INVENTÁRIO SUBSEQUENTE A DIVÓRCIO
PAGAMENTO DO PASSIVO
CONFERÊNCIA DE INTERESSADOS
Sumário

I - O disposto no artigo 2100.º, número 1 do Código Civil não é imperativo, podendo os interessados acordar em conferência de interessados que o pagamento do passivo que onere bem adjudicado a apenas um deles fique a cargo de todos ou de alguns.
II - As declarações prestadas pelos interessados na referida conferência quanto à “forma de pagamento” do passivo consubstanciam exercício do direito que o legislador conferiu aos mesmos para disporem por acordo sobre essa matéria nos termos do número 3 do artigo 1111.º do Código de Processo Civil, pelo que devem ser interpretadas como declarações de vontade negocial, à luz do previsto no artigo 236.º do Código Civil.
III - As declarações dos interessados ficam a constar da ata da diligência presidida pela Mmª Juíza, pelo que o que dela consta faz prova plena sobre aquilo que a mesma pôde percecionar, sendo ainda de ter em conta o teor da gravação dessa diligência para a interpretação do sentido das declarações enquanto manifestações de vontade.

Texto Integral

Processo número 475/21.4T8OBR.P1, Juízo de Família e Menores de Oliveira do Bairro,

Recorrente: AA

Recorrido: BB

Relatora: Ana Olívia Loureiro

Primeira adjunta: Maria de Fátima Almeida Andrade

Segundo adjunto: Carlos Gil

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório:

1. Em 24-04-2023 realizou-se conferência de interessados no âmbito de inventário para partilha do património comum de recorrente e recorrido, em consequência do seu divórcio.

2. Nela as partes acordaram na aprovação do passivo relacionado sob as verbas 9, 10, 11, 12, 14 e 18 da relação de bens nos seguintes termos:

- verba n.º 9, no valor de 29.380,37 euros: reconheceram “serem ambos responsáveis pelo seu pagamento” (trata-se de verba decorrente de mútuo hipotecário cuja hipoteca incide sobre a verba número 1 do ativo);

- verba n.º 10 (relativa às prestações desse mútuo pagas pela cabeça de casal após 18-06-2018 e até 22-02-2023) no montante total de 14.060,79 euros, “sendo ambos responsáveis pelo seu pagamento” e correspondentemente a cabeça de casal credora de metade desse valor sobre o interessado BB.

- verba n.º 11 do passivo, relativa às prestações do IMI dos anos de 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022 pagas exclusivamente pela cabeça de casal no montante total de 998,89 euros “sendo ambos responsáveis pelo seu pagamento” e correspondentemente a cabeça de casal credora de metade de tal quantia sobre o interessado BB;

- verba n.º 12, valor da amortização parcial do mútuo hipotecário feita pela cabeça de casal, estabelecendo-se que é credora de metade de tal quantia – 4.907,27 € - sobre o interessado BB;

- verba n.º 14 relativa a mensalidades do colégio do filho comum do casal pagas pela cabeça de casal, “sendo ambos responsáveis pelo seu pagamento” e correspondentemente a cabeça de casal é credora de metade de tal quantia - 962,50 € -, sobre o interessado BB;

- verba número 18, o interessado BB reconheceu ser devedor da cabeça de casal do valor de 5000 €.

3. Na mesma conferência acordaram os interessados em que fossem adjudicadas à cabeça de casal todas as verbas do ativo, nos seguintes termos:

- Verba n.º 1 - 159.000,00 euros;

- Verba n.º 2 - 350,00 euros;

- Verba n.º 3 - 200,00 euros;

- Verba n.º 4 - 300,00 euros;

- Verba n.º 5 - 350,00 euros;

- Verba n.º 6 - 350,00 euros;

- Verba n.º 7 - 150,00 euros;

- Verba n.º 8 - 350,00 euros;

- Verba n.º 20 - 350,00 euros;

- Verba n.º 21 - 200,00 euros;

- Verba n.º 22 - 200,00 euros;

- Verba n.º 23 - 100,00 euros;

- Verba n.º 24 - 700,00 euros;

- Verba n.º 25 - 200,00 euros; e

- Verba n.º 26 - 200,00 euros.

4. Por despacho de 04-10-2023 foi ordenado que fosse elaborado mapa de partilha pela seguinte forma: “1. À soma do valor dos bens do ativo (tendo em consideração o acordado na conferência de interessados) abate-se o passivo aprovado por ambos os interessados na conferência de interessados, sendo o remanescente dividido em duas partes iguais que constituem a meação de cada um dos cônjuges.

2. Na composição das meações observar-se-á o que ficou acordado na conferência de interessados, sendo que os créditos entre os ex-cônjuges serão tidos em consideração como compensações”.

5. Em 10-01-2024 foi elaborado mapa da partilha, nos seguintes termos:

(…)

6. Em 29-01-2024, a cabeça de casal apresentou reclamação a tal mapa alegando, em suma, que ao valor do ativo que lhe foi adjudicado deveria ser descontada a totalidade do passivo hipotecário, concluindo que em face da soma da sua meação (correspondente à subtração desse passivo ao valor do ativo que lhe foi adjudicado) com o montante dos seus créditos de compensação, tem direito a receber 80.209,42 € e o interessado BB direito a receber apenas o valor de 53.410,21 € (resultantes da subtração à sua meação do valor dos débitos de compensação). Concluiu, em conformidade que apenas tem que pagar tornas a tal interessado no montante de 48.410,21 € dado que o mesmo lhe deve 5.000 € que ficou obrigado a pagar-lhe.

7. Por despacho de 17-04-2024 foi indeferida tal reclamação por se ter entendido, em suma e no que releva em face da pretensão da reclamante, ora recorrente, o seguinte: “O valor da verba de passivo n.º 9 da relação de bens está contemplado no mapa da partilha e foi descontado ao valor total das verbas de ativo, como determinado no despacho de 04.10.2023 e previsto no n.º 3 do artigo 1120.º do Código de Processo Civil. Acresce que o valor dessa verba de passivo foi repartido na meação de cada cônjuge, em conformidade com o acordado na conferência de interessados de 24.04.2024.

Salienta-se, além disso, que não há qualquer remição a fazer, nos termos previstos nos artigos 2099.º e 2100.º do Código Civil, porquanto o credor informou, em 04.07.2022, que o empréstimo está a ser pontualmente cumprido e não requereu a sua amortização.”.

8. A cabeça de casal interpôs recurso de tal decisão que não foi admitido por despacho de 29-10-2024. A recorrente reclamou do despacho de não admissão do recurso tendo tal reclamação sido julgada improcedente por este Tribunal, por decisão de 14-04-2025.

9. No dia 29-10-2024 foi proferida sentença homologatória da partilha feita nos termos do mapa elaborado pela secção de processos em 10-01-2024.


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II - O recurso:

É desta sentença e do despacho de 17-04-2024 que indeferiu a reclamação do mapa da partilha que recorre a cabeça de casal, sustentando a nulidade da sentença por falta de fundamentação e solicitando a revogação do despacho recorrido por não ter sido imputado ao cálculo da sua meação o passivo comum hipotecário apesar de lhe ter sido adjudicado o imóvel hipotecado.

Para tanto, formulou as seguintes conclusões de recurso:

(…)


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Não foram apresentadas contra-alegações.

III – Questões a resolver:

Não obstante a prolixidade das alegações em que repetidamente são referidas questões relativas à forma de elaboração do mapa da partilha de que não discorda a recorrente, são apenas duas as questões a decidir, nos termos do previsto nos artigos 635º, números 4 e 5 e 639º, números 1 e 2, do Código de Processo Civil:

1 – saber se foi deliberado em conferência de interessados que o pagamento do passivo descrito na verba número 9 caberia a ambos os interessados;

2 – a da nulidade da sentença por falta de fundamentação e /ou omissão de pronúncia.

A enunciada ordem de resolução das questões- inversa à seguida pela recorrente nas alegações de recurso -, decorre da inutilidade do conhecimento da nulidade da sentença homologatória da partilha no caso de vir a ser revogado o despacho que indeferiu a reclamação ao mapa da partilha, caso em que tal mapa terá de ser reelaborado, o que determinará a prolação de nova sentença homologatória da partilha.


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IV – Fundamentação:

Os factos relevantes para a decisão são os que estão sumariados no relatório desta decisão.

1. Como já acima se adiantou, a única divergência da recorrente em relação à forma como foi elaborado o mapa da partilha prende-se com a forma como a verba número 9 do passivo foi imputada à meação de ambos os cônjuges.

A argumentação em que a recorrente sustenta a sua posição, divergente da adotada pelo Tribunal a quo está perfeitamente sumariada nas conclusões XLV a XVII do recurso em que se afirma o seguinte; “Decorre ainda do despacho objeto de recurso que não há qualquer remição a fazer, nos termos previstos nos artigos 2099.º e 2100.º do Código Civil, porquanto o credor informou, em 04.07.2022, que o empréstimo está a ser pontualmente cumprido e não requereu a sua amortização. XLVI. a lei não faz depender do incumprimento da divida ou da sua amortização (pelo contrário), como defendido no despacho objeto de recurso a aplicação do previsto no artigo 2100.º, n.º1, do Código Civil, entrando bens na partilha com direitos de natureza remível, como é o caso da hipoteca, descontar-se-á neles o valor desses direitos.XVII. Resulta daquela acta que as partes não acordaram que a referida divida seria paga por si em partes iguais, na medida em que reconheceram a existência da verba n.º 9 do passivo da relação de bens de fls. 24 a 26 no montante à data de 22-02-2023 de 29.380,37 euros, e serem ambos responsáveis pelo seu pagamento, ou seja, reconheceram ser uma divida comum (tal como outras que também aprovaram e reconheceram como comuns)”


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A partilha a realizar nestes autos tem por finalidade a divisão do património comum após a dissolução do casamento por divórcio, para que cada cônjuge receba os seus bens próprios e a sua meação no património comum, conforme previsto no número 1 do artigo 1689.º do Código Civil, de modo a que nenhum deles receba mais ou menos do que aquilo a que tem direito. Na partilha são ainda tidos em conta os créditos de cada cônjuge sobre o outro, a serem pagos pela meação do devedor.

As operações de partilha devem seguir a ordem prevista no artigo 1120.º do Código Civil, e assim foi feito no mapa da partilha: soma-se o valor do ativo (conforme às avaliações ou licitações), deduzem-se as dívidas comuns e, assim determinada a meação de cada interessado, preenchem-se as respetivas quotas nos termos previstos no número 4 do referido preceito, ou seja, em conformidade com o decidido na conferência de interessados, sendo os demais inteirados com tornas nos termos do artigo 1117.º do Código de Processo Civil.

Foi o que foi feito, em cumprimento do despacho que determinou a forma da partilha. Todavia, foi considerado no mapa da partilha que os interessados tinham acordado que o pagamento da verba número 9 do passivo seria da responsabilidade de ambos.

O que o despacho recorrido manteve ao conhecer, pela sua improcedência, da reclamação do mapa da partilha.

Ora a recorrente sustenta que não ficou acordado na conferência de interessados que o passivo relacionado sob a verba 9 seria pago por ambos os interessados.

É pacífico na doutrina e na jurisprudência que artigo 2100.º do Código Civil não é imperativo, podendo as partes acordar noutra forma de pagamento do passivo ali previsto.

A esse propósito afirma Lopes Cardoso[1] que “se a remissão (sic) não for exigida ou de outra forma se não convencionou, os bens entram à partilha com esse ónus, descontando-se neles o respetivo valor, e o interessado a quem foram atribuídos os bens suportará exclusivamente a satisfação do encargo”.

Encontra-se, entre muitos outros em acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-11-2006[2], do Supremo Tribunal de Justiça de 17-12-2009,[3] e deste Tribunal de 26-06-2025[4] e de 05-02-2024[5], bem como da Relação de Guimarães de 20-06-2024[6] a afirmação da bondade da solução legal adotada no artigo 2100.º do Código Civil, mas também o reconhecimento de que a mesma pode ser afastada por vontade das partes.

O que nos parece incontroverso, visto que estamos perante direitos disponíveis que estão, portanto, à mercê da livre vontade das partes, não ficando qualquer terceiro prejudicado com o que venham a decidir sobre a forma de pagamento do passivo que onere um bem a adjudicar, justamente porque o eventual direito do terceiro (correspetivo do passivo que possa ser imputado a todos os interessados) continuará a onerar o bem transmitido por partilha, mesmo que tal bem passe a ser apenas propriedade de um deles[7].

O artigo 1111.º do Código de Processo Civil prevê que na conferência de interessados estes possam deliberar sobre várias questões, reconhecendo-lhes o legislador o direito de decidirem por acordo a adjudicação dos bens ou a sua venda, a aprovação do passivo, a forma do seu pagamento e a forma de cumprimento de legados e dos demais encargos da herança.

Ao inventário para partilha subsequente a divórcio aplica-se tal preceito por força do previsto no artigo 1082.º do Código de Processo Civil.

No caso a recorrente reclamou do mapa da partilha por entender que dele não resultava a aplicação do disposto no artigo 2100.º do Código Civil e tal reclamação foi-lhe indeferida no despacho recorrido com base na seguinte motivação: “ O valor da verba de passivo n.º 9 da relação de bens está contemplado no mapa da partilha e foi descontado ao valor total das verbas de ativo, como determinado no despacho de 04.10.2023 e previsto no n.º 3 do artigo 1120.º do Código de Processo Civil. Acresce que o valor dessa verba de passivo foi repartido na meação de cada cônjuge, em conformidade com o acordado na conferência de interessados de 24.04.2024.

Salienta-se, além disso, que não há qualquer remição a fazer, nos termos previstos nos artigos 2099.º e 2100.º do Código Civil, porquanto o credor informou, em 04.07.2022, que o empréstimo está a ser pontualmente cumprido e não requereu a sua amortização.” (sublinhado nosso).

Como já se afirmou, a recorrente sustenta que não ficou acordado na conferência de interessados que o passivo relacionado sob a verba 9 seria pago por ambos os interessados.

No caso, as declarações dos interessados ficaram a constar da ata da diligência presidida pela Mmª Juíza pelo que o que dela consta faz prova plena sobre aquilo que a mesma pôde percecionar, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 371.º do Código Civil e 155º, números 7 e 8 do Código de Processo Civil.

Ora, da referida ata não resulta qualquer declaração expressa e inequívoca dos interessados sobre a forma como deveria ser pago o passivo relativo à verba 9 (ao contrário do que resulta da mesma quanto a todas as demais verbas ali identificadas como sendo do passivo).

A menção ali feita – à semelhança do que aconteceu quanto às verbas 10, 11 e 14 -, a que são “ambos responsáveis pelo seu pagamento” – enquadra-se na descrição do passivo aprovado (foi aprovado porque ambos reconheceram que era da responsabilidade de ambos o seu pagamento) e não na subsequente deliberação quanto à forma do seu pagamento, ao contrário do que sucede com as demais verbas do passivo[8] ali referidas em que, a seguir à menção de que se tratam de dívidas da responsabilidade de ambos, se exarou em ata que seria o interessado BB a proceder ao seu pagamento.

Quanto às verbas 9, 10,11, 12 e 14, ao contrário do que se passa quanto à verba 18, tratavam-se de facto de valores por cujo pagamento eram ambos os interessados responsáveis porque resultantes: de mútuos contraídos por ambos; do valor devido à Autoridade Tributária pelo IMI do imóvel comum; e de propinas escolares do filho comum. Sucede que, quanto às verbas 10,11, 12 e 14, a cabeça de casal já procedera ao pagamento desses valores, pelo que ficou credora do património comum, ficando o cointeressado obrigado a pagar-lhe metade desse valor, por conta da sua meação.

Já quanto à verba número 9, nem o seu credor exigiu o seu pagamento, nem as partes acordaram com tal credor exonerar um dos devedores da dívida.

O facto de ambos serem devedores ao banco mutuante por esse valor (que é pagável em prestações e não está, portanto, vencido) relaciona-se com a sua qualidade de mutuários.

Já nas relações patrimoniais entre eles, que cessam com o casamento e são liquidadas na partilha, pode assim não suceder, podendo ser imputado a apenas um deles o valor do passivo.

Tendo em conta que as declarações prestadas pelos interessados na referida conferência quanto à “forma de pagamento” do passivo se inserem no exercício do direito que o legislador conferiu aos mesmos para disporem por acordo sobre essa matéria nos termos do número 3 do artigo 1111.º do Código de Processo Civil, devem as mesmas ser interpretadas como declarações de vontade negocial, à luz do previsto no artigo 236.º do Código Civil.

Tal preceito obriga a que se atenda ao que um declaratário normal, “colocado na posição do real declaratário” entenderia do teor da declaração, aceitando o legislador, contudo, que o sentido decorrente da impressão do destinatário seja afastado quando este conheça a real vontade do declarante.

Colocando-se o intérprete do teor da ata da conferência de interessados no lugar dos reais declaratários ali presentes, e tendo em conta que a expressão “serem ambos responsáveis pelo seu pagamento” foi igualmente usada aquando da aprovação das verbas 9, 10, 11 e 14 mas quanto a estas, de seguida, foi expressa a declaração de ambos os interessados sobre a “forma do seu pagamento” (cfr. artigo 1111.º, número 3 do Código de Processo Civil), depreende-se com elevado grau de certeza que tal expressão não foi usada em qualquer dessas declarações como sendo respeitante à deliberação sobre essa “forma de pagamento”, mas como meramente relativa à aprovação da dívida, ou seja, expressa quando os interessados estavam a deliberar sobre a aprovação do passivo comum: reconhecendo que se tratavam de montantes por cujo pagamento ambos eram responsáveis o que conduziu à sua aprovação.

Doutra forma também teríamos que interpretar de igual modo a mesma exata expressão quando expressa relativamente às verbas 10, 11 e 14, e aí seria até contraditório entender que ambos interessados declararam ora que o passivo ali descrito teria que ser pago por ambos ora, logo de seguida, que teria de ser o interessado BB a suportar o pagamento de metade dele por conta da sua meação.

Acresce que se tem acesso à gravação da conferência de interessados e dela decorre (minutos 4, 30 a 15) que quanto à verba número 9 os interessados declararam apenas aprová-la, nada tendo declarado quanto à sua forma de pagamento.

Foi, em relação a cada das verbas do passivo, com exceção da verba número 18, a Mmª juíza quem ditou para a ata o que dela consta, ordenando que dela ficasse a constar, o seguinte:

- quanto à verba número 9, em concreto, após declaração dos mandatários dos interessados de que ambos aprovavam tal passivo, seguiu-se uma discussão sobre o seu valor atualizado, tendo-se concluído que seria o que ficou a constar em ata, após o que a Mmª Juíza ordenou que ficasse a constar da ata: “Reconhecem a existência da verba 9 crédito habitação do Banco 1..., SA, com o capital em dívida à data de 22 de fevereiro de 2023 no montante de 29.380,37 €, sendo ambos responsáveis pelo seu pagamento”;

-quanto à verba número 10 a Mmª Juíza ordenou que ficasse constar em ata que “Reconhecem a existência da verba 10 do passivo, relativa à prestações pagas pelo cabeça de casal até 22 de fevereiro de 2023, no montante de 14.050,79 €, sendo ambos responsáveis por este pagamento e correspondentemente o cabeça de casal credor de metade sobre o interessado”; e

- aproximadamente o mesmo foi ditado a propósito das verbas 11 e 14.

A tudo anuíram os mandatários em representação dos interessados, sem que tenham concreta e expressamente referido qual a forma de pagamento da verba número 9. O que também não fez a Mmª Juíza.

Pelo que, em face do teor destas declarações e do que delas ficou exarado em ata, se deve concluir que os interessados não deliberaram qualquer forma de pagamento do passivo relacionado sob a verba número 9, apenas reconhecendo ambos de que se tratava de dívida comum.

Na falta dessa deliberação é de aplicar o disposto no artigo 2100.º do Código Civil, norma que já acima se analisou e por via da qual deve ser reformado o mapa da partilha, imputando-se à cabeça de casal, enquanto adjudicatária do imóvel onerado, a totalidade do passivo hipotecário aprovado, com o consequente recálculo do valor que cabe a tal interessada e ao cointeressado.

Pelo que é de revogar o despacho que indeferiu a reclamação do mapa da partilha, devendo este ser reformulado quanto à imputação do valor da verba número 9 do passivo à cabeça de casal, o que resultará na consequente alteração do valor que a ela cabe receber em virtude das adjudicações e dos créditos de compensação de que é titular, bem como do valor que lhe cabe pagar a título de tornas ao interessado BB.


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Após seguirão os autos os termos previstos nos artigos 1120.º, número 5, 1121.º e 1122.º, do Código de Processo Civil com nova prolação de sentença homologatória da partilha pelo que fica prejudicado o conhecimento da sua alegada nulidade.

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As custas do recurso ficarão a cargo da recorrente, dado que o recorrido não contra-alegou nem deu causa ao recurso, tendo sido aquela quem dele tirou proveito, nos termos do previsto no artigo 527.º, número 1 do Código de Processo Civil.

V – Decisão:

Julga-se procedente o recurso incidente sobre o despacho que indeferiu a reclamação ao mapa da partilha, revogando-se o despacho recorrido e ordenando que o mapa da partilha seja reformulado de modo a que o passivo relacionado sob a verba número 9 da relação de bens seja imputado na composição do quinhão da cabeça de casal por via do desconto do respetivo valor no do bem imóvel (verba número 1) que à mesma foi adjudicado. Após, deverão os autos seguir os termos previstos nos artigos 1120.º, número 5, 1121.º e 1122.º do Código de Processo Civil.

Fica prejudicado o conhecimento do recurso da sentença homologatória da partilha


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Custas pela recorrente.


Porto, 24 de novembro de 2025.
Ana Olívia Loureiro
Fátima Andrade
Carlos Gil
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