerimento executivo.
J. Pelo que, não se verifica pertinência no início de um procedimento que pode, desde logo, ser encerrado face à existência de penhoras registadas.
K. Por todo o supra exposto, concluiu-se, s.m.o., que não assiste razão ao entendimento do douto Tribunal.
Termos em que, e nos mais de Direito que V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, doutamente suprirão, deverá o presente Recurso ser julgado procedente, fazendo assim uma vez mais, a costumada JUSTIÇA! ”.

A Apelada AA contra-alegou, terminando com as seguintes conclusões:
“I. A sentença recorrida julgou procedentes os embargos, por verificada a exceção dilatória inominada resultante da falta de comunicação e integração dos mutuários no PERSI, extinguindo a execução e ordenando o levantamento das penhoras.
II. A Recorrente não logrou provar o cumprimento dos deveres impostos pelo DL n.º 227/2012, nomeadamente a efetiva notificação da integração e extinção do PERSI em suporte duradouro.
III. A mera junção de cartas simples, sem registo, aviso de receção ou outro meio idóneo de comprovar o envio e receção, é insuficiente para demonstrar a comunicação exigida por lei.
IV. O ónus da prova da integração no PERSI recai sobre a instituição de crédito (art. 17.º-A, n.º 1 do DL 227/2012).
V. A jurisprudência maioritária, designadamente dos Tribunais da Relação e do STJ, considera que a falta dessa prova constitui exceção dilatória que obsta à execução e à cessão do crédito.
VI. As penhoras invocadas pela Recorrente são irrelevantes: não substituem o cumprimento das obrigações impostas às instituições de crédito pelo regime do PERSI.
VII. O art. 17.º, n.º 2, al. a), do DL 227/2012 apenas admite a extinção de um procedimento PERSI já instaurado, e não a dispensa da sua instauração.
VIII. No caso concreto, o procedimento nunca foi iniciado, pelo que não pode a Recorrente invocar causa de extinção de algo inexistente.
IX. As renegociações de 2012 invocadas pela Recorrente não equivalem à integração no PERSI, pois ocorreram antes da entrada em vigor do diploma e antes do incumprimento que deu origem à execução.
X. A sentença recorrida aplicou corretamente os arts. 14.º, 17.º e 18.º do DL 227/2012, bem como os arts. 576.º, 577.º e 278.º, n.º 1, al. e) do CPC, concluindo pela falta de pressuposto processual essencial à prossecução da execução.
XI. Não se verifica erro de julgamento nem vício de fundamentação na decisão sobre a matéria de facto.
XII. Deve, pois, o recurso ser julgado improcedente, confirmando-se integralmente a sentença recorrida que declarou a exceção dilatória e a consequente extinção da execução.
Termos em que, e nos mais de Direito que Vossas Excelências suprirão, requer-se a V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, que seja julgado improcedente o recurso de apelação interposto, mantendo-se na íntegra a sentença recorrida que julgou verificada a exceção dilatória de falta de comunicação da integração no PERSI dos Executado(a)(s) mutuários e em consequência absolveu a Embargante AA e os Co- Executados (habilitados no lugar do Co-Executado mutuário BB), da instância executiva, ordenando a extinção da execução, bem como o consequente levantamento das penhoras efetuadas, e condenou a Exequente/ Embargada nas custas devidas quer dos presentes Embargos de Executado, quer da execução, fazendo-se, assim, a costumada Justiça!”.
O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Questões a decidir

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em analisar o seguinte:

1. Alteração da matéria de facto;
2. Se em face dessa eventual ou não alteração deve a solução jurídica ser distinta da decisão recorrida, mais especificamente se merece provimento o recurso.
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III. Fundamentação de facto

Na decisão apelada, foi dado como provado o seguinte:
“1. EMP01..., S.A. instaurou, em 28-04-2022, a execução sumária para pagamento da quantia de 83 090,63 € (Oitenta e Três Mil e Noventa Euros e Sessenta e Três Cêntimos) de que estes autos são apenso contra BB e AA.
2. Como título executivo juntou:
a) A escritura pública denominada COMPRAS E VENDAS E MÚTUO COM HIPOTECA, de 22 de Abril de 1994, inscrito no livro de notas para escrituras diversas n.º ...30-C de fls. 57 a 60 verso do 2.º Cartório, outorgada na Secretaria Notarial ... entre a Banco 1..., S.A. e os Executados BB e AA – junto com o RE como doc. 4 (escritura pública e documento complementar) cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
b) O documento particular denominado CONTRATO DE MÚTUO N.º ... celebrado, em ../../2012, entre a Banco 1..., S.A. e os Executados BB e AA – junto com o RE como doc. 3 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
3. Na sequência da escritura pública denominada COMPRAS E VENDAS E MÚTUO COM HIPOTECA identificada em 2. a), a Banco 1..., S.A. concedeu ao mutuários BB e AA a quantia de PTE 8.600.000$00, actualmente € 42.896,62 (quarenta e dois mil oitocentos e noventa e seis euros e sessenta e dois cêntimos) a título de empréstimo, enquadrado no regime bonificado, de que estes se confessaram devedores;
4. Tal crédito destinou-se à aquisição do seguinte imóvel: Fracção Autónoma designada pela letra ..., correspondente a uma habitação no ......, tipo ..., do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ...77 e descrito no Registo Predial sob o n.º ...56/...;
5. E para garantia do integral cumprimento das obrigações assumidas no Contrato, foi constituída pelos Mutuários a favor da Banco 1..., S.A., uma hipoteca voluntária sobre a Fracção Autónoma designada pela letra ..., identificada em 4.; registada sob a Ap. ...1 de 1994/03/25 – cfr. Certidão permanente do imóvel junta com o RE como doc . n.º 2.
6. Em 29-05-2012, foi celebrado um Adicional relativo à escritura pública denominada COMPRAS E VENDAS E MÚTUO COM HIPOTECA, correspondente ao doc. N.º 5 junto com o RE cujo teor se dá por integralmente reproduzido, tendo sido acordado:
a) O reembolso do capital ainda em dívida no prazo de 24 (vinte e quatro) prestações mensais, constantes e sucessivas, vencendo-se a primeira delas em 22.05.2012 e as restantes em igual dia dos meses seguintes (cfr. Cláusula Primeira do Doc. 5);
b) A alteração expressa do regime de crédito inicialmente estabelecido, passando o referido empréstimo a enquadrar-se no Regime Geral de Crédito, revogando-se todas as cláusulas constantes do contrato inicial que digam respeito ao regime de crédito bonificado, que, por força do novo enquadramento do empréstimo deixaram de ser aplicáveis ao contrato (cfr. Cláusula Quarta do Doc. 5);
c) Que em tudo o mais se mantém o clausulado na Escritura, nomeadamente no que se refere à garantia hipotecária constituída (cfr. Cláusula Sétima do Doc. 5).
7. Em 29.05.2012, foi celebrado um Acordo relativo à escritura pública denominada COMPRAS E VENDAS E MÚTUO COM HIPOTECA, tendo sido convencionada a alteração do prazo identificado Contrato de Mútuo, no sentido de passar a constar que o prazo contratual é de 25 (vinte e cinco) anos, prazo contado a partir da data de celebração do respectivo contrato, com efeitos a contar de 22.04.2012 - cfr. Cláusula Primeira do Acordo junto como Doc. 1 com o requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.
8. Por Escritura Pública datada de 6 de Novembro de 2009, lavrada de fls. 72 a fls. 74 do livro de notas ...1-A, do Cartório Notarial de DD, sito na Av. ..., ..., ..., os Executados BB e AA , constituíram uma hipoteca voluntária a favor da Banco 1..., S.A. «para garantia, até ao limite global máximo de capital de trinta e cinco mil euros, todas e quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir por eles outorgantes», a incidir sobre a Fracção Autónoma designada pela letra ..., identificada em 4 – junto com o RE como doc. 6 (escritura) cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
9. A referida hipoteca encontra-se registada a favor da Exequente pela AP. ...36 de 2009/11/10, sendo o MONTANTE MÁXIMO ASSEGURADO: 43.400,00 Euros– cfr. Certidão predial actualizada junta aos autos de execução em 02-08-2022 sob a ref.ª ...57.
10.Na sequência do CONTRATO DE MÚTUO N.º ... identificado em 2.b), a Banco 1..., S.A. concedeu aos Executados/mutuários a quantia de € 31.500,00 (trinta e um mil e quinhentos euros), a título de mútuo destinado «a reformular a dívida do empresário»/mutuário - cfr. n.º 1 da Cláusula 1.ª do Doc. 3 junto com o RE.
11.A quantia mutuada foi, efectivamente, creditada na conta de depósito à ordem n.º ..., constituída no Balcão da Banco 1..., em ..., em nome da PARTE DEVEDORA - cfr. n.º 2 da Cláusula 1.ª do Doc. 3 junto com o RE.
12.Os Executados receberam o montante supra referido, confessando-se solidariamente devedores da Banco 1..., S.A. - cfr. Cláusula 1.ª do Doc. 3 junto com o RE.
13.O aludido contrato foi celebrado pelo prazo de 48 (quarenta e oito) meses, a contar da respectiva data de celebração - cfr. Cláusula 2.ª do Doc. 3 junto com o RE.
14.Em caso de incumprimento do contrato, ficou ainda acordado que seria devida uma indemnização com natureza de cláusula penal à taxa fixada na data de celebração do contrato em 4% (três por cento) ao ano, calculada sobre o capital em dívida desde a data de mora - cfr. Cláusula 7.ª do Doc. 3 junto com o RE.
15.No âmbito do contrato em apreço a Exequente reservou-se ao direito de exigir, a todo o tempo, o reforço ou a substituição das garantias prestadas, caso se viesse a verificar que as mesmas não se mostram suficientes para cobrir as responsabilidades assumidas pela PARTE DEVEDORA - Cláusula 11.ª do Doc. 3 junto com o RE.
16.Na Cláusula 14.ª do Doc. 3 junto com o RE, as partes acordaram que a Exequente poderia considerar o crédito imediatamente vencido em caso de incumprimento, ainda que parcial, de qualquer das obrigações assumidas ao abrigo do contrato em apreço.
17.Em 23-04-2013, foi celebrado um Acordo relativo ao CONTRATO DE MÚTUO N.º ... , tendo sido convencionado na cláusula 1ª o seguinte:
« 1. Durante o período 12 (doze) meses, compreendido entre 24.04.2013 e 24.04.2014, é concedido à PARTE DEVEDORA um período de carência de capital, durante o qual a PARTE DEVEDORA obriga-se, apenas, ao pagamento mensal dos juros, cujo cálculo tem como referência trezentos e sessenta dias.
2 Findo o período de carência concedido, o referido empréstimo será reembolsado em 24 (vinte e quatro) prestações mensais. constantes e sucessivas, compostas por capitai e juros, vencendo-se a primeira em 24 de Maio de 2014 e as restantes em igual dia dos meses seguintes ou no último dia do respectivo mês se neste não houver dia correspondente.
3. A PARTE DEVEDORA fica obrigada ao pagamento das prestações que resultarem da aplicação do disposto no presente Acordo, cujo montante será oportunamente comunicado pela Banco 1....» cfr. Acordo junto como Doc. 2 com o requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.
18.No requerimento executivo a Exequente, ora Embargada, procede à liquidação da quantia exequenda do seguinte modo:
«À data de 28/04/2022, no que respeita contrato junto como Doc. 1, a Exequente tem a haver dos Executados a quantia total de 12 612,86 €, correspondendo a
Capital: 6 529,72
€ Juros de mora a uma taxa de 7,670 %, desde a data de incumprimento (22/10/2013 até ao dia de 28/04/2022): 4 082,09 €
Despesas: 2 002,44 €
Total: 12 614,25 €
À data de 28/04/2022, no que respeita Contrato junto como Doc. 7, a Exequente tem a haver dos Executados a quantia total de 70 465,12 €, correspondendo
Capital: € 31.500,00
Juros de mora vencidos entre 24/08/2013 até dia 28/04/2022 a uma taxa global de 12,870 %: 37.132,38 €;
Despesas: 1 832,74 €
Total: 70 476,38 €»
19.A fracção ... tem o valor patrimonial de €49.237,14, determinado no ano: 2024 – cfr. certidão matricial junta aos autos de execução em 11-03-2025.
20.O valor actualizado da quantia exequenda e demais despesas ascende a 100.699,77 € - cfr. conta corrente discriminada apresentada pelo Sr.(ª) Agente de Execução na execução no dia 11-03-2025.
21.A cedente Banco 1... instaurou, em 01-04-2015, a execução sumária que correu termos sob o Proc. n.º 2762/15.1T8VNF, do Juízo de Execução de Vila Nova de Famalicão, Juiz ..., contra a aqui Embargante e o Co-Executado BB, tendo por base os dois contratos de mútuo que servem de título à execução de que estes autos são apenso (os indicados em 2 do Factos Provados) – cfr. certidão junta como doc. 3 com o requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.
22.Com o requerimento executivo do Proc. n.º 2762/15.1T8VNF foram juntos também os dois acordos ou aditamentos a esses contratos que correspondem aos Acordos referidos em 7 e 17 - cfr. certidão junta como doc. 3 com o requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.
23.Os Executados foram citados para esse Proc. n.º 2762/15.1T8VNF em 15-06-2015, não tendo nenhum deles deduzido Embargos de Executado - cfr. certidão junta como doc. 3 com o requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.
24.Nesse Proc. n.º 2762/15.1T8VNF foi penhorada, em 08-05-2015, a Fracção Autónoma designada pela letra ..., identificada em 4 - cfr. certidão junta como doc. 3 com o  requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.
25.A Agente de Execução da Extinção nesse Proc. n.º 2762/15.1T8VNF proferiu, em 05-06-2015, decisão de sustação da execução quanto à Fracção Autónoma designada pela letra ..., identificada em 4, ao abrigo do disposto no art.º 794º, n.º 1 do Código de Processo Civil, em virtude da existência de uma penhora anteriormente registada sob a Ap. ...90 de 10-09-2012 - cfr. certidão junta como doc. 3 com o requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.
26.Por decisão da Sr.(ª) Agente de Execução no Proc. n.º 2762/15.1T8VNF, datada de 17-01-2020, foi essa execução extinta por deserção - cfr. certidão junta como doc. 3 com o requerimento de 23-04-2025 sob a ref.ª ...63.”.
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 Na decisão apelada, foi dado como não provado o seguinte:
“(da p.i. de Embargos de Executado)
- que os Executados tivessem procedido ao pagamento integral dos contratos de mútuo em causa nestes autos à cedente Banco 1....
(da contestação)
- que ainda na gestão da cedente Banco 1..., esta remeteu aos mutuários cartas de integração e extinção do PERSI, esta última por falta de colaboração das partes, datadas de 23 de novembro de 2013 e de 23 de fevereiro de 2014 juntas como doc. 5 da p.i.. ” .
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1. Da propugnada alteração da matéria de facto.
Cabe aqui apreciar se se mostram preenchidos os pressupostos para a reapreciação da matéria de facto e neste caso indagar se o tribunal cometeu algum erro da apreciação da prova e assim na decisão sobre a matéria de facto.
A este propósito, temos que a recorrente impugnou a decisão da matéria de facto, nas suas conclusões, que, como vimos, delimitam o objeto do processo, relativamente apenas a um concreto ponto que foi dado como não provado e que no seu entender devia ter sido considerado como provado, embora não o diga expressamente, cingindo-se a dizer o seguinte nas suas conclusões, a este respeito:
“A. A recorrente impugna a matéria de facto, porquanto considera dever considerar-se provados os seguintes factos:
- O envio da carta pelo Banco Mutuante aos Executados, de integração no PERSI e posterior extinção, logo impõe-se decisão diferente quanto à procedência da exceção dilatória inominada.
B. De facto, verificando-se o cumprimento pelo Banco mutuante de integração dos Executados no PERSI, deverão os embargos improceder quanto a esta alegação.”
Das alegações, a este respeito, temos o seguinte:
“na gestão da cedente Banco 1..., esta remeteu aos mutuários cartas de integração e extinção do PERSI, esta última por falta de colaboração das partes, datadas de 23 de novembro de 2013 e de 23 de fevereiro de 2014 juntas como doc. 5 da p.i.
(…)
7. Nem prevê o diploma que rege o PERSI a forma de envio registada.”.
Mas será que as alegações produzidas, juntamente com as transcritas conclusões, são bastantes para que se mostrem cumpridas as exigências formais previstas no  art. 640.º, nº 1, do Código Processo Civil?
Há, assim, que primeiramente sindicar se a recorrente cumpriu os requisitos de ordem formal que permitam apreciar a impugnação que faz da matéria de facto, designadamente se indica os concretos pontos de facto que considera incorretamente analisados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões, se especifica na motivação dos meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, impõem uma decisão diversa quanto aos factos em causa.
Dispõe ao art. 640., n.º 1 do Código de Processo Civil que:
 “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
 Abrantes Geraldes em “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 8.ª edição, 2024, Almedina, págs. 228 e 229, resume as obrigações impostas ao recorrente que impugne a matéria de facto nos seguintes termos:
“a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) O recorrente deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em prova gravada, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) O recorrente pode sugerir à Relação a renovação da produção de certos meios de prova, nos termos do art. 662.º, n.º 2, al. a), ou mesmo a produção de novos meios de prova nas situações referidas na al. b).(…);
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente.”.
 Sobre a interpretação do artigo 640.º do Código de Processo Civil, escreveu-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01/10/2015, perfilhado pelo Acórdão desta Relação, de 19/01/2023, ambos disponíveis em www.dgsi.pt, o seguinte:
“Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa-fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão”.
Diz-se também no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 2015, acessível em www.dgsi.pt, que:
“(...), a exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem questionar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto”. (...) Por sua vez, a especificação dos concretos meios probatórios convocados, bem como a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, serve sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre hoje, claramente, do preceituado no nº 1 do artigo 662º do CPC”. (…) É, pois, em vista dessa função, no tocante à decisão de facto, que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, ou seja, sem possibilidade de suprimento, na parte afetada, nos termos do artigo 640º, nº 1, proémio, e nº 2, alínea a), do CPC. (…) “…Não sofre, pois, qualquer dúvida que a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº 1 do referido artigo 640º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada.”.
 Acresce salientar que a crítica de quem impugna a convicção do Tribunal, sustentada na livre apreciação da prova e nas regras da experiência, não pode ter sucesso se se alicerçar apenas na diferente convicção sobre a prova produzida. Ou seja, não basta afirmar ou transcrever aquilo que foi afirmado pelas testemunhas, para se concluir que um determinado facto foi ou não incorretamente julgado. Na verdade, a parte que impugne a decisão da matéria de facto não está dispensada de efetuar a análise crítica da prova, já que pretendendo contrariar a apreciação crítica da prova feita pelo Tribunal terá de apresentar razões objetivas para contrariar a prevalência dada a um meio de prova sobre outro de sinal oposto, ou o maior crédito dado a um depoimento sobre outro contrário, não sendo suficiente para o efeito a mera transcrição de excertos de alguns dos depoimentos prestados (Cfr. neste sentido o Acórdão da Relação de Guimarães de 11/07/2017, e o Acórdão da Relação de Lisboa de 26/09/2019, consultáveis em www.dgsi.pt).
 No caso em apreço, constata-se que a Apelante, nem nas alegações nem nas suas conclusões de recurso, nem sequer considera quais foram os factos incorretamente julgados como não provados, cingindo-se a dizer de uma forma lacónica que deve ficar provado o envio de uma carta pelo banco mutuante aos executados de integração no PERSI e posterior extinção.
Mais, nem sequer indica para o efeito quais os concretos elementos probatórios  que no seu entender sustentavam o por si alegado e muito menos os que impunham uma decisão distinta do que constava dos factos não provados a tal respeito, que nem sequer se dignou mencionar.
Limitou-se a discordar da apontada matéria de facto dada por não provada, sem nunca o referir e sem apresentar as razões pelas quais devia ser colocada em crise a motivação explanada na decisão recorrida, ou seja, não fazendo uma apreciação crítica dessa motivação nem esgrimindo razões objetivas para contrariar a relevância dada à motivação do Tribunal recorrido.
Ao formular alegações e conclusões nos termos descritos, a Apelante não deu cabal cumprimento ao plasmado disposto na citadas als. a) e b), do nº 1, do art. 640.º, do Código de Processo Civil, já que ignorou por completo a motivação da decisão recorrida.
A este respeito a motivação da decisão recorrida foi a seguinte:
“Note-se ainda que embora resulte dos factos provados que tanto o contrato de mútuo celebrado pela escritura pública denominada COMPRAS E VENDAS E MÚTUO COM HIPOTECA, de 22 de Abril de 1994, como o CONTRATO DE MÚTUO N.º ... celebrado em ../../2012, foram objecto de renegociação, tais renegociações ocorreram em 29-05-2012, isto é, muito antes do alegado envio das cartas de integração no PERSI.
Ademais, na anterior execução que a cedente propôs contra os Executados não foi alegado, no requerimento executivo, o cumprimento do PERSI e nem essa questão foi aflorada nesses autos.
Por todo o exposto, não pode dar-se como provado o envio dos documentos juntos com a contestação com vista à comunicação da abertura e encerramento do PERSI, cuja prova competia à Exequente.”.
 
Conforme resulta do texto da motivação, a convicção do Tribunal, em relação aos descritos factos não provados que a recorrente pretende ver como provados não é posta em causa nas suas alegações e conclusões de recurso, a recorrente, pois não faz a análise crítica da valoração da prova pelo Tribunal recorrido, sendo inclusivamente completamente omissa a este respeito e sem qualquer indicação concreta das insuficiências, discrepâncias ou deficiências de apreciação da prova produzida.
Por seu turno, o Tribunal recorrido, na sua motivação, explicitou de forma densa, clara e explicativa, as razões para considerar a factualidade não provada nos termos em que o fez.
 Incumbia à apelante, com vista ao cumprimento do ónus concretizar a discordância quanto à decisão de facto proferida, argumentar no sentido de que os meios de prova produzidos no processo e valorados pelo Tribunal, apreciados em conjunto e de forma crítica, impunham uma convicção diversa, o que não fez de todo, cingindo-se a discorrer livremente sem nem sequer indicar qualquer prova.
Teria, pois, a apelante de argumentar no sentido de fazer claudicar a argumentação expendida pelo Tribunal recorrido alicerçado nos concretos meios probatórios a que conferiu relevância, em vez de dizer que tal matéria devia ficar provada.
Ora, a apelante omitiu o comportamento argumentativo que se lhe impunha no sentido de que os meios de prova produzidos no processo e valorados pelo Tribunal, apreciados em conjunto e de forma crítica, impunham uma convicção diversa.
A tudo acresce que a prova documental junta - cartas simples, sem registo -, em nada relevam quanto à pretendida alteração da matéria de facto, desacompanhada de qualquer outro meio de prova.
Deste modo, não tendo a recorrente observado o disposto no art. 640.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil, tal significa desde logo a rejeição do recurso, na parte relativa à impugnação da matéria de facto.
Improcede, pois, o recurso quanto à impugnação da matéria de facto que se pretendia ver alterada.
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V. Fundamentação de direito

Mostrando-se rejeitada a impugnação da matéria de facto, incumbe verificar se a solução alcançada na decisão recorrida é de manter.
Mostrando-se rejeitada a impugnação da matéria de facto, não tendo ficado provado que ainda na gestão da cedente Banco 1..., esta remeteu aos mutuários cartas de integração e extinção do PERSI, esta última por falta de colaboração das partes, datadas de 23 de novembro de 2013 e de 23 de fevereiro de 2014 juntas como doc. 5 da p.i., incumbe ainda assim verificar se a solução alcançada na decisão recorrida é de manter, apenas em função das demais questões suscitadas pela apelante.
 Efetivamente, entende a apelante que mesmo sem a prova da integração dos executados no PERSI não deverá a oposição à execução proceder.
Em primeiro lugar porque foram realizados acordos de regularização- um acordo adicional ao contrato de mútuo com hipoteca a contrato de créditos à habitação – Aquisição – Regime de Crédito Bonificado, no qual as partes acordaram alterar as cláusulas relativas ao “Reembolso” e “Alterações” constantes do Documentos Complementar anexo à escritura – pelo que foi apresentada uma proposta de regularização pela Banco 1... adequada à necessidade da Embargada e dos mutuários na altura, tendo as condições sido renegociadas.
Depois porque se existirem penhoras a favor de terceiros sobre bens do devedor, como sucede no caso em apreço, o PERSI pode ser extinto pela instituição de crédito, pelo que não se verifica a pertinência do início de um procedimento que pode ser logo encerrado face à existência de penhoras registadas.
 Ora, sobre a primeira questão já se pronunciou o Tribunal recorrido em termos sobre os quais a recorrente não se pronuncia, não fazendo qualquer análise crítica do expendido na decisão recorrida, cingindo-se, basicamente, a repetir o que já havia dito em sede de contestação, que, a este respeito foi o seguinte:
“91. Face a situações de incumprimento anteriores ao DL 227/2012, DE 25-10, verificadas pelo Banco, por parte da Embargada, foram realizados acordos de regularização já aqui referidos e junto com a petição inicial - a 29.05.2012, um acordo adicional ao contrato de mútuo com hipoteca a contrato de créditos à habitação – Aquisição – Regime de Crédito Bonificado, no qual as partes acordaram alterar as cláusulas relativas ao “Reembolso” e “Alterações” constantes do Documentos Complementar anexo à escritura – pelo que foi apresentada uma proposta de regularização pela Banco 1... adequada à necessidade da Embargada e dos mutuários na altura, tendo as condições sido renegociadas.
92. A este propósito diz-nos o Acórdão do TRC 7576/18.4T8CBR-A.C1 o seguinte: “ao longo de anos, a instituição de crédito/exequente e o oponente/executado alcançaram acordos de regularização das situações de incumprimento, conseguindo, inclusive, no decurso da acção executiva dos autos principais, a regularização de, pelo menos, um dos (dois) contratos de mútuo celebrados entre as partes, não teria qualquer sentido integrar esta situação de incumprimento no PERSI. Nessas circunstâncias, age com abuso do direito, na modalidade de “venire contra factum proprium”, o devedor/executado que na oposição à execução, vem acusar o facto de não ter sido (formalmente) integrado no PERSI (para concluir que a exequente estava impedida de intentar acção judicial para satisfação do seu crédito).”
93. Quer isto dizer, que apesar de até ter sido cumprido o procedimento de Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, o que é certo é que já antes existiu negociação da dívida com o credor originário, tendo sido mesmo alcançado acordo.
94. Face ao exposto, não se verifica qualquer excepção dilatória inominada, uma vez que o PERSI foi devidamente cumprimento e, já anteriormente o Banco renegociou os contratos, devendo os autos prosseguirem os devidos termos, devendo ser julgado improcedente a oposição apesentada por falta de fundamento legal, mantendo-se a penhora registada.
95. Ainda nesta senda e, apesar de a Embargante não o admitir afirmado que não reconhece legitimidade à ora Embargada, a verdade é que tem contactado a Embargada no sentido de chegar a acordo, tendo-lhe sido já comunicados valores e condições para chegar a acordo, factos que omite e não reconhece nos autos.”.
Escreveu-se na sentença recorrida a este propósito, após realizar uma resenha sobre o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI, regulado pelo D.L. n.º 227/2012, de 25/10, que entrou em vigor em 01/01/2013)
“ A Exequente alude a um abuso de direito da Embargante ao invocar a falta de integração no PERSI, justificando que face a situações de incumprimento anteriores ao DL 227/2012, DE 25-10, verificadas pelo Banco, por parte da Embargada, foram realizados acordos de regularização já aqui referidos e junto com a petição inicial - a 29.05.2012, um acordo adicional ao contrato de mútuo com hipoteca a contrato de créditos à habitação – Aquisição – Regime de Crédito Bonificado, no qual as partes acordaram alterar as cláusulas relativas ao “Reembolso” e “Alterações” constantes do Documentos Complementar anexo à escritura – pelo que foi apresentada uma proposta de regularização pela Banco 1... adequada à necessidade da Embargada e dos mutuários na altura, tendo as condições sido renegociadas.
Não cremos, todavia, que lhe assista razão.
Primeiro porque essas renegociações, ocorridas em 29-05-2012, são ainda anteriores à entrada em vigor do DL 227/2012, DE 25-10;
Segundo porque a jurisprudência tem afirmado, de forma sistemática, que mesmo no caso de o cliente bancário ter sido anteriormente integrado em PERSI já extinto não existe obstáculo a que venha novamente a beneficiar desse regime, caso se encontrem reunidos os necessários pressupostos normativos para esse efeito. – cfr. entre outros Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Processo: 1820/22.0T8ACB-A.C1, Relator: JOSÉ AVELINO GONÇALVES, de 23-04-2024; e Acórdão Tribunal da Relação do Porto, de 2022-05-04, Processo: 3751/20.0T8MAI.P1, Relator: EUGÉNIA CUNHA;
Neste contexto, a arguição da referida exceção, com invocação, pela Embargante das normas jurídicas do regime jurídico do PERSI a seu favor, não constitui abuso do direito, antes o normal e legítimo exercício de direitos conferidos por lei em salvaguarda da parte mais fraca na relação contratual.”.
Sufragamos em abstrato integralmente tal entendimento.
Porém, temos que da matéria de facto dada por adquirida nem sequer resulta que os acordos de 2012 tenham resultado de qualquer incumprimento por parte dos primitivos devedores e muito menos que tenha sido apresentada qualquer proposta de regularização por parte da Banco 1..., sendo que do documento junto como doc. n.º5 com o requerimento executivo, denominado de “Adicional contrato de mútuo com hipoteca a contrato com crédito à habitação-aquisição- regime de crédito bonificado n.º 096.20....” (e igualmente junto com o requerimento de 23/04/2025) resulta precisamente o oposto, ou seja que foram os devedores que solicitaram a alteração dos contratos, o que a credora aceitou, não constando do documento em apreço quais as motivações subjacentes.
 Ou seja, claudica, desde logo pela base, a argumentação da apelante, pois que se não se mostra provado que a credora tenha tomado a iniciativa para o que quer que fosse designadamente de um arremedo de PERSI, que à data nem sequer estava legalmente previsto.
Por fim, quanto à questão da desnecessidade do PERSI por sobre os bens dos devedores incidirem penhoras, o que implica que o PERSI poderia ser extinto pela instituição de crédito, pelo que se na tese da apelante não se verificaria a pertinência do início de tal procedimento que poderia ser logo encerrado devido à existência de penhoras, trata-se de uma questão nova, não suscitada nos articulados e, por isso, naturalmente, não decidida na sentença recorrida.
Tal questão foi suscitada apenas nas alegações de recurso
Ora, é verdade que em matéria de qualificação jurídica dos factos ou no que concerne a questões de conhecimento oficioso o Tribunal de recurso não está circunscrito pela iniciativa das partes (cfr. art. 5.º, n.º 3 do Código de Processo Civil). Interposto o recurso pode o Tribunal conhecer oficiosamente relativamente à decisão em reapreciação de questões processuais (incompetência absoluta, falta de personalidade, caso julgado, etc) e mesmo de natureza substantiva (v.g. nulidade do contrato por vício formal, simulação, caducidade em matéria de direitos indisponíveis, abuso de direito, etc). Tem vindo a ser entendido que a regra que obsta à apreciação de questões inovatórias, não tem validade relativamente às questões que ao Tribunal incumba conhecer oficiosamente, que podem ser decididas pelo Tribunal a que como pelo Tribunal ad quem, ainda que não suscitadas pelas partes. Note-se, contudo, que tal será apenas exercitável caso essa possibilidade não esteja precludida por força de alguma disposição legal como ocorre com o art. 97.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, no que tange à incompetência absoluta dos tribunais judiciais, ou no que concerne ao art. 200.º, n.º 2 do mesmo diploma legal, acerca designadamente da ineptidão da petição inicial, quer no que diz respeito ao caso julgado formal previamente formado, atento o plasmado no art. 635.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, sendo que o caso julgado que, por qualquer via,  se tenho formado em relação a alguma decisão ou segmento decisório não pode ser afetado por uma posterior decisão, ainda que de um tribunal hierarquicamente superior.
Os recursos têm por escopo a reapreciação de decisões já proferidas e não a sindicância de questões novas, exceto, conforme tem vindo a ser entendido e já referido, estas sejam de conhecimento oficioso e claro está, o processo tenha todos os elementos necessários para a sua apreciação.
A diferença de graus de jurisdição leva a que, por via de regra, os Tribunais de recurso apenas devam ser confrontados com questões que as partes tiveram oportunidade de apresentar e discutir nos momentos apropriados, sendo que tal apreciação equivaleria a suprimir um ou mais órgão de jurisdição - Cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 8ª ed., 2024, págs. 160, 161, 164 a 166 e a vasta jurisprudência aí recenseada.
No caso dos autos, a questão suscitada, da desnecessidade do PERSI, não é obviamente de conhecimento oficioso, uma vez que não está estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes, estando em causa interesses meramente materiais/económicos, que o legislador não considera como direitos indisponíveis, pelo que devia ter sido expressamente suscitada em primeira instância, o que não foi feito, pelo que em consonância, como vimos, nenhuma decisão foi proferida a tal respeito.
Assim sendo, como primeiramente se referiu, por ser matéria nova, que não é de conhecimento oficioso, não se toma conhecimento da mesma.
Improcede, pois, o recurso.
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As custas serão suportadas pela apelante, uma vez que ficou vencida (art. 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).
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VI. Decisão

Perante o exposto, acordam os Juízes que compõem este Coletivo da 3.ª Secção Cível deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão apelada.
Custas pela apelante.
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Guimarães, 20 de novembro de 2025

Relator: Luís Miguel Martins
Primeira Adjunta: Maria Amália Santos
Segunda Adjunta:  Anizabel Sousa Pereira