CONFLITO DE COMPETÊNCIA
COMPETÊNCIA
COMPETÊNCIA POR CONEXÃO
ARTIGO 11.º DO RGPTC
IRMÃOS
PROVIMENTO
LEI
HIERARQUIA DAS NORMAS
Sumário

I. O regime de competência estabelecido no n.º 1 do artigo 11.º do RGPTC (e a que os artigos 80.º e 81.º da LPCJP também se referem) traduz um regime especial de competência, dito “por conexão”, que sobreleva sobre a competência territorial (cfr. n.º 5 do mencionado artigo 11.º do RGPTC).
II. Em face deste regime especial de competência “por conexão”, o que releva para efeitos de competência para todas as ações é a data da sua instauração, ou seja, da entrada em tribunal, sendo irrelevantes as modificações de facto que posteriormente ocorram – cfr. artigos 9.º n.ºs 1 e 9 do RGPTC e artigo 81.º, n.º 1, da LPCJP.
III. Em face do regime especial de competência “por conexão”, resultante do n.º 1 do artigo 11.º do RGPTC, sendo instaurado relativamente à mesma criança ou jovem um processo de promoção e proteção e, anos depois, instaurado novo processo, nomeadamente um processo tutelar cível ou de promoção e proteção, estando aquele ou aqueles já arquivados, o tribunal e juiz que o decidiu, ainda que estejam findos, continua a manter a sua competência material para todos estes processos.
IV. Tendo corrido termos, previamente à presente ação para regulação do exercício das responsabilidades parentais (respeitante às crianças CC, BB e AA), um processo de promoção e proteção, instaurado em 2017, apenas quanto às crianças BB e AA, no Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 4, inexiste obstáculo a que seja determinada a apensação do processo de regulação das responsabilidades parentais, ao processo de promoção e proteção anteriormente instaurado e que correu termos relativamente às crianças que – à data – careciam de proteção, a isso não obstando a circunstância de serem, agora, 3 as crianças em questão na ação de regulação.
V. A circunstância de a anterior ação se encontrar finda ou arquivada, não afasta a dita conexão, sendo certo que a lei não faz depender a sua operatividade do estado do processo e, designadamente, de a primeira ação se encontrar pendente ou ter findado.
VI. O constante do ponto 5.º do Provimento de 14-09-2016, do Juízo de Família e Menores de Cascais - “Nos termos do art.º 11.º, n.º 1, do RGPTC e 81.º da LPCJP, serão efectuadas apensações entre processos tutelares cíveis, de promoção e protecção ou tutelares educativos referentes ao mesmo menor, sem prejuízo do disposto no art.º 37.º da Lei Tutelar Educativa”- não pode comportar um sentido divergente ou contrário àquele que resulta dos normativos legais aplicáveis.

Texto Integral

Pº 346/25.5T8CSC.L1
6.ª Secção
Conflito de Competência
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I. O Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 1 suscita a resolução de conflito negativo de competência entre ele próprio e o Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 4 para a tramitação do presente processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, com fundamento em que ambos se declararam incompetentes para dele conhecer.
O Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 1 remeteu os autos ao Juízo de Família e Menores de Cascais - Juiz 4 por verificar que, relativamente às crianças AA e BB, correu termos processo de promoção e protecção neste último juízo, sob o n.º de proc. 3016/17.4T8CSC, determinando a remessa dos autos de regulação àquele juízo para apensação – art.º 11.º, n.º 1 do RGPTC.
Por sua vez, o Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 4 devolveu os autos ao Juiz 1, por considerar que o processo de promoção e protecção apenas correu em benefício das crianças BB e AA e não, também, em benefício da criança CC, considerando não existir fundamento para a apensação ao abrigo do artº 11º, nº 1 do RGPTC.
O Ministério Público foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 112.º, n.º 2, do CPC, promovendo – por promoção de 02-05-2025 – que seja “indeferido o pedido de resolução de conflito suscitado pelo Juiz 1 do Juízo de Família e Menores de Cascais, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste”.
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II. Mostra-se apurado, com pertinência para a resolução do conflito, o seguinte:
1) Em 28-01-2025, DD veio requerer a regulação do exercício das responsabilidades parentais, no interesse dos seus filhos EE, nascida em ...-2011, FF, nascido em ...-2015 e GG, nascida em .../2019.
2) Distribuídos os autos ao Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 1, sob o n.º 346/25.5T8CSC, em 03-02-2025 – despacho objeto de notificação expedida em 04-02-2025 - foi proferido o seguinte despacho:
“Atendendo a que relativamente às crianças AA e BB, correu termos processo de promoção e protecção, no 4.º juízo deste Tribunal de Família e Menores de Cascais, sob o n.º de proc. 3016/17.4T8CSC, determino a remessa dos presentes autos àquele juízo para apensação – art.º 11.º, n.º 1 do RGPTC.
Custas a cargo da requerente, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que possa beneficiar.
Valor da acção: € 30.000,01”.
3) Remetidos que foram os autos ao Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 4 e apensados ao processo n.º 3016/17.4T8CSC, aí foi proferido – no então apenso A - em 11-02-2025, o seguinte despacho – objeto de notificação expedida em 12-02-2025:
“Considerando que o processo de promoção e protecção a que os presentes autos foram apensos apenas correu em benefício das crianças BB e AA e não, também, em benefício da criança CC, não existe fundamento para a determinada apensação ao abrigo do artº 11º, nº 1 do RGPTC (neste sentido veja-se o ponto 4º do Provimento subscrito, em 14.09.2016, pelas Juízes Titulares deste Juízo de Família e Menores de Cascais).
Assim sendo, desapense e devolva ao Juiz 1.
Notifique.
D.N.”.
4) Em 05-03-2025 – decisão objeto de notificação expedida em 21-03-2025 - o Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 1 proferiu o despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte:
“(…) Dispõe o art.º 11, n.º 1 do RGPTC, relativamente à competência por conexão: “Se, relativamente à mesma criança, forem instaurados, separadamente, processo tutelar cível e processo de promoção e protecção (…), devem os mesmos correr por apenso, independentemente do respectivo estado, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar.”
Sendo que o n.º 4 do mesmo artigo, dispõe: “- Quando o processo tutelar cível respeitar a mais do que uma criança, pode ser instaurado um único processo e, tendo sido instaurados processos distintos, pode proceder-se à apensação de todos eles ao que foi instaurado em primeiro lugar, se as relações familiares assim o justificarem.”
Também na Lei de Prmocção e Protecção, mais concretamente, no artigo 81.º, n.º 1 da Lei de Promocção e Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro, na redacção introduzida pela Lei n.º 23/2023, de 25 de Maio) se prevê: “Quando, relativamente à mesma criança ou jovem, forem instaurados, sucessivamente ou em separado, processos de promoção e protecção, tutelar educativo ou relativos a providências tutelares cíveis, devem os mesmos correr por apenso, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar”.
Prevê o n.º 4 do artigo 81.º da referida LPCJP, que a apensação a que se reporta o n.º 1 do mesmo normativo, tem lugar independentemente do estado dos processos.
A intenção do legislador foi, para nós, clara. Pretendeu aquele que o Tribunal que já conhece a família, as crianças e a sua situação, seja chamado a decidir os outros processos em que sejam intervenientes as mesmas crianças e os mesmos pais.
Ora, o processo que foi inicialmente instaurado, foi o processo de promoção e protecção que correu termos no 4.º Juízo, sendo que os pais são os mesmos, e as duas crianças mais velhas, AA e BB, são também as mesmas, sendo que à data em que o processo de promoção e protecção foi instaurado, em 2017, ainda só existiam 2 filhos, uma vez que filha mais nova, CC, nasceu em 2019, razão pela qual não foi abrangida pelo referido processo.
Como refere a Digníssima Magistrada do Ministério Público na sua douta promoção: “A razão de ser dessa apensação, consiste, que naquele processo de promoção e contém outros elementos de prova atinentes à situação dos menores, à sua história de vida, ao seu contexto familiar, e que certamente auxiliariam o tribunal a proferir uma decisão neste processo, perante a falta de acordo e os autos prossigam para julgamento.
Podemos assim, concluir, que a decisão proferida poderá ser antagónica com o da intervenção mínima do tribunal, pois, na verdade, os processos já existentes, mesmo que arquivados, contêm elementos passíveis de serem usados como meios de prova e, nessa medida, evita-se a recolha de nova prova, a duplicação de diligências e, consequentemente, assegura-se a intervenção mínima do tribunal.
Poderia suscitar-se a dúvida, de não ter corrido o processo de promoção e protecção relativamente ao menor (…), mas apenas relativamente aos seus dois irmãos (…). Mas também, essas situações foi salvaguardado por parte do legislador, no preceituado no art.º 11, n.º4 «Quando o processo tutelar cível respeitar a mais do que uma criança, pode ser instaurado um único processo e, tendo sido instaurados processos distintos, pode proceder-se à apensação de todos eles ao que foi instaurado em primeiro lugar, se as relações familiares assim o justificarem», neste caso justifica-se o agregado familiar é o mesmo, poderá ter de existir uma intervenção no agregado familiar, para aquelas situações que tenha que existir uma audiência técnica especializada, teriam de duplicar os meios em processos destintos.”
Relativamente ao invocado ponto 4.º do Provimento de 14 de Setembro de 2016, impõe-se desde já referir que cremos que a Mm.ª Juiz titular do 4.º Juízo, pretendia, na verdade, referir-se ao ponto 5.º do referido provimento, porquanto o ponto 4.º respeita a situações de litispendência, enquanto o ponto 5.º dispõe: “Nos termos do art.º 11.º, n.º 1, do RGPTC e 81.º da LPCJP, serão efectuadas apensações entre processos tutelares cíveis, de promoção e protecção ou tutelares educativos referentes ao mesmo menor, sem prejuízo do disposto no art.º 37.º da Lei Tutelar Educativa”
Ora, não só se impõe referir que o mesmo foi subscrito pelas Exmas. Senhoras Juízas titulares do Tribunal de Família e Menores, àquela data (em 2016), que não são todas as actuais, sendo que a interpretação que agora se está a dar ao referido ponto, para não aceitar a apensação, nos parece claramente contrária quer à letra da lei, - RGPTC e LPPCJP – quer ao seu espírito.
Tal interpretação do provimento, fará com que sempre que nasça uma nova criança de uma mesma família que já tem vários processos a correr termos num Juízo, sejam processos de promoção e protecção, sejam processos tutelares cíveis, que os mesmos sejam distribuídos autonomamente, correndo-se assim o risco de haver diferentes juízes a apreciar separadamente a realidade daquela mesma família, o que nos parece, salvo melhor entendimento, o oposto do pretendido pelo legislador, não só devido à multiplicação de recursos humanos para a mesma família (sejam os meios do Tribunal, sejam as equipas técnicas), mas também porque o objectivo é que o Juiz que decida o que é o superior interesse de uma criança que é filha daqueles pais, esteja em melhor posição para apreciar, com o conhecimento e com os elementos que já tem nos autos, qual é também o superior interesse da criança mais nova no seio daquela mesma família.
Por todo o exposto, impõe-se suscitar o conflito negativo de competência, para que o Tribunal da Relação doutamente dirima o conflito.
Assim, e suscitando-se aqui o conflito negativo de competência, solicita-se, muito respeitosamente, ao Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, a resolução do mesmo (artigos 109.º, n.º 2, 110.º, n.º 2 e 111.º, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Civil) (…)”.
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III. Conhecendo:
Nos termos do n.º 2 do artigo 109.º do CPC, há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão.
Não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência (cfr. artigo 109.º, n.º 3, do CPC).
Suscita o Ministério Público a questão de que, na data em que os autos foram remetidos, não se pode considerar que a decisão de 11-02-2025 se mostrasse transitada.
Todavia, certo é que, conforme decorre do ponto II, tal decisão foi objeto de notificação aos sujeitos processuais, designadamente, à requerente da regulação e ao Ministério Público, as únicas partes – então – dos autos.
Afigura-se-nos, pois, que o despacho correspondente – de 11-02-2025 – transitou, uma vez que, dele não foi apresentada impugnação.
Quando o tribunal se aperceba do conflito, deve suscitar oficiosamente a sua resolução junto do presidente do tribunal competente para decidir (cfr. artigo 111.º, n.º 1, do CPC).
Entendem ambos os tribunais, não serem competentes para dirimir o processo de regulação.
A Lei n.º 141/2015, de 08 de setembro veio aprovado o Regime Geral do Processo Tutelar Cível (abreviadamente RGPTC) estabelecendo o artigo 3.º desse regime que:
“Para efeitos do RGPTC, constituem providências tutelares cíveis:
(…) c) A regulação do exercício das responsabilidades parentais e o conhecimento das questões a este respeitantes; (….)”.
Por seu turno, o artigo 9.º do RGPTC – sob a epígrafe “Competência territorial” – prescreve o seguinte:
“1 - Para decretar as providências tutelares cíveis é competente o tribunal da residência da criança no momento em que o processo foi instaurado.
2 - Sendo desconhecida a residência da criança, é competente o tribunal da residência dos titulares das responsabilidades parentais.
3 - Se os titulares das responsabilidades parentais tiverem residências diferentes, é competente o tribunal da residência daquele que exercer as responsabilidades parentais.
4 - No caso de exercício conjunto das responsabilidades parentais, é competente o tribunal da residência daquele com quem residir a criança ou, em situações de igualdade de circunstâncias, o tribunal em que a providência tiver sido requerida em primeiro lugar.
5 - Se alguma das providências disser respeito a duas crianças, filhos dos mesmos progenitores e residentes em comarcas diferentes, é competente o tribunal em que a providência tiver sido requerida em primeiro lugar.
6 - Se alguma das providências disser respeito a mais do que duas crianças, filhos dos mesmos progenitores e residentes em comarcas diferentes, é competente o tribunal da residência do maior número delas.
7 - Se no momento da instauração do processo a criança residir no estrangeiro e o tribunal português for internacionalmente competente, é competente para apreciar e decidir a causa o tribunal da residência do requerente ou do requerido.
8 - Quando o requerente e o requerido residam no estrangeiro e o tribunal português for internacionalmente competente, o conhecimento da causa pertence à secção da instância central de família e menores de Lisboa, na Comarca de Lisboa.
9 - Sem prejuízo das regras de conexão e do previsto em lei especial, são irrelevantes as modificações de facto que ocorram após a instauração do processo”.
Nos termos previstos no n.º 1 do artigo 10.º do RGPTC, a incompetência territorial pode ser deduzida até decisão final, devendo o tribunal conhecer dela oficiosamente.
O artigo 11.º do RGPTC regula os casos de “competência por conexão”, dispondo o seguinte:
1 - Se, relativamente à mesma criança, forem instaurados, separadamente, processo tutelar cível e processo de promoção e proteção, incluindo os processos perante a comissão de proteção de crianças e jovens, ou processo tutelar educativo, devem os mesmos correr por apenso, independentemente do respetivo estado, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar.
2 - O disposto no número anterior não se aplica às providências tutelares cíveis relativas à averiguação oficiosa da maternidade ou da paternidade, nem às que sejam da competência das conservatórias do registo civil, ou às que respeitem a mais que uma criança.
3 - Estando pendente ação de divórcio ou de separação judicial, os processos de regulação do exercício das responsabilidades parentais, de prestação de alimentos e de inibição do exercício das responsabilidades parentais correm por apenso àquela ação.
4 - Quando o processo tutelar cível respeitar a mais do que uma criança, pode ser instaurado um único processo e, tendo sido instaurados processos distintos, pode proceder-se à apensação de todos eles ao que foi instaurado em primeiro lugar, se as relações familiares assim o justificarem.
5 - A incompetência territorial não impede a observância do disposto nos n.os 1, 3 e 4.”.
Da conjugação do n.º 1 com o n.º 5 do preceito, resulta que a competência “por conexão”, a que se refere o primeiro, sobreleva sobre a competência territorial.
Da interpretação do n.º 1 do artigo 11.º do RGPTC resulta a consagração de 4 regras:
“- a 1ª impõe (“devem”) a apensação entre o processo tutelar cível e o processo de promoção e proteção ou o processo tutelar educativo (e somente entre estes);
- a 2ª que a apensação opera em qualquer estado dos processo (mesmo que findos);
- a 3ª (implícita), estabelece a ordem ou precedência da apensação (ao processo instaurado em 1ª lugar);
- a 4ª instituindo um regime especial de competência territorial (o tribunal onde primeiramente se instaurou qualquer dos referidos processos)” (assim, a decisão do Vice-Presidente do STJ de 21-04-2023, Pº 2600/14.2TBALM-B.L1.S1, rel. NUNO GONÇALVES, disponível em https://www.dgsi.pt).
Por seu turno, quanto a processos de promoção e proteção, regula a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (abreviadamente, LPCJP, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro).
Por “medida de promoção dos direitos e de proteção” entende-se “a providência adotada pelas comissões de proteção de crianças e jovens ou pelos tribunais, nos termos do presente diploma, para proteger a criança e o jovem em perigo” (cfr. artigo 5.º, al. e) da LPCJP), estando o leque de medidas aplicáveis previsto no artigo 35.º da LPCJP.
Sobre a competência territorial para a aplicação de medidas de promoção e proteção, dispõe o artigo 79.º da LPCJP que:
“1 - É competente para a aplicação das medidas de promoção e proteção a comissão de proteção ou o tribunal da área da residência da criança ou do jovem no momento em que é recebida a comunicação da situação ou instaurado o processo judicial.
2 - Se a residência da criança ou do jovem não for conhecida, nem for possível determiná-la, é competente a comissão de proteção ou o tribunal do lugar onde aquele for encontrado.
3 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, a comissão de proteção ou o tribunal do lugar onde a criança ou o jovem for encontrado realiza as diligências consideradas urgentes e toma as medidas necessárias para a sua proteção imediata.
4 - Se, após a aplicação de medida não cautelar, a criança ou o jovem mudar de residência por período superior a três meses, o processo é remetido à comissão de proteção ou ao tribunal da área da nova residência.
5 - Para efeitos do disposto no número anterior, a execução de medida de promoção e proteção de acolhimento não determina a alteração de residência da criança ou jovem acolhido.
6 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a comissão de proteção com competência territorial na área do município ou freguesia de acolhimento da criança ou jovem, presta à comissão que aplicou a medida de promoção e proteção toda a colaboração necessária ao efetivo acompanhamento da medida aplicada, que para o efeito lhe seja solicitada.
7 - Salvo o disposto no n.º 4, são irrelevantes as modificações de facto que ocorrerem posteriormente ao momento da instauração do processo”.
Nos termos do disposto no n.º. 1 do artigo 85.º do Código Civil, o menor tem domicílio no lugar da residência da família; se ela não existir, tem por domicílio, o do progenitor a cuja guarda estiver.
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IV. Os presentes autos de regulação das responsabilidades parentais, com o n.º 346/25.5T8CSC, foram distribuídos ao Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 1.
Previamente, e quanto às mesmas crianças (sendo que a regulação ainda respeita a uma outra criança), tinha corrido termos no Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 4, um processo de promoção e proteção, com o n.º 3016/17.4T8CSC, instaurado em 2017.
Insurge-se o Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 4 contra a apensação de processos determinada pelo Juiz 1 do mesmo Juízo, por considerar que o processo de promoção e proteção a que os autos de regulação foram apensos apenas correu em benefício das crianças BB e AA e não, também, em benefício da criança CC, concluindo inexistir fundamento para a apensação ao abrigo do artº 11º, nº 1 do RGPTC, invocando, neste sentido, o ponto 4º do Provimento subscrito, em 14-09-2016, pelas Juízes do Juízo de Família e Menores de Cascais.
Contudo, não nos parece que esta limitação à apensação de processos decorra da interpretação de algum dos normativos referenciados.
Conforme se sublinhou no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04-03-2024 (Pº 2182/14.5TBVFR.25.P1, rel. JORGE MARTINS RIBEIRO), “as normas atinentes à competência por conexão (e apensação de diferentes processos), constantes do art.º 11.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, R.G.P.T.C. e dos artigos 80.º e 81.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, L.P.C.J.P. têm uma dupla função, factual e jurídica: por um lado, permitir uma visão holística da realidade factual e, em consequência, habilitar o tribunal a decidir com melhor conhecimento de causa e a concertar as decisões nos diferentes processos”.
E essa concatenação e harmonia de decisões tem clara prevalência sobre a da natureza dos processos em confronto e, designadamente, sobre a circunstância de no processo de promoção e proteção apenas terem estado em questão dois dos 3 irmãos a que ora diz respeito a regulação das responsabilidades parentais almejada.
Efetivamente, em face do regime especial de competência “por conexão”, resultante do n.º 1 do artigo 11.º do RGPTC, “sendo instaurado relativamente à mesma criança ou jovem um processo de promoção e proteção (…), e anos depois é instaurado novo processo, nomeadamente um processo tutelar cível ou de promoção e proteção, estando aquele ou aqueles já arquivados, o tribunal e juiz que o decidiu, ainda que estejam findos, continua a manter a sua competência material para todos estes processos (pressupondo que continua a manter competência material para o efeito) (…)”, o que “significa que a existência de qualquer um dos apontados processos determina, no futuro, a competência desse tribunal para todos os demais processos supervenientes relativamente à mesma criança, independentemente de outras vicissitudes ou circunstâncias, exigindo-se, apenas, que esse tribunal continue a manter a necessária competência material para o efeito (assim, Tomé D’Almeida Ramião; Regime do Processo Tutelar Cível, Anotado e Comentado, 4.ª ed., Quid Juris, 2020, p. 59).
Isso mesmo considerámos já anteriormente, sendo exemplo de decisão tomada nesse sentido, a proferida em 02-05-2024, no processo n.º 24177/18.0T8LSB-B.L1-7 e relatada pelo signatário:
“1) Em face do regime especial de competência “por conexão”, resultante do n.º 1 do artigo 11.º do RGPTC, sendo instaurado relativamente à mesma criança ou jovem um processo tutelar cível e anos depois novo processo, nomeadamente um processo tutelar cível ou de promoção e proteção, estando aquele ou aqueles já arquivados, o tribunal e juiz que o decidiu, ainda que estejam findos, continua a manter a sua competência material para todos estes processos (pressupondo que continua a manter competência material para o efeito).
2) A circunstância de a anterior ação se encontrar finda, não afasta a dita conexão, sendo certo que a lei não faz depender a sua operatividade do estado do processo e, designadamente, de a primeira ação se encontrar pendente ou ter findado”.
Por outro lado, conforme sublinha o Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 1, “o processo que foi inicialmente instaurado, foi o processo de promoção e protecção que correu termos no 4.º Juízo, sendo que os pais são os mesmos, e as duas crianças mais velhas, AA e BB, são também as mesmas, sendo que à data em que o processo de promoção e protecção foi instaurado, em 2017, ainda só existiam 2 filhos, uma vez que filha mais nova, CC, nasceu em 2019, razão pela qual não foi abrangida pelo referido processo”.
Assim, conforme decorre também da consideração do regime resultante do artigo 11.º, n.º 4, do RGPTC, inexistia obstáculo a que fosse determinada a apensação do processo de regulação das responsabilidades parentais, ao processo de promoção e proteção anteriormente instaurado e que correu termos relativamente às crianças que – à data – careciam de proteção.
Do exposto, verifica-se que, à data em que foi instaurado o presente processo de regulação ocorria uma situação de competência por conexão, entre este processo e o que o precedeu.
Como se disse, o regime de competência estabelecido no n.º 1 do artigo 11.º do RGPTC (e a que os artigos 80.º e 81.º da LPCJP também se referem) traduz um regime especial de competência, dito “por conexão”, que sobreleva sobre a competência territorial (cfr. n.º 5 do mencionado artigo 11.º do RGPTC).
Em face deste regime especial de competência “por conexão”, o que releva para efeitos de competência para todas as ações é a data da sua instauração, ou seja, da entrada em tribunal, sendo irrelevantes as modificações de facto que posteriormente ocorram – cfr. artigos 9.º n.ºs 1 e 9 do RGPTC e artigo 81.º, n.º 1, da LPCJP.
Ora, o processo de promoção e proteção instaurado em 2017 determinou a competência por conexão do processo de regulação ulteriormente instaurado, independentemente do seu estado.
A circunstância de a anterior ação se encontrar finda ou arquivada, não afasta a dita conexão, sendo certo que a lei não faz depender a sua operatividade do estado do processo e, designadamente, de a primeira ação se encontrar pendente ou ter findado.
No mais, subscrevem-se inteiramente as considerações tecidas no despacho de 05-03-2025 a respeito da vinculatividade e da interpretação que poderá obter-se do contido no ponto 5.º do Provimento de 14-09-2016, do referido Juízo de Família e Menores, onde se enunciou que: “Nos termos do art.º 11.º, n.º 1, do RGPTC e 81.º da LPCJP, serão efectuadas apensações entre processos tutelares cíveis, de promoção e protecção ou tutelares educativos referentes ao mesmo menor, sem prejuízo do disposto no art.º 37.º da Lei Tutelar Educativa”.
De facto, por um lado, o provimento em questão apenas se pode considerar vinculativo das respetivas subscritoras, estando por demonstrar que algum dos titulares dos tribunais em controvérsia o tenha subscrito.
Mas, independentemente disso, certo é que, não poderá conferir-se ao enunciado em tal ponto 5.º, um sentido divergente ou contrário àquele que resulta dos normativos legais aplicáveis.
Como se refere no despacho de 05-03-2025, a interpretação invocada pelo Juiz 4 “fará com que sempre que nasça uma nova criança de uma mesma família que já tem vários processos a correr termos num Juízo, sejam processos de promoção e protecção, sejam processos tutelares cíveis, que os mesmos sejam distribuídos autonomamente, correndo-se assim o risco de haver diferentes juízes a apreciar separadamente a realidade daquela mesma família, o que nos parece, salvo melhor entendimento, o oposto do pretendido pelo legislador (…)”.
Do exposto resulta que, por força do supra referido regime de conexão especial, constante do artigo 11.º, n.º 1, do RGPTC é competente para a tramitação do presente processo de promoção e proteção, o Juízo de Família e Menores de Cascais – Juiz 4.
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V. Pelo exposto, sem necessidade de mais considerações, decido este conflito, declarando competente para a presente ação, o Juízo de Família e Menores de Loures – Juiz 4.
Sem custas.
Notifique-se (cfr. artigo 113.°, n.° 3, do CPC).
Baixem os autos.

Lisboa, 06-05-2025,
Carlos Castelo Branco.