I – No caso dos baldios, a personalidade judiciária pertence às comunidades locais erigidas em assembleia de compartes, (nº 1 do art.º 4º da lei n.º 75/2017, de 17 de agosto), e a capacidade judiciária pertencerá ao conselho diretivo, enquanto órgão executivo daquela comunidade local, em cujas competências se incluem as de recorrer a juízo em defesa dos direitos e interesses daquela e de representar o universo dos compartes.
II – A atuação em juízo de um conselho diretivo, naturalmente em representação de uma comunidade local, dependerá sempre ou da prévia deliberação nesse sentido da assembleia de compartes (al. q) do art.º 24º da mencionada Lei) ou de posterior deliberação da mesma assembleia a ratificar a sua atuação quando, em situação de urgência, instaurou ação judicial e constituiu mandatário para defesa dos interesses legítimos da comunidade correspondente ao baldio (al. h) do art.º 29º da mesma Lei).
(Sumário elaborado pelo Relator)
O «CONSELHO DIRETIVO DO BALDIO DA FREGUESIA DE ...», órgão executivo da comunidade local formada pela assembleia de compartes do Baldio de ..., representado pelo seu Presidente, AA, BB, CC e DD, na qualidade de compartes do Baldio de ..., instauram ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra:
1ª - A..., Ldª, sociedade comercial por quotas com sede em ..., ...:
2º - EE e mulher FF;
Alegam também que o Conselho Diretivo autor instaurou a presente ação sem a prévia autorização da assembleia de compartes, o que constitui uma exceção que, não sendo sanada, determina a absolvição da instância.
Alegam ainda que a ré A..., em setembro de 2020, instaurou uma ação (Proc. n.º 1150/20....) contra o Baldio em causa, pedindo ao tribunal, designadamente, que reconhecesse o seu direito de propriedade da sobre o logradouro e anexos da Pousada de ... e ordenasse respetivo registo, ação essa que foi julgada procedente na 1ª instância e cujo recurso se encontrava, na altura da contestação, pendente no Tribunal da Relação de Coimbra.
Defendendo existir identidade de sujeitos processuais, de pedido e de causa de pedir em ambas as ações, deduzem a exceção de litispendência.
Tendo em consideração o teor da procuração forense junta aos autos pelo autor CD do Baldio [com poderes exclusivamente para interpor recurso no âmbito de um outro processo – não para instauração da presente ação] e o teor da posição processual assumida pelos réus, o tribunal convida os autores a juntarem aos autos, no prazo de 10 dias, cópia da deliberação da assembleia de compartes que autorizou a propositura da presente ação e a contratação de advogado para o efeito e nova procuração forense assente nessa deliberação e na subsequente deliberação do CD - tudo isto tendo em vista a regularidade da intervenção e representação processual do CD do Baldio e as eventuais consequências processuais daí decorrentes.
Notifique
Bem como procuração forense datada de 24 de setembro de 2024, que afirmam estar de acordo com de com a deliberação suprarreferida;
(…).
(…).
Pelo exposto, o tribunal julga procedente a exceção de litispendência e, em consequência, nos termos dos artigos 576º/1 e 2, 577º/i), 578º e 580º a 582º do Código de Processo Civil, absolve a ré da instância.
Tendo em consideração as circunstâncias em que a presente ação foi instaurada, na pendência de uma anterior ação com o mesmo objeto processual, cujos contornos os autores não podiam desconhecer, nos termos do artigo 16º/5 e 6 da Lei n.º 75/2017, de 17/08, condena os autores nas custas da ação – cfr. artigo 527º/1 do Código de Processo Civil.
(…).
(…).
Perante o teor das conclusões formuladas pelos recorrentes, em ambos os recursos – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito de cada um dos recursos, nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil - as questão a apreciar são as seguintes:
a) Se se verificava a irregularidade de representação do Conselho Diretivo do Baldio da Freguesia de ..., por falta de autorização/deliberação da assembleia de compartes (recurso da decisão de 9 de janeiro de 2025);
b) Se o tribunal da 1.ª instância deveria ter julgado, como fez, verificada a exceção dilatória de litispendência e, nessa medida, absolvido a ré da instância (recurso da decisão de 20 de fevereiro de 2025).
Foi por isso que o tribunal a quo, com fundamento no disposto no art.º 29º do Código de Processo Civil, ordenou a notificação do ora recorrente para juntar aos autos certidão da ata da assembleia de compartes que o havia autorizado a interpor a presente ação ou, em alterativa, a ata da assembleia de compartes, posterior à data da interposição da presente ação, que ratificasse todo o processado realizado até ao momento, o que não fez.
Em razão do não suprimento da falta da autorização da assembleia de compartes, foi considerada verificada a exceção dilatória prevista na al. d) do art.º 577º do Código de Processo Civil (falta de autorização ou deliberação que o autor devesse obter) e, assim, foram os réus absolvidos da instância, na parte referente à ação interposta pelo mencionada Conselho Diretivo.
O recorrente defende o desacerto desta decisão, sustentando que a situação vertente – em que está em causa interposição de ação em que, além do mais, se pede a declaração de nulidade de atos de apossamento praticados por terceiros em relação ao baldio – “não é enquadrável no disposto na alínea q) do art.º 24º da lei 75/2017, mas antes na hipótese do n.º 9 do art.º 6 da mesma Lei, que, na sua al. a), prevê a legitimidade própria dos órgãos da comunidade local (sem distinguir entre eles) para arguirem em juízo a nulidade dos atos ou negócios jurídicos de apropriação ou apossamento, por terceiros, tendo por objeto terrenos baldios, bem como da sua posterior transmissão (..)”.
Ao fim e ao cabo, defende que o nº 9 do art.º 6º da mencionada lei “é uma norma especial, que derroga a norma geral ao definir a legitimidade (e, indiretamente, as competências, no que respeita aos órgãos) para o caso especial que é a interposição de ação de nulidade de atos de desapossamento – que é a hipótese mais grave, radicalmente mais grave, entre os atos em que está em causa a defesa dos interesses e direitos do baldio” (sic).
Vejamos.
O art.º 6 da Lei dos baldios preceitua no seu n.º 4 que, “(o)s atos ou negócios jurídicos de apropriação ou apossamento, por terceiros, tendo por objeto terrenos baldios, bem como da sua posterior transmissão, são nulos, nos termos gerais de direito, exceto nos casos expressamente previstos na presente lei”.
Por seu turno, o n.º 9 da mesma norma dispõe:
9 - A declaração de nulidade pode ser requerida:
a) Pelos órgãos da comunidade local ou por qualquer dos compartes;
b) Pelo Ministério Público;
c) Pela entidade na qual os compartes tenham delegado poderes de administração do baldio ou de parte dele;
d) Pelos cessionários do baldio.
Nos termos do n.º 10 da mesma norma, “(a)s entidades referidas no número anterior têm também legitimidade para requerer a restituição da posse do baldio, no todo ou em parte, a favor da respetiva comunidade ou da entidade que legitimamente o explore”.
A redação dos n.ºs 9 a 10 do citado art.º 6 da Lei dos Baldios aprovada pela Lei n.º 75/2017. manteve, no essencial que para aqui releva, a redação dada aos n.ºs 2 e 3 do art.º 4º da anterior Lei n.º 68/93, de 4 de setembro[3] (cuja versão original foi entretanto alterada pela Lei n.º 72/2014, de 2 de setembro).
Ora, com a introdução desta norma – o mencionado art.º 4 da Lei n.º 68/93, de 4 de setembro - o legislador visou dissipar as dúvidas que, na vigência do DL n.º 36/76, subsistiam quanto à questão da legitimidade para “defender” os baldios.
Nas palavras de Jaime Gralheiro[4], “(…) durante a vigência do Dec.-Lei n.º 39/76 era jurisprudência mais ou menos assente que, apenas as Assembleias de Compartes, representadas pelos Conselhos Diretivos tinham legitimidade para intentar ações judiciais reivindicando ou defendendo os baldios de qualquer ataque. As juntas de freguesia e as câmaras municipais não tinham legitimidade para intentarem em juízo qualquer ação relativa aos baldios. (…)
Quanto á legitimidade do Estado, só lhe era reconhecida, quando estavam sujeitos ao regime florestal e o Estado intervinha na defesa dos interesses dos serviços Florestais.
Aos compartes não era conhecida qualquer legitimidade.
Com o n.º 2 do art. 4 da Lei n.º 68/9 pretendeu dar-se resposta às dúvidas levantadas na vigência dos Decs-Lei 39 e 40/76 e, por isso, hoje, a questão da legitimidade põe-se em termos diferentes e disso são conta os Tribunais Superiores.
Para além do mais, abriu-se o leque da legitimidade activa, contemplando os próprios compartes que foi, na prática, a melhor porta aberta para defender os baldios da ganância dos grandes, designadamente das Juntas de freguesia que continuam a apoderar-se dos baldios e seus rendimentos, passando por cima dos compartes”.
Quer dizer, com a norma em questão, o legislador apenas terá pretendido identificar as entidades/pessoas a que reconhecida legitimidade para formularem aquele tipo de pedidos.
Como nos diz João Carlos Gralheiro[5], “entende-se que o legislador, ao introduzir aquela tabela de entidades/pessoas com legitimidade para formularem os pedidos de nulidade, mais não teria feito do que identificar os interessados referidos no art.º 286º do CC, pelo que não se partilha a interpretação segundo a qual, na Lei n.º 68/93, se haveria criado um regime de nulidades mistas : invalidades que reúnem no seu regime traços próprios das nulidades (sentido restrito) com traços e características das anulabilidades”.
Isto posto, entendemos não ser de acompanhar o argumento da recorrente segundo o qual, “se o poder previsto na alínea a) do nº 9 do art.º 6º da lei 75/2017 estivesse dependente do disposto na alínea q) do art.º 24º da lei 75/2017 teríamos que aquela seria inútil, o que levaria a presumir que o legislador não consagrou a solução mais acertada nem soube exprimir o seu pensamento nos termos adequados, o que violaria o nº 3 do artº 9º do Código Civil”.
É que, como se disse, com a introdução da norma do art.º 4º da Lei dos Baldios aprovada pela lei n.º 68/93 [em tudo idêntica à previsão do artigo 6º, n.ºs 4 e 9 da atual Lei dos Baldios (Lei n.º 75/2017)], o legislador não pretendeu atribuir uma nova ou distinta legitimidade aos órgãos da comunidade local para instaurarem ações judiciais com vista a reivindicarem ou defenderem os baldios de atos de apossamento - pois que, na vigência da anterior Lei 39/76, a legitimidade das assembleias de compartes, representadas em juízo pelos conselhos diretivos nunca esteve em causa – mas tão só clarificar as demais pessoas/entidades a quem deveria ser reconhecida tal legitimidade.
Daí que, como bem nota o despacho recorrido, o preceito em análise, quando expressamente atribui legitimidade para a instauração daquele tipo de ações aos órgãos do baldio, não possa ser interpretado desenquadrado das competências de cada órgão, valendo isto para dizer que, tendo o conselho diretivo legitimidade para instaurar tais ações em representação da assembleia de compartes, a não ser em caso urgência, não o pode fazer sem a prévia autorização da assembleia de compartes.
E de facto, no caso dos baldios, a personalidade judiciária pertence às comunidades locais erigidas em assembleia de compartes, (nº 1 do art.º 4º daquele diploma), e a capacidade judiciária pertencerá ao Conselho Diretivo, enquanto órgão executivo daquela comunidade local[6].
Pode assim dizer-se que o Conselho Diretivo é o órgão da comunidade dos compartes, ou comunidade local para a administração dos baldios, a quem cabe funções executivas, nas quais se incluem as de recorrer a juízo em defesa dos direitos e interesses daquela e de representar o universo dos compartes.
Por conseguinte, a atuação em juízo de um conselho diretivo, naturalmente em representação de uma comunidade local, dependerá sempre ou da prévia deliberação nesse sentido da assembleia de compartes (al. q) do art.º 24º) ou de posterior deliberação da mesma assembleia a ratificar a sua atuação quando, em situação de urgência, instaurou ação judicial e constituiu mandatário para defesa dos interesses legítimos da comunidade correspondente ao baldio (al. h) do art.º 29º).
A falta de tal deliberação (prévia ou de ratificação), não sendo sanada no prazo fixado pelo Tribunal – como o não foi no caso em análise - conduz à absolvição dos Réus da instância (art.º 577º, al. d) do Código de Processo Civil).
Improcede, assim, o recurso, devendo manter-se a decisão recorrida.
Enfrentemos agora o recurso interposto da decisão que considerou verificada a exceção de litispendência e absolveu a ré da instância.
A questão essencial que, neste recurso, se coloca à apreciação deste tribunal é a de saber se, no caso dos autos, ocorre uma situação de litispendência entre a presente ação e a ação de processo comum n.º 1150/20...., que foi instaurada no dia 17/09/2020 e, que, à data da instauração da primeira, corria termos na Comarca da Guarda, Juízo Local Cível – Juiz 2.
De acordo com o preceituado no art.º 580.º do Código de Processo Civil, "[a]s excepções da litispendência e do caso julgado pressupõem a repetição de uma causa; se a causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência; se a repetição se verifica depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, há lugar à excepção do caso julgado” (n.º 1).
Traçando a diretriz substancial destes institutos, o n.º 2 do mesmo preceito dispõe que “[t]anto a excepção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior", em homenagem ao princípio da certeza e segurança jurídica, próprio do Estado de Direito e consagrado no artigo 2.º da Constituição (evitando que o tribunal contradiga uma decisão anterior), bem como ao princípio da economia processual (evitando que o tribunal pratique atos inúteis ao conhecer de uma segunda ação idêntica à primeira, reproduzindo o que já foi decidido). Mas também em homenagem ao prestígio das instituições judiciárias e da função constitucional que lhes está atribuída, que seria comprometido no mais alto grau se a mesma situação concreta, uma vez definida por um órgão de soberania em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente[7].
É o artigo 581.º do Código de Processo Civil que densifica os requisitos da litispendência e do caso julgado estabelecendo no seu n.º 1 que a repetição da causa se verifica “quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir" e enunciando nos seus n.ºs 2 a 4 que:
“2 — Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3 — Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4 — Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido.”.
Segundo o Professor José Alberto do Reis[8], quando haja dúvidas sobre a identidade das ações, deve lançar-se mão do princípio segundo o qual o tribunal pode correr o risco de contradizer ou reproduzir decisão proferida na primeira ação. Se isso acontecer, então estaremos perante duas ações idênticas.
A decisão da 1.ª instância julgou procedente a exceção dilatória da litispendência, absolvendo a ré «A..., Ldª» da instância nesta ação, com base nos seguintes fundamentos:
«[…] Assim, para aferirmos se existe litispendência, analisando a petição inicial dos presentes autos, constata-se que os autores pretendem, com a mesma, a condenação da ré a reconhecer: a) que se está a apossar de uma parcela de terreno, a identificada no n.º 67 deste articulado, parcela que integra o Campo ... que é terreno baldio da área geográfica do baldio de ...; b) que esse apossamento é nulo e como tal deve ser decretado com todas as consequências.
Analisando a causa de pedir, assente na propriedade da parcela de terreno identificada no artigo 67º da petição inicial, constata-se que está em causa a parcela de terreno que a ré A... alega integrar o logradouro do seu prédio – “uma parcela de terreno com um feitio trapezoidal situada em frente ao artigo 493º, do outro lado da Estrada, (conforme desenho, sem ser à escala e a sua localização aproximada em mapa Google, da dita parcela de terreno, … (DOC. 26)”, documento este que não é nada mais na menos que o doc. que a ré A... juntou com a sua petição inicial como doc. 15, na anterior ação.
Dito isto, entrando no preenchimento dos pressupostos legais da litispendência, não há dúvidas que estamos perante uma repetição de causas com o mesmo objeto processual, ou seja, a mesma causa de pedir e os mesmos pedidos, independentemente da identidade ou posição dos sujeitos processuais.
Na verdade, não obstante as partes se encontrarem em papéis processuais invertidos, a causa de pedir em ambas as ações é sempre a mesma: a propriedade do logradouro e anexos da Pousada explorada pela aqui ré A..., independentemente de quem se arroga seu proprietário.
Por outro lado, encontrando-se as partes em posições processuais invertidas, o efeito jurídico que ambas pretendem com as ações que instauraram é também sempre o mesmo: o reconhecimento e condenação a parte contrária a reconhecer que o logradouro em causa e seus anexos pertencem-na presente ação, ao Baldio em causa e, na anterior ação, à aí autora A....
A única dissintonia que existe é relativamente à identidade das partes. Encontrando-se em ambas as ações como parte, em posições processuais invertidas, a aqui ré A..., na anterior ação a parte contrária era o Baldio da freguesia de ..., enquanto que na presente ação a parte contrária são, para além do Conselho Diretivo do Baldio da freguesia de ..., os compartes BB, CC e DD, que são simultaneamente membros e representantes do Conselho Diretivo do Baldio da freguesia de ... - tal como resulta da procuração forense que o Conselho Diretivo do Baldio da freguesia de ... juntou aos autos.
Dito isto, havendo identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica, sendo o Baldio da freguesia de ... a entidade que legitima a atuação do seu Conselho Diretivo, dos membros ou representantes do Conselho Diretivo ou, em última análise, dos seus compartes, estamos em crer que a qualidade jurídica que estas pessoas invocam para fundamentar a propositura da ação é sempre a mesma: a de representantes ou membros do Baldio da freguesia de ..., visando com a sua atuação a produção do mesmo efeito jurídico para o Baldio em causa, isto é, o reconhecimento do direito de propriedade do Baldio sobre o logradouro e anexos em causa.
Na verdade, como bem alega a ré, os autores compartes e membros do conselho diretivo do Baldio, atuam numa posição processual destituída de qualquer conteúdo autónomo relativamente à posição processual do Baldio, sendo o interesse em discussão sempre e só da comunidade dos compartes, atuando os compartes não em nome próprio, mas para benefício desta comunidade, que é o verdadeiro sujeito processual.
Assim, havendo identidade de sujeitos, pedidos e causas de pedir, tendo a presente ação sido instaurada quando a anterior ainda se encontrava pendente, conclui-se que procede a exceção de litispendência”.
Nas suas alegações, os recorrentes não colocam em causa a existência de “identidade de pedido e de causa de pedir”.
Já quanto à identidade de sujeitos, refutam que a mesma se verifique.
E, de facto, parece-nos patente que, em ambas as ações em cotejo, discute-se a mesma questão jurídica, ou seja, a propriedade do logradouro e anexos da Pousada explorada pela aqui ré A..., independentemente de quem se arroga seu proprietário.
A diferença está em que, na ação primeiramente intentada, a ali autora, ora recorrida, peticionou o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o logradouro e anexos da Pousada de ... e, que seja ordenado o respectivo registo e a consequente a declaração de nulidade da escritura de justificação que incidiu sobre a referida parcela e o cancelamento da descrição predial com o n.º ...87/... (B...). Já na presente ação, intentada cerca de dois anos depois pelos ora recorrentes (e pelo Conselho Diretivo do Baldio da Freguesia de ...), estes peticionaram a condenação dos réus a reconhecerem que se estão a apossar de uma parcela de terreno, a identificada no n.º 67 da petição inicial, que integra o Campo ... que é terreno baldio, da área geográfica do baldio de ..., e que esse apossamento é nulo e como tal deve ser decretado, com todas as consequências.
Como é sabido, a individualização da ação faz-se pelas partes (autor e réu) e pelo objeto (causa de pedir e pedido).
Ao conceito de repetição da causa – para efeitos de verificação da exceção de litispendência/caso julgado – é indiferente que seja, ou não, a mesma a posição das partes nos primeiro e segundo processos, podendo ser autor na segunda ação o réu da primeira e vice-versa e, consequentemente, é também irrelevante que, na segunda ação, se peça o mesmo da primeira ou o inverso do que nela se pediu[9].
Por isso, e como ensina Lebre de Freitas, haverá litispendência quando, estando pendente instância para a qual foi citado o réu, surge uma nova ação entre as mesmas partes e com o mesmo objeto e na nova ação, com fundamento na mesma causa de pedir, “se pede o mesmo ou o inverso, se houver inversão das partes”[10].
Aliás, como decorre do disposto no artigo 564.º do Código de Processo Civil que rege sobre os efeitos da citação, esta, além de outros efeitos especialmente prescritos na lei, inibe o réu da primeira ação de propor contra o autor da mesma – in casu o ora recorrido, que a instaurou – ação destinada à apreciação da mesma questão jurídica. É o que claramente resulta da alínea c) do preceito.
Nesse sentido, um dos efeitos da citação é, precisamente, a restrição e coartação imposta ao réu de propor contra o autor ação destinada à apreciação do mesmo objeto processual, isto é, de um pedido normalmente deduzido ao contrário.
Se o fizer “haverá litispendência e a segunda ação não poderá prosseguir”[11], nos termos das disposições conjugadas dos artigos 580.º, n.º 1, 581.º, n.º 1 e 582.º, do Código de Processo Civil.
Todavia, para que, no caso em análise, se conclua pela verificação de litispendência, ou para que se possa afirmar o tribunal pode ver-se, na presente ação, na contingência de contradizer a decisão final que viesse a ser proferida no processo n.º 1150/20...., necessário será apurar se se verifica a identidade de sujeitos em ambas as ações.
É esse, como vimos, o ponto central da questão que se coloca no presente recurso.
Tal como ensina Alberto dos Reis[12], “a exigência da identidade subjetiva (identidade de autor e de réu nas duas ações) corresponde ao princípio da relatividade do caso julgado” e, por isso mesmo, ele só há de ter “a eficácia que lhe é peculiar, em relação às pessoas que figuram como partes na ação em que ele se formou”.
Quem está impedido de intentar nova ação será toda a pessoa, singular ou coletiva, que já tenha visto anteriormente apreciada a sua pretensão.
Em regra, só autor e réu podem achar-se abrangidos por uma decisão na construção da qual participaram, onde lhes foi possível a adução de razões de procedência da sua pretensão e de improcedência da pretensão da contraparte[13].
Da mesma forma que, em princípio, só esses sujeitos podem ser obrigados a não litigar de novo em causa idêntica.
Mas o que está aqui em discussão é não a identidade física. Pelo contrário, a relevância reside na identidade jurídica dos sujeitos. E, “para averiguar o preenchimento do requisito da identidade de sujeitos, deve atender-se, não a critérios formais ou nominais, mas a um ponto de vista substancial, ou seja, ao interesse jurídico que a parte concretamente atuou e atua no processo"[14].
Vejamos, então, se é possível afirmar a identidade de sujeitos em ambas as ações em confronto, tendo por assente que, como se disse à identidade não obsta a que as partes aparecem em posições inversas numa e noutra ação.
A presente ação é instaurada pelo Conselho Diretivo do Baldio da Freguesia de ..., na qualidade de órgão executivo da comunidade local formada pela assembleia de compartes do Baldio de ... e por BB, CC e DD, estes na qualidade de compartes do Baldio de ..., contra «A..., Ldª» e ainda contra EE e FF (estes últimos considerados partes ilegítimas e absolvidos da instância, por decisão transitada em julgado).
A ação que correu termos sob o n.º Sob o nº 1545/23.... foi instaurada pela sociedade «A..., Ldª», aqui ré, contra o “Baldio da Freguesia de ...”.
A questão que se coloca é saber se a parte demandada na ação n.º 1545/23.... é a mesma que instaurou a presente ação.
A resposta a esta questão exige que se analise a questão da personalidade jurídica dos baldios, o que será feito à luz da vigente Lei n.º 75/2017, de 17 de agosto.
Como nos diz João Carlos Gralheiro[15], «(o)s baldios, melhor dizendo, as comunidades locais compostas pelo universo de compartes, integrados pelos compartes, que andam na posse e gestão comunitárias dos terenos que constituem o seu logradouro comum podem/devem ser vistos como “centros autónomos de relações jurídicas” suscetíveis de direitos e obrigações, com aptidão para funcionar como centro de uma esfera jurídica”, formado por organizações de (…) bens e homens, dirigidos à realização de interesses comuns ou coletivos (…) com carácter de permanência (…), como uma “pessoa jurídica rudimentar”.».
Como já se anotou, resulta expressamente do art.º 4º, n.º 1 da citada Lei n.º 75/2017, que as comunidades locais não têm personalidade jurídica, mas possuem capacidade judiciária que, como se sabe, consiste na possibilidade de requerer ou contra si ser requerida, em próprio nome, qualquer das providências de tutela jurisdicional reconhecidas na lei”[16].
Tal como já referido, a aludida comunidade de compartes só pode estar em juízo através dos seus órgãos, concretamente do Conselho Diretivo, a quem compete expressamente essa função «ex vi legis».
Pode assim dizer-se que Conselho Diretivo, enquanto órgão executivo daquela comunidade local, tem capacidade judiciária para demandar e ser demandado em representação da comunidade local erigida em assembleia de compartes do Baldio de ....
Sucede que na ação nº 1545/23.... não foi demandada a Assembleia de Compartes do Baldio da Freguesia de ..., nem o respetivo Conselho Diretivo, na qualidade de órgão executivo da comunidade local erigida em assembleia de compartes.
Foi instaurada contra o «Baldio da Freguesia de ...», que foi o condenado na sentença ali proferida.
O Tribunal da Relação de Coimbra, por decisão de 17 de junho de 2024, entendeu não admitir o recurso da referida sentença condenatória que foi interposto pelo «Conselho Diretivo do Baldio da freguesia de ..., órgão executivo da comunidade local formado pela Assembleia de Compartes do Baldio da Freguesia de ...», por falta de legitimidade do recorrente.
Com efeito, ali se entendeu que “(a) Assembleia de Compartes do Baldio da Freguesia de ... não foi parte principal na causa, pelo que em sua representação, o CD carece de legitimidade para recorrer da sentença face ao disposto no n.º 1 do citado art.º 631º”.
Concordamos o entendimento, subjacente a esta última decisão, segundo a qual a parte ali demandada não foi a Assembleia de Compartes do Baldio da Freguesia de ..., enquanto entidade a que a lei atribui personalidade judiciária.
Daí que, como refere, a mesma decisão, “(…) também não se pode dizer que, mediante a sentença “sub judice”, que condenou o “Baldio da Freguesia de ...”, a “Assembleia de Compartes do Baldio da Freguesia de ...” haja sido, directa e efectivamente prejudicada , entendendo-se, como se entende, aliás, que não vale contra esta o caso julgado que se forme relativamente a tal decisão.
Como se refere no Acórdão do STJ, de 18/01/2016, revista n.º 126/12.8TBPTL.G1.S1, “…A sentença proferida numa acção em que estejam em discussão direitos absolutos e subjetivamente vinculantes (como é o caso dos direitos reais, entre os quais o direito de propriedade) não expande a sua eficácia para além dos sujeitos intervenientes no processo, não podendo vincular e abranger todos quanto á exclusão do domínio (sobre a coisa), mas tão só aqueles entre quem a sentença atribuiu e delimitou a exclusão da turbação do direito perturbado.”.
Assim sendo, temos de concluir que não se verifica a identidade das partes em ambas as ações, que é pressuposto da exceção dilatória de litispendência.
E se assim é também não podemos concordar com a decisão recorrida quando na mesma se conclui que, “a não proceder a exceção de litispendência, em face da decisão de mérito proferida pelo tribunal no anterior processo, que conheceu do objeto em discussão nos presentes autos, afirmando que o logradouro e anexos do prédio em causa nos autos pertentem à ré A... (e independentemente do decidido pelo Tribunal da Relação, na decisão singular proferida - que fez a análise na perspetiva da exceção de caso julgado, ante a não admissão da contestação apresentada nos autos por falta de autorização do baldio, mas não da autoridade do caso julgado), sob pena de colocarmos o tribunal na alternativa de se contradizer (decidindo nos presentes autos o contrário daquilo que decidiu no anterior processo) ou de ter que reproduzir a anterior decisão (reafirmando que o logradouro e anexos em causa pertentem à ré A...), sempre se estenderia a autoridade de caso julgado aos presentes autos, vedando a discussão trazida aos autos pelos autores, com a improcedência da pretensão dos autores”.
É que, se é certo que existe um entendimento jurídico consolidado (quer a doutrinal, quer jurisprudencial) no sentido de que a “autoridade” do caso julgado pode funcionar independentemente da verificação da referida tríplice identidade a que alude o art.º 581º do Código de Processo Civil, não é menos verdade que a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça vem defendendo que a figura da autoridade do caso julgado apenas prescinde da identidade objetiva (identidade atinente aos pedidos e causas de pedir entre as duas causas), não abdicando, todavia, para fazer operar o seu efeito de vinculação do tribunal posterior à decisão proferida pelo tribunal anterior, da identidade subjetiva entre as duas causas[17]
Este entendimento, que pressupõe que a autoridade de caso julgado apenas pode ser oposta a quem seja tido como parte do ponto de vista da sua qualidade jurídica, radica no princípio da proibição da indefesa.
A invocação da “autoridade de caso julgado” formado num processo não pode conduzir a que se produzam na esfera de terceiros efeitos com que este não poderia contar, pelo facto de emergirem de um processo em que não teve qualquer intervenção.
Como nos ensina Antunes Varela, a propósito da problemática dos efeitos da sentença relativamente a terceiros, referindo-se ao terceiros que sejam titulares de uma relação jurídica incompatível com a litigada, “nenhuma razão há, de acordo com o espírito da norma que prescreve a eficácia relativa do caso julgado, para impor a sentença ao terceiro, titular da posição incompatível com a declarada na sentença transitada”[18].
“Nas demais situações cobertas pelas regras gerais, a invocação da “autoridade de caso julgado” formado num processo não pode conduzir a que se produzam na esfera de terceiros efeitos com que este não poderia contar, pelo facto de emergirem de um processo em que não teve qualquer intervenção.»[19]
Em resumo, não podemos ter por verificados todos os pressupostos caraterizadores da exceção dilatória de litispendência e da exceção perentória da autoridade de caso julgado, pelo que deve proceder o recurso.
Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação:
- julgar improcedente o recurso interposto pelo autor «Conselho Diretivo do Baldio da Freguesia de ...» da decisão de 9 de janeiro de 2025 e, em consequência, manter a decisão recorrida nos seus precisos termos;
- conceder provimento ao recurso da decisão de 20 de fevereiro de 2025, julgando improcedente a exceção de litispendência invocada pela ré e determinando o prosseguimento dos autos relativamente aos pedidos formulados pelos autores BB, CC e DD contra a ré «A..., Ldª».
As custas do recurso da decisão do recurso da decisão de 9 de janeiro de 2025 serão suportadas pelo autor «Conselho Diretivo» e as custas do recurso da decisão de 20 de fevereiro de 2025 ficarão a cargo da ré «A..., Ldª»
Assinado eletronicamente por:
Hugo Meireles
Luís Manuel Carvalho Ricardo
Cristina Neves
(O presente acórdão segue na sua redação as regras do novo acordo ortográfico, com exceção das citações/transcrições efetuadas que não o sigam)
[1] JAIME GRALHEIRO, Comentário à nova lei dos baldios Lei n.º 68/93 de 4 de Setembro, p. 154.︎
[2] No anterior regime, ou seja, nos termos previstos no artigo 15º nº1 o) da Lei 68/93, competia à assembleia de compartes “Ratificar o recurso a juízo pelo conselho diretivo, bem como a respetiva representação judicial, para defesa de direitos ou legítimos interesses da comunidade relativos ao correspondente baldio, nomeadamente para defesa dos respetivos domínios, posse e fruição contra atos de ocupação, demarcação e aproveitamento ilegais ou contrários aos usos e costumes por que o baldio se rege”. Por seu turno, previa o artigo 21º h) da mesma Lei que competia ao Conselho Diretivo “Recorrer a juízo e constituir mandatário para defesa de direitos ou interesses legítimos da comunidade relativos ao correspondente baldio e submeter estes atos a ratificação da assembleia de compartes”.
[3] Dispunha o mencionado art.º 4 da Lei dos Baldios aprovada pela Lei n.º 68/93 (na versão original):
1 - Os actos ou negócios jurídicos de apropriação ou apossamento, tendo por objecto terrenos baldios, bem como da sua posterior transmissão, são nulos, nos termos gerais de direito, excepto nos casos expressamente previstos na presente lei.
2 - A declaração de nulidade pode ser requerida pelo Ministério Público, por representante da administração central, da administração regional ou local da área do baldio, pelos órgãos de gestão deste ou por qualquer comparte.
3 - As entidades referidas no número anterior têm também legitimidade para requerer a restituição da posse do baldio, no todo ou em parte, a favor da respectiva comunidade ou da entidade que legitimamente o explore.
Por seu turno, na versão da Lei n.º 72 Redação dada pelo seguinte diploma: Lei n.º 68/93, de 04 de Setembro, dito art.º 4 passou a ter a seguinte redação:
1 - Os atos ou negócios jurídicos de apropriação ou apossamento, tendo por objeto terrenos baldios, bem como da sua posterior transmissão, são nulos, nos termos gerais de direito, exceto nos casos expressamente previstos na presente lei.
2 - A declaração de nulidade pode ser requerida:
a) Pelos órgãos do baldio ou por qualquer dos compartes;
b) Pelo Ministério Público;
c) Pela entidade na qual os compartes tenham delegado poderes de administração do baldio nos termos dos artigos 22.º e 23.º;
d) Pelos arrendatários e cessionários do baldio, nos termos do artigo 10.º
3 - As entidades referidas no número anterior têm também legitimidade para requerer a restituição da posse do baldio, no todo ou em parte, a favor da respetiva comunidade ou da entidade que legitimamente o explore.
[4] Comentário à Nova Lei dos Baldios, Almedina, Janeiro de 2002, pag. 81 e segs
[5] Dos baldios até á lei 75/2017 de 17 de Agosto, , 4ª Edição, pag. 198/199,
[6] Ac. do TRG, de 15 de fevereiro de 2018, processo n.º 12/16.2T8VPA.G1, in www.dgsi
[7] Cf. Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 1979, p. 306, quanto ao fundamento do caso julgado, que coincide com o da litispendência nos termos do artigo 580.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
[8] Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, Coimbra 1950, p. 95.
[9] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª Edição, Coimbra, 2018, p. 592
[10] José Lebre de Freitas, in A Acção Declarativa Comum À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª Edição, Coimbra, 2013, p. 111.
[11] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Parte Geral e Processo de Declaração, Coimbra, 2018, p. 24.
[12] Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, cit. p. 99, anotação ao art. 502º.
[13] Neste sentido, Germana Sanhudo Barreiro, «Aplicação Judicial do Conceito de Caso Julgado: Análise Crítica». Dissertação de Mestrado, Universidade do Minho, in repositorium.uminho.pt.
[14] Ac. do STJ de 24-02-2015 (Pº 915/09.0TBCBR.C1.S1), in www.dgsi.pt.
[15] Op. cit., pag. 112.
[16] Antunes Varela, Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, pag. 108.
[17] Cf. entre outros, o Acórdão do STJ de 2-03-2023 (P. n.º 6055/18.4T8ALM.L1.S1), in https://juris.stj.pt. E o Acórdão do STJ de 19-09-2024 (Pº 3042/21.9T8PRT.S2), in www.dgsi.pt.
[18] Manual de Processo Civil, 2ª ed. pág. 727.
[19] Acórdão do STJ de 18.06.2014 (Pº nº 209/09.1TBPTL.G1.S1) disponível em www.dgsi.pt/jstj