CONFLITO DE COMPETÊNCIA
COMPETÊNCIA
ACÇÃO EXECUTIVA
EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Sumário

I. A competência para apreciar a execução fundada em sentença condenatória proferida em 1ª instância compete aos juízos de competência especializada de execução da comarca, nos termos do disposto no artigo 85.º, n.ºs. 1 e 2, do CPC.
II. Respeitando a sentença que se pretende executar a processo instaurado na 1.ª instância e, não, nos tribunais superiores, não tem aplicação ao caso, o normativo do artigo 86.º do CPC, que respeita a sentenças proferidas em processos propostos “na Relação ou no Supremo Tribunal de Justiça”.

Texto Integral

Pº 106/25.3T8ALM.L1
6.ª Secção
Conflito de Competência
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I. O Juízo de Execução do Funchal – Juiz 1 suscita a resolução de conflito negativo de competência entre ele próprio e o Juízo de Execução de Almada – Juiz 1, para a tramitação da presente ação executiva para pagamento de quantia certa, com fundamento em que ambos se declararam incompetentes para dele conhecer.
O Juízo de Execução de Almada – Juiz 1 declarou-se incompetente, em razão do território, com fundamento, em síntese, em que, em que, atento o disposto no artigo 89.º, n.º 1, do CPC - tendo o executado sede na área da comarca do Funchal e a exequente sede em Almada - está vedado ao exequente optar pelo lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, por não ter a sua sede na mesma área metropolitana e tendo sido dado à execução um acórdão do STJ de 14-07-2020, aplica-se o disposto no artigo 86.º do CPC, pelo que é sempre a sede do executado a ter em conta.
Por sua vez, o Juízo de Execução do Funchal – Juiz 1 declarou-se incompetente para a tramitação do presente processo, com fundamento, em síntese, no artigo 85.º, n.º 1, do CPC, ao sustentar que o título da execução é a sentença condenatória proferida em primeira instância, e não, o acórdão do STJ, que repristinou a decisão.
O Ministério Público – por promoção de ...-...-2025 – pronunciou-se, nos termos do artigo 112.º, n.º 2, do CPC, no sentido de que “somos de parecer que competente para assegurar a tramitação e e decidir a execução para pagamento de quantia certa instaurada contra o Clube Desportivo Nacional será o Juízo de Execução de Almada –Juiz 1”.
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II. Mostra-se apurado, com pertinência para a resolução do conflito, o seguinte:
1) Em ...-...-2025, Beira Mar Atlético Clube de Almada, com sede em Almada, apresentou em juízo, no Juízo de Execução de Almada, contra Clube Desportivo Nacional, com sede no Funchal, requerimento executivo, para execução de pagamento de quantia certa, indicando como título executivo “Decisão judicial condenatória”, como “Finalidade”, “Execução nos próprios autos”, como “Espécie”, “Exec Sentença próprios autos”, referente ao processo n.º 8891/18.2T8ALM, que correu termos no Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3, e alegando o seguinte:
“1. Por douto acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional em ........2023, já transitado em julgado, foi decidido não conhecer do objecto do recurso interposto pelo Executado, confirmando assim a decisão proferida pelo Venerando Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 14.07.2022, que condenou o Executado a pagar ao Exequente a quantia de € 234.281,60 (duzentos e trinta e quatro mil, duzentos e oitenta e um euros e sessenta cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a data da citação até à data da sentença, que perfazem o valor de € 55.277,62, e à taxa legal desde aquela data até efetivo e integral pagamento, que na presente data perfazem a quantia de € 94.551,88 (cfr. Documentos n.ºs 1 e 2 que aqui se juntam e se dão por inteiramente reproduzidos para todos os legais e devidos efeitos).
2. O Executado é, ainda, devedor do Exequente da quantia de € 6.158,15 (seis mil cento e cinquenta e oito euros e quinze cêntimos) a título de custas de parte, conforme decorre da nota discriminativa e justificativa de custas de parte que foi oportuna e tempestivamente notificada ao aqui Executado. (cfr. Documento n.º 3 que aqui se junta e se dá por inteiramente reproduzido para todos legais e devidos efeitos).
3. O Executado apesar de ter sido notificado da decisão condenatória proferida nos autos, da nota discriminativa e justificativa de custas de parte e ter sido, também, interpelado para pagamento pela Exequente, não pagou os montantes em dívida.
4. Deste modo, o Executado é devedor do Exequente do montante global de €390.269,25 (trezentos e noventa mil duzentos e sessenta e nove euros e vinte e cinco cêntimos).
5. A este valor acrescerão os juros vincendos e custos inerentes à presente execução, nomeadamente, a título de preparos, custas judiciais, honorários e despesas com Agente de Execução.
6. Note-se que a obrigação exequenda é certa, líquida e exigível nos termos do artigo 713.º e ss. do Código de Processo Civil (doravante abreviadamente designado por CPC).
7. A sentença condenatória constitui título executivo nos termos e para os efeitos dos artigos 703.º, n.º 1 alínea a) e 704.º, ambos, do CPC.
NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO, deve a presente execução ser recebida e processada, ordenando-se as diligências necessárias a penhora de todo e qualquer bem do já identificado executado capaz de assegurar a boa cobrança dos valores devidos, nomeadamente, a quantia exequenda em di vida no montante de €390.269,25 (trezentos e noventa mil duzentos e sessenta nove euros e vinte e cinco cêntimos) importância esta a que ainda devera o acrescer os custos extra judiciais e judiciais inerentes a presente execução a ti tulo de preparos, custas
judiciais, honora rios, despesas com Agente de Execução bem como os juros vencidos e vincendos, a taxa legal, que aqui se reclamam até efectivo e integral pagamento.”.
2) Em ...-...-2025, o exequente apresentou requerimento juntando Acórdão proferido pela 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça - em 14-07-2022 -, constando do respetivo dispositivo deste, o seguinte:
“Por todo o exposto, Acordam os Juízes que integram esta 1ª secção e que subscreveram o Acórdão ora reclamado, que o mesmo não padece de qualquer dos vícios invocados, pelo que a reclamação do recorrido CLUBE DESPORTIVO NACIONAL deve ser indeferida, apenas se atendendo no tocante aos lapsos de escrita supra analisados, corrigindo-se o dispositivo nos termos seguintes:
Acordam os Juízes que integram a 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça em julgar a revista procedente, revogando o Acórdão recorrido e repristinando a sentença proferida na 1ª instância, condenando-se o Réu Clube a pagar ao Autor a quantia de € 234.281,60 (duzentos e trinta e quatro mil, duzentos e oitenta e um Euros e sessenta cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a data da citação até à data da
3) Em ...-...-2025, o Juízo de Execução de Almada – Juiz 1 proferiu despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte:
“Por manifesta desnecessidade, não se determina o cumprimento do disposto no art. 3º, n.º 3 do Novo C.P.C. quanto à excepção de incompetência territorial.
(…)
Beira Mar Atlético Clube de Almada, com sede na Praceta 1, veio instaurar contra Clube Desportivo Nacional, com sede na Rua 2, a presente acção executiva para pagamento de quantia certa, apresentando como título executivo um acórdão do STJ (sem mais) datado de 14.07.2022 e pedindo o pagamento da quantia de € 234.281,60 acrescida de juros de mora.
A competência territorial de um tribunal define-se através da observância e aplicação ao caso concreto do preceituado nos arts. 70º e segs. do Novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho (NCPC), configurando uma excepção dilatória que, a verificar-se, obsta ao conhecimento do mérito pelo tribunal em causa e implica a remessa dos autos ao tribunal competente para esse conhecimento (art.ºs 104.º, n.º 3, 576.º, n.º s 1 e 2, 577.º, al. a), todos do NCPC).
Lê-se, no que ao caso em apreço interessa, no art. 89º, n.º 1 do N.C.P.C., que «salvos os casos especiais previstos na lei, é competente para a execução o tribunal do domicílio do executado, podendo o exequente optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, quando o executado seja pessoa colectiva ou quando, situando-se o domicílio do credor na área metropolitana de Lisboa ou Porto, o executado tenha domicílio na mesma área metropolitana».
Concretizando, o Executado tem sede no Funchal (área da Comarca do Funchal), e a exequente tem sede em Almada (área da Comarca de Lisboa – Juízo de Execução de Almada). Está, assim, vedado ao Exequente optar pelo tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida, pois que o executado não tem a sua sede na mesma área metropolitana. Aliás, face ao título dado à execução desconhece-se em que lugar foi convencionado que a obrigação devia ser cumprida.
Por outro lado, tendo sido dado à execução um acórdão do STJ aplica-se o disposto no artº 86º do NCPC, pelo que é sempre a sede do executado a ter em conta.
Por conseguinte, este Juízo de Execução de Almada é incompetente em razão do território, sendo tal incompetência de conhecimento oficioso.
Com efeito, o artigo 104º, nº 1 alínea a) do Novo Código de Processo Civil, estipula, no que para o caso em apreço releva, que a incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal nas causas a que se refere a primeira parte do n.º 1 do artigo 89º.
Assim, de acordo com o preceituado no Regulamento da Lei de Organização do Sistema Judiciário, conclui-se que é territorialmente competente para tramitar a presente execução o tribunal da residência da executada, isto é, o Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízo de Execução do Funchal.
Pelo exposto, nos termos das citadas disposições legais, conhecendo oficiosamente da incompetência territorial, declaro este Juízo de Execução de Almada incompetente, em razão do território, para a tramitação e decisão deste processo e determino que, após trânsito em julgado, se remetam estes autos ao tribunal competente, o Juízo de Execução do Funchal (…)”.
4) Remetidos os autos, em ...-...-2025, o Juízo de Execução do Funchal – Juiz 1 proferiu despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte:
“Compulsados os autos constata-se que os presentes autos de execução para pagamento de quantia certa fundada em sentença proferida no processo n.º 8891/18.2T8ALM, que correu termos no Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3, da Comarca de Lisboa.
Na verdade, o Juízo de Execução de Almada pediu informação sobre o trânsito em julgado da sentença dada à execução, tendo aquele Juízo Central Cível de Almada a prestado a ........2025.
Daí que o processo declarativo tenha assumido as letras ALM próprias de Almada e não as de Lisboa, como seria o caso de a ação ter sido instaurada no Tribunal da Relação de Lisboa ou no Supremo Tribunal de Justiça.
Mais se constata que a presente execução não foi instaurada diretamente no juízo de execução.
Em obediência ao estipulado no artigo 85.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a execução foi apresentada no próprio processo declarativo, ou seja, no processo n.º 8891/18.2T8ALM, no próprio Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3 — cf. requerimento executivo.
A regra em matéria de execuções de sentença é que a competência cabe ao próprio Tribunal onde correu termos o processo declarativo. Ainda que, porventura, a primeira instância tenha absolvido o réu do pedido e o Tribunal da Relação e/ou o Supremo Tribunal de Justiça revoguem a sentença absolutória e condenem o réu na obrigação que se executa.
Todavia, se houver juízo especializado em execuções na comarca, o Tribunal onde correu o processo declarativo remete àquele cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham — artigo 85.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
Tal foi o que sucedeu nos autos, embora de forma lacunar.
Id est, o tribunal onde foi proferido o título executivo limitou-se a juntar o Acórdão do STJ que incidiu sobre o pedido de retificação do acórdão do STJ que revogou o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa e repristinou a sentença de condenação da primeira instância.
Falta, pois, juntar o acórdão do STJ de 21.04.2022 que foi objeto do pedido de retificação, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de ........2021 e a sentença da primeira instância.
Assim, oficie o processo n.º 8891/18.2T8ALM, Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3, para que junte certidão dos seguintes atos aí praticados:
a) acórdão do STJ de 21.04.2022;
b) acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de ........2021;
c) a sentença da primeira instância (…)”.
5) Em ...-...-2025, a referida certidão foi junta aos autos.
6) Em ...-...-2025, o Juízo de Execução do Funchal – Juiz 1 proferiu despacho onde se lê, nomeadamente, o seguinte:
“(…) Por requerimento executivo de ........2024, Beira Mar Atlético Clube de Almada instaurou execução para pagamento de quantia certa contra Clube Desportivo Nacional com fundamento em sentença condenatória proferida no âmbito do processo n.º 8891/18.2T8ALM, no Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3 — cf. requerimento executivo que aqui se dá por integralmente reproduzido.
Em obediência ao estipulado no artigo 85.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a execução foi apresentada no próprio processo declarativo, ou seja, no processo n.º 8891/18.2T8ALM, no Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3.
Tendo o Juízo de Execução de Almada pedido informação sobre o trânsito em julgado da sentença dada à execução ao mencionado Juízo Central Cível de Almada e não ao Supremo Tribunal de Justiça. Informação que aquele prestou a ........2025.
A sentença dada à execução foi proferida no âmbito de processo instaurado no Juízo Central Cível de Almada, daí que tenha assumido as letras ALM próprias de Almada e não as de Lisboa, como sucederia se o processo declarativo tivesse sido instaurado diretamente em Tribunal Superior, como seria o caso de a ação ter sido instaurada no Tribunal da Relação de Lisboa ou no Supremo Tribunal de Justiça.
Na verdade, foi proferida sentença condenatória do ora executado, com conclusão de ........2020, pelo Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3 — cf. título executivo cuja certidão foi junta a ........2025.
Dessa sentença foi interposto recurso que culminou na prolação do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de ........2021 — cf. título executivo cuja certidão foi junta a ........2025.
Desse acórdão foi interposto recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça que viria a repristinar a sentença da primeira instância proferida pelo Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3 — cf. título executivo cuja certidão foi junta a ........2025.
Esse acórdão foi objeto de requerimento de invocação de nulidades que foi objeto de indeferimento, apenas tendo sido atendidos lapsos de escrita — cf. título executivo cuja certidão foi junta a ........2025.
O processo declarativo ao remeter os autos para o juízo especializado de execuções de Almada, somente fez constar do processo este último aresto do Supremo Tribunal de Justiça que decide sobre as invocadas nulidades do aresto por si anteriormente proferido. Todavia, do relatório e do dispositivo é patente que o processo declarativo não deu início no Supremo Tribunal de Justiça, mas antes no Juízo Central Cível de Almada, sendo o aresto daquele o culminar dos recursos que foram sendo interpostos da decisão da primeira instância até ao seu trânsito em julgado. Decisão que se executa.
Mais, é patente que a sentença que se executa foi proferida num processo que se iniciou na primeira instância por o requerimento executivo ter sido instaurado nesse processo e nesse tribunal e o próprio juízo de execuções ter pedido informação sobre o trânsito em julgado a esse tribunal e não ao Tribunal Superior.
Estabelece o artigo 86.º do Código de Processo Civil:
«Se a ação tiver sido proposta na Relação ou no Supremo Tribunal de Justiça, é competente para a execução o tribunal do domicílio do executado, salvo o caso especial do artigo 84.º; em qualquer caso, baixa o traslado ou o processo declarativo ao tribunal competente para a execução.», destaque nosso.
Daqui resulta que a regra da competência para execução de sentença vertida no artigo 85.º somente não tem aplicação se se tratar de sentença proferida por Tribunal Superior que funciona como primeira instância. Isto é, tendo a ação sido proposta ab initio num Tribunal Superior, não tendo este competência de execução, a lei teve necessidade de prever uma regra para essas situações. Decisão proferida em recurso não equivale evidentemente a ação proposta no Tribunal Superior, daí que o próprio recurso seja interposto no tribunal a quo e somente após sobe para o Tribunal ad quem.
Ora, no caso, a sentença dada à execução foi proferida na sequência de ação declarativa proposta em tribunal da 1.ª instância — o Juízo Central Cível de Almada.
Donde, deveria a execução deveria ter sido — como de resto o foi — instaurada no processo declarativo junto do Tribunal da 1.ª instância onde a ação teve início (artigo 85.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) e, seguidamente, como ocorreu, sido remetida para o Juízo com competência especializada em execuções — o Juízo de Execuções de Almada (artigo 85.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Todavia, por sentença de ........2025, que aqui se dá por integralmente reproduzida, considerou-se que o Tribunal competente para a execução da sentença dada à execução seria o Tribunal do domicílio do executado por se aplicar o artigo 86.º do Código de Processo Civil, na medida em que se executa um acórdão do STJ.
Salvo o devido respeito, essa sentença não tem em conta que o aresto que se executa repristinou sentença da primeira instância e que o citado preceito do artigo 86.º circunscreve-se a decisões proferidas por tribunal superior como 1.ª instância, ou seja, em que a ação tenha sido ab initio aí proposta e não resulte da interposição dum recurso.
No fundo, existe documento — o próprio aresto que indeferiu as nulidades e cujo teor é claro no sentido de haver uma sentença de 1.ª instância que se repristina — que implica por si só decisão diversa [artigo 616.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil].
Face ao exposto, nos termos do disposto no artigo 85.º do Código de Processo Civil, estando em causa a execução de sentença cujo processo foi proposto no Juízo Central Cível de Almada, julga-se o presente Tribunal incompetente para conhecer desta execução, sendo o Tribunal competente o Juízo de Execução de Almada — Juiz 1.
Notifique, incluindo o Ministério Público.
(…)
Ao abrigo do disposto no artigo 111.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, suscito o conflito de competência junto do Venerando Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa.
(…)
Notifique, sendo as partes para, querendo, em 5 dias, se pronunciarem (artigo 112.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
Logo após, abra vista ao Ministério Público (artigo 112.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Findos estes prazos, abra conclusão para ordenar a subida dos autos, em consonância com o supra exposto (…)”.
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III. Nos termos do n.º 2 do artigo 109.º do CPC, há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão.
Não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência (cfr. artigo 109.º, n.º 3, do CPC).
Quando o tribunal se aperceba do conflito, deve suscitar oficiosamente a sua resolução junto do presidente do tribunal competente para decidir (cfr. artigo 111.º, n.º 1, do CPC).
Entendem ambos os tribunais, não serem competentes em razão do território, para dirimir o presente processo executivo.
A aferição do pressuposto processual da competência é determinada à luz da estrutura do objeto do processo, envolvida pela causa de pedir e pelo pedido formulado na petição inicial, no momento em que a mesma é intentada (vd., entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20-02-2019, Pº 9086/18.0T8LSB-A.L1.S1, rel. RIBEIRO CARDOSO, de 07-03-2019, Pº 13688/16.1TBPRT.P1.S1, rel. FERNANDO SAMÕES e do TRL de 01-07-1993, in C.J., t. 3, p. 144, de 26-05-1999, Pº 0023414, rel. PEREIRA RODRIGUES e de 10-04-2024, Pº 31189/22.7T8LSB-A.L1-4, rel. SÉRGIO ALMEIDA e Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 18-11-2021, Pº 1475/09.8TBPRD-N.P1, rel. ANA VIEIRA).
Conforme salienta AA (A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004, pp. 507-508): “Para efeitos de competência, a causa de pedir deve ser identificada com os factos jurídicos alegados pelo autor que, analisados na lógica jurídica da petição inicial, permitam a aplicação de uma norma de competência. Isto significa que a estrutura de causalidade entre causa de pedir e pedido que o autor estabelece na petição inicial, ou no conjunto dos seus articulados, é suficiente, é o contexto, o enquadramento da relação jurídica alegada e, em consequência, da aplicação das normas de competência”.
De acordo com o disposto no artigo 37.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário (abreviadamente LOSJ, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de ...) na ordem jurídica interna, a competência reparte-se pelos tribunais judiciais segundo a matéria, o valor, a hierarquia e o território (n.º 1).
O CPC ocupa-se de cada um desses fatores de determinação da competência na ordem jurídica interna, nos artigos 64.º e ss.
Em matéria de competência territorial enuncia-se no artigo 80.º, n.º 1, do CPC, a regra geral: “Em todos os casos não previstos nos artigos anteriores ou em disposições especiais é competente para a ação o tribunal do domicílio do réu”.
Para além desta regra geral, a lei processual civil enuncia diversos critérios especiais de determinação da competência do tribunal em razão do território, expressas, nomeadamente, nos artigos 70.º e ss. do CPC.
No artigo 85.º e ss. do CPC estabelecem-se disposições especiais relativamente a execuções.
Estabelece o n,º 1 do artigo 85.º do CPC – com a epígrafe “Competência para a execução fundada em sentença” – o seguinte:
“1 - Na execução de decisão proferida por tribunais portugueses, o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, exceto quando o processo tenha entretanto subido em recurso, casos em que corre no traslado”.
Em anotação a este normativo, referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3.ª ed., Almedina, ..., p. 121) que: ”A execução fundada em sentença (…) é tramitada, ainda que de forma autónoma, nos autos de ação declarativa (art. 626.º). Nos casos em que, de acordo com a LOSJ, a competência para a execução seja atribuída a um tribunal diverso daquele que proferiu a sentença (juízo especializado de execução), exigindo-se, embora, que o impulso processual ocorra nos autos declarativos (RG ...-...-17, 196/16), a lei determina que se extraia cópia da sentença, do requerimento executivo e dos eventuais documentos que o acompanham, sendo o processo de execução autuado com base nesse expediente (RE ...-...-20, 2176/16)”.
Assim, “face ao disposto no artigo 85º do C.P.C., o requerimento inicial para execução de decisão judicial condenatória deve ser dirigido ao processo no qual foi proferida a sentença exequenda. De seguida, ao tribunal em que a ação declarativa foi julgada cabe dar cumprimento ao disposto no nº 2 do artigo 85º do C.P.C.” (cfr., o citado Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-03-2018, Pº 121/14.2TBAMT.P1, rel. AUGUSTO DE CARVALHO), ou seja, quando, nos termos da lei de organização judiciária seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com caráter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham.
Por sua vez, dispõe o artigo 86.º do CPC – com a epígrafe “Execução de sentença proferida por tribunais superiores” – que:
“Se a ação tiver sido proposta na Relação ou no Supremo Tribunal de Justiça, é competente para a execução o tribunal do domicílio do executado, salvo o caso especial do artigo 84.º; em qualquer caso, baixa o traslado ou o processo declarativo ao tribunal competente para a execução”.
Importa ainda referir que a incompetência em razão do território deve ser conhecida oficiosamente pelo tribunal, sempre que os autos fornecerem os elementos necessários, nos casos enunciados n.º 1 do artigo 104.º do CPC, a saber:
a) Nas causas a que se referem o artigo 70.º do CPC, a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 71.º do CPC, os artigos 78.º, 83.º e 84.º, o n.º 1 do artigo 85.º e a primeira parte do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 89.º do mesmo Código;
b) Nos processos cuja decisão não seja precedida de citação do requerido;
c) Nas causas que, por lei, devam correr como dependência de outro processo.
O juiz deve suscitar e decidir a questão da incompetência até ao despacho saneador, podendo a decisão ser incluída neste sempre que o tribunal se julgue competente; não havendo lugar a saneador, pode a questão ser suscitada até à prolação do primeiro despacho subsequente ao termo dos articulados (cfr. artigo 104.º, n.º 3, do CPC).
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IV. No caso em apreço, o exequente instaurou a presente ação executiva contra o executado, com fundamento em sentença condenatória proferida no processo n.º 8891/18.2T8ALM, que correu termos no Juízo Central Cível de Almada - Juiz 3.
Tal sentença foi objeto de recurso de apelação, que deu origem ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de ...-...-2021.
Deste acórdão foi interposto recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual decidiu repristinar a sentença da primeira instância, encontrando-se a decisão transitada (cfr. certidão junta aos autos em ...-...-2025).
A execução para pagamento de quantia certa, fundada na dita sentença condenatória, foi instaurada no processo declarativo que correu termos no tribunal da 1.ª instância, em conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 85.º do CPC, tendo sido de seguida, nos termos consignados no n.º 2 do mesmo preceito legal, remetida para o Juízo com competência especializada em execuções, o Juízo de Execução de Almada.
Ora, considerando o exposto, verifica-se que a sentença que se pretende executar respeita a processo instaurado na 1.ª instância e, não, nos tribunais superiores. Por este motivo, não tem qualquer aplicação ao caso, o normativo do artigo 86.º do CPC, que respeita a sentenças proferidas em processos propostos “na Relação ou no Supremo Tribunal de Justiça”.
E, assim, têm inteira pertinência as considerações tecidas pelo Ministério Público na pronúncia apresentada nos presentes autos, as quais se subscrevem inteiramente, pelo seu acerto e que se transcrevem:
“Em face do contexto acabado de expor, verifica-se que a decisão do Juízo de Execução de Almada – Juiz 1 assentou num pressuposto incorreto relacionado com o título dado à execução, pois não se trata do acórdão do STJ, como defende, mas sim da sentença condenatória proferida na ação declarativa n.º 8891/18.2T8ALM, da competência do Juízo Central Cível de Almada – Juiz 3, repristinada por força daquele acórdão, conforme entendimento sustentado pelo Juízo de Execução do Funchal –Juiz 1.
Perante o exposto, a resolução do conflito deve atender ao disposto no artigo 85.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, segundo o qual a competência para apreciar a execução fundada em sentença condenatória proferida em 1ª instância compete aos juízos de competência especializada de execução da comarca (…)”.
Assim, o conflito verificado deverá resolver-se considerando competente para a tramitação da presente ação, o Juízo de Execução de Almada – Juiz 1, o competente para a execução da decisão proferida pelo Juízo Central Cível de Almada – Juiz 3, que proferiu a decisão a executar.
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V. Pelo exposto, sem necessidade de mais considerações, decido este conflito, declarando competente para a tramitação da presente ação, o Juízo de Execução de Almada – Juiz 1.
Sem custas.
Notifique-se (cfr. artigo 113.º, n.º 3, do CPC).
Baixem os autos.

Lisboa, 07-07-2025,
Carlos Castelo Branco.