CRIME DE ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS
CRIME DE ABUSO SEXUAL DE MENORES DEPENDENTES
ACTO SEXUAL DE RELEVO
Sumário


I - O conceito de “acto sexual de relevo” tem suscitado alguma polémica na jurisprudência e doutrina onde se têm vindo a desenhar três posições: a objectivista, a subjectivista e a mista.
II - Para a primeira das referidas posições por acto sexual deve entender-se o comportamento que, de um ponto de vista predominantemente objectivo, assume uma natureza, um conteúdo ou um significado directamente relacionados com a esfera da sexualidade e, por conseguinte, com a liberdade de determinação sexual de quem o sofre ou de quem o pratica.
III - Já a segunda posição defende que à referida conotação objectiva deve acrescer uma outra subjectiva, traduzida na intenção do agente de despertar ou satisfazer, em si ou em outrem, a excitação sexual, correspondente à designada intenção libidinosa.
IV - Por fim, de acordo com a terceira posição, o conceito tanto poderá ser integrado pela sua acepção objectiva, como subjectiva.
V - Em nosso entendimento, tal como defende Figueiredo Dias, deve dar-se prevalência à interpretação objectivista do conceito, considerando-se, por conseguinte, irrelevante o motivo da actuação do agente.
VI - Como refere Figueiredo Dias, ao exigir que o acto sexual seja de relevo a lei impõe ao intérprete que afaste da tipicidade não apenas os actos insignificantes ou bagatelares (função negativa), mas que investigue do seu relevo na perspectiva do bem jurídico protegido (função positiva), isto é, que determine – ainda aqui de um ponto de vista objectivo – se o acto representa um entrave com importância para a liberdade de determinação sexual da vítima.

Texto Integral


Acordam na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

1. No processo comum colectivo n.º 570/23.5JAVRL, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança – Juízo Central Cível e Criminal de Bragança – Juiz ..., realizado o julgamento, foi proferido acórdão em 31-03-2025, depositado em 01-04-2025, com o dispositivo seguinte:
«Pelo exposto, decide o Tribunal Colectivo:
a. Absolver o Arguido AA da prática de 5 (cinco) crimes de Abuso Sexual de Crianças, previsto e punido pelo artigo 171.º, nºs 1 e 2 do Código Penal;
b. Absolver o Arguido AA da prática de 4 (quatro) crimes de Importunação Sexual, previsto e punido pelo artigo 170.º do Código Penal (quatro dos quais por estarem numa relação de concurso aparente com o crime de Abuso sexual de menores dependentes que o consome);
c. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 3), 4), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) do mesmo código, na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de BB;
d. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 5), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) do mesmo código, na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de CC;
e. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 6) a 7), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a), na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, na pessoa de CC;
f. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 18), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea b), na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, na pessoa de DD;
g. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 21), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a), na pena de 6 meses de prisão, na pessoa de EE;
h. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 13) 15), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alíneas a) e b), na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de FF;
i. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 8), 9), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea b) do Código Penal, na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de GG;
j. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 11), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) do Código Penal, na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, na pessoa de GG;
k. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 19), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de crianças previsto no artigo 171.º, n.º 3, alínea a) por referência ao artigo 170.º do Código Penal, na pena de 1 anos e 2 meses de prisão, na pessoa de HH;
l. Em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas em c) a k) condenar o Arguido AA na pena única de 3 anos e 9 meses de prisão;
m. Suspender a pena única de prisão aplicada ao Arguido AA pelo prazo de cinco anos – artigo 50.º, n.ºs 1 e 5 do Código Penal - com sujeição à obrigação de pagamento da indemnização referida em n) no prazo da suspensão da pena– artigo 50.º, n.ºs 1, 2 e 5, 51.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal.
n. Condenar o Arguido AA a pagar, os montantes infra, acrescidos de juros de mora à taxa anual de 4%, contados desde a prolação da presente sentença, até efectivo e integral pagamento (cf. artigos 559.º, 805.º e 806.º do Código Civil e Portaria n.º 291/03, de 08/04) a título de reparação pelos danos causados oficiosamente arbitrada à vítima:
BB, no valor de 1.250,00€ (mil duzentos e cinquenta euros);
ii. CC, no valor de 1.250,00€ (mil duzentos e cinquenta euros);
iii. DD, no valor de 1.000,00€ (mil euros);
iv. EE, no valor de 1.400,00€ (mil e quatrocentos euros);
v. FF, no valor de 1.000,00€ (mil euros);
vi. GG, no valor de 1.250,00€ (mil duzentos e cinquenta euros);
vii. HH, o valor de 2.000,00€ (dois mil euros).
o. Condenar o Arguido AA na pena acessória proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual, previsto e punido pelo artigo 69.º B, n.º 2 do Código Penal, pelo período de 5 anos;
p. Determinar a recolha de uma amostra de ADN ao Arguido AA, para integrar a base de dados de perfis de ADN para fins de identificação civil e criminal;
q. Condenar o Arguido AA no pagamento das custas do processo, fixando a taxa de justiça em 3 (três) UC - artigos 513.º e 514.º do Código Processo Penal e artigo 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa àquele Regulamento.

*
-Estatuto Processual do Arguido-
Proferida decisão que conheceu a final do objecto do processo, constata-se que deixou de se verificar o perigo de perturbação do decurso de inquérito e o perigo para aquisição de prova.
Mais, em face da sanção supra aplicada, e considerando que neste momento o Arguido não se encontra a laborar em estabelecimento de ensino, desnecessário se torna acautelar a eventual proximidade do Arguido com as vítimas, nestes autos, e mostra-se mitigada, por ora, o perigo de continuação da actividade criminosa.
Em face do exposto, revendo-se as medidas de coacção impostas afigura-se adequado, necessário e proporcional, para além do Termo de identidade e residência:
- Manter Obrigação de apresentações periódicas, no posto policial da sua área de residência, reduzindo-a de duas vezes por semana, a uma vez a cada 15 dias, nos moldes em que vier a ser indicado pelo OPC competente, até às 18h00 dos dias que vierem a ser indicados;
- Manter a suspensão das funções que exerce na Escola Profissional ... – EMP01..., sita em ..., designadamente de assistente operacional e, ainda, bem como do exercício da actividade de juiz-árbitro em competições de natação em que participem crianças e jovens.
Notifique.
Comunique ao OPC competente.
Dn.
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De imediato:
-Proceda-se ao depósito da presente Sentença na secretaria do Tribunal, conforme disposto nos artigos 372.º, n.º 5 e 373.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal.
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Após trânsito do presente acórdão:
- Remeta-se boletim ao D.S.I.C. (artigo 5.º, n.º 1 e artigo 6.º e 7.º da Lei n.º 37/2015, de 05 de Maio e artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 171/2015, de 25 de Agosto).
- Dê conhecimento aos legais representantes das menores de idade, ora Ofendidas, notificando-os que devem no prazo de 20 dias, juntar aos autos comprovativo de IBAN em nome daquelas. Posteriormente, vindo os comprovativos referidos dê conhecimento ao Arguido e Ilustre Defensor para os efeitos pertinentes.
- Dn. no que tange a recolha de ADN.»
2. Inconformados com a decisão, recorreram o Ministério Público e o arguido AA, retirando das suas motivações as seguintes conclusões:
2.1. Recurso interposto pelo Ministério Público (transcrição):
«1. Versa o presente recurso sobre o Acórdão proferido a 31-03-2025 com a referência ...62, depositado a 01-04-2025, no qual, entre o mais, se decidiu:
«a. Absolver o Arguido AA da prática de 5 (cinco) crimes de Abuso Sexual de Crianças, previsto e punido pelo artigo 171.º, nºs 1 e 2 do Código Penal;
b. Absolver o Arguido AA da prática de 4 (quatro) crimes de Importunação Sexual, previsto e punido pelo artigo 170.º do Código Penal (quatro dos quais por estarem numa relação de concurso aparente com o crime de Abuso sexual de menores dependentes que o consome);
c. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 3), 4), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) do mesmo código, na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de BB;
d. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 5), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) do mesmo código, na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de CC;
e. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 6) a 7), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a), na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, na pessoa de CC;
f. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 18), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea b), na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, na pessoa de DD;
g. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 21), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a), na pena de 6 meses de prisão, na pessoa de EE;
h. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 13) 15), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alíneas a) e b), na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de FF;
i. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 8), 9), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea b) do Código Penal, na pena de 6 meses de prisão, cada um, na pessoa de GG;
j. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 11), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) do Código Penal, na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, na pessoa de GG;
k. Condenar o Arguido AA por reporte aos factos provados 19), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de crianças previsto no artigo 171.º, n.º 3, alínea a) por referência ao artigo 170.º do Código Penal, na pena de 1 anos e 2 meses de prisão, na pessoa de HH;
l. Em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas em c) a k) condenar o Arguido AA na pena única de 3 anos e 9 meses de prisão; (...)»
2. Perscrutado o Acórdão recorrido, verificamos que o Tribunal a quo julgou provado, em 16) que «Nas circunstâncias de modo mencionadas em 2), em data não apurada mas após Maio de 2023, pelo menos duas vezes, quando a vítima II se encontrava no corredor de acesso às salas de aula do ... piso, o Arguido abeirou-se dela, deslizou a mão para cima e para baixo na lateral superior de uma das coxas de II.»; todavia, julgou não provado, em i), que «Ao actuar da forma acima descrita em 10), 12) 14), 16), 17) 20) dos factos provados e h) dos não provados, o Arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal e que por isso incorria em responsabilidade criminal.», fundamentando, em apertada síntese, no sentido de que «a factualidade em análise, por si só, carece de idoneidade para, entre outros, se considerar que o Arguido representou ou apresentou a Jovem como envolvida em comportamento sexual explicito, logo a conduta dada como provada carece de autonomia e adequação para prejudicar o livre e harmonioso desenvolvimento da personalidade da Ofendida Menor de Idade na esfera sexual.», julgando, em consequência, absolver, nesta parte, o arguido.
3. Analisando atentamente a factualidade assente, não podemos concordar com a douta fundamentação que vimos de transcrever e, bem assim, com a conclusão daí extraída, no sentido de que os factos em apreciação não integram a prática de ilícito criminal.
4. Importa ter presente que a incriminação prevista no artigo 171.º, do Código Penal, e demais crimes contra a autodeterminação sexual de crianças, pretende, conforme reconheceu o Tribunal a quo, proteger a liberdade e autodeterminação sexual do menor face a condutas de natureza sexual que, em consideração da pouca idade da vítima, podem, mesmo sem coacção, prejudicar gravemente o livre desenvolvimento da sua personalidade.
5. A doutrina e a jurisprudência têm cuidado de densificar o conceito de acto sexual de relevo ali previsto.
6. Nesta senda, Paulo Pinto de Albuquerque, de forma clara e inequívoca, entende que «o ato sexual de relevo inclui a cópula vulvar e o toque, com objetos ou partes do corpo, nos órgãos genitais, seios, nádegas, coxas e boca» (cf. Comentário do Código Penal à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, UCP Editora, 2024, p. 749).
7. No mesmo sentido, M. Miguez Garcia defende que o acto sexual de relevo compreende «excitação sexual do clitóris, masturbação do pénis, passar as mãos pelas coxas, seios ou órgãos genitais», ao passo que o acto sexual de relevo qualificado integra «cópula, coito anal e coito oral, introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos, sendo irrelevante a sua natureza hétero ou homossexual, levado a efeito com violência (coação e violação: artigos 163º/1 e 164º/1); abuso (artigos 165º/2, 166º/2; 171º/2 e 172º/1); fraude (artigo 167º/2); aproveitamento da idade (artigos 173º/2; e 174º/2)» (cf. Código Penal, Parte geral e especial, Coimbra Editora, 2018, p. 777).
8. Na mesma linha, tem entendido a jurisprudência dos tribunais superiores que «I - É acto sexual de relevo todo o que tenha uma natureza objectiva estritamente relacionada com a actividade sexual, ou seja, que normalmente apenas seja praticado no domínio da sexualidade entre pessoas. II - Manifestamente, circunscrevem-se nesse domínio os casos traduzidos em acariciar/apalpar nádegas e a parte interior das coxas, actos preliminares do acto sexual final que conduz ao orgasmo.» (cf. Ac. TRC de 05-06-2013, R. JJ); «Toques nas pernas, beliscões nas nádegas, apalpões nas coxas e, ainda que de raspão, o dedo sobre a zona vaginal da menor integram o conceito de ato sexual de relevo.» (cf. Ac. TRP de 28-11-2012, R. KK).
9. Numa palavra, «importa ter presente que o acto sexual de relevo é todo o comportamento que, de um ponto de vista predominantemente objectivo, assume uma natureza, um conteúdo ou um significado directamente relacionados com a esfera da sexualidade (Ob. cit., p. 447). Estão aqui em causa a cópula vulvar e o toque, com objectos e partes do corpo, nos órgãos genitais, seios, nádegas, coxas e boca das crianças abusadas.» (cf. Ac. STJ de 12-01-2022, R. LL).
10. Assim, acto sexual de relevo será todo aquele comportamento que de um ponto de vista essencialmente objectivo pode ser reconhecido por um observador comum como possuindo carácter sexual e que em face da espécie, intensidade ou duração é susceptível de ofender gravemente a liberdade sexual da vítima, compreendendo, nomeadamente, qualquer toque nos órgãos genitais, seios, nádegas, coxas e boca.
11. Isto posto, afigura-se-nos evidente que deslizar a mão para cima e para baixo na lateral superior da coxa, nas circunstâncias apuradas no caso, integra o conceito de acto sexual de relevo.
12. O que não podemos admitir é que se conclua, como concluiu o Tribunal a quo, que aquela conduta, nas circunstâncias em que foi levada a cabo, possa «a um observador incauto parecer um gesto de afeição», pois que não se nos suscitam quaisquer dúvidas de que ao actuar do modo descrito, nas concretas circunstâncias em que se apurou que actuava sobre a ofendida, o arguido agiu de forma livre, deliberada e conscientemente, com o intuito de assim satisfazer os seus instintos sexuais, propósito que foi renovando, durante o período em que foi concretizando os actos supra referidos, aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com a aluna por força das relações que tinha com ela em virtude das funções que exercia na escola que ela frequentava.
13. Assim, cremos nós que dando por provado que «(...) o Arguido abeirou-se dela, deslizou a mão para cima e para baixo na lateral superior de uma das coxas de II», necessariamente teria o Tribunal a quo de ter julgado igualmente provado que agiu «livre, deliberada e conscientemente, com o intuito de assim satisfazer os seus instintos sexuais, propósito que foi renovando, durante o período em que foi concretizando os actos supra-referidos, aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com a aluna II por força das relações que tinha com elas em virtude das funções que exercia na escola que ela frequentava» e que «Ao actuar da forma acima descrita em 16) dos factos provados e h) dos não provados, o Arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal e que por isso incorria em responsabilidade criminal».
14. E, em consequência disso, necessariamente concluiria pela verificação dos elementos objectivos e subjectivos do tipo do crime de abuso sexual de menor dependente, p. e p. pelo artigo 172.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 1, do mesmo código (ou, caso assim não se entendesse, pelo menos, do crime de actos sexuais com adolescentes, previsto e punido pelo artigo 173.º, n.º 1, do Código Penal).
15. Em o não fazendo, e ao decidir no sentido exposto, o Tribunal incorreu em erro notório na apreciação da prova, nos termos previstos no artigo 410.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal, relativamente à apreciação e valoração da prova produzida, não logrando completar devidamente o silogismo judiciário, isto é, retirar das normas gerais e abstractas pertinentes o preceito-jurídico concreto apto a regular com acerto a questão.
16. Para além disso, mostrando-se provado que o arguido deslizou a sua mão pela coxa da ofendida – que tinha, à data, 14 anos de idade e se encontrava na escola, à sua guarda e responsabilidade –, necessariamente se conclui encontrar-se em contradição a matéria assente em 16) com a factualidade julgada não provada em i) e a correspondente fundamentação.
17. Com efeito, o Tribunal a quo julgou provado, no facto 16), que «(...) o Arguido abeirou-se dela, deslizou a mão para cima e para baixo na lateral superior de uma das coxas de II», ao mesmo tempo que julgou não provado, em i), que «Ao actuar da forma acima descrita em 16) dos factos provados (...) o Arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal e que por isso incorria em responsabilidade criminal», entendendo, pois, que «a factualidade em análise, por si só, carece de idoneidade para, entre outros, se considerar que o Arguido representou ou apresentou a Jovem como envolvida em comportamento sexual explicito, logo a conduta dada como provada carece de autonomia e adequação para prejudicar o livre e harmonioso desenvolvimento da personalidade da Ofendida Menor de Idade na esfera sexual.»
18. Pelo exposto, entendemos existir contradição insanável entre a fundamentação e a decisão e mesmo entre os factos provados e não provados, nos termos previstos no artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Penal, não só entre factos provados e não provados (facto provado 16) e facto não provado i)) como entre factos dados como assentes e a própria fundamentação da convicção do Tribunal.
19. Deve, por isso, o vício ora apontado ser sanado, aditando-se à factualidade provada que «o Arguido actuou como descrito em 16), livre, deliberada e conscientemente, com o intuito de assim satisfazer os seus instintos sexuais, propósito que foi renovando, durante o período em que foi concretizando os actos supra-referidos, aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com a aluna II por força das relações que tinha com ela em virtude das funções que exercia na escola que ela frequentava» e que «Ao actuar da forma acima descrita em 16), o Arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal e que por isso incorria em responsabilidade criminal.».
20. Por conseguinte, e por tudo quanto já se expôs, mostrando-se preenchidos os pressupostos objectivos e subjectivos do tipo, deverá o arguido ser condenado pela prática de dois crimes de abuso sexual de menor dependente, previsto no artigo 172.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 1, do mesmo código, na pessoa de II, aplicando-se-lhe, em consequência, pena adequada às exigências do caso, ou, caso assim se não entenda, deve, pelo menos, o arguido ser condenado pela prática de dois crimes de actos sexuais com adolescente, previsto e punido pelo artigo 173.º, n.º 1, do Código Penal, na pessoa de II.
Por outro lado,
21. Atentando à factualidade julgada provada em 3), 4), 5), 6), 11), 19), 22), 23 e 24), (na qual se deu por provado que o arguido «deu uma palmada nas nádegas», «voltou a dar-lhe uma palmada nas nádegas», «desferiu uma palmada nas nádegas», «colocou-lhe a mão no ombro e foi deslizando em direcção ao peito», «colocou-lhe a mão na cintura e deslizou-a em direcção às nádegas» e «deu uma palmada nas nádegas»), concluímos que em todas as citadas circunstâncias o arguido sujeitou as vítimas a um contacto típico da intimidade sexual, tocando-lhes com as mãos em partes do corpo inequivocamente erógenas que compreendem, nomeadamente, as nádegas e o peito, idóneo, naquelas concretas circunstâncias, a afectar de forma grave e séria o desenvolvimento sexual de uma criança ou jovem de 14 anos.
22. Assim, fazendo novo apelo à mais considerada doutrina e jurisprudência, já citadas, entendemos que a circunstância de dar uma palmada nas nádegas, colocar a mão no ombro e deslizar em direcção ao peito e colocar a mão na cintura e deslizar em direcção às nádegas, no contexto em que se provou que o arguido o fez, necessariamente integra o conceito de acto sexual de relevo ínsito no artigo 171.º, n.º 1, do Código Penal.
23. Por ser assim, mostram-se preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo de abuso sexual de menor dependente, previsto e punido pelos artigos 172.º, n.º 1, alínea b) e 171.º, n.º 1, do Código Penal, não se vislumbrando razões para recorrer à previsão ínsita nos artigos 171.º, n.º 3, alínea a) por referência ao 170.º, todos do Código Penal, sendo este último normativo residual dos crimes contra a autodeterminação sexual.
24. Como tal, cremos que deve o arguido ser condenado:
i. por reporte aos factos provados 3), 4), 22) a 24), pela prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 1, do mesmo código, na pessoa de BB (ou, caso assim não se entenda, pelo menos, pela prática de dois crimes de actos sexuais com adolescente, p. e p. pelo artigo 173.º, n.º 1, do Código Penal);
ii. por reporte aos factos provados 5), 6), 22) a 24), pela prática de três crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 1, do mesmo código, na pessoa de CC (ou, caso assim não se entenda, pelo menos, pela prática de três crimes de actos sexuais com adolescente, p. e p. pelo artigo 173.º, n.º 1, do Código Penal);
iii. por reporte aos factos provados 11), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 1, do mesmo código, na pessoa de GG (ou, caso assim não se entenda, pelo menos, pela prática de um crime de actos sexuais com adolescente, p. e p. pelo artigo 173.º, n.º 1, do Código Penal);
iv. por reporte aos factos provados 19), 22) a 24), pela prática de um crime de abuso sexual de crianças previsto no artigo 171.º, n.º 1, do Código Penal, na pessoa de HH.
25. E, condenando-se o arguido nos termos em que pugnamos, deverão, pois, ser-lhe aplicadas penas parcelares em conformidade com a correcta qualificação jurídica, de acordo com as exigências do caso, com necessário reflexo na pena única aplicada.
26. O Acórdão recorrido violou, assim, o disposto nos artigos 170.º, 171.º, n.ºs 1 e 2, e 172.º, n.º 1, alínea b), todos do Código Penal.
                                           *
Termos em que, julgando V. Exas. procedente o presente recurso, deverá o douto Acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que condene o arguido nos termos supra descritos, com que se fará, como sempre, JUSTIÇA!»

2.2. Recurso interposto pelo arguido AA (transcrição):
« I- Quanto à Matéria da Acusação:
1º - Em 31/03/2025, o Acórdão condenou o recorrente pela prática, de 12 crimes de Assédio Sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável, p. p pelo art. 172º, n.º 1, alínea b) e 2 do Código Penal, e por 1 crime de crime de Assédio Sexual de Crianças, p. e p. pelo art. 171.º n.º3 do Código Penal.
2º- Em 11/03/2024, o AA, foi acusado, em autoria material e na forma consumada e em concurso efetivo, da prática de:
- 5 (cinco) crimes de Abuso Sexual de Crianças, previsto e punido pelo artigo 171.º, n.ºs 1 e 2 , al. b) do Código Penal; - 4 (quatro) crimes de Importunação Sexual, previsto e punido pelo artigo 170.º, n.º 1 do Código Penal;
- Mais se requer que, nos termos do artigo 82.º-A do Código de Processo Penal, seja arbitrada uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos pelas vítimas, caso as mesmas não deduzam Pedido de Indemnização Civil.
3º- Em 12/03/2025, por alteração não substancial dos factos e respectiva alteração da qualificação jurídica, o tribunal corrigiu a acusação, imputando ao arguido a prática de:
 - 7 Crimes de Assédio Sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável, p. e p. pelo art. 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a);
- 3 Crimes de Assédio Sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável, p. e p. pelo art. 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea b);
- 2 Crimes de Assédio Sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável, p. e p. pelo art. 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) e b);
- 1 Crime de Assédio Sexual de Crianças, p. e p. pelo art. 171.º n.º3 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alíneas a);
- Pena acessória proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual, previsto e punido pelo artigo 69.º B, n.º 2 do Código Penal (cfr. doc. 1).
 4º- Ora a “alteração da qualificação jurídica, com a consequente convolação nos termos em que se verificou não é consentida e isso decorre das disposições conjugadas dos artºs 359, nº 1 e 1º, al. f) ambos do Código de Processo Penal, por isso que traduzindo-se numa agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, reconduz-se a uma “Alteração substancial dos factos”, pelo que tal alteração não podia ser tomada em conta pelo Tribunal e daí que tenham sido violadas as disposições citadas.
5º - O acórdão recorrido violou, também o artº 30º, nº 2 do C.Penal por manifesto erro de interpretação.
6º - Dispõe o artigo 374º, nº 2 do CPP, acerca dos requisitos da sentença: "Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação e exame critico das prova..."
7º - Exige-se, assim, que haja uma individualização e separação de factos provados e não provados, no sentido de ser absolutamente claro, e inteligível o que se provou e o que não se provou, não bastando, por isso, uma diferenciação meramente numérica.
8º - O Acórdão recorrido não se pronunciou sobre a motivação que deu como provado o facto 44).
9º - Em consequência o Acórdão violou o disposto no artigo 374, nº 2 1ª parte do CPP, o que gera a sua nulidade, de acordo com a alínea a) do nº 1 do artigo 379º do mesmo Diploma, pois não basta colocar números aos factos, é preciso individualizá-los de forma a que sejam percetíveis e façam sentido.

II- Quanto à Impugnação Da Decisão Sobre a Matéria De Facto:

10º - O Acórdão, a fls. 10 e seguintes sob a epígrafe “Motivação” começa por fazer uma abordagem ao princípio da livre apreciação da prova e às provas em geral, de forma abstrata, abordagem essa que, sob o ponto de vista doutrinal e jurisprudencial nos parece minimamente aceitável, abordando ainda cada meio de prova em termos gerais e abstractos:
11º - Contudo, quando começa a análise em concreto dos factos, Ofendida a Ofendida, (fls. 15 a 27), o Tribunal, na grande maioria dos casos, desconsidera por completo as declarações do arguido e suporta os factos dados como provados nas declarações para memória futura de cada Ofendida, como única prova de que tal facto ocorreu, apesar de estar em direta contradição com as declarações do Arguido, sem indicação dos critérios lógicos e racionais utilizados para valorar determinados meios de prova num ou noutro sentido.
12º – E não basta, para se concluir o que quer que seja, lançar mão das regras da experiência, pois estas não apresentam um resultado unívoco. A mera possibilidade de um determinado evento ter acontecido não logra, por natureza, vencer a dúvida razoável, pelo que o “non liquet” tem de ser valorado a favor do arguido.
13º - Verifica-se, assim, que falta o exame crítico das provas que fundaram a convicção do tribunal recorrido.
14º - Na verdade, tal exame crítico não pode resumir-se a uma simples remissão para as declarações para memória futura das ofendidas, apesar de ter verificado que algumas das Ofendidas mentiram, ou no mínimo realizaram declarações que tiveram de ser desconsideradas pelo Tribunal pelo grau de inverosimilidade que apresentavam.
15º- E, por outro lado, ao analisarmos a decisão sobre a matéria de facto, tal como se evidenciou na impugnação da matéria de facto, para que se remete, encontramos factos julgados provados que colidem inconciliavelmente entre si e/ou colidem com a fundamentação da decisão, sem que se perceba o fio condutor do raciocínio lógico do julgador, porque não examinou devida e criticamente a prova e não fundamentou corretamente a decisão;
16º- Tal configura, manifestamente, os vícios a que se reportam as alíneas b) e c) do nº 2 do artº 410º do CPP;
17º- Relativamente aos factos dados como provados no acórdão, aceitam-se os seguintes factos: 1), 2), 17), 25), 27), 29), 31), 33), 35), 37), 39), 41), 43), 45), 46), 47), 48), 49, 50), 52) e 53).
18º- O Recorrente também aceita todos os factos dados como não provados no acórdão: a) - j).
19º- O recorrente não concorda com a motivação que deu como provados os factos n.ºs 3), 4), 5), 6), 7), 8), 9), 10), 11), 12), 13), 14), 15), 16), 18), 19), 20), 21), 22), 23), 24), 26), 28), 30), 32), 34), 36), 38), 40), 42), 44) e 51), pelo que deles vem recorrer. Sobre os factos dados como provados, impugnam-se os mesmos, por deles se discordar quer com a sua motivação, quer com alguns lapsos:
20º- Devem ser considerados como não provados os factos n.ºs 3), 8) 9) 10), 11), 16), 20), 21) 22) porque resultam da contradição directa das declarações da Ofendida com as declarações do Arguido, não existindo qualquer outra prova documental ou testemunhal, pelo que deve prevalecer o princípio “in dubio pro reo”;
21º- O facto provado 4) deve ser entendido que ocorreu nos moldes que o Arguido mencionou, ou seja, como palmada correctiva e consequentemente, embora provado, não deve ter relevância criminal, por não dever ser considerado como um contacto de natureza sexual;
22º- Deve ser considerado como provado o facto 5), acrescentando a seguinte expressão: “em contexto de brincadeira”;
23º- Acerca do facto provado 6) deve o mesmo ser alterado para: “Numa outra situação, no aludido período temporal, quando a CC se encontrava sentada numa secretária colocada no corredor de acesso às salas de aula, o Arguido, sentou-se ao lado dela, colocou-lhe a mão no ombro e no braço”;
24º- O facto provado 7), deve ser corrigido para: “CC, quando já se tinha levantado e se encontrava a dirigir para a sala, para ir ter com o seu colega, foi questionada pelo Arguido sobre o motivo porque não usava tops porque parecia ter um bom peito”;
25º- Relativamente ao facto provado 12) deve este ser corrigido na sua data, para “novembro a dezembro de 2023”;
26º- Acerca do facto provado 15), este deve ser dado como não provado porque a expressão referida não encontra amparo em qualquer testemunho, declaração ou prova documental;
27º- Acerca do facto provado 18), este deve ser dado como não provado porque a expressão referida não encontra amparo nas declarações dos intervenientes;
28ª- Sobre o facto provado 19), deve o mesmo ser alterado para: “Nas circunstâncias de modo indicadas em 2), nomeadamente no dia 25-05-2023, o Arguido deu uma palmada na nádega de HH, que se tinha colocado na sua frente quando estava realizar o seu trabalho, perturbando-o, e após o que lhe perguntou “Não gostas?”
29º- O facto provado 23) deve ser corrigido para “O Arguido não ignorava a idade das vítimas supra identificadas, não só a real, mas aparente, sendo que duas delas: HH e MM, têm idade inferior a 14 anos.”
30º- Acerca dos factos provados 24) e 26), os mesmos resultam de uma contradição insanável da fundamentação, pelo que devem ser dados como não provados.
31º- Relativamente ao facto provado 44), resulta de uma contradição entre fundamentação e decisão, quando o que deveria ter sido dado como provado era: O Arguido era um “excelente” colaborador; O Arguido era jovial e apresentava uma postura menos formal em relação aos alunos; O Arguido e outros funcionários, tiveram atitudes de carinho com os alunos, como um abraço” uma vez que tais afirmações foram referenciadas pelo tribunal na sua exposição, mas não tiveram qualquer respaldo nos factos dados como provados.
32º- No que concerne ao facto provado 51) deve o mesmo ser corrigido para “Consta do relatório social de fls. 811, que por via de processo disciplinar o Arguido foi dispensado da EMP01..., no mês de Maio de 2024, o que considera injustificado, tendo interposto acção judicial.”
33º- O Tribunal não podia ter dado como provados, como deu, os factos constantes dos pontos supra indicados, por ser manifesta a insuficiência da matéria probatória produzida nos autos e em sede de audiência de julgamento, para ter chegado às conclusões que chegou, e ter fundamentado os referidos factos dados como provados nos termos em que o fez, tendo assim violado o artº 410º, nº 2, al. a) do CPP.

III- Quanto à Impugnação Da Matéria De Direito:

Crime de importunação sexual - condenação pela formulação de propostas de teor sexual.
34º- É com extrema objectividade que deve ser aferido se o Arguido cometeu o crime previsto pelos actos do art. 170.º do CP, e verificando que o Arguido não efetuou estas propostas, declarar que as conversas e interações que ocorreram entre Arguido e Menores, não são criminalizadas pelo art. 170.º.
35º- Dessa forma, o Arguido não pode ser condenado nos termos em que foi pelo tribunal “a quo”, pelo que deve ser absolvido dos referidos crimes que são consequência directa dos factos dados como provados em 7) a 10), 13) a 15) e 17) a 22).
Crime de importunação sexual - condenação por atos de carácter exibicionista.
36º- Para praticar este crime, não basta o acto de exibição de uma zona erógena ou sexual do corpo para consubstanciar o crime pelos actos previstos no art. 170.º do CP. É necessário que a verificação da existência de um nexo de causalidade entre o acto exibicionista e a importunação da vítima e não apenas uma situação causadora de repulsa na vítima.
37º- Ela tem de ser perturbada na sua liberdade sexual, ou seja, algo tem de lhe ser imposto, dizemos nós, o que não se verifica em qualquer conduta do Arguido.
Crime de importunação sexual - condenação pelo constrangimento a contacto de natureza sexual.
38º- Na mesma linha de pensamento, consideramos que relativamente ao constrangimento a contacto de natureza sexual, deve ser aferido pelo mesmo padrão, ou seja, que para preenchimento do mesmo se exija a verificação da existência de um nexo de causalidade entre o contacto de natureza sexual e a importunação da vítima e não apenas uma situação causadora de repulsa na mesma.
Crime de Abuso sexual de Menores - Importunar Menor de 18 anos por meio de conversa
39º- O Tribunal “a quo” trouxe como jurisprudência o sumário do acórdão no processo n.º 3533/17.6JAPRT.P1 de 29/01/2020, que aborda o conceito de “atuar sobre menor de 14 anos por meio de conversa”.
PIC e dedução de indemnização pelo 82-A.
40º- Apenas se justifica a determinação pelo tribunal de uma compensação pelos prejuízos, quando existem os mesmos, não sendo automático o decretamento de tal compensação.
Autonomização e penalização por cada acto provado
41º- O Tribunal “a quo” referiu na sua fundamentação do direito (pág. 32 do acórdão) que: “No caso dos tipos legais ora em dissídio, como supra vertido, estes afectam bem jurídico eminentemente pessoal - “em cada ato individualmente perpetrado a vítima é renovadamente lesada”.
42º - Mas esta separação e individualização de cada acto provado terá de ter autonomia e relevância criminal para cada um, individualmente, poder ser criminalizado
Determinação da sanção principal - Conexão entre factos dados como provados, regras da experiência e da normalidade do acontecer e dolo
43º- Não bastam as declarações para memória futura, que contrariam as declarações do arguido, para poder dar como provado que tais actos ocorreram sem o suporte de outra prova que confirma as declarações conjunta das Menores com os seus pais, também não foi suficiente para produzir qualquer queixa contra o Arguido, quer nas autoridades policiais, quer na direção da escola.
44º- Qualquer Menor de Idade é sugestionável e influenciável pelos adultos, e perante uma acusação pública e mediática, também seja influenciado a condenar o Arguido
Da Proporcionalidade e Adequação Da Medida Da Pena, (Da desadequação da medida da pena)
45º- Como se viu o acórdão recorrido condenou o arguido na pena única de 3 anos e 9 meses, na suspensão da pena única aplicada ao Arguido pelo período de 5 anos, ao pagamento de uma indemnização no valor total de 9.150,00€ às Ofendidas. Condenou ainda o Arguido na pena acessória de proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e liberdade sexual pelo período de 5 anos, determinou a recolha de amostra de ADN para integrar a base de dados, manteve a obrigação de apresentações periódicas, uma vez a cada 15 dias e manteve a suspensão de funções que exerce na escola como assistente operacional e no exercício da actividade de juiz-árbitro em competições de natação em que participem crianças e jovens.
46º - Sem prescindir quanto ao que se alegou e da impugnação da matéria de facto, donde decorre que nenhuma prova se fez que fundamente a intenção do recorrente em qualquer crime, é inequívoco que se trata de uma pena injusta, violenta, manifestamente excessiva mesmo para os factos julgados provados no Acórdão.
47º – Quanto à matéria de facto julgada provada, o recorrente considera que nenhuma prova inequívoca se fez, muito pelo contrário, as próprias testemunhas confirmaram a ausência de intenção sexual nos actos dados como provados.
48º - É pacífico o entendimento de que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, que continua a constituir um dos fundamentos irrenunciáveis da aplicação de qualquer pena (artº 40º,nºs 1 e 2 do C. Penal), e aqui é claramente ultrapassada, em violação do preceito atrás citado.
49º - O recorrente teve sempre um comportamento exemplar, mereceu sempre e continua a merecer a consideração e respeito de seus amigos e vizinhos, de uma maneira geral das pessoas com quem contactava e contacta, designadamente com aquelas que vivem na comunidade em que se insere, quer antes dos alegados factos, quer depois dos mesmos, tendo mantido durante todo o tempo entretanto decorrido uma boa conduta, como resulta do seu RS.
50º– É um homem de família com uma imagem social positiva e tido como pessoa educada, respeitadora e trabalhador.
51º- Já não trabalha na Escola Profissional ... - EMP01..., mas, o presente processo, teve para o ora recorrente, implicações sociais, manifestamente prejudiciais a sua reputação e o seu bom nome.
52º– Nunca exibiu, nem exibe, sinais exteriores de riqueza, porque praticamente nada tem, como aliás decorre da verificação da sua condição económica.
53º- Cumpre, numa demonstração inequívoca do erro do decidido, renovar doutos ensinamentos de FARIA COSTA, sobre a questão concreta da medida da pena.
54º- Em matéria de aplicação da pena, o processo penal obedece à afirmação do princípio de que sem culpa não há pena, assumindo-se este principio como prius perante o poder punitivo do Estado. A culpa é o limite e o fundamento da pena.
55º- Como assinala a doutrina, a pena tutela o bem jurídico, sendo indiscutível que cumpre uma função de prevenção do crime, seja prevenção geral (fortalecimento da confiança na validade da norma), seja prevenção especial (em função das concretas necessidades da pessoa a punir e, em certo sentido, atento o teor e finalidades ético-jurídicas de retribuição).
56º- No complexo caminho tendente à procura da pena ajustada, o juiz, apurada a factualidade típica, deverá começar por eleger a moldura penal abstrata.
57º- Na sequência, pode acontecer que a moldura penal venha a ser alterada em virtude do funcionamento das chamadas circunstâncias modificativas, agravantes ou atenuantes.
58º- Circunstâncias são, nesta aceção, pressupostos ou conjunto de pressupostos que, não dizendo diretamente respeito nem ao tipo de ilícito, nem ao tipo de culpa, nem mesmo à punibilidade em sentido próprio, todavia contendem com a maior ou menor gravidade do crime como um todo e relevam por isso diretamente para a doutrina da determinação da pena.
59º- Uma vez fixada a moldura penal que cabe em abstrato ao caso, o juiz deve fixar o quantum concreto da pena que constará da condenação. Para tal, deverá o julgador, além de apoiar-se no critério global apresentado pelo artigo 71.º, n.º 2 do Código Penal. Nos termos deste preceito, “na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.”
60º- Assim, o ordenamento jurídico-penal português, na sequência de um vasto labor doutrinário, não renuncia a postular critérios normativos que possam vincular a atividade judicial em todo aquele processo e também nos seus momentos finais e decisivos. Por isso, o nosso julgador jurídico-penal, no artigo 71.º, n.º 2 do C.P. apresenta uma lista de fatores que devem constituir ponto de apoio do julgador no momento em que deve condensar as valorações feitas num quantum concreto da pena. Nos termos deste preceito, na determinação concreta da pena, o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente, entre outras, “O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências”, “A intensidade do dolo ou da negligência”;”As condições pessoais do agente e a sua situação económica” (artigo 71.º, n.º 2, alíneas a), b), d) do Código Penal).
61º- Nos termos do artigo 71.º, n.º 1 do C.P. “a determinação da pena dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”. Resulta de uma sã leitura deste preceito que a culpa (indiciador de um radical pessoal) e a prevenção (que insinua a vertente comunitária da punição) constituem os princípios regulativos em que o juiz se deve ancorar no momento em que se lhe exige que fixe num quantum concreto da pena. Fornecendo o critério, o legislador não fornece ao juiz conceitos fechados e aptos à subsunção que permitam a matematização do iter formativo da pena concreta. Se a pena há-de ser individualizada afigura-se que o juiz, assumindo as intencionalidades e as vinculações do sistema jurídico-penal, desempenha, também aqui, uma insubstituível tarefa mediadora e constitutiva.
62º- Contudo, a recusa de um qualquer procedimento matemático na determinação do quantum concreto da pena não tem o sentido de abandonar este momento crucial à arbitrariedade do juiz. Aliás, uma discricionariedade total do juiz pelas tarefas de determinação da pena significa uma violação ao princípio da legalidade da pena constitucionalmente consagrada no artigo 29.º, n.º 1 da C.R.P. No que ao caso concreto reporta, assumem pertinência diversas considerações:
63º- Mesmo admitindo que o comportamento do arguido é passível de censura penal, sempre se dirá que em matéria de funções de prevenção, o recorrente entende estarem claramente atenuadas as respeitantes à prevenção especial, uma vez que deixou de trabalhar naquele local e de ter contacto direto com os Menores.
64º- Assim sendo, prevalecerão à aplicação da pena critérios e necessidades preventivas de índole geral, associadas à necessidade de moralizar o funcionamento de um sistema frágil, à luz das práticas instituídas que não são legais, consabidamente associado, a características sócio culturais que nem sempre permitem uma destrinça rigorosa entre o criminoso e o socialmente adequado, sem conceder no que à situação respeita.
65º- O sucesso da pretendida prevenção geral, não resulta prejudicado por ao arguido ser aplicada pena mais baixa – designadamente nos limites mínimos da moldura penal, e por, no êxito dessa pretensão, ser absolvido, dos crimes de que vem condenado.
66º- Neste item importa realçar que os antecedentes criminais do arguido, AA, estão perfeitamente plasmados no douto  acórdão proferido pelo colectivo de Juízes do Tribunal a quo, apesar do mesmo ter cumprido, até à presente data, com todas as suas responsabilidades penais/sociais e ser um pessoa bem inserida socialmente e pai de família.
67º- As características que à atuação criminosa são apontadas, permitem concluir, com suficiente segurança, que deve o arguido, ser absolvido ou se assim não for entendido, não deve a pena aplicada ultrapassar o limite mínimo da moldura penal, suspensa por igual período, ou suspensa com regras de conduta, ou ainda, sujeita a regime de prova, mas não em cumulação umas com as outras, pois causaria uma dupla penalização.
68º- O conjunto de circunstâncias aludidas, sendo consignado de forma expressa, mas genérica, em sede de acórdão recorrido, não parece valorado sob a forma de circunstâncias atenuantes, ao mesmo tempo que contrariam o dolo e ilicitude elevados com que é fundamentada a determinação do tipo e medida da pena.
69º- Se utilizados fossem os fundamentos justificativos das penas aplicadas (e confirmadas) por muitos dos Acórdãos mais recentes do S.T.J., chegava-se à conclusão certa de que a pena aplicada é desproporcional à medida da satisfação do sentimento jurídico da comunidade e às exigências de prevenção.
70º- O tribunal, na sua ponderação, não valorou convenientemente esta circunstância para efeitos de determinação de medida da pena, pelo que:
71º- Violou o disposto no artigo 71º, nº 2, alíneas a), b), d) do Código Penal.

NESTE TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, A DECISÃO PROFERIDA SER REVOGADA, SEM OS VÍCIOS INVOCADOS, SUBSUMIDOS NOS ARTIGOS 410.º e 412.º DO CPP, OU, CASO ASSIM SE NÃO ENTENDA, SER ALTERADA A PENA APLICADA, ABSOLVENDO-SE E CONDENANDO-SE O ARGUIDO NOS TERMOS REQUERIDOS,
Assim fazendo, Vossas Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores, a costumada JUSTIÇA»

3. O arguido não respondeu ao recurso do Ministério Público.
4. O Ministério Público junto da 1ª instância respondeu ao recurso do arguido, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões (transcrição):
«1. Analisados os autos e a respectiva tramitação, cremos que, por se não verificar uma qualquer descaracterização do quadro factual, cremos que nos encontramos diante de mera alteração da qualificação jurídica e que, por assim ser, ao proceder do modo descrito, não incorreu o Tribunal a quo na prática da nulidade invocada pelo Recorrente.
2. Com efeito, como se consignou no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23-04-2024, Relatado pela Exma. Senhora Desembargadora Ester Pacheco dos Santos, «A qualificação jurídica pelo Tribunal é totalmente livre, independentemente da agravação dos limites máximos das sanções, posto que essa agravação não decorra da inclusão de qualquer facto novo», pelo que, contrariamente ao invocado, o Tribunal a quo não estava impedido de condenar, como condenou, o arguido por crimes punidos com moldura penal mais gravosa.
3. Sobre o ponto 44) da matéria de facto provada, consta na fundamentação que «Relativamente aos factos atinentes às condições socioeconómicas do Arguido atendeu-se às declarações do próprio, da Testemunha NN, que aos costumes disse ser esposa do Arguido, em conjugação com o relatório social de fls. 811 e ss.».
4. No aludido relatório social fez-se constar que «Na comunidade, foi com surpresa que se tomou conhecimento da existência deste processo, mas o arguido não é rejeitado, mantendo o seu quotidiano habitual», donde terá sido extraído o predito facto provado 44).
5. Assim, porque não é toda a falta de fundamentação que importa a consequência da nulidade da sentença ou acórdão, mas antes a falta que seja absoluta, cremos que, também neste ponto, não assiste razão ao Recorrente.
6. O Tribunal a quo decidiu em conformidade com a livre apreciação da prova ínsita ao artigo 127.º, do Código de Processo Penal, que possibilita ao juiz uma certa discricionariedade na apreciação das provas que fundamentam a decisão, ainda que limitada pela racionalidade e as regras da experiência comum.
7. A ponderação agregada dos elementos de prova referenciados foi (mais que) suficiente para dar como provada a factualidade imputada ao Recorrente, sendo certo que a versão constante do Acórdão recorrido é, na realidade, coerente e razoável com a prova produzida, ultrapassando o teste de resistência da dúvida razoável.
8. Deve, pois, nesta parte, improceder o recurso interposto, tendo-se por adequada a matéria provada no douto Acórdão recorrido.
9. Relativamente à qualificação jurídica dos factos, conforme afirmámos no nosso recurso, cremos que, atentando à factualidade julgada provada em 3), 4), 5), 6), 11), 19), 22), 23 e 24) (na qual se deu por provado que o arguido «deu uma palmada nas nádegas», «voltou a dar-lhe uma palmada nas nádegas», «desferiu uma palmada nas nádegas», «colocou-lhe a mão no ombro e foi deslizando em direcção ao peito», «colocou-lhe a mão na cintura e deslizou-a em direcção às nádegas» e «deu uma palmada nas nádegas»), se impõe concluir que em todas as citadas circunstâncias o arguido sujeitou as vítimas à prática de acto sexual de relevo jurídico-penalmente relevante.
10. E, mostrando-se preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do tipo de abuso sexual de menor dependente, previsto e punido pelos artigos 172.º, n.º 1, alínea b) e 171.º, n.º 1, do Código Penal, não se vislumbram razões para recorrer à previsão ínsita nos artigos 171.º, n.º 3, alínea a) por referência ao 170.º, todos do Código Penal, sendo este último normativo o mais residual dos crimes contra a autodeterminação sexual.
11. Como tal, cremos, diferentemente do Recorrente e, ainda, do Tribunal a quo, que deve o arguido ser condenado nos termos em que pugnámos no nosso já citado recurso.
12. Sendo as ofendidas dos autos, menores de idade, são, inequivocamente, vítimas especialmente vulneráveis, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 16.º, n.º 1, do Estatuto de Vítima, aprovado pela Lei 130/2015, de 4 de Setembro, e 67.º-A, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, pelo que, na ausência de oposição expressa, o arbitramento de reparação das vítimas sempre seria oficiosamente determinado, nos termos já referidos, conforme impõe o artigo 82.º- A, n.º 1, do Código de Processo Penal (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10-05-2017, relatado pelo Exmo. Sr. Desembargador Inácio Monteiro).
13. Em nosso entendimento, o Tribunal ajuizou correctamente as penas parcelares aplicadas a cada um dos crimes que julgou verificados (sem prejuízo da nossa discordância quanto à qualificação jurídica dos factos nos termos assinalados no recurso por nos interpostos e das necessárias consequências na determinação da medida da pena), ponderando devidamente todos os elementos que militam a favor e contra o arguido.
14. Ademais, cremos que o Tribunal a quo andou bem ao decidir conforme decidiu, optando pela suspensão da execução da pena de prisão sujeita à obrigação de pagamento das quantias arbitradas às vítimas; de outro modo, o arguido não sentiria os efeitos da condenação de forma suficientemente dissuasora do cometimento de novos crimes.
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Nestes termos, e noutros que V/ Exas. doutamente suprirão, entende-se que não deverá ser dado provimento ao recurso e que, assim procedendo, V/ Exas. farão inteira e sã justiça!»
5. A assistente OO também respondeu ao recurso do arguido, pugnando pela manutenção do julgado.
6. Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, na vista a que e refere o artigo 416.º do Código de Processo Penal([1]), emitiu parecer no sentido do não provimento de ambos os recursos.
7. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, não houve resposta.
8. Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.
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II - FUNDAMENTAÇÃO

1. O acórdão recorrido
1.1. No acórdão proferido na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos (transcrição):
«1) O Arguido AA, exerceu as funções de assistente operacional na Escola Profissional ... – EMP01..., sita em ....
2) Por via das funções exercidas teve contacto com os respectivos alunos da aludida escola, nomeadamente com:
BB, nascida em ../../2008;
ii. CC, nascida em ../../2008;
iii. II, nascida em ../../2008;
iv. DD, nascida em ../../2007;
v. EE, nascida em ../../2006;
vi. FF, nascida em ../../2008;
vii. GG, nascida em ../../2006;
viii. HH, nascida em ../../2009, e;
ix. MM, nascida em ../../2009.
3) Nas circunstâncias de modo referidas em 2) o Arguido, em dia não concretamente apurado, no ano lectivo de 2022/2023, entre Setembro de 2022 e Dezembro de 2022, deu uma palmada nas nádegas da BB.
4) Nas mesmas circunstâncias de tempo e modo, num outro dia, voltou a dar-lhe uma palmada nas nádegas.
5) Nas circunstâncias de modo mencionadas em 2), no ano lectivo de 2022/2023, entre Janeiro e Março de 2023, em dias não concretamente apurados, pelo menos por duas vezes, o Arguido desferiu uma palmada nas nádegas da CC.
6) Numa outra situação, no aludido período temporal, quando a CC se encontrava sentada numa secretária colocada no corredor de acesso às salas de aula, o Arguido, sentou-se ao lado dela, colocou-lhe a mão no ombro e foi deslizando em direcção ao peito.
7) CC incomodada, levantou-se e o Arguido questionou-a sobre o motivo porque não usava tops porque parecia ter um bom peito para os usar.
8) Nas circunstâncias de modo referidas em 2), em data não apurada, mas seguramente em Maio de 2023, o Arguido dirigindo-se à vítima GG, disse-lhe “Quais são as posições que gostas de fazer com o PP?”
9) No dia seguinte perguntou-lhe: “Já fizeste sexo?”.
10) Dias depois, intrometeu-se numa conversa entre a GG e o colega QQ e disse-lhes: “Quando chegar a casa também vou ver vídeos e pintar as minhas paredes!”.
11) Dias depois, quando a GG passava no corredor, o Arguido abeirou-se dela e colocou-lhe a mão na cintura e deslizou-a em direcção às nádegas.
12) Nas circunstâncias de modo aludidas em 2), entre Fevereiro e Março de 2022, o Arguido sempre que via a vítima FF colocava-lhe a mão na cintura.
13) Em datas não concretamente apuradas, mas anteriores a Junho de 2023, o Arguido dirigindo-se a FF, disse-lhe: “Já fizeste amor?”.
14) Em Fevereiro de 2023, quando a FF se encontrava numa sala, o Arguido dirigindo-se a ela disse-lhe: “O teu percing no umbigo é a cereja no topo do bolo!”.
15) No mês de Junho de 2023, disse-lhe: “Eu também te queria fazer um chupão, mas mais para a zona do ombro onde não se visse!”.
16) Nas circunstâncias de modo mencionadas em 2), em data não apurada mas após Maio de 2023, pelo menos duas vezes, quando a vítima II se encontrava no corredor de acesso às salas de aula do ... piso, o Arguido abeirou-se dela, deslizou a mão para cima e para baixo na lateral superior de uma das coxas de II.
17) Nas circunstâncias de modo indicadas em 2), no início do ano de 2022, o Arguido, por várias vezes, dirigiu-se à vítima DD e chamou-lhe “Giraça!”.
18) Em data não concretamente apurada do ano de 2023, antes do mês de Junho, o Arguido disse dirigindo-se a DD “Fica-te bem o vestido com essas mamas, devias trazê-lo mais vezes!”.
19) Nas circunstâncias de modo indicadas em 2), nomeadamente no dia 25-05-2023, o Arguido deu uma palmada nas nádegas de HH e após o que lhe perguntou “Não gostas?
20) Nas circunstâncias de modo referidas em 2), em data não concretamente apurada, mas entre Setembro e Dezembro de 2022, o Arguido abordou a vítima OO e disse-lhe “Estas toda boa!
21) Em data não concretamente apurada mas entre Abril e Julho de 2023, quando a EE se encontrava sentada junto de uma secretária, junto à entrada das salas de aulas do ... piso, o Arguido dirigiu-se a ela e perguntou-lhe: “EE, já fizeste a tua primeira vez?”.
22) Como ela não lhe respondeu ele disse-lhe: “Se te apanhar numa sala a meter os dedos não tem mal nenhum. Não vou levar isso a mal, nem vou dizer a ninguém!”.
23) O Arguido não ignorava a idade das vítimas supra identificadas, não só a real, mas aparente, sendo que algumas delas têm idade inferior a 14 anos.
24) O Arguido actuou como descrito em 3), 4), 5) a 7), 8), 9), 11), 13), 15), 18), 19), 21) e 22), livre, deliberada e conscientemente, com o intuito de assim satisfazer os seus instintos sexuais, propósito que foi renovando, durante o período em que foi concretizando os actos supra-referidos, aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com as alunas por força das relações que tinha com elas em virtude das funções que exercia na escola que elas frequentam/frequentavam.
25) Ao actuar da forma acima descrita, o Arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente.
26) Ao agir como descrito em como descrito 3), 4), 5) a 7), 8), 9), 11), 13), 15), 18), 19), 21) e 22), fê-lo bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
Mais se provou que,
27) CC, com idade aparente correspondente à real, aparenta bom desenvolvimento psicomotor e socio afectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia, e sem antecedentes psiquiátricos significativos.
28) CC apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
29) BB, com idade aparente ligeiramente superior à idade real, aparenta bom desenvolvimento psicomotor e socioafectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia, e sem antecedentes psiquiátricos significativos.
30) BB apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
31) II, com idade correspondente à real, aparenta bom desenvolvimento psicomotor e socio afectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia, e sem antecedentes psiquiátricos significativos.
32) II apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
33) EE, com idade aparente ligeiramente superior à idade real, aparenta bom desenvolvimento psicomotor e socio afectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia, e sem antecedentes psiquiátricos significativos.
34) EE apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
35) HH, com idade correspondente à real, aparenta bom desenvolvimento psicomotor e socio afectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia, e sem antecedentes psiquiátricos significativos.
36) HH apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
37) GG, com idade aparente superior à idade real, aparenta bom desenvolvimento psicomotor e socio afectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia, e sem antecedentes psiquiátricos significativos.
38) GG apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
39) MM, com idade aparente correspondente à real, aparenta bom desenvolvimento psicomotor e socio afectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia, e sem antecedentes psiquiátricos significativos.
40) MM apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
41) DD, com idade aparente correspondente à idade real, aparenta um bom desenvolvimento psicomotor e socio afectivo, sem evidenciar sinais ou sintomas de psicopatologia aguda.
42) DD tem competências cognitivas normativas, é capaz de distinguir realidade de fantasia e tanto a memória de curto quanto a de médio prazo se encontram preservadas. Apresenta uma linguagem adequada à sua idade, com discurso claro, contextualizando os eventos de forma lógica, coerente e consistente, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
43) FF não evidenciou sinais ou sintomas de doença psiquiátrica, tem competências cognitivas normativas, é capaz de distinguir realidade de fantasia e tanto a memória de curto quanto a de médio prazo se encontram preservadas.
44) O Arguido é pessoa considerada socialmente.
45) O Arguido exerce, há cerca de 5 meses, a actividade de empregado de escritório, na empresa EMP02..., e aufere como vencimento o valor correspondente ao salário mínimo nacional.
46) À data da alegada prática dos factos, AA mantinha residência com o cônjuge e com a filha, de 23 anos de idade.
47) O agregado descrito residia em apartamento de titularidade própria.
48) A Cônjuge do Arguido trabalha como assistente técnica na Câmara Municipal ..., auferindo mensalmente cerca de 1.100,00€.
49) Tem como despesas fixas mensais a prestação referente ao empréstimo bancário para aquisição da habitação, água, electricidade, comunicações e gastos com a filha a estudar na Universidade ..., num valor aproximado de 1.272,00 €.
50) O Arguido exercia a actividade de árbitro de natação.
51) Consta do relatório social de fls. 811, que por via de processo disciplinar o Arguido foi dispensado a EMP01..., no mês de Maio de 2024, o que considera injustificado, tendo interposto acção judicial.
52) O Arguido tem como habilitações literárias o 12.º ano de escolaridade.
53) O Arguido não possui quaisquer condenações averbadas no respectivo certificado de registo criminal.»
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1.2. Quanto a factos não provados consta do acórdão recorrido (transcrição):
«a) Que nas circunstâncias de tempo e modo referidas em 3) dos factos provados o Arguido ao mesmo tempo disse a BB: “Essas calças ficam-te muito bem! Estás muito sexy! Estás muito linda!”, questionando-a também sobre se já tinha mantido relações sexuais e fez gestos obscenos.
b) Que após Abril de 2023 o Arguido tenha agido como referido em 5) dos factos provados.
c) Que entre Fevereiro e Março de 2022, o Arguido colocando a mão na cintura de FF, disse-lhe: “Já fizeste amor?”.
d) Que ao invés do descrito em 16) dos factos provados, o ali descrito ocorreu 10 a 12 vezes.
e) Que nas circunstâncias referidas em 16) o Arguido disse “És boa! És gostosa!”.
f) Que ao invés do ano de 2023, o facto provado 18) ocorreu no início do ano de 2022.
g) Que o Arguido tenha dito a DD “Devias trazer aquela peça de roupa mais vezes porque as mamas ficavam bem assim!
h) Em data não concretamente apurada, mas no período lectivo de 2022/2023 o Arguido aproximou o corpo dele ao da vítima RR, e roçava o seu corpo no dela, designadamente friccionando-a no peito.
i) Ao actuar da forma acima descrita em 10), 12) 14), 16), 17) 20) dos factos provados e h) dos não provados, o Arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal e que por isso incorria em responsabilidade criminal.
j) Que o Arguido actuou com o intuito de ofender a honra e consideração das vítimas.»
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1.3. O tribunal recorrido fundamentou a formação da sua convicção nos seguintes termos (transcrição):
«Na Sentença deve o Julgador explicitar, ainda que concisamente, os motivos fundamentadores da decisão, não cumprindo reproduzir o teor integral dos depoimentos produzidos em Audiência, que ficam documentados em acta e gravados mas, antes indicando e apreciando criticamente as provas que serviram para formar a respectiva convicção, ancorado nas regras da experiência e da livre convicção, como manda o disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Nestes termos, o juiz não está sujeito a critérios de valoração de cada um dos meios probatórios, legalmente pré-determinados, sendo o tribunal livre na apreciação que faz da prova e na forma como atinge a sua convicção, nomeadamente face à globalidade da prova produzida, nada impede que o tribunal se apoie num certo conjunto de provas, em detrimento doutras, nada obstando que esse convencimento parta de um registo mínimo, mas credível, de prova, em detrimento de vastas referências probatórias, que, contudo, não têm qualquer suporte de credibilidade, tudo quando devidamente fundamentado na forma prevista na Lei.
Na apreciação releva a percepção directa, a imediação e a oralidade, imprescindíveis para a valoração da prova num determinado sentido e não noutro.
Com efeito, entre outros meios de prova (e algumas restrições legais ao regime da livre apreciação da prova, como sucede com o valor probatório dos documentos autênticos e autenticados [art. 169.o], o efeito de caso julgado nos pedidos de indemnização civil [art. 84.º], a prova pericial [art. 163.º], e a confissão integral e sem reservas [art. 344.º], o princípio da legalidade da prova [art. 32.º, n.º 8 da C.R.P.; artigos 125.º e 126., ambos do C.P.P.] e outra o princípio in dubio pro reo, enquanto emanação da garantia constitucional da presunção de inocência - [art. 32.º, nº 2 da C.R.P.; art. 11.º, n.º 1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de Dezembro de 1948; e art. 6.º, n.º 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que foi aprovada, para ratificação, pela Lei n.º 65/78, de 13 de Outubro]), a convicção do julgador é formada pela análise dos testemunhos, em função das razões de ciência demonstradas, das certezas afirmadas, das hesitações manifestadas, das lacunas e contradições exteriorizadas e, ainda, da coerência e seriedade reveladas.
Na formação da convicção judicial podem intervir também presunções, que permitem estabelecer a ligação entre o que se tem por adquirido e aquilo que as regras da experiência ensinam a poder inferir.
Ora, uma vez que a prova do facto criminoso nem sempre é directa e de percepção imediata, amiúde é necessário fazer uso da prova indiciária, que pressupõe a demonstração do facto base ou indício, que faz despoletar no raciocínio do julgador uma regra da experiência ou da ciência, permitindo inferir outro facto.
Tudo sem jamais olvidar que o que é exigível para que o juiz possa dar um facto como provado ou não provado, se cinge à forte probabilidade da sua ocorrência, em face da valoração que faça dos meios de prova que lhe são apresentados pelos sujeitos processuais e, bem assim, pelos oficiosamente determinados, de acordo com a sua livre convicção nos termos permitidos pelo artigo 127.º, do Código de Processo Penal, dado que existem constrangimentos naturais que impedem que o juiz tenha acesso à “verdade absoluta” dos factos submetidos a pleito.
Posto isto.
Tal como não cumpre reproduzir o teor integral do depoimento das Testemunhas, também não cumpre fazê-lo quanto às declarações do Arguido, que se mostram gravadas.
Portanto, diremos o Arguido prestou declarações, reconhecendo certas condutas descritas na acusação, mas atribuindo às mesmas outra relevância e intenção, dessa forma procurando justificá-las.
A justificação por banda do Arguido ocorre ainda em sede de contestação apresentada, onde reconhece usar algumas das expressões verbais que lhe são atribuídas, mas tudo porquanto é jovial (o que é reconhecido pela maioria das Ofendidas e pelas Testemunhas SS, TT, UU e VV, todas colaboradora da EMP01... à data dos factos), e no sentido de melhorar o relacionamento com todos os alunos da escola. Refere inclusivamente que pretendia “ajudar as crianças a cresceram saudável, e com apoio, nunca sozinhas”.
Ou seja, e em suma, o Arguido nega a prática de qualquer ilícito criminal, sendo que qualquer conduta que objectivamente tenha praticado não o foi com a intenção de abusar sexualmente de Menor de Idade ou de importunar sexualmente.
Antes de avançarmos mais na explicação do juízo lógico dedutivo deste Tribunal Colectivo, relembraremos que estamos no âmbito do processo penal, e não civil, administrativo e/ou disciplinar.
Ora, os fundamentos que subjazem à decisão naquele primeiro, são diferentes dos restantes, valendo a prova pré-constituída e a constituída em sede de Audiência de Julgamento.
Logo, mesmo que constasse ou viesse a constar (que não consta) um qualquer relatório final de processo disciplinar, este seria apreciado segundo o princípio da livre apreciação do Juiz. Ademais a prova Testemunhal ali recolhida para aqui ser valorada nestes autos deveriam ser produzidas em Audiência.
Tudo quanto bem se compreende, porquanto, e repetindo, os fundamentos de um processo disciplinar e de processo penal são diferentes.
E acrescentaremos que é igualmente diferente o juízo realizado pela comunidade, que em casos como o dos autos, naturalmente têm uma faceta aproximada da ética e da moral.
O Julgador Penal, para efeitos de juízo de condenação, para se afirmar que o agente vai condenado (não nos referimos a pena ou medida da pena a aplicar em consequência), deve pautar-se por um juízo objectivo, amparado na Lei, que já espelha as necessidades da Comunidade. Não quer isto dizer que a destrinça entre o que é moral ou tipificado legalmente seja fácil ou facilitado, mas compete ao Julgador efectuá-la.
Por outro lado, em processo penal provando-se objectivamente uma conduta, para haver condenação há que se provar o dolo do tipo.
Esta prova, porque ligada intrinsecamente ao foro interno, é feita, na falta de admissão, mediante articulação, entre conduta objectiva dada como provada e as regras da experiência e da normalidade do acontecer.
Com isto quer-se dizer que sem prejuízo de o Arguido ter pretendido com as suas declarações as mais das vezes afastar o dolo do tipo de ilícito pelo qual vem acusado, a sua verosimilhança com a normalidade do acontecer foi (será adiante) arredada.
Tudo porquanto os Juízes que compõem o Colectivo entenderam que as declarações para memória futura das Ofendidas, mereceram inteira credibilidade.
Ouvidas as aludidas declarações, o Tribunal Colectivo não tem motivos para afastar o resultado dos relatórios da perícia médico-legal extensos e completos de fls. 413 e ss, que se acompanham sem qualquer reserva e sem necessidade de outras considerações.
Sucede que a Ofendida FF, não se apresentou, até ao final da produção de prova nestes autos, perante Perito, como ordenado pelo Tribunal, na pessoa da sua Legal Representante.
Mais ainda assim, o Tribunal não tem, nem teve a menor dúvida, quanto à coerência, espontaneidade e credibilidade da Ofendida ouvidas as suas declarações para memória futura.
Veja-se que nas declarações prestadas por esta, ainda que de forma sobranceira, a Menor de Idade, deu nota espontaneamente de algum desconforto da sua progenitora, demonstrando que a questão/participação “na culpa[1]” nos eventos relatados pela Menor de Idade não seria pacífica.
Logo, é possível concluir pela análise do processado (sucessivas notificações da progenitora para comparência junto do IML, e sucessivas faltas injustificadas) que a Jovem terá falado com verdade.
Esta congruência entre o relatado espontaneamente e o que sucedeu a nível processual, bem como a circunstância de o escutado nas declarações para memória futura, ser coerente, claro, e em parte suportado em prova Testemunhal confere inteira credibilidade às declarações para memória futura da Menor de Idade.
Acresce ainda que a Menor de Idade não denota no seu discurso manipulação exterior ou sugestionamento.
Aliás, revela capacidade de querer e entender, na medida em que se afasta do que diz ser o entendimento da sua mãe na questão. Revelador de capacidade de pensamento crítico temos que a Ofendida a dado momento refere a propósito da roupa que vestia quando ia para a escola “Ela [mãe] só disse que eu devia ter cuidado com a roupa (...) Sim, que eu às vezes também exagero um pouco, mas para ir para a escola, não.”.
Junto o relatório da perícia médico-legal (ref.a ...69) foi determinada a reabertura da Audiência, concedido contraditório quanto ao mesmo, porquanto se entendeu que aquele deveria aqui ser valorado. Ora, apreciado o relatório supra referido conclui-se que o mesmo não afasta as conclusões retiradas, e supra enumeradas, por este Tribunal Colectivo.
Prosseguindo e no que tange às declarações de todas as Ofendidas, temos que para além da coerência interna do discurso, não se denota qualquer incoerência externa, tendo em conta as suas capacidades, em face da idade e ambiente cultural (não passou despercebido ao Tribunal que a criança Ofendida HH, falou numa boneca e situação associada que viu na rede social ..., porém tal tem-se como perfeitamente normal, atenta a idade daquela e os hábitos dos Jovens nos dias de hoje, não tendo a estória relatada pela criança sido valorizada contra o Arguido, apenas demonstrou a normalidade de desenvolvimento e ingenuidade da declarante).
Os eventos relatados pelas Ofendidas, circunstanciados em termos de modo, tempo e lugar, são semelhantes e com grau de gravidade similar (a título exemplificativo, nenhuma das jovens vem relatar ao contrário das outras que o Arguido praticava actos sexuais de cópula em contexto escolar, com alunos ou outros).
Mais, algumas das declarações das jovens encontram amparo em prova testemunhal, como adiante discorreremos.
Escalpelizando.
O Arguido reconhece que era colaborador à data dos factos na Escola Profissional ... – EMP01..., e tal facto resulta pacífica e unanimemente de toda a prova Testemunhal produzida em sede de Audiência de Julgamento, corroborado ainda indiciariamente pelo documento de fls. 73.
Igualmente decorre das declarações do Arguido que as Ofendidas frequentavam aquele estabelecimento escolar, o que encontra amparo igualmente em fls. 26, 35, 46, 49, 53, 56, 59, 65 e 67, bem como nas declarações das próprias.
A idade das Ofendidas, e sua aparência resulta dos assentos de nascimento de fls. 150 a 156, das declarações das próprias, e da visualização do vídeo que se encontra em pen agrafada em contracapa.
Demonstraram-se assim os factos 1) e 2).
Ponderando as declarações para memória futura, singelas e credíveis, de BB, o Colectivo está convicto que os factos 3) e 4), ocorreram nos exactos termos que se deixaram transcritos.
O Arguido em Audiência reconheceu ter dado uma palmada no rabo à Menor de Idade, e em sede de contestação referiu que não se dirigiu à Menor de Idade dizendo “Estás muito sexy! Estás muito linda!” questionando-a também sobre se já tinha mantido relações sexuais e fazendo gestos obscenos. Por outro lado, a Jovem declarou que eventualmente num segundo momento/palmada, o Arguido lhe terá dito “Essas calças ficam-te muito bem!”, mas disse-o sem a segurança e falta de hesitação que demonstrou quanto à afirmação dos factos que se deixam como provados. Ora, como não resulta das declarações para memória futura prestadas pela própria, sem dúvidas, que o Arguido ao mesmo tempo que dava “nalgada” teve quaisquer comentários, como imputado em sede de Acusação Pública, a) resultou não provado.
No que respeita aos factos 5) a 7) a sua demonstração resultou das declarações para memória futura, sinceras e credíveis, de CC, corroboradas parcialmente [facto 5)] pela Menor de Idade BB, não se vislumbrando o ganho desta última em mentir, ainda mais falando de modo tão espontâneo, sem hesitação, e de forma coerente e lógica.
No seu discurso que se teve como seguro, atenta a idade da declarante, CC foi afirmativa e assertiva no que respeita às circunstâncias de tempo, afirmando que os factos dados como provados ocorreram ainda no 2.º período do ano lectivo de 2022/2023, o conduziu à não sedimentação de b).
Na mesma lógica, a convicção positiva quanto aos factos 8) a 11) passou pelas declarações para memória futura da Menor de Idade GG, que também não ofereceram dúvidas, pela assertividade, tendo-se as mesmas como credíveis, tanto mais porque harmoniosas (em termos de modo de agir e de estar do Arguido) com as declarações das restantes Ofendidas, não se vislumbrando exageros ou especial animosidade para com o Arguido.
As declarações para memória futura da Menor de Idade FF, impressionaram, pela independência e espírito crítico demonstrado, e foram essenciais para a demostração dos factos 12) a 15).
Mais, a autoconsciência demonstrada quanto à realidade social onde se mostra integrada é desconcertante. A Menor de Idade apenas falou quando sentiu segurança e após lhe ser dirigida uma explicação. De forma sincera, absolutamente compatível com a sua idade e desenvolvimento mental admitiu que achava que o que relatou era normal até que ouviu comentários de outras meninas.
Para além do mais, contribuiu de modo decisivo para a formação da convicção do Tribunal Colectivo, o depoimento da Testemunha WW, que aos costumes disse ser funcionário da Escola Profissional ... – EMP01..., desde pelo menos 2011, daí lhe advindo o conhecimento directo, no caso do facto 15).
A Testemunha WW, com um discurso rápido, mas plausível e credível, corroborou as declarações da Menor de Idade, no que tange ao facto 15), no que respeita à sua presença no momento, e quanto ao conteúdo da conversa ocorrida.
Não se considera razoável ponderar que a Testemunha tenha manipulado a Menor de Idade, para mentir nas suas declarações, para conseguir prejudicar o Arguido em termos profissionais. Com o devido respeito, não se nos afigura que a Testemunha tenha/tivesse essa capacidade, de molde a que a Menor de Idade falasse tão espontânea e coerentemente, de molde a convencer, como convenceu, este Colectivo. Esta dúvida quanto às capacidades de manipulação da Testemunha são percepcionáveis ouvindo-se o teor da gravação do seu depoimento, onde se percebe - e mais uma vez com o perdão da palavra, sempre com o devido respeito para com a Testemunha - parca eloquência e capacidade de argumentação. Portanto, não se crê que a Menor de Idade seja sugestionável, e menos ainda que tenha sido de algum modo manipulada pela Testemunha WW.
Não se olvida que a Testemunha WW demonstrou desaprovação no que tange às condutas (esta e outras que não constam da acusação) do Arguido. Mas a desaprovação constatada não significa que a(s) menor(es) de idade mentiram. Mais, os factos afirmados pela Testemunha não se desadequam ou contrariam, nem genérica, nem especificamente, as declarações para memória futura prestadas pela(s) menor(es) de idade.
Por outro lado, não decorre das declarações para memória futura de FF que entre Fevereiro e Marco de 2022, o Arguido colocando a mão na sua cintura lhe disse: “Já fizeste amor?”. Decorre, outrossim, que em dado momento, o Arguido disse à Menor de Idade “Já fizeste amor?”. A Jovem quanto ao momento concreto em que o facto terá ocorrido não o circunstanciou, nos termos constantes da acusação. Portanto, na dúvida, quanto às circunstâncias de tempo, c) resultou não provado, sedimentando-se apenas o que se deixou vertido em 12) e 13).
Em suma, ante tudo o que supra se deixou exposto, os factos 12) a 15) resultaram provados e c) não provado.
O facto 16) foi relatado, de modo credível, pela Menor de Idade II, e conjugando com as declarações para memória futura da Menor de Idade DD, que neste ponto foram descritivas e com conhecimento directo, logo credíveis, colheu demonstração.
O Arguido não negou os factos de modo integral, como se disse supra pretendeu imprimir aos factos objectivos uma outra representação - quanto a esta infra nos pronunciaremos.
Sucede que a Jovem II de modo espontâneo descreveu com algum detalhe e sem hesitação apenas uma (“última”) situação em que o Arguido lhe terá deslizado a mão para cima e para baixo (e usando as palavras do Arguido na sua defesa em Audiência) “na lateral superior de uma das coxas”. Quanto às 10/12 vezes imputadas em sede de Acusação Pública, a Jovem foi peremptória dizendo que foram várias vezes, questionada refere que foram 9/10, sendo que “a última vez [acha] que foi há três semanas”. Ora, atenta a idade da Jovem, não lhe retira credibilidade a circunstância de esta apenas conseguir descrever sem hesitação o facto mais recente. Porém, com a segurança exigível em direito penal não se conclui que o facto ocorreu 9 vezes ao invés de 10, ou vice-versa. Contudo, com segurança conclui-se que o facto que a jovem descreve como sendo o último, terá ocorrido pelo menos mais de uma vez, pois para existir um último teve que ter acontecido um primeiro. Logo conclui-se que o facto em questão ocorreu pelo menos duas vezes e isso se deixou vertido na factualidade assente de 16), consignando-se d) como não provado.
Das declarações para memória futura da Menor de Idade não decorre que enquanto o Arguido deslizava a mão para cima e para baixo na lateral superior de uma das coxas de II lhe dizia “És boa! És gostosa!”. A Jovem alude a “bué bonita”, o que ainda assim é diferente em termos de rudeza e sexualidade das primeiras expressões. Mais, das declarações para memória futura de DD, que diz ter assistido ao facto, o que se crê, também nada resultou em abono do uso das expressões imputadas ao Arguido. Donde, e) resultou não provado.
Ainda que não cumpra reproduzir as declarações que se mostram gravadas, para melhor enquadramento do raciocínio lógico, há que referir que DD mencionou, que no início do ano de 2022 o Arguido “começou [“-me] sempre a chamar giraça”, tendo sido corroborado por II o uso de expressões semelhantes em relação à Jovem DD pelo Arguido.
Em face desta verosimilhança 17) resultou provado.
Continuando, nas declarações para memória futura a Jovem DD após descrever o uso da palavra “giraça”, em 2022, passou a descrever factos que enquadrou no ano de 2023.
Este enquadramento está em perfeita sintonia com o conteúdo das declarações daqueloutra Jovem II que demonstrou uma memória mais nítida e clara quanto a factos ocorridos no ano de 2023, próximo ao mês de Maio e que diz ter memória de o Arguido dirigindo-se a DD ter dito que um vestido “ficava bem, que as mamas dela ficavam bué bem naquele vestido”.
A Jovem DD de modo espontâneo referiu que o Arguido lhe disse «”ah, ficam-te muito bem esses peitos nesse vestido, devias trazê-lo mais vezes”», o que é em tudo semelhante à expressão aludida pela Jovem II.
Nesta decorrência 18) resultou provado e f) não provado.
Uma vez que não foi mencionado pela Menor de Idade DD ou II, nem foi produzida qualquer outra prova a propósito, que o Arguido tenha dito dirigindo-se a DD “Devias trazer aquela peça de roupa mais vezes porque as mamas ficavam bem assim”, g) resultou não provado.
Relativamente ao facto 19) não fora as declarações para memória futura de HH serem suficientes por si só para a prova do facto, e devidamente circunstanciadas temporalmente (feriado em ...), estas mostram-se alcandoradas no depoimento claro, directo e credível da Testemunha XX, que aos costumes disse ser colaborador da Escola Profissional ... – EMP01..., pelo menos desde 2005. Para além de objectivamente declarações e depoimento se complementarem e harmonizarem, o sentimento de perplexidade que ambos deixaram perceber é coincidente, o que denota verosimilhança.
Finalmente, no que respeita a condutas objectivas externas, temos que os factos 20) a 22) colheram a sua sedimentação, igualmente nas declarações para memória futura, directas, singelas e credíveis, da Menor de Idade OO.
O Arguido reconheceu que se dirigiu nos termos provados em 21), e fez todo um outro enquadramento no que respeita ao facto 22), tentando convencer que tentava proteger a Jovem, e que poderá ter sido ríspido, o que por sua vez terá levado a que aquela quisesse retaliar contra o Arguido. Ou seja, tentou convencer o Arguido sem sucesso, por inverosímil, que a Jovem terá engendrado um plano para se vingar do dele por ficado chateada por este lhe chamar à atenção. Note-se que não é plausível que a Jovem, conseguisse que as restantes Ofendidas falassem como falaram perante Magistrado Judicial em declarações para memória futura, e que não suscitassem dívidas quanto às suas capacidades de “resistir” a manipulações e sugestões a perito, como no caso em apreço sucedeu. Tanto mais que a jovem alegadamente, nas suas palavras, faltava muito. Portanto, ainda que seja verdade que a Jovem EE estivesse incompatibilizada com o Arguido, não significa que as suas declarações contenham inverdades relativamente ao Arguido, e/ou que esta tenha manipulado uma situação, para aqui chegarmos. Em suma, não colheu a versão apresentada pelo Arguido.
As condutas objectivas dadas como provadas estão em harmonia com o relatado credivelmente pelas Ofendidas, contextualizado/normalizado pelo depoimento credível das Testemunhas WW e XX – a cuja razão de ciência já nos referimos supra.
Mais, em Audiência prestaram depoimento as Testemunhas YY e ZZ, que aos costumes disseram ter frequentado a Escola Profissional ... – EMP01..., à data dos factos. As Testemunhas quando aos factos constantes da acusação não têm conhecimento directo. Mas enquadraram o comportamento do Arguido, no sentido de que nada do que as Ofendidas declararam suscite estranheza ou desconfiança por parte deste Tribunal Colectivo. Ao invés tais depoimentos sedimentaram a credibilidade das declarações para memória futura das Ofendidas. Resumindo e em jeito de conclusão, as Juízes que compõem o Colectivo estão convictas que os factos 1) a 22) ocorreram nos termos ali descritos.
Quanto às representações e intenções do Arguido, conjugando as condutas que objectivamente se deram como provadas, não restam dúvidas, pelas declarações daquele que sabia a idade das menores de idade, como não podia deixar de saber, atentas as funções que exercia, que lhe permitiam ter acesso a tal informação, e porque o reconheceu.
O Arguido, com o 12.º ano de escolaridade, que trabalhava na Escola Profissional ... – EMP01..., é casado, tem filhos, tem acesso a informação, por meio de televisão e pelo menos, como qualquer cidadão medianamente sagaz, colocado na sua posição, não podia deixar de saber que a sua conduta, nos contextos em que o foi tem conotação sexual, bem como da punibilidade da sua conduta, cuja ilicitude material se encontra sedimentada na consciência ética da comunidade.
Não resulta dos autos que o Arguido agiu, como agiu, com intenção educativa ou correctiva. Aliás, é inverosímil que para educar ou corrigir o Arguido tivesse agido como agiu – por exemplo dando “nalgada” na Menor de Idade BB - ao invés de reportar a questão a quem teria competências de educação e correcção.
Não se crê que o Arguido, com mais de 30 anos, imbuído de espírito pedagógico, tivesse agido como agiu, sem prever a aparência e consequência das suas condutas, ou seja, não se crê que o Arguido desconhecesse a conotação sexual que assume uma ou várias palmadas no rabo, e que com isso se imiscui na liberdade de autodeterminação sexual das Ofendidas. O mesmo sucede com conversas assumidas pelo Arguido, de teor explicitamente sexual, como quando assume ter questionado à jovem EE “já fizeste a tua primeira vez”.
As Juízes que compõem o Colectivo não descortinam justificação plausível ou razoável para a conduta do Arguido, portanto outras não podem ter sido as suas representações e intenções que não as de compelir menores de idade a suportar contactos físicos sexualizados, e conversas de teor explicitamente sexual, com intenção de satisfazer os seus instintos libidinosos e de obter prazer sexual, o que fez com consciência de que as mesmas eram menores de idade, ofendendo os respectivos sentimentos de pudor, intimidade e liberdade sexual, erotizando-as antes de disporem de competências cognitivas, sociais e emocionais para regularizarem a sua sexualidade e evitarem o contacto sexual com o adulto, ainda para mais em contexto de estabelecimento escolar em que o Arguido exercia funções.
Não se coloca em questão que o Arguido fosse um “excelente” colaborador, isso mesmo foi dito pelas Testemunhas SS, TT, UU e VV – a cuja razão de ciência já nos referimos supra - e inclusivamente reconhecido pela Testemunha AAA, que aos costumes disse ser director da Escola Profissional ... – EMP01..., daí a prova do facto 43).
Não se questiona que o Arguido fosse jovial, e por isso tenha tido uma postura menos formal em relação aos alunos. Não se suscitam dúvidas de que Arguido e outros funcionários, tendo em conta a personalidade de alguns alunos, tenham tido atitudes de carinho como um abraço. Porém, não se coaduna com a normalidade do acontecer que um colaborador com mais de 30 anos de idade, integrado na Sociedade como o Arguido, tenha as conversas sexuais que teve com menores de idade e que as tocasse para além de um abraço ou um toque no ombro. Aliás, dizem-nos as regras da prudência - as quais o Arguido não podia deixar de conhecer porquanto social e familiarmente integrado - que em contexto escolar, auxiliares, professores, devem evitar (não estamos a afirmar que não o possam fazer) adoptar contactos mais íntimos com menores de idade, quanto mais envolver-se em conversas como “primeira vez” e “meter os dedos”.
As conversas tidas e que resultaram demonstradas em 8), 9), 13), 15), 18), 19) 21) e 22), não são explicáveis por “curiosidade”, na medida em que o Arguido à data tinha mais de 30 anos, era casado e tem uma filha. Portanto, resulta da experiência comum que o Arguido procurou, com aquelas conversas obter um mínimo de excitação e prazer sexual.
Veja-se que as Testemunhas SS, TT, UU e VV, arroladas pelo Arguido, têm-no em suma como simpático, afectuoso, disponível e descrevem que não assistiram a qualquer comportamento desadequado por parte do mesmo, o que não invalida o juízo probatório que se alcançou. Primeiro porque não se encontravam sempre com o Arguido. E em segundo lugar porque quando confrontadas com as condutas que vêm imputadas ao Arguido, distanciaram-se do discurso de atribuição de normalidade, exprimindo de forma mais ou menos explícita uma desadequação. Se as Testemunhas tivessem visto os comportamentos com que foram confrontadas e constantes da acusação, teriam chamado à atenção, como assertivamente referiram as Testemunhas TT e VV.
Não se ignora, que um sentimento de desvalorização dos comportamentos do Arguido, numa fase inicial, percorre todas as declarações para memória futura tomadas.
Mas, e isso parece-nos claro, e lógico, uma Menor de Idade ao ouvir (e assimilar, como é próprio do desenvolvimento de um Menor de Idade) que o Arguido teve um comportamento semelhante com outra aluna, e ao ouvir (e assimilar) que esse comportamento é desadequado, concluirá que aquele primeiro comportamento tido para consigo também é desadequado. Esta é a conclusão lógica a que chegará um Menor de Idade, ainda em desenvolvimento, designadamente sexual, que tendencialmente normalizará o sucedido, desde logo por não saber lidar com o mesmo, ou por achar que contribuiu para que determinados comportamentos tivessem lugar. E ainda mais, em contexto escolar, quando confrontado o Menor de Idade por actos e palavras praticados por alguém bem integrado nessa comunidade e que se mostre titular de uma posição de poder sobre os alunos (no caso o Arguido era funcionário).
Mas ao Julgador Penal compete racionalizar o comportamento e as expressões, e nesse sentido diremos que não se conclui por uma argumentação de normalização dos mesmos, por tudo quanto já vem sendo referido. Também não se conclui por uma argumentação de desvalorização e/ou negação, como o fez a Testemunha UU, para quem, nas suas palavras em súmula, se o assunto tivesse sido tratado pela escola “de outro modo”, (quiçá impedindo a divulgação das declarações das menores de idade, diremos nós) o evento teria ocorrido de outra forma. Um acontecimento ilícito não deixa de o ser, por ser mais ou menos divulgado, ou por ser tratado de uma forma ou de outra. Em conclusão, o Colectivo de Juízes conclui que o Arguido ao agir como agiu, quis satisfazer os seus instintos sexuais aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com as menores de idade por força das relações que tinha em virtude das funções que exercia na escola que estas frequentam/frequentavam.
Assim se explica a sedimentação de 23) a 26).
No que tange aos factos 27) a 43) a sua sedimentação ancora-se nos relatórios da perícia médico legal a que supra já se fez referência.
Relativamente aos factos atinentes às condições socioeconómicas do Arguido atendeu-se às declarações do próprio, da Testemunha NN, que aos costumes disse ser esposa do Arguido, em conjugação com o relatório social de fls. 811 e ss.
No que se refere à inexistência de antecedentes criminais pelo Arguido atentou-se no certificado de registo criminal de fls. 816.
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No que se refere ao aos factos não provados a) a g), já nos referimos supra e remetemos para a fundamentação aí expendida.
Por falta de prova nesse sentido, não se demonstrou que em data não concretamente apurada, mas no período lectivo de 2022/2023 o Arguido aproximou o corpo dele ao da vítima RR, e roçava o seu corpo no dela, designadamente friccionando-a no peito.
Explicitando, o facto h) não colhe afirmação no sentido exposto na acusação, porquanto o termo “roçar” tem uma conotação sexual, que vai para além de um abraço leve ou apertado, que é o que decorre das declarações para memória futura da Menor de Idade RR. Daí a sua não prova.
Em consequência, o Tribunal não ficou convencido que o Arguido agiu “roçando-se”, logo o elemento subjectivo de uma conduta que não se verificou não pode ser dado como provado. Assim, se explica parcialmente a não prova de i).
Ainda quanto ao facto não provado i), dir-se-á que as condutas dadas como provadas em 10), 12) 14), 16), 17) 20), podem no limite ser consideradas socialmente desadequadas, ou até gerar a dúvida sobre se não se tratariam efectivamente de actos corriqueiros de carinho, protecção, simpatia ou simples grosseria. A circunstância de se terem dado como provadas condutas ilícitas praticadas pelo Arguido, não permite que se extrapole/presuma sempre e sem mais para a ilicitude de todas as suas condutas relacionadas com todas as alunas do estabelecimento aqui em causa.
O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através de uma espécie de presunções. O recurso às presunções naturais não viola o princípio do in dubio pro reo, pois elas cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto, pelo que aquele princípio constitui o limite àquele recurso.[2]
A dúvida que assim se deixa expressa, que se tem por razoável, terá de fazer funcionar o princípio da presunção de inocência, neste ponto em concreto, valorando a versão fáctica que mais beneficia o arguido.
Finalmente, não se conclui que o Arguido tenha agido com o intuito de ofender a honra e consideração das Ofendidas, porquanto não era nem à honra nem à Consideração social, que o Arguido dirigia a sua conduta, mas sim à liberdade de autodeterminação sexual das mesmas, como decorre dos factos objectivamente provados, daí a não prova de j).
*
Assim, em face do que supra se elenca, considerou o Tribunal Colectivo que o Arguido praticou os factos nos exactos termos em que estes foram considerados provados.»
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2. Apreciando

Dispõe o artigo 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.
Por isso é entendimento unânime que as conclusões da motivação constituem o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
Nas suas conclusões o arguido veio invocar a nulidade do acórdão recorrido, por violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 1ª parte, e 379.º, n.º 1, a), ambos do Código de Processo Penal, assim como impugna a medida da pena única principal aplicada pelo tribunal a quo e afirma a existência dos vícios previstos nas als. a), b) e c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, sem que estas questões tenham sido minimamente afloradas no corpo da motivação.
Como resulta com clareza do citado artigo 412.º, n.º 1, os fundamentos do recurso são enunciados na motivação, servindo as conclusões, tão só, para resumir as razões do pedido.
Servindo as conclusões para resumir as razões do pedido, têm elas que reflectir a matéria desenvolvida no corpo da motivação, não podendo servir para alargar o objecto do processo a matéria estranhas e naquele não tratadas, como sucede com a nulidade do acórdão recorrido, por violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 1ª parte, e 379.º, n.º 1, a), ambos do CPP, a medida da pena única principal e os vícios previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, matérias referidas pelo recorrente nas conclusões sem que tenham sido tratadas no corpo da motivação([2]).
Por isso a lei admite o aperfeiçoamento das conclusões (n.º 3 do artigo 417.º) mas já não o aperfeiçoamento da motivação que fixa definitivamente o âmbito do recurso e é imodificável (n.º 4 do artigo 417.º).
Como se assinalou em acórdão do Supremo Tribunal de Justiça “o objecto dos recursos é definido pelas conclusões com que o recorrente encerra a motivação, desde que não extravasem as questões abordadas no corpo da mesma motivação. Isto é, se, nas conclusões, o recorrente pode restringir expressa ou tacitamente o objecto do recurso tal como delineado ao longo da motivação, já as questões suscitadas nas conclusões sem correspondência na motivação se têm de considerar fora do objecto do mesmo (nas conclusões, o recorrente não pode ampliar o objecto do recurso) - arts. 412.º do CPP, 684.º, n.º 3, e 685.º-A, n.º 1, do CPC.”([3]).
Não se considera, pois, integrar o objecto do recurso do arguido a questão da nulidade do acórdão recorrido, por violação do disposto nos artigos 374.º, n.º 2, 1ª parte, e 379.º, n.º 1, a), ambos do CPP, assim como a impugnação da medida da pena única principal e a existência dos vícios previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, pelo delas não cumpre conhecer.
Assim, atenta a conformação das conclusões formuladas, importa conhecer das seguintes questões, organizadas pela ordem lógica das consequências da sua eventual procedência:
-  nulidade do acórdão por alteração substancial dos factos [recurso do arguido];
- erro notório na apreciação da prova [recurso do Ministério Público];
- contradição insanável entre a fundamentação e a decisão [recurso do Ministério Público];
- impugnação da matéria de facto [recurso do arguido];
- violação do princípio in dubio pro reo [recurso do arguido];
- qualificação jurídica dos factos [recurso do arguido e recurso do Ministério Público];
- arbitramento de indemnização [recurso do arguido]

2.1. Da nulidade do acórdão por alteração substancial dos factos [recurso do arguido]
Alega o arguido que a alteração da qualificação jurídica dos factos operada pelo tribunal a quo, traduzindo-se numa agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, reconduz-se a uma alteração substancial dos factos pelo que tal alteração não podia ser tomada em conta nos termos das disposições conjugadas dos artigos 359.º, n.º 1 e 1.º, al. f) ambos do Código de Processo Penal.
Vejamos.
Um processo penal como o nosso, de estrutura basicamente acusatória integrado por um princípio de investigação, admite que, sendo a descrição dos factos na acusação uma narração sintética, nem todos os factos ou circunstâncias factuais relativas ao crime acusado possam constar desde logo dessa peça, podendo surgir durante a discussão factos novos que traduzam alteração dos anteriormente descritos, matéria regulada nos artigos 303.º, 358.º e 359.º que distinguem entre “alteração substancial” e “alteração não substancial” dos factos descritos na acusação ou pronúncia.
Estaremos perante factos novos e portanto perante uma alteração dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, quando se modifica – substitui ou adita – o concreto «pedaço de vida» que constitui o objecto do processo, dando-lhe uma outra imagem.
Para essa distinção releva a definição constante do artigo 1.º, n.º 1, f) do Código de Processo Penal, segundo a qual se considera alteração substancial dos factos “aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”.
Assim, primeiro requisito é que ocorra uma modificação dos factos, considerando-se facto o acontecimento ou ocorrência, passada ou presente, susceptível de prova. Depois, é necessário que a modificação ocorra em factos relevantes para a imputação de um crime ou para a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.
A alínea a) do mesmo artigo define «crime» como o conjunto de pressupostos de que depende a aplicação ao agente de uma pena ou de uma medida de segurança criminais.
O crime que para este efeito releva é o crime diverso, entendido, não como diferente tipo legal, em sentido substantivo, mas no sentido de facto diferente, situado para além dos limites do «pedaço da vida» que constitui o objecto do processo e, portanto, um crime novo.
A autonomia dos critérios estabelecidos no art. 1.º, f) do Código de Processo Penal determina que não deixa de ser crime diverso o que, face à alteração dos factos, passa a ser punido com sanção menos grave.
A alteração não substancial dos factos define-se por exclusão de partes, sendo, portanto, toda a alteração de factos que não tiver por efeito a imputação ao arguido de crime diverso, ou a agravação do limite máximo da pena aplicável, pressuposta, evidentemente, a sua relevância para a decisão da causa (cfr. art. 358.º, n.º 1 do Cód. de Processo Penal).
O artigo 359.º rege para a alteração substancial e determina que tal alteração da factualidade descrita na acusação não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, nem implica a extinção da instância.
Tratando-se de novos factos autonomizáveis em relação ao objecto do processo, a comunicação da alteração ao Ministério Público vale como denúncia (n.º 2), ressalvando-se a possibilidade de acordo entre o Ministério Publico, o arguido e o assistente na continuação do julgamento se o conhecimento dos factos novos não determinar a incompetência do tribunal (n.º 3), concedendo-se então ao arguido, a requerimento, um prazo para preparação da defesa não superior a 10 dias, com o consequente adiamento da audiência, se necessário (n.º 4).
Diversamente, se a alteração dos factos for não substancial, isto é, não determinar uma alteração do objecto do processo, então o tribunal pode investigar e integrar no processo factos que não constem da acusação ou da pronúncia e que tenham relevo para a decisão da causa, exigindo-se, porém, que ao arguido seja comunicada a alteração e que se lhe conceda, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa (n.º 1 do artigo 358.º), ressalvando-se os casos em que a alteração derive de factos alegados pela defesa (n.º 2).
O artigo 379.º, n.º 1 estabelece as situações em que uma sentença é nula, sendo uma delas, no que ora interessa, a prevista na sua alínea b), o que sucederá quando se “condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos artigos 358.º e 359.º”.
Ínsito a tais preceitos encontra-se subjacente o princípio do contraditório, o qual, encarado no ponto de vista do arguido, pretende assegurar os seus direitos de defesa com a abrangência imposta pelo artigo 32.º, nºs 1 e 5 da Constituição da República, no sentido de que nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem nenhuma decisão deve ser proferida, sem que previamente tenha sido precedida de ampla e efectiva possibilidade de ser contestada ou valorada pelo sujeito processual contra o qual aquelas são dirigidas([4]).
 Trata-se, no fundo, do “direito de ser ouvido”, enquanto direito de se dispor de uma efectiva oportunidade processual para se tomar uma posição sobre aquilo que o afecta([5]).
No caso em apreço, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido imputando-lhe a prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo de, “pelo menos cinco crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo art.º 171.º, n.º 1 e 2, al. b) do CP e quatro crimes de importunação sexual, p. e p. pelo art.º 170.º, n.º 1 do CP.”.
Em sede de audiência de julgamento, após a produção de prova, o tribunal a quo proferiu, em 12.03.2025, o seguinte despacho:
«O Tribunal ao abrigo do art.º 358º do CPP vai proceder à comunicação de alteração não substancial dos factos e também à alteração da qualificação jurídica porquanto, após produção de prova:
- No ano lectivo de 2022/2023, entre Janeiro e Março de 2023, em dias não concretamente apurados, pelo menos por duas vezes, o Arguido desferiu uma palmada nas nádegas da CC.
- Em datas não concretamente apuradas, mas anteriores a Junho de 2023, o Arguido dirigindo-se a FF, disse-lhe: “Já fizeste amor?”.
- Nas circunstâncias de modo mencionadas em 2), em data não apurada, mas após Maio de 2023, pelo menos duas vezes, quando a vítima II se encontrava no corredor de acesso às salas de aula do ... piso, o Arguido abeirou-se dela, ao mesmo tempo que dizia “És boa! És gostosa!”, deslizou a mão para cima e para baixo na lateral superior de uma das coxas de II.
- Em data não concretamente apurada do ano de 2023, antes do mês de Junho, o Arguido disse dirigindo-se a DD “Fica-te bem o vestido com essas mamas, devias trazê-lo mais vezes!”.
Relativamente à alteração da qualificação jurídica o Tribunal entende que resultaram da instrução da causa factos susceptíveis de consubstanciar a prática de:
- dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a), na pessoa de BB;
- três crimes de abuso sexual de menores dependentes, previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a), na pessoa de CC;
- um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea b) na pessoa de DD;
- um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a), na pessoa de EE;
- dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alíneas a) e b), na pessoa de FF;
- dois crimes de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea b) do Código Penal, na pessoa de GG;
- um crime de abuso sexual de menores dependentes previsto e punido pelo artigo 172.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alínea a) do Código Penal, na pessoa de GG;
- um crime de abuso sexual de menores previsto no artigo 171.º, n.º 3, por referência ao artigo 170.º do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, alíneas a), na pessoa de HH;
- Pena acessória proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual, previsto e punido pelo artigo 69.º B, n.º 2 do Código Penal.
Notifique.»
Este despacho foi notificado a todos os presentes, tendo o ilustre mandatário do arguido requerido a concessão de prazo para preparação da defesa, o que foi concedido.
Os factos comunicados pelo tribunal a quo correspondem aos factos descritos nos artigos 6, 14, 17 e 18 da acusação com a seguinte redacção:
«6 - Em data não apurada, mas seguramente no 2.º e 3.º período do ano letivo de 2022/2023, pelo menos por duas vezes, o arguido desferiu uma palmada nas nádegas da CC;
14 - Numa dessas ocasiões, disse-lhe: “Já fizeste amor?”;
17 - Em data não apurada mas há cerca de 2 meses, por várias vezes (cerca de 10/12 xx) quando a vítima II se encontrava no corredor de acesso às salas de aula do ... piso, o arguido abeirou-se dela, e ao mesmo tempo que dizia “És boa! És gostosa!”, passou-lhe a mão nas coxas;
18 - No início do ano de 2022, o arguido, por várias vezes, dirigiu-se à vitima DD e chamou-lhe “Giraça!”, sendo que numa dessas vezes lhe disse: “Fica-te bem o vestido com essas mamas!” e noutra, disse-lhe: “Devias trazer aquela peça de roupa mais vezes porque as mamas ficavam bem assim”.»
Como resulta do cotejo entre os factos descritos na acusação e os factos indiciados o tribunal a quo concretizou, quanto ao artigo 6.º da acusação, que a conduta do arguido ocorreu entre Janeiro e Março de 2023, isto é, no período temporal referido na acusação, no que respeita ao artigo 14.º da acusação concretizou que o arguido se dirigiu à menor em datas não concretamente apuradas mas anteriores a Junho de 2023, que se referem também ao período temporal referido na acusação, e relativamente ao artigo 17.º da acusação concretizou uma data ainda no período temporal referido na acusação, tratando-se, pois, de factos que concretizaram as circunstâncias de tempo dos factos descritos na acusação, inexistindo, portanto, factos novos.
No que respeita ao artigo 18.º da acusação o tribunal a quo concretizou que uma das vezes em que o arguido se dirigiu dessa forma à menor ocorreu em data não apurada do ano de 2023 antes do mês de Junho de 2023, enquanto na acusação todas as vezes eram situadas no início de 2022, mas esta alteração não alterou a essencialidade da acção levada a cabo pelo recorrente, nem o resultado provocado, assim como não lhe conferiu uma imagem diferenciada pela variação que nela introduziu a apontada circunstância, não alterando, portanto, o objecto do processo.
Assim, a alteração dos factos operada foi uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação, sujeita, portanto, ao regime previsto no artigo 358.º do Código de Processo Penal.
Por outro lado, por entender que os factos indiciados eram susceptíveis de consubstanciar a prática de dois crimes de abuso sexual de menores dependentes. p. e p. pelo artigo 172.º, nºs 1, b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, a), na pessoa de BB, três crimes de abuso sexual de menores dependentes, p. e p. pelo artigo 172.º, nº 1, b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, a), na pessoa de CC, um crime de abuso sexual de menores dependentes. p. e p. pelo artigo 172.º, nºs 1, b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, b) na pessoa de DD, um crime de abuso sexual de menores dependentes, p. e p. pelo artigo 172.º, nºs 1, b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, a), na pessoa de EE, dois crimes de abuso sexual de menores dependentes, p. e p. pelo artigo 172.º, nºs 1, b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, a) e b), na pessoa de FF, dois crimes de abuso sexual de menores dependentes, p. e p. pelo artigo 172.º, nºs 1, b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, b) do Código Penal, na pessoa de GG, um crime de abuso sexual de menores dependentes, p. e p. pelo artigo 172.º, nº 1, b) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 3, a) do Código Penal, na pessoa de GG, um crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171.º, n.º 3, a), por referência ao artigo 170.º do Código Penal, na pessoa de HH e bem assim com pena acessória proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual, nos termos previstos pelo artigo 69.º B, n.º 2 do Código Penal, o tribunal a quo procedeu à comunicação desta alteração da qualificação jurídica dos factos.
A este respeito importa distinguir entre alteração dos factos e alteração da qualificação jurídica dos factos, pois esta é permitida até o momento da sentença, desde que os factos permaneçam os mesmos e o arguido tenha tido oportunidade de se defender.
Como refere Maria João Antunes, a questão da alteração dos factos é distinta da alteração da qualificação jurídica dos factos, desde logo, porque se sabe de antemão que a discussão da causa tem por objecto os factos alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da prova produzida na audiência, bem como todas as soluções jurídicas, independentemente da qualificação jurídica dos factos resultante da acusação ou da pronúncia (artigo 339.º, n.º 4 do CPP), havendo alteração da qualificação jurídica dos factos quando os factos se mantêm, alterando-se somente a sua qualificação jurídica([6]).
A alteração substancial ou não substancial dos factos não deve ser confundida com a alteração da qualificação jurídica dos mesmos, nada impedindo que com base nos factos constantes da acusação, ou ainda dos resultantes de uma alteração não substancial, o tribunal venha a condenar por crime diverso – e mesmo mais grave –, posto que, com vista a assegurar um efectivo exercício do direito de defesa, máxime o contraditório, comunique a alteração da qualificação jurídica e, sendo o caso, a alteração não substancial dos factos, concedendo, se requerido, prazo para preparação da defesa – artigo 358.º, nºs 1 e 3 do CPP([7]).
No caso em apreço, o tribunal a quo operou uma alteração não substancial do factos e uma alteração da qualificação jurídica dos factos em moldes diferentes da qualificação jurídica que deles fez o Ministério Público na acusação, as quais foram devidamente comunicadas, em cumprimento do disposto no artigo 358.º, nºs 1 e 3 do CPP, assim se assegurando as garantias de defesa do arguido e o contraditório.
Por conseguinte, tendo as alterações efectuadas pelo tribunal a quo sido comunicadas ao arguido, com observância do regime decorrente do apontado artigo 358.º do Código de Processo Penal, improcede a invocada nulidade.

2.2. Dos vícios decisórios [erro notório na apreciação da prova e contradição insanável entre a fundamentação e a decisão – recurso do Ministério Público]
Alega o Ministério Público que o tribunal a quo incorreu em erro notório na apreciação da prova, nos termos previstos no artigo 410.º, n.º 2, al. c) do Código de Processo Penal, ao julgar como provado o facto descrito no ponto 16) dos factos provados e como não provado o facto mencionado na alínea i) da matéria de facto não provada, na parte em que se refere ao ponto 16), acrescentando que a matéria assente no ponto 16) dos factos provados encontra-se em contradição com a factualidade julgada como não provada na alínea i) e a correspondente fundamentação, vício este previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal.
Vejamos.
Os vícios previstos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal – a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação do prova – respeitam à estrutura interna da decisão penal, exigindo a lei, por tal razão, que a sua demonstração resulte do respectivo texto por si só, ou em conjugação com as regras da experiência comum.
No âmbito da revista alargada – comum designação do regime – o tribunal de recurso não conhece da matéria de facto – no sentido da reapreciação da prova –, limitando a sua actuação à detecção dos vícios que a sentença, por si só e nos seus precisos termos, evidencia e, não podendo saná-los, determina o reenvio do processo para novo julgamento. 
A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão consiste na incompatibilidade, insusceptível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão.
Existe tal vício quando, de acordo com um raciocínio lógico na base do texto da decisão, por si ou conjugado com as regras da experiência comum, seja de concluir que a fundamentação justifica decisão oposta, ou não justifica a decisão, ou torna-a fundamentalmente insuficiente, por contradição insanável entre factos provados, entre factos provados e não provados, entre uns e outros e a indicação e a análise dos meios de prova fundamentos da convicção do Tribunal([8]).
Ocorrerá, por exemplo, quando um mesmo facto com interesse para a decisão da causa seja julgado como provado e não provado, ou quando se considerem como provados factos incompatíveis entre si, de modo a que apenas um deles pode persistir, ou quando for de concluir que a fundamentação conduz a uma decisão contrária àquela que foi tomada.
No que respeita ao erro notório na apreciação da prova, tal vício verifica-se quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios.
O apontado vício é aquele que é evidente, que não escapa ao homem comum, de que um observador médio se apercebe com facilidade, que é patente, só podendo relevar se for ostensivo, inquestionável e perceptível pelo comum dos observadores ou pelas faculdades de apreciação do “homem médio”.
O vício existe quando se dão por provados factos que, face às regras de experiência comum e à lógica corrente, do homem médio, não se teriam podido verificar ou são contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsos([9]).
Trata-se de um vício do raciocínio na apreciação das provas, evidenciado pela simples leitura do texto da decisão; erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, sem necessidade de particular exercício mental; as provas revelam claramente um sentido e a decisão recorrida extraiu ilação contrária, logicamente impossível, incluindo na matéria fáctica provada ou excluindo dela algum facto essencial.
Assim balizado o vício do erro notório, lida a decisão em crise, não vemos que nela tenha sido considerado não provado um facto que, notoriamente, não pudesse ter deixado de ter acontecido, nem que tenha sido valorado um qualquer meio de prova ao arrepio de critério legal estabelecido ou que esta tenha sido valorada contra as regras da experiência comum.
Desde logo há que afastar a possibilidade de o mesmo ter origem na violação de critérios de prova legalmente fixados, isto é, na inobservância de regras de prova vinculada, isto porque não vemos, nem o recorrente a identifica, que concreta regra ou critério tenha sido desrespeitado.
Quanto à valoração da prova contra regras da experiência comum, entendendo-se por estas, na lição de Cavaleiro de Ferreira, as definições ou juízos hipotéticos de conteúdo genérico, independentes do caso concreto sub judice, assentes na experiência comum, e por isso independentes dos casos individuais em cuja observação se alicerçam, mas para além dos quais têm validade([10]), também não vemos que regra, com esta natureza, tenha sido violada pelo tribunal a quo, sendo certo que tão-pouco o recorrente a indica.
O que parece ser o verdadeiro propósito do recorrente é antes discordar da decisão sobre a matéria de facto proferida por entender que a conduta descrita no ponto 16) dos factos provados integra o conceito de acto sexual de relevo, tratando-se, portanto, de uma questão jurídica que se prende com a densificação deste conceito.
Esta discordância já não tem a ver com o regime dos vícios da decisão, pois se erro houve na valoração da prova produzida, ele não terá a qualidade de notório, o que arreda a verificação do vício em análise.
Assim balizada a questão, ela nada tem a ver com o invocado vício, mas antes com a discordância do recorrente em relação a um concreto aspecto da decisão proferida sobre a matéria de facto, discordância que poderia ter sido sindicada nos termos da impugnação ampla da matéria de facto regulada, essencialmente, no artigo 412.º do Código de Processo Penal. Acontece que o recorrente não impugnou a decisão de facto, concretamente, a alínea i) dos factos não provados, nestes termos.
No que respeita à invocada contradição insanável entre a fundamentação e a decisão dir-se-á que o excerto da fundamentação do acórdão recorrido que foi transcrito pelo recorrente [«a factualidade em análise, por si só, carece de idoneidade para, entre outros, se considerar que o Arguido representou ou apresentou a Jovem como envolvida em comportamento sexual explicito, logo a conduta dada como provada carece de autonomia e adequação para prejudicar o livre e harmonioso desenvolvimento da personalidade da Ofendida Menor de Idade na esfera sexual.»] diz respeito à fundamentação jurídica do acórdão, sendo que os vícios previstos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal são vícios da decisão sobre a matéria de facto.
Em relação ao ponto 16) dos factos provados consta da fundamentação de facto do acórdão o seguinte:
«O facto 16) foi relatado, de modo credível, pela Menor de Idade II, e conjugando com as declarações para memória futura da Menor de Idade DD, que neste ponto foram descritivas e com conhecimento directo, logo credíveis, colheu demonstração.
O Arguido não negou os factos de modo integral, como se disse supra pretendeu imprimir aos factos objectivos uma outra representação - quanto a esta infra nos pronunciaremos.
Sucede que a Jovem II de modo espontâneo descreveu com algum detalhe e sem hesitação apenas uma (“última”) situação em que o Arguido lhe terá deslizado a mão para cima e para baixo (e usando as palavras do Arguido na sua defesa em Audiência) “na lateral superior de uma das coxas”. Quanto às 10/12 vezes imputadas em sede de Acusação Pública, a Jovem foi peremptória dizendo que foram várias vezes, questionada refere que foram 9/10, sendo que “a última vez [acha] que foi há três semanas”. Ora, atenta a idade da Jovem, não lhe retira credibilidade a circunstância de esta apenas conseguir descrever sem hesitação o facto mais recente. Porém, com a segurança exigível em direito penal não se conclui que o facto ocorreu 9 vezes ao invés de 10, ou vice-versa. Contudo, com segurança conclui-se que o facto que a jovem descreve como sendo o último, terá ocorrido pelo menos mais de uma vez, pois para existir um último teve que ter acontecido um primeiro. Logo conclui-se que o facto em questão ocorreu pelo menos duas vezes e isso se deixou vertido na factualidade assente de 16), consignando-se d) como não provado.»
No que respeita à factualidade julgada não provada na alínea i) consta o seguinte da fundamentação de facto do acórdão:
«Ainda quanto ao facto não provado i), dir-se-á que as condutas dadas como provadas em 10), 12) 14), 16), 17) 20), podem no limite ser consideradas socialmente desadequadas, ou até gerar a dúvida sobre se não se tratariam efectivamente de actos corriqueiros de carinho, protecção, simpatia ou simples grosseria. A circunstância de se terem dado como provadas condutas ilícitas praticadas pelo Arguido, não permite que se extrapole/presuma sempre e sem mais para a ilicitude de todas as suas condutas relacionadas com todas as alunas do estabelecimento aqui em causa.
O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através de uma espécie de presunções. O recurso às presunções naturais não viola o princípio do in dubio pro reo, pois elas cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto, pelo que aquele princípio constitui o limite àquele recurso.[3]
A dúvida que assim se deixa expressa, que se tem por razoável, terá de fazer funcionar o princípio da presunção de inocência, neste ponto em concreto, valorando a versão fáctica que mais beneficia o arguido.»
Assim, não vislumbramos qualquer contradição, muito menos insanável, entre a matéria assente no ponto 16) dos factos provados, a factualidade julgada não provada na alínea i) e a correspondente fundamentação, assim como não vislumbramos qualquer incompatibilidade entre aquele ponto dos factos provados e a alínea i) dos factos não provados.
Em conclusão, não padece o acórdão recorrido dos apontados vícios.

2.3. Da impugnação ampla da matéria de facto [recurso do arguido]
Nos termos do disposto no artigo 428.º os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito.
Uma vez que no caso em apreço houve documentação da prova produzida em audiência, com a respectiva gravação, pode este tribunal reapreciar em termos amplos a prova, nos termos dos artigos 412.º, n.º 3 e 431.º, b), ficando, todavia, o seu poder de cognição delimitado pelas conclusões da motivação do recorrente.
É sabido que a matéria de facto pode ser sindicada no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, no que se convencionou chamar de “revista alargada”, ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, nºs 3, 4 e 6.
No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos estranhos àquela para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento([11]).
No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos nºs 3 e 4 do artigo 412.º.
Nos casos de impugnação ampla, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, agora com base na audição de gravações, antes constituindo um mero remédio para obviar a eventuais erros ou incorrecções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, na perspectiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente.
O recurso que impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não pressupõe, por conseguinte, a reapreciação total do acervo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas antes uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos «concretos pontos de facto» que o recorrente especifique como incorrectamente julgados.
Para esse efeito, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa([12]).
Justamente porque o recurso em que se impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não constituiu um novo julgamento do objecto do processo, mas antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir, cirurgicamente, erros in judicando ou in procedendo, que o recorrente deve expressamente indicar, impõe-se a este o ónus de proceder a uma tríplice especificação, estabelecendo o artigo 412.º, n.º 3, o seguinte:
«Quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) As provas que devem ser renovadas.»
A especificação dos «concretos pontos de facto» traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorrectamente julgados.
A especificação das «concretas provas» só se satisfaz com a indicação do conteúdo especifico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essas «provas» impõem decisão diversa da recorrida.
A especificação das provas que devem ser renovadas implica a indicação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em 1ª instância cuja renovação se pretenda, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, e das razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo (cfr. artigo 430.º).
Estabelece ainda o n.º 4 do artigo 412.º que, havendo gravação das provas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens (das gravações) em que se funda a impugnação, pois são essas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo tribunal, sem prejuízo de outras relevantes (n.º 6 do artigo 412.º)([13]).
Ao apreciar-se o processo de formação da convicção do julgador não pode ignorar-se que a apreciação da prova obedece ao disposto no artigo 127.º, ou seja, fora as excepções relativas a prova legal, assenta na livre convicção do julgador e nas regras da experiência, não podendo também esquecer-se o que a imediação em 1.ª instância dá e o julgamento da Relação não permite.
Como se tem entendido, a reapreciação, com base em meios de prova com força probatória não vinculativa, da decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto deverá ser feita com o cuidado e ponderação necessárias, face aos princípios da oralidade, imediação e livre apreciação da prova.
São inúmeros os factores relevantes na apreciação da credibilidade do teor de um depoimento que só são apreensíveis pelo julgador mediante o contacto directo com os depoentes na audiência.
Embora a reapreciação da matéria de facto, no que ao Tribunal da Relação se refere, esteja igualmente subordinada ao princípio da livre apreciação da prova e sem limitação (à excepção da prova vinculada) no processo de formação da sua convicção, deverá ela ter em conta que dos referidos princípios decorrem aspectos de relevância indiscutível (reacções do próprio depoente ou de outros, hesitações, pausas, gestos, expressões) na valoração dos depoimentos pessoais que melhor são perceptíveis pela 1ª instância.
À Relação caberá, sem esquecer tais limitações, analisar o processo de formação da convicção do julgador, apreciando, com base na prova gravada e demais elementos de prova constantes dos autos, se as respostas dadas apresentam erro evidenciável e/ou se têm suporte razoável nas provas e nas regras da lógica, experiência e conhecimento comuns, não bastando, para eventual alteração, diferente convicção ou avaliação do recorrente quanto à prova testemunhal produzida.
Assim, se a decisão factual do tribunal recorrido se baseia numa livre convicção objectivada numa fundamentação compreensível e naquela optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção – obtida com o benefício da imediação e da oralidade – apenas pode ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.
Não basta, pois, que o recorrente pretenda fazer uma “revisão” da convicção obtida pelo tribunal recorrido por via de argumentos que permitam concluir que uma outra convicção “era possível”, sendo imperiosa a demonstração de que as provas indicadas impõem uma outra convicção.
A demonstração desta imposição recai sobre o recorrente que deve relacionar o conteúdo específico de cada meio de prova que impõe decisão diversa da recorrida com o facto individualizado que considera incorrectamente julgado([14]).
Torna-se necessário que demonstre que a convicção obtida pelo tribunal recorrido é uma impossibilidade lógica, uma impossibilidade probatória, uma violação de regras de experiência comum, uma patentemente errada utilização de presunções naturais, ou seja, que demonstre não só a possível incorrecção decisória mas o absoluto da imperatividade de uma diferente convicção.
Tudo isto vem para se dizer que o trabalho que cabe à Relação fazer, na sindicância do apuramento dos factos realizado em 1.ª instância, se traduz fundamentalmente em analisar o processo de formação da convicção do julgador, e concluir, ou não, pela perfeita razoabilidade de se ter dado por provado o que se deu por provado([15]).
O Tribunal da Relação só pode/deve determinar uma alteração da matéria de facto assente quando concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão([16]).
A utilização do termo “impor” no artigo 412.º do Código de Processo Penal “…revela que para o legislador essa alteração terá de ter um grau de exigência elevado, ou seja, que ela só ocorrerá se a prova invocada for suficientemente forte não só para colocar algumas dúvidas, mas para determinar sem lugar a dúvidas razoáveis uma decisão diferente.”([17]).
Expostas estas breves considerações sobre o sentido e alcance da impugnação ampla da matéria de facto, assim como sobre os ónus impostos ao recorrente, passemos à análise do caso concreto.
O recorrente manifesta discordância sobre a matéria de facto por entender que ocorreu erro de julgamento quanto aos factos n.ºs 3), 4), 5), 6), 7), 8), 9), 10), 11), 12), 13), 14), 15), 16), 18), 19), 20), 21), 22), 23), 24), 26), 28), 30), 32), 34), 36), 38), 40), 42), 44) e 51) que deveriam ter sido considerados não provados ou ter diferente redacção.
Como resulta da motivação de facto do acórdão o tribunal a quo formou a sua convicção com base no conjunto da prova produzida e examinada em audiência, analisada criticamente e segundo as regras da experiência comum, sendo essenciais, para a prova dos factos impugnados, as declarações para memória futura das ofendidas, que mereceram inteira credibilidade, conjugadas com os relatórios das perícias médico-legais de fls. 413 e segs. e com os depoimentos das testemunhas WW, XX, YY e ZZ.
Atenta a natureza dos crimes em causa nos presentes autos, importa antes de mais realçar a importância das declarações para memória futura prestadas pelas menores, ofendidas nos autos.
A prova nos crimes de abuso sexual de crianças e menores apresenta quase sempre um elevado grau de dificuldade pela simples razão de que o agente não chama ninguém para presenciar os factos e procura ambientes reservados para os praticar, sendo, por isso, na esmagadora maioria dos casos, o meio de prova fundamental, porque único meio de prova directa existente, a própria vítima.   
Assim, o que quase sempre é colocado em causa, num exercício legítimo do direito de defesa, é a credibilidade do depoimento da vítima, quer em função da sua qualidade processual, quer em função da sua pouca idade.
É verdade que, frequentemente, o pudor, o sentimento de vergonha e o sofrimento da memória, conduzem a vítima, numa atitude de auto-protecção, a manter reserva e distanciamento quando instada sobre os factos, o que faz com que o seu depoimento – por isso, também as declarações para memória futura – contenha, como é natural, imprecisões, incongruências, contradições, intermitências e omissões.
Estes factores podem ter influência na valoração probatória do depoimento da vítima, mas não significam, por si só, a desconsideração deste meio de prova. Pelo contrário, o juiz, conhecedor destas circunstâncias, deve contextualizar o depoimento, conjugá-lo com os outros meios de prova indirecta disponíveis e, a final, no seu prudente juízo, valorá-lo, positiva ou negativamente.
Por outro lado, as declarações prestadas pelo arguido não têm a força probatória que o recorrente lhe empresta, pois não existe dispositivo legal que atribua força probatória plena às declarações do arguido, muito menos quando se trata de “confissão” de factos que lhe são favoráveis e não têm apoio em qualquer outro meio probatório, estando as suas declarações sujeitas ao critério geral da apreciação livre e motivada.
Não existe norma ou princípio que imponha a aceitação das declarações do arguido em bloco ou em todas as afirmações que profira, mormente na parte em que constituem puro subjectivismo e são infirmadas por outros meios de prova.
Ao invés, como resulta do critério da apreciação livre e motivada, deverá ser-lhe atribuída credibilidade quando o mereçam, o mesmo é dizer quando corroboradas por outros meios de prova, pelas regras da experiência comum e da lógica.
Posto isto.
Quanto aos pontos 3) e 4) dos factos provados, o recorrente transcreveu excertos das declarações para memória futura da menor BB para afirmar que temos apenas a versão da menor, que nem se recorda da suposta primeira nalgada, e a versão do arguido que admitiu ter dado uma palmada mas como forma correctiva, ou seja, deu-lhe uma palmada na nádega para corrigir e repreender da situação em que estava a dar nalgadas aos seus colegas, o que constitui um acto pedagógico e correctivo.
Entende, assim, que o facto provado n.º 3) deve ser dado como não provado e que o facto provado n.º 4) deve ser entendido que ocorreu nos moldes que mencionou, ou seja, como palmada correctiva.
Os pontos 3) e 4) dos factos provados têm o seguinte teor:
3) Nas circunstâncias de modo referidas em 2) o Arguido, em dia não concretamente apurado, no ano lectivo de 2022/2023, entre Setembro de 2022 e Dezembro de 2022, deu uma palmada nas nádegas da BB.
4) Nas mesmas circunstâncias de tempo e modo, num outro dia, voltou a dar-lhe uma palmada nas nádegas.
Resulta da motivação de facto do acórdão que, relativamente aos pontos 3) e 4) dos factos provados, o tribunal a quo fundou a sua convicção com base nas declarações para memória futura da ofendida BB, conjugadas com o relatório da perícia médico-legal de fls. 422 a 427.
Teve ainda em consideração as declarações do arguido que reconheceu ter dado uma palmada no rabo à menor em sede de audiência.
Como resulta da transcrição das declarações para memória futura, a menor de BB referiu que foram duas as palmadas no rabo, assim como esclareceu as circunstâncias em que tal sucedeu do que resulta afastado o contexto de atitude correctiva alegado pelo arguido (fls. 520 a 534).
Assim não só a decisão de facto quanto aos pontos 3) e 4) dos factos provados se mostra conforme a prova produzida valorada à luz do artigo 127.º do Código de Processo Penal, como também o meio de prova especificado pelo arguido, como impondo decisão diversa da recorrida, é insusceptível de atingir este objectivo.
Improcede, pois, a pretensão do arguido.
No que diz respeito aos pontos 5) a 7) dos factos provados, o recorrente transcreveu excertos das declarações para memória futura das menores CC e BB para afirmar que as palmadas no rabo foram realizadas no contexto de brincadeira, no episódio do braço não ocorreu qualquer toque em zona erógena e a redacção do ponto 7) deve ser alterada de modo a ser eliminado o adjectivo incomodada.
Entende, assim, que ao facto provado 5) deve ser acrescentada a expressão “em contexto de brincadeira”, que o facto provado 6) deve ser alterado para: “Numa outra situação, no aludido período temporal, quando a CC se encontrava sentada numa secretária colocada no corredor de acesso às salas de aula, o Arguido, sentou-se ao lado dela, colocou-lhe a mão no ombro e no braço” e que o facto provado 7) deve ser corrigido para: “CC, quando já se tinha levantado e se encontrava a dirigir para a sala, para ir ter com o seu colega, foi questionada pelo Arguido sobre o motivo porque não usava tops porque parecia ter um bom peito”.
Os pontos 5) e 7) dos factos provados têm o seguinte teor:
5) Nas circunstâncias de modo mencionadas em 2), no ano lectivo de 2022/2023, entre Janeiro e Março de 2023, em dias não concretamente apurados, pelo menos por duas vezes, o Arguido desfe-riu uma palmada nas nádegas da CC.
6) Numa outra situação, no aludido período temporal, quando a CC se encontrava sentada numa secretária colocada no corredor de acesso às salas de aula, o Arguido, sentou-se ao lado dela, colocou-lhe a mão no ombro e foi deslizando em direcção ao peito.
7) CC incomodada, levantou-se e o Arguido questionou-a sobre o motivo porque não usava tops porque parecia ter um bom peito para os usar.
Como decorre da motivação de facto do acórdão, no que respeita aos pontos 5) a 7) dos factos provados, o tribunal a quo formou a sua convicção com base nas declarações para memória futura da ofendida CC, corroboradas quanto ao ponto 5) dos factos provados, pelas declarações para memória futura da ofendida BB, conjugadas com os relatórios da perícia médico-legal de fls. 414 a 420 e de fls. 422 a 427.
Nas declarações prestadas a menor CC afirmou, a propósito das palmadas nas nádegas, que no início pensava que era brincadeira mas depois começou a aperceber-se que não era a única a quem o arguido fazia a mesma coisa, assim como referiu que quando o arguido lhe pôs a mão no ombro, foi descendo em direcção ao peito, acrescentando que a actuação do arguido era propositada e que tudo isso a deixava constrangida e incomodada (cfr. fls. 548 a 557).
Por seu turno, nas declarações prestadas, no seguimento da seguinte pergunta formulada pela Mma. Juíza, Pronto... Mas isso foi em tom de brincadeira, só para se meter com a tua amiga e ela pensar que eras tu? Ou achas que ele fez isso mesmo para se meter com ela? Tu estavas lá no momento, tu já consegues perceber quando os rapazes às vezes querem-se meter connosco a sério, não?, a menor BB respondeu: Sim. (fls. 520 a 534).
As declarações de ambas as menores não permitem, pois, a conclusão que a descrita actuação do arguido foi realizada no “contexto de brincadeira” ou, como afirma o arguido, que “não existiu qualquer intenção sexual na nalgada”.
Em suma, não só a decisão de facto quanto aos pontos 5) a 7) dos factos provados se mostra conforme a prova produzida valorada à luz do art. 127.º do Código de Processo Penal, como os meios de prova especificados pelo recorrente, como impondo a correcção destes pontos da matéria de facto, são insusceptíveis de atingirem este objectivo.
Improcede, portanto, a pretensão do arguido.
Quanto aos pontos 8) a 11) dos factos provados, alega o recorrente que pelas próprias declarações da ofendida não foi a mesma importunada sexualmente, pois a mesma declarou que nunca recebeu nenhuma proposta de teor sexual da parte do arguido, pelo que, mesmo concordando que os factos dados como provados em 8) a 10) ocorreram, eles não têm relevância criminal.
Depois transcreveu excertos das declarações para memória futura da menor GG para afirmar que relativamente ao facto provado 11) temos as declarações da ofendida, que não foram presenciadas por mais ninguém, e a contradição directa do arguido que declarou que tal facto não existiu.
Os pontos 8 a 11) dos factos provados têm o seguinte teor:
8) Nas circunstâncias de modo referidas em 2), em data não apurada, mas seguramente em Maio de 2023, o Arguido dirigindo-se à vítima GG, disse-lhe “Quais são as posições que gostas de fazer com o PP?”
9) No dia seguinte perguntou-lhe: “Já fizeste sexo?”.
10) Dias depois, intrometeu-se numa conversa entre a GG e o colega QQ e disse-lhes: “Quando chegar a casa também vou ver vídeos e pintar as minhas paredes!”.
11) Dias depois, quando a GG passava no corredor, o Arguido abeirou-se dela e colocou-lhe a mão na cintura e deslizou-a em direcção às nádegas.
Como resulta da motivação de facto do acórdão, no que respeita aos pontos 8) a 11) dos factos provados, o tribunal a quo fundou a sua convicção com base nas declarações para memória futura da ofendida GG, conjugadas com o relatório da perícia médico-legal de fls. 455 a 465, explicitando que as declarações da menor não ofereceram dúvidas pela assertividade, tendo-se as mesmas como credíveis, tanto mais porque harmoniosas (em termos de modo de agir e de estar do arguido) com as declarações das restantes ofendidas, não se vislumbrando exageros ou especial animosidade para com o arguido.
No que respeita aos pontos 8) a 10) dos factos provados não existe uma verdadeira impugnação, pois, concordando que eles ocorreram, o que o recorrente afirma é que eles não têm relevância criminal.
Já relativamente ao ponto 11) dos factos provados importa aqui salientar que, de acordo com o relatório da perícia médico-legal de fls. 455 a 465, considerando os critérios de credibilidade presentes no seu relato, a menor parece ter capacidade para prestar um testemunho válido e credível e durante o exame pericial não se apuraram ganhos potenciais com a mentira, o que reforça a credibilidade que as suas declarações mereceram por parte do tribunal a quo.
Assim, não só a decisão de facto quanto aos pontos 8) a 11) dos factos provados se mostra conforme a prova produzida valorada à luz do artigo 127.º do Código de Processo Penal, como também o meio de prova especificado pelo arguido, como impondo decisão diversa da recorrida, é insusceptível de atingir este objectivo.
Improcede, pois, a pretensão do arguido.
No que respeita aos pontos 12) a 15) dos factos provados, o recorrente transcreveu excertos das declarações para memória futura da menor FF para afirmar que esta prestou declarações em Junho de 2023 e, por isso, o período temporal, mencionado no ponto 12), que corresponde ao 1º período do ano civil anterior é Setembro/Dezembro de 2022.
Depois transcreve excertos do depoimento da testemunha WW e das declarações para memória futura da menor FF para afirmar que a expressão mencionada no ponto 15) dos factos provados não encontra acolhimento nas palavras da menor, da testemunha WW ou do arguido.
Acerca dos pontos 13) e 14) dos factos provados, alega que, como resultam de interações verbais entre ofendida e arguido e não consubstanciam qualquer proposta de teor sexual, devem deixar de ter relevância criminal.
Entende, assim, que o facto provado 12) deve ser corrigido, na sua data, para “Novembro a Dezembro de 2022” [por lapso manifesto, o arguido refere “Novembro a Dezembro de 2023] e que o facto provado 15) deve ser dado como não provado porque a expressão referida não encontra amparo em qualquer testemunho, declaração ou prova documental.
Os pontos 12) a 15) dos factos provados têm o seguinte teor:
12) Nas circunstâncias de modo aludidas em 2), entre Fevereiro e Março de 2022, o Arguido sempre que via a vítima FF colocava-lhe a mão na cintura.
13) Em datas não concretamente apuradas, mas anteriores a Junho de 2023, o Arguido dirigindo-se a FF, disse-lhe: “Já fizeste amor?”.
14) Em Fevereiro de 2023, quando a FF se encontrava numa sala, o Arguido dirigindo-se a ela disse-lhe: “O teu percing no umbigo é a cereja no topo do bolo!”.
15) No mês de Junho de 2023, disse-lhe: “Eu também te queria fazer um chupão, mas mais para a zona do ombro onde não se visse!”.
Como resulta da motivação de facto do acórdão, no que respeita aos pontos 12) a 15) dos factos provados, o tribunal a quo formou a sua convicção com base nas declarações para memória futura da ofendida FF, conjugadas com o relatório da perícia médico-legal [referência n.º ...69], explicitando que as declarações da menor impressionaram pela independência e espírito crítico demonstrado, apenas falando quando sentiu segurança e após lhe ser dirigida uma explicação e que de forma sincera, absolutamente compatível com a sua idade e desenvolvimento mental admitiu que achava que o que relatou era normal até que ouviu comentários de outras meninas.
O tribunal a quo teve ainda em consideração o depoimento da testemunha WW, funcionário da Escola Profissional ... – EMP01..., desde pelo menos 2011, o qual, com um discurso rápido mas plausível e credível, corroborou as declarações da menor acerca do facto 15) no que respeita à sua presença no momento e quanto ao conteúdo da conversa ocorrida.
Quanto ao ponto 12) dos factos provados, tendo a menor FF prestado declarações para memória futura em 12.07.2023 [auto de fls. 253 a 254] e afirmado que os factos ocorreram no ano passado, no final do 1º período, é evidente que se estava a referir ao ano civil de 2022, final do 1º período escolar, o qual decorreu entre Setembro e Dezembro de 2022.
Assim, impõe-se que o ponto 12) dos factos provados seja alterado, nos termos do artigo 431.º, alínea b) do CPP, pelo que aonde se lê “entre Fevereiro e Março de 2022” deve passar a ler-se “entre Novembro e Dezembro de 2022”.
Esta alteração não tem qualquer efeito, já que independentemente da data, o tribunal a quo considerou que a descrita conduta não assume relevância criminal.
No que respeita aos pontos 13) e 14) dos factos provados, estamos completamente fora do âmbito da impugnação da matéria de facto na medida em que o recorrente não só não indica as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, como o que afirma é que eles não têm relevância criminal.
Acerca do episódio a que se refere o ponto 15) dos factos provados, ouvida a gravação das declarações para memória futura da menor FF, o que esta declarou foi o seguinte:
«Quando eu estava cá fora, na mesa ao pé do funcionário na entrada da escola, eu estava lá com o sr. BBB e o Sr. AA desce as escadas...e o meu namorado tinha-me feito dois ou três chupões no pescoço...pronto. E ele vira-se assim “Ah, o que é isso? Isso fica mal no pescoço! Ah! eu não deixava de te fazer um, mas era mais aqui para o ombro para não se notar, porque isso fica feio assim.”» [circa 10:20 das declarações].
Por outro lado, ouvida a gravação do depoimento da testemunha WW, confirma-se que a testemunha referiu não se recordar do episódio a que se refere o ponto 15) dos factos provados.
Assim, impõe-se que o ponto 15) dos factos provados seja alterado, nos termos do artigo 431.º, alínea b) do CPP, por forma a contextualizar e reproduzir a exacta expressão utilizada pelo arguido, nos seguintes termos:
15) No mês de Junho de 2023, ao ver que a menor FF tinha dois ou três chupões no pescoço, o arguido disse-lhe: “Ah, o que é isso? Isso fica mal no pescoço! Ah! eu não deixava de te fazer um, mas era mais aqui para o ombro para não se notar, porque isso fica feio assim.”
Improcede, assim, nesta medida, a impugnação do recorrente.
Quanto ao ponto 16) dos factos provados, alega o recorrente que o tribunal a quo deveria ter desconsiderado as declarações da ofendida ou, pelo menos, desvalorizá-las, quando se apercebeu de que a ofendida mentiu, por várias vezes, e que as declarações do arguido que desmentiu os toques nas pernas deviam ter sido valorizadas.
O ponto 16) dos factos provados tem o seguinte teor:
16) Nas circunstâncias de modo mencionadas em 2), em data não apurada mas após Maio de 2023, pelo menos duas vezes, quando a vítima II se encontrava no corredor de acesso às salas de aula do ... piso, o Arguido abeirou-se dela, deslizou a mão para cima e para baixo na lateral superior de uma das coxas de II.
Conforme decorre da motivação de facto do acórdão, no que respeita ao ponto 16) dos factos provados, o tribunal a quo fundou a sua convicção com base nas declarações para memória futura das menores II e DD, conjugadas com os relatórios das perícias médico-legais de fls. 440 a 445 e de fls. 484 vº a 490, acrescentado que o arguido não negou os factos de modo integral mas pretendeu imprimir aos factos objectivos uma outra representação.
Explicitou o tribunal a quo que a menor II de modo espontâneo descreveu com algum detalhe e sem hesitação apenas uma (“última”) situação em que o arguido lhe terá deslizado a mão para cima e para baixo (e usando as palavras do arguido na sua defesa em audiência) “na lateral superior de uma das coxas”.
Quanto às 10/12 vezes imputadas em sede de acusação pública, a menor foi peremptória dizendo que foram várias vezes, questionada referiu que foram 9/10, sendo que “a última vez [acha] que foi há três semanas”.
Ponderou o tribunal a quo que, atenta a idade da menor, não lhe retira credibilidade a circunstância de esta apenas conseguir descrever sem hesitação o facto mais recente mas, com a segurança, não se poderá concluir que o facto ocorreu 9 vezes ao invés de 10, ou vice-versa.
Contudo, pode concluir-se, com segurança, que o facto que a menor descreve como sendo o último terá ocorrido pelo menos mais de uma vez, pois para existir um último teve que ter acontecido um primeiro.
Assim, concluiu o tribunal a quo que o facto em questão ocorreu pelo menos duas vezes, o que ficou vertido na factualidade assente em 16), considerando como não provado, na alínea d) da factualidade não assente, que o descrito em 16) dos factos provados ocorreu 10 a 12 vezes.
Por conseguinte, não só a decisão de facto quanto ao ponto 16) dos factos provados se mostra conforme a prova produzida valorada à luz do artigo 127.º do Código de Processo Penal, como também o meio de prova especificado pelo arguido, como impondo decisão diversa da recorrida, é insusceptível de atingir este objectivo.
Improcede, pois, a pretensão do arguido.
Quanto ao ponto 18) dos factos provados, o arguido alega que não entende como o tribunal dá como provado que a expressão exacta usada pelo arguido para a ofendida DD não foi a proferida em declarações para memória futura, mas sim outra, que é ligeiramente diferente, acrescentando que a expressão referida pela ofendida DD foi: “ah, ficam-te muito bem esses peitos nesse vestido, devias trazê-lo mais vezes”.
Entende, assim, que o facto provado em 18) deve ser dado como não provado porque a expressão referida não encontra amparo nas declarações dos intervenientes.
O ponto 18) dos factos provados tem a seguinte redacção:
18) Em data não concretamente apurada do ano de 2023, antes do mês de Junho, o Arguido disse dirigindo-se a DD “Fica-te bem o vestido com essas mamas, devias trazê-lo mais vezes!”.
Como resulta da motivação de facto do acórdão, quanto ao ponto 18) dos factos provados, o tribunal fundou a sua convicção com base nas declarações para memória futura das menores DD e II, conjugadas com os relatórios das perícias médico-legais de fls. 484 vº a 490 e de fls. 440 a 445.
Explicitou o tribunal a quo que nas declarações para memória futura a jovem DD após descrever o uso da palavra “giraça”, em 2022, passou a descrever factos que enquadrou no ano de 2023.
Este enquadramento está em perfeita sintonia com o conteúdo das declarações daqueloutra jovem II que demonstrou uma memória mais nítida e clara quanto a factos ocorridos no ano de 2023, próximo ao mês de Maio e que diz ter memória de o arguido dirigindo-se a DD ter dito que um vestido “ficava bem, que as mamas dela ficavam bué bem naquele vestido”.
Refere ainda que a jovem DD de modo espontâneo referiu que o arguido lhe disse «“ah, ficam-te muito bem esses peitos nesse vestido, devias trazê-lo mais vezes”», o que é em tudo semelhante à expressão aludida pela jovem II.
Assim, impõe-se que o ponto 18) dos factos provados seja alterado, nos termos do artigo 431.º, alínea b) do CPP, por forma a reproduzir a exacta expressão utilizada pelo arguido, nos seguintes termos:
18) Em data não concretamente apurada do ano de 2023, antes do mês de Junho, o arguido disse dirigindo-se a DD “Ah, ficam-te muito bem esses peitos nesse vestido, devias trazê-lo mais vezes
No que respeita ao ponto 19) dos factos provados, o recorrente transcreveu um excerto das declarações da menor HH para afirmar que por tais declarações ficamos sem entender a situação e o que terá provocado este toque, acrescentado que através do depoimento da testemunha CCC percebemos que a palmada foi realizada apenas com o intuito prático e laboral de provocar que a aluna saísse da sua frente e o deixasse trabalhar.
Entende, assim, que o facto provado em 19) deve ser alterado para: “Nas circunstâncias de modo indicadas em 2), nomeadamente no dia 25-05-2023, o arguido deu uma palmada na nádega de HH, que se tinha colocado na sua frente quando estava realizar o seu trabalho, perturbando-o, e após o que lhe perguntou “Não gostas?”.
O ponto 19) dos factos provados tem o seguinte teor:
19) Nas circunstâncias de modo indicadas em 2), nomeadamente no dia 25-05-2023, o Arguido deu uma palmada nas nádegas de HH e após o que lhe perguntou “Não gostas?
Como resulta da motivação de facto do acórdão, no que respeita ao ponto 19) dos factos provados, o tribunal fundou a sua convicção com base nas declarações para memória futura da menor de HH, conjugadas com o relatório da perícia médico-legal de fls. 467 a 472 e ainda com o depoimento da testemunha XX, colaborador da Escola Profissional ... – EMP01..., pelo menos desde 2005.
Explicitou o tribunal a quo que não fora as declarações para memória futura de HH serem suficientes por si só para a prova do facto, e devidamente circunstanciadas temporalmente (feriado em ...), estas mostram-se alcandoradas no depoimento claro, directo e credível da testemunha XX, acrescentando que, para além de objectivamente declarações e depoimento se complementarem e harmonizarem, o sentimento de perplexidade que ambos deixaram perceber é coincidente, o que denota verosimilhança.
Alega o arguido que através das declarações da menor que transcreveu ficamos sem entender a situação descrita no ponto 19) dos factos provados e o que terá provocado o toque, assim como alega que a menor apenas mencionou o que lhe era prejudicial, não permitindo, pelas suas declarações, perceber por que motivo o mesmo poderia ter feito aquele gesto.
O segmento transcrito pelo arguido integra-se numa descrição mais ampla que vale a pena transcrever e contextualizar. Assim, no seguimento da pergunta formulada pela Mma. Juiz: “Mas ele apareceu por trás ou estava ao teu lado ? Para eu perceber como é que ele te bateu”, a menor HH declarou: «Ele estava ao meu lado, estávamos a pôr as estantes na carrinha e eu estava-lhe a dar as estantes e ele punha a carrinha, e depois, quando eu me ia virar, ele bateu-me e disse “ai, não gostas”».
Depois a Mma. Juiz afirmou: “Tu ias-lhe lá deixar as estantes…”, ao que a menor respondeu: “Sim”.
Seguidamente às perguntas da Mma. Juiz: “E quando estavas a dar meia volta para buscar mais? Digo eu…era isso? Então ele aproveitou, tu ficaste de costas para ele e, então, ele deu-te uma palmada no rabo. Foi uma palmada ou foi um apalpão?”, a menor respondeu: “Uma palmada”.
À pergunta da Mma. Juiz: “Uma palmada… aleijou-te?”, a menor respondeu: “Não”.
E à pergunta da Mma. Juiz: “Não? Mas tu ficaste logo incomodada com isso, não foi?”, a menor respondeu: “Sim”.
Assim, ao contrário do que afirma o arguido, a menor, quando prestou as declarações, descreveu o sucedido de forma pormenorizada, explicando as circunstâncias em que o arguido lhe desferiu uma palmada no rabo.
Por outro lado, o excerto do depoimento da testemunha CCC transcrito pelo recorrente integra-se numa descrição mais ampla que também vale a pena transcrever e contextualizar.
Assim, ouvido o depoimento da testemunha CCC, este disse que tiveram um concerto em ..., na parte da manhã, depois do concerto carregaram a carrinha e foram descarregar a carrinha na escola, ao estarem a descarregar tinha também uns alunos a ajudar, entretanto viu uma garota também a descarregar, a ajudar e meteu-se à frente do sr. AA, o sr. AA por detrás dela deu-lhe uma palmada na nádega, a garota virou-se para ele e disse “Oh, sr. AA!”, ele virou-se para ela e disse: “Oh, o que é que foi? Não gostas, é?” [circa 03:10 do depoimento].
Depois a testemunha esclareceu que a garota se chama HH, era aluna da escola [circa 05.07 do depoimento].
Seguidamente à pergunta da Sra. Procuradora: “Como é que interpretou aquele gesto?”, a testemunha respondeu que era um bocado chato interpretar, não era ele que tinha de interpretar, o tribunal é que tem interpretar, acrescentado que ficou “mais coiso” com o comentário “Não gostas?” [circa 06:50 do depoimento].
Na sequência da pergunta a testemunha acabou depois por referir o que consta do segmento do depoimento transcrito pelo recorrente.
Assim, sendo certo que a “interpretação” ou os juízos valorativos formulados pelas testemunhas são irrelevantes por competirem exclusivamente ao tribunal, não só a decisão de facto quanto ao ponto 19) dos factos provados se mostra conforme a prova produzida valorada à luz do artigo 127.º do Código de Processo Penal, como também o meio de prova especificado pelo arguido, como impondo a pretendida alteração da decisão recorrida, é insusceptível de atingir este objectivo.
Improcede, pois, a pretensão do arguido.
Quanto aos pontos 20) a 22) dos factos provados, o recorrente transcreveu excertos das declarações para memória futura da menor OO para afirmar que temos apenas a versão da ofendida que contraria a do arguido e, por isso, não havendo qualquer outra prova deverão os factos não serem dados como provados porque contrariam as declarações do arguido.
Os pontos 20) a 22) dos factos provados têm o seguinte teor:
20) Nas circunstâncias de modo referidas em 2), em data não concretamente apurada, mas entre Setembro e Dezembro de 2022, o Arguido abordou a vítima OO e disse-lhe “Estas toda boa!
21) Em data não concretamente apurada mas entre Abril e Julho de 2023, quando a EE se encontrava sentada junto de uma secretária, junto à entrada das salas de aulas do ... piso, o Arguido dirigiu-se a ela e perguntou-lhe: “EE, já fizeste a tua primeira vez?”.
22) Como ela não lhe respondeu ele disse-lhe: “Se te apanhar numa sala a meter os dedos não tem mal nenhum. Não vou levar isso a mal, nem vou dizer a ninguém!”.
Como decorre da motivação de facto do acórdão, quanto aos pontos 20) a 22) dos factos provados, o tribunal a quo fundou a sua convicção com base nas declarações para memória futura da menor OO, conjugadas com o relatório da perícia médico-legal de fls. 447 a 453.
Refira-se que o recorrente não aponta em concreto um erro de julgamento, fazendo o ataque à decisão da matéria de facto pela via da credibilidade que o tribunal deu a este meio de prova, o que se afigura irrelevante em termos de impugnação da matéria de facto, pois, ao contrário do que por vezes se pensa, o recurso da matéria de facto não tem por finalidade, nem pode ser confundido, com a realização de um “novo julgamento” fundado numa nova convicção mas apenas apreciar a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal recorrido em relação aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados, com base na avaliação das provas que considera imporem uma decisão diversa.
Assim, não só a decisão de facto quanto aos pontos 20) a 22) dos factos provados se mostra conforme a prova produzida valorada à luz do artigo 127.º do Código de Processo Penal, como também o meio de prova especificado pelo arguido, como impondo decisão diversa da recorrida, é insusceptível de atingir este objectivo.
Improcede, pois, a pretensão do arguido.
No que respeita ao pontos 23) a 26) dos factos provados, o recorrente alega que o facto 23) deve ser corrigido para:“ O Arguido não ignorava a idade das vítimas supra identificadas, não só a real, mas aparente, sendo que duas delas: HH e MM, têm idade inferior a 14 anos.”, em relação ao facto 25) aceita o mesmo e quanto aos factos 24) e 26) alega que resultam da falta de prova devendo os mesmos serem dados como não provados, uma vez que nunca se verificaram quaisquer evidências de que o arguido com as suas condutas tivesse tido alguma satisfação sexual, nomeadamente alguma reacção física que tivesse sido constatada por alguma ofendida ou testemunha.
Os pontos 23) a 26) dos factos provados têm o seguinte teor:
23) O Arguido não ignorava a idade das vítimas supra identificadas, não só a real, mas aparente, sendo que algumas delas têm idade inferior a 14 anos.
24) O Arguido actuou como descrito em 3), 4), 5) a 7), 8), 9), 11), 13), 15), 18), 19), 21) e 22), livre, deliberada e conscientemente, com o intuito de assim satisfazer os seus instintos sexuais, propósito que foi renovando, durante o período em que foi concretizando os actos supra-referidos, aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com as alunas por força das relações que tinha com elas em virtude das funções que exercia na escola que elas frequentam/frequentavam.
25) Ao actuar da forma acima descrita, o Arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente.
26) Ao agir como descrito em como descrito 3), 4), 5) a 7), 8), 9), 11), 13), 15), 18), 19), 21) e 22), fê-lo bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
Como decorre da motivação de facto, a idade de todas as menores, que se mostra descrita no ponto 2) dos factos provados, facto não impugnado pelo recorrente, baseia-se nos assentos de nascimento de fls. 150 a 156, assim como nas declarações das próprias menores, sendo que a pretendida alteração do ponto 23) dos factos provados mais não é do que um juízo conclusivo.
Quanto aos elementos subjectivos dos tipos de crime imputados ao arguido, o tribunal a quo considerou que decorriam de forma segura, por inferência e com apoio nas regras da normalidade, das suas descritas condutas, não sendo autonomizáveis razões que pudessem levar a uma decisão diversa da exposta na motivação para a factualidade objectiva, da qual deriva, em regra, a prova por inferência dos elementos subjectivos do ilícito típico.
Os factos relativos aos elementos subjectivos do tipo de crime, sendo factos do foro interno dos arguidos, são necessariamente decorrentes da factualidade objectiva, desde que não existam outros factos que os afastem, excluam ou justifiquem.
A este respeito exarou o tribunal a quo a seguinte fundamentação:
«(…) em processo penal provando-se objectivamente uma conduta, para haver condenação há que se provar o dolo do tipo.
Esta prova, porque ligada intrinsecamente ao foro interno, é feita, na falta de admissão, mediante articulação, entre conduta objectiva dada como provada e as regras da experiência e da normalidade do acontecer.
Com isto quer-se dizer que sem prejuízo de o Arguido ter pretendido com as suas declarações as mais das vezes afastar o dolo do tipo de ilícito pelo qual vem acusado, a sua verosimilhança com a normalidade do acontecer foi (será adiante) arredada.
(…)
Quanto às representações e intenções do Arguido, conjugando as condutas que objectivamente se deram como provadas, não restam dúvidas, pelas declarações daquele que sabia a idade das menores de idade, como não podia deixar de saber, atentas as funções que exercia, que lhe permitiam ter acesso a tal informação, e porque o reconheceu.
O Arguido, com o 12.º ano de escolaridade, que trabalhava na Escola Profissional ... – EMP01..., é casado, tem filhos, tem acesso a informação, por meio de televisão e pelo menos, como qualquer cidadão medianamente sagaz, colocado na sua posição, não podia deixar de saber que a sua conduta, nos contextos em que o foi tem conotação sexual, bem como da punibilidade da sua conduta, cuja ilicitude material se encontra sedimentada na consciência ética da comunidade.
Não resulta dos autos que o Arguido agiu, como agiu, com intenção educativa ou correctiva. Aliás, é inverosímil que para educar ou corrigir o Arguido tivesse agido como agiu – por exemplo dando “nalgada” na Menor de Idade BB - ao invés de reportar a questão a quem teria competências de educação e correcção.
Não se crê que o Arguido, com mais de 30 anos, imbuído de espírito pedagógico, tivesse agido como agiu, sem prever a aparência e consequência das suas condutas, ou seja, não se crê que o Arguido desconhecesse a conotação sexual que assume uma ou várias palmadas no rabo, e que com isso se imiscui na liberdade de autodeterminação sexual das Ofendidas. O mesmo sucede com conversas assumidas pelo Arguido, de teor explicitamente sexual, como quando assume ter questionado à jovem EE “já fizeste a tua primeira vez”.
As Juízes que compõem o Colectivo não descortinam justificação plausível ou razoável para a conduta do Arguido, portanto outras não podem ter sido as suas representações e intenções que não as de compelir menores de idade a suportar contactos físicos sexualizados, e conversas de teor explicitamente sexual, com intenção de satisfazer os seus instintos libidinosos e de obter prazer sexual, o que fez com consciência de que as mesmas eram menores de idade, ofendendo os respectivos sentimentos de pudor, intimidade e liberdade sexual, erotizando-as antes de disporem de competências cognitivas, sociais e emocionais para regularizarem a sua sexualidade e evitarem o contacto sexual com o adulto, ainda para mais em contexto de estabelecimento escolar em que o Arguido exercia funções.
(…)
Não se questiona que o Arguido fosse jovial, e por isso tenha tido uma postura menos formal em relação aos alunos. Não se suscitam dúvidas de que Arguido e outros funcionários, tendo em conta a personalidade de alguns alunos, tenham tido atitudes de carinho como um abraço. Porém, não se coaduna com a normalidade do acontecer que um colaborador com mais de 30 anos de idade, integrado na Sociedade como o Arguido, tenha as conversas sexuais que teve com menores de idade e que as tocasse para além de um abraço ou um toque no ombro. Aliás, dizem-nos as regras da prudência - as quais o Arguido não podia deixar de conhecer porquanto social e familiarmente integrado - que em contexto escolar, auxiliares, professores, devem evitar (não estamos a afirmar que não o possam fazer) adoptar contactos mais íntimos com menores de idade, quanto mais envolver-se em conversas como “primeira vez” e “meter os dedos”.
As conversas tidas e que resultaram demonstradas em 8), 9), 13), 15), 18), 19) 21) e 22), não são explicáveis por “curiosidade”, na medida em que o Arguido à data tinha mais de 30 anos, era casado e tem uma filha. Portanto, resulta da experiência comum que o Arguido procurou, com aquelas conversas obter um mínimo de excitação e prazer sexual.
(…)
Não se ignora, que um sentimento de desvalorização dos comportamentos do Arguido, numa fase inicial, percorre todas as declarações para memória futura tomadas.
Mas, e isso parece-nos claro, e lógico, uma Menor de Idade ao ouvir (e assimilar, como é próprio do desenvolvimento de um Menor de Idade) que o Arguido teve um comportamento semelhante com outra aluna, e ao ouvir (e assimilar) que esse comportamento é desadequado, concluirá que aquele primeiro comportamento tido para consigo também é desadequado. Esta é a conclusão lógica a que chegará um Menor de Idade, ainda em desenvolvimento, designadamente sexual, que tendencialmente normalizará o sucedido, desde logo por não saber lidar com o mesmo, ou por achar que contribuiu para que determinados comportamentos tivessem lugar. E ainda mais, em contexto escolar, quando confrontado o Menor de Idade por actos e palavras praticados por alguém bem integrado nessa comunidade e que se mostre titular de uma posição de poder sobre os alunos (no caso o Arguido era funcionário).
Mas ao Julgador Penal compete racionalizar o comportamento e as expressões, e nesse sentido diremos que não se conclui por uma argumentação de normalização dos mesmos, por tudo quanto já vem sendo referido.
(…)
Em conclusão, o Colectivo de Juízes conclui que o Arguido ao agir como agiu, quis satisfazer os seus instintos sexuais aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com as menores de idade por força das relações que tinha em virtude das funções que exercia na escola que estas frequentam/frequentavam.
Assim se explica a sedimentação de 23) a 26).»
Em suma, não só os meios de prova indicados pelo recorrente como impondo decisão de facto diversa da recorrida são insusceptíveis de alcançar tal fim, como os pontos de facto sindicados se mostram sustentados na prova produzida e valorada em estrita observância ao princípio da livre apreciação, ínsito no artigo 127.º do Código de  Processo Penal.
Improcede, portanto, a pretensão do arguido.
Quanto aos pontos 28), 30), 32), 34), 36), 38), 40) e 42) dos factos provados, alega o recorrente que as diligências realizadas no âmbito do inquérito influenciaram de forma negativa a compreensão que as ofendidas tinham inicialmente de tais actos, tendo por isso alterado a mesma compreensão, além das medidas preventivas que foram impostas e que provocaram na comunidade escolar uma opinião de que o arguido era culpado.
Os pontos 28), 30), 32), 34), 36), 38), 40) e 42) dos factos provados têm o seguinte teor:
28) CC apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
30) BB apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
32) II apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
34) EE apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
36) HH apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
38) GG apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
40) MM apresenta discurso com conteúdo coerente e consistente, que compreende e relata, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
42) DD tem competências cognitivas normativas, é capaz de distinguir realidade de fantasia e tanto a memória de curto quanto a de médio prazo se encontram preservadas. Apresenta uma linguagem adequada à sua idade, com discurso claro, contextualizando os eventos de forma lógica, coerente e consistente, sem indícios de condicionamento no seu discurso ou de ser sugestionável.
Como resulta da motivação de facto do acórdão, quanto aos pontos 28), 30), 32), 34), 36), 38), 40) e 42) dos factos provados, o tribunal a quo formou a sua convicção com base nos relatórios das perícias médico-legais de fls. 414 a 420, 422 a 427vº, 440 a 445, 447 a 453, 467 a 472, 455 a 465, 429 a 438 e 484vº a 490, respectivamente, elaborados pelo Gabinete Médico-Legal e Forense de Alto Trás-os-Montes.
Trata-se de prova pericial sujeita ao regime do artigo 163.º do Código de Processo Penal, isto é, o juízo de carácter técnico-científico expendido pelo perito presume-se subtraído à livre apreciação do julgador, o que quer dizer que o resultado da perícia não é livremente valorado pelo julgador, sendo certo que o recorrente tão pouco indicou qualquer meio de prova que pudesse impor decisão diversa da recorrida.
A este respeito sublinhe-se que a lei impõe ao julgador o parecer ou juízo técnico, científico ou artístico, salvo quando o mesmo seja susceptível de crítica da mesma natureza, isto é, o julgador pode divergir do juízo pericial – afastando o valor da prova pericial – mas para o fazer tem que fundamentar a sua divergência com base em razões da mesma natureza, portanto com base em diferente juízo técnico, científico ou artístico (artigo 163.º, n.º 2 do Código de Processo Penal)([18]), o que vale por dizer que o recorrente teria que fundamentar a sua divergência em razões da mesma natureza.
Assim, não só a decisão de facto quanto aos pontos 28), 30), 32), 34), 36), 38), 40) e 42) dos factos provados se mostra conforme a prova produzida valorada à luz do artigo 163.º do Código de Processo Penal, como também o arguido não indicou qualquer meio de prova como impondo decisão diversa da recorrida.
Improcede, pois, a pretensão do arguido.
No que respeita ao ponto 44) dos facto provados, o recorrente alega que não o entende quando o tribunal afirma “O Arguido é uma pessoa considerada socialmente”, acrescentando que ao longo de toda a motivação não encontramos a referência ao facto dado como provado em 44) e que talvez o tribunal tenha pretendido utilizar este facto para justificar que o arguido tinha obrigação de saber que determinados temas não podem ser abordados e dentro da escola, por regras de prudência, as quais tinha obrigação de conhecer, uma vez que se encontrava socialmente e familiarmente integrado.
Refere ainda que resulta de uma contradição entre fundamentação e decisão quando o que deveria ter sido dado como provado era: O Arguido era um “excelente” colaborador; O Arguido era jovial e apresentava uma postura menos formal em relação aos alunos; O Arguido e outros funcionários, tiveram atitudes de carinho com os alunos, como um abraço” uma vez que tais afirmações foram referenciadas pelo tribunal na sua exposição, mas não tiveram qualquer respaldo nos factos dados como provados.
O ponto 44) dos factos provados tem o seguinte teor:
44) O Arguido é pessoa considerada socialmente.
Como decorre da motivação de facto do acórdão, relativamente aos factos atinentes às condições socioeconómicas do arguido, o tribunal a quo atendeu às declarações do próprio, ao depoimento da testemunha NN, esposa do arguido, em conjugação com o relatório social de fls. 811 e ss.
A factualidade vertida no ponto 44) dos factos provados é relevante para a determinação da medida da pena, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 71.º do Código Penal, tanto assim que o tribunal a quo, na determinação da medida da pena, ponderou, em favor do arguido, a sua integração social, profissional e familiar.
Este o sentido e alcance do ponto 44) dos factos provados.
Assim, não se vislumbrando qualquer contradição entre a fundamentação e a decisão, também não vemos razões para alterar a redacção do ponto 44) dos factos provados ou para que o mesmo seja considerado como não provado.
Improcede, pois, esta pretensão.
Quanto ao ponto 51) dos factos provados, o recorrente alega que contém uma imprecisão que convém corrigir já que foi despedido pela entidade EMP01... e não dispensado.
O ponto 51) dos factos provados tem o seguinte teor:
51) Consta do relatório social de fls. 811, que por via de processo disciplinar o Arguido foi dispensado a EMP01..., no mês de Maio de 2024, o que considera injustificado, tendo interposto acção judicial.
Como resulta do relatório social de fls. 811 e segs., o arguido foi alvo de um processo disciplinar na EMP01... e no final do mês de Maio de 2024 foi despedido por justa causa.
Assim, nos termos do artigo 431.º, alínea b) do CPP, por forma a reproduzir com exactidão o que consta do relatório social, o ponto 51) dos factos provados passa a ter a seguinte redacção:
51) Consta do relatório social de fls. 811, que por via de processo disciplinar o Arguido foi despedido da EMP01..., no mês de Maio de 2024, por justa causa, o que considera injustificado, tendo interposto acção judicial.
Improcede, pois, nestes termos, a impugnação ampla da matéria de facto.

2.5. Da violação do princípio in dubio pro reo [recurso do arguido]
O nosso regime jurídico processual-penal consagra no artigo 127.º o princípio da livre apreciação da prova.
A livre apreciação da prova pressupõe que esta seja considerada segundo critérios objectivos que permitam estabelecer o substrato racional da fundamentação da convicção.
O princípio in dubio pro reo constitui um limite normativo do princípio da livre apreciação da prova na medida em que impõe orientação vinculativa para os casos de dúvida sobre os factos: em tal situação, impõe-se que o Tribunal decida pro reo, a favor do arguido, pois.
Como acentua Jescheck “serve para resolver dúvidas a respeito da aplicação do direito que surjam numa situação probatória incerta”([19]) ou, dito de outro modo, significa que a persistência de dúvida razoável, após a produção de prova, tem de actuar em sentido favorável ao arguido([20]).
A dúvida que há-de levar o tribunal a decidir «pro reo», tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária. Por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal([21]) ([22]).
Não é assim toda a dúvida que justifica a absolvição com base neste princípio. Mas apenas aquela em que for inultrapassável, séria e razoável a reserva intelectual à afirmação de um facto que constitui elemento de um tipo de crime ou com ele relacionado, deduzido da prova globalmente considerada (…) A própria dúvida está sujeita a controlo, devendo revelar-se conforme à razão ou racionalmente sindicável, pelo que, não se mostrando racional, tal dúvida não legitima a aplicação do citado princípio([23]).
A dúvida razoável, que determina a impossibilidade de convicção do Tribunal sobre a realidade de um facto, distingue-se da dúvida ligeira, meramente possível, hipotética. Só a dúvida séria se impõe à íntima convicção. Esta deve ser, pois, argumentada, coerente, razoável([24]).
Daí que o tribunal de recurso só poderá censurar o uso feito desse princípio (in dubio) se da decisão recorrida resultar que o tribunal a quo chegou a um estado de dúvida insanável e que, face a ele, escolheu a tese desfavorável ao arguido([25]).
O princípio in dubio pro reo encerra, portanto, uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa, pelo que a sua violação exige que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido.
Em sede de recurso, a demonstração da violação do princípio passa pela sua notoriedade, aferida pelo texto da decisão isto é, deve resultar dos termos da sentença, de forma clara e inequívoca, que o juiz, tendo ficado na dúvida sobre a verificação de determinado facto desfavorável ao agente, o considerou provado ou, inversamente, tendo ficado na dúvida sobre a verificação de determinado facto favorável ao agente, o considerou não provado.
A dúvida relevante para este efeito, não é, portanto, a dúvida que o recorrente entende que deveria ter permanecido no espírito do julgador após a produção da prova mas apenas a dúvida que o julgador não logrou ultrapassar e fez constar da sentença ou que por esta é evidenciada.
No caso em apreço, o recorrente invoca a violação do princípio in dubio pro reo essencialmente como corolário da sua apreciação da prova produzida, sendo que, em momento algum, resulta do acórdão recorrido que relativamente aos factos provados, incluindo os factos que o recorrente pretendeu incorrectamente julgados, o tribunal colectivo se defrontou com dúvidas que resolveu contra o recorrente ou demonstrou qualquer dúvida na formação da convicção e, ademais, se impunha que a devesse ter tido.
Ao contrário, o que sobressai da motivação da decisão da matéria de facto é uma descrição aprofundada das declarações e dos depoimentos que foram acolhidos bem como da prova documental e pericial que foi produzida, perfeitamente convergente, atenta a credibilidade que lhes foi atribuída, assim como a desconsideração feita relativamente às declarações do recorrente com destrinça subsequente na matéria de facto provada e naquela outra não provada.
Tudo a permitir concluir pela inexistência de qualquer violação ao invocado princípio in dubio pro reo.
Improcede, portanto, esta questão.

2.6. Da qualificação jurídica dos factos [recurso do Ministério Público e recurso do arguido]
Neste âmbito, o Ministério Público defende, na decorrência da pretendida alteração da matéria de facto com base nos vícios decisórios invocados, que o arguido deve ser condenado pela prática de dois crimes de abuso sexual de menor dependente, previsto no artigo 172.º, n.º 1, b) do Código Penal, por referência ao artigo 171.º, n.º 1, do mesmo código, ou, caso assim se não entenda, deve o arguido ser condenado pela prática de dois crimes de actos sexuais com adolescente, previstos e punidos pelo artigo 173.º, n.º 1 do Código Penal, na pessoa de II.
Como liminarmente se poderá concluir, resultando improcedente o recurso quanto à impugnação da matéria de facto por via da chamada revista alargada, mantendo-se o facto não provado na alínea i), na parte que se refere ao ponto 16) dos factos provados, nos exactos termos em que foram fixados pela 1ª instância, o mesmo terá que necessariamente improceder no que se refere a esta pretensão.
Pretende ainda o Ministério Público a integração dos factos provados nºs 3), 4), 5, 6, 11 e 22 a 24 no crime de abuso sexual de menor dependente, p. e p. no artigo 172.º, n.º 1, al. b), por referência ao artigo 171.º, n.º 1 ambos do Código Penal, ou, caso assim não se entenda, no crime de actos sexuais com adolescente, p. e p. pelo artigo 173.º, n.º 1 do Código Penal (ofendidas BB, CC e GG) e dos factos provados nºs 19 e 22 a 24 no crime de abuso sexual de crianças previsto no artigo 171.º, n.º 1 do Código Penal (ofendida HH), o que pressupõe considerar as descritas condutas como actos sexuais de relevo.
O conceito de “acto sexual de relevo” tem suscitado alguma polémica na jurisprudência e doutrina onde se têm vindo a desenhar três posições: a objectivista, a subjectivista e a mista.
Para a primeira das referidas posições por acto sexual deve entender-se o comportamento que, de um ponto de vista predominantemente objectivo, assume uma natureza, um conteúdo ou um significado directamente relacionados com a esfera da sexualidade e, por conseguinte, com a liberdade de determinação sexual de quem o sofre ou de quem o pratica.
Já a segunda posição defende que à referida conotação objectiva deve acrescer uma outra subjectiva, traduzida na intenção do agente de despertar ou satisfazer, em si ou em outrem, a excitação sexual, correspondente à designada intenção libidinosa.
Por fim, de acordo com a terceira posição, o conceito tanto poderá ser integrado pela sua acepção objectiva, como subjectiva.
Em nosso entendimento, tal como defende Figueiredo Dias, deve dar-se prevalência à interpretação objectivista do conceito, considerando-se, por conseguinte, irrelevante o motivo da actuação do agente.
Como refere Figueiredo Dias, ao exigir que o acto sexual seja de relevo a lei impõe ao intérprete que afaste da tipicidade não apenas os actos insignificantes ou bagatelares (função negativa), mas que investigue do seu relevo na perspectiva do bem jurídico protegido (função positiva), isto é, que determine –  ainda aqui de um ponto de vista objectivo – se o acto representa um entrave com importância para a liberdade de determinação sexual da vítima ([26]).
No quadro das descritas condutas, o arguido actuou da forma seguinte:
 - Nas circunstâncias de modo referidas em 2) o arguido, em dia não concretamente apurado, no ano lectivo de 2022/2023, entre Setembro de 2022 e Dezembro de 2022, deu uma palmada nas nádegas da BB;
- Nas mesmas circunstâncias de tempo e modo, num outro dia, voltou a dar-lhe uma palmada nas nádegas;
 - Nas circunstâncias de modo mencionadas em 2), no ano lectivo de 2022/2023, entre Janeiro e Março de 2023, em dias não concretamente apurados, pelo menos por duas vezes, o arguido desferiu uma palmada nas nádegas da CC;
- Numa outra situação, no aludido período temporal, quando a CC se encontrava sentada numa secretária colocada no corredor de acesso às salas de aula, o arguido, sentou-se ao lado dela, colocou-lhe a mão no ombro e foi deslizando em direcção ao peito;
- Nas circunstâncias de modo referidas em 2), em data não apurada, mas seguramente em Maio de 2023, quando a GG passava no corredor, o arguido abeirou-se dela e colocou-lhe a mão na cintura e deslizou-a em direcção às nádegas;
- Nas circunstâncias de modo indicadas em 2), nomeadamente no dia 25-05-2023, o arguido deu uma palmada nas nádegas de HH e após o que lhe perguntou “Não gostas?”;
- Ao actuar da forma descrita, agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, com o intuito de assim satisfazer os seus instintos sexuais, propósito que foi renovando, durante o período em que foi concretizando os actos supra-referidos, aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com as alunas por força das relações que tinha com elas em virtude das funções que exercia na escola que elas frequentam/frequentavam;
O arguido não ignorava a idade das vítimas supra identificadas, não só a real, mas aparente, e agiu sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Tendo por consideração o que se entende ser um acto sexual de relevo temos de concluir que os factos praticados pelo arguido em qualquer uma das referidas situações, sendo, no descrito circunstancialismo, despropositados, impróprios e inoportunos, não atingem o grau de perigosidade necessário para integrarem o referido conceito, isto é, para representarem um entrave significativo à livre determinação sexual das vítimas.
Assim, ao considerar que as descritas condutas do arguido não integram o conceito de “acto sexual de relevo”, mas apenas o conceito de “contacto de natureza sexual”, a que se refere o artigo 170.º do Código Penal, o acórdão recorrido não merece censura, pelo improcede também esta pretensão.
Por seu lado, o arguido, manifestando a sua concordância com a decisão do tribunal a quo no sentido de que não cometeu qualquer acto sexual de relevo sobre qualquer das vítimas, afirma que as conversas e interacções que ocorreram entre ele e as menores não são criminalizadas, assim como alega o tribunal “a quo” referiu na sua fundamentação de direito que os tipos legais em causa afectam bem jurídico eminentemente pessoal – “em cada ato individualmente perpetrado a vítima é renovadamente lesada” – mas esta separação e individualização de cada acto provado terá de ter autonomia e relevância criminal para cada um, individualmente, poder ser criminalizado, acrescentado que o acórdão recorrido violou o artigo 30.º, n.º 2 do Código Penal por manifesto erro de interpretação.
Como liminarmente também aqui se poderá concluir, resultando improcedente o recurso quanto à impugnação dos pontos 3), 4), 5), 6), 7), 8), 9), 10), 11), 12), 13), 14), 15), 16), 18), 19), 20), 21), 22), 23), 24), 26), 28), 30), 32), 34), 36), 38), 40), 42), 44) e 51) dos factos provados, com as pequenas alterações supra assinaladas, mantendo-se o essencial dos pontos de facto impugnados pelo recorrente nos exactos termos em que foram fixados pela 1ª instância, o mesmo terá que improceder no que se refere à pretendida absolvição já que esta passaria necessariamente pela alteração da factualidade provada, designadamente os pontos 24) a 26) do factos provados.
No que respeita à alegada violação do artigo 30.º do Código Penal, como salienta o acórdão recorrido, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça afasta quer a continuação criminosa quer a figura do crime exaurido, de trato “sucessivo”, nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual.
A questão da unificação num só crime de trato sucessivo de uma pluralidade de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, cometidos durante determinado lapso de tempo contra a mesma vítima, depois de alguma hesitação, tem vindo a ser, ultimamente e de forma reiterada, decidida pelo Supremo Tribunal de Justiça em sentido negativo.
Desde logo, porque pressupondo o denominado crime de ‘trato sucessivo’ [para além da reiteração de uma actividade ilícita, que poderá consumar-se em um ou mais actos, dos quais um só deles basta para preencher o respectivo tipo legal – como sucede, por ex., com o crime de tráfico de estupefacientes –, desenvolvida de forma essencialmente homogénea e durante um certo lapso temporal] unidade de resolução (que não única resolução), vem entendendo a jurisprudência do Supremo Tribunal que, tratando-se de crimes de abuso sexual de crianças, a aludida unidade resolutiva não se verifica.
E não se verifica porque, para tanto, seria indispensável a ocorrência, entre o mais, de uma conexão temporal que permitisse admitir que o agente executou toda a actividade criminosa no quadro de um dolo inicial que, por não ter sido renovado, é comum a todos os actos ilícitos, situação que, por regra e de acordo com os dados da experiência, maxime emocional, não acontece num caso com as especificidades do que se encontra em apreciação.
E depois porque a prática reiterada de actos ilícitos integradores dos mencionados crimes de abuso sexual de menores dependentes e abuso sexual de crianças, não derivando decididamente de uma situação exógena ao agente e facilitadora do seu sucumbir criminoso, mas antes só podendo ter sido provocada, buscada, e delineada pelo mesmo agente, nunca terá como efeito a diminuição da sua culpa, mas antes a sua agravação… para mais quando, como na situação em análise, estão em causa actos praticados em contexto escolar com jovens alunas, menores de idade, aproveitando-se o arguido do fácil contacto que mantinha com elas por força das funções de assistente operacional que exercia na escola e a quem se impunha o dever de não atentar contra a sua liberdade e autodeterminação sexual.
E ainda porque – se com a alteração introduzida ao artigo 30.º do Código Penal pela Lei n.º 40/2010, de 03.09 (que lhe aditou o referido número 3) teve o legislador em vista apartar a possibilidade de a pluralidade de crimes contra bens eminentemente pessoais ser punida como um só crime continuado – mal se compreenderia que, por via de uma ficção do julgador quanto à existência de um dolo inicial único não renovado abrangendo todas as actuações ilícitas sucessivamente tidas pelo agente, se viabilizasse a sua punição por apenas um crime de trato sucessivo, assim se defraudando o propósito do legislador([27]).
Cada uma das condutas descritas nos pontos 3), 4), 5), 6), 8), 9), 11), 13), 15), 18), 19), 21) e 22) da factualidade provada foi levada a cabo num diverso contexto situacional, necessariamente comandado por uma diversa resolução e traduziu-se numa autónoma lesão do bem jurídico protegido.
Cada uma dessas condutas não constituiu um momento ou parcela de um todo projectado, nem uma conduta em que se tenha desdobrado uma actividade suposta no tipo, mas um “todo”, em si mesmo, um autónomo facto punível, devendo, por isso, entender-se que, em relação a cada grupo de actos, existe, usando as palavras de Figueiredo Dias, «pluralidade de sentidos de ilicitude típica» e, portanto, de crimes([28]).
Por conseguinte, ao contrário do que alega o arguido, inexiste qualquer violação do disposto no artigo 30.º, n.º 2 do Código Penal, estando em causa a pluralidade de crimes (13) por que foi condenado.
Improcede, portanto, também esta questão.

2.7. Do arbitramento de indemnização [recurso do arguido]
Alega o arguido que, de acordo com a conduta das ofendidas e dos seus representantes legais, nenhuma delas se considera com direito a uma indemnização, caso contrário teriam deduzido pedido de indemnização civil, nem considera que sofreu prejuízos, acrescentando que apenas se justifica a determinação pelo tribunal de uma compensação pelos prejuízos quando os mesmos existem, não sendo automático o decretamento de tal compensação.
Vejamos.
Ao contrário do que afirma o recorrente, sendo as menores vítimas de actos praticados pelo arguido qualificados comos crimes, a lei impõe o arbitramento de indemnização, presumindo a existência de particulares exigências da sua protecção, só assim não sendo quando a ele se oponha a vítima expressamente, o que não sucedeu no caso concreto, pois dos autos não consta qualquer declaração dos representantes legais das vítimas no sentido de se oporem ao seu arbitramento oficioso [cfr. arts. 16.º, n.º 2 da Lei n.º 130/2015 de 04/09 (Estatuto da Vítima), 67.º-A, nºs 1, a), iii) e b), 82.º-A, nºs 1 e 3 todos do Código de Processo Penal).
No que concerne aos danos, resulta da matéria de facto provada que o arguido praticou actos e proferiu expressões, sendo as visadas com as suas condutas as menores BB, CC, DD, EE, FF, GG e HH.
O arguido agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, com o intuito de assim satisfazer os seus instintos sexuais, propósito que foi renovando, durante o período em que foi concretizando os actos e proferindo as expressões, bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
O arguido sabia que os comportamentos sexuais por si praticados eram atentatórios do direito das menores ao livre desenvolvimento da personalidade na sua vertente sexual, aproveitando-se do fácil contacto que mantinha com as menores por força das relações que tinha com elas em virtude das funções que exercia na escola que frequentavam.
Assente que está a prática dos factos pelo arguido e a sua qualificação como crimes de abuso sexual de menores dependentes e crime de abuso sexual de crianças, é evidente a ofensa de bens das ofendidas protegidos pela ordem jurídica, a ofensa de direitos de personalidade, do direito à liberdade e autodeterminação sexual.
Sendo o dano toda a ofensa de bens ou interesses alheios protegidos pela ordem jurídica([29]) é evidente que as ofendidas sofreram, em consequência das condutas do arguido, e face aos factos provados supra, danos não patrimoniais, pois não são susceptíveis de avaliação pecuniária. 
Dispõe o artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil (aplicável ex vi art. 129.º do Código Penal) que, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º.
Não se duvidará de que os danos sofridos pelas ofendidas assumem uma gravidade tal que merecem, seguramente, a tutela do direito. Com efeito, trata-se de menores que foram sujeitas a expressões e actos causadores de importantes perturbações e cujas memórias do sucedido se irão intensificando à medida que, com o crescimento, for ganhando consciência do exacto significado de tais actos.
Assim, considerando o número de condutas relativamente a cada uma das menores, considerando a sua natureza dolosa, considerando ainda que o sujeito passivo da obrigação de indemnizar, o arguido, é detentor de uma situação económica que se pode qualificar de remediada, considerando ainda que, sendo graves todas as condutas que vitimaram as ofendidas, uma das menores ((HH) é ainda uma menor de 14 anos, entendemos que a compensação dos danos não patrimoniais sofridos pelas ofendidas através do arbitramento de uma indemnização no valor de 1.250,00€ (mil duzentos e cinquenta euros) à BB, no valor de 1.250,00€ (mil duzentos e cinquenta euros) à CC, no valor de 1.000,00€ (mil euros) à DD, no valor de 1.400,00€ (mil e quatrocentos euros) à EE, no valor de 1.000,00€ (mil euros) à FF, no valor de 1.250,00€ (mil duzentos e cinquenta euros) à GG e no valor de 2.000,00€ (dois mil euros) à HH, como foi determinado pela 1ª instância, realiza a justiça do caso concreto.
Em conclusão, por ser equitativa, deve manter-se a indemnização fixada às ofendidas no acórdão recorrido.
Improcede, portanto, esta questão.        
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III – DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação nos seguintes termos:
A) Alterar o ponto 12) da matéria de facto provada devendo ler-se “entre Novembro e Dezembro de 2022” aonde se lê “entre Fevereiro e Março de 2022”;
B) Alterar o ponto 15) da matéria de facto provada que passará a ter a seguinte redacção:
15) No mês de Junho de 2023, ao ver que a menor FF tinha dois ou três chupões no pescoço, o arguido disse-lhe: “Ah, o que é isso? Isso fica mal no pescoço! Ah! eu não deixava de te fazer um, mas era mais aqui para o ombro para não se notar, porque isso fica feio assim.”;
C) Alterar o ponto 18) da matéria de facto provada que passará a ter a seguinte redacção:
18) Em data não concretamente apurada do ano de 2023, antes do mês de Junho, o arguido disse dirigindo-se a DD “Ah, ficam-te muito bem esses peitos nesse vestido, devias trazê-lo mais vezes
D) Alterar o ponto 51) da matéria de facto provada que passará a ter a seguinte redacção:
51) Consta do relatório social de fls. 811, que por via de processo disciplinar o Arguido foi despedido da EMP01..., no mês de Maio de 2024, por justa causa, o que considera injustificado, tendo interposto acção judicial.
E) Quanto ao mais, julgar improcedente quer o recurso do Ministério Público, quer o recurso do arguido AA, e, consequentemente, confirmar o acórdão recorrido.
*
Sem tributação o recurso do Ministério Público (Público (artigo 4.º, n.º 1, alínea a) do Regulamento das Custas Processuais).
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As custas do recurso do arguido AA serão suportadas pelo próprio, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (arts. 513.º, n.º 1 do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa a este último diploma legal).
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(O acórdão foi elaborado pelo relator e revisto pelos seus signatários, nos termos do artigo 94.º, n.º 2 do CPP)
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Guimarães, 28.10.2025

Os Juízes Desembargadores
Fernando Chaves (Relator)
Florbela Sebastião e Silva (1ª Adjunta)
Armando da Rocha Azevedo (2º Adjunto)


[1] Expressão nossa desprovida de sentido jurídico.
[2] In, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça- p. 07P015 de 15-02-2007. disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/ad5d340657230671802572830053c502?OpenDocument
[3] In, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça- p. 07P015 de 15-02-2007. disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/ad5d340657230671802572830053c502?OpenDocument
[1] - Diploma a que se referem os demais preceitos legais citados sem menção de origem.
[2] - Cfr. Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 7ª edição, 107; Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, Vol. 3, 2020, Universidade Católica Editora, pág. 335 e segs.
[3] - Acórdão do STJ de 29/4/2009, Proc. nº 607/09 da 3.ª Secção, in www.stj.pt/jurisprudência/sumários de acórdãos; No mesmo sentido, Acórdão do STJ de 17/2/2011, in www.dgsi.pt/jstj.
[4] - Cfr. Parecer da Comissão Constitucional n.º 18/81, Volume XVI, pág. 147.
[5] - Cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 330/97, de 17/4/97, e 387/05, de 13/7/05, in www.tribunalconstitucional.pt/tc.
[6] - Direito Processual Penal, Livraria Almedina, 5ª edição, 2024, pág. 222.
[7] - Cfr. Acórdão da Relação de Coimbra de 22/02/2023, disponível em www.dgsi.pt/jtrc.
[8] - Cfr. Acórdão do STJ de 13/10/1999, CJ ACSTJ, Ano VII, tomo III, pág.184.
[9] - Acórdão do STJ de 1/10/1997, Processo n.º 627/97-3ª.
[10] - Cfr. Curso de Processo Penal, II, pág. 30.
[11] - Cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal, Anotado, 10ª edição, pág. 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., pág. 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recurso em Processo Penal, 6ª ed., págs. 77 e segs.
[12] - Cfr. Acórdãos do STJ de 14/3/2007, de 23/5/2007 e de 3/7/2008, disponíveis em www.dgsi.pt/jstj.
[13] - Na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações, o Supremo Tribunal de Justiça veio fixar jurisprudência no sentido de bastar, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas – Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 3/2012, de 8/3, publicado no DR, I Série, de 18/4/2012.
[14] - Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 3ª edição, pág. 1122, nota 9.
[15] - Cfr. Acórdãos do STJ de 23/4/2009 e de 29/10/2009, disponíveis em www.dgsi.pt/jstj.
[16] - Cfr. Acórdãos do STJ de 15/7/2009, de 10/3/2010 e de 25/3/2010, disponíveis em www.dgsi.pt/jstj.
[17] - Acórdão do STJ de 18/01/2018, proferido, em 2ª instância, no Proc.º. 563/14.3TABRG.S1 - 3ª Secção, disponível em www.dgsi.pt/jstj.
[18] - Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5/5/1993, CJ, ACSTJ, Ano I, tomo II, pág. 218; Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Coimbra Editora, pág. 209; Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, Verbo, 3ª Edição, 2002, pág. 198.
[19] - Tratado de Derecho Penal, Parte General, 4ª edição, pág. 127.
[20] - Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, edição de 1974, pág. 215.
[21] - Cf. Cristina Líbano Monteiro, Perigosidade de inimputáveis e in dubio pro reo, página 166.
[22] - No mesmo sentido, entre muitos outros, os acórdãos do STJ de 05.02.2009, 14.10.2009 e de 15.04.2010, proferidos nos processos nºs 2381/08 - 5, 101/08.7PAABT.E1.S1 - 3 e 154/01.9JACBR.C1.S1 - 5, in www.stj.pt/jurisprudencia/sumáriosdeacórdãos/secçãocriminal.
[23] - Acórdão do STJ de 4.11.1998, in BMJ n.º 481, pág. 265.
[24] - Neste sentido, Jean-Denis Bredin, Le Doute et L’intime Conviction, Revue Française de Théorie, de Philosophie e de Culture Juridique, Vol. 23, (1966), pág. 25.
[25] - Acórdão do STJ de 02.05.1996, CJ, ACSTJ, 1996, Tomo II, pág. 177.
[26] - Cfr. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, págs. 447/450. Na 2.ª edição desta obra [de 2012, págs. 718/721] não se expressa relativamente ao conceito exactamente deste modo mas nem por isso a nova referência se mostra substancialmente divergente.
[27] - Cfr. Acórdãos do STJ de 6/4/2016, Proc. 19/15.7JAPDL.S1, de 20/4/2016, Proc. 657/13.2JAPRT.P1.S1, de 18/1/2018, Proc. 239/11.3TALRS.L1, de 22/3/2018, Proc. 467/16.5PALSB.L1-S1, e de 23/5/2019, Proc. 134/17.2JAAVR.S1, que acompanhamos de perto, todos disponíveis em www.dgsi.pt.jstj; e de 16/1/2020, in CJ, ACSTJ, Ano XXVIII, tomo I, pág. 131.
[28] - Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, pág. 989.
[29] - Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 9ª Edição, pág. 542.