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CONTRATO DE MEDIAÇÃO
SEGURO
CADUCIDADE DO DIREITO À RESOLUÇÃO DO CONTRATO
CONHECIMENTO OFICIOSO
Sumário
I - A caducidade do direito à resolução de um contrato de mediação de seguros, tratando-se de matéria não excluída da disponibilidade das partes, não pode ser oficiosamente conhecida, necessitando de ser invocada; II - Não se tratando de questão de conhecimento oficioso, a caducidade estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes não pode ser suscitada no recurso de apelação, que visa reapreciar a decisão impugnada e não criar decisões sobre matéria nova, impondo-se a respetiva invocação perante a 1ª instância; III - Verificando que a 1ª instância invocou dois fundamentos decisórios – considerou válida com base em dois fundamentos distintos a resolução contratual operada extrajudicialmente pela ré e, em consequência da validade da resolução contratual, julgou improcedente a pretensão deduzida pelo autor na ação – e que um dos fundamentos da decisão final não integra o objeto da apelação, daqui decorre a insusceptibilidade da reapreciação de tal fundamento por esta Relação, atento o caso julgado material decorrente da aceitação do decidido quanto a este fundamento não impugnado no recurso; IV - Assente que a 1ª instância invocou dois fundamentos decisórios e que a discordância manifestada pelo apelante no recurso se reporta apenas a um deles, a apreciação da validade da resolução operada com base no fundamento impugnado pelo recorrente mostra-se inútil, já que sempre se manteria a validade da resolução operada com base no outro fundamento tido em conta na decisão recorrida, bem como a consequente improcedência da pretensão deduzida pelo autor. (Sumário da Relatora)
Texto Integral
Processo n.º 754/23.6T8LAG.E1
Juízo de Competência Genérica de Lagos
Tribunal Judicial da Comarca de Faro
Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
1. Relatório
(…) intentou a presente ação declarativa, com processo comum, contra Liberty Seguros, Companhia de Seguros Y Reaseguros, S.A. – presentemente denominada Generali Seguros, S.A. –, formulando o pedido que se transcreve:
«(…) deve ser julgada procedente e provada a presente acção, declarando a cessão por resolução do contrato ilícito e sem qualquer justificação legal e fáctica, condenando a ré ao pagamento dos danos patrimoniais (lucros cessantes) pelo autor no montante de € 25.000,00 (vinte cinco mil e quinhentos euros) sofridos desde Dezembro de 2020 até hoje.
Deve também a ré ser condenada ao pagamento de € 10.000,00 (dez mil euros), por danos não patrimoniais sofridos pela cessação ilícita do contrato de Agente de Seguros Liberty a partir de Dezembro de 2020 até hoje.
Não pode neste momento contabilizar os danos emergentes, relegando para a liquidação em execução de sentença.»
A justificar o pedido, o autor alega que a ré procedeu à inválida resolução de um contrato de mediação de seguros, reportado à categoria de agente de seguros, entre ambos celebrado, sustentando que tal lhe causou danos patrimoniais e não patrimoniais, como tudo melhor consta da petição inicial.
Citada, a ré contestou, pugnando pela validade da resolução contratual operada e pela improcedência da ação.
Por despacho de 19-02-2024, foi dirigido ao autor um convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, não tendo sido apresentada resposta.
Dispensada a audiência prévia, foi fixado o valor à causa, retificado um lapso de escrita detetado no primeiro pedido formulado na petição inicial e proferido despacho saneador, em que se absolveu a ré da instância quanto ao terceiro pedido formulado naquele articulado – com a redação: «não pode neste momento contabilizar os danos emergentes, relegando para liquidação em execução de sentença» –, após o que se identificou o objeto do litígio e se procedeu à enunciação dos temas da prova.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença, em que se julgou a ação improcedente, absolvendo-se a ré dos pedidos e condenando-se o autor nas custas.
Inconformado, o autor interpôs recurso desta sentença, pugnando pela respetiva revogação e prolação de decisão que julgue procedentes os pedidos formulados, terminando as alegações com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem:
«1. Na douta sentença recorrida, deveria ter resultado facto provado que a resolução do contrato causou no Autor um estado de ansiedade e perturbação grave que afectaram o seu sossego e bem-estar.
2. O Autor, devido à resolução do contrato, ficou indignado, perturbado, envergonhado e ferido no seu brio profissional.
3. Esta factualidade, resulta demonstrada pelas próprias declarações de parte do Autor, das quais resulta claramente que o mesmo ficou gravemente abalado o seu bem-estar e mentalmente afectado no seu estado emocional. As declarações do assistente encontram-se gravadas entre as 09.51 e as 10:26 da sessão única de julgamento de 04/11/2024.
4. A Testemunha (…) refere expressamente aos minutos 09:00 e os 10:35 (depoimento entre as 10:39 – 10:58) ter conhecimento pessoal da perturbação emocional do Autor em virtude do litígio existente entre o A e a R. à data.
5. A testemunha (…), ao min 5:50 até 16:25 refere de forma detalhada no seu depoimento que o autor, por força da resolução do contrato pela Ré, ficou muito afectado psicologicamente. Inclusivamente, se tornou numa pessoa “agressiva”.
6. Os factos b), c) e d) da factualidade não provada foram incorrectamente julgados, devendo os mesmos passar a factos provados.
7. Quando a comunicação de resolução contractual é realizada, já há muito havia caducado o direito de resolução da Ré.
8. A Ré invoca na sua comunicação de resolução do contrato, que entre a Liberty e o autor houve quebra de confiança, o que tornou impossível a subsistência da relação contratual entre as partes, bem sabendo desde 2015 que a relação contractual se encontrava irremediavelmente comprometida.
9. Estava já então em 2015, na esfera de conhecimento da ré, a quebra de confiança contractual.
10. Não havendo sido convencionado contratualmente pelas partes no contrato, prazo para a resolução do contrato, deveria a ré ter procedido à sua resolução num prazo razoável, nos termos do disposto no artigo 436.º do Código Civil, e que nunca deveria ter excedido um ano desde o conhecimento do facto que fundamenta a resolução.
11. Constando do n.º 4 da factualidade dada como provada, que O Autor, com base numa gravação feita em outubro de 2015, acusou de furto um trabalhador da Liberty Seguros e fez, nessa altura, denúncia à Liberty e exigiu uma compensação financeira, que a mesma rejeitou. (…), reconhece o tribunal que já em Outubro de 2015 a Ré teve conhecimento pelo próprio Autor, que a relação contratual já se encontrava irremediavelmente comprometida e quebrada.
12. Iniciando-se nesse momento, o prazo para que esta fizesse cessar o contrato.
13. E fê-lo por via de resolução em 2020, data em que já havia caducado o respectivo direito.
14. Ainda que se considere não haver caducado o direito a fazer cessar o contrato, resulta que as comunicações posteriores do autor à ré em 2020 e as imputações aí feitas (que serviram igualmente de fundamento à resolução), não o são directamente à Liberty, mas sim ao então funcionário da Liberty acusado de furto.
15. Pelo que, nesta parte, entende o recorrente que houve erro de julgamento, e que as condutas do Autor, e que fundamentaram a resolução operada pela Ré, não são manifestamente violadoras dos deveres contratuais e legais decorrentes da relação contratual existente entre as partes, nem sendo ilícitas e culposas, não configurando, assim, justa causa para aquela resolução.
16. No exarado pela ré na comunicação enviada ao autor no dia 9 de Outubro de 2020,a ré a única coisa que faz é invocar cláusulas gerais e conceitos indeterminados, para legitimar a cessação do contrato existente com o autor.
17. A ré não faz referência a factos concretos que possam consubstanciar fundamento da cessação do contrato e/ou a resolução do mesmo.
18. A cessação unilateral do contrato referido, na comunicação ao autor com efeitos imediatos é ilícita, não produzindo o efeito típico aliado àquela forma de cessação do contrato.
19. Como consequência directa e necessária do comportamento ilícito da ré, o autor (…) sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais.
20. Sendo a resolução injustificada, e portanto ilícita, o autor da declaração responde pelo prejuízo causado à contraparte.
21. Posto isto, e salvo o devido respeito, a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 432.º, n.º 1, 436.º e 562.º do Código Civil, importando substituí-la (…) por outra que decida pela ilicitude da resolução unilateral da ré.
22. Devendo a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido do Autor.»
A ré apresentou contra-alegações, pronunciando-se no sentido da improcedência da apelação.
Face às conclusões das alegações do recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre apreciar as questões seguintes:
a) da invocação pelo apelante da caducidade relativa ao direito de resolução do contrato;
b) da validade da resolução extrajudicial do contrato operada pela ré;
c) do direito do autor a indemnização:
i. impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
ii. direito do autor a indemnização;
iii. quantificação do montante indemnizatório.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
2. Fundamentos
2.1. Decisão de facto
2.1.1. Factos considerados provados em 1.ª instância:
1) As partes celebraram, por documento particular datado de 27.04.2007, um contrato de agente de seguros Liberty, por via do qual a Ré autorizou e conferiu ao Autor poderes para este celebrar contratos de seguro com tomadores em seu nome e representação, mediante o pagamento de comissões.
2) Na cláusula 3ª do contrato referido em 1), sob a epígrafe “Serviços a prestar pelo segundo outorgante”, ficou convencionado:
“O Segundo Outorgante obriga-se expressa e irrevogavelmente a: (i) Promover a criação, manutenção e desenvolvimento de uma carteira de seguros tendo em vista atingir os objectivos de crescimento, sinistralidade e rentabilidade fixados anualmente pela Liberty; (ii) Promover assistência e manutenção da carteira de clientes já existentes na Liberty, e efectuar a prospecção de novos clientes; (iii) Respeitar sempre as regras de comunicação corporativas da Liberty e não efectuar qualquer tipo de acção publicitária com a identificação da Liberty, sem prévia autorização escrita desta; (iv) Representar a Liberty em quaisquer actos ou eventos relacionados com a actividade seguradora, quando para isso solicitado pela Liberty ou por sua iniciativa desde que devidamente autorizados pela Liberty; (v) Prestar diligentemente toda a assistência aos contratos de seguro que compõem a sua carteira, e apoiar, de acordo com as orientações que lhe forem dadas pela Liberty, os tomadores de seguro, segurados, pessoas seguras e sinistrados; (vi) Não prestar ao tomador do seguro outros serviços para além dos que estejam directamente relacionados com a actividade de mediação, salvo quando prévia e expressamente autorizado pela Liberty; (vii) Conhecer adequadamente e manter-se actualizado sobre todos os produtos disponibilizados pela Liberty, informando correctamente os seus clientes; (viii) Não facultar aos clientes qualquer informação relativa aos produtos da Liberty que não tenha sido aprovada e facultada por esta última; (ix) Cumprir todas as disposições legais aplicáveis à actividade de mediação, bem como as normas reguladoras da actividade seguradora, e bem assim todas as instruções da Liberty; (x) Respeitar o segredo profissional aplicável à sua actividade, bem como o regime legal de protecção de dados pessoais; (xi) Recolher toda a informação relativa à identificação dos clientes, bem como a demais que seja necessária para a elaboração dos contratos de seguro; (xii) Não promover contratos de seguro em condições diferentes das fixadas pela Liberty; (xiii) Manter todo o seu arquivo devidamente organizado e actualizado e permitir a sua consulta pela Liberty, sempre que por esta solicitado; (xiv) Participar assiduamente nas acções de formação conduzidas pela Liberty; (xv) Providenciar para que as cobranças sejam feitas no mais curto espaço de tempo e sempre dentro dos prazos fixados pela lei”.
3) Na cláusula 8ª do contrato referido em 1) ficou convencionado:
“8.1. Causas de cessação O presente Contrato cessará automaticamente os seus efeitos em qualquer dos seguintes casos: (i) em caso de cessação por mútuo acordo das Partes formalizado por escrito; (ii) em caso de morte ou incapacidade do Segundo Outorgante para o exercício da profissão de agente de seguros (iii) em caso de incumprimento por qualquer das Partes, total ou parcial, das obrigações estabelecidas no presente Contrato ou na legislação em vigor; (iv) em caso de infracção por qualquer das Partes do dever de lealdade ou de boa fé”.
4) O Autor, com base numa gravação feita em outubro de 2015, acusou de furto um trabalhador da Liberty Seguros e fez, nessa altura, denúncia à Liberty e exigiu uma compensação financeira, que a mesma rejeitou.
5) Em outubro de 2020, o Autor enviou para a Ré um documento, por correio eletrónico, no qual entende ter o direito a ser indemnizado pela Liberty Seguros e o direito a um tratamento privilegiado como mediador, ameaçando levar o assunto para as redes sociais e de dar conhecimento dos factos à Liberty Mutual Insurance Group (LMIG) em Boston, se aquela não lhe pagasse uma indemnização de € 30.000,00.
6) No documento referido em 5) consta: “(…) COMPENSAÇÃO AO LESADO: Apesar de se ignorar os totais dos valores em questão roubados, mas pelos vários anos que foram efectuados, os empréstimos forçados assim como pelos danos morais causados ao AGT (…) de que foi vítima, estima-se que o pagamento de € 30.000,00 limpos, fica abaixo dos valores reais ocorridos. Será esse o justo valor que o AGT fica aguardar V/ concordância a lhe ser pago. (…) Caso não haja feedback até 20 de Outubro, antes de sua subscrição, será publicado em várias redes para todo o Mundo, imagens e a informação da postura e cumplicidade que a Liberty Seguros teve para com o seu funcionário gatuno que por eles fora contratado. (…) Por o seu orgulho ter sido ferido, recorrerá o AGT até aos limites físicos e monetários, tudo fazer para que dele não se fiquem a rir, recorrerá à sua família militar, a todos seus contatos e admiradores que para ele sejam solidários, You tube etc., etc... Procurará que se torne um viral! Desmentindo a Liberty Seguros, que ao inverso do que eles apregoam, a seguradora não tem qualquer estima ou consideração para com seus Parceiros de negócios, sim só o interesse numerário, mesmo que no final tenham ficado muito prejudicados e ainda a Procissão vai na praça. PS. Até os srs. americanos vão gostar de apreciar as imagens e a forma como trabalha em Portugal sua filial -- Alerta, se não houver V/ feedback nos oito dias posteriores ao envio do presente mail para V. Exas., será o presente reenviado para a Liberty Mutual Insurance Group (LMIG) em Boston”.
7) A Ré não acedeu ao referido em 5) e o Autor o dia 19.10.2020, o Autor enviou, por correio electrónico, para a Liberty Mutual Insurance Group, em Boston, comunicação com o seguinte teor: “Prezado Diretor (…), Chamo-me (…), trabalho com a Liberty há muitos anos como agente (…), eu achava que era digno de alguma estima e consideração, mas parece que isso não existe na Liberty Portugal. Certo, que estas não são regras incentivadas pela Liberty da América, mas... Embora a Liberty Mutual Insurance não seja responsável pelos eventos, uma vez que é o nome original do grupo em Boston, bem como de outras filiais noutros continentes, todo o Grupo Liberty será "rastreado" se as imagens e factos forem tornados públicos. Vou esperar até 21 de Outubro e se a Liberty Portugal não fornecer feedback para corrigir a sua postura de: Falta de Respeito e Dignidade ao seu Parceiro de Negócios. Nada impede a sua publicação nessa data em todas as redes. Este e-mail foi-lhe endereçado para que não seja apanhado de surpresa. Atenciosamente. Telefone fixo (…) Móvel: (…) PS. Arquivo anexado com e-mail enviado à Liberty Portugal em alerta. Filme de imagens de um dos furtos e uma foto do ladrão a quem dava emprego”.
8) O Autor publicou nas redes sociais, em 21.10.2020, a seguinte mensagem: “(…) adicionou uma foto e um vídeo do dia 21 de outubro às 23:00. Ontem às 23:00 · · **Tanto é o funcionário ladrão, como o é o seu próprio patrão** Isto se deduz pelas imagens reais captadas e como os factos ocorreram! =Se és cliente Liberty ou pensas com eles subscrever contrato … analisa a postura de suas chefias e decide se isso será sensato?= A reação das suas chefias sem respeito nem dignidade... Foi o feedback da "Liberty Seguros" nesta triste realidade. Crime de Abuso de Confiança. Por ser honrado e honesto (mais isso facilita o pilho), considerando as amizades, confiava no amigo. Havia tempos que detetava extravio nas contas mas nunca imaginava que fosse essa pessoa. Só que tanto vai a cantarinha à fonte que um dia lá deixa a asa... Numa habitual visita do "artista" às quartas-feiras, as circunstâncias na gaveta do dinheiro, deram pista que seria aquele o tipo que me estava a originar os desfalques. Pelos vestígios, nesse dia fui roubado sem saber quanto. Na semana seguinte, após sua visita, como estive uns momentos ausente a vistoriar os vidros auto de contrato efectuado, dos exactos € 120,00 que sabia ter deixado na gaveta, só lá estavam € 80,00. Na semana seguinte, as filmagens e ele a roubar mais uma vez roubado..! Resumindo: Se nas últimas 3 semanas roubou sempre sem escrúpulos, identificou assim ter roubado quando tinha oportunidade vários anos nas suas visitas pois eu sentia isso no orçamento... Mesmo ingénuo eu, com a dica que ele me deu em 21 de Janeiro de 2012, até publiquei o facto no FBook continuando lá exposto. Tendo ele chegado nessa quarta-feira ao meu espaço com tanta euforia, eu pergunto-me hoje quanto teria sido a quantia que roubara na semana anterior??? Como eu não tinha empregados, estando coletado sem escrita organizada, razão porque não efectuava a Folha de Caixa Diária, isso era oportunidade para o ladrão. Foi o tipo admitido pela Liberty em 2009, como já tínhamos trabalhado quando ele estava na Axa na década de 90 última, fiquei satisfeito em reiniciar a trabalhar, sem duvidar da sua seriedade e reiniciar a amizade: Começando a produzir muito mais pelo seu apoio. Pelas imagens, ao ter finalmente descoberto quem era o ladrão, chamada a PSP ao local para os factos ficarem registados. Quando as autoridades chegaram já o ladrão se tinha esgueirado do local. Após a saída das autoridades, pelas 12h40 emiti e enviei mail com ficheiro anexo às chefias da seguradora, para seu delegado da zona sul. Lhe requeri apoio e ajuda como proceder para com a grave situação, pois fiquei a bater mal. Até hoje nunca me foi dada resposta ao meu pedido. Por nada receber em resposta, telefonei pelas 17h30 desse mesmo dia para Faro, falando com o delegado sobre o caso cerca de uns 10 mts, denunciando o seu técnico comercial, informando que tinha imagens brutais (para mim) que identificava quem era o gatuno que me roubava havia anos. Terminado o telefonema, fiquei a aguardar, pensando, será aberto um inquérito, vêm ver o filme para analisar, falar com a PSP, etc... Mas as chefias Liberty absolutamente nada fizeram. Desrespeito e indignidade para mim seu parceiro, que, nas dezenas de anos da N/ colaboração, pela reduzida sinistralidade lhes fez embolsar milhões de Esc./Euros. Que terão conversado Delegado e o funcionário gatuno nas suas seguintes reuniões, suspeito, pacto, cumplicidade??? Pois algo foi porque o delegado o enviou de novo, e o gatuno teve a ousadia de voltar ao local do crime quarta-feira quinze dias depois de ter sido expulso, ele com a pastinha debaixo do braço como se nada tivesse acontecido. Só posterior a essa visita, por eu ter "corrido" com o tipo do meu escritório, sou visitado pelos delegados a ver o filme e no seguinte dia o despediram. As chefias nunca me pediram desculpa nem mesmo verbal, nem apresentaram qualquer dado compensatório para me ajudar dos desfalques que fui vítima sabendo eles bem terem existido. A partir daí só me complicaram a vida, me retiraram as cobranças, cortaram acessos, etc... Parece que o ladrão fui eu?!!? Onde está a consideração e estima pelos seus Parceiros de Negócios que tanto apregoam. Grandes hipócritas! No encontro entre eles após acusação sem me ter facultado dados como seria obrigatório. Mafia. Pelos factos expostos com as minhas acusações, se amanhã eu vier sofrer algum atentado, será fácil deduzir por quem ele foi ordenado! PS. Como o MP arquivou o Proc. sem o crime ser julgado, parece que para a N/ lei os roubos por Abuso de Confiança são legais, tentei que a seguradora revisse a sua postura mas nada. Até a Liberty Mutual americana é igual, sem deles feedback ao meu e-mail. Como hoje dia 21 prescreve o Proc. eu salto para a sociedade, através das redes sociais peço aos amigos e conhecidos V/ solidariedade... Doa a quem doer, bora correr com eles! Não vamos deixar estes gajos ficarem a rir de gente honrada e honesta!!!!"
9) O Autor deixou de contratar novos seguros com a Ré e, no período compreendido entre 2016 e 2020, transferiu cerca de 90% da carteira de seguros para outras empresas de seguros.
10) Na sequência do referido em 5), 6), 7), 8) e 9), a Ré procedeu à resolução do contrato celebrado entre as partes, referido em 1), remetendo ao Autor carta datada de 03.11.2020, com o seguinte teor: “Informamos que devido ao incumprimento da sua parte do Contrato de Agente de Seguros celebrado em 27 de abril de 2007, e nos termos do disposto na Cláusula 8.1 (iii) e (iv) do mesmo, este irá cessar todos os seus efeitos, automaticamente. Da correspondência que nos dirigiu no passado dia 09 de Outubro, bem como do seu posterior comportamento, resulta clara a violação das suas obrigações de lealdade e de boa-fé para com a Liberty Seguros, resultando igualmente provado pelo conteúdo da sua exposição que não tem promovido a criação, manutenção e desenvolvimento da carteira de seguros, tal como é também sua obrigação contratual. Estas condutas constituem violações muito graves, nomeadamente ao disposto no artigo 29.º, alínea e), da Lei n.º 7/2019, de 16 de janeiro, bem como da Cláusula 3 (i) do Contrato de Agente de Seguros, comprometendo em definitivo a relação contratual existente, uma vez que a confiança que sempre deverá existir entre as Partes, se encontra irremediavelmente quebrada. Deste modo, nos termos da legislação aplicável e do Contrato, a Liberty Seguros faz, deste modo, cessar automaticamente o presente Contrato com justa causa, com todas as consequências legais e contratuais que advêm de tal decisão, uma vez que o comportamento adotado, torna imediata e praticamente impossível a subsistência da relação contratual. Ainda no que se refere à sua comunicação de dia 09 de Outubro, esclarecemos que os alegados factos que ali descreve tiveram a nossa oportuna reação que culminou, como é do seu conhecimento, com o afastamento do nosso então colaborador, sendo que nada mais temos a acrescentar sobre este assunto. A Liberty Seguros não é responsável, nem pode responsabilizar-se, por eventuais crimes cometidos pelos seus colaboradores. Os órgãos de polícia e os tribunais existem para essa finalidade, competindo aos queixosos, caso assim o entendam, prosseguir por essa via contra aqueles que os tenham lesado com um comportamento alegadamente criminoso. Da nossa parte, não nos revemos em nenhum desses alegados comportamentos e não vemos nenhum fundamento para negociar sobre quaisquer eventuais danos daí decorrentes. Ademais, a Liberty Seguros não pauta a sua conduta, seja ela negocial ou qualquer outra, por via de ameaças ou chantagens e, deste modo, não deixará de tomar as providências legais que entenda adequadas, caso venha a receber mais comunicações com este tipo de conteúdo”.
2.1.2. Factos considerados não provados em 1ª instância:
a) O Autor teve lucros cessantes no montante de € 25.500,00 devido à resolução do contrato;
b) Antes da data da resolução o Autor vivia tranquilamente, era uma pessoa saudável, feliz, alegre, sossegada e emocionalmente estável.
c) A resolução do contrato causou no Autor um estado de ansiedade e perturbação grave que afectaram o seu sossego e bem-estar.
d) O Autor, devido à resolução do contrato, ficou indignado, perturbado, envergonhado e ferido no seu brio profissional.
2.2. Apreciação do objeto do recurso
2.2.1. Invocação pelo apelante da caducidade relativa ao direito de resolução do contrato
Está em causa, nos presentes autos, a resolução pela ré de um contrato de mediação de seguros, reportado à categoria de agente de seguros, outorgado entre as partes, o que não vem questionado na apelação, existindo acordo a tal respeito.
Nas alegações de recurso, o apelante invocou a caducidade do direito de resolução do contrato com os fundamentos indicados pela apelada, sustentando que a respetiva comunicação foi dirigida pela ré ao autor após o decurso do prazo de caducidade.
Porém, esta questão não foi suscitada na 1ª instância, mas apenas em sede de recurso, nas alegações da apelação.
Na petição inicial, o autor invocou a invalidade da resolução contratual, alegando que foi operada sem fundamento legal, e sustentou que tal lhe causou danos patrimoniais e não patrimoniais, peticionando a condenação da ré em indemnização; esta pretensão foi rejeitada pela 1ª instância, por se ter considerado que o contrato foi validamente resolvido e que não assiste ao autor o direito a indemnização.
Considerando que a questão da caducidade do direito à resolução não foi colocada perante a 1ª instância, que sobre a mesma se não pronunciou, tendo sido suscitada pelo autor unicamente nas alegações do recurso de apelação, cumpre analisar a oportunidade de tal invocação.
Sob a epígrafe Apreciação oficiosa da caducidade, dispõe o artigo 333.º do Código Civil o seguinte: 1. A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes. 2. Se for estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, é aplicável à caducidade o disposto no artigo 303.º.
O artigo 303.º do aludido Código, por seu turno, reportando-se à invocação da prescrição, dispõe o seguinte: O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público.
Decorre destes preceitos que a caducidade, se for estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, não é de conhecimento oficioso, necessitando de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita.
Face ao regime estabelecido nos citados artigos 333.º, n.º 2, e 303.º, verifica-se que a caducidade do direito à resolução de um contrato de mediação de seguros, tratando-se de matéria não excluída da disponibilidade das partes, não pode ser oficiosamente conhecida, necessitando de ser invocada.
Assim sendo, não se tratando de questão de conhecimento oficioso, não pode a mesma ser suscitada no recurso de apelação, que visa reapreciar a decisão impugnada e não criar decisões sobre matéria nova, antes de impondo a respetiva invocação perante a 1ª instância, o que não ocorreu no caso presente.
Nesta conformidade, atenta a novidade da indicada questão, a qual não é de conhecimento oficioso, não será a mesma apreciada.
2.2.2. Validade da resolução extrajudicial do contrato operada pela ré
Vem posta em causa na apelação a decisão, proferida pela 1ª instância, que considerou validamente resolvido pela ré o contrato de mediação de seguros, reportado à categoria de agente de seguros, outorgado entre as partes.
A 1ª instância fundamentou tal decisão nos termos seguintes: Conforme resulta da factualidade provada, as partes celebraram, entre si, em 27.04.2007, um contrato de agente de seguros por via do qual a Ré, seguradora, autorizou e conferiu ao Autor poderes para este celebrar contratos de seguro com tomadores em seu nome e representação, mediante o pagamento de comissões. Sucede que, por carta de 03.11.2020, a Ré comunicou ao Autor a resolução do referido contrato, imputando-lhe a violação dos deveres de lealdade e boa-fé e a quebra de confiança (cfr. facto provado 10). Entende o Autor que tal resolução é ilícita e, por via disso, alega ter sofrido danos que pretende ver indemnizados. Importa apreciar e decidir. À data em que foi celebrado o referido contrato encontrava-se em vigor o Regime Jurídico do Acesso e do Exercício da Actividade de Mediação de Seguros ou de Resseguros (RJAEAM), aprovado pelo DL n.º 114/2006, de 31.07, que na alínea e) do artigo 5.º, definia “mediador de seguros” como “qualquer pessoa singular ou coletiva que inicie ou exerça, mediante remuneração, a atividade de mediação de seguros”. O referido diploma foi revogado pela Lei n.º 7/2019, de 16.01 (cfr. artigo 15.º) que aprovou o Regime Jurídico da Distribuição de Seguros e Resseguros, mantendo-se aquela definição. Com efeito, inexiste divergência entre as partes quanto à qualificação jurídica dada ao contrato, mas apenas quanto à licitude da resolução operada pela Ré, sendo sobre esta questão que teremos de nos debruçar. Em termos gerais, as causas de cessação do contrato de mediação são a caducidade (por exemplo, no termo de um prazo não sujeito a renovação, ou por morte do mediador pessoa singular ou extinção da pessoa colectiva), a cessação por mútuo acordo (acordo revogatório), a denúncia, com aviso prévio, por iniciativa discricionária de uma das partes, ou a resolução. A última causa de cessação – resolução – pressupõe a ocorrência de uma justa causa, conceito próprio dos contratos duradouros e o ónus da prova da existência de justa causa na cessação cabe à parte que faz cessar o contrato, pelo n.º 6 do artigo 55.º do RJDSR (Regime Jurídico da Distribuição de Seguros e Resseguros). E, nos termos do n.º 7, considera-se justa causa “o comportamento da contraparte que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação contratual”. Como é sabido, a resolução de um contrato é a extinção da relação contratual por declaração unilateral de um dos contraentes, baseada num fundamento superveniente à sua celebração (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, II, 7.ª ed., Coimbra: Almedina, 1997, pág. 275). Caracteriza-se por ser de exercício vinculado, só podendo ocorrer quando se verifique um fundamento, legal ou convencional, que autorize o seu exercício (artigo 432.º, n.º 1, C.Civil). Para além dos fundamentos legais, as partes podem convencionar, através de cláusulas resolutivas expressas, todo um conjunto de “circunstâncias cuja verificação eventual permite o recurso à resolução do contrato” (Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, II, 9.ª ed., Coimbra: Almedina, 2009, pág. 95). O principal fundamento da resolução é, precisamente, o incumprimento ilícito e culposo. A ilicitude manifesta-se, desde logo, pela referência contratual, a violação de uma obrigação contratual. Essa ilicitude tem que assumir uma gravidade que justifique, em termos de adequação e proporcionalidade, a ruptura do vínculo contratual, para que se possa dizer que esta é conforme à boa fé. O que está em causa é, no essencial, a “relação de desconformidade entre a conduta devida (a prestação debitória) e o comportamento observado” (Antunes Varela, Das Obrigações cit., pág. 93). Por outro lado, o comportamento ilícito tem, em regra, de ser culposo, o que se presume iuris tantum (artigo 799.º, n.º 2, Cód. Civil). A culpa é apreciada de acordo com o comportamento ou diligência de um bom pai de família (artigos 487.º, n.º 2 e 799.º, n.º 2, do Código Civil). A ideia de culpa resulta da imputação pessoal ao devedor de um juízo de censura ou reprovação, porque não só devia, como podia ter agido de outro modo (Antunes Varela, Das Obrigações cit., pág. 95). No caso dos autos, na declaração resolutória de 03.11.2020, referida no facto 10), essa justa causa consistiu, por um lado, na violação do dever de lealdade e de boa-fé, em virtude das condutas descritas nos factos provados 6), 7) e 8), e, por outro, o facto de o Autor não promover a criação, manutenção e desenvolvimento da carteira de seguros (facto 9). Conforme dispõe o artigo 29.º, alínea e) do RJDSR, é dever do mediador de seguros para com as empresas de seguros “atuar com lealdade”. E, conforme decorre do teor do contrato celebrado entre as partes (facto provado 2), o Autor obrigou-se perante a Ré a promover a criação, manutenção e desenvolvimento de uma carteira de seguros tendo em vista atingir os objectivos fixados anualmente pela Ré. A factualidade provada demonstra que o Autor acusou de furto um colaborador da Ré e exigiu que esta lhe pagasse € 30.000,00 sob pena de publicar nas redes sociais e dar conhecimento à Liberty Mutual Insurance Group (LMIG) em Boston informações sobre a Ré, designadamente que compactuou com o referido colaborador. Com efeito, e conforme ficou provado, o Autor concretizou aquele facto. E, as imputações ali feitas à Ré (e que aqui se dão por reproduzidas) colocaram em causa a sua imagem, enquanto empresa de seguros, perante o público e perante a Liberty Mutual Insurance Group, em Boston, quebrando a relação de confiança entre as partes porquanto violadoras dos deveres de lealdade e de boa-fé impostos pela relação contratual. Acresce que, conforme ficou provado, o Autor deixou de contratar novos seguros com a Ré e, no período compreendido entre 2016 e 2020, transferiu cerca de 90% dos seguros em carteira para outras empresas de seguros, violando, com esta conduta, não só aqueles deveres de lealdade e de boa-fé como, também, e de forma intencional, a obrigação contratual de promover a criação, manutenção e desenvolvimento da carteira de seguros, imposta pela alínea i) da cláusula 3ª do contrato (facto provado 2). As condutas do Autor, que resultaram provadas e fundamentaram a resolução operada pela Ré, são manifestamente violadoras dos deveres contratuais e legais decorrentes da relação contratual existente entre as partes, sendo ilícitas, culposas e tornando objectivamente impossível a subsistência da mesma, configurando, assim, justa causa para aquela resolução. Ao contrário do sustentado pelo Autor, na declaração de resolução a Ré mostram-se expressamente fundamentadas as razões da mesma e que são do conhecimento daquele. Ante o exposto, e sem necessidade de outras considerações, a resolução contratual operada pela Ré, que se mostra fundamentada, foi lícita.
Discordando deste entendimento, o apelante defende a invalidade da resolução contratual operada pela ré, sustentando, em síntese, o seguinte: i) as comunicações que dirigiu à ré, por esta invocadas como fundamento da resolução contratual, não integram a imputação de qualquer atuação à própria seguradora, mas apenas ao respetivo funcionário, a quem é imputada a prática de furto; ii) na comunicação que dirigiu ao autor em 09-10-2020, a ré não invoca factos concretos como fundamento da resolução do contrato, apenas indicando cláusulas gerais e conceitos indeterminados.
Vejamos se lhe assiste razão.
Face ao objeto da apelação, cumpre averiguar da validade da resolução extrajudicial do contrato operada pela ré.
Ao contrato de mediação de seguro são aplicáveis, além das normas previstas no Regime Jurídico da Distribuição de Seguros e de Resseguros (RJDSR) aprovado pela Lei n.º 7/2019, de 16-01, as regras gerais relativas ao cumprimento e incumprimento das obrigações que com aquelas se não revelem incompatíveis, cumprindo atender, ainda, ao estabelecido no contrato celebrado entre as partes.
É sabido que a resolução consiste numa forma de cessação do contrato operada por um dos contraentes, com fundamento em evento posterior à respetiva celebração, a qual, em regra, destrói retroativamente o vínculo estabelecido, salvo se tal retroatividade contrariar a vontade das partes, conforme estatui o artigo 434.º, n.º 1, do Código Civil.
Nos termos do disposto no artigo 432.º, n.º 1, do citado código, a resolução do contrato só é permitida se fundada na lei ou em convenção. Daqui resulta que esta forma de cessação do contrato corresponde ao exercício de um direito potestativo vinculado, dado que só é admitida se fundada em cláusula resolutiva estatuída pelos contraentes ou em fundamento legal que a justifique.
Conforme se extrai do excerto supra transcrito da decisão recorrida, a 1ª instância considerou que a ré, na comunicação de 03-11-2020 que dirigiu ao autor, declarou resolvido o contrato mediante a invocação de dois fundamentos distintos – a saber: i) violação do dever de lealdade e de boa-fé, em virtude das condutas descritas nos factos provados 6), 7) e 8); ii) o facto de o Autor não promover a criação, manutenção e desenvolvimento da carteira de seguros (facto 9) –, o que não vem posto em causa na apelação. Mais considerou a 1ª instância verificados ambos os fundamentos invocados pela ré na declaração resolutiva, tendo-se consignado que cada um deles constitui motivo válido de resolução contratual, na sequência do que se julgou válida a resolução com base nos mesmos operada pela ré e, consequentemente, improcedente a pretensão deduzida pelo autor na ação.
Na apelação que interpôs, o autor impugnou a parte da decisão recorrida em que se considerou verificado o primeiro dos supra indicados fundamentos invocados para a resolução – i) violação do dever de lealdade e de boa-fé, em virtude das condutas descritas nos factos provados 6), 7) e 8) –, não pondo em causa a parte da sentença em que se considerou verificado o segundo fundamento invocado pela ré – ii) o facto de o Autor não promover a criação, manutenção e desenvolvimento da carteira de seguros (facto 9) – e se julgou válida a resolução contratual com base neste operada, matéria que não integra o objeto do recurso.
Verificando que a 1ª instância invocou dois fundamentos decisórios – considerou válida com base em dois fundamentos distintos a resolução contratual operada extrajudicialmente pela ré e, em consequência da validade da resolução contratual, julgou improcedente a pretensão deduzida pelo autor na ação – e que um dos fundamentos da decisão final não integra o objeto da apelação, daqui decorre a insusceptibilidade da reapreciação de tal fundamento por esta Relação, atento o caso julgado material decorrente da aceitação do decidido quanto a este fundamento não impugnado no recurso.
Assente que a 1ª instância invocou dois fundamentos decisórios e que a discordância manifestada pelo apelante no recurso se reporta apenas a um deles, a apreciação da validade da resolução operada com base no fundamento impugnado pelo recorrente mostra-se inútil, já que sempre se manteria a validade da resolução operada com base no outro fundamento tido em conta na decisão recorrida, bem como a consequente improcedência da pretensão deduzida pelo autor.
Nesta conformidade, verificando que a eventual procedência da questão suscitada pelo autor na apelação, dado que reportada a apenas um dos fundamentos decisórios, se mostra inidónea à alteração da decisão recorrida, não pode o recurso deixar de soçobrar quanto à questão da validade da resolução contratual operada extrajudicialmente pela ré, face ao imperativo acatamento do decidido relativamente ao outro fundamento, o que torna inútil a reapreciação do fundamento decisório impugnado na apelação.
Tendo-se concluído que a reapreciação da decisão proferida, na parte relativa ao fundamento decisório impugnado na apelação, se mostra inútil, face ao estatuído no artigo 130.º do CPC, cumpre rejeitar tal reapreciação.
Rejeita-se, assim, a reapreciação da argumentação deduzida pelo apelante, na parte relativa à validade da resolução contratual operada pela ré.
2.2.3. Direito do autor a indemnização
O autor baseia a indemnização peticionada nos presentes autos na invalidade da resolução contratual operada pela ré, sustentando que tal lhe causou danos patrimoniais e não patrimoniais.
Mostrando-se assente, pelos motivos expostos em 2.2.2., a validade da resolução contratual operada pela ré, afastada se mostra a invalidade do ato em que o autor baseia o invocado direito a indemnização, o que impede se considere verificada a obrigação de a ré indemnizar o autor por danos decorrentes da extinção do contrato entre ambos celebrado.
Nesta conformidade, verifica-se que a decisão da questão apreciada em 2.2.2., ao impor se considere que não assiste ao autor o direito a indemnização, conduz necessariamente à improcedência da apelação, o que prejudica a apreciação das demais questões suscitadas do recurso, designadamente a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, dado que reportada unicamente a factualidade relativa a danos cuja indemnização vem peticionada pelo autor na ação.
Cumpre, assim, julgar improcedente a apelação.
Em conclusão: (…)
3. Decisão
Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
Notifique.
Évora, 13-11-2025
(Acórdão assinado digitalmente)
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite (Relatora)
Vítor Sequinho dos Santos (1º Adjunto)
Maria Domingas Simões (2ª Adjunta)