NULIDADE DA SENTENÇA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
EXAME CRÍTICO DAS PROVAS
REGRAS DA EXPERIÊNCIA
Sumário


1, A nulidade da sentença prevista nos artigos 379.º, n.º 1, alínea a), e 374.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal, só ocorre quando a omissão for integral, salvo no tocante à exposição dos motivos de facto, cuja inapreensibilidade equivale à respetiva omissão integral.
2. Deve distinguir-se claramente facto e questão, incluindo-se a falta de apreciação de factos relevantes do objeto do processo no vício da insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, e a falta de apreciação de questões no vício da omissão de pronúncia.
3. O segmento da sentença subordinado ao tópico exposição dos motivos de facto não deve consistir na reprodução das declarações e depoimentos prestados em julgamento, em virtude do comando legal da concisão e do princípio da oralidade.
4. O esforço intelectual do julgador nesta sede deve ser direcionado para um verdadeiro exame crítico da prova, que se não quede por afirmações meramente proclamatórias ou vacuidades expositivas, traduzidas em lugares comuns ou chavões, mas avance decididamente na indicação das razões pelas quais se atendeu a determinada prova para formar a convicção em certo sentido.
5. A invocação das regras da experiência acarreta o correlativo dever intelectual da sua indicação. Isto é, regras da experiência, constitui uma miríade de sabedoria comum que encerra em si uma infinita pletora de conhecimentos, sendo necessário indicar a qual deles nos referimos no discurso, para, da sua análise e ponderação, poder resultar, ou não, a conclusão pretendida.

Texto Integral


I RELATÓRIO

1
No processo n.º 323/22.8PBBGC, do Juízo Local Criminal de ..., do Tribunal Judicial da Comarca de ..., teve lugar a audiência de julgamento, durante a qual foi proferida decisão com o seguinte dispositivo:

Em face do exposto julga-se improcedente a acusação, por não provada e, consequentemente:
I - Absolve-se o arguido – AA da prática em autoria material e na forma consumada, de um crime violência doméstica, previsto e punido pelos artigos 152.º, n.º 1, alínea a) e nº 2, alínea a), 14º, nº 1 e 26º, todos do Código Penal.
II - Sem custas.

III – Julga-se improcedente, por não provado, o pedido de indemnização civil deduzido e absolve-se o demandado do pedido.

2
Não se tendo conformado com a decisão, o Ministério Público apresentou recurso, formulando as seguintes conclusões:

1º No caso em apreço, o arguido AA foi absolvido da prática em autoria material e na forma consumada, de um crime violência doméstica, previsto e punido pelos artigos 152.º, n.º 1, alínea a) e nº 2, alínea a), 14º, nº 1 e 26º, todos do Código Penal.
2º Estabelece o art.º 127.º do Código de Processo Penal que “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”.
3º Este princípio da livre apreciação das provas não tem carácter arbitrário nem se circunscreve a meras impressões criadas no espírito do julgador, encontrando-se vinculado à busca da verdade e às regras da experiência e da lógica comum.
4º Ora, apesar de, efectivamente, a ofendida BB ter prestado declarações para memória futura, de fls. 238 a 291 e novamente em sede de audiência de discussão e julgamento (18.04.2024), assim como menor CC ter prestado declarações para memória futura, de fls.309 a 327, as testemunhas DD, EE, FF e GG [Vide audição das declarações prestadas pelas testemunhas na audiência de 11.01.2024, 21.02.2024 e 18.04.2024], conjugado com o relatório da perícia de Avaliação do dano corporal, de fls.109 a 110 e ainda a prova documental indicada em sede de libelo acusatório, outra conclusão não poderia ter efectuado, se não a condenação do arguido.
5º Ora, o Tribunal “a quo” não efetuou qualquer apreciação crítica destes depoimentos, pura e simplesmente omitindo-os, nesta parte, na fundamentação da sentença, cingindo-searestringir aprova àsdeclarações da ofendida BB, indicando de forma parca e apressada.
6º Por outro lado, de forma incompreensível, o Tribunal “a quo” indicou a existência de dúvidas sobre credibilidade do depoimento da testemunha CC (filho da ofendida e do arguido) e da testemunha DD (mãe da ofendida), sendo que ambos coabitavam com o casal [CC desde o nascimento e DD que inicialmente fazia videochamadas com a vitima e desde janeiro de 2022 passou a residir com o casal).
7º Não foi aventada qualquer motivação válida pelo Tribunal “a quo” para a existência de tal dúvida tanto mais que, conforme decorre da motivação da inquinação dos testemunhos de BB, CC, DD, EE, FF e GG.
8º Na verdade, o Trinunal “a quo” apenas refere as declarações para memória futura de BB, fls. 238 a 291, prestadas no dia 02.12.2022 disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal entre os pontos 11.17.02 a 12.02.53) e as declarações prestadas em sede de julgamento de 18.04.2024 disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, o seu início ocorreu pelas 10:29:05 horas e o seu termo pelas 10:57:46 horas, concluindo que as mesmas não foram corroboradas pela demais prova.
9º Tal não poderá proceder, já que tais declarações têm de ser forçosamente conjugadas com a restante prova testemunhal [CC, DD, EE, FF e GG], prova pericial (relatório da perícia de Avaliação do dano corporal, de fls.109 a 110 ) e prova documental (Auto de Denuncia NUIPC 324/22.6PBBGC, de fls.3 a 6 do Anexo A, Fotografias, de fls.20 a 22 do Anexo A; Registos clínicos, de fls.67 e 68, Aditamento, de fls.98, Auto de denúncia, de fls.3 a 5, Fotografias, de fls. 17, informação da PSP, de fls.48, Informação clinica, de fls.64, Cópias do Auto de denuncia e do despacho final do Processo n.º 191/20.4PBBGC, de fls.160 a 166; Cópias do Auto de denuncia e do despacho final do Processo n.º 123/16.4PBBGC, de fls.167 a 173; Cópias do Processo n.º335/14.5PBBGC, de fls.174 a 182).
10º O Tribunal “a quo” não cuidou de conjugar essas mesmas declarações da vítima, com a prova pericial junta aos autos, os documentos clínicos, e até mesmo, as várias denuncias anteriores (olhando para as datas em que tais denuncias foram apresentadas) e a restante prova testemunhal.
11º Assim, dos meios de prova escalpelizados, teremos de concluir que o Tribunal “a quo” errou no julgamento dos factos dados como não provados sob o n.º 1 a 60 quanto à conduta do arguido.
12º Por essa via, nos termos do disposto nos artigos 428.º, n.º 2, e 431.º, als. a) e b), do Código de Processo Penal, deve, em conformidade com o expendido e à respetiva fundamentação crítica, face ao reexame das provas a efetuar pelo Tribunal da Relação, dar-se como provados os seguintes factos: Factos dados como não provados sob os n.ºs 1 a 60 (pág.s 10 a 18 da sentença), correspondentes aos pontos 4 a 68 da acusação publica.
13º Constituem meios de prova que impõem decisão diversa da recorrida (art.º 412.º, n.º 3, al. b), do Código de Processo Penal), os depoimentos de:
i) BB ter prestado declarações para memóriafutura, defls. 238 a 291 e novamente em sede de audiência de discussão e julgamento de 18.04.2024 disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, oseu início ocorreu pelas 10:29:05 horas e o seu termo pelas 10:57:46 horas, ii) CC ter prestado declarações para memória futura, de fls.309 a 327- DD de dia 11.01.2024 disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, o seu início ocorreu pelas 10:05:30 horas e foi interrompido pelas 12:41:54 horas, iii) EE de dia 21.02.2024 disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, o seu início ocorreu pelas 14:40:26 horas e o seu termo pelas 15:34:33 horas; iv) GG de dia 21.02.2024 disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, o seu início ocorreu pelas 15:36:50 horas e o seu termo pelas 15:53:13 horas, v) FF de dia 18.04.2025 disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, oseu início ocorreu pelas 10:08:43 horas e o seu termo pelas 10:28:18 horas.
14º Subsequentemente, ponderados os condicionalismos previstos nos artigos 40.º, 70.º e 71.º, todos do Código Penal, que o arguido AA condenado, como autor material e na forma consumada, em um (1) crime de violência doméstica, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 14º n.º 1, 26º, e 152º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 al. a), todos do Código Penal em pena não inferior a 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão suspensa na sua execução pelo período temporal da respetiva duração da pena de prisão.
15º Tendo em conta o disposto nos art.os 70.º e 50.º do Código Penal, a personalidade do agente e as suas condições de vida, fazem crer que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição pelo que entendemos que a execução da pena referida deve ser suspensa na sua execução pelo período temporal da sua duração.

NORMAS VIOLADAS:
- 152º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 al. a), do Código Penal. - Art.º 127.º do Código de Processo Penal.
- art.s 151.º e 163º, ambos do Código de Processo Penal.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogar-se a sentença recorrida,
Substituindo-se a decisão absolutória integral relativa ao arguido AA, por decisão que:
Dê como provada a matéria de facto de 1 a 60 constante decisão proferida a fls. 609-613 verso, nomeadamente os pontos 4 a 68 da acusação.
E condene o arguido AA como autor material e na forma consumada, em um (1) crime de violência doméstica, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 14º n.º 1, 26º, e 152º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 al. a), todos do Código Penal em pena não inferior a 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão suspensa na sua execução pelo período temporal da respetiva duração da pena de prisão.

3
O arguido respondeu ao recuso, pugnando pela sua improcedência.

4
Recebidos os autos neste Tribunal da Relação de Guimarães, o Ministério Público emitiu parecer anuindo à posição enunciada pelo recorrente, aditando ainda a nulidade da decisão recorrida, por falta de fundamentação, nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal.

5
Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o arguido respondeu, defendendo a completude da motivação da decisão recorrida, opondo-se ao proposto no aludido parecer.

6
Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

II FUNDAMENTAÇÃO

1 Objeto do recurso:

A
Ocorre erro de julgamento em relação aos pontos 1 a 60 dos factos dados como não provados, no que concerne à conduta do arguido?

B
Em caso de resposta afirmativa à anterior questão, deve condenar-se o arguido como autor material e na forma consumada, em um crime de violência doméstica, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 14º n.º 1, 26º, e 152º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 al. a), todos do Código Penal, em pena não inferior a 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período temporal da respetiva duração da pena de prisão?

*
*
2 Decisão recorrida (excertos relevantes):

Fundamentação de Facto:
Discutida a causa ficaram provados os seguintes factos:

1 - O arguido AA e a queixosa, BB contraíram matrimónio, no dia ../../2011, em ..., na ...;
2 - No dia 13 de Maio de 2011, o arguido e a queixosa vêm para Portugal e fixaram residência na Rua ..., em ...;
3 - Desse casamento tiveram dois filhos em comum, CC, nascido a ../../2012 e CC, nascido a ../../2021;
4 - No ano de 2014, em data não concretamente apurada, e como a queixosa queria trabalhar, o arguido abriu-lhe um salão de cabeleireiro que passado pouco tempo acabou por fechar;
5 - No final do ano de 2015, o arguido sofreu um ataque cardíaco, e quando saiu do hospital, era a queixosa que tratava de tudo, do arguido, da habitação e do filho;
6 - Entretanto, a queixosa arranjou trabalho em ..., e decidiu ir para lá com o filho de ambos;
7 - A queixosa ficou cerca de dois meses em ..., mas como ficou sem trabalho, regressou a ...;
8 - No ano de 2020, em data não concretamente apurada, o arguido e a queixosa discutiram, na presença do filho, e mais uma vez veio à discussão o facto de a queixosa ter ido para ..., e a discussão foi de tal forma, que o filho CC teve um ataque de pânico;
9 – Na ocasião do parto do filho HH, a queixosa pediu ao arguido para fazer o parto em ..., e aquele, apesar de ter acedido ao seu pedido, não ficou com a queixosa durante o parto, tendo esta permanecido sozinha em ..., e repetidamente lhe dizia “podias ter feito o parto normal em ... andaste com a história de fazer o parto no privado”;
10 - No 21 de Janeiro de 2022, a mãe da queixosa, DD, veio da ... para os visitar, e ficou hospedada na residência comum do casal;
11 – A mãe da queixosa era para ficar só até ../../2022, acabou por ficar em Portugal mais tempo, porque, entretanto, começou a guerra na ...;
12 - Aquando do baptizado do HH e por causa dos convidados gerou-se uma discussão entre o arguido e a queixosa e o baptizado do HH acabou por não se realizar;
13 – No dia ../../2022, pelas 18.38 horas, a queixosa foi assistida em episódio de urgência no Hospital ..., apresentando escoriações na região cervical e lombar;
14 – O arguido não tem antecedentes criminais;
15 – O arguido vivia com a queixosa, os descendentes de ambos e a progenitora da queixosa, na Rua ..., ..., num imóvel pertença do arguido, de tipologia ..., com condições de habitabilidade e conforto;
16 - A queixosa permaneceu no imóvel aludido em 15, até Novembro de 2024, com os dois descendentes do casal e a sua progenitora;
17 - Após vacatura do imóvel por aqueles elementos, o arguido retornou ao seu imóvel e constatou que o mesmo apresenta uma fuga de água, pelo que decidiu permanecer a pernoitar na vivenda da irmã, sita no Bairro ..., até resolução desta situação;
18 – O arguido dispõe do apoio familiar e afetivo dos irmãos (tem sete irmãos, sendo que ambos os progenitores já faleceram, o progenitor em 1964, quando o arguido tinha três anos de idade) e mantém relacionamento afetivo próximo com a descendente, atualmente de vinte e dois anos de idade, fruto da relação de união de facto que manteve com uma colega de profissão, de 1992/1993 a 2003;
19 - Esta descendente integrava o agregado do arguido três dias por semana, numa dinâmica articulada com a anterior companheira;
20 - A descendente integrou o ensino superior no ano letivo 2019/2020, sendo, no presente, aluna de mestrado, em ...;
21 - Em 4-2-2011 o arguido estabeleceu relação matrimonial com a queixosa, cidadã de nacionalidade ..., mais nova que o arguido dezanove anos, precedida por comunicações entre ambos pelas redes sociais e uma visita à ...;
22 - O primeiro descendente do casal nasceu em ../../2012, sendo que o segundo descendente nasceu em ../../2021, decorrendo relativamente a este o processo de impugnação de paternidade, instaurado pelo arguido;
23 – O arguido descreve a relação matrimonial como tendo sido numa fase inicial gratificante, em harmonia com a esposa e descendente mais velha;
24 – O arguido assume que a sua atividade profissional era e é muito intensa, com prejuízo no tempo para estar em família;
25 - A rutura relacional do casal ocorreu em Agosto de 2022, com apresentação de queixa da queixosa na Policia de Segurança Pública de ..., tendo o arguido, por imposição judicial, deixado de residir no imóvel onde o casal residia, com posterior registo de mobilidade habitacional;
26 – O arguido apresenta um vasto e investido percurso académico e profissional, sendo detentor do grau de doutoramento em Biotecnologia, obtido em 2001, na Universidade ..., tendo a tese sido defendida na Universidade ..., no Instituto Superior de Tecnologia. Mestrado em Biotecnologia pela Universidade ..., em 1994 e Licenciatura em Biologia e Geologia pela Universidade ..., em 1986;
27 – O arguido pertence ao quadro de docentes do Instituto Politécnico ... (...)/ Escola Superior Agrária desde 1991;
28 – O arguido lecionou nesta Escola Superior as disciplinas de Biologia, Bioquímica, Ecologia, Microbiologia e Química;
29 – O arguido foi responsável pela lecionação das disciplinas de Biologia, Ecologia e Bioquímica no ... de 1995 a 2001;
30 – De 1982 a 1991 o arguido exerceu funções de docente em Escolas Secundárias, e no ano letivo de 87/88 funções de diretor da Escola Secundária;
31 – O arguido exercia funções de docência no IPB de ..., era Diretor do Curso de Biologia e Biotecnologia, e no presente e desde Setembro de 2024 está em licença sabática;
32 - Não obstante, o arguido participa em projetos da Escola Superior Agrária e orienta estágios, tendo publicado recentemente um livro de biotecnologia e está a preparar dois artigos científicos para publicação em revistas da especialidade;
33 – O arguido está igualmente a preparar provas públicas para agregação, para futura progressão profissional;
34 – O arguido é descrito pelo seu superior hierárquico, Prof. Dr. II, Diretor da Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de ... como um profissional responsável, empenhado e de relacionamento adequado quer com os alunos quer com os outros docentes;
35 – O arguido aufere de salário o valor de cerca de € 2.500,00 por mês (liquido) e apresenta como despesas mensais, € 100,00 com a medicação, € 200,00 de água, luz, internet, € 150,00 de prestação de alimentos para o descendente mais velho do casal (não efetua o pagamento da prestação de alimentos para o filho mais novo por aguardar desfecho do processo de verificação de paternidade), e à outra descendente continua a enviar-lhe o dinheiro que a mesma necessita para conclusão dos estudos superiores, em valores mensais variáveis;
36 - No âmbito clinico, o arguido informou ter registado problemas cardíacos no final do ano de 2015, com um longo período de convalescença;
37 – O arguido mantém terapêutica e acompanhamento clinico especializado, na valência de cardiologia;
38 - Ao nível da ocupação do tempo livre referiu-nos que centra a rotina diária em tarefas associadas à sua atividade profissional, na prática da atividade agrícola, em terrenos próprios e da família, e no convívio com os familiares e amigos. Perspetiva retomar a atividade desportiva;
39 - Na comunidade o arguido regista integração, posto a relação adequada que estabelece com a comunidade vicinal;
39 - No âmbito da medida da coação aplicada ao arguido de afastamento da residência da queixosa e proibição de contacto com a mesma, controlada com recurso a meios técnicos de controlo à distância, de 29-11-2024 a 11-7-2024, o arguido manteve uma postura adequada;
40 – O arguido demonstrou recetividade tanto no que concerne aos procedimentos de supervisão e controlo que decorreram da medida aplicada, como ao nível da intervenção individualizada realizada pelo técnico gestor;
41 - No âmbito pessoal o arguido vivencia o presente processo judicial com sentimentos de revolta, frustração e de injustiça, considerando-se vitima do comportamento manipulativo da queixosa;
42 – O arguido enfatiza o facto de ter perdido o contacto com os descendentes, referindo que apesar de subsistir a dúvida relativamente à paternidade do descendente mais novo, refere ter cuidado dele e sentir pelo mesmo afeto;
43 - Relativamente à queixosa o arguido pretende manter o afastamento, limitando o contacto com a mesma para tratamento de assuntos de interesse comum, designadamente os descendentes;
44 - No presente, a queixosa informou não residir em ... e não referencia ocorrências anómalas;
45 - O arguido perceciona que o presente processo judicial não teve impacto negativo na esfera familiar, profissional e social, mantendo adequada integração nos diferentes âmbitos;
46 - O arguido ao longo do seu percurso vivencial registou enquadramento familiar e socioprofissional, com particular investimento nas esferas académica e profissional;
47 - Este é o seu primeiro contacto com o sistema de justiça, e vivencia o presente processo com sentimento de revolta, frustração e injustiça;
48 - Cumpriu a medida de coação de afastamento da queixosa, sem registo de ocorrências anómalas;
49 - Segundo o serviço de reinserção social, o arguido reúne condições para a execução de uma medida na comunidade, direcionada para a interiorização do desvalor da sua conduta criminal, com afastamento da queixosa;
50 – Correram os seus termos no Juízo Local Cível de ... – Juiz ..., o processo de divórcio sem consentimento de outro cônjuge nº 1036/22.6T8BGC no qual figura como requerente BB e requerido AA, no qual por sentença transitada em julgado foi dissolvido o casamento aludido em 1, por divórcio decretado entre requerente e requerido e no âmbito do referido processo e no processo apenso A, foi homologado por sentença transitada em julgado o acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais dos filhos do casal, requerente e requerido;
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Não se provou que:

1 - Após o casamento, em data não concretamente apurada, estando a queixosa grávida de oito meses do seu filho CC, ao utilizar o computador, viu que o arguido estava a comunicar, através da internet, com outras mulheres, onde afirmava que não estava casado, tendo mesmo escrito, a uma delas, a seguinte expressão “querida vem para aqui”;
2 - Nessa altura, a queixosa fez as malas e decidiu sair de casa, mas o arguido pediu-lhe desculpa e acabou por ficar;
3 - Entretanto o filho CC nasceu, e o relacionamento entre eles piorou, porquanto o filho chorava durante a noite e o arguido mandava a queixosa sair do quarto de ambos, porque queria descansar;
4 - Quando a queixosa pedia ajuda para cuidar do CC, o arguido dizia-lhe “a minha mãe criou oito filhos, e tu não consegues fazer nada com um bebé só?”;
5 - Durante o casamento, em data não concretamente apurada, mas cerca de três meses após o nascimento do CC, e porque se estava a sentir mal, foi ao hospital, e teve de deixar o CC com uma amiga porque o arguido não quis ficar a cuidar do filho;
6 - No mês de Agosto de 2014, e porque tinham um jantar de família com vinte e cinco pessoas, a queixosa pediu ao arguido para a acompanhar ás compras, e aquele, contrariado, porque não queria ir, agrediu-a na casa de banho da habitação, apertando-lhe, com ambas as mãos, o pescoço, e ainda lhe disse “tu não respeitas o teu marido”;
7 – Na ocasião aludida em 4, o arguido diariamente se dirigia à queixosa e dizia que tinha feito um mau investimento;
8 - Para além do trabalho no cabeleireiro era a queixosa que cuidava, sozinha, da habitação, porquanto o arguido não a ajudava nas tarefas domésticas, e do filho menor de ambos;
9 - Após o regresso da queixosa de ..., o arguido, quando se dirigia à queixosa, apodava-a de “adúltera”, “traidora”, “puta”, “vaca gorda”, “filha da puta”, “... de merda”, e “vocês ... são todas filhas da puta não respeitam os maridos”;
10 - A partir dessa altura os ciúmes estiveram sempre presentes na relação entre ambos, e sempre que discutiam, o arguido trazia para a conversa o facto de a queixosa ter ido para ..., sempre com uma atitude controladora, queria sempre saber onde e com quem estava, inclusive pedindo-lhe para ligar por videochamada para poder ver o local onde a aquela se encontrava;
11 - Numa dessas ocasiões, em data não apurada, o arguido tirou o telemóvel à queixosa, e quando aquela lhe disse para o devolver, o arguido disse-lhe: “mas eu tenho direito de ver”, e acto continuo, levou consigo o telemóvel e fechou-se no quarto;
12 - O arguido agia sempre como se a queixosa fosse uma coisa de sua propriedade, mantendo um ascendente sobre a mesma, pelo facto daquela não trabalhar e não auferir qualquer vencimento, e quando a queixosa não fazia o que ele queria, impedia-a de ter acesso aos recursos económicos do casal, bloqueando-lhe os cartões, para que aquela não tivesse acesso ao dinheiro;
13 - Durante o casamento, de forma reiterada, o arguido proferia as seguintes expressões: “olha tu não tens direito a nada, se tu não agradeces ao marido”, “ah! Tens de me agradecer, tens de me dizer obrigada, obrigada, porque estás debaixo do meu tecto, em casa que construi, estás a viver à custa do que eu estou a ganhar” e “tens de me respeitar, tens de me obedecer, tens de agradecer por tudo o que faço por ti.”;
14 – No ano de 2016, no mês de Agosto, em data não concretamente apurada, quando regressavam a Portugal, vindos de ..., em ..., a queixosa vinha a conduzir, e a dada altura fez um “zigue-zague” com a viatura para se afastar de uns pássaros que estavam na estrada e o arguido, sem nada que o fizesse prever desferiu-lhe com força uma pancada com a mão aberta na face;
15 - Em consequência directa e necessária da conduta do arguido, a queixosa sofreu dores na parte do corpo atingida;
16 - De seguida, a ofendida, a chorar, parou a viatura e saiu da mesma com o filho;
17 - Perante isto, o arguido colocou-se no lugar do condutor e seguiu viagem, deixando os dois apeados na via pública, tendo mais tarde os ido buscar a meio do trajecto;
18 - No ano de 2017, em data não concretamente apurada, mas durante o casamento, o arguido pediu ajuda á queixosa para pendurar uma televisão na sala, discutiram, e o arguido, sem nada que o fizesse prever, e na presença do filho menor CC, desferiu com força uma bofetada com a mão aberta que atingiu a queixosa na face, na zona de um dos ouvidos, o que fez com que a queixosa ficasse dois a três dias sem audição naquele ouvido;
19 – Na ocasião aludida em 8, a queixosa saiu de casa com o filho e foi viver para a residência de uma irmã do arguido;
20 - Durante o tempo em que a queixosa permaneceu na casa da irmã do arguido, cerca de duas semanas, aquele todos os dias falava com a queixosa, pedindo-lhe desculpa, tendo aquela acabado por regressar à habitação comum do casal;
21 - Depois de ter regressado à residência comum os primeiros três meses correram bem, porém passado esse período, o arguido voltou a ser como era antes, a vontade daquele é que prevalecia, e se a queixosa o contrariasse o arguido proferia as seguintes palavras: “tens que me respeitar, tens que ser digna, tens que ser amorosa.”;
22 - O arguido tinha relações sexuais com a queixosa quando queria, independentemente da vontade desta, e nessas alturas afirmava que aquela que era “seca” e “fria”, e quando a queixosa declarava que não tinha vontade, o arguido proferia as seguintes palavras: “se não vais cumprir eu também não vou cumprir”, referindo-se ao facto de lhe vedar o acesso às contas bancárias e aos recursos económicos;
23 - Entretanto a queixosa voltou a engravidar do filho HH, e quando mostrou ao arguido o teste de gravidez, aquele disse: “isto pode sair, durante três meses, na tua idade”, e a queixosa quando o questionou se queria que ela fizesse um aborto, aquele respondeu: “bem tu estás grávida!”;
24 - Mesmo durante a gravidez do filho HH, o arguido discutia muitas vezes com a queixosa;
25 - Pouco tempo depois de a sogra estar a residir com eles, o arguido começou a queixar-se que existiam muitas despesas, proferindo as seguintes expressões: “tenho seis crianças á minha custa”, “estou aqui a aturar toda a gente”, as discussões iam aumentando, e sempre durante as refeições;
26 - O arguido discutia várias vezes com a sogra, e repetidamente afirmava que elas, a mulher e a sogra, eram “mal agradecidas”;
27 - Na ocasião aludida em 12, a mãe da queixosa, ao aperceber-se que estavam a discutir, questionou-os: “o que se passa aqui outra vez?”, tendo o arguido a mandado sair do quarto e respondido: “que não a tinha convidado a discutir aqui com a mulher”;
28 - No dia ../../2022, em hora não concretamente apurada, mas de manhã, o arguido andava atrás da queixosa proferindo as seguintes expressões: “vamos foder BB, que já estou farto de estar aqui à espera”, “vamos aí à sala, vou-te dar bem forte, estou com tesão”, a queixosa recusou, o que fez despoletar uma discussão;
29 - Por via disso, a queixosa saiu da habitação, com a mãe os filhos, indo fazer umas compras, e no supermercado “...” sito em ..., apercebeu-se que não tinha o cartão de crédito para efectuar o pagamento;
30 - Quando chegou á habitação confrontou o arguido, perguntando porque lhe tinha tirado o cartão, tendo aquele respondido: “estás a portar-te muito mal”;
31 - Depois do almoço, a queixosa foi adormecer o filho HH, deitando-se na cama, a seu lado;
32 - O arguido entrou no quarto, e sem nada que o fizesse prever dirigiu-se à queixosa, que se encontrava deitada só de cuecas, e desferiu-lhe, uma pancada com a mão fechada, na anca, ao mesmo tempo que lhe perguntou “que cartão usaste?”;
33 - A conduta do arguido fez com que o HH acordasse e começasse a chorar;
34 - De seguida, o arguido começou a abrir e a mexer nas gavetas dos móveis, a fim de localizar o cartão de crédito, e como a queixosa lhe disse para não mexer nas coisas dela, aquele disse-lhe: “isto tudo é meu, a casa é minha, tudo é meu, as cuecas são minhas, que fui eu que comprei, tu não trabalhas, és uma migalha de merda”;
35 - Para evitar que o arguido mexesse nas suas coisas, a queixosa, puxou-lhe pelo braço, e acto continuo, o arguido desferiu-lhe um empurrão, que fez com que aquela caísse desamparada, para cima da cama;
36 - Acto continuo, o arguido colocou-se em cima da queixosa, e com as duas mãos, apertou-lhe o pescoço;
37 - A queixosa, aos gritos, e a chorar, pediu auxilio, chamando pela mãe e pelo filho;
38 - Entretanto, a queixosa conseguiu desenvencilhar-se do arguido, saiu do quarto, e já no corredor da habitação dirigiu-se àquele e disse: “eu vou á policia agora, vais responder por tudo”;
39 - Ao ouvir aquelas palavras, o arguido ajoelhou-se junto à esquina da cama e desferiu várias pancadas com a cabeça na cama, ao mesmo tempo que dizia: “não sou eu que vou responder, vais responder tu”;
40 - De seguida, o arguido saiu da habitação e o filho CC foi atrás dele, e quando chegou á porta de entrada da habitação, aos gritos, disse: “o AA está a matar a minha mãe”;
41 - Em consequência directa e necessária da conduta do arguido a queixosa, para além de ter sofrido dores nas partes do corpo atingidas, apresentou lesões no pescoço, vestígio de equimose na região posterior de coloração esverdeada, com 2cm; e no membro inferior esquerdo, equimose na região da anca, de coloração arroxeada e áreas avermelhadas, com 15 por 5 cm de maiores dimensões;
42 - Tais lesões determinaram sete dias para a cura sem afectação da capacidade de trabalho geral e profissional;
43 - A arguida saiu da residência comum do casal, todavia, regressou;
44 - Desde que regressou, diariamente o arguido se dirigia à queixosa e proferia as seguintes palavras: “tens que sair de casa, vou-te desligar a água, a luz e internet de casa, não vais ter aquecimento em casa”;
45 - No dia 29-10-2022, em hora não concretamente apurada, o arguido estava a mexer no interior das gavetas do quarto da queixosa, e quando confrontado por aquela respondeu “quem quer ter privacidade, arranja casa, tu estás na minha casa, não tens direito a privacidade eu faço aquilo que eu quiser”;
46 - Desde o inicio da relação, o arguido é protagonista de vários episódios  de violência física e verbal,   e discussões várias, proporcionando um ambiente familiar degradante, exercendo sobre a queixosa, o necessário ascendente, fazendo-a sentir-se inferiorizada, causando-lhe receio e subjugando-a à sua vontade;
47 - O arguido agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente;
48 - O arguido sabia que as palavras que dirigiu à queixosa, a ofendiam na sua honra e consideração, o que quis e conseguiu;
49 - O arguido actuou com intenção de molestar o corpo da queixosa, o que quis e conseguiu;
50 - Sabia que as palavras que proferiu, de forma a fazer crer que estava firmemente decidido a concretizar tais afirmações, e lhe dirigiu, eram adequadas a causar na queixosa, receio pela sua vida, integridade física, segurança e bem-estar, o que quis e conseguiu;
51 - Sabia o arguido que o seu comportamento era adequado a constranger a queixosa na sua liberdade de determinação e na sua vida privada, nomeadamente quando a queixosa contrariava a vontade do arguido, firme no propósito de a molestar psicologicamente, o que quis e conseguiu;
52 - O arguido bem sabia que estava a constranger a queixosa a manter relações sexuais com aquele, contra a sua vontade, nomeadamente ao cancelar os cartões à queixosa, impedindo-a dessa forma de ter acesso aos recursos económicos do casal, caso a mesma não mantivesse relações sexuais com aquele, o que quis e conseguiu;
53 - Sabia também o arguido que o seu comportamento era adequado a afectar a dignidade pessoal da queixosa, bem como o seu equilíbrio psíquico, criando nela sentimentos de vergonha, humilhação, diminuição e frustração, o que quis e conseguiu;
54 - Sabia ainda que os factos descritos foram praticados na presença dos filhos menores de ambos e na residência comum do casal;
55 - O arguido tinha conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei, todavia, não se absteve de a prosseguir;
56 – A queixosa ficou dois ou três dias sem audição no ouvido;
57 - A queixosa sofreu dores que se prolongaram por vários dias, impedindo-a de gozar na plenitude a saúde que sempre teve;
58 - A queixosa sentiu medo, ansiedade, sobressalto, insónias, que lhe converteram a vida num verdadeiro calvário durante semanas e meses;
59 - Actualmente a   queixosa  sente-se devastada psicologicamente;
60 - A conduta do arguido causou profundo desgosto a queixosa que se sentiu humilhada e vexada.
*
*
Motivação

O Tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados e não provados com base na apreciação crítica dos depoimentos das testemunhas de acusação e de defesa cujo teor consta do registo fonográfico apreciados à luz de regras de normalidade e de experiência comum.
E ainda com base no teor da prova documental analisada de forma critica e junta aos autos:
- auto de denúncia de fls. 3 a 5;
- reportagem fotográfica de fls. 17 e fotografias de fls. 20 a 22 do apenso A;
- assentos de nascimento de fls. 29 a 30, 89, 90 e 47 do apenso A; - informação da PSP de fls. 50;
- informação clinica de fls. 66 a 68;
- certificado de Registo Criminal de fls. 75, 76, 103, 105, 504, 50 verso do Apenso A
- relatório do exame médico-legal realizado a BB de fls. 109 a 110;
- relatório do exame médico-legal realizado a AA de fls. 112 a 114;
- e-mail de fls. 536;
- relatório social de fls. 578 a 584;
- auto de denúncia de fls. 3 a 5 do apenso A; *

Declarações do arguido - AA

O arguido não prestou declarações, dizendo apenas que tem sofrido muito com isto há três anos e está afectado psicologicamente.
E disse ainda que é tudo mentira.
*
Testemunhas da acusação

- CC, filho do arguido e da queixosa.
Disse que sabia de muitas situações da mãe e do pai.
Disse que no salão de baixo da casa viu o pai dar uma chapada forte na mãe, não estava mais ninguém presente.
Disse que quando foram para a ... estavam a passar pássaros e a mãe parou e o pai deu uma chapada à mãe.
Depois a mãe e ele, depoente, saíram do carro e a mãe ligou a uns amigos e foram estes que os foram buscar (versão contrária á da mãe que disse que foi o arguido que os levou de volta).
Disse que aconteceu um escândalo e ele, depoente, chamou a polícia. Disse que foi ele, depoente, que chamou a policia.
Disse que houve uma discussão entre os pais e ele, depoente, disse a avó para ir para a rua e saíram para o exterior da casa.
Disse que não viu bater na mãe.
Disse que o pai chamou nomes á mãe, filha da puta, as ... são todas umas putas,
Disse que numa ocasião, durante o jantar, a avó estava na escola a aprender português, e o pai deu uma chapada na mãe (o que não foi referido pela queixosa).
Disse que depois do hospital foram para um hotel e depois foram para uma casa e ficaram lá para cerca de um mês e depois voltaram para casa e o pai foi para casa de família.
Disse que num dia o pai disse a avó que ela tinha que sair de casa ou para a rua ou para a ....
Disse que a mãe não batia no pai, nem ouviu a mãe a chamar nomes ao pai.
Quando o arguido batia na mãe em 2020, o menor chorou muito e foram para a casa da amiga JJ.

*

- BB, queixosa.
Disse que ela, depoente e o arguido, conheceram-se na internet e que o arguido ia muitas vezes a ... visitá-la.
Disse que ela, depoente, trabalhou na ... e depois por causa do casamento veio para Portugal e passou a viver na casa do arguido.
Disse que as coisas correram bem como um casal e a dada altura ela foi ao computador e reparou que o arguido contactava mulheres e dizia que não estava casada e ficou triste e saiu para a rua e encontrou uma amiga ... de nome KK e a noite regressou a casa e começou a fazer as malas e disse que ia para a ... e ele pediu desculpa e disse que aquilo não era nada.
Disse que na altura, ela, depoente, estava grávida.
Disse que a criança nasceu e chorava muito e o arguido disse-lhe que a mãe teve oito filhos e ela não conseguia criar um.
Disse que a dada altura tinha muitas dores de cabeça e queria ir para o hospital e como o arguido não a levou ligou para uma amiga que ficou com a criança.
Disse que entre 2011 a 2014 aconteceram coisas ligeiras mas nada relevante.
Disse que em Agosto, foram fazer as compras para a festa, e o arguido agarrou o pescoço da depoente na casa de banho e depois pediu desculpas, e ela, depoente, não ficou com marcas no pescoço.
Disse que dava-se bem com a família do arguido e com a filha do arguido que passava muito tempo com eles.
Disse que em 2014 o arguido abriu um cabeleireiro para a queixosa e contrataram uma empregada e a dada altura como o cabeleireiro não corria bem, o arguido disse para ela fechar.
Disse que o arguido dizia que só tinha prejuízo com ela, para ela não trabalhar e ficar em casa.
Disse que em Novembro de 2015 o arguido teve um problema de saúde.
Disse que em Maio de 2016, ela, depoente, foi para ... trabalhar numa oficina de carros, tinha uma promessa de emprego e que quando estava em ... foi ao multibanco e o cartão estava bloqueado.
Disse que ela, depoente, foi fazer queixa a GNR e depois voltou para ....
Disse que depois dela, depoente, regressar de ... o arguido estava muito ciumento e começou a tratá-la de maneira diferente, e insultava-a de filha da puta, dizia que as ... são todas filhas da puta, vaca gorda, ... de merda, as ... não respeitam o marido.
Disse que uma vez o arguido tirou-lhe o telemóvel e não viu nada porque estava bloqueado.
Disse que o arguido foi sempre controlador e tratava-a como propriedade dele.
Disse que o arguido estava sempre a cobrar as coisas, e dizia que que ela, depoente, vivia a custa dele.
Disse que numa altura estavam a colocar a televisão e houve uma discussão entre ambos e o arguido deu-lhe uma chapada no ouvido e ficou sem ouvir três ou quatro dias e o CC viu e começou a gritar e o arguido ajoelhou-se e pediu-lhe desculpa.
Disse que o cartão está com o arguido, a casa em nome dele, e ela, depoente, está dependente do arguido.
Disse que a primeira agressão foi quando o arguido apertou o pescoço na casa de banho (suscitando dúvidas ao Tribunal tal ocorrência por ter sido evasivo, ligeiro e pouco convincente o depoimento da queixosa na medida em que limitou-se a dizer que iam as compras por causa de uma festa e o arguido apertou-lhe o pescoço sem mais).
Disse que a segunda agressão foi quando estavam a pendurar a televisão e houve uma discussão e o arguido deu-lhe uma chapada, sem concretizar a razão da discussão, afigurando-se também evasiva e ligeira a forma como depôs.
Disse que a terceira agressão foi quando foram a ..., ela, depoente, conduzia o carro e por causa de uma manobra o arguido deu-lhe uma chapada e o CC estava no carro e depois o arguido foi-se embora e voltou para os levar de volta (versão diversa da do filho CC que disse que regressaram com uns amigos).
Disse que houve umas discussões e o filho CC por vezes ficava assustado e soluçava de medo.
Disse que numa altura foram morar para a casa da irmã do arguido e depois voltaram para casa a pedido do arguido.
Disse que em 2021 engravidou e o arguido disse para não se preocupar porque ia perder a criança por causa da idade.
Disse que o arguido dizia à depoente “tens que me respeitar, tens que me obedecer, tens que me agradecer pelo que faço por ti”.
Disse que o arguido dizia-lhe, á depoente, que era fria e seca, não tens idade para fazer sexo, não és amorosa, que as ... não sabem o que é o valor de família.
Disse que ela, depoente, deixou o trabalho dela e tudo para vir para Portugal com o arguido.
Disse que a sua mãe veio para a visitar.
Disse que o parto do filho HH foi em ... no hospital privado e ficou lá três ou quatro dias.
Disse que o HH nasceu em ../../2021.
Disse que em casa não tinha nenhuma ajuda do arguido era o filho CC que a ajudava.
Disse que a sua mãe, da depoente, veio para cá em Janeiro de 2022 para passar férias e acabou por ficar cá por causa da guerra e com o acordo do arguido e depois o arguido começou a queixar-se das despesas, da luz, água e comida.
Disse que o arguido chamava a depoente e a sua mãe de cobras e mal agradecidas.
Sobre o baptizado do filho HH, disse que tinham combinado e o arguido queria convidar um irmão e a queixosa disse que em vez de convidar um irmão tinha que convidar todos e depois o arguido dizia que a mãe dela também não ia e depois por falta de acordo quanto aos convidados não houve baptizado.
Disse que depois houve uma discussão entre o arguido e a queixosa e o CC ficou muito assustado.
Sobre a expressão “vou-te dar bem forte”, confirma que o arguido disse isto.
Sobre a ida ao ... disse que foi depois, antes disso houve uma discussão.
Disse que a mãe da queixosa deixou de passar camisas do arguido e a noite o arguido começou a discutir e ela, depoente, saiu e quando regressou o CC chamou a policia mas esta não fez nada e foi-se embora.
Disse que o filho CC chamou a policia porque tinha medo porque o arguido estava a discutir.
Disse que no outro dia ia buscar a comida social e foram ao ..., aí fizeram compras e quando chegou a caixa para pagar viu que não tinha cartão para pagar porque o arguido tinha lhe tirado o cartão de manhã.
Disse que devia oitenta euros à mãe do cabeleireiro. Disse que depois tinha outro cartão que deu.
Disse que num certo dia, a dada altura estava quase a adormecer e chegou o arguido com uma cara estranha e perguntou pelos sessenta euros, e o arguido começou a mexer nas gavetas das coisas da depoente que lhe perguntou o que é que ele estava a fazer e o arguido dizia que aquilo era tudo dele e atirou-a para cima da cama e começou a sufocá-la com as mãos no pescoço só não conseguiu porque ela defendeu-se pondo a mãe na boca dele e afastou-o.
Disse que o arguido disse-lhe “és uma migalha de merda”. Disse que o filho HH estava na cama e não foi atingido.
Disse que depois ela, depoente, foi para o corredor gritar e disse ao arguido que ele ia responder por tudo agora e o arguido bateu com a cabeça dele contra a cama e disse que era ela que ia responder.
Disse que o bebé ficou assustado.
Disse que o filho CC e a sua mãe saíram do quarto e viram a depoente a chorar e viram o arguido a bater com a cabeça contra a cama e depois ela, depoente, foi a policia e o filho CC saiu a rua e gritava.
Disse que quando chegaram a policia o arguido já lá estava na policia.
Disse que na policia a mãe da depoente começou a sentir-se mal e foi para o hospital e ela, depoente, foi assistida no hospital embora não fosse muito grave.
Disse que nesse dia foram para o hotel Ibis e no dia seguinte foram a policia.
Confrontada com as fotografias de 20 a 22 do processo apenso A e fls. 17 do processo principal que se refere ao arguido, confirmou o teor.
Disse que fez queixa e foram para uma casa de acolhimento durante uma semana e as crianças ficaram com diarreia.
Disse que depois o arguido disse à técnica para voltarem para casa que ele saía e elas voltaram e a dada altura o arguido aparece lá em casa mas saiu de seguida.
Disse que o arguido foi a casa buscar medicação.
Disse que o arguido disse que ia desligar a água e a luz.
Disse que o arguido foi lá e mexeu nas gavetas e disse á depoente que tinha que ir embora.
Confrontada com os documentos de fls. 201 a 201, disse que são mensagens trocadas entre ambos, ela, depoente e o arguido.
Disse que quando ela, depoente, foi para ..., houve prejuízo para o casal, emprestaram a quantia de vinte mil euros a uma pessoa ....
A queixosa, para além das declarações para memória futura, prestou ainda depoimento na audiência.
Disse que isto começou em 2014, o arguido estava a sufocá-la na casa de banho e ela sempre o perdoava.
Disse que a violência psicológica era a pior, porque ela não trabalhava e segundo o arguido tinha que lhe agradecer porque estava a viver na casa dele e comia da mão dele, estava sempre a humilhá-la, sempre apontava que ela não era nada, insultava-a de puta, vaca gorda, ... de merda.
Disse que no passeio a ... também lhe deu uma bofetada no percurso e isto foi em 2016.
Disse que no episódio da televisão deu-lhe uma bofetada no ouvido que teve que tomar brufen e que isto sucedeu em 2017.
Disse que o que a preocupava, á queixosa, é o estado do filho CC que presenciava a situação de violência.
Disse que em 2015 o arguido sofreu ataque cardíaco e depois ficou deprimido e ela, queixosa, a dada altura foi para ... e aí o arguido bloqueou o cartão de crédito e ela teve de regressar a casa.
Disse que o arguido aproveitava-se dela estar cá sozinha e não ter nenhum apoio.
Disse que chorava muito.
Disse que dormiu duas ou três vezes na casa da amiga JJ. Disse que ia para casa das amigas porque o filho não queria estar em casa.
Sobre ferimento no ombro, disse supor que foi na mesma altura do pescoço.
Disse que a primeira preocupação da queixosa era o filho. Disse que actualmente já trabalha no controlo de qualidade.
Disse que os filhos não estão melhores, o CC está a ser acompanhado por psicólogo e o HH deixou de falar, com três anos e não fala.
Disse que foi sempre perdoando o arguido e neste momento não é capaz de o perdoar.
Disse que ela, depoente, nunca teve apoio psicológico porque não quis.
Disse que está a trabalhar desde Outubro de 2023.
Disse que o CC não tem contactos com o pai porque não quer. Disse que o CC nunca chamou pai ao arguido e que o arguido nunca actuou como pai.
*
O depoimento da queixosa pela forma vaga, ligeira, dispersa e evasiva como foi prestado e sem consistência, suscitou dúvidas ao Tribunal acerca da ocorrência dos factos. Note-se que as lesões apresentadas pela mesma e constante das fotografias de 1 de Agosto de 2022 não se coadunam com a descrição efectuada pela mesma da conduta do arguido. Acresce que a queixosa apresenta versões divergentes no que respeita à actuação do arguido, ora dizendo que o mesmo a empurrou para cima da cama e apertou-lhe o pescoço ora dizendo que o mesmo lhe deu murros e unhadas como resulta do relatório da perícia médico-legal.
*
- DD, divorciada, 61 anos, mãe da queixosa.
Disse que está em Portugal desde Janeiro de 2022 e foi viver para a casa do arguido e da filha.
Disse que quando ela, depoente, morava na ... contactava a filha por videochamada e ela sempre reclamou dos conflitos entre a filha e o arguido.
Disse que a primeira vez foi quando estava grávida do CC, a sua filha queria voltar para a ... por causa do arguido contactar com outras mulheres na net e dizia que era solteiro e a queixosa viu isso.
Disse que na altura o arguido pediu desculpa e a sua filha ficou. Disse que quando a sua filha ficou mais carinhosa com o arguido,
a depoente disse á filha que o filho ia nascer e ela ia ficar mais carinhosa.
Disse que quando o CC fez dois anos, a sua filha disse que o arguido apertou-lhe o pescoço na casa de banho.
Falou do episódio da televisão e a depoente ainda estava na ....
Disse que as vezes a filha ficava na casa das amigas com o filho. Disse que a filha disse-lhe, á depoente, que o arguido bateu-lhe
quatro vezes (versão diversa da queixosa que referiu três episódios). Disse que segundo a sua filha, porque ele, depoente, nunca viu, o
arguido apertou o pescoço á filha, bateu-lhe no ouvido e outra vez bateu na cara e na quarta vez.
Disse que ela, depoente, nunca viu o arguido agredir a queixosa, foi a queixosa que lhe contava.
Disse que o arguido fez isso na presença do filho CC. Disse que o CC tinha medo que o arguido agredisse a mãe.
Disse que chegou a ver o CC a tremer quando havia conflitos entre o casal.
Disse que depois de Janeiro de 2022, quando vivia com o casal, viu escândalos, discussões frequentes, a filha preparava o jantar e o arguido insultava-a.
Disse que era o arguido que começava.
Disse que ela, depoente, chegou a ouvir o arguido a insultar a filha de puta e prostituta.
Disse que numa vez na hora do almoço, surgiu um conflito e eles gritaram e o CC estava na escola.
Disse que quando o HH começou a chorar a depoente interviu, foi ao quarto onde estava o casal e ouviu o arguido a dizer aquilo à filha.
Disse que o arguido disse a filha bate-me, bate-me, provocando a filha (sugerindo que era a filha, queixosa, que agredia o arguido).
Disse que nesta altura não houve agressões físicas mas houve insultos, “as ... são prostitutas”, “gorda”.
Disse que quando a depoente foi para as aulas de português, a depoente chegou e viu o CC nervoso e a vomitar por nervos e disse que o pai bateu á mãe com um murro na cabeça.
Disse que a filha não tinha cartão multibanco porque o arguido tirou-lhe.
Disse que quando o arguido apercebeu-se que a depoente não ia regressar a ..., ficou menos acolhedor.
Disse que nunca foram ao hospital.
Sobre a quantia de oitenta euros do cabeleireiro, disse que a filha não pagou porque não conseguia pagar porque o cartão estava bloqueado, referindo que ela, depoente, sabe disto porque a filha lhe contou. E depois ela, depoente, deu o dinheiro á queixosa para pagar.
Disse que depois o arguido desbloqueou o cartão e a filha levantou a quantia de sessenta euros.
Disse que depois das compras quando chegaram a casa foram descansar e dormir e o arguido estava na casa do irmão. E depois o arguido chegou a casa e bateu (tocou) na filha e perguntou-lhe pelos sessenta euros. Disse que ela, depoente, não viu isto foi a queixosa que lhe contou.
Disse que o arguido apertou-lhe o pescoço e a filha gritou e disse-lhe que ia a policia e o arguido bateu com a sua própria cabeça na cama.
Disse que o CC dormia com a depoente e o HH com a filha.
Disse que o casal, o arguido e a filha dormiam separados desde Janeiro de 2022.
Disse que a casa tinha três quartos.
Disse que no dia ../../2022 a depoente acordou com os gritos da filha e nesse dia foi quando apresentaram queixa a policia.
Disse que o arguido saiu de casa antes da queixosa e nesse dia o CC gritou que o AA estava a matar a mãe.
Disse que nesse dia dormiram num hotel não voltaram para casa. Disse que a filha era dependente do arguido que não a deixava trabalhar (o que foi infirmado pela prova produzida da acusação e da defesa, da qual resultou que o arguido abriu um cabeleireiro para a filha trabalhar e a filha foi para ... para trabalhar).
Disse que a filha vive com o arguido desde 2011. Disse que a filha trabalhou três meses no cabeleireiro.
Disse que ela, depoente, não estava cá quando nasceram os netos.
Sobre ameaças, disse que o arguido dizia a filha que ela tinha que lhe agradecer tudo, humilhou-a.
Disse que a filha cuidava dos filhos e do arguido.
Disse que a filha tinha um cartão com limite de € 20,00 por dia e disse que o arguido reclamava quando a filha comprava coisas mais caras, tipo iogurte.
Disse que ela, depoente, nunca viu o arguido a bater na filha. Disse que em 2017, quando ela, depoente, esteve cá a visitar a filha, viu o arguido empurrar a filha.
Disse que as agressões de que fala, foi a filha que contou e o CC.
Disse que chegou a ver o arguido a insultar a filha e acontecia nas horas das refeições. Disse que chamou as ... de prostituta.
Disse que o HH deixou de falar com o trauma aquando do episódio de 31 de Julho.
Disse que o arguido dizia a filha que tinha que fazer sexo com ele se não cortava-lhe o cartão.
Disse que a queixosa estava nervosa.
Sobre a preparação de uma festa em que o arguido apertou o pescoço a queixosa, a depoente disse que sabe disso porque a filha lhe contou por videochamada passados dois dias não no dia do episódio. Disse que a filha não mostrou qualquer marca de agressão.
Disse que houve quatro agressões.
A primeira vez foi quando o arguido apertou o pescoço da filha, a segunda foi quando o arguido bateu no ouvido aquando da colocação da televisão, a terceira foi quando o arguido bateu na bochecha com a mão aberta quando estavam no carro o arguido, a filha e o CC, aquando do passeio a ... e a filha e o neto voltaram para casa a pé (versão diversa da versão da filha que disse que foi o arguido que os trouxe) e a quarta vez foi em 2017 quando o arguido empurrou a filha.
Disse que ela, depoente, só presenciou o empurrão referido em último lugar.
Disse que ela, depoente, esteve três vezes no hospital.

Disse que num dia, que não sabe precisar a data, a hora do almoço houve um conflito e as crianças começaram a gritar, ela, depoente, estava presente, por isso foi depois de Janeiro de 2022, o CC ficou na escola e durante o almoço houve um conflito e depois do almoço o conflito continuou no quarto. Disse que só chorou o HH e que foi neste episódio que a depoente retirou a filha do quarto e foi quando o arguido dizia á filha, bate-me, bate-me (a filha, queixosa, não falou disto).
Disse que o arguido provocou a filha e a depoente não queria que o conflito continuasse e por isso retirou a filha.
Disse que no dia em que a depoente estava nas aulas de português e o CC disse que o arguido bateu na filha e que esta ficou com marca (inchaço e vermelho) na cabeça que a depoente curou e a filha não quis ir ao hospital.
Disse que nunca viu o arguido a tirar o cartão a filha mas viu que a filha queria pagar e não conseguiu e isto aconteceu no ... e por isso deixaram os produtos na caixa, isto foi na hora do almoço.
Disse que um cartão foi bloqueado e outro foi esmagado e deste conseguiu levantar dinheiro e isto foi tudo no mesmo dia.
Disse que não levaram os produtos num dia mas de outra vez, noutro dia, levantaram dinheiro no multibanco.
Disse que há dois episódios no ... em que a filha ia para pagar as compras e o cartão não dava para pagar.
Sobre o episódio do dia ../../2022, a depoente disse que não viu o arguido agredir a filha, só viu marcas na filha, no pescoço, marca dos dedos e também viu marca no corpo da filha, do lado da cintura, arranhado com as unhas.
Confrontada com o facto do arguido abrir o cabeleireiro à filha e com o facto do arguido não deixar a filha trabalhar, a depoente disse que o arguido não deixava a filha trabalhar por conta de outrem.
Disse que quando a filha esteve grávida pela primeira vez, o casal tinha empregada doméstica para arrumar a casa e na segunda gravidez a depoente não sabe.
Disse que o casal, a filha e o arguido, não viveu na ....
Disse que a filha chegou a ir para ... para trabalhar, e nessa altura a filha tinha cartão multibanco.
Disse que a filha e a depoente tomam medicação ... e da ... para a tensão arterial e para acalmar.
Disse que actualmente estão a viver na casa do arguido.
Disse que quando estiveram a residir na casa de acolhimento as crianças ficaram com diarreia e depois o arguido disse para irem viver para casa dele, do arguido e foram viver para lá e o arguido saiu de casa mas ia lá as vezes porque tinha a chave da porta e dizia-lhes que tinham que ir embora porque a casa não é delas.
A depoente e a filha moram na casa do arguido sem o mesmo desde Agosto de 2022, depois do episódio de Julho de 2022.
Sobre o baptizado do HH, disse que o arguido e a filha queriam fazer o baptizado mas o arguido disse que a filha não tinha dinheiro para a festa e levantou-se a questão por causa dos convidados e acabaram por não fazer o baptizado.
Disse que o arguido não queria que a depoente estivesse no baptizado, então a filha resolveu não fazer a festa nem baptizaram a criança.
Disse que o arguido só queria convidar um irmão dele e a filha disse que se ele convidasse um irmão devia convidar os irmãos todos e não um só.
*
O depoimento da testemunha DD revelou que o que sabia foi pela própria filha, queixosa, que lhe contava e que não presenciou os factos, contrariando a versão da própria em algumas situações, suscitando dúvidas sobre a ocorrência dos factos.
*
- EE, 40 anos, casada.
Disse que conhece a queixosa, é amiga da mesma e conhece o arguido.
Disse que primeiro era amiga da queixosa e depois passou a ser do casal.
Disse que conheceu a queixosa quando ela abriu o salão de cabeleireiro em 2014 ou 2015, não sabe precisar.
Disse que nunca chegou a ver o arguido no salão de cabeleireiro. Disse que não se apercebeu que a relação entre o casal não era boa.
Disse que só se apercebeu de algo quando o salão estava para fechar e a queixosa disse que as coisas não corriam bem e que o arguido reclamava.
Disse que o arguido gostava que a queixosa ficasse em casa, dizendo que sabe disto pela queixosa.
Disse que as vezes a noite a queixosa ia para casa da depoente e chorava e o CC também chorava e a queixosa queixava-se do arguido por este querer que ela ficasse em casa.
Disse que isto era assim depois de fechar o salão, desde 2014. Disse que o CC tratava o arguido por AA.
Disse não saber se foi em 2019 ou em 2020 viu a queixosa com marcas no pescoço. Disse que a queixosa foi com o CC para casa da depoente e a queixosa disse que o arguido apertou-lhe o pescoço e a queixosa ficou lá dois dias. Disse saber disto porque a queixosa lhe contou.
Disse que a queixosa só dormiu duas vezes na casa da depoente e nessa altura o arguido telefonava á queixosa e dizia-lhe que precisava do carro para ir para o hospital.
Disse que a queixosa foi para ... trabalhar e o arguido bloqueou o cartão de crédito para ela voltar, fez tudo para ela voltar.
Disse que nunca ouviu qualquer insulto e a queixosa contava á depoente que o arguido insultava-a de puta.
Disse que só ouviu o arguido dizer que a queixosa tinha que assumir o que fez.
Disse que ela, depoente, soube que a queixosa foi para ... no início de 2016. Disse que a queixosa foi para ... em 2016.
Disse que nunca ouviu o arguido insultar e agredir a queixosa. Disse que no casal estava tudo bem até a queixosa conhecer uma amiga ... e começou a sair.
Disse que ela, depoente, só sabia de alguma coisa porque a queixosa queixou-se e contou à depoente porque a depoente nunca presenciou nada.
Disse que nunca presenciou nada de agressão e insultos no casal, entre o arguido e a queixosa.
Disse que a queixosa disse á depoente que o arguido a queria matar.
Disse que as coisas no casal pioraram quando a queixosa conheceu a amiga LL porque saia muito e a LL trabalhava no salão.
Disse que a queixosa foi para ... para trabalhar e acha que o arguido não estava contra.
Disse que há um ... que era camionista e o arguido emprestou dinheiro ao ... e acha que foi este que arranjou o emprego para a queixosa.
Disse que a queixosa conheceu o ... na net.
Disse que a queixosa saia muito a tarde, após o fecho do salão e o arguido não gostava.
Disse que o arguido á frente da depoente sempre foi um anjo. Disse não saber se a queixosa toma medicação.
Disse que o arguido não queria que a queixosa trabalhasse por causa do IRS.
*
Esta testemunha nada revelou saber sobre os factos imputados ao arguido, de agressão e insulto á queixosa, por nunca ter presenciado nada, referindo apenas o que a queixosa lhe contava e que não foi dito pela própria, que o arguido a queria matar.
*
- MM, costureira.

Disse que conhece o arguido porque é marido de uma conhecida e conhece a queixosa desde 2010 porque conheceram-se na escola de português.
Disse que sabe alguma coisa do casal porque foi a queixosa que contou e viu duas amassaduras no pescoço da queixosa.
Disse que tinham aulas três vezes por semana e que não estavam na mesma turma e falavam no intervalo das aulas.
Disse que uma vez na casa da depoente, quando a queixosa estava grávida e falaram e a queixosa disse-lhe que estava triste porque viu o marido na net a falar com outras mulheres.
*
Esta testemunha nada revelou saber.
*
- FF, cabeleireira e esteticista.

Disse que conhece o arguido e a queixosa, é amiga da queixosa e conhece a queixosa desde 2016, desde a abertura do salão de cabeleireiro.
Disse que nunca viu nada, só viu marcas no ombro da queixosa mas não sabe quando foi isso e disse que a queixosa disse que o arguido estava a tentar sufocá-la.
Disse que a queixosa dizia á depoente que o casal discutia mas não sabe porque discutiam nem sabe o motivo da discussão.
Disse que nunca viu o arguido insultar a queixosa.
Disse que numa vez em 2019 a queixosa ficou na casa da depoente porque o casal discutiu, segundo a queixosa.
Disse que quando a queixosa deixou de viver com o arguido, a queixosa ficou em baixo e stressada.
Disse que o filho mais novo ficou afectado e não fala.
*
*
Testemunhas de defesa

- NN, casada, 49 anos, enfermeira, residente em Rua ..., ... ....
Disse que é vizinha do arguido e que a filha do arguido, a OO era amiga da filha da depoente e frequentavam a casa uma da outra.
Disse que a casa da depoente é em frente a casa do arguido. Disse que as jovens, a filha da depoente e a filha do arguido comunicavam-se de janela para janela.
Disse que nunca se apercebeu que o arguido tratasse mal a queixosa.
Disse que viu dois episódios e apercebeu-se de algo através da OO, filha do arguido, foi no 12º ano das jovens, em 2019 ou 2020, na altura dos exames finais, num dia bateram a porta, num Domingo, era a OO que estava a tremer e a chorar, descalça, e a OO contou que fugiu de casa, da mesa, referindo que a dada altura o arguido perguntou porque a criança não o chamou pai, discutiram e a queixosa pegou numa cadeira e deu com ela ao arguido e a filha do arguido, a OO, fugiu. Disse que isto foi há quatro anos, no fim de Junho de 2020.
Disse que a outra situação, foi há um ano, quando a depoente estava a chegar a casa, tocam a porta com insistência, a depoente abre a janela da garagem e vê o CC a bater a porta de outro vizinho e o CC na rua a gritar que o pai estava a matar a avó e o pai estava na rua. Disse que o CC pontapeou o pai na rua e que isto ocorreu por volta das 13.00 horas. Disse que o CC dizia na rua “o meu pai está a matar a minha avó” e o pai estava ali perto dele.
Disse que chegou a ver a queixosa sair de casa tarde, por volta das 23.00 horas com a criança.
Disse que ela, depoente, sabia de outras situações através da filha quando ia para a casa do arguido.
Disse que a janela da cozinha da casa da depoente dava para a ciclovia.
Disse que em casa a depoente comentava que a OO ia passar o fim de semana a casa do pai de quinze em quinze dias e não tinham lá comida para a filha, tinham um ovo no frigorifico.
Disse que nunca se apercebeu nem viu nada de agressivo da parte do arguido para a queixosa e ao contrário acha que a queixosa tinha uma posição mais de poder.
Disse que a queixosa falava pouco com a depoente.
Disse que a sua filha, da depoente, sabia das coisas pela filha do arguido mas não contava a mãe.
Disse que a dada altura deixou de ver na casa o pai e a filha. Disse que um dos agentes que foi a casa do arguido anda de bicicleta com o marido da depoente e questionou como era a vivência do casal.
Disse que em 12 de Julho de 2023 a depoente e a sua família saíram para ... e não foi nessa data.
Disse supor que foi no ano de 2021 o episódio do CC de vir para a rua gritar que o pai estava a matar a avó.
Disse que a sua filha, da depoente, dizia-lhe que a OO dizia que a queixosa era agressiva.
Disse saber que a queixosa está na casa do arguido com os filhos e com a mãe.
*
Esta testemunha depôs de forma espontânea e isenta.
*
- PP, professora no ..., casada, residente em Alameda ...., ... ....
Disse que conhece o arguido desde 1992, porque foi seu namorado durante dez anos e é pai da filha de ambos de nome OO.
Disse a relação de ambos, da depoente e do arguido era mais uma relação de namoro e são colegas no ....
Disse que em Setembro de 2004 a depoente saiu de ... nesta altura por causa do doutoramento.
Disse supor que a relação do arguido com a queixosa foi na altura da primeira comunhão da filha, em 2011.
Disse que o arguido nunca foi agressivo com ela, depoente, nem a insultou.
Disse que o arguido é muito focado no trabalho e honesto, bem comportado, não consumia álcool.
Disse que o arguido vivia sobretudo para o trabalho. Disse que ela, depoente, casou em 2007.
Disse que o arguido foi sempre preocupado com a filha.
Disse que ela, depoente, quando soube da relação do arguido com a queixosa ficou contente por ele.
Disse que o arguido é introvertido.
Disse que a filha de ambos, OO, não era de comentar o que se passava na casa do pai mas por vezes vinha triste de lá mas não dizia nada.
Disse que a queixosa não deixava o CC chamar pai ao arguido o que chocava a filha OO e esta contava á mãe, depoente.
Disse que apesar deste desconforto a filha OO continuava a querer ir para o pai.
Disse que a filha OO dizia que por vezes o pai era enxovalhado pela queixosa.
Disse que o quarto dela na casa do pai foi ocupado.
Disse que a filha OO não tinha a melhor opinião da queixosa nos últimos tempos.
Disse que a filha OO levou tudo o que tinha de jogos e brinquedos para o CC e este a dada altura com o telemóvel não ligava nada ao que a irmã lhe tinha dado, o que a entristecia.
Disse não saber a idade do CC.
Disse que a filha OO dizia que não respeitavam o pai.
Disse que a filha OO foi para ... em Setembro de 2020, para a faculdade e não vinha todos os fins de semana.
Disse que a filha OO acabou o curso em Julho de 2023.
Disse que a filha OO deixou de ir a casa do pai quando o pai deixou de viver lá, supõe ter sido em 2022.
Disse que quando a queixosa ficava alterada, era agressiva. Disse que o ambiente estava mal.
Falou do episódio da cadeira mas não foi o arguido que atirou com a cadeira á queixosa, foi esta que pegou na cadeira. Disse que foi o único episódio de agressão que a filha OO relatou.
Disse que a filha OO nasceu em 2002.
Disse que a filha OO chegou a ir a casa do pai quando a mãe da queixosa já cá estava.
Disse que a sua relação, da depoente, com o arguido decorreu entre os anos de 1992 a 2001.
Disse que costumam falar um com o outro mensalmente sobre a filha comum dos dois, a OO.
Disse que a filha OO vai a casa do arguido desde que foi estudar para ..., desde 2020 e cerca de cinco vezes por ano e nessa altura estava com o pai.
Disse que antes de 2020 a filha OO ia a casa do pai mensalmente, todos os meses.
Disse que soube da relação do arguido com a queixosa quando a filha de ambos fez a primeira comunhão, por volta de 2012.
Disse que tudo o que sabe da relação do arguido com a queixosa sabe pela filha.
Disse que depois da comunhão da OO, ela, depoente, entrou na casa do arguido e apercebeu-se e o arguido disse-lhe que a queixosa trabalhava na área alimentar e o arguido disse que era importante a queixosa trabalhar, fazer alguma coisa, tipo a pedir á depoente que arranjasse alguma coisa de trabalho para a queixosa.
Na altura, ela, depoente, chegou a pedir o currículo à queixosa, estava tudo bem encaminhado, a oportunidade de trabalho que surgiu mais depressa foi a da ..., e quando confrontou a queixosa com a oferta de trabalho, ela hesitou e disse que esse trabalho era duro e preferia esperar por outro. Disse que isto foi em 2016.
Disse que ela, depoente, ficou com a ideia que se a queixosa não arranjou trabalho foi porque a queixosa não quis.
Disse que não era por causa do arguido que a queixosa não trabalhava.
Sobre a agressão e os insultos do arguido á queixosa, disse não saber nada nem a filha disse nada sobre isso.
Disse que a filha OO chegou a dizer que o ambiente estava pesado.
Disse que nos últimos tempos a filha OO já não ficava na casa do pai.
Disse que o arguido não é pessoa para agredir alguém, para insultar não sabe.
Disse que a filha OO chegou a dizer que ficou sozinha em casa e não tinha comida e foi comer a casa da amiga.
Disse supor que o arguido não era capaz de agredir a queixosa nem ninguém.
Disse que houve uma ocasião que supõe ter sido de 2020 para cá e não antes, em que a queixosa atirou com uma cadeira porque estava enervada, segundo a filha de ambos, a OO.
Disse que ela, depoente, só soube em Dezembro de 2022 que o arguido está com pulseira electrónica.
Referiu-se a umas fotografias de 27 de Setembro de 2022 para melhor situar os factos em termos temporais.
Disse que a filha OO chegou a dormir em casa do pai com a tia paterna por causa do pai, para o proteger da queixosa e da mãe da queixosa.
Disse que a filha OO ia ser madrinha do irmão mais novo, do HH, compraram a vela, roupa, a toalhinha e não foi usada porque não houve baptizado. Disse que ficou tudo sem efeito por decisão da queixosa segundo a filha OO e isso chateou a OO.
Sobre o trabalho disse que a queixosa disse á depoente que não queria trabalhar porque o trabalho era pesado.
Referiu-se a um e-mail de 23 de Setembro de 2016 enviado pela depoente á queixosa sobre trabalho e a outro e-mail de 10 de Outubro de 2016 – conforme documento de fls. 536 exibido pela depoente no decurso da prestação do seu depoimento e cuja junção aos autos foi ordenada pelo Tribunal.
Disse que a queixosa não trabalhou porque não quis, não teve nada a ver com o arguido que até pediu á depoente para ajudar a queixosa arranjar trabalho.
*
Revelou saber sobre o ataque cardíaco do arguido.
*
- QQ, professor, 60 anos, casado, residente em Rua ..., ..., ... ....
Disse que é irmão do arguido e frequentava a casa do arguido não com regularidade.
Disse que no início o casal dava-se bem e a dada altura a queixosa começou a mudar e o arguido contava-lhe que a queixosa ficou mais agressiva. Disse não saber precisar quando isto aconteceu, mas supõe que foi antes da mãe dela vir para cá e piorou com a vinda da mãe, que a queixosa ficou mais agressiva e nessas alturas o arguido telefonava ao depoente e ele ia lá.
Disse que numa altura andaram a lenha e o arguido telefonou ao depoente porque a queixosa e a mãe dela estavam agressivas e o depoente foi lá a casa e a mãe da queixosa ia sair com o filho, supõe que era no final do dia e o arguido disse que era tarde para sair e depois ficou a saber que iam chamar a policia.
Disse que quando chegou a casa viu a queixosa a gritar com o arguido e a dar empurrões ao arguido e a dar-lhe uma chapada e quando chegou a polícia um deles esteve a falar com eles, arguido e depoente e disse-lhes que elas estariam a preparar algo contra ele, arguido.
Disse supor que a queixosa estava a provocar o arguido para ele reagir porque entretanto chamaram a policia.
Disse que nunca se apercebeu que o irmão fosse agressivo e acha que o irmão tinha receio delas.
Disse que quando esteve cá o irmão mais velho deles, do depoente e do arguido, disse que ia preocupado porque apercebeu-se que a queixosa e a mãe não tratavam bem o arguido, o humilhavam.
Disse que mesmo o policia que é pai de um ex aluno do depoente, disse ao depoente para avisar o arguido que elas andavam para lhe fazer a cama. E isto foi em 2022 pelo final de Junho, depois de ter ido a casa.
Disse que a policia foi a casa do arguido em Junho ou Julho de 2022 e chamada pelo arguido. Disse que a policia disse isso com base no que viu quando foi a casa chamado pelo CC.
Disse que a queixosa no inicio era afável.
Disse que a queixosa mudou quando nasceu o filho mais novo. Disse que dizem que ela andava com outro e o depoente chegou a  ver a queixosa com outro homem e acha que o irmão não é pai do filho mais velho.
Disse que quando a policia foi a casa do arguido, ele, depoente, estava lá e chegou antes da policia chegar.
Disse que o arguido queixava-se que a queixosa o agredia.
Disse que nunca se apercebeu que o arguido tivesse tido uma atitude desagradável com a queixosa.
Disse que chegou a ver a queixosa empurrar o arguido. Disse que o arguido adorava o CC.
Disse que a queixosa humilhava o arguido e que sabe disso através do irmão.
Disse que numa altura a queixosa atirou-lhe com um copo e noutra atirou-lhe com uma cadeira e o arguido até tinha medo de estar em casa.
Disse que nunca viu o arguido insultar a queixosa.
Disse que o irmão que mora em ... esteve cá e também disse que a queixosa estava muito agressiva.
Disse que o CC chamou a policia porque foi a queixosa e a mãe que lhe disse para chamar a policia.
Disse que ele, depoente, chegou a comentar com o irmão que a queixosa saiu com outro homem.
Disse que o CC estava manipulado pela mãe.
Disse que o CC nunca chamou o arguido de pai, só o chamou de AA.
*
- RR, professor do ensino superior, 66 anos, divorciado, residente em Avenida ..., ... ....
Disse que é colega do arguido no ... e conhece o arguido e a queixosa.
Disse que tem ligações á comunidade estrangeira, sobretudo de origem ... dada a sua formação e ajuda a integração dos estrangeiros.
Disse que chegou a ver o arguido apaixonado pela queixosa. Disse que o arguido é um cientista puro e muito concentrado no seu trabalho.
Disse que foi ele, depoente, que traduziu os diplomas da queixosa e fez o processo de reconhecimento dos diplomas da queixosa, tudo a pedido do arguido.
Disse que a dada altura ficou a saber pela comunidade de comportamentos menos próprios e desviantes (tinha vários amantes, situações de infidelidade) por parte da queixosa e o depoente tentou falar com o arguido mas este não queria saber por estar apaixonado.
Disse que isto coincidiu com a vinda da mãe da queixosa – em 2022 – as infidelidades. Disse que isto sucedeu dois a três anos depois de nascer o primeiro filho e a situação agudizou-se antes de nascer o segundo filho.
Disse que soube pelo arguido que o arguido deu vinte mil euros (€ 20.000,00) à queixosa para ela ir procurar emprego para ... ou ... e supõe que isto foi antes de nascer o segundo filho e o depoente sabia que ela tinha ido ter com outro individuo.
Disse que a queixosa não foi acompanhada para ... mas sabe que foi ter com alguém lá.
Entretanto depois da queixosa regressar de ... o arguido teve um ataque cardíaco.
Disse supor que o arguido perdoou a infidelidade da queixosa porque o arguido sabe que ela foi ter com alguém e ela voltou para a casa do arguido, é porque lhe perdoou.
Disse que numa altura, ele, depoente, foi mais directo com o arguido e disse-lhe depois do ataque cardíaco dele.
Disse que na altura foi visitar o arguido ao hospital.
Disse que soube por outras pessoas da comunidade que o arguido fez-lhe tudo e ela, queixosa, tem um certo distanciamento e a viram com outro individuo e que a queixosa se gabava do que fazia em termos íntimos com outros homens.
Disse que o arguido contou ao depoente que a queixosa tentou agredi-lo e chamou a policia e ele arguido não sabia o que se passava. E num certo dia ele, depoente, contou ao arguido o que se passava.
Disse que ele, depoente, foi interprete das declarações da mãe da queixosa e nessa altura, aí, o depoente resolveu falar com o arguido.
Disse que na altura em que estava a ser interprete, o filho mais velho, o CC, estava a presenciar as declarações da avó e o depoente estranhou.
Disse que o CC falava mal do pai e a dizer a avó o que havia de dizer e o depoente concluiu que estava um complô montado.
Disse que o CC estava com o credo ensinado.
Disse que o CC fazia de pombo correio entre a avó e a mãe. Disse supor que não houve agressão nenhuma por parte do
arguido.
Disse que o filho mais novo andava a ser acompanhado no .... Disse que a queixosa escondia o filho mais novo da família paterna.
Disse que o arguido queixou-se ao depoente que a queixosa atirou-se para cima dele para o agredir e arranharam-se.
Disse que o arguido queixou-se várias vezes a ele, depoente, que a queixosa o agredia e andava mal disposta.
Disse que no ... ninguém acredita que o arguido pudesse agredir alguém.
Disse que o filho mais novo não será do arguido mas de outro homem com quem a queixosa manteve até agora um relacionamento.
Disse que nunca presenciou qualquer discussão entre o casal. Disse que traduziu os diplomas da queixosa para reconhecimento das habilitações da queixosa e que fez isso, supõe que a pedido do arguido mas não se lembra.
Disse saber que o arguido queria que a queixosa trabalhasse até porque investiu no cabeleireiro para a queixosa.
Disse que até a ex-mulher do arguido mexeu os cordelinhos e arranjou emprego para a queixosa que ela rejeitou, recusou.
Disse que o arguido tinha empregada doméstica.
Disse que ele, depoente, tentou encontrar trabalho para a queixosa e esta nunca quis trabalhar.
Disse que conhece o arguido há 32 ou 34 anos e conheceu a mãe da OO.
Disse que nunca ouviu qualquer queixa do arguido. Disse que o arguido é rato de laboratório.
Disse que o arguido vive para o trabalho.
Disse que o arguido não é capaz de matar uma mosca e não acha que tenha agredido de qualquer forma a queixosa.
Disse que foi o arguido que pediu á Professora PP para arranjar trabalho para a queixosa.
Disse que a queixosa foi ... e regressou antes do nascimento do segundo filho.
Disse supor que o arguido já sabia que a queixosa lhe era infiel e o arguido perdoou a queixosa.
Disse que o arguido falou de um crescendo de violência em 2022, depois do nascimento do segundo filho.
Disse que para fora a queixosa dava a ideia de que era o arguido que a agredia. Disse que a queixosa automutilava-se para o efeito.
Disse que o arguido já tinha contado alguns episódios ao depoente, desvalorizando.
Disse que ele, depoente, só soube dos factos aquando da tradução na altura das declarações da mãe da queixosa.
Sobre a quantia de € 20.000,00.
Disse que o arguido tentou arranjar trabalho para a queixosa.
Disse que aquando do interrogatório, ele, depoente, não a viu a queixosa arranhada.
Disse que antes do interrogatório, o arguido já se tinha queixado que a queixosa o agrediu, deu-lhe empurrões contra a cama, atirou-o contra a cama e outra vez ia bater-lhe com objectos.
Disse que ele, depoente, encontrou o arguido perdido e acha que o arguido não tinha consciência do que se estava a passar, achava aquilo gestos de carinho abrutalhado, atirou-lhe com uma cadeira, levou com uma cadeira na cabeça.
Disse que o arguido disse-lhe, ao depoente, que a queixosa apareceu arranhada e disse que foi ele, arguido.
O depoente acha que o arguido não é o agressor pois o agressor é a queixosa.
Disse que o arguido foi agredido duas vezes, numa os empurrões e outra vez com a cadeira.
Disse que o interrogatório foi mais tarde.
Disse não saber por que razão o salão de cabeleireiro fechou. Disse que o arguido nunca disse que havia mau relacionamento no
casal, entre ele, arguido, e a queixosa, e disse que o arguido achava que a queixosa era agressiva e o arguido não sabia porquê.
Disse que conheceu o CC e esteve com ele poucas vezes. Disse que o CC está alienado.
Disse que o CC disse que o pai é um filho da puta.
*
- CC, 22 anos, solteira, residente em Alameda ..., ... ....
Disse que é filha do arguido.
Disse que saiu para estudar quando tinha 18 anos, foi para .... Disse que nessa altura vinha a ... alguns fins de semana, uma vez por mês.
Disse que a dada altura ia menos vezes a casa do pai devido as situações lá de casa, por causa da queixosa.
Disse que sentia que o CC não estava muito bem integrado na família paterna, não tinha ligação com o pai e a depoente ficava frustrada com isso e ficava triste por o CC nem chamar pai ao pai e a queixosa não deixava o CC chamar pai ao arguido.
Disse que a dada altura deixou de falar com a queixosa e não se sentia bem lá em casa do pai, arguido.
Disse que o CC não estava bem integrado na família por não tratar o pai como pai mas por AA.
Disse que a queixosa não deixava o CC chamar pai ao arguido. Disse que nunca presenciou o pai agredir ou tratar mal a queixosa nem é pessoa disso, achou essa acusação muito estranha.
Disse que com a vinda da mãe da queixosa a dinâmica familiar também mudou.
Disse que o pai nunca puxou as orelhas à depoente, filha.
Disse que nunca notou qualquer comportamento agressivo por parte do arguido relativamente á queixosa.
E disse que presenciou agressividade da queixosa para com o arguido, presenciou violência verbal e física, quando o pai fez anos, no dia 6 de Novembro, não o ano mas supõe ter sido antes de 2020, estavam na sala, a queixosa convidou uma amiga dela e começaram-se a chatear e a queixosa atira um copo de vidro á cabeça do pai e a amiga ficou sem saber o que fazer e dizer, o copo não partiu e noutra vez viu a queixosa atirar com uma cadeira ao pai, ao arguido e isto foi em 2020 antes do Verão começar.
Disse que começaram a chatear-se por causa do CC não chamar pai ao arguido.
Disse que a queixosa reagia de forma agressiva verbalmente ou por atitudes.
Disse que ela, depoente, não gostava de deixar o pai sozinho em casa.
Disse que o casal discutia um com o outro, mas era mais ela e nas discussões o pai ficava mais calado e a queixosa acusava-o de a ter insultado.
Disse que a queixosa chamava-o de velho.
Disse que no dia em que a queixosa atirou o copo ao pai, arguido, a queixosa dizia que o ia por num lar por ser velho.
Disse que a queixosa chamava o arguido de velho, estúpido.
Disse que as razões de discussão eram várias, um dos temas era o CC, outro tema era o facto de ela ter ido para ... com outro homem e ter gasto o dinheiro e o arguido tê-la aceite, os tios paternos porque a queixosa não gostava dos tios.
Disse que o arguido na maior parte das vezes não dizia nada e quando o arguido falava não insultava a queixosa.
Disse que a queixosa dizia que o arguido chamava-a de puta e a depoente nunca ouviu nada disso. A depoente acha que aquilo era para o CC ouvir isso.
Disse que era a queixosa que dizia ao CC para não tratar o pai por pai.
Disse que muitas vezes a queixosa falava com o CC em ... e russo para o arguido não perceber.
A discussão do dinheiro prende-se com o facto da queixosa ter ido para ... e levou € 20.000,00.
Disse que nunca se apercebeu do arguido agredir a queixosa e viu a queixosa agredir o arguido.
Disse que a queixosa atirava os comandos da televisão ao arguido.
Disse não saber por que razão a queixosa não trabalhava mas disse supor que a sua mãe, da depoente, tentou arranjar trabalho á queixosa.
Disse que o pai não proibiu a queixosa de trabalhar.
Disse achar impossível o seu pai, arguido, agredir a queixosa. Disse que a queixosa foi sempre gananciosa e que este processo
foi uma forma de proteger o ganho dela.
Disse que o filho mais novo, o HH, supõe que não é filho do pai porque a queixosa desde que a criança nasceu ela mudou muito nem mostrava a criança á família.
Disse que a vinda da mãe da queixosa mudou tudo e quase nunca estavam em casa.
Disse que quando foram embora levaram as roupas da depoente que estava na casa do pai.
Disse que ele, depoente, ia ser madrinha do baptizado, já tinha tudo comprado e de repente a queixosa disse que não havia baptizado porque a queixosa não queria que a família paterna fosse convidada.
Disse que as cenas do copo e da cadeira ocorreram antes de nascer o HH.
Disse que a queixosa manteve a agressividade.
Disse que a queixosa não deixava ninguém ver o filho HH. Disse que no dia em que a queixosa contou que estava grávida parece que não ficou muito satisfeita.
Disse que a queixosa é agressiva para com o arguido.
Disse que o seu pai, da depoente, é muito comodista e não dizia nada apesar das coisas não estarem bem.
Disse que ela, depoente, tinha um bom relacionamento com o CC.
Disse que a queixosa dizia á depoente que o pai já lhe tinha batido e a depoente contrariava-a o que não era do agrado dela, da queixosa.
Disse que havia momentos em que acha que a queixosa não tinha a melhor atitude com a depoente.
Disse que a queixosa disse-lhe, á depoente, uma ou duas vezes, antes da depoente ter ido para a faculdade, que o pai a tinha agredido.
Disse que a queixosa estava a tentar convencê-la, a depoente, de que ela, a queixosa, era uma vitima, quando dizia á depoente que o pai lhe tinha batido.
Disse que desde 2020 que o casal já não estava bem.
Disse que o pai as vezes ligava-lhe, á depoente, e dizia que estava trancado no quarto porque tinha medo dela.
Disse que o CC não dizia nada porque era reservado. Disse que o CC tratava a mãe por mama e a avó por DD. Disse que não fala com o CC desde há três anos.
*
*
Da conjugação da prova produzida apenas resulta como certo o casamento da queixosa e do arguido, o nascimento dos filhos, a vinda da mãe da queixosa da ... e que todos residiam na casa do arguido, quanto à ocorrência dos factos denunciados e imputados ao arguido, da conjugação da prova produzida resulta para o Tribunal fundadas dúvidas quanto á ocorrência dos factos, quanto á verificação do ilícito e seu cometimento pelo arguido. Da prova produzida suscitaram fundadas dúvidas ao Tribunal quanto á ocorrência dos factos, designadamente que o arguido agrediu e insultou a queixosa da forma descrita na acusação, que o arguido tenha actuado da forma descrita na acusação. Note-se que relativamente aos mesmos temos apenas a versão da queixosa que dada a forma ligeira, evasiva e imprecisa como depôs não se afigurou suficientemente consistente de forma a permitir o Tribunal concluir pela verificação dos factos.
Note-se que o depoimento da queixosa afigurou-se inconsistente e incoerente, dada a ligeireza, pouca isenção, as imprecisões e as contradições reveladas, não tendo sido confirmado por qualquer outro meio de prova designadamente pelos depoimentos das testemunha de acusação que pouco ou nada revelaram saber, para além do relatado pela queixosa. Note-se que a corroborar a versão da queixosa temos a sua mãe, a testemunha DD, que revelou saber o que a queixosa lhe contava, nada presenciando e o depoimento do filho CC que para além de revelar parcialidade e falta de isenção, revelou ainda contradição com o depoimento da queixosa, sua mãe, referindo factos diversos dos referidos pela queixosa o que também sucedeu com a testemunha DD. As demais testemunhas de acusação para além do que a queixosa lhes contava, o que revelaram saber acerca do casal, infirma a versão da queixosa, pois por nenhuma foi dito terem presenciado qualquer agressão física ou verbal do arguido á queixosa, disseram ainda coisas diversa das referidas pela queixosa, tendo uma delas dito que a queixosa dizia que o arguido a queria matar, quando tal não foi dito pela mesma queixosa. Acresce que os depoimentos das testemunhas de defesa, pessoas próximas do casal que se relacionavam com o casal, irmão, filha, ex-mulher, colegas e vizinha do arguido, revelaram-se isentos, imparciais, coerentes, espontâneos, unânimes e convergentes, merecendo por isso credibilidade, infirmaram a versão da queixosa. Note-se que a testemunha OO, filha do arguido que frequentava a casa do pai, onde residia o casal, referiu factos que se afiguraram credíveis ao Tribunal que contraria a versão da queixosa, no sentido que no caso o agressor era a queixosa e o agredido, o arguido. Acresce que a versão da queixosa que o arguido a tinha e a queria dependente, sem trabalho, sem dinheiro, também não logrou provada, pois a própria queixosa disse que a dada altura resolveu ir para ... trabalhar e foi quando e como bem quis, levando ainda dinheiro para gastar. As testemunhas de defesa revelaram ainda que o arguido diligenciou no sentido da queixosa obter e conseguir trabalho, o que se logrou numa ocasião a foi rejeitado e ou recusado pela queixosa. A própria queixosa referiu que o arguido abriu um cabeleireiro para a mesma, o que infirma a sua própria versão.
Refira-se ainda que a queixosa refere factos e agressões de forma ligeira e evasiva, disse que numa altura em que estavam a preparar uma festa e por causa das compras, o arguido apertou-lhe o pescoço na casa de banho. Noutra ocasião quando estavam a pendurar uma televisão o arguido deu-lhe uma chapada.
Em suma, da conjugação da prova produzida resulta para o Tribunal fundadas dúvidas quanto á verificação do ilícito e seu cometimento pelo arguido.
Fazendo uso das regras de experiência comum e à luz de critérios de razoabilidade e bom senso, os depoimentos das testemunhas de defesa pela forma espontânea, isenta, imparcial, coerente, minuciosa, uniforme e esclarecedora como foram prestados, contrariaram e infirmaram a versão da queixosa, afigurando-se a versão dos depoimentos das testemunhas de defesa mais consentânea com a realidade e com as regras da experiência comum. Resultando desses depoimentos, pela forma como foram prestados, não ser crível que o arguido tenha actuado da forma descrita na acusação, ou seja, que tenha agredido e injuriado a queixosa.
A prova produzida não consente nem autoriza o Tribunal a extrair com certeza ter o arguido agredido e insultado a queixosa, ter o arguido praticado o ilícito que lhe é imputado.
Assim, no presente caso, confrontando-se o Tribunal com a dúvida insanável da prática pelo arguido do ilícito que lhe é imputado, impõe-se em obediência ao princípio in dúbio pro reo, proferir um juízo decisório favorável ao arguido, concluir pela tese favorável ao arguido.
“O principio in dúbio pro reo está reservado àqueles casos em que, produzida a prova, subsistam dúvidas razoáveis e intransponível a respeito dos factos objecto do processo, devendo então essas dúvidas ser resolvidas a favor do arguido.”, vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 3-4-2013, in www.dgsi.pt.
“A presunção de inocência é identificada com o principio “in dúbio pro reo”, “no sentido de que um non liquet na questão da prova tem de ser sempre valorado a favor do arguido.”, vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16-1-2013, in www.dgsi.pt.
O principio in dubio pro reo é uma imposição dirigida ao juiz no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não houver a certeza sobre factos decisivos para a solução da causa.
Em suma, da prova produzida, o Tribunal concluiu pela exclusão da responsabilidade do arguido e pela sua absolvição e improcedência da acusação.
Relativamente à situação pessoal e aos antecedentes criminais do arguido, o Tribunal teve em consideração o certificado do Registo Criminal e o relatório social.

3 O direito.

Antes de dirigir a nossa atenção ao objeto do processo, cumpre apreciar a posição enunciada pelo Ministério Público no parecer formulado nos autos, em relação à nulidade da decisão recorrida, matéria que é, aliás, de conhecimento oficioso.
O Ministério Público entende no aludido parecer que a decisão recorrida não respeita a imposição legal de fundamentação, designadamente na parte que se refere à exposição dos motivos de facto que serviram para a formação da convicção do julgador.
Está aqui em causa apenas a falta de exame crítico da prova.
*
Vejamos, em primeiro lugar, o que diz o Código de Processo Penal, na parte que aqui interessa:

Artigo 97.º
Actos decisórios
1 - Os actos decisórios dos juízes tomam a forma de:
a) Sentenças, quando conhecerem a final do objecto do processo;
b) Despachos, quando conhecerem de qualquer questão interlocutória ou quando puserem termo ao processo fora do caso previsto na alínea anterior.
2 - Os actos decisórios previstos no número anterior tomam a forma de acórdãos quando forem proferidos por um tribunal colegial.
(…)
5 - Os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão.
*
Artigo 374.º
Requisitos da sentença
(…)
2 - Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
(…)
*
Artigo 379.º
Nulidade da sentença
1 - É nula a sentença:
a) Que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374.º ou, em processo sumário ou abreviado, não contiver a decisão condenatória ou absolutória ou as menções referidas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 389.º-A e 391.º-F;
(…)
c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Antes de tudo isto, dispõe o artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República, que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
“Princípio de matriz constitucional essencial em matéria de decisões judiciais é o princípio da fundamentação, consagrado no art.º 205.º, n.º 1, da Constituição da República, o qual se traduz na obrigatoriedade de o tribunal especificar os motivos de facto e de direito da decisão – n.º 4 do artigo 97.º deste Código. Tal princípio, relativamente à sentença penal concretiza-se, porém, mediante uma fundamentação reforçada, que visa, por um lado, a total transparência da decisão, para que os seus destinatários (aqui se incluindo a própria comunidade) possam apreender e compreender claramente os juízos de valoração e de apreciação da prova, bem como a atividade interpretativa da lei e da sua aplicação e, por outro lado, possibilitar ao tribunal superior a fiscalização e o controlo da atividade decisória, fiscalização e controlo que se concretizam através do recurso, o que consubstancia, desde a revisão de 1997, um direito do arguido constitucionalmente consagrado, expressamente incluído nas garantias de defesa - art.º 32.º, n.º 1, da Constituição da República.” – Conselheiro Oliveira Mendes, Código de Processo Penal Comentado, Almedina, 2014, pag. 1168.
Significa isto, e de acordo com as normas acima citadas, que, sob pena de nulidade, a sentença, a este respeito, para além da indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, tem de conter também o respetivo exame crítico das provas, isto é, o processo lógico e racional que foi seguido na sua apreciação, e apreciar as questões que lhe são colocadas pelos sujeitos processuais.
A exigência dessa fundamentação tem como função, conforme escreve Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal. 2ª ed. III, p. 294), permitir «a sindicância da legalidade do ato, por uma parte, e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, atuando, por isso como meio de autodisciplina».
A propósito dos motivos de facto que fundamentam a decisão, diz Marques Ferreira (Jornadas de Direito Processual Penal, Almedina, p. 229) que estes «não são nem os factos provados (thema decidendum) nem os meios de prova (thema probandum) mas os elementos que, em razão das regras de experiência ou de critérios lógicos, constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência».
O rigor e a suficiência do exame crítico têm de ser aferidos por critérios de razoabilidade, sendo fundamental, mas bastante, que permita exteriorizar as razões da decisão e o processo lógico, racional e intelectual que lhe serviu de suporte (cf., entre outros, Acórdão do STJ de 03.10.2007, processo n.º 07P1779).
“Sobre a ausência de fundamentação a norma estabelece que a nulidade ocorre, inequivocamente, quando a sentença não contenha (i) a enumeração dos factos provados e não provados, (ii) a exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas. A omissão integral de qualquer destes elementos estruturais da sentença torna a mesma nula. Ainda que algum deles (factos provados, factos não provados e motivação) esteja na sentença, individualizadamente, a omissão de qualquer um, fulmina a sentença de nulidade.” Note-se bem: a omissão integral, e não a parcial - cfr. Mouraz Lopes, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Almedina, 2.º Edição, Tomo IV, pag. 809
Portanto, e a título de exemplo, para a sentença ser considerada nula por omissão em relação à matéria de facto, necessário é que esteja obliterada nessa parte, não bastando para tal que tenha havido falta de decisão de alguns dos factos alegados na acusação ou na pronúncia. Repare-se que, lida a lei, diz esta que é nula a sentença que não contiver (para o que aqui interessa) a enumeração dos factos provados e não provados; ou seja a lei não fere de nulidade a sentença que não contiver a enumeração de todos os factos provados e não provados que interessam à boa decisão da causa – isso será já uma questão de insuficiência, como se verá na analise da questão seguinte.
Por outro lado, e sem embargo do que antes se afirmou, quando está em causa, o exame crítico da prova, não obstante poder até haver na decisão um texto submetido a esse tópico, se ele não for percetível, se os motivos do tribunal não forem apreensíveis, tudo se passa como se não existisse, apesar de formalmente lá se encontrar, e por isso se pode considerar nula tal sentença – neste sentido vejam-se Mouraz Lopes in A Fundamentação da Sentença no Sistema Penal Português, Legitimar, Diferenciar, Simplificar, Almedina 2011, pag. 338/339,  Paulo Saragoça da Matta, in A Livre Apreciação da Prova e o dever de Fundamentar a Sentença, Jornadas de Direito Processual penal e Direitos Fundamentais, Almedina, pag. 265, e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/11/2005, Processo n.º 2155/04, todos citados no parecer emitido nos autos.
Na verdade, e em conclusão, refira-se que a nulidade está cominada para a falta de fundamentação (“é nula a sentença que não contenha as menções referidas no n.º 2 (…) do art.º 374.º” - cfr. art.º 380.º, n.º 1, alínea a), ambos do CPP), e não para os casos de fundamentação menos brilhante ou menos conseguida por parte de quem escreve – o importante é que se possam perceber a decisão e os seus motivos. Saber, depois, se foi ou não bem decidido é outra questão. E não esqueçamos que é sempre muito mais difícil atingir a completude com a sempre desejável concisão do que com a balofa prolixidade, e que a concisa completude será sempre, naturalmente a seguir ao percuciente acerto, a maior qualidade de qualquer decisão judicial.
Na fundamentação da decisão que ora se aprecia, impressiona, desde logo, a tão desnecessária quão exuberante reprodução do teor dos meios de prova apresentados em juízo. Na verdade, os incontáveis parágrafos, invariavelmente iniciados pelo vocábulo disse, arrolados ao longo de 21 páginas (!) representam, simultaneamente, um inglório esforço e um manifesto desperdício de energia, que podiam e deviam ter sido aplicados num mais rigoroso, abrangente, esclarecedor e coerente discurso de explicação do pensamento do julgador – é certo que nessas massudas 21 páginas se entrecortam alguns telegráficos comentários ao conteúdo das provas assim quase literalmente replicado, mas isso não retira àquele extenso texto o seu caráter monótono e repetitivo, e, sobretudo, ineficaz, do ponto de vista da imposição legal.
Esta orientação é hoje absolutamente pacífica na Jurisprudência, podendo citar-se, apenas a título de exemplo, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10/07/2018, processo n.º 106/15.1PFLRS.L1-5, disponível em jurisprudência.pt, segundo o qual:

A fundamentação, na parte que respeita à indicação e exame crítico das provas, não tem de ser uma espécie de assentada em que o tribunal reproduza os depoimentos das testemunhas inquiridas, ainda que de forma sintética. O exame crítico deve ser aferido com critérios de razoabilidade, não indo ao ponto de exigir uma explanação fastidiosa, com escalpelização descritiva de todas as provas produzidas, o que transformaria o processo oral em escrito, pois o que importa é explicitar o porquê da decisão tomada relativamente aos factos, de modo a permitir aos destinatários da decisão e ao tribunal superior uma avaliação do processo lógico-mental que serviu de base ao respetivo conteúdo.

Assim, o esforço intelectual e o tempo despendidos na indevida assentada deve ser redirecionado para um verdadeiro exame crítico da prova, que se não quede por afirmações meramente proclamatórias ou vacuidades expositivas, traduzidas em lugares comuns ou chavões, mas avance decididamente na indicação das razões pelas quais se atendeu a determinada prova para formar a convicção em certo sentido.
Aceita-se que tal tenha sido feito com a mais reta intenção e com a firme propósito de aumentar a transparência da decisão. Todavia, tal modo de proceder contraria frontalmente a lei, designadamente o princípio da oralidade, em obediência ao qual o já citado artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, determina que a exposição em causa deve ser concisa – ora, nesta parte, a concisão foi completamente postergada, constatando-se, pelo contrário, e como já se disse, uma inusitada exuberância repetidora, que deve ser sempre firmemente evitada.
Já quanto à explicação das razões da decisão sobre os factos, isto é, quanto ao esclarecimento e transmissão do pensamento do julgador a este respeito, o texto da decisão recorrida é de uma excessiva e indevida concisão, apresentando uma incompreensível frugalidade, atenta a complexidade e extensão probatória e factual submetida a análise, bem como a consabida dificuldade deste tipo de julgamentos, cujo objeto geralmente ocorre em ambiente privado, longe dos olhares dos outros, em que a adjacência probatória corroborante(que não é indispensável, note-se bem)  não é habitual, em que muitas vezes a palavra contra palavra corresponde ao quadro geral disponível ao julgador, exigindo deste, além de toda a sua prudentiae, um particular esforço de apreciação a que pantograficamente corresponderá uma atitude de esmiuçadora explicação das causas da sua decisão.
Vejamos o que se pode ler na decisão a este respeito, expurgada, naturalmente, da fastidiosa assentada:

O arguido não prestou declarações, dizendo apenas que tem sofrido muito com isto há três anos e está afectado psicologicamente.
E disse ainda que é tudo mentira.
Nenhum comentário. Será isto credível? Será que nunca ocorreu uma discussão das que se referem nos autos, em clara dissonância com a máxima da experiência de que a vida que não é ralhada não é governada? E como compatibilizar isto com o facto de da ata de julgamento constar que arguido afirmou não pretender prestar declarações? É preciso explicar estas coisas.
*
Testemunhas da acusação

- CC, filho do arguido e da queixosa.

Nenhum comentário, referindo-se na apreciação geral final apenas que o depoimento do filho CC que para além de revelar parcialidade e falta de isenção, revelou ainda contradição com o depoimento da queixosa, sua mãe, referindo factos diversos dos referidos pela queixosa. Parcialidade e falta de isenção em que parte do depoimento? E Porquê? Repare-se, só a título de exemplo, que o filho, segundo o texto da decisão recorrida, até disse que não viu bater na mãe – ora, um filho parcial sem isenção, provavelmente diria que o pai bateu na mãe, dizemos nós. Não se questiona a convicção do julgador em relação á classificação de parcialidade e falta de isenção, que é absolutamente livre. Todavia, não se consegue perceber onde se denunciam essas imperfeições do depoimento, porque tal não é esclarecido, não passando, assim, aquele exprobrar de um tão simples quão árido rótulo. E qual a relevância da contradição, quando é consabido que os depoimentos e declarações não são geralmente simétricos e incontornavelmente consonantes – de novo o dizemos, aceitamos o veredicto, mas precisamos de uma explicação inteligível, ou temos de partir do impensável princípio quase maniqueísta que para o julgador em causa ou há mimetismo probatório ou se fulmina a prova com incredulidade.
*
- BB, queixosa.

Comentário:

O depoimento da queixosa pela forma vaga, ligeira, dispersa e evasiva como foi prestado e sem consistência, suscitou dúvidas ao Tribunal acerca da ocorrência dos factos. Note-se que as lesões apresentadas pela mesma e constante das fotografias de 1 de Agosto de 2022 não se coadunam com a descrição efectuada pela mesma da conduta do arguido. Acresce que a queixosa apresenta versões divergentes no que respeita à actuação do arguido, ora dizendo que o mesmo a empurrou para cima da cama e apertou-lhe o pescoço ora dizendo que o mesmo lhe deu murros e unhadas como resulta do relatório da perícia médico-legal.

Na apreciação geral final repetem-se estes qualificativos, designadamente inconsistente e incoerente, dada a ligeireza, pouca isenção, as imprecisões e as contradições reveladas, não tendo sido confirmado por qualquer outro meio de prova designadamente pelos depoimentos das testemunhas de acusação que pouco ou nada revelaram saber, para além do relatado pela queixosa. Ora, sempre aceitando o livre e soberano veredicto, é necessário, responsavelmente, explicar onde estão a vacuidade, ligeireza, dispersão e evasão, e não simplesmente apenas afirmar estas imperfeições, para que nós possamos perceber e assentir ou dissentir, até porque, como é consabido, se a dessincronização do raciocínio se nos afigurar ostensiva nesta sede, pode chamar-se à colação o erro notório na apreciação da prova.
*
- DD, divorciada, 61 anos, mãe da queixosa.

Comentário:

O depoimento da testemunha DD revelou que o que sabia foi pela própria filha, queixosa, que lhe contava e que não presenciou os factos, contrariando a versão da própria em algumas situações, suscitando dúvidas sobre a ocorrência dos factos.
Cumpre aqui explicar quais são as aludidas dissonâncias e a razão de um depoimento indireto poder infirmar um meio de prova cuja razão de ciência é o conhecimento direto dos factos em julgamento – a este respeito, até ensina a experiência que, muitas vezes, os mais velhos, procuram desvalorizar o sucedido na ânsia de poderem assim manter a união familiar; não quer dizer que tenha sido assim, mas cumpre explicar a potencialidade destrutiva deste depoimento indireto.
*
- EE, 40 anos, casada.

Comentário:

Esta testemunha nada revelou saber sobre os factos imputados ao arguido, de agressão e insulto á queixosa, por nunca ter presenciado nada, referindo apenas o que a queixosa lhe contava e que não foi dito pela própria, que o arguido a queria matar.

Ora esta desconcertante conclusão briga, desde logo com vários segmentos da assentada, tais como:
Disse que as vezes a noite a queixosa ia para casa da depoente e chorava e o CC também chorava e a queixosa queixava-se do arguido por este querer que ela ficasse em casa.
Disse não saber se foi em 2019 ou em 2020 viu a queixosa com marcas no pescoço.
Disse que a queixosa foi com o CC para casa da depoente e a queixosa disse que o arguido apertou-lhe o pescoço e a queixosa ficou lá dois dias. Disse saber disto porque a queixosa lhe contou.
Disse que a queixosa só dormiu duas vezes na casa da depoente e nessa altura o arguido telefonava á queixosa e dizia-lhe que precisava do carro para ir para o hospital.

Da assentada consta muita coisa que a testemunha não viu. Ora, as testemunhas não devem depor sobre o que não viram, porque isso não assegura que tal não tenha ocorrido – ou estavam no local e viram que não aconteceu, ou não interessa o que não viram. As testemunhas depõem sobre os factos de que tenham conhecimento direto, ou, no máximo, nos termos do artigo 129.º do Código de Processo Penal, sobre o que ouviram dizer a outem. Não depõem sobre o que não viram, pois, se assim fosse, seria sempre muito fácil arrolar resmas de testemunhas que não viram os factos em julgamento, sejam eles quais forem.
Mas esta testemunha viu marcas no pescoço da vítima, acolheu-a, juntamente com o filho ainda muito pequeno, em sua casa, onde até pernoitaram dois dias, num quadro emocional perturbado, e do seu relato, constante da assentada, até resulta a arrepiante frieza do arguido, que, neste perturbador contexto, telefonou à vítima, dizendo-lhe que precisava do carro para ir para o hospital. Ensina a experiência que quando uma mãe sai do seu lar conjugal, juntamente com o seu filho pequeno, pela mão ou ao colo, vai chorar para casa de uma vizinha e lá pernoita dois dias, algo de anormal se passará naquele agregado familiar. Até pode ser um devaneio imputável à própria, mas tudo isto carece de explicação e dilucidação, porque o que, pelo menos, aquela criança sofreu com tudo isto não é ligeiro, nem vago, nem dispersivo nem evasivo, e demanda mais percuciente atenção e análise do julgador. Curiosamente, não há notícia na decisão recorrida de qualquer destas (típicas) evasões do arguido do seu lar conjugal, não obstante as agressões de que, segundo a sua filha OO, terá sido vítima, nem de qualquer amigo/a em cujo ombro tenha derramado o seu sofrimento pelo tormento conjugal em que (segundo a convicção do julgador, como adiante se verá) vivia; há notícia de alguns relatos ao irmão QQ e ao colega RR (que, nos respetivos depoimentos, segundo a assentada, pura e simplesmente, arrasaram a vítima, sem qualquer particular observação do julgador a este respeito), mas tão só isso – há pessoas que são muito reservadas, e, se calhar, o arguido é uma dessas pessoas, mas convinha perceber se assim é, e, se possível, porquê.
*
- MM, costureira.

Comentário:

Esta testemunha nada revelou saber.

Repetimos o que antes dissemos, mutatis mutandis, uma vez que consta da assentada que a testemunha viu duas amassaduras no pescoço da queixosa.
*
- FF, cabeleireira e esteticista.

Nenhum comentário.

Repetimos o que antes dissemos, mutatis mutandis, uma vez que consta da assentada que:

Disse que nunca viu nada, só viu marcas no ombro da queixosa mas não sabe quando foi isso e disse que a queixosa disse que o arguido estava a tentar sufocá-la.
Disse que numa vez em 2019 a queixosa ficou na casa da depoente porque o casal discutiu, segundo a queixosa.
*
*
Testemunhas de defesa

- NN, casada, 49 anos, enfermeira, residente em Rua ..., ... ....

Comentário:

Esta testemunha depôs de forma espontânea e isenta.

Porquê? O tribunal não explica a razão desta conclusão sobre a isenção, sendo certo que quase todo o depoimento desta testemunha é por ouvir dizer, desta feita a uma filha do arguido, mas não da ora vítima. Repetimos que a convicção é livre e que se respeita, mas tem que ser explicada, e não foi.
*
- PP, professora no ..., casada, residente em Alameda ...., ... ....

Nenhum comentário.
*
- QQ, professor, 60 anos, casado, residente em Rua ..., ..., ... ....

Nenhum comentário.
*
- RR, professor do ensino superior, 66 anos, divorciado, residente em Avenida ..., ... ....

Nenhum comentário
*
- CC, 22 anos, solteira, residente em Alameda ..., ... ....
Nenhum comentário, mas na apreciação geral final diz-se:
Note-se que a testemunha OO, filha do arguido que frequentava a casa do pai, onde residia o casal, referiu factos que se afiguraram credíveis ao Tribunal que contraria a versão da queixosa, no sentido que no caso o agressor era a queixosa e o agredido, o arguido.

Ora, se isto é assim, como afirmar uma dúvida? Depois desta apreciação, impunha-se, dizemos nós, afirmar que o que a vítima disse não corresponde à verdade, e sem rodeios apodar as suas declarações de mentira. Esta perturbadora incoerência, sem explicação adjacente, demonstra intrínseca contradição no espírito do julgador, que urge ser dilucidada. Percutindo, não se compreende a invocação do princípio in dubio pro reo quando o tribunal diz que está convencido que o agressor era a queixosa e o agredido, o arguido. Tal invocação da mencionada regra de decisão da prova só seria azada se o tribunal admitisse como possível a veracidade dos factos constantes da acusação, mas não tivesse, na sua consciência, a certeza plena da sua ocorrência, se no seu espírito germinasse o mais pequeno grão de dúvida, pelo mais variados (mas identificados e explicados) motivos. Se o julgador está convencido de que a verdade radica no contrário do que é alegado na acusação, não ocorre dúvida no seu espírito sobre a veracidade destes últimos factos, pois instalou-se no seu espírito a certeza de que não ocorreram, dando-os por não provados por, em seu entender, serem inexistentes.
*
Após isto, formulou-se na decisão recorrida esta apreciação genérica:

Da conjugação da prova produzida apenas resulta como certo o casamento da queixosa e do arguido, o nascimento dos filhos, a vinda da mãe da queixosa da ... e que todos residiam na casa do arguido, quanto à ocorrência dos factos denunciados e imputados ao arguido, da conjugação da prova produzida resulta para o Tribunal fundadas dúvidas quanto á ocorrência dos factos, quanto á verificação do ilícito e seu cometimento pelo arguido. Da prova produzida suscitaram fundadas dúvidas ao Tribunal quanto á ocorrência dos factos, designadamente que o arguido agrediu e insultou a queixosa da forma descrita na acusação, que o arguido tenha actuado da forma descrita na acusação. Note-se que relativamente aos mesmos temos apenas a versão da queixosa que dada a forma ligeira, evasiva e imprecisa como depôs não se afigurou suficientemente consistente de forma a permitir o Tribunal concluir pela verificação dos factos.
Note-se que o depoimento da queixosa afigurou-se inconsistente e incoerente, dada a ligeireza, pouca isenção, as imprecisões e as contradições reveladas, não tendo sido confirmado por qualquer outro meio de prova designadamente pelos depoimentos das testemunha de acusação que pouco ou nada revelaram saber, para além do relatado pela queixosa. Note-se que a corroborar a versão da queixosa temos a sua mãe, a testemunha DD, que revelou saber o que a queixosa lhe contava, nada presenciando e o depoimento do filho CC que para além de revelar parcialidade e falta de isenção, revelou ainda contradição com o depoimento da queixosa, sua mãe, referindo factos diversos dos referidos pela queixosa o que também sucedeu com a testemunha DD. As demais testemunhas de acusação para além do que a queixosa lhes contava, o que revelaram saber acerca do casal, infirma a versão da queixosa, pois por nenhuma foi dito terem presenciado qualquer agressão física ou verbal do arguido á queixosa, disseram ainda coisas diversa das referidas pela queixosa, tendo uma delas dito que a queixosa dizia que o arguido a queria matar, quando tal não foi dito pela mesma queixosa. Acresce que os depoimentos das testemunhas de defesa, pessoas próximas do casal que se relacionavam com o casal, irmão, filha, ex-mulher, colegas e vizinha do arguido, revelaram-se isentos, imparciais, coerentes, espontâneos, unânimes e convergentes, merecendo por isso credibilidade, infirmaram a versão da queixosa. Note-se que a testemunha OO, filha do arguido que frequentava a casa do pai, onde residia o casal, referiu factos que se afiguraram credíveis ao Tribunal que contraria a versão da queixosa, no sentido que no caso o agressor era a queixosa e o agredido, o arguido. Acresce que a versão da queixosa que o arguido a tinha e a queria dependente, sem trabalho, sem dinheiro, também não logrou provada, pois a própria queixosa disse que a dada altura resolveu ir para ... trabalhar e foi quando e como bem quis, levando ainda dinheiro para gastar. As testemunhas de defesa revelaram ainda que o arguido diligenciou no sentido da queixosa obter e conseguir trabalho, o que se logrou numa ocasião a foi rejeitado e ou recusado pela queixosa. A própria queixosa referiu que o arguido abriu um cabeleireiro para a mesma, o que infirma a sua própria versão.
Refira-se ainda que a queixosa refere factos e agressões de forma ligeira e evasiva, disse que numa altura em que estavam a preparar uma festa e por causa das compras, o arguido apertou-lhe o pescoço na casa de banho. Noutra ocasião quando estavam a pendurar uma televisão o arguido deu-lhe uma chapada.
Em suma, da conjugação da prova produzida resulta para o Tribunal fundadas dúvidas quanto á verificação do ilícito e seu cometimento pelo arguido.
Fazendo uso das regras de experiência comum e à luz de critérios de razoabilidade e bom senso, os depoimentos das testemunhas de defesa pela forma espontânea, isenta, imparcial, coerente, minuciosa, uniforme e esclarecedora como foram prestados, contrariaram e infirmaram a versão da queixosa, afigurando-se a versão dos depoimentos das testemunhas de defesa mais consentânea com a realidade e com as regras da experiência comum. Resultando desses depoimentos, pela forma como foram prestados, não ser crível que o arguido tenha actuado da forma descrita na acusação, ou seja, que tenha agredido e injuriado a queixosa.
A prova produzida não consente nem autoriza o Tribunal a extrair com certeza ter o arguido agredido e insultado a queixosa, ter o arguido praticado o ilícito que lhe é imputado.
Assim, no presente caso, confrontando-se o Tribunal com a dúvida insanável da prática pelo arguido do ilícito que lhe é imputado, impõe-se em obediência ao princípio in dúbio pro reo, proferir um juízo decisório favorável ao arguido, concluir pela tese favorável ao arguido.
“O principio in dúbio pro reo está reservado àqueles casos em que, produzida a prova, subsistam dúvidas razoáveis e intransponível a respeito dos factos objecto do processo, devendo então essas dúvidas ser resolvidas a favor do arguido.”, vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 3-4-2013, in www.dgsi.pt.
“A presunção de inocência é identificada com o principio “in dúbio pro reo”, “no sentido de que um non liquet na questão da prova tem de ser sempre valorado a favor do arguido.”, vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16-1-2013, in www.dgsi.pt.
O principio in dubio pro reo é uma imposição dirigida ao juiz no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não houver a certeza sobre factos decisivos para a solução da causa.
Em suma, da prova produzida, o Tribunal concluiu pela exclusão da responsabilidade do arguido e pela sua absolvição e improcedência da acusação.
Relativamente à situação pessoal e aos antecedentes criminais do arguido, o Tribunal teve em consideração o certificado do Registo Criminal e o relatório social.

Nesta última genérica apreciação, o julgador invoca como alicerce da sua decisão o uso das regras de experiência comum e à luz de critérios de razoabilidade e bom senso.
Ora, o bom senso é um conceito muito volátil e não consta sequer da lei de processo, pelo que não deve ser erigido à categoria de critério de decisão. Podendo entender-se por ele a capacidade de fazer a coisa certa, a forma sensata e equilibrada de decidir e julgar, prudência, siso, confluímos assim para o resultado final a que a aplicação conscienciosa das regras nos aportará, ou deverá aportar, pelo que não é pressuposto, mas antes desiderato ou desígnio de qualquer decisão.
Quanto às regras da experiência, essas sim com assento legal, e de inarredável contributo para a atividade do julgador, em ordem a alcançar o aludido desígnio, apenas se nos oferece dizer que na decisão não se constata qualquer concreta indicação, sequer ao de leve, de uma delas, apenas se observando a sua tão abstrata quão proclamatória invocação.
Quanto às regras da experiência, deve ter-se sempre presente que a sua invocação acarreta o correlativo dever intelectual da sua indicação. Isto é, regras da experiência, constitui uma miríade de sabedoria comum que encerra em si uma infinita pletora de conhecimentos, sendo necessário indicar a qual deles nos referimos no discurso, para, da sua análise e ponderação, poder resultar, ou não, a conclusão pretendida. E não nos esqueçamos nunca, ao invocar de modo tão seguro, assertivo e conhecedor as ditas regras da experiência, a inolvidável lição de Óscar Wilde, no inesquecível Retrato de Dorian Gray: “A experiência é o nome que costumamos dar aos nossos erros”.
Se rememorarmos, ainda que de modo meramente reminiscente, o que atrás dissemos, concluiremos que no discurso por nós apresentado procurámos enunciar tais regras a propósito dos assuntos que íamos recursando, para que quem tiver a obrigação (ou até a diletante maçada) de o ler, possa perceber o que pretendemos dizer e com que alcance o pretendemos fazer.
E também se não se alcança com clareza (porque não está explicado) por que motivo a decisão é tão elogiosa para com todas as testemunhas de defesa (isentos, imparciais, coerentes, espontâneos, unânimes e convergentes, merecendo por isso credibilidade), quando comparadas com as testemunhas de acusação, pois parece que a razão de ciência de todas é muito similar (audita), e que todas elas também não viram nada dos factos constantes da acusação (a filha do arguido viu outros factos , diferentes), e muito menos se percebe por que motivo as suas declarações infirmaram a versão da queixosa, uma vez que, tal como as testemunhas de acusação, também não viram nada, sendo certo que em relação a estas últimas isso foi considerado uma limitação, e parece que em relação às primeiras o mesmo não sucedeu –ou seja, as testemunhas de acusação não servem porque não viram nada, as testemunhas de defesa servem porque não viram nada; intrincado, dir-se-ia. Do mesmo passo, também não é minimamente entendível por que motivo se categoriza o depoimento de OO, filha do arguido, de credível, quando ele está tão isolado como o da vítima (ninguém mais viu as agressões que diz terem sido sofridas pelo seu pai), por falta de corroboração através de outros meios de prova, sejam testemunhais, documentais, periciais ou outros, e também por que motivo não se fulmina tal depoimento de parcial e isento, à semelhança do que sucedeu em relação ao depoimento do CC, que por acaso até disse que não viu o pai agredir a mãe, como já se referiu – insistindo numa ideia já avançada, até poderá ser credível, isento e imparcial, mas falta explicar porquê para se poder perceber. É certo e sabido por todos nós que já no Digesto (22.5.9) se avisava que testis idoneus pater aut fillius patri non est, que, com vénia, se traduz por o pai não é testemunha idónea para o filho, nem o filho para o pai, mas tal brocardo, se pregnante de ensinamento, também demanda criteriosa explicação para o respetivo afastamento, e, no caso concreto, acrescendo que se considerou parcial o que relatou factos que prejudicam o pai e como imparcial o que relatou factos que o favorecem, o que, claro está, repercutimos, é aceitável enquanto juízo soberano, mas demanda melhor, mais circunstanciada e clara, e, por isso, mais convincente explicação.
Tal como se escreve no Acórdão da Tribunal da Relação de Lisboa acima citado:

O exame crítico das provas exige a indicação dos meios de prova utilizados, mas não se basta com estes, tornando-se necessário explicitar o processo de formação da convicção do tribunal, a partir desses meios de prova, com apelo às regras de experiência e aos critérios lógicos e racionais que conduziram a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido. Só assim será possível comprovar se foi seguido um processo lógico e racional na apreciação da prova ou se esta se fundou num subjectivismo incomunicável que abre as portas ao arbítrio.
– Porém, se não é possível retirar da sentença qual o processo de raciocínio do tribunal na formação da sua convicção quanto aos factos, o que impede a Relação de sindicar se aquela efetuou (ou não) uma apreciação objetiva da prova produzida, em conformidade com as regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos, não permitindo ao tribunal superior uma avaliação segura e cabal da racionalidade e coerência do juízo ou do processo lógico que conduziu à formação da convicção, é nula a sentença por falta de fundamentação, nos termos do art.º 379º,n.º1 al. a) e 374º,n.º2 ambos do CPP.

Assim sendo, e tendo em conta que nem com excruciante esforço conseguimos inteligir o pensamento ínsito na exposição de motivos de facto da decisão recorrida, só nos resta declará-la nula, ao abrigo do disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea a), em conjugação com o artigo 374.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal, não sendo tal invalidade passível de suprimento nesta instância, pelo que se ordenará a devolução dos autos ao tribunal recorrido para ser proferida nova decisão, nos termos ordenados.

III DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em declarar nula a decisão recorrida, ao abrigo do disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea a), em conjugação com o artigo 374.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal, e ordenar a devolução dos autos ao tribunal recorrido para ser proferida nova decisão, nos termos acima mencionados.

Sem tributação.
Guimarães, 30 de Setembro de 2025

Os Juízes Desembargadores           

Bráulio Martins
Pedro Cunha Lopes
Armando da Rocha Azevedo