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ACÇÃO DE EXCLUSÃO DE SÓCIO
COMPORTAMENTO DESLEAL
DELIBERAÇÃO QUE APROVA A INSTAURAÇÃO DA ACÇÃO
CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE DA ACÇÃO
Sumário
I - A procedência da acção judicial de exclusão de sócio depende da prova de comportamentos do sócio, qualificados de desleais e de gravemente perturbadores do funcionamento da sociedade e ainda do requisito da prejudicialidade. II - Como condição de procedibilidade, a lei exige ainda que a propositura da acção judicial seja precedida por uma deliberação dos sócios. III - No que respeita ao conteúdo da deliberação, não se exige uma articulação de factos como se se tratasse de uma petição inicial mas tão-só a descrição, sintética, dos comportamentos, necessariamente graves, que tornam insustentável a relação contratual societária e legitimam o pedido de exclusão da qualidade de sócio, por via judicial. IV - Não é suficiente, para se considerar preenchida a referida condição de procedibilidade que, na assembleia, os sócios se limitem a votar uma deliberação meramente genérica, da qual não constem os motivos concretos pelos quais entendem que o sócio em causa deve ser excluído do seio da sociedade.
Texto Integral
Processo n.º 2960/23.4T8AVR.P2
Relatora: Anabela Andrade Miranda
Adjunto: Eduardo Rodrigues Pires
Adjunto: João Ramos Lopes
“A..., Lda., com sede na Rua ..., ... Aveiro, intentou a presente acção declarativa contra AA, solteiro, residente na Rua ..., ... ..., Vila Nova de Gaia, pedindo a sua exclusão como sócio e a condenação a pagar-lhe a quantia de € 32.000,00 pelos prejuízos que já lhe causou, acrescida de juros de mora contados à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento; declarou operar compensação entre o valor nominal da quota do R - €8.000 (oito mil euros) -, que é superior ao ser valor real, e a indemnização devida pelo R à A de €32.000,00, pedindo a condenação do R. a pagar-lhe a quantia de € 24.000 (vinte e quatro mil euros), tudo acrescido de juros de mora contados à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, refere que a partir do ano de 2021 o Réu não colaborou com a sociedade Autora na aprovação de contas dos exercícios de 2021/2022; desenvolveu atividade concorrencial e apropriou-se de ideia de uma marca de vinho da Autora, procedendo ao seu registo no INPI através de outra sociedade de que é sócio; denegriu a imagem da Autora e dos seus vinhos junto de clientes e fornecedores; apropriou-se de garrafas de vinho da Autora; impediu a Autora de tomar conhecimento da sua citação para ação que o próprio intentou contra a mesma (Proc. sob o nº 155/22.3T8TMC do Juízo de Competência Genérica de Torre de Moncorvo), o que determinou que viesse a ser proferida sentença de condenação de preceito (estando pendente incidente de nulidade de citação e recurso). Comportamentos com os quais causou prejuízos à Autora e que constituem fundamento da sua exclusão como sócio.
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O Réu contestou impugnando os factos alegados pela Autora.
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A Autora deduziu articulado superveniente dando conta de outros comportamentos do Réu, ocorridos em momento posterior, que lhe causam danos.
Admitido tal articulado e notificado o Réu, veio apresentar resposta, impugnando os factos alegados.
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O mandatário do Réu, em 10/10/2024, remeteu aos autos declaração de renúncia ao mandato.
Foi enviada carta com a A/R ao Réu em 11/10/2024.
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No dia 25/10/2024, o tribunal, por e-mail, recebeu a seguinte comunicação do Réu: “Exmo/a. Senhor/a Juiz de Direito Fui informado pelos meus advogados que teriam renunciado à procuração que emiti a seu favor neste processo e que o Tribunal já me teria enviado a respetiva notificação. Sucede que me encontro ausento do país em trabalho até ao próximo dia 31 de outubro, motivo por que agradeço o envio (ou reenvio) da notificação a partir dessa data, até porque desconheço, ainda, quaisquer processos ou procedimentos que tenha de adotar nesta situação. Para qualquer contacto deixo o meu número de telefone pessoal para o efeito: ...48 Com os melhores cumprimentos, AA”.
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A continuaçãodo julgamento estava agendada para o dia 29/10/2024.
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O mandatário do Réu, no dia agendado para continuação da audiência, remeteu a seguinte informação e requerimento: 1.ºO expoente encontra-se impedido de comparecer na audiência de julgamento agendada para hoje, 29/10/2024, 2.º uma vez que acordou com sintomas gripais, nomeadamente com febre, arrepios de frio, dores no corpo e dores de garganta. 3.ºAcresce que, dada a ocorrência súbita e inesperada de tal contingência, nenhum outro colega de escritório do Requerente está disponível para o substituir. 4.ºTal facto constitui justo impedimento, nos termos do disposto no artigo 140.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. 5.ºMais se informa que, com tais sintomas, entendeu o expoente, desde logo, contactar o seu escritório para que fosse contactado quer o Tribunal, quer o Il. Mandatário da Autora, de forma a comunicar que não estaria presente como medida de precaução. 6.º A comunicação acabou por ser efetuada diretamente ao Il. Mandatário da Autora em virtude de dificuldades com os contactos do Tribunal à hora em questão. 7.º Nesse mesmo momento foi também entregue via citius o presente requerimento. TERMOS EM QUE REQUER A V. EXA. QUE DÊ SEM EFEITO A DILIGÊNCIA AGENDADA E DESIGNE NOVA DATA PARA O EFEITO. Prova testemunhal: • BB, com domicílio profissional na Rua ..., ... .... E.D. O Advogado, CC”
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O tribunal não deu sem efeito o julgamento por ter entendido que, apesar de ocorrer justo impedimento, a procuração conferida pelo Réu era conjunta.
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O Réu arguiu a nulidade do seguinte despacho que determinou o prosseguimento da audiência:
“AA, Réu nos autos, veio arguir a nulidade do despacho proferido em ata de julgamento que determinou que fosse dada continuidade à mesma, apesar do justo impedimento invocado pelo seu Ilustre mandatário.
Entende que, “(…) em virtude dessa irregularidade, esteve – e está – manifestamente comprometida a defesa do Réu no presente processo.”
“Não tendo tido este oportunidade de exercer o contraditório face à prova oferecida em juízo, como impõem os artigos 3.º, nº 3 e 415º, nº 1 do CPC.”
Entende que “(…) uma vez que não foram observadas as formalidades prescritas nas normas indicadas, é nula toda a produção de prova produzida na 2.ª sessão de discussão e julgamento (…)”
“E, considerando que nulidade pode influir no exame ou na decisão da causa, deverá a presente arguição da nulidade ser atendida, nos termos do disposto no artigo 195.º, n.º 1, do CPC.
“O entendimento sufragado pelo Tribunal viola também o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, mormente a disposição que afirma que todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão mediante processo equitativo.”
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A Autora pronunciou-se, pugnando pela improcedência da arguida nulidade.
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Cumpre decidir:
No caso concreto dos autos, considerou-se que o justo impedimento do Ilustre Mandatário do Réu não constituía fundamento de adiamento da continuação do julgamento, nos termos do disposto no art. 603º nº 1 do CPC, porque a procuração emitida pelo Réu é uma procuração conjunta, mediante a qual foram mandatados vários Senhores Advogados, e tratava-se de uma continuação de julgamento, que tem carácter de prevalência sobre qualquer outro agendamento marcado em tribunal.
Nesse seguimento, deu-se continuidade à audiência e as testemunhas foram inquiridas pelo tribunal.
Não se vislumbra a prática de qualquer nulidade, nem que tenha sido coartado o direito de defesa do Réu, com preterição do principio do contraditório, com consagração constitucional, apenas tendo sido dado cumprimento à lei.
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 06/12/2017, processo 1734/13.5TBTVD.L1-7, consultável in www.dg.si.pt
“5. Havendo uma procuração conjunta a favor de vários advogados, qualquer dos mandatários assim constituídos pela parte pode intervir no julgamento e o justo impedimento de um deles não determina necessariamente o adiamento do julgamento. No entanto, se se verificar que apenas um dos advogados constituídos interveio no processo, subscrevendo todas as peças processuais a título pessoal, sendo apenas ele quem participou em todas as diligências até aí realizadas, o justo impedimento deste será de atender como causa de adiamento do julgamento se no requerimento logo justificar o motivo pelo qual os restantes advogados não podem assegurar o cumprimento do mandato, seja porque têm outras diligências marcadas à mesma hora, seja porque não estarem a par do litígio e as especificidades do processo não lhes permita, sem aviso prévio e com tempo, exercerem o patrocínio devido à parte em condições de razoabilidade.”
No mesmo sentido, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, in Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, 2.ª Ed. - 2014, pág. 571, citados pela Autora, sustentam que nos casos de procuração conjunta, o impedimento de um dos mandatários não é suficiente para provocar o adiamento da audiência, porque a outorga da procuração nessas condições terá precisamente por finalidade fazer face a situações de impedimento de um dos mandatários. Estes Autores entendem que, nestes casos, se exige que a parte justifique a razão pela qual os restantes patronos não podem assegurar o patrocínio.
No caso dos autos, a procuração emitida pelo Réu é, como já se referiu, conjunta.
Como o próprio Réu alega no art.º 16.º do requerimento em análise, “A junção de procuração conjunta aos autos serve, essencialmente, para efeitos de economia documental (e processual), ao não terem os mandatários de uma parte de juntar sucessivos substabelecimentos para o tratamento de uma causa...”
No requerimento em que invoca justo impedimento para estar presente na continuação da data de julgamento, o Ilustre Mandatário do Réu apenas alega, genericamente, que “dada a ocorrência súbita e inesperada de tal contingência, nenhum outro colega de escritório do Requerente está disponível para o substituir.”
Concretamente, não indica qual o impedimento dos restantes mandatários com procuração conjunta, sendo ainda certo que estávamos perante uma continuação de julgamento que tem carácter de prevalência sobre qualquer outro agendamento marcado em tribunal. Não se desconsidera que a continuação da audiência seria assegurada por advogado que não esteve presente na anterior sessão de julgamento, mas tal é uma contingência das procurações conjuntas. Também os magistrados do Ministério Público, em caso de impedimento de um colega, têm que assegurar as diligências, ainda que em continuação; e os magistrados judiciais, em substituição de colegas, poderão ter que dar início a um julgamento sem que tenham tido tempo de preparar o processo como achariam conveniente.
As testemunhas arroladas pelo Réu, que compareceram em audiência, foram inquiridas pelo tribunal.
Improcede, pois, a invocada nulidade.
Custas do incidente a cargo do Réu, com taxa de justiça que se fixa em 1 UC – cfr. art.º 527.º, ns 1 e 2 do CPC e art.º 7.º, n.º 4 do Regulamento das Custas Processuais.
Notifique.”
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Proferiu-se sentença que determinou a exclusão do Réu como sócio da sociedade Autora e condenou-o a pagar-lhe a quantia de €3.010,70 acrescida de juros de mora à taxa legal anual de 4%, ou da que sucessivamente vigorar, sobre o capital de €2.869,50, até integral pagamento.
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Inconformado com a sentença, o Réu interpôs recurso finalizando com as seguintes Conclusões
1.ºVem o presente recurso jurisdicional interposto da douta Sentença proferida no processo n.º 2960/23.4T8AVR, que julgou parcialmente procedente e, em consequência, determinou a “exclusão de AA como sócio da sociedade A..., Lda. “ e a condenação do Réu “a pagar à Autora a quantia de €3.010,70 (três mil e dez euros e setenta cêntimos) acrescida de juros de mora à taxa legal anual de 4%, ou da que sucessivamente vigorar, sobre o capital de €2.869,50 (dois mil, oitocentos e sessenta e nove euros e cinquenta cêntimos), até integral pagamento”.
2.ºNão obstante, e com o devido respeito pelo Tribunal a quo e pela douta Sentença proferida, não pode o Recorrente conformar-se com a mesma, pois, os factos dados como provados não mostram que o sócio ora Apelante tenha tido um comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade ora Apelada e que, por isso, lhe tenha causado ou possa vir a causar prejuízos relevantes,
3.ºBem pelo contrário, os factos provados–como é exemplo disso o facto de não ter havido oposição à comercialização, pela sociedade Apelada, de vinhos com a marca “Funky”, que comprovadamente não pertence à Apelada – mostram que o ora Apelante não prejudicou nem teve qualquer intenção de prejudicar a sociedade de que ainda é sócio.
4.ºSeria, aliás, um contrassenso fazê-lo, como bem se percebe: enquanto sócio (de uma sociedade de que é fundador e à qual o seu nome está ligado como enólogo), o Apelante deseja, antes de mais, que a sua quota seja valorizada, que a sociedade Apelada gere lucros que possam ser distribuídos e/ou lhe proporcionem uma valorização positiva da quota em caso de eventual alienação.
5.ºAo contrário da atual gerência da sociedade Apelada, controlada pelos restantes sócios, que tem vindo a evidenciar comportamentos que visam, claramente, diminuir o valor da quota detida pelo ora Apelante, desmoralizando-o, tudo fazendo para o forçar a cedê-la quase gratuitamente: pretendiam adquirir a quota do ora Apelante, correspondente a 40% do capital, por UM EURO (!!!), enquanto o Apelante se mostrou disponível para adquirir as quotas dos restantes sócios, correspondentes a 60% do capital da Apelada, por trezentos mil euros (!!!).
6.ºPercebe-se bem que, à falta de fundamentos verdadeiros para excluir o ora Apelante da sociedade Apelada, os seus demais sócios (e gerentes) partiram da descrição de factos efetuada no Acórdão do STJ de 20/03/2018 (referido na sentença) para, mimetizando-o, imputar, falsamente, comportamentos idênticos ao sócio ora Apelante (não especificados na ata que suporta a instauração da ação de exclusão de sócio), na esperança de obter decisão idêntica à que foi tomada no citado aresto.
7.ºTendo o Tribunal a quo caído nesse engodo, porquanto a douta sentença recorrida, que viria a considerar provados e relevantes para a decisão supostos factos (relativamente aos quais a sociedade, de resto, já teria perdido o direito de pedir a exclusão do sócio, por caducidade, isto é, por já terem decorridos, à data da deliberação de exclusão, mais de 90 dias desde o seu conhecimento) que foram dados como provados com base em testemunhos indiretos (“alguém disse”!...), sem confirmação por parte dos intervenientes diretos, de cujo testemunho a sociedade ora Apelada viria, afinal, a prescindir (certamente por saber que não confirmariam o que os gerentes da Apelada afirmaram…).
8.ºMas a douta sentença a quo, mesmo assim, levou em conta as declarações dos dois gerentes (e sócios maioritários, com interesse direto na decisão): “embora com conhecimento indireto destes factos, apenas relatando o que lhe dizem terceiros”!!!... (sic)
9.ºOlvidando, mais uma vez o Tribunal a quo que o Gerente da ... “...” -DD-, foi arrolado como testemunha e esteve presente no Tribunal para depor, tendo a Apelada prescindindo da aludida testemunha (vide ficheiro Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-09-24_12-06-35 a 02:20) ou ata de Audiência de Julgamento de 24/9/2024.
10.ºTestemunha que era essencial para prova do facto alegado no artigo 33.º da PI de que o Apelante lhe havia dito “para não vender mais vinho à A A..., pois que esta não lho pagaria certamente, estando em situação de insolvência prática.” E que, afinal, veio a ser julgada provada na sentença recorrida (facto provado n.º 15). Tal como prescindiu da testemunha EE, vide ata de Audiência de Julgamento de 24/9/2024.
11.ºSendo que a única testemunha externa à Autora (arrolada pela mesma) que prestou depoimento foi a Testemunha – FF – afastou qualquer dúvida sobre o comportamento do Apelante, (vide Diligencia_2960 23.4T8AVR_2024-10-29_14-22-13 4:24 a 4:27).
12.ºAcabando o representante legal da Autora e gerente – GG, quando lhe foi perguntado se o Apelante fala desfavoravelmente acerca dos vinhos da Autora ou da própria Autora, o mesmo afirmou que: “não é ele diretamente” (20:38), acabando por referir que eram os amigos do Apelante!!! (20:28) [ficheiro -Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-09-24_10-09-05].
13.ºA sentença recorrida, confundiu, ainda, os atos exercidos pela sociedade B..., Lda com os atos praticados pelo Apelante, julgando-os como se da mesma coisa se tratassem (vide facto provado n.º 7), como não distingue os atos do trabalhador subordinado (eventualmente sancionados por via da instauração de processo disciplinar), dos atos praticados enquanto sócio (eventualmente sancionado com a exclusão do grémio societário), em termos idênticos ao que deve ser feito relativamente ao sócio-gerente, distinguindo os atos praticados enquanto gerente, dos atos praticados enquanto sócio.
14.ºOlvidando o douto Tribunal que o Apelante apenas possui 20% da sociedade B..., Lda (vide facto provado 11.º) e 40% da Autora (vide facto provado 2.º). Isto é, não possui qualquer posição de controlo em qualquer delas e que nunca exerceu o Apelante a gerência de qualquer uma dessas sociedades.
15.ºNão sendo crível que o Apelante, enólogo dos vinhos da Apelada, atente contra os mesmos ou os desqualifique, porquanto, a ser assim, estava diretamente a desqualificar o seu trabalho. (vide 24:13 e 24:50 do ficheiro áudio-Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-09-24_10-09-05).
16.ºPor fim, não podemos deixar de lamentar que quase por tendência o Tribunal a quo opte por seguir um caminho em aberta contradição com a prova produzida em audiência e que as partes devem produzirem respeito ao princípio da distribuição do respetivo ónus.
DA NULIDADE POR VIOLAÇÃO DE LEI – N.º 1 DO ARTIGO 603.º DO CPC E 20.º da CRP.
17.ºEstabelece o n.º 1 do artigo 603.º do CPC que se: “ocorrer motivo que constituía justo impedimento” a audiência deve ser adiada, no entanto, pese embora o Tribunal a quo tenha reconhecido o justo impedimento do mandatário do Apelado – Dr. CC, entendeu que a audiência não deveria ser adiada porquanto existiam mais advogados na procuração forense junto aos autos.
18.ºNão obstante, nesse requerimento – remetido em momento anterior à audiência de julgamento - o Mandatário ter informado o Tribunal a quo que: “dada a ocorrência súbita e inesperada de tal contingência, nenhum outro colega de escritório do Requerente está disponível para o substituir.” (destacado nosso), requerimento com Ref.ª Citius 40528401.
19.ºNão podendo o Apelante concordar com a aludida decisão uma vez que a mesma viola de forma manifesta o n.º 1 do artigo 603.º do CPC e, consequentemente, a que houvesse uma produção de prova em condições de flagrante desequilíbrio entre as partes, sem cumprimento pleno do contraditório (artigos 3.º n.º 3 e 415º n.º 1 do CPC), todas essas situações são consequência da decisão de não adiamento da audiência final e põem em causa o julgamento da matéria de facto e, consequentemente, da sentença recorrida.
20.ºComo decorre do requerimento junto ao citius (Ref.ª Citius 40528401), o anterior Mandatário apresentou na manhã do dia 29/10/2024, requerimento de adiamento da diligência agendada para esse mesmo dia, por motivo de doença súbita e inesperada – o que fez nos termos do artigo 140.º, n.º 1 e artigo
21.ºNão obstante, entendeu o Tribunal a quo determinar a continuidade à audiência, conforme ata Ref.ª Citius 465086345.
22.ºOra, contrariamente ao que pode ser entendido pela mera consulta da referida procuração, os advogados que integram uma determinada sociedade de advogados não estão todos a trabalhar para os mesmos clientes, nem maioritariamente conhecem os clientes com processos pendentes que estão a cargo de departamentos que não aqueles em que concretamente trabalham.
23.ºMesmo no seio de um determinado departamento, nem todos os advogados que dele fazem parte estão a par de todos os processos que ali são seguidos. E mesmo entre colegas que tratem do mesmo processo, não estão todos adstritos à realização da mesma peça ou da preparação de uma determinada sessão de julgamento! Ajustando os Advogados que constam dessa procuração as suas agendas por forma a dar resposta às demandas de todos os clientes do escritório.
24.ºA junção de procuração conjunta aos autos serve, essencialmente, para efeitos de economia documental (e processual), ao não terem os mandatários de uma parte de juntar sucessivos substabelecimentos para o tratamento de uma causa. É, tão-somente, uma escolha interna – e discricionária! – da organização da sociedade de advogados mandatada, que nada diz sobre a disponibilidade de os mandatários se substituírem uns aos outros em face de um justo impedimento de última hora do Advogado adstrito ao (e que conduz o) processo em causa, tão-pouco diz sobre a sua aptidão para assegurarem o patrocínio à parte em condições de razoabilidade – como se impõe!
25.ºPodemos concluir assim que, o simples facto de uma Parte ter procuração conjunta junta aos autos de onde resulta o nome de todos os advogados que (no momento da constituição do mandato forense) integram uma determinada sociedade de advogados, não significa que qualquer um desses advogados está apto a representar essa Parte em toda e qualquer diligência.
26.ºEm virtude dessa irregularidade, esteve–e está – manifestamente comprometida a defesa do Apelante no presente processo. Esta realidade é ainda mais evidente, ao contrário daquele que foi o entendimento do Tribunal, no caso de uma continuação da audiência de julgamento em que a presença na segunda data do mesmo Advogado que esteve presente na primeira ganha uma maior importância, uma vez que foi ele quem ouviu, de forma directa, toda a prova testemunhal então produzida. Não tendo tido este oportunidade de exercer o contraditório face à prova oferecida em juízo, nem tomar posição sobre a prova testemunhal por si arrolada, como impõem os artigos 3.º, nº 3 e 415º, nº 1 do CPC. O princípio da audiência contraditória é, aliás, um dos princípios basilares do Direito Processual Civil.
27.ºComo veremos melhor infra, aquando da impugnação da matéria de facto, a continuação de um julgamento sem intervenção de advogado (que representou a parte na primeira sessão de julgamento), que teve o cuidado de invocar uma situação objetiva de justo impedimento antes da realização dessa diligência, dá azo a situações de desequilíbrio entre as partes litigantes, a limitações formais e injustificadas no exercício de direitos e promove mais facilmente a possibilidade de se chegar a soluções injustas. O que certamente não é desejado pelo sistema jurídico, nem estava na mente do legislador ao estabelecer as soluções que consagrou nos artigos 603º n.º 1 e 140º n.º 1 e n.º 2 do CPC.
28.ºPelo supra exposto, uma vez que não foram observadas as formalidades prescritas nas normas indicadas, é nula toda a produção de prova produzida na 2.ª sessão de discussão e julgamento. O entendimento sufragado pelo Tribunal viola também o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, mormente a disposição que afirma que todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão mediante processo equitativo.
29.ºDevendo, assim, o Despacho que determinou a continuação da audiência de discussão e julgamento (cfr. ata Ref.ª Citius 465086345), bem como o Despacho que não reconheceu a nulidade do Despacho anterior arguido pelo Apelante (Ref.ª Citius 465376919), serem declarados nulos por violação do n.º 1 do artigo 603.º do CPC e artigo 20.º da CRP.
DA NULIDADE POR VIOLAÇÃO DE LEI - ARTIGOS 3.º, 508.º e N.º 3 DO CPC E ARTIGO 20.º DA CRP
30.ºO Apelante aquando da sua contestação arrolou prova testemunhal, nomeadamente a Testemunha HH, a notificar.
31.ºTendo a mesma sido notificada para estar presente e prestar depoimento na audiência de discussão e julgamento que ocorreu em 24 de setembro de 2024 (vide ata de Audiência de Julgamento de 24/9/2024), não obstante, o seu depoimento foi adiado para a audiência de discussão e julgamento a ocorrer em 29 de outubro de 2024, pelas 14h00 (vide ata de audiência de discussão e julgamento de 24/9/2024).
32.ºAcontece, porém, que nessa sessão de julgamento (29 de outubro de 2024) a testemunha HH foi considerada faltosa, nos termos e para os efeitos do artigo 508.º n.º 3 CPC.
33.ºNão tendo a parte prescindido da mesma, desde logo porque, como vimos, o mandatário da parte também se encontrava ausente por doença, não tendo, assim, a parte conhecimento, naquele momento, da situação de impedimento da testemunha. Não podendo, nessa esteira, a parte tomar posição acerca da substituição da testemunha (alínea a) do artigo 508.º do CPC) ou requerer o adiamento da inquirição da mesma (alínea b) do artigo 508.º do CPC).
34.ºPerante a testemunha faltosa a MM juíza proferiu o seguinte Despacho “Atenta a falta da testemunha HH, condena-se a mesma em multa que se fixa desde já em 1/2 UC caso não justifique a sua falta no prazo legal.”, mas ao invés de marcar outra data para a testemunha depor, como determina o artigo 508.º do CPC, condenou a mesma em multa e deu como encerrada o julgamento, após as alegações da Apelada.
35.ºO que é de todo contraditório com o estabelecido no n.º 5 do artigo 508.º do CPC, uma vez que, ou a Testemunha é motivo para adiamento do julgamento e em razão disso é-lhe aplicado uma multa, ou não havendo adiamento, não há lugar a condenação em multa…
36.ºO direito da parte se poder socorrer de testemunhas para prova dos factos por esta alegados constitui manifestação do direito ao contraditório, ao abrigo do nº 3 do artigo 3º CPC, sendo que a aludida Testemunha é dotada de conhecimentos técnicos e conhecedora de factos, revelando-se essencial para a descoberta da verdade material no âmbito dos presentes autos.
37.ºAo ter determinado o encerramento da audiência de discussão e julgamento, sem abranger das razões para a falta da Testemunha, violou o Tribunal a quo o disposto nos artigos 3.º e 508.º, n.º 3 do CPC e, bem assim o artigo 20.º da CRP.
38.ºPosto tudo isto, deverá ser reaberta a audiência de discussão e julgamento para, desta forma, permitir-se a inquirição da testemunha HH, arrolada pelo Apelante. E, consequentemente, deverá ser declarado nulo o despacho recorrido, substituindo-se o mesmo por um despacho que determine a suspensão da audiência de discussão e julgamento, designando-se nova data para a inquirição da testemunha arrolada. Bem como a anulação de todos os atos subsequentes, designadamente, da sentença recorrida.
A IMPUGNAÇÃO E ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO – DOS PONTOS DE FACTO INCORRETAMENTE JULGADOS
39.ºA decisão da matéria de facto controvertida, normalmente apoiada no princípio da liberdade de julgamento, consagrado no artigo 607.º, n.º 5 do CPC, deve refletir o resultado da conjugação dos vários elementos de prova que na audiência, ou em momento anterior, foram sujeitos às regras da contraditoriedade, da imediação e da oralidade.
40.ºAs respostas dadas devem traduzir, assim, aquilo que efetivamente se apurou, após uma análise objetiva, imparcial e desinteressada da prova produzida ao longo de todo o processo, o que entendemos não foi feito pelo Tribunal Recorrido.
41.ºO que não aconteceu in casu, uma vez que as declarações e depoimentos prestados em sede de julgamento (sessão de 29/10/2024) e que foram o fundamento do julgamento da matéria de facto, não têm qualquer credibilidade, porque existe nos mesmos contradições insanáveis nas declarações e depoimentos que não puderam ser objeto de esclarecimento [ficheiros áudios das Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-10-29_10-54-0 e Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-10-29_09-57-03], não tendo havido confrontação com prova documental que dava um retrato dos factos alegadamente diverso do relatado pelas testemunhas e representantes legais.
42.ºPara além de que as testemunhas inquiridas, como ressalta de forma manifesta da prova gravada, responderam a perguntas que sugeriam as respostas resultando da falta da intervenção do advogado do Apelante, manifestas situações de desequilíbrio entre as partes litigantes, a limitações formais e injustificadas no exercício de direitos e promove mais facilmente a possibilidade de se chegar a soluções injustas. O que certamente não é desejado pelo sistema, nem estava na mente do legislador ao estabelecer as soluções que consagrou nos artigos 603º n.º 1 e 140º n.º 1 e n.º 2 do CPC.
43.ºA tudo acresce que também não foi possível ouvir a prova arrolada pelo Apelado, já que como a testemunha HH faltou ao julgamento não pôde o Apelante requerer, nos termos da alínea b) do artigo 508.º do CPC, o adiamento da inquirição da mesma.
44.ºSituação provocada, como vimos, em resultado do Despacho do Tribunal a quo que determinou a continuação do julgamento sem a intervenção do advogado, mesmo tendo sido proferido Despacho que considerou verificado o justo impedimento do mesmo.
45.ºEm resultado do aludido Despacho, determinou que houvesse uma produção de prova em condições de flagrante desequilíbrio entre as partes, sem cumprimento pleno do contraditório (artigos 3.º n.º 3 e 415º n.º 1 do CPC). Todas essas situações são consequência da decisão de não adiamento da audiência final e põem em causa o julgamento da matéria de facto e, consequentemente, da sentença recorrida.
46.ºVerificando-se, assim, um manifesto erro de julgamento, devendo Venerandos Juízes Desembargadores ordenar a renovação integral da produção de prova, permitindo que o Apelante possa contraditar de forma plena os depoimentos e declarações prestados e produzira sua prova em condições de igualdade como a Apelada, quanto mais não fosse também por mera decorrência do disposto no artigo 662º n.º 2 al.s a) (por haver dúvidas sérias sobre a credibilidade dos depoimentos que foram prestados nas condições já mencionadas), b) (por haver dúvidas fundadas sobre a prova assim realizada) e c) (por ser evidente a deficiência da prova assim produzida) do CPC.
47.ºO Apelante entende que os factos dados como provados sob os n.ºs 14.º a 20.º, 41.º a 43.º deveriam, diversamente, ter sido considerados como não provados, em face da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.
48.ºEm relação a todos estes factos – mas não só – parece que o Tribunal Recorrido se limita única e exclusivamente a copiar os factos elencados na Petição Inicial apresentada pela Autora – que mimetizou o do Acórdão do STJ de 20/03/2018, sem terem consideração, nem os documentos juntos aos autos, nem a prova testemunhal produzida em sede de audiência e julgamento – o que não pode o Recorrente aceitar e reiterar a nota!
49.ºRelativamente aos factos provados com os n.ºs 14 a 17 e 41.º a 43.º, entende o Recorrente que os mesmos deveriam ter sido julgados como não provados, pois das declarações dos legais representantes os mesmos não identificam qualquer empresa/pessoa suscetível de identificação para que o Apelante possa, no pleno exercício do direito ao contraditório (Art.s 3.º n.º 3 e 415º n.º 1 do C.P.C.), arrolar os mesmos para deporem em sede de audiência de julgamento.
50.ºSendo que nenhumas dessas testemunhas, atenta a atual estrutura do nosso sistema processual civil, estava impedida de prestar declarações sobre os factos de que tinham conhecimento direto – assim fossem arroladas e requerida a respetiva notificação, pela Apelada, como era seu ónus!
51.ºNão pode, com todo o respeito, é dar o Tribunal a quo como provados factos por depoimento indireto quando até foi a Apelada que prescindiu das testemunhas por si arroladas [DD e EE] e que, de acordo com a sua narrativa, eram pessoas com esse conhecimento direto.
52.ºTransgredindo as regras gerais sobre o ónus da prova, em que opera o preceituado no disposto no n.º 1 do artigo 342º do Código Civil: “àquele que invoca um direito, cabe fazer a prova dos factos constitutivos do mesmo”.
53.ºAssim, com o fundamento numa alegada dificuldade em arrolar testemunhas disponíveis para depor em Tribunal sobre essa matéria (reiteramos: bastaria que as arrolasse e requeresse a sua notificação, para que elas tivessem a obrigação de depor…), entendeu o Tribunal a quo que deveria valorar o depoimento indireto dos legais representantes da Apelada., mas, não houve qualquer tipo de condicionalismos que não permitisse a prova testemunhal direta, pois a prova testemunhal arrolada pela Apelada esteve presente em sede de julgamento.
54.º Nomeadamente, a testemunha DD que esteve presente no Tribunal para depor, e após a sua identificação, respondeu aos “costumes” tendo sido interrompido pela Autora que prescindiu do mesmo (vide ficheiro diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-09-24_12-06-35 aos 02:20). Testemunha que era essencial, reitera-se, para prova do facto alegado no artigo 33.º da PI de que o Apelante lhe havia dito “para não vender mais vinho à A A..., pois que esta não lho pagaria certamente, estando em situação de insolvência prática.”. Como havia prescindido da testemunha EE, vide ata de Audiência de Julgamento de 24/9/2024.
55.ºOra, com todo o respeito, não pode a Apelada prescindir do testemunho do único interlocutor referente ao facto provado n.º 15 (artigo 35.º da PI), e depois, o tribunal com fundamento numa alegada falta de disponibilidade (!!!) dessas pessoas, com fundamento em depoimento indireta, dar tal facto como provado.
56.ºSendo certo que em declarações do gerente da Apelada – GG (Ficheiro áudio - Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-10-29_10-54-07: sobre a aludida factualidade respondeu: (22:26) o senhor disse que não, que não foi nada disso,
57.ºPelo exposto, cremos não existirem dúvidas que o facto provado n.º 15 deveria ter sido considerado como não provado!
58.ºNo que tange aos demais factos provados (14.º, 16.º, 17.º e 41.º a 43.º). é importante ter em consideração que a única Testemunha autónoma da Apelada que prestou depoimento - FF. Pessoa que, na versão da Apelante tinha conhecimento dos factos imputados ao Apelante, quando lhe foi perguntado pela Meritíssima Juíza acerca do Apelante ter “falado mal” da Autora respondeu num depoimento totalmente isento e, por isso, credível que não, (vide Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-10-29_14-22-13 4:24 a 4:27).
59.ºOu seja, a única testemunha a quem a Apelada imputava conhecimentos acerca dessa factualidade, numa alegada conversa tida com o Apelante, em depoimento prestado sem contraditório, depôs que não. Que nunca o Apelante lhe havia dito mal da Apelada.
60.ºSendo certo que em declarações do gerente da Apelada – GG (Ficheiro áudio - Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-10-29_10-54-07: sobre a aludida factualidade respondeu: (20:18) que não era o Apelante, mas sim amigos dele…
61.ºOu seja, ao contrário do manifestado na motivação da sentença, o legal representante (e gerente) da Apelada, referiu apenas que o Apelante diretamente não fazia nada, mas que um dono do restaurante (de ..., sem dizer qual!!!!) lhe disse que um amigo do Apelante disse que o vinho não prestava.
62.ºNão tendo as declarações e os depoimentos prestados por funcionários da Apelada merecido reservas (como deviam), não sendo credíveis, nomeadamente por terem apresentado versões completamente díspares uns dos outros em questões nomeadamente dos prejuízos causados, enquanto II declara que não vende os vinhos de marca Funky, que teve de alterar os rótulos das garrafas e que as vendas foram inferiores ao projetado e, em consequência, provoca à Apelada muitos prejuízos [ficheiro áudio - Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-10-29_09-57-03 nos tempos 10:42 e 13:36], o Gerente da Apelada e representante legal da mesma – GG, nas suas declarações depôs que a Apelada continuou a vender os vinhos com a marca Funky, uma vez que já estava todo engarrafado e que não tinham alterado os rótulos. Dizendo, ainda que o vinho se vendeu muito bem e que este vinho está atualmente no mercado, e que não teve prejuízo efetivo nenhum [ficheiro áudio - Diligencia_2960-23.4T8AVR_2024-10-29_10-54-07 tempos 9:00 a 14:09].
63.ºAssim, é manifesto que as declarações dos representantes legais da Apelada apresentam versões completamente díspares uns dos outros em questões nomeadamente dos prejuízos causados, e do comportamento imputável ao Apelante. Não podendo, assim, o douto Tribunal ter aceitado sem reservas as suas declarações, uma vez que, das mesmas resultam, de forma manifesta, falta de credibilidade.
64.ºPelo exposto, cremos não existirem dúvidas que o facto provado n.ºs 14.º, 16.º, 17.º e 41.º a 43.º deveriam ter sido julgados como não provados!
65.ºRelativamente aos factos provados com os n.ºs 18, 19 e 20, entende o Recorrente que os mesmos deveriam ter sido julgados como não provados, no entanto, não há uma única testemunha ou declarante, ouvida em sede de audiência de discussão e julgamento, que tivesse referido que “os produtos apenas podiam ser levantados do armazém desde que a pessoa que os levantasse preenchesse guias do sistema TOCONLINE.”,
66.ºMesmo (nem sequer) nas declarações dos legais representantes da Autora, II e GG conjugados com o depoimento da testemunha JJ, contabilista da Autora, como referido da motivação do tribunal a quo.
67.ºNão podendo, assim, ser dado como provado os factos provados com os n.ºs 18, 19 e 20, por omissão total de prova (documental e testemunhal) que alicercem tal julgamento: nesta senda, cremos que os factos dados como provados n.º 18, 19 e 20 deveriam ser inseridos no elenco dos factos não provados;
68.ºSendo certo que, tal como decorre dos factos provados, o Recorrente era trabalhador da Autora (facto provado n.º 29), desempenhando, nesse âmbito, trabalho de enólogo–fazia os vinhos e era o comercial da Autora–vendia os vinhos, (…)
69.ºOu seja, decorre das declarações do II, tal como do GG e do Apelante, que este último enquanto funcionário da Apelada era responsável pela área de produção, de venda, comunicação e marketing.
70.ºE, como resulta cristalinamente do depoimento de parte do Apelante, o mesmo não conhecia à data o sistema TOCONLINE (…)
71.ºImporta destacar que à data dos alegados levantamentos (entre 13 de abril e 21 de maio de 2021! (cfr. facto provado n.º 20)) o Apelante era trabalhador da Apelada, tendo sido nesse âmbito (reitera-se, no exercício da sua atividade como trabalhador da Apelada e não como sócio da mesma) que o mesmo efetuou os alegados levantamentos.
72.ºQue se destinavam, como cristalinamente explicado pelo Apelante (…), a promover o vinho junto dos clientes e para as provas de vinhos efetuadas em feiras da especialidade. Sendo que esses levantamentos eram efetuados com o conhecimento dos sócios da Apelada. Mais, como o Apelante à data não tinha carro, esse vinho era transportado no carro do sócio II (…)
73.ºAssim, a existir quaisquer levantamentos de garrafas de vinho do armazém da Apelada, reitera-se, os mesmos ocorreram no âmbito das funções de trabalhador que o Apelante desempenhava para a Apelada, remetendo, assim, quaisquer “irregularidades“ de procedimentos para o âmbito disciplinar entre os mesmos – o que nunca ocorreu – e a existência de quaisquer “dívidas” ou prejuízos da Apelada deveriam ser processados como créditos laborais, nos termos do n.º1 do artigo 337.º do Código do Trabalho.
74.ºNo entanto, como a Apelada domina, esses créditos já estão, como vimos, prescritos uma vez que decorreram mais de “um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”. Para além de determinara incompetência absoluta do Tribunal a quo para tal pedido.
75.ºSendo este pedido, uma forma claríssima de deixar entrar pela janela o que a lei quis proibir que entrasse pela porta, sob pena de se frustrar completamente as normas imperativas do Código do Trabalho.
DA CADUCIDADE DO DIREITO DE EXCLUSÃO DE SÓCIO
76.ºPor regra, todos os direitos têm um prazo, maior ou menor, para serem exercidos, sob pena de prescreverem (pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, quanto aos direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição) ou caducarem (quanto aos direitos que por força da lei ou por vontade das partes, devam ser exercidos dentro de certo prazo) – cfr. artigo 298.º do Código Civil.
77.ºEmbora a lei seja omissa quanto ao prazo de que dispõe a sociedade para exercer o direito de excluir o sócio (adotando a deliberação que dá azo à propositura da ação judicial), deve entender-se, porém, como CAROLINA CUNHA (in Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Volume III, 3ª Edição, Almedina, p. 637) “por aplicação analógica do art. 241.º e sua remissão para o art. 234.º, 2 [do CSC, que] a sociedade terá noventa dias, a contar do conhecimento dos factos por algum dos gerentes, para adotar a deliberação que desencadeia o processo de exclusão”; a inobservância de tal prazo de noventa dias faz caducar o direito da sociedade a excluir o sócio.
78.ºOra, como ficou provado, os factos referidos na douta sentença a quo ocorreram, sobretudo, em 2021 e 2022 e, todos eles, já tinham ocorrido há muito mais de noventa dias, quando foi tomada a deliberação de instauração da ação de exclusão de sócio (recorde-se, em 24-08-2023)! Por isso, deveria a caducidade do direito de exclusão de sócio do ora Apelante ser conhecida/declarada (cfr. 333.º do Código Civil).
79.ºMas mesmo que não pudesse ser conhecida/declarada, não poderia deixar de ser tida em conta no momento de apreciar se o comportamento do Apelante impossibilita ou dificulta a prossecução do fim social (tal a distância temporal entre a alegada prática e a reação da sociedade Apelada), tornando inexigível que os sócios maioritários suportem a permanência do Apelante na sociedade Apelada.
DA INVALIDADE DA DELIBERAÇÃO DE EXCLUSÃO DE SÓCIO
80.ºA exclusão de sócio, embora efetuada por via judicial, não prescinde de ser previamente decidida pelo órgão deliberativo interno, ou seja, de prévia deliberação tomada pela sociedade (como resulta expressamente do n.º 2 do artigo 242.º e se extrai do artigo 246.º, n.º 1, alínea g), ambos do CSC).
81.ºEm tal deliberação (que tem por objeto a proposição da ação), como esclarecidamente escreveu RAÚL VENTURA (in Sociedade por Quotas, Vol. II, p. 62) “não basta alegar, como fundamento da deliberação, de modo genérico, comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, devendo ser especificados os factos que podem receber tal qualificação, (…) [sendo] que tais factos limitam a causa de pedir da ação de exclusão, pois o representante da sociedade deve propor a ação com os fundamentos da deliberação e não outros, sobre os quais não tenha recaído a apreciação dos sócios”.
82.ºA jurisprudência tem sido pródiga (e unânime) no tratamento deste tema, de que é exemplo o recente Acórdão do STJ de 16-01-2024 (Proc. n.º 4216/22.0T8VCT.S1 -Relator: António Barateiro Martins), in www.dgsi.pt, que reforça, na sua fundamentação de Direito a posição antes defendida por RAÚL VENTURA.
83.ºOra, como resulta da Ata n.º 7 da reunião da assembleia geral da ora Apelada, realizada no dia 24 de agosto de 2023 (junta com a petição inicial como Doc. 1), a alínea b) da respetiva ordem de trabalhos apenas refere: “Aprovação da propositura de acção de exclusão de sócio contra AA”.
84.ºE na parte deliberativa, apenas foi referido: “Passou-se de seguida à discussão e votação da al. b) da ordem de trabalhos, tendo usado a palavra pelo sócio II, referiu que o sócio AA tem vindo a praticar vários atos ao longo dos últimos anos que prejudicaram fortemente os interesses da Sociedade, razão pela qual se mostra essencial propor acção de exclusão de sócios”.
85.ºDa mesma ata consta que, perante a instância do representante do aqui Apelante na dita assembleia geral, sobre “quais seriam, em concreto, os factos alegadamente praticados e que se mostram lesivos da sociedade”, foi este “remetido pelo sócio II para os termos constantes da presente ata” !!!
86.ºAndou mal, portanto, o Tribunal a quo, ao considerar como provado, acriticamente e sem atender ao Direito, que: “Foi proferida deliberação social de aprovação da propositura da presente ação” (cfr. facto provado n.º 38).
87.ºEm vez de considerar que a falta de uma ata de deliberação da assembleia geral da sociedade Apelada onde estivessem devidamente especificados, como tinham de ser, os factos concretos alegadamente lesivos da sociedade – que são os que limitam a causa de pedir da ação de exclusão -, integrava o vício processual previsto no n.º 1 do artigo 29.º do CPC.
DA VIOLAÇÃO DO ARTIGO 242.º DO CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS
88.ºCom a decisão proferida, o Tribunal a quo violou e fez errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 242.º, máxime no respetivo n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais.
89.ºA exclusão de sócios é um direito atribuído à própria sociedade, pela lei ou pelos estatutos sociais, sendo que, no que respeita às sociedades por quotas, tal direito está previsto nos artigos 241.º e 242.º do CSC: no primeiro, prevê-se a exclusão do sócio por deliberação da sociedade; no segundo, prevê a lei a exclusão do sócio por decisão judicial.
90.ºNo caso dos autos, não se invoca pois, como fundamento para a exclusão do Apelante, factos que se encontrem especificados em disposições legais ou no contrato de sociedade (causas legais ou causas estatutárias de exclusão de sócios), mas “apenas” a causa legal genérica de exclusão de sócio contida (como cláusula geral) no n.º 1 do artigo 242.º do CSC, segundo a qual: “pode ser excluído por decisão judicial o sócio que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, lhe tenha causado ou possa vir a causar-lhe prejuízos relevantes”.
91.ºCom efeito, reafirmamos, face ao disposto no n.º 1 do artigo 242.º do CSC, para o sócio ser excluído têm de ficar demonstrados comportamentos dos sócios que sejam qualificados ou como desleais ou como gravemente perturbadores do funcionamento da sociedade; e, além disso, têm tais comportamentos dos sócios que ter causado ou possam vir a causar à sociedade prejuízos relevantes.
92.ºOra, não nos parece – salvo o devido respeito e melhor opinião – que tais exigências tenham sido observadas na douta decisão a quo.
93.ºÉ sabido que, nas sociedades em nome coletivo, os sócios não podem “exercer, por conta própria ou alheia, atividade concorrente com a da sociedade nem ser sócio de responsabilidade ilimitada noutra sociedade, salvo expresso consentimento de todos os outros sócios” (cfr. artigo 180.º n.º 1 do CSC). Mas não existe idêntica proibição para os sócios das sociedades por quotas, nem existe qualquer norma da regulamentação das sociedades por quotas que remeta para tal regime das sociedades em nome coletivo.
94.ºAs diferenças, nesta como noutras matérias, entre os regimes das sociedades em nome coletivo e as sociedades por quotas, radica na “natureza mais personalística ou capitalística da concreta sociedade", sendo que os deveres impostos aos sócios “variam consoante o tipo legal societário” e “a posição ou poder dos sócios”, sendo certo que “o dever é mais intenso e extenso nas sociedades de pessoas [isto é, nas sociedades em nome coletivo] do que nas de capitais [as sociedades por quotas e as sociedades anónimas], é mais intenso e extenso para os sócios maioritários ou de controlo [no caso, os sócios e gerentes da Apelada que pretendem excluir o Apelante] do que para os minoritários [no caso, o ora Apelante]”11.
95.ºDe facto, no regime das sociedades por quotas apenas existe idêntica proibição (de não concorrência ou aquisição de posição societária) para os gerentes (cfr. artigo 254.º do CSC), mas não para aqueles que apenas sejam sócios, sem funções de gerência, como é o caso do aqui Apelante.
96.ºOra, o Apelante não é gerente da sociedade Apelada, apenas detendo uma participação minoritária (40%) no seu capital social, sem direito a exercer qualquer cargo de gerência.
97.ºParticipação social que os sócios maioritários (que exercem as funções de gerência) julgam (e assim se comportam) não lhe conferir quaisquer direitos, mas apenas obrigações.
98.ºA verdade é que o Apelante, pelo facto de ser(apenas) sócio (minoritário) da Apelada, não estava, nem está, legalmente impedido de deter participações em sociedades com objeto idêntico ao da sociedade Apelada, nem estava, nem está, impedido de exercer atividade concorrente com a atividade da sociedade Apelada.
99.ºDaí que, não estando legalmente impedido de deter participações ou concorrer com a sociedade Apelada, também não se pode considerar que tenha violado, ou esteja a violar, o dever de lealdade pressuposto no n.º 1 do artigo 242.º do CSC. E o mesmo se diga em relação ao exercício da atividade profissional do aqui Apelante.
100.º Com efeito, o Apelante, que é enólogo, sempre se dedicou à criação, promoção e venda de vinhos. É esta a sua especialização profissional e é pelo seu exercício profissional – e não por outro – que obtém os seus meios de subsistência. Foi essa a atividade que exerceu ao serviço da ora Apelada, como seu trabalhador assalariado, ao abrigo de contrato de trabalho, entre 1 de setembro de 2017 e 30 de abril de 2022 (de facto, até 4 de abril de 2022, data em que entrou em gozo de férias).
101.ºEm nada beneficiando do facto de, por sinal, também ser sócio (embora minoritário) da sociedade Apelada. Tanto assim é que o seu ordenado mensal não ultrapassava o ordenado mínimo nacional (!), com a agravante de que eram recorrentes os atrasos no pagamento das remunerações a que tinha legalmente direito, designadamente das comissões das vendas efetuadas.
102.º A que acresce o facto de a sociedade Apelada não ter substituído a viatura que o Apelante usava para o exercício da sua atividade (e que foi danificada por um incêndio), dificultando, sobremaneira, o exercício das suas funções profissionais, que implicavam constantes deslocações pelo país e estrangeiro.
103.º E não menos importante, o Apelante constatou que a participação que detinha e detém na sociedade Apelada, que legitimamente almejava que pudesse contribuir (quinhoando, como é legítimo esperar, nos lucros da atividade societária), para complementar os seus rendimentos do trabalho, não só não produzia os rendimentos esperados, como a sociedade Apelada não distribuía os lucros obtidos, por decisão dos restantes sócios (maioritários e de controlo), que são precisamente aqueles que também exercem os cargos de gerência!
104.º E que, praticamente desde que adquiriram participações maioritárias na sociedade Apelada (em 21/05/2020), sempre dificultaram a obtenção de informações sobre a sociedade, legitimamente pedidas pelo ora Apelante, ignorando que, além de trabalhador assalariado, também lhe cabem direitos enquanto sócio…
105.º Direitos de sócio que lhe foram negados pelos sócios (gerentes) maioritários e de controlo, sempre que o ora Apelante os procurou exercer; pior, tais sócios maioritários (e gerentes) consideram que o exercício legítimo dos direitos de sócio significa “falta de colaboração” com a sociedade (!!!)…
106.º Foi neste enquadramento que o ora Apelante, face à necessidade de garantir a sua subsistência, se viu obrigado a procurar alternativas de emprego, o que teve de fazer, naturalmente, na sua área de atividade, onde operam empresas com atividade necessariamente idêntica e, por isso, concorrente com a atividade da ora Apelada.
107.º Queremos dizer que não é exigível, a qualquer título, que o ora Apelante, face à sua especialização e experiência, estivesse obrigado a mudar de profissão e de ramo de atividade, para, eventualmente, não entrar “em concorrência” com a sua anterior entidade patronal.
108.º Porque não podemos perder de vista que o ora Apelante, apesar de sócio (não gerente e minoritário) da sociedade Apelada, não deixava de ser um trabalhador assalariado e a ela juridicamente subordinado.
109.º Neste contexto, viria a aceitar um convite para exercer a sua atividade profissional, numa nova empresa do mesmo ramo de atividade da ora Apelada (a “B..., Lda”), na qual também lhe foi dada a possibilidade de adquirir uma quota minoritária (correspondente apenas a 20% do respetivo capital social).
110.º Empresa na qual não exerce qualquer cargo de gerência, mas apenas uma atividade profissional juridicamente subordinada, ao abrigo de contrato de trabalho, tal qual sucedia na sociedade ora Apelada.
111.º Como é óbvio, não seria expectável (seria estultícia pensar o contrário!), nem muito menos exigível, que o ora Apelante, enólogo de formação, fosse procurar emprego (permita-se os exemplos) numa perfumaria ou numa casa de presuntos e enchidos, não podendo, pois, ser retirado qualquer efeito do exercício profissional pelo ora Apelante, como assalariado, de uma atividade concorrente com a atividade da sociedade Apelada.
112.º Finalmente, como ficou referido supra, a própria sentença a quo considerou que não foram provados quaisquer dos prejuízos invocados pela sociedade Apelada.
113.º Sendo que, com defendem as mais recentes jurisprudência e doutrina, na ausência de prejuízo o (eventual) desvalor contido no comportamento dos sócios não bastará para fundar a respetiva exclusão.
114.º Com efeito, refere a sentença recorrida: “não foram provados os prejuízos que a Autora invoca, desde logo porque, como provado, a Autora lançou e mantem em comercialização vinhos com a marca “GUYOT FUNKY”, que têm uma grande aceitação junto do público, sendo um produto de sucesso da Autora”.
115.º Sabido que – foi dado como provado na sentença recorrida – o ora Apelante «é o autor único da ideia que originou a criação da marca “FUNKY”» e a respetiva marca está registada em nome da “B..., Lda”.
116.º O que estes factos provam é que – ao contrário do que pretende a sociedade Apelada – o ora Apelante continua interessado (até empenhado) no sucesso comercial da Apelada, bem sabendo que o valor da quota que detém na sociedade Apelada depende desse sucesso comercial.
117.º Portanto, não ficou provado, como vimos supra, que os factos/comportamentos que a Apelada atribui ao ora Apelante (mesmo que padecessem de qualquer antijuridicidade, o que não se concede) tenham causado ou possam vir a causar à sociedade Apelada prejuízos. Muito menos “prejuízos relevantes”!
118.º E mesmo quanto ao “valor de €2.869,50, referente às garrafas de vinho da Autora” (cfr. página 19, segundo parágrafo, da douta sentença a quo), a condenação do ora Apelante, configura um erro grosseiro.
119.º Erro que seria evitado se o Tribunal a quo tivesse tomado na devida conta que o alegado levantamento de vinhos terá ocorrido entre 13 de abril e 21 de maio de 2021! (cfr. facto provado n.º 20), altura em que o ora Apelante era trabalhador por contra doutrem (da ora Apelada), exercendo funções juridicamente subordinadas ao abrigo de contrato de trabalho (o que sucedeu entre 1 de setembro de 2017 e 30 de abril de 2022).
120.º A alegada – mas a nosso ver não provada – utilização dos vinhos em proveito próprio do Apelante terá ocorrido enquanto exercia a sua atividade laboral juridicamente subordinada (todos os vinhos levantados eram utilizados exclusivamente no exercício da atividade profissional subordinada e por causa dela), pelo que o eventual crédito da Apelante(entidade patronal do Apelado) teria de ser reclamado e provado em sede da jurisdição laboral.
121.º Bem sabendo a Apelada que tal eventual crédito já estaria prescrito, nos termos do n.º 1 do artigo 337.º do Código do Trabalho (“O crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido uma no a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”), tornando, igualmente, o tribunal a quo materialmente incompetente para a condenação no pagamento desses “créditos laborais”.
122.º Tudo isto a douta sentença a quo ignorou, aderindo acriticamente às teses defendidas pela Apelada.
123.º E foi essa falta de cuidado e rigor que levou à errada condenação do ora Apelante no pagamento da referida quantia.
124.º No caso sub judice, nem sequer se demonstrou que o sócio ora Apelante tenha tido qualquer comportamento desleal para com a sociedade Apelada, por forma a poder ser excluído do ente societário.
125.º Não está, pois, demonstrado o primeiro requisito exigido pelo artigo 242° do Código das Sociedades Comerciais: comportamento desleal do sócio ora Apelante.
126.º Mas, mesmo que assim não fosse (o que, todavia, não se admite), o certo é que também o segundo requisito ficou por demonstrar.
127.º Efetivamente, como se referiu supra, para que o sócio seja excluído não basta que tenha comportamentos desleais. É também preciso que esses comportamentos causem ou possam vir a causar à sociedade "prejuízos relevantes".
128.º Ora a sociedade Apelada não logrou demonstrar que o Apelante fosse responsável pela diminuição dos seus resultados, nem que tivesse tido qualquer prejuízo de natureza patrimonial ou não patrimonial a este imputável, muito menos que pudesse ser considerado “relevante”. Aliás, não deixa de ser curioso que a Apelada continue a obter bons resultados (como ela própria alega) com a venda do vinho que comercializa com a marca “FUNKY”, criada pelo Apelante e com propriedade registada a favor da “B..., Lda”…
129.º Em suma, não provou a ora Apelada qualquer facto concreto do qual se possa concluir que o ora Apelante tenha causado ou possa vir a causar à Apelada um qualquer prejuízo.
130.º Esta não prova (ou falta de prova) também há de implicar a improcedência do pedido de exclusão de sócio e da condenação no pagamento à Apelada do valor dos vinhos alegadamente levantados pelo Apelante.
*
A Autora apresentou resposta, concluindo nos seguintes termos:
Das nulidades invocadas
1. Argumenta o Recorrente que ocorreu violação do n.º 1 do artigo 603.º do CPC e 20º CRP.
2. Sucede que o Recorrente arguiu tal nulidade a 23/10/2024 e a referida nulidade foi julgada improcedente por douto despacho de 13/11/2024, notificado às partes a 14/11/2024, pelo que o recurso do Réu de 4/2/2025 a tal propósito é manifestamente extemporâneo – cfr art.º 644º, n.º 2, al. a) e 638º, n.º 1 CPC.
3. Por outro lado, e ainda que assim não fosse, não assiste razão ao Recorrente, desde logo, por, nos termos das disposições conjugadas dos Arts. 603º n.º 1 e 151º, nºs 1 e 2 do C.P.C., no caso dos autos, a falta de Ilustre Mandatário do R, só por si, não constituir justificação legal bastante para o adiamento da audiência final.
4. A falta do advogado, como fundamento do adiamento da audiência, estaria, no caso, restrita à situação de haver “justo impedimento” (Art. 603º n.º 1 “in fine” do C.P.C.).
5. Todavia, como se trata de um caso de procuração conjunta, o impedimento de um dos mandatários não é suficiente para provocar o adiamento da audiência, porque a outorga da procuração nessas condições terá precisamente por finalidade fazer face a situações de impedimento de um dos mandatários. Pelo que, entendem estes Autores, e a nosso ver bem, que nestes casos se exige que a parte justifique a razão pela qual os restantes patronos não podem, ou não puderam assegurar o patrocínio.
6. No caso concreto dos autos, o Ilustre Mandatário subscritor do requerimento em que se invocava justo impedimento apenas alegou a esse propósito que: “dada a ocorrência súbita e inesperada de tal contingência, nenhum outro colega de escritório do Requerente está disponível para o substituir.”
7. Assim, não foi sequer invocado que:
a. nenhum mandatário a quem o R havia conferido procuração conjunta estivesse impedido em afazeres profissionais que o impedissem de assegurar a realização da audiência de julgamento, indicando-se os concretos afazeres profissionais em questão;
b. Também não foi invocado que nenhum desses mandatários estaria em condições para exercer o patrocínio da parte e assegurar a colaboração devida à realização da justiça, o que também muito dificilmente sucederia no caso, porquanto na pretéria audiência de julgamento o R estava representado por dois
8. E evidentemente o Réu não provou qualquer facto do aludido incidente –designadamente os referidos nos pontos 22º a 26º das conclusões do Apelante -, pelo que a sua pretensão sempre improcederia.
9. Concluímos, pois, que nenhuma nulidade ou irregularidade foi cometida, pugnando-se pela improcedência da pretensão do R.
10. Acrescenta o recorrente que ocorreu violação dos arts 3º, 508º, n.º 3 CPC e 200º CRP, de novo, sem razão:
- a ter havido irregularidade, a mesma teria de ser arguida pelo Recorrente no prazo de 10 dias, e findo tal prazo a mesma ter-se-ia convalidado – art.º 199º CPC;
- o ora Recorrente apenas suscitou tal questão em sede de Recurso e não perante a 1ª instância, estando impedido legalmente de o fazer por esta via;
- Decorre dos nºs 2 e 3, al. c) 508º e 509ºCPC, que não há adiamento dos actos de produção de prova se uma testemunha faltar por duas vezes a sessões de julgamento, como foi o caso, poderia era ser substituída, o que o Réu não requereu.
11. Outrossim, o art.º 509º CPC é taxativo: “salvo acordo das partes, não pode haver segundo adiamento da inquirição de testemunha faltosa.”
Do Recurso em Matéria de Facto:
12. Subentende-se das alegações oferecidas que o Recorrente pretende recorrer em matéria de facto.
13. Contudo, não cumpre o mesmo os pressupostos para o efeito, porquanto não especifica:
- os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados,
- os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e
- a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (art. 640.º, n.º 1, do CPC).
14. Ora nos pontos 5º, 15º das conclusões, há referências a factos não alegados sequer nos autos, pelo que não pode de modo algum ser considerado.
15. Nos pontos 7º, última parte, e 8º a 12º, 13º 2ª parte, 39º a 46º, 53º a 55º das conclusões, não há qualquer impugnação de matéria de facto em sentido próprio do termo; quando muito há um desabafo, que não tem correspondência com a realidade, diga-se.
16. Quanto ao vertido em 13º, pretendendo sindicar o facto provado vertido em 7), entendendo o Recorrente que a sentença recorrida, confundiu, ainda, os actos exercidos pela sociedade B..., Lda com os atos praticados pelo Apelante, o que não sucede, como resulta evidente da leitura do referido facto.
17. Na conclusão 14ª o Recorrente vale-se dos factos provados 11º e 2º provados, pelo que nenhuma impugnação aí é feita.
18. E desses factos não se retiram as conclusões pretendidas pelo Recorrente, como resulta da sua leitura.
19. Quanto à matéria dos arts 14º a 20º, 41º a 43º, que o Recorrente diz ter sido mal julgada, nenhum meio de prova é referido que impunha decisão diversa da recorrida, pelo que tem de improceder a pretensão do Recorrente.
20. No tocante ao facto provado n.º 15, refere conclusivamente a Apelante que o gerente da Apelada GG o negou.
21. Desde logo a passagem das declarações do legal representante da A citada pela Apelante não se refere a essa situação.
22. Todavia tal não corresponde à verdade, pois que a esse propósito GG declarou: (…)
23. Também II corroborou estas declarações(…)
24. Quanto aos factos provados (14.º, 16.º, 17.º e 41.º a 43.º), refere a Apelante que FF o negou, embora sem especificar as passagens do depoimento deste.
25. Contudo o que tal testemunha declarou foi o seguinte: (…)
26. Portanto, FF não negou tais factos, o que se pode ver do seu depoimento cuja transcrição integral se junta, e foram produzidos outros meios de prova, que permitiram ao Tribunal “a quo” formar a sua convicção, designadamente: (…)
27. Relativamente aos factos provados com os n.ºs 18, 19 e 20, insurge-se a Recorrente quanto ao facto de na sentença recorrida se ter dado tal matéria como provada por não ter sido produzida qualquer prova.
28. Todavia, foram juntos aos autos documentos nesse sentido, juntos com a pi, e foram prestadas as seguintes declarações: (…)
29. Improcedendo o recurso em matéria de facto deverá manter-se integralmente a decisão recorrida ao invés do propugnado pelo Recorrente, pois que aquela obedece ao Direito aplicável.
Do Recurso em Matéria de Direito
30. Vem agora o Réu invocar em sede de recurso excepção de caducidade que não aduziu tempestivamente perante o “Tribunal a quo”, pelo que não pode agora vir invocar tal excepção, sendo certo que a Recorrente não teve oportunidade de quanto à mesma se pronunciar em sede de articulados.
31. Sempre se dirá que, ainda que assim não fosse, a pretensão do Recorrente sempre teria de improceder, porquanto os factos são continuados e não passaram 90 dias desde a prática do último facto pelo Réu e a propositura da acção.
32. Para além do mais, entende o Recorrente que “os factos dados como provados não mostram que o sócio ora Apelante tenha tido um comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade ora Apelada e que, por isso, lhe tenha causado ou possa vir a causar prejuízos relevantes”, sem razão, entende a Apelada.
33. Na verdade, demonstrou-se que
“3. A Autora dedica-se à produção, comercialização, importação, exportação, representação, agente de comercio por grosso de todo o tipo de bebidas, nomeadamente vinhos e espumantes, exploração de atividades agrícolas, transformação e comercialização de produtos agrícolas, prestação de todos os serviços na área da vitivinicultura, olivicultura e outras culturas, consultadoria nas áreas atrás referidas, produção, promoção e organização de eventos, feiras e exposições (cfr doc 1 junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
4. No ano de 2021 os sócios da Autora decidiram utilizar a marca “GUYOT FUNKY” para um dos seus vinhos.
5. O rótulo para esse vinho “GUYOT FUNKY” foi feito em finais de 2021, com o conhecimento e a participação do Réu que à data era funcionário e sócio da Autora.
6. Em 31/05/2022 a Autora tentou promover o registo da marca do vinho “GUYOT FUNKY”, da classe 33, o que deu origem ao processo junto do INPI, DMP/05/2022/...29, MARCA NACIONAL n.º ...26, com o que despendeu €127,50 acrescido de €54,54 de emolumentos (cfr docs 2 e 4 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais).
7. Nesses autos foi notificada da oposição de B..., Lda que alegou ser titular da Marca Nacional n.º ...13 “FUNKY B...”, na classe 33 (cfr docs 3 e 4 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais).
8. Por via dessa oposição, a Autora ficou impossibilitada de registar aquela marca (cfr doc 4 e doc. 15, fls. 44, juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais, anotando-se que a Autora junta dois documentos com a numeração “15”).
9. O Réu é o autor único da ideia que originou a criação da marca “FUNKY”.
10. A sociedade B..., Lda foi constituída em 2022/03/20 e tem como objeto social a produção, comercialização, importação, exportação, representação, agente de comercio por grosso de todo o tipo de bebidas, nomeadamente vinhos e espumantes; exploração de atividades agrícolas; transformação e comercialização de produtos agrícolas; prestação de todos os serviços na área da vitivinicultura, olivicultura e outras culturas; atividades de consultoria, orientação e assistência operacional a empresas ou organismos; promoção e organização de eventos, feiras e exposições.
11. A sociedade B..., Lda tem o capital social de 2.000,00 Euros (dois mil euros) que se encontra distribuído pelos sócios C..., Lda, titular de uma quota no valor de €1.600,00 (mil e seiscentos euros) e AA, titular de uma quota no valor de €400,00 (quatrocentos euros).
12. Os vinhos que a Autora comercializa com a marca “GUYOT FUNKY” têm uma grande aceitação junto do público, sendo um produto de sucesso da A....
13. O Réu promove os vinhos da B..., Lda junto de clientes da Autora.
14. O Réu, junto de fornecedores e clientes da Autora, diz que os vinhos da Autora não têm qualidade, que a Autora não tem capacidade financeira, que vai falir ou está já falida, que os seus sócios não merecem qualquer crédito nem confiança.
15. No período compreendido entre janeiro de 2022 e março de 2022 o Réu AA deslocou-se ao fornecedor de espumantes da Autora, que esta comercializa com a marca Dinamite, ... (...), dizendo-lhe para não vender mais vinho à Autora A..., pois que esta certamente não lho pagaria, estando em situação de insolvência prática.
16. O Réu disse a comerciais da empresa D... que a Autora iria fechar.
17. O Réu tentou que vários restaurantes do Porto retirassem os vinhos da Autora A... da carta de vinhos referindo que a empresa iria fechar e que os vinhos não têm futuro porque a Autora não iria conseguir comprar uvas no Douro.
18. Para controlar as existências, a Autora tinha estabelecida e implementada uma regra no sentido de que os produtos apenas podiam ser levantados do armazém desde que a pessoa que os levantasse preenchesse guias do sistema TOCONLINE.
19. O Réu fez suas garrafas de vinho da Autora, sem dar qualquer justificação à Autora, nem aos gerentes desta e sócios e sem preencher qualquer guia no sistema TONCONLINE.
20. Tal sucedeu com as seguintes garrafas de vinho que totalizam o valor de €2869,50:
21. A Autora viu-se confrontada com dificuldades de tesouraria nos anos de 2020, 2021 e 2022.
22. Os sócios tiveram de fazer suprimentos para a Autora poder assumir os seus compromissos financeiros.
23. Foram pedidos pelos gerentes e demais sócios da Autora ao Réu que fizesse suprimentos em 31/05/2021 e 14/06/2021 por mail e por vários contactos telefónicos entre maio de 2020 e janeiro de 2023, que este não fez.
24. O Réu intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança ação que corre termos sob Processo n.º 155/22.3T8TMC, Juízo de Competência Genérica de Torre de Moncorvo, contra a Autora, pedindo: que se declare anulável e de nenhum efeito a deliberação social tomada em Assembleia Geral da Ré, realizada em 27 de julho de 2022, referente à destinação a dar ao montante de €69.285,92 apurado do exercício durante o ano de 2021, com todas as legais consequências; ser a R condenada a pagar ao A. a quantia de €13.156,59, correspondente a 40% de metade dos lucros apurados e passíveis de distribuição, no exercício de 2021, acrescida dos juros que se vencerem, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento (cfr doc 9 junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
25. Em tais autos, a Ré (aqui Autora) não deduziu contestação e foi proferida sentença de condenação, parcialmente procedente, tendo o Autor (aqui Réu) interposto recurso da decisão de 1ª instância Tribunal da Relação de Guimarães (cfr docs 10 e 11 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais).
26. Encontra-se pendente incidente de nulidade de citação e recurso para o STJ da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães nesses mesmos autos (cfr docs 12, 13 e 17 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais). (…)
27. A sociedade E..., SA e II adquiriram as quotas sociais de que são titulares na sociedade Autora em 21/05/2020 (cfr doc 1 – certidão de registo comercial - junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
28. Decidiram manter a sede da Autora em ... pelo potencial da região para a atividade vinícola, que é o objeto da sociedade, e pelos apoios e fundos comunitários concedidos às empresas aí sedeadas.
29. O Réu AA, para além de sócio, foi trabalhador da Autora.
30. O Proprietário da sede da Autora em ..., de nome EE, é conhecido do Réu AA, que os gerentes da Autora conheceram quando foram a Miranda do Douro a uma reunião com o Banco 1... para o processo burocrático de associar a nova gerência à conta bancária da empresa.
31. Aquele EE e o próprio Réu acordaram com os demais sócios da Autora que ambos garantiam a receção de toda a correspondência dirigida à sociedade e a sua entrega oportuna aos sócios da Autora e seus gerentes.
32. Entretanto o Réu AA desvinculou-se como funcionário da Autora, embora se mantenha como sócio.
33. Entre de março 2022 e maio de 2023, II fez vários contatos com o Sr. EE para a obtenção do correio da empresa, sendo a maior parte deles infrutíferos.
34. A última vez que os gerentes da Autora conseguiram receber alguma documentação da empresa foi no inicio do ano de 2022.
35. Dada a dificuldade na obtenção do correio pediram o reencaminhamento do mesmo para a estação de correios de ... - Maia.
36. Durante o 1º trimestre de 2022 o Réu deixou de contactar fornecedores e clientes e de fazer entregas de produtos.
37. O Réu AA enviou um e-mail ao cliente da Autora, F..., SA, com o seguinte teor: “Olá KK, A situação é tudo idêntica ao passado em Viana. Estes gajos devem estar mal de finanças e deram como desculpa termos vendido a um cliente que fomos nós que lhes passamos, com um decréscimo enorme das vendas no mesmo após eles terem tomado as redias do mesmo. Assim sendo e com a realidade da pandemia e as não vendas deste nosso distribuidor de Lisboa sempre com mil e uma desculpas para o insucesso sempre culpa dos clientes e da realidade do mercado de quebrarem a nossa parceria, que não tínhamos qualquer contrato de exclusividade assinado assim pois no estamos dispostos a aceitar a devolução do vinho. Como tal poderás assumir esta situação por favor e responder a esta gente com elevação que tanto te caracteriza?
As encomendas foram feitas, o vinho foi entregue e agora queremos apenas o dinheiro das facturas. Muito Obrigado Os melhores cumprimentos. The best regards. AA Producer & Winemaker A...”
38. Foi proferida deliberação social de aprovação da propositura da presente ação (cfr. acta n.º 7 que constitui o doc. 1 junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
39. Em 4 de Novembro de 2023, o Réu AA encontrou um trabalhador da Autora numa feira de vinhos que teve lugar em Lisboa, “Essência do Vinho” e disse-lhe que: a. ia bloquear todas as contas bancárias da Autora, b. na Autora nunca lhe diriam nada, referindo-se à situação económica deficitária da Autora.
40. No dia 6 de novembro de 2023, os gerentes da Autora tomaram conhecimento que as contas bancárias da Autora tinham sido alvo de uma penhora no valor de mais de €16.500,00.
41. O Réu continua a contactar os clientes e fornecedores da Autora, o que faz na zona da Anadia e Mealhada, no alto Douro vinhateiro, na zona da Grande Lisboa, no Porto e no Algarve.
42. Faz-lhes propostas de vendas de produtos propondo preços inferiores aos produtos da Autora.
43. E faz propostas de aquisição de vinhos por valores superiores aos praticados pela Autora.”
34. No caso mostram-se preenchidos os requisitos a que alude o art.º 242º CSC, na verdade:
(1) Houve vários comportamentos gravemente perturbadores por parte do Réu.
(2) Os vários comportamentos do Réu isolada e conjuntamente perturbaram gravemente o funcionamento da Autora,
(3) Ocorreu prejuízo económico e reputacional grave para a Autora.
(4) Comportamento e prejuízo possuem relação de causalidade.
(5) Os prejuízos são de monta e relevo.
6) Relevantes o suficiente para implicar perda do direito à qualidade de sócio, pois pela gravidade, reiteração e perpetuar no tempo a relevância dos prejuízos torna necessária a exclusão do Réu.
(7) Também há prejuízos potenciais, sendo o comportamento perturbador suficiente para alterar o funcionamento da sociedade
(8) Igualmente há risco de prejuízos futuros.
(9) O comportamento e o risco de prejuízo guardam nexo de causalidade.
(10) O prejuízo que pode vir a ocorrer é relevante.
(11) Relevante o suficiente para implicar a perda da qualidade de sócio.
35. Donde se conclui que a pretensão do Recorrente em sede de arguição de violação do art.º 262º CSC tem de improceder, confirmando-se a douta sentença recorrida.
*
II — Delimitação do Objecto do Recurso
As questões principais decidendas, delimitadas pelas conclusões do recurso, consistem em apreciar as nulidades invocadas (falta de adiamento da audiência por falta de mandatário, de inquirição de testemunha faltosa e a invalidade da deliberação), saber se deve ser alterada a decisão proferida sobre a factualidade apontada; em caso afirmativo, se o direito caducou e se assiste à Autora o direito a requerer a exclusão de sócio por justa causa e de ser indemnizada.
*
Em resultado do estudo das questões suscitadas, as partes foram convidadas a pronunciarem-se designadamente sobre a eventual verificação da exceção dilatória, de conhecimento oficioso, prevista no artigo 577.º, alínea d), do Código de Processo Civil, fundada na falta de concretização, na deliberação social de 24/08/2023, dos actos imputados ao sócio Réu, mesmo após ter sido questionado, na assembleia, pelo seu representante “quais seriam em concreto os factos alegadamente praticados e que se mostram lesivos da sociedade.(…)”.
Esta questão, suscitada pelo Recorrente no recurso, não foi objecto de resposta pela Recorrida.
Nessa sequência, o Apelante, em resumo, sustentou que a deliberação da assembleia geral da Apelada, de 24/08/2023, limita-se a efetuar juízos conclusivos e genéricos (“vários actos”, “prejudicaram fortemente”), dela resultando a recusa de especificar, mesmo após interpelação expressa ao sócio que presidiu à reunião da assembleia, qualquer facto concreto. Se a deliberação que fundamenta a ação judicial de exclusão for insuficiente ou deficiente, nomeadamente por falta de fundamentação ou por não indicar factos concretos que justifiquem a exclusão, tal comprometerá a validade da própria ação. É por demais evidente que emerge, da análise dos elementos que constam dos autos, a falta de uma condição objetiva de procedibilidade, a qual consubstancia uma exceção dilatória nominada, de conhecimento oficioso, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 278.º, alínea e), 577.º, alínea d) e 578.º, todos do Código de Processo Civil, o que desde já se invoca e que importa a absolvição do pedido.
*
A Autora também se pronunciou aduzindo, em resumo, que o princípio da eventualidade ou da preclusão radica em razões de lealdade na condução da lide, de segurança e de certeza jurídica e que o autor está sujeito ao princípio da preclusão. Os fundamentos da ação e da defesa devem ser invocados, respetiva e simultaneamente, na petição e na contestação, se bem que em planos não necessariamente ao mesmo nível (a título principal e/ou subsidiário ou eventual).
A preclusão aplica-se às exceções que não sejam de conhecimento oficioso. A matéria de facto referida na decisão em apreço não se subsume ao disposto no art.º 577º CPC, al. d) CPC pois no caso dos autos há deliberação social que funda a propositura da presente acção.
*
III — FUNDAMENTAÇÃO
FACTOS PROVADOS (elencados na sentença)
1. A Autora é uma sociedade comercial por quotas e teve sede na Rua ..., Distrito: Bragança, Concelho: ..., Freguesia: ..., ... ... até dia 24 de agosto de 2023, data em que foi deliberado alterar a sua sede para a Rua ..., ... Aveiro (cfr docs 1 e 14 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais, anotando-se que a Autora juntou mais que um documento com a numeração “Doc 1”).
2. A Autora, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o nº ...42, tem o capital social de 20.000,00 Euros (vinte mil euros) que se encontra distribuído pelos sócios II, titular de uma quota no valor de €8.000,00 (oito mil euros), E..., S.A., representada pelo seu administrador GG titular de duas quotas no valor unitário de €2.000,00 (dois mil euros) cada, AA, titular de uma quota no valor de €8.000,00 (oito mil euros) (cfr doc 1 junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
3. A Autora dedica-se à produção, comercialização, importação, exportação, representação, agente de comercio por grosso de todo o tipo de bebidas, nomeadamente vinhos e espumantes, exploração de atividades agrícolas, transformação e comercialização de produtos agrícolas, prestação de todos os serviços na área da vitivinicultura, olivicultura e outras culturas, consultadoria nas áreas atrás referidas, produção, promoção e organização de eventos, feiras e exposições (cfr doc 1 junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
4. No ano de 2021 os sócios da Autora decidiram utilizar a marca “GUYOT FUNKY” para um dos seus vinhos.
5. O rótulo para esse vinho “GUYOT FUNKY” foi feito em finais de 2021, com o conhecimento e a participação do Réu que à data era funcionário e sócio da Autora.
6. Em 31/05/2022 a Autora tentou promover o registo da marca do vinho “GUYOT FUNKY”, da classe 33, o que deu origem ao processo junto do INPI, DMP/05/2022/...29, MARCA NACIONAL n.º ...26, com o que despendeu €127,50 acrescido de €54,54 de emolumentos (cfr docs 2 e 4 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais).
7. Nesses autos foi notificada da oposição de B..., Lda que alegou ser titular da Marca Nacional n.º ...13 “FUNKY B...”, na classe 33 (cfr docs 3 e 4 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais).
8. Por via dessa oposição, a Autora ficou impossibilitada de registar aquela marca (cfr doc 4 e doc. 15, fls. 44, juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais, anotando-se que a Autora junta dois documentos com a numeração “15”).
9. O Réu é o autor único da ideia que originou a criação da marca “FUNKY”.
10. A sociedade B..., Lda foi constituída em 2022/03/20 e tem como objeto social a produção, comercialização, importação, exportação, representação, agente de comercio por grosso de todo o tipo de bebidas, nomeadamente vinhos e espumantes; exploração de atividades agrícolas; transformação e comercialização de produtos agrícolas; prestação de todos os serviços na área da vitivinicultura, olivicultura e outras culturas; atividades de consultoria, orientação e assistência operacional a empresas ou organismos; promoção e organização de eventos, feiras e exposições.
11. A sociedade B..., Lda tem o capital social de 2.000,00 Euros (dois mil euros) que se encontra distribuído pelos sócios C..., Lda, titular de uma quota no valor de €1.600,00 (mil e seiscentos euros) e AA, titular de uma quota no valor de €400,00 (quatrocentos euros).
12. Os vinhos que a Autora comercializa com a marca “GUYOT FUNKY” têm uma grande aceitação junto do público, sendo um produto de sucesso da A....
13. O Réu promove os vinhos da B..., Lda junto de clientes da Autora.
14. O Réu, junto de fornecedores e clientes da Autora, diz que os vinhos da Autora não têm qualidade, que a Autora não tem capacidade financeira, que vai falir ou está já falida, que os seus sócios não merecem qualquer crédito nem confiança.
15. No período compreendido entre janeiro de 2022 e março de 2022 o Réu AA deslocou-se ao fornecedor de espumantes da Autora, que esta comercializa com a marca Dinamite, ... (...), dizendo-lhe para não vender mais vinho à Autora A..., pois que esta certamente não lho pagaria, estando em situação de insolvência prática.
16. O Réu disse a comerciais da empresa D... que a Autora iria fechar.
17. O Réu tentou que vários restaurantes do Porto retirassem os vinhos da Autora A... da carta de vinhos referindo que a empresa iria fechar e que os vinhos não têm futuro porque a Autora não iria conseguir comprar uvas no Douro.
18. Para controlar as existências, a Autora tinha estabelecida e implementada uma regra no sentido de que os produtos apenas podiam ser levantados do armazém desde que a pessoa que os levantasse preenchesse guias do sistema TOCONLINE.
19. O Réu fez suas garrafas de vinho da Autora, sem dar qualquer justificação à Autora, nem aos gerentes desta e sócios e sem preencher qualquer guia no sistema TONCONLINE.
20. Tal sucedeu com as seguintes garrafas de vinho que totalizam o valor de €2869,50.
21. A Autora viu-se confrontada com dificuldades de tesouraria nos anos de 2020, 2021 e 2022.
22. Os sócios tiveram de fazer suprimentos para a Autora poder assumir os seus compromissos financeiros.
23. Foram pedidos pelos gerentes e demais sócios da Autora ao Réu que fizesse suprimentos em 31/05/2021 e 14/06/2021 por mail e por vários contactos telefónicos entre maio de 2020 e janeiro de 2023, que este não fez.
24. O Réu intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança ação que corre termos sob Processo n.º 155/22.3T8TMC, Juízo de Competência Genérica de Torre de Moncorvo, contra a Autora, pedindo: que se declare anulável e de nenhum efeito a deliberação social tomada em Assembleia Geral da Ré, realizada em 27 de julho de 2022, referente à destinação a dar ao montante de €69.285,92 apurado do exercício durante o ano de 2021, com todas as legais consequências; ser a R condenada a pagar ao A. a quantia de €13.156,59, correspondente a 40% de metade dos lucros apurados e passíveis de distribuição, no exercício de 2021, acrescida dos juros que se vencerem, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento (cfr doc 9 junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
25. Em tais autos, a Ré (aqui Autora) não deduziu contestação e foi proferida sentença de condenação, parcialmente procedente, tendo o Autor (aqui Réu) interposto recurso da decisão de 1ª instância Tribunal da Relação de Guimarães (cfr docs 10 e 11 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais).
26. Encontra-se pendente incidente de nulidade de citação e recurso para o STJ da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães nesses mesmos autos (cfr docs 12, 13 e 17 juntos com a petição inicial, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais).
27. A sociedade E..., SA e II adquiriram as quotas sociais de que são titulares na sociedade Autora em 21/05/2020 (cfr doc 1 – certidão de registo comercial - junto com a petição inicial, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
28. Decidiram manter a sede da Autora em ... pelo potencial da região para a atividade vinícola, que é o objeto da sociedade, e pelos apoios e fundos comunitários concedidos às empresas aí sedeadas.
29. O Réu AA, para além de sócio, foi trabalhador da Autora.
30. O Proprietário da sede da Autora em ..., de nome EE, é conhecido do Réu AA, que os gerentes da Autora conheceram quando foram a Miranda do Douro a uma reunião com o Banco 1... para o processo burocrático de associar a nova gerência à conta bancária da empresa.
31. Aquele EE e o próprio Réu acordaram com os demais sócios da Autora que ambos garantiam a receção de toda a correspondência dirigida à sociedade e a sua entrega oportuna aos sócios da Autora e seus gerentes.
32. Entretanto o Réu AA desvinculou-se como funcionário da Autora, embora se mantenha como sócio.
33. Entre de março 2022 e maio de 2023, II fez vários contatos com o Sr. EE para a obtenção do correio da empresa, sendo a maior parte deles infrutíferos.
34. A última vez que os gerentes da Autora conseguiram receber alguma documentação da empresa foi no inicio do ano de 2022.
35. Dada a dificuldade na obtenção do correio pediram o reencaminhamento do mesmo para a estação de correios de ... - Maia.
36. Durante o 1º trimestre de 2022 o Réu deixou de contactar fornecedores e clientes e de fazer entregas de produtos.
37. O Réu AA enviou um e-mail ao cliente da Autora, F..., SA, com o seguinte teor:
“Olá KK,
A situação é tudo idêntica ao passado em Viana. Estes gajos devem estar mal de finanças e deram como desculpa termos vendido a um cliente que fomos nós que lhes passamos, com um decréscimo enorme das vendas no mesmo após eles terem tomado as redias do mesmo.
Assim sendo e com a realidade da pandemia e as não vendas deste nosso distribuidor de Lisboa sempre com mil e uma desculpas para o insucesso sempre culpa dos clientes e da realidade do mercado de quebrarem a nossa parceria, que não tínhamos qualquer contrato de exclusividade assinado assim pois no estamos dispostos a aceitar a devolução do vinho.
Como tal poderás assumir esta situação por favor e responder a esta gente com elevação que tanto te caracteriza? As encomendas foram feitas, o vinho foi entregue e agora queremos apenas o dinheiro das facturas.
Muito Obrigado
Os melhores cumprimentos.
The best regards.
AA
Producer & Winemaker
A...”
38. Da acta n.º 7 resulta que em 24/09/2023, realizou-se a assembleia geral extraordinária da Autora e quanto à alínea b) da ordem de trabalhos consignou-se:
“Passou-se de seguida à discussão e votação da al. b) da ordem de trabalhos, tendo usado de palavra o sócio II, referiu que o sócio tem vindo a praticar vários actos ao longo dos últimos anos que prejudicaram fortemente os interesses da Sociedade, razão pela qual se mostra essencial propor acção de exclusão de sócio.
O aqui representado sócio, por intermédio do seu representante Dr. LL, questionou de imediato quais seriam, em concreto, os factos alegadamente praticados e que se mostram lesivos da sociedade. Perante a questão colocada foi remetido pelo sócio II para os termos constantes da presente acta.”
39. Em 4 de Novembro de 2023, o Réu AA encontrou um trabalhador da Autora numa feira de vinhos que teve lugar em Lisboa, “Essência do Vinho” e disse-lhe que:
a. ia bloquear todas as contas bancárias da Autora,
b. na Autora nunca lhe diriam nada, referindo-se à situação económica deficitária da Autora.
40. No dia 6 de novembro de 2023, os gerentes da Autora tomaram conhecimento que as contas bancárias da Autora tinham sido alvo de uma penhora no valor de mais de €16.500,00.
41. O Réu continua a contactar os clientes e fornecedores da Autora, o que faz na zona da Anadia e Mealhada, no alto Douro vinhateiro, na zona da Grande Lisboa, no Porto e no Algarve.
42. Faz-lhes propostas de vendas de produtos propondo preços inferiores aos produtos da Autora.
43. E faz propostas de aquisição de vinhos por valores superiores aos praticados pela Autora.
44. Por carta datada de 7 de novembro de 2023, o Réu notificou a Autora para consultar todas as suas contas e contabilidade.
45. Em 20 de outubro de 2023 teve lugar Assembleia Geral da Ré na qual ocorreu a aprovação das contas do exercício de 2022 (cfr. doc 2 junto com o articulado superveniente da Autora, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais).
46. O Réu foi citado em 12 de setembro de 2023.
Factos Não Provados:
1. Nos anos de 2021 e 2022 o ora R recusou-se por diversas vezes colaborar para que se procedesse à prestação de contas dos anos de 2020 e 2021, não respondendo atempadamente a emails e furtando-se a contactos telefónicos com vista a acordar reuniões sociais.
2. Foram os sócios da Autora que tiveram a ideia da marca do vinho “GUYOT FUNKY” para um dos seus vinhos.
3. A Marca Nacional n.º ...13 “FUNKY B...”, na classe 33, foi registada a favor de B..., Lda, em 03/03/2022.
4. Por não ter conseguido registar a marca “GUYOT FUNKY” a Autora sofreu e sofrerá “prejuízo” de, pelo menos, €155.000,00.
5. Os vinhos que a Autora projetava vender com a marca “GUYOT FUNKY” representaram cerca de 36.200,00 euros em vendas junto dos seus clientes, considerando o período fixado entre 3/3/2022 e a propositura desta ação.
6. A marca “GUYOT FUNKY” alavancaria a notoriedade da A..., que passaria a ser conhecida no mercado como empresa capaz de produzir vinhos diferenciados e irreverentes.
7. A empresa veria assim a sua imagem e o seu nome junto de clientes, fornecedores e parceiros valorizados.
8. E outros produtos da empresa adquiririam maior projeção junto do público, incrementando as vendas e os lucros.
9. A Autora soube, porque lhe foi transmitido por uma empresa de Coimbra e um restaurante no Algarve, que o Réu se apresentou como representante da A..., mas pretendendo vender os vinhos da B..., Lda.
10. Nesses dois casos, os clientes contactaram a Autora para confirmarem se o Réu a representava e se a Autora tinha alguma relação com os vinhos da B..., Lda.
11. Com a conduta do Réu referida em 13 dos factos provados [promovendo o Réu vinhos da B..., Lda junto de clientes da Autora] a Autora deixa de vender os seus vinhos, deixando de ter proventos que estima em não menos de €50.000,00.
12. Nas circunstâncias referidas em 21 e 22 dos factos provados, a Sócia E... prestou suprimentos no valor global de €169.295,27 e o Sócio II prestou suprimentos no valor global de € 157.000,00.
13. A Autora usou os suprimentos prestados pela E... para pagamento das quantias referidas no quadro apresentado no artigo 42 da petição inicial (aqui dado por reproduzido).
14. A última vez que os gerentes da Autora conseguiram receber alguma documentação da empresa [expedida por correio] foi dia 19/05/2023 e dela não constava nenhum documento de tribunais ou quaisquer processos judiciais.
15. O pedido de reencaminhamento do correio para a estação de correios de ... - Maia foi realizado no dia 28/02/2023.
16. Atentas as divergências com o Réu foi difícil alterar a sede da Autora.
17. Foi o Réu e o Sr. EE que receberam as missivas para citação da Autora nos autos de anulação de deliberação social, Processo 155/22.3T8TMC, aludido em 24 dos factos provados, e não as entregaram aos gerentes da Autora.
18. No primeiro trimestre de 2022 a Autora teve vendas que ascenderam ao valor global de €30.819,00.
19. Valor inferior ao verificado no 1º trimestre de 2021 e de 2023, sendo que neste último o Réu já não trabalhou para a Autora, designadamente:
a. 2021 - € 73.231 euros
b. 2022 - € 30.819 euros
c. 2023 - € 124.587 euros
20. O Réu nesse trimestre de 2022 estava já a trabalhar na promoção de produtos concorrentes da Autora.
21. O e-mail enviado pelo Réu AA à F..., SA, referido em 37 dos factos provados, provocou a rescisão do acordo de distribuição que a Autora tinha em vigor com esta e obrigou a sociedade procurar e encontrar um novo distribuidor, o que lhe provocou baixas nas vendas.
22. O Réu pretende ter conhecimento dos mais recentes fornecedores e clientes da Autora, a fim de os contactar e desviar clientela e fornecedores.
*
DIREITO
Obedecendo a uma ordem de precedência lógica, impõe-se, numa primeira linha, conhecer a questão que se prende com a falta da condição necessária que autoriza os sócios a recorrerem à via judicial, ou seja, por eventualmente inexistir uma deliberação social que satisfaça essa exigência legal.
A Autora pretende obter a declaração judicial de exclusão do Réu comosócio e a sua condenação no pagamento da quantia de € 32.000,00 pelos prejuízos que alegadamente lhe causou, imputando-lhe a prática de actos considerados lesivos dos interesses societários.
Segundo o n.º 1 do art.º 241.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) “Um sócio pode ser excluído da sociedade nos casos e termos previstos na presente lei, bem como nos casos respeitantes à sua pessoa ou ao seu comportamento fixados no contrato.”
Do ponto de vista da estrutura, como esclarece Carolina Cunha,[1]o direito de exclusão de sócio apresenta-se como um direito potestativo extintivo do qual é titular a sociedade.
O caso sub judice enquadra-se na cláusula geral prevista no artigo 242.º, n.º 1 do CSC: “Pode ser excluído por decisão judicial o sócio que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, lhe tenha causado ou possa vir a causar-lhe prejuízos relevantes.”
A procedência da acção judicial de exclusão de sócio depende, assim, da prova de comportamentos do sócio, qualificados de desleais e de gravemente perturbadores do funcionamento da sociedade e ainda do requisito da prejudicialidade.
A lei exige ainda que a propositura da acção judicial seja precedida por uma deliberação dos sócios (n.º 2).
Neste ponto fulcral atinente à deliberação dos sócios, concretamente quanto ao seu conteúdo, Raúl Ventura,[2] citado pelo Recorrente, esclarece que “Não basta alegar, como fundamento da deliberação, de modo genérico, “comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade”, devendo ser especificados os factos que podem receber tal qualificação. Isto é tanto mais importante quanto tais factos limitam a causa de pedir da acção de exclusão, pois o representante da sociedade deve propor a acção com os fundamentos da deliberação e não outros, sobre os quais não tenha recaído a apreciação dos sócios.”[3]
A este respeito importa observar que não se exige uma articulação de factos como se se tratasse de uma petição inicial mas tão-só a descrição, em termos sintéticos, dos comportamentos, necessariamente graves, que tornam insustentável a relação contratual societária e legitimam o pedido de exclusão da qualidade de sócio, por via judicial.
Neste sentido o Acórdão do STJ, de 05/05/2015,[4]sustentou que “Não se pede – nem e lei exige – que na deliberação social de uma sociedade destinada a cevar um pedido de exclusão de sócio especifique, concretize e narre, descritivamente, os factos materiais que venham a constituir uma petição inicial de uma acção judicial. O que se pede, e é legalmente exigível, é que a deliberação contenha as situações-base e concentradas, ou até conceptualizadas, de condutas e atitudes desvirtuadoras e desvalorativas em que os sócios visados incorreram e que, na apreciação compreensiva de uma realidade societária, se mostram e patenteiam contrárias aos objectivos e fins da sociedade e se revelam susceptíveis de preencher os fundamentos que habilitam a tomada de decisão, por parte da sociedade em nome colectivo.”
Em suma, não basta, para se considerar preenchida a condição de procedibilidade da acção judicial de exclusão de sócio que, na assembleia, os sócios se limitem a votar uma deliberação meramente genérica, da qual não constem os motivos concretos pelos quais entendem que o sócio em causa deve ser excluído do seio da sociedade.
A exclusão de sócio, com fundamento na cláusula geral de um comportamento desleal ou perturbador do funcionamento da sociedade, constitui sempre uma situação deveras grave para o visado.
O sócio, apesar de estar impedido de votar, tem o direito de estar presente e de participar na discussão da deliberação, contribuindo, assim, para a formação da vontade colectiva.[5]
Ora, sem se saber minimamente quais são os comportamentos que lhe são imputados como lesivos do interesse societário, está vedada, à partida, a possibilidade de qualquer discussão sobre a matéria.
Por outro lado, nesta hipótese de votação de uma deliberação genérica, o sócio só terá conhecimento da factualidade susceptível de ser enquadrada no citado art. 242.º, n.º 1 do CSC através da petição inicial, o que manifestamente anula a função delimitadora do objecto da acção que se atribui à deliberação social que a deve preceder.
A Relação de Évora, no acórdão de 18/10/2007[6] seguiu a mesma orientação sobre esta questão declarando: “Com efeito, na acção de exclusão de sócio a causa de pedir não é propriamente constituída pela deliberação que o n.º 2 do art. 242 do C.S.C. refere, mas sim pelos fundamentos dessa deliberação, isto é, concretamente pelos factos sobre que recaiu a atenção dos sócios, nela especificados como seu fundamento – cfr. Ac STJ de 20-03-2003, relatado pelo Sr. Cons. Oliveira Barros, in dgsi.pt.”
No caso em análise, os sócios votaram uma deliberação sem qualquer conteúdo fáctico imputável ao Réu pois apenas ficou consignado que o sócio II referiu que o sócio tem vindo a praticar vários actos ao longo dos últimos anos que prejudicaram fortemente os interesses da Sociedade, razão pela qual se mostra essencial propor acção de exclusão de sócio.
Nessa assembleia, o Réu, por intermédio do seu representante, questionou de imediato quais seriam, em concreto, os factos alegadamente praticados e que se mostram lesivos da sociedade.
Todavia, nem perante a interpelação directa que foi dirigida ao referido sócio, nessa assembleia, com o objectivo do Réu tomar conhecimento dos actos que, na perspectiva dos sócios, legitimam uma acção judicial para o excluir da sociedade, nada foi esclarecido pois foi remetido para os termos constantes da presente acta.
Ou seja, no caso que estamos a analisar em que não foi exposta a base factual imputada ao sócio e que motiva a sociedade a exigir judicialmente a sua exclusão, não se pode afirmar que os factos articulados na acção judicial de exclusão de sócio foram precedidos da necessária deliberação social.
Com efeito, a Autora acusou o Réu, nesta acção, de falta de colaboração e envolvimento, nomeadamente para aprovação das contas da sociedade, de apropriação indevida de marca de vinhos da Autora, alegando que causaram prejuízos na esfera da Autora, por quebra nas vendas, concorrência direta e desleal para com a Autora, a prática de atos conducentes ao impedimento de acesso pela Autora à respetiva sede social e a falta de realização de suprimentos.
Nenhum destes actos, atribuídos ao Réu, foram dados a conhecer na assembleia que votou a sua exclusão.
Na verdade, especificamente sobre esses factos (ou outros) a vontade colectiva não se chegou a formar com sentido útil.
Em bom rigor, desconhecem-se os motivos pelos quais se entendeu que os interesses da sociedade foram gravemente desrespeitados pelo Réu, de tal forma que os sócios não tiveram alternativa e decidiram avançar judicialmente contra o sócio com vista a obter a extinção da sua relação com a Autora.
A ausência de um mínimo de temas com suporte factual na deliberação, é equiparada à sua falta, e por isso, carece a presente acção da mencionada condição objectiva de procedibilidade.
Esta situação configura uma exceção dilatória nominada, de conhecimento oficioso, nos termos dos artigos 278.º, e), 577.º, alínea d), 576.º, n.º 2 e 578.º do CPC, determinando a absolvição do Réu da instância.
O recurso merece, pelas razões aduzidas, provimento, pelo que o conhecimento das demais questões fica naturalmente prejudicado.
*
V - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação do Porto em julgar procedente o recurso, e em consequência, absolvem o Réu da instância ao abrigo do disposto nos artigos 278.º, e), 576.º, n.º 2, 577.º, alínea d) e 578.º do CPC.
Custas pela Autora.
Notifique.
Porto, 11/11/2025.
Anabela Andrade Miranda
Eduardo Rodrigues Pires
João Ramos Lopes
_________________________ [1]Código das Sociedades Comerciais em Comentário, n.º 3, Almedina, pág. 579. [2]Sociedade por Quotas, vol. II, Almedina, 1989, pág. 62. [3] Acompanhando a doutrina v. Acs. STJ de 31/05/2023 e de 16/01/2024 (Rel. Barateiro Martins), disponíveis em www.dgsi.pt. [4] Rel. Gabriel Catarino, disponível em www.dgsi.pt [5] Neste sentido, Cunha, Carolina, ob. cit., pág. 598, a propósito da sociedade formada por dois sócios. [6] Rel. Manuel Marques, disponível em www.dgsi.pt.