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INUTILIDADE DA REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
RESIDÊNCIA ALTERNADA
PRESSUPOSTOS
IDADE DA CRIANÇA
CONFLITUALIDADE ENTRE OS PROGENITORES
QUESTÃO DE PARTICULAR IMPORTÂNCIA
DIREITO DE VISITA
OBRIGAÇÃO DE ALIMENTOS
Sumário
I- A causa de nulidade prevista na alínea b) do artigo 615.º do Código de Processo Civil respeita apenas à falta absoluta de fundamentação, entendendo-se como tal a total ausência de fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão. Não abrange a fundamentação deficiente, incompleta ou insuficiente, errada e/ou não convincente, que configura apenas uma causa de recurso por erro de julgamento, de facto ou de direito, que afeta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, se este for admissível, mas não constitui causa de nulidade da sentença; II- A impugnação da decisão de facto não se justifica a se, de forma independente e autónoma da decisão de mérito, assumindo antes um caráter instrumental face à mesma, pelo que essa impugnação só deve ser conhecida pelo tribunal superior se os factos que o impugnante pretende ver alterados assumirem, em face do regime substantivo e das regras do ónus da prova aplicáveis ao caso, algum interesse real e efetivo, no sentido de poder alterar a própria decisão jurídica do litígio no sentido defendido pelo recorrente, pois que se, por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, for irrelevante para a decisão a proferir, torna-se inútil e inconsequente a atividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, por não resultar de tal atividade jurisdicional qualquer efeito útil para o processo; III- O critério que deve presidir à definição do regime das responsabilidades parentais é o do superior interesse da criança, critério este que, ponderadas todas as circunstâncias relevantes, se sobrepõe aos direitos e interesses dos pais quando estes sejam conflituantes com os daquela; IV- O exercício conjunto das responsabilidades parentais com residência alternada apresenta-se, em abstrato, como uma solução viável para o futuro da criança, – quando há uma relação de boa colaboração e compromisso entre os pais no que respeita aos assuntos da vida do filho, e vinculação afetiva forte entre este e os seus progenitores – desde logo, por possibilitar uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, fortalecendo os laços afetivos entre o filho e os pais, e permitir que aquele beneficie do envolvimento igualitário e equilibrado dos seus progenitores na sua educação e desenvolvimento pessoal, tendo dois progenitores de pleno direito no exercício das responsabilidades parentais; V- A solução legal não reflete qualquer presunção legal de residência alternada ou preferência legislativa nesse sentido, mas uma mera possibilidade de o julgador aplicar a residência alternada, independentemente de acordo dos pais, mediante a prova de que a residência alternada promove o interesse da criança, determinado de forma casuística, e a ponderação de todas as circunstâncias relevantes; VI- O estabelecimento de um regime de residência alternada não se justifica quando a litigiosidade entre os progenitores inviabiliza o diálogo, entendimento e cooperação entre os mesmos, e a partilha de um projeto de vida e de educação comuns em relação ao filho, mormente quando estão em causa crianças muito pequenas.
Texto Integral
Acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte: I. RELATÓRIO:
AA, residente na Rua ..., ..., ..., na freguesia ..., concelho ..., instaurou ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais contra BB, residente na Rua ..., ..., ..., na freguesia ..., concelho ..., peticionando a «[r]egulação do Exercício das Responsabilidades Parentais das filhas menores, por forma a que: a) As menores fiquem entregue exclusivamente aos cuidados da mãe; b) Seja fixada uma prestação de alimentos, a cargo do Requerido pai, no valor mínimo mensal de 300,00€ (trezentos euros) cada menor, atualizada anualmente no dia 1 de Janeiro de acordo com os índices de inflação estabelecidos pelo Instituo Nacional de Estatística e em valor nunca inferior a 3%, mantendo-se para lá da menoridade se verificados os requisitos do artigo 1880.º do Código Civil.; c) Seja fixado um regime de visitas para o Requerido; e d) Sejam fixadas as demais questões decorrentes das responsabilidades parentais.»
Alegou, para o efeito e em síntese, que celebrou casamento católico com o requerido, no dia ../../2012, e que do referido matrimónio nasceram 3 filhas: em ../../2013, a filha CC; em ../../2016, a filha DD e em ../../2020, a filha EE.
No entanto, requerente e requerido encontram-se desavindos conjugalmente, motivo pelo qual a requerente deu entrada de uma ação de divórcio sem mútuo consentimento, e não estão de acordo quanto ao modo de exercer definitivamente as responsabilidades parentais relativamente às ditas filhas.
A requerente é o progenitor de longe o mais apto a proporcionar às filhas maior equilíbrio afetivo e emocional, pelo que pretende que a guarda das mesmas lhe seja confiada, e que seja fixado um regime de visitas para o requerido, que deverá pagar uma pensão de alimentos de cerca de € 300,00 (trezentos euros) mensais por cada, nomeadamente, € 900,00 (novecentos euros) a titulo de pensão de alimentos, pelas 3 filhas.
Realizou-se a conferência de pais a que alude o artigo 35.º, n.º 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (doravante RGPTC), na qual, dada a impossibilidade de acordo, foram tomadas declarações aos progenitores, e, na sequência do promovido pelo Ministério Público, decidiu o Tribunal a quo regular provisoriamente o exercício das responsabilidades parentais relativas às crianças CC, DD e EE, nos seguintes termos:
«A) Residência e exercício das responsabilidades parentais 1 - As crianças residirão habitualmente na companhia de ambos os progenitores, em regime de alternância semanal, de sexta a sexta-feira, indo o progenitor que passar com elas a semana que se inicia buscá-las à casa do outro pelas 19h00m. 2 – Na semana que não tiver as menores consigo, poderá o outro progenitor visitá-las e conviver com elas quando lhe aprouver, desde que informe o outro com antecedência e respeite os períodos de alimentação, descanso e demais rotinas das filhas; além disso, às quartas-feiras poderá recolher as filhas nos estabelecimentos de ensino, findas as atividades letivas, jantando com elas, e levando-as à residência do outro progenitor até às 20h30m. 3 – As questões de particular importância para a vida das crianças serão decididas em conjunto por ambos os progenitores, sendo os atos da vida corrente decididos pelo progenitor com quem as crianças estiverem em cada momento. B) Convívios 1 - O dia do pai, o dia de aniversário do pai, o dia da mãe e o dia de aniversário da mãe serão passados pelas menores na companhia do progenitor ao qual diz respeito o dia festivo, sem prejuízo das obrigações escolares das crianças. 2 – O Domingo de Páscoa será passado com a mãe até ás 14h00m e depois desse horário com o pai até às 20h00m, pernoitando depois as crianças com o progenitor a quem estejam confiadas nessa semana. C) Alimentos e despesas 1 - O pai suportará as despesas com a aquisição de livros e material escolar para as filhas, bem como o custo dos seguros de saúde das mesmas, e pagará ainda a título de alimentos para cada uma das menores uma prestação mensal no valor de € 50,00 (cinquenta) euros, que entregará à mãe até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária. 2 – As despesas de saúde que não sejam comparticipadas pelo SNS ou pelo seguro de saúde, serão suportadas pelos progenitores na proporção de metade, assim como metade das mensalidades da atividade extracurricular de dança praticada pelas crianças CC e DD. Notifique.»
De seguida, foi determinada a suspensão da conferência e remetidas as partes para audição técnica especializada, nos termos previstos no artigo 38.º, al. b), do RGPTC.
Inconformada com a fixação daquele regime provisório, a requerente interpôs recurso de apelação para este Tribunal, o qual veio a proferir a seguinte decisão, com data de 23.05.2024:
«Assim sendo, considerando o acima exposto, sem nunca esquecer a natureza provisória da presente decisão, a que necessariamente se seguirá, a curto prazo, previsivelmente, após obtenção de elementos probatórios complementares, uma nova decisão tendencialmente final, na 1ª instância, tendo em conta, nomeadamente, a idade das menores, 3 anos, a EE, 7 anos, a DD e 10 anos, a CC, ao facto de terem estado, até ao momento, a viver com a progenitora, à exiguidade dos elementos de facto relevantes para justificar uma alteração da situação vivida pelas menores, a atual situação conhecida das mesmas, com algum convívio com o progenitor, à situação económica de ambos, afigura-se-nos dever alterar a decisão proferida pelo tribunal a quo, julgando-se parcialmente procedente a apelação e determinando que: 1) As crianças continuarão a residir com a progenitora, a quem caberá o exercício do poder paternal, com as limitações que seguem. 2) A apelante entregará as menores, de segunda a sexta-feira, pelas 7,10 horas, ao apelado, em casa deste, já prontas, onde tomarão o pequeno-almoço com este, após o que o mesmo deixará a CC no autocarro e levará a DD e a EE na carrinha da escola que se desloca à fábrica onde o apelado trabalha, cabendo a recolha das mesmas à mãe. 3) Quinzenalmente, as menores passarão o fim-de-semana como o pai, que as recolherá na escola na sexta-feira respetiva indo a apelante buscá-las à escola na segunda-feira imediata, continuando na ordem que atualmente já existe. Para a eventualidade de esta ordem já não se continuar a observar, seguir-se-á a ordem acima estabelecida, com início, para o progenitor, no fim de semana a partir de 31/05/2024. 4) As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida das crianças serão exercidas por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, ressalvadas as situações urgentes. 5) O Dia do Pai, o dia de aniversário do pai, o Dia da Mãe e o dia de aniversário da mãe serão passados pelas menores na companhia do progenitor ao qual diz respeito o dia festivo, sem prejuízo das obrigações escolares e do período de descanso das crianças. 6) Para a eventualidade de a decisão final, deste processo não ocorrer até ao início das férias escolares do verão, das menores, o pai poderá tê-las consigo durante dois períodos intercalados de uma semana, cada, em data a combinar com a apelante e, na falta de acordo, a ser escolhido pelo progenitor e comunicado à mãe, com uma antecedência mínima de 15 dias, relativamente à data escolhida, cabendo a recolha e entrega das menores ao progenitor, podendo os progenitores acordar que, em vez de dois períodos intercalados de uma semana do período de férias, possa o pai possa ter as menores consigo durante o período de uma quinzena, com a recolha e entrega das mesmas a cargo do pai. 7) A título de alimentos devidos às menores, o progenitor pagará à mãe, a quantia mensal de €100,00, por cada filha, através de transferência bancária, até ao dia 8 de cada mês. 8) O pai suportará ainda as despesas com a aquisição de livros e material escolar para as filhas, bem como com o custo dos seguros de saúde das mesmas. 9) As despesas de saúde que não sejam comparticipadas pelo SNS ou pelo seguro de saúde, serão suportadas pelos progenitores na proporção de metade, por cada um, assim como metade das mensalidades da atividade extracurricular de dança praticada pela CC e pela DD.»
Inconformado com tal decisão, o recorrido interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, no qual veio a ser proferida a seguinte decisão: «Pelo exposto, atento o estatuído no art. 988º/2, do CPCivil, do CPCivil, por ser inadmissível, não admito o recurso de revista interposto por BB».
Junta que foi informação sobre audição técnica especializada realizada com entrevistas individuais aos progenitores, audições da CC e da DD e reunião conjunta entre os progenitores e seus mandatários, teve lugar a continuação da conferência de pais, nos termos do artigo 39.º, n.ºs 1 e 3 do RGPTC, na qual as partes não chegaram a acordo sobre a regulação do exercício das responsabilidades parentais, pelo que foram as mesmas notificadas para alegarem o que tivessem por conveniente e/ou juntarem prova nos termos do artigo 39.º, n.º 4, aplicável ex vi do artigo 42.º, n.º 5, do mesmo diploma legal.
A requerente apresentou alegações nas quais manteve a sua posição inicial, defendendo que a guarda atribuída a si é o regime que melhor serve os superiores interesses das crianças.
Propõe, assim, o seguinte regime de Regulação das Responsabilidades Parentais:
«I- RESIDÊNCIA: As menores residirão habitualmente com a progenitora, a quem caberá o exercício do poder paternal.
II- RESPONSABILIDADES PARENTAIS As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida das menores serão exercidas conjuntamente por ambos os progenitores. As responsabilidades parentais relativas aos atos de vida corrente das menores serão exercidas pela progenitora.
III- DIAS DE FESTA E FÉRIAS A véspera de Natal e Natal bem como a véspera de Ano Novo e dia de Ano novo serão passados pelas menores, alternadamente, com cada progenitor. Os dias de Aniversário dos progenitores, o dia do pai e o dia da mãe serão passados pelas menores com o progenitor a que diga respeito o dia festivo, sem prejuízo das obrigações escolares e horário de descanso das menores. No dia de aniversário de cada uma da das menores, as mesmas almoçarão com um dos progenitores e jantarão com o outro, de forma alternada. No período de férias de Verão, as menores passarão 15 dias consecutivos com cada um dos progenitores, nas datas entre eles a combinar.
IV- COMPARTICIPAÇÃO DESPESAS O pai suportará as despesas com a aquisição dos livros e material escolar para as filhas, bem como o custo dos seguros de saúde das mesmas. O pai pagará a título de alimentos para cada uma das menores uma prestação mensal no valor de € 200,00 (duzentos euros) que entregará à mãe até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária. As despesas de saúde que não sejam comparticipadas pelo SNS ou pelo seguro de saúde, serão suportadas pelos progenitores na proporção de metade, assim como metade das mensalidades das atividades extracurriculares de dança praticada pelas menores CC e DD.»
O requerido apresentou igualmente alegações, nas quais, em síntese, pugnou por um regime de residência alternada semanal, nos seguintes termos:
«1 - As crianças residirão habitualmente na companhia de ambos os progenitores, em regime de alternância semanal, de sexta a sexta-feira, indo o progenitor que passar com elas a semana que se inicia buscá-las à escola. 2 – Na semana que não tiver as menores consigo, poderá o outro progenitor visitá-las e conviver com elas quando lhe aprouver, desde que informe o outro com antecedência e respeite os períodos de alimentação, descanso e demais rotinas das filhas; além disso, às quartas-feiras poderá recolher as filhas nos estabelecimentos de ensino, findas as atividades letivas, jantando com elas, e levando-as à residência do outro progenitor até às 20h30m. 3 – As questões de particular importância para a vida das crianças serão decididas em conjunto por ambos os progenitores, sendo os atos da vida corrente decididos pelo progenitor com quem as crianças estiverem em cada momento. B) Convívios 1 - O dia do pai, o dia de aniversário do pai, o dia da mãe e o dia de aniversário da mãe serão passados pelas menores na companhia do progenitor ao qual diz respeito o dia festivo, sem prejuízo das obrigações escolares das crianças. 2 – O Domingo de Páscoa será passado com a mãe até ás 14h00m e depois desse horário com o pai até às 20h00m, pernoitando depois as crianças com o progenitor a quem estejam confiadas nessa semana. C) Alimentos e despesas 1 - O pai suportará as despesas com a aquisição de livros e material escolar para as filhas, bem como o custo dos seguros de saúde das mesmas, e pagará ainda a título de alimentos para cada uma das menores uma prestação mensal no valor de € 50,00 (cinquenta) euros, que entregará à mãe até ao dia 8 de cada mês, por transferência bancária. 2 – As despesas de saúde que não sejam comparticipadas pelo SNS ou pelo seguro de saúde, serão suportadas pelos progenitores na proporção de metade, assim como metade das mensalidades da atividade extracurricular de dança praticada pelas crianças CC e DD.»
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Realizou-se a audiência final e veio a ser prolatada sentença, que regulou o exercício das responsabilidades parentais relativas às crianças CC, DD e EE, nos seguintes termos:
«i. As crianças terão residência com ambos os progenitores, em regime dealternância semanal, de sexta-feira a sexta-feira, indo o progenitor que passarcom elas a semana que se inicia busca-las à casa do outro pelas 19:00 horas. ii. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida das crianças serão exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoraram na constância do casamento, salvo nos casos de manifesta urgência, em que qualquer deles poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível. iii. O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente das filhas caberá ao progenitor com quem elas se encontrem, nas respectivas semanas ou temporariamente; todavia, as orientações educativas mais relevantes para a vida das crianças deverão ser definidas pelos dois progenitores. iv. Nas semanas em que não tiver as crianças a residir consigo, às quartas-feiras poderá esse progenitor recolhê-las nos estabelecimentos de ensino no termo das actividades lectivos (ou pelas 18:30 horas, na casa do outro, em períodos de pausas escolares), jantando com elas, e levando-as à residência do outro progenitor até às 21:30 horas. v. Nas férias do Verão, as crianças passarão uma quinzena seguida com cada um dos progenitores, entre as datas que combinarem até final do mês de Maio de cada ano; não havendo acordo, nos anos pares caberá ao pai a escolha dessa quinzena, e nos anos ímpares caberá à mãe. vi. A véspera de Natal e o dia de Natal, assim como a véspera de Ano Novo e o dia de Ano Novo, serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos seus progenitores, cabendo o próximo dia 24 de Dezembro à mãe, o dia 25 de Dezembro ao pai, o dia 31 de Dezembro ao pai e o dia 1 de Janeiro à mãe. vii. Os domingos de Páscoa serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos seus progenitores, cabendo o próximo à mãe; a segunda-feira seguinte será passada pelas crianças na companhia do outro progenitor. viii. O Dia do Pai e o dia de aniversário do pai, assim como o Dia da Mãe e o dia de aniversário da mãe serão passados pelas crianças na companhia do progenitor a que respeite a data festiva, pernoitando nessas datas em casa desse progenitor. ix. Nos dias de aniversário das crianças, estas almoçarão com um e jantarão com outro dos progenitores nos moldes a combinar entre ambos; na falta de acordo, nos anos pares escolherá a mãe e nos ímpares o pai. x. Nas semanas em que um dos progenitores tiver as crianças consigo, fica obrigado a proporcionar ao outro um contacto diário por telefone ou videochamada, desde que respeite os períodos de alimentação e de descanso faz filhas; na falta de acordo quanto ao horário, esse contacto realizar-se-á entre as 19:30 e as 20:30 horas. xi. O pai suportará a totalidade das despesas com a aquisição de livros e de outro material necessário às actividades lectivas das filhas (v.g., economato, mochilas, equipamentos informáticos), e a totalidade do prémio de seguro de saúde que beneficie as crianças, que fica obrigado a contratar e manter em vigor todos os anos. xii. A título de alimentos, o pai contribuirá ainda com uma pensão mensal de € 50,00 (cinquenta euros) para cada criança, que entregará à mãe até ao dia 8 de cada mês, por transferência para conta bancária titulada por esta última; essas prestações actualizar-se-ão automaticamente, em Janeiro de cada ano, de acordo com o índice de inflação publicado pelo INE, mas sempre num mínimo de € 2,00 (dois euros). xiii. As despesas de saúde (v.g. consultas e tratamentos médicos e médico- dentários, medicamentos justificados por receita médica, óculos e lentes graduadas, cirurgias, aparelhos dentários, etc.) tidas com as crianças, na parte que não seja comparticipada pela seguradora ou outra entidade, serão suportadas pelos dois progenitores na proporção de metade. xiv. As despesas com actividades extracurriculares (v.g. explicações ou centros de estudos), com a frequência de ATL, ou com actividades desportivas ou lúdicas (v.g. natação, dança, visitas de estudo) serão também suportadas as meias por ambos os progenitores, desde que previamente decididas em conjunto. xv. O progenitor que suportar as despesas referidas nos parágrafos anteriores remeterá o documento comprovativo ao outro (com indicação do NIF da criança) até final do mês em que foi realizada, ficado o que recebeu o documento obrigado a pagar a metade que lhe compete até ao final do mês seguinte, também por transferência bancária.»
Não se conformando com o assim decidido, a requerente interpôs o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito suspensivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES:
«I. Aos dias 14-12-2023, a Recorrente apresentou um pedido de regulação do exercício das responsabilidades parentais, relativamente às suas três filhas: CC, à data com 10 anos de idade, DD, à data com 7 anos de idade e EE, à data com 3 anos de idade. II. Foi realizada a conferência de pais no dia 07-02-2024, em cumprimento do disposto no artigo 35.º do RGPTC. III. Atenta a falta de acordo entre os pais, entendeu o Tribunal a quo em fixar provisoriamente o regime de residência alternada. IV. Regime este com o qual a Recorrente não se conformou, porquanto tal regime, ainda que provisório, impunha às menores uma instabilidade e imprevisibilidade injustificada no seu quotidiano, desrespeitando manifestamente o seu superior interesse. V. Assim sendo, a Recorrente interpôs recurso de tal decisão, tendo o Tribunal da Relação decidido julgar parcialmente procedente a apelação e determinado que as crianças continuariam a residir com a progenitora, a quem coube o exercício do poder paternal. VI. Não obstante, os presentes autos prosseguiram para a fase de julgamento e, consequentemente, para a decisão definitiva de 1.ª instância, tendo o Tribunal a quo fixado novamente o regime de residência alternada. VII. Sucede que, a Recorrente não se pode conformar com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, merecendo a mesma censura, versando o presente recurso sobre matéria de facto e de direito. VIII. Em primeiro lugar, é sabido que o legislador atribuiu, como regra, no artigo 32.º, n.º 4, do RGPTC, efeito meramente devolutivo ao recurso interposto da sentença proferida, presumindo, assim, que a solução aí alcançada será, de facto, a mais consentânea com a proteção daquele interesse, e não outra. IX. Após a separação dos progenitores, ocorrida em setembro de 2023, as menores permaneceram a residir exclusivamente com a mãe (ora Recorrente), que, durante e após a coabitação, sempre foi a principal cuidadora das filhas, assegurando integralmente os cuidados básicos, médicos, escolares e emocionais. X. A matéria de facto dada como provada revela que o pai (Recorrido), apesar de beneficiar de isenção de horário de trabalho, mantém uma jornada diária das 09h00 às 19h00, não dispondo de competências básicas, como a confeção de refeições adaptadas às necessidades alimentares específicas das menores, delegando essas tarefas a terceiros. XI. Está também provado que os progenitores mantêm uma relação conflituosa e sem comunicação direta eficaz, o que inviabiliza, por completo, o funcionamento harmonioso de um regime de residência alternada. XII. As menores foram ouvidas em Tribunal e manifestaram, de forma clara, o desejo de permanecer a residir com a mãe, visitando o pai aos fins de semana, vontade essa que deve ser valorada à luz do seu interesse superior e da sua autonomia progressiva. XIII. A execução imediata da decisão recorrida representaria uma alteração abrupta nas rotinas e estrutura emocional das menores, com risco sério de danos psíquicos e organizativos, por ausência de adaptação prévia, de suporte técnico e de condições objetivas adequadas. XIV. O acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9 de outubro de 2023 (proc. n.º 1477/21.6T8VCD.P1) enfatiza que a residência alternada apenas é viável quando existe uma relação cooperante entre os progenitores e condições logísticas compatíveis, bem como a audição e vontade da criança como fator determinante na fixação do regime. XV. A aplicação imediata do regime fixado é manifestamente desproporcionada, desconsiderando a tenra idade das menores, o seu enraizamento no ambiente familiar materno, a vontade por elas expressa e as limitações do pai em garantir cuidados adequados. XVI. Pelo que, se requer, ao abrigo do disposto no artigo 32.º, n.º 1 do RGPTC, que seja concedido efeito suspensivo ao presente recurso, por se verificarem os pressupostos legais de risco de prejuízo irreparável ou de difícil reparação para as menores, devendo prevalecer, em primeira linha, o seu interesse superior, enquanto princípio estruturante do direito da família e da proteção de menores. XVII. Nos termos do disposto no artigo 205.º, n.º 1 da CRP, as decisões judiciais que não sejam de mero expediente carecem, obrigatoriamente, de fundamentação. XVIII. Tal dever de fundamentação encontra consagração igualmente nos artigos 154.º e 615.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, constituindo uma garantia essencial das partes quanto à transparência, racionalidade e legitimidade da decisão jurisdicional. XIX. A fundamentação das decisões visa permitir o controlo da legalidade da atuação judicial, assegurar o contraditório e possibilitar o exercício do direito ao recurso, integrando-se, por isso, no núcleo das garantias fundamentais do processo equitativo. XX. A decisão recorrida não especifica os fundamentos de facto e de direito que a sustentam, limitando-se a apresentar uma conclusão sem a indicação das premissas ou da base argumentativa que a justificam. XXI. A ausência de fundamentação impede a parte recorrente de conhecer os motivos que levaram à decisão, frustrando a possibilidade de reação eficaz por via do recurso e impedindo o Tribunal ad quem de exercer cabalmente o seu dever de reapreciação. XXII. Conforme entendimento pacífico da jurisprudência, designadamente dos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 16-11-2010, e da Relação de Coimbra, de 15-01-2013, a simples menção à convicção do julgador, sem a exteriorização dos respetivos fundamentos, não satisfaz o dever de motivação consagrado legal e constitucionalmente. XXIII. A omissão de fundamentação da sentença recorrida consubstancia, por conseguinte, a nulidade da mesma, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, nulidade essa que expressamente se argui para os devidos e legais efeitos. XXIV. Salvo melhor opinião, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na apreciação crítica da prova produzida em sede de audiência de julgamento, ao desconsiderar declarações de parte e prova testemunhal relevantes e coerentes, designadamente quanto aos factos elencados sob as alíneas b), c), d) e e) dos factos não provados. XXV. Relativamente à alínea b) dos factos não provados, ficou demonstrado, através de declarações claras e não infirmadas da Recorrente, que esta alterou o seu percurso profissional em maio de 2021 para reduzir a carga horária e permitir ao Recorrido maior tranquilidade na gestão dos horários escolares das filhas. XXVI. Pelo que, requer-se a este Venerando Tribunal ad quem que se proceda à alteração da matéria de facto julgada quanto à alínea b), passando tal facto a considerar-se como provado, com a seguinte redação: Em maio de 2021 a Requerente mudou de emprego para ter menos carga horária e não pressionar o Requerido com horários de cuidados com as suas filhas. XXVII. Quanto à alínea c), resultou igualmente provado, com base nas declarações da Recorrente, que, em janeiro de 2023, cessou a sua atividade profissional a pedido do Recorrido, que não conseguia assegurar os cuidados das menores durante o período matinal. XXVIII. Tal facto resulta de prova direta gravada, cuja transcrição foi indicada supra, não tendo sido contrariada por qualquer meio de prova com força probatória superior. XXIX. Pelo que, requer-se a este Venerando Tribunal ad quem que se proceda à alteração da matéria de facto julgada quanto à alínea c), passando tal facto a considerar-se como provado, com a seguinte redação: Em janeiro de 2023 a Requerente foi uma vez mais forçada a abdicar da sua carreira profissional em virtude de o Requerido não conseguir lidar com a pressão de cuidar das crianças de manhã e da rotina de horários a que as mesmas obrigavam. XXX. Relativamente à alínea d), o próprio Recorrido confessou, em sede de audiência de julgamento, frequentar o ginásio aos sábados, quando não o fazia durante a semana, regressando a casa apenas ao final do dia, o que confirma, ainda que parcialmente, o conteúdo da factualidade alegada. XXXI. Pelo que, requer-se a este Venerando Tribunal ad quem que se proceda à alteração da matéria de facto julgada quanto à alínea d), passando tal facto a considerar-se como provado, com a seguinte redação: Aos fins de semana, designadamente ao sábado, o Requerido frequentava o ginásio, após o horário de trabalho, quando não conseguia fazê-lo durante a semana, aparecendo em casa apenas ao final do dia. XXXII. Quanto à alínea e), as declarações prestadas pela Recorrente, de forma detalhada e coerente, comprovam que o Recorrido apenas convivia com as filhas aos domingos à tarde, estando ausente durante a semana devido ao trabalho e à prática de atividades pessoais, o que o próprio, ainda que indiretamente, reconheceu. XXXIII. Pelo que, requer-se a este Venerando Tribunal ad quem que se proceda à alteração da matéria de facto julgada quanto à alínea e), passando tal facto a considerar-se como provado, com a seguinte redação: O Requerido apenas passava tempo com as filhas aos domingos à tarde. XXXIV. O presente recurso visa a revogação da decisão proferida pelo Tribunal a quo que fixou um regime de residência alternada das menores CC, DD e EE com ambos os progenitores, decisão essa que enferma de erro de julgamento, por não se encontrar devidamente sustentada na matéria de facto dada como provada. XXXV. O próprio Tribunal recorrido reconheceu, na sua motivação da decisão de facto, que a Recorrente sempre foi a progenitora mais presente na vida das filhas, sendo a sua principal cuidadora e figura de referência, não lhe sendo apontado qualquer aspeto negativo enquanto mãe. XXXVI. Igualmente ficou provado, de forma expressa, que a relação entre os progenitores é conflituosa e marcada por ausência de comunicação eficaz, circunstância que inviabiliza a implementação funcional de um regime de residência alternada, o qual exige, por definição, uma cooperação parental estável, harmoniosa e duradoura. XXXVII. A decisão recorrida não se mostra lógica nem coerente com os factos considerados provados, desde logo porque impõe uma alteração estrutural na vida das menores, sem base factual suficiente nem suporte jurídico adequado, desconsiderando, inclusive, a vontade expressamente manifestada pelas próprias crianças em audiência, no sentido de residirem com a mãe. XXXVIII. A jurisprudência maioritária dos Tribunais Superiores vem reiteradamente afirmando que a residência alternada só é admissível quando exista, no mínimo, uma relação parental cooperante, funcional e isenta de conflitos relevantes — o que manifestamente não se verifica no caso sub judice. XXXIX. A imposição judicial de um regime de residência alternada contra a vontade das menores e em contradição com a realidade relacional, emocional e logística que sempre conheceram constitui uma violação do princípio do superior interesse da criança, consagrado no artigo 1906.º, n.º 7, do Código Civil. XL. Ao não atender à centralidade da mãe no quotidiano das filhas, à ausência de condições objetivas do pai para assegurar os cuidados primários, à comprovada conflitualidade parental e à vontade expressa das menores, a decisão do Tribunal a quo revela-se desajustada e materialmente injusta, devendo ser revogada. XLI. Em conformidade, deverá o Tribunal ad quem revogar a decisão recorrida, fixando-se a residência das menores junto da mãe, com quem sempre viveram e pretendem continuar a residir, estabelecendo-se, a favor do pai, um regime de visitas estruturado, regular e promotor da vinculação afetiva, mas respeitador da estabilidade e bem-estar das crianças. XLII. A decisão recorrida padece ainda de incorreta aplicação do direito ao caso concreto, ao fixar um regime de residência alternada sem a necessária ponderação das exigências legais e jurisprudenciais subjacentes à tutela do superior interesse das menores. XLIII. Nos termos do artigo 1906.º, n.º 6, do Código Civil, a fixação da residência alternada depende da verificação, em concreto, do superior interesse da criança, devendo ser avaliada de forma ponderada e fundamentada. XLIV. A jurisprudência e a doutrina majoritária, designadamente a da Sra. Juíza Conselheira Clara Sottomayor, sustentam que a residência alternada exige, como pressuposto mínimo, uma base sólida de cooperação, diálogo funcional e confiança entre os progenitores, bem como uma maturidade adequada por parte da criança. XLV. O regime de residência alternada mostra-se inadequado quando inexiste um relacionamento civilizado e cooperante entre os progenitores, circunstância que se verifica no caso sub judice, atento o elevado grau de conflitualidade entre as partes, dado como provado. XLVI. A idade das menores — concretamente, 5 anos (EE), 8 anos (DD) e 11 anos (CC), na presente data —, especialmente a tenra idade da EE, não é compatível com o modelo de residência alternada, o qual pode comprometer a estabilidade emocional e o desenvolvimento harmonioso das crianças. XLVII. A jurisprudência consolidada dos Tribunais da Relação, nomeadamente dos Tribunais da Relação de Coimbra e do Porto, entende que, em casos de elevada conflitualidade parental e idade reduzida das crianças, a residência alternada deve ser afastada, por não salvaguardar o interesse superior dos menores. XLVIII. A vontade manifestada pelas menores DD e CC — com 8 e 11 anos, respetivamente —, conforme resulta dos autos, foi ignorada pelo Tribunal a quo, em violação do disposto nos artigos 5.º, n.º 1, do RGPTC, 1901.º, n.º 1, do Código Civil. XLIX. A alteração do regime provisório então vigente, fundado na residência principal das menores junto da mãe, para um regime de residência alternada, consubstancia uma medida desproporcionada, desadequada e desajustada face ao quadro factual e probatório dos autos. L. A sentença recorrida omitiu a consideração dos elementos fundamentais que deveriam ter norteado a decisão judicial, designadamente: a idade das menores, o vínculo afetivo com a mãe, a ausência de cooperação parental, o regime provisório previamente estabelecido e os riscos associados à instabilidade emocional decorrente da alternância de residências. LI. A decisão recorrida viola o disposto nos artigos 1901.º, 1905.º e 1906.º do Código Civil, por não assegurar, nem proteger, o superior interesse das menores, colocando em risco a sua estabilidade emocional, afetiva e educativa. LII. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra que fixe a residência das menores junto da mãe, com exercício conjunto das responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância, nos termos do regime provisório anteriormente fixado, em consonância com o superior interesse das crianças. Nestes termos e nos melhores de direito, deverá ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida que fixou um regime de residência alternada, substituindo-a por outra que fixe definitivamente a residência das menores junto da Recorrente, mantendo-se os demais termos do regime provisório anteriormente fixado quanto ao Recorrido, em conformidade com o superior interesse das crianças. Fazendo-se, assim, a habitual e necessária justiça.»
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O requerido apresentou contra-alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES
«i. Por sentença proferida a 11.06.2025, o Dign. Tribunal a quo regulou o exercício das responsabilidades parentais relativas às crianças CC, DD e EE, nos seguintes termos: As crianças terão residência com ambos os progenitores, em regime de alternância semanal, de sexta-feira a sexta-feira, indo o progenitor que passar com elas a semana que se inicia busca-las à casa do outro pelas 19:00 horas. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida das crianças serão exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoraram na constância do casamento, salvo nos casos de manifesta urgência, em que qualquer deles poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível. O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente das filhas caberá ao progenitor com quem elas se encontrem, nas respectivas semanas ou temporariamente; todavia, as orientações educativas mais relevantes para a vida das crianças deverão ser definidas pelos dois progenitores. Nas semanas em que não tiver as crianças a residir consigo, às quartas-feiras poderá esse progenitor recolhê-las nos estabelecimentos de ensino no termo das actividades lectivos (ou pelas 18:30 horas, na casa do outro, em períodos de pausas escolares), jantando com elas, e levando-as à residência do outro progenitor até às 21:30 horas. Nas férias do Verão, as crianças passarão uma quinzena seguida com cada um dos progenitores, entre as datas que combinarem até final do mês de Maio de cada ano; não havendo acordo, nos anos pares caberá ao pai a escolha dessa quinzena, e nos anos ímpares caberá à mãe. A véspera de Natal e o dia de Natal, assim como a véspera de Ano Novo e o dia de Ano Novo, serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos seus progenitores, cabendo o próximo dia 24 de Dezembro à mãe, o dia 25 de Dezembro ao pai, o dia 31 de Dezembro ao pai e o dia 1 de Janeiro à mãe. Os domingos de Páscoa serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos seus progenitores, cabendo o próximo à mãe; a segunda-feira seguinte será passada pelas crianças na companhia do outro progenitor. O Dia do Pai e o dia de aniversário do pai, assim como o Dia da Mãe e o dia de aniversário da mãe serão passados pelas crianças na companhia do progenitor a que respeite a data festiva, pernoitando nessas datas em casa desse progenitor. Nos dias de aniversário das crianças, estas almoçarão com um e jantarão com outro dos progenitores nos moldes a combinar entre ambos; na falta de acordo, nos anos pares escolherá a mãe e nos ímpares o pai. Nas semanas em que um dos progenitores tiver as crianças consigo, fica obrigado a proporcionar ao outro um contacto diário por telefone ou videochamada, desde que respeite os períodos de alimentação e de descanso faz filhas; na falta de acordo quanto ao horário, esse contacto realizar-se-á entre as 19:30 e as 20:30 horas. O pai suportará a totalidade das despesas com a aquisição de livros e de outro material necessário às actividades lectivas das filhas (v.g., economato, mochilas, equipamentos informáticos), e a totalidade do prémio de seguro de saúde que beneficie as crianças, que fica obrigado a contratar e manter em vigor todos os anos. A título de alimentos, o pai contribuirá ainda com uma pensão mensal de € 50,00 (cinquenta euros) para cada criança, que entregará à mãe até ao dia 8 de cada mês, por transferência para conta bancária titulada por esta última; essas prestações actualizar-se-ão automaticamente, em Janeiro de cada ano, de acordo com o índice de inflação publicado pelo INE, mas sempre num mínimo de € 2,00 (dois euros). As despesas de saúde (v.g. consultas e tratamentos médicos e médico-dentários, medicamentos justificados por receita médica, óculos e lentes graduadas, cirurgias, aparelhos dentários, etc.) tidas com as crianças, na parte que não seja comparticipada pela seguradora ou outra entidade, serão suportadas pelos dois progenitores na proporção de metade. As despesas com actividades extracurriculares (v.g. explicações ou centros de estudos), com a frequência de ATL, ou com actividades desportivas ou lúdicas (v.g. natação, dança, visitas de estudo) serão também suportadas as meias por ambos os progenitores, desde que previamente decididas em conjunto. O progenitor que suportar as despesas referidas nos parágrafos anteriores remeterá o documento comprovativo ao outro (com indicação do NIF da criança) até final do mês em que foi realizada, ficado o que recebeu o documento obrigado a pagar a metade que lhe compete até ao final do mês seguinte, também por transferência bancária. ii. A Requerente interpôs recurso da decisão que regulou o exercício das responsabilidades parentais quanto às menores, pugnando pela atribuição de efeito suspensivo e arguindo nulidade da sentença por falta de fundamentação, bem como erro na apreciação da matéria de facto. iii. Quanto ao efeito da apelação, rege o disposto no artº 32º nº4 RGPTC, no sentido de que “os recursos (em matéria tutelar cível) têm efeito meramente devolutivo, excepto se o tribunal lhes fixar outro efeito”. iv. E fá-lo, como adequadamente se sublinhou no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 5.11.09, proferido no Processo n.º 1735/06.OTMPRT.S1, relatado pela Exma. Sra. Consª Mª dos Prazeres Beleza, por ser “função do interesse superior da criança desaconselhar em especial o protelamento de situações de facto conflituantes com decisões judiciais”. v. Inexistem quaisquer razões factuais que, em concreto, imponham um desvio ao regime-regra. vi. No caso dos autos, a decisão recorrida foi proferida em função da necessidade de ser fixado um regime de regulação das responsabilidades parentais que garanta a segurança e estabilidade das crianças, evitando que a situação de eventual conflitualidade entre os progenitores faça adivinhar que o processo se vá protelar no tempo. vii. Em função de tais pressupostos, nada aconselha a adoção de um efeito de subida do recurso que não atalhasse, ou contribuísse para atalhar, a situação de facto que fundamentou a prolação da douta decisão. viii. Acresce ainda que, é falso que após a separação as menores tenham permanecido a residir com a mãe (Recorrente). ix. Tanto que, no regime provisório ficou definida a residência alternada das menores, tendo o Pai, aqui Recorrido, provido todos os cuidados com as menores, assegurado as rotinas diárias, apoio escolar e acompanhamento emocional. x. Ademais, e conforme factos dados como provados sob o n.º 11 e 12, o Recorrente tem isenção de horário, podendo ajustar as horas de trabalho em função das necessidades das filhas, tendo disponibilidade para as acompanhar em qualquer situação que seja preciso e beneficia do apoio da família alargada, nomeadamente dos avós paternos das crianças, e principalmente da avó materna que ainda hoje, tal como durante a coabitação da requerente e do requerido, está disponível para ajudar ou substituir o pai ou a mãe quando é necessário para tomar conta das netas ou transportá-las a algum local. xi. A pretensão da Recorrente não merece acolhimento, porquanto o artigo 32.º, n.º 4, do RGPTC consagra como regra o efeito meramente devolutivo, e apenas em situações excecionais, devidamente comprovadas, pode ser concedido efeito suspensivo. xii. Não resulta dos autos qualquer elemento que demonstre a existência de risco grave e irreparável. xiii. Pelo contrário, as menores já beneficiaram de convívio próximo e regular com ambos os progenitores, residindo em casas muito próximas, pelo que o regime alternado não representa uma rutura mas antes uma continuação natural da dinâmica familiar. xiv. Atento o supra exposto, deve ser negado provimento ao recurso, mantendo- se integralmente a decisão proferida, com fixação do efeito meramente devolutivo do mesmo, por ser o regime legal aplicável e o que melhor acautela o superior interesse das menores. xv. A Recorrente alega nulidade da sentença por falta de fundamentação. xvi. Todavia, a decisão recorrida encontra-se amplamente fundamentada, com extensa apreciação da prova testemunhal, documental e declarações de parte, bem como com enquadramento jurídico detalhado, não padecendo de qualquer vício de forma. xvii. A nulidade da sentença em razão da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando que impõe ao Tribunal o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes. xviii. Só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do citado art.º 615º do Código de Processo Civil. xix. Nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, apenas a ausência absoluta de fundamentação gera nulidade, não bastando fundamentação deficiente ou errada. Igualmente, não se verifica contradição, obscuridade ou ininteligibilidade no discurso decisório. xx. Inexiste a invocada nulidade, devendo ser mantida a sentença recorrida. xxi. A Recorrente pretende alterar matéria de facto julgada, designadamente quanto às rotinas familiares e à disponibilidade do Recorrido. xxii. Todavia, o Tribunal a quo fez correta apreciação crítica da prova produzida, valorando adequadamente os depoimentos prestados pelas partes e pelas testemunhas e reconhecendo que ambos os progenitores são aptos e capazes no cuidado das filhas. xxiii. Não existe, assim, erro de julgamento, sendo infundada a pretensão de alterar a decisão de facto. xxiv. Pretende a Recorrente que os factos constantes das alíneas b), c), d) e e) como factos não provados, sejam dados como provados. xxv. Constam dos referidos factos o seguinte: b) Em Maio de 2021 a requerente mudou de emprego para ter menos carga horária e não pressionar o requerido com horários de cuidados com as suas filhas. c) Em Janeiro de 2023 a requerente foi uma vez mais forçada a abdicar da sua carreira profissional em virtude de o requerido não conseguir lidar com a pressão de cuidar das crianças de manhã e da rotina de horários a que as mesmas obrigavam. d) Aos fins-de-semana o requerido trabalhava aos sábados até às 16:00 horas e de seguida ia para o ginásio, aparecendo em casa só por volta das 20:00/21:00 horas. e) O requerido apenas passava tempo com as filhas aos domingos à tarde. xxvi. Os factos foram devidamente dados como não provados e, inclusivamente, toda a prova testemunhal e as declarações de parte o demonstram. xxvii. Na verdade, de acordo com a prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento, nunca poderia ficar provado que a Recorrente se viu forçada a abdicar da sua atividade profissional em janeiro de 2023, em virtude da incapacidade manifesta do Recorrido em assegurar, de forma autónoma e adequada, os cuidados necessários às filhas do ex-casal, durante o período da manhã e no cumprimento da rotina imposta pelos horários escolares e familiares. xxviii. Em sede de audiência de julgamento, a própria Recorrente, ouvida pelo Tribunal, prestou declarações que se revelaram pouco coerentes, emotivas e dotadas de plenas contradições, designadamente referiu que o Recorrido nunca tinha legado as filhas ao médico mas, a instâncias anteriores tinha referido que o mesmo tinha levado a filha a uma consulta de urgência devido a uma amigdalite. xxix. Temos que valorar assim que: - a Recorrente AA, inquirida na sessão de julgamento de 28 de novembro de 2024, das 15:34 às 16:26:00 com a duração de 00:00:00 até 00:51:51 disse que o Recorrido nunca foi violento com as filhas, que não via mal em que as filhas pernoitassem com o pai, que o pai era trabalhador dedicado, que as fulhas eram devidamente alimentadas quando estavam com o pai porque tinha uma funcionária que cozinhava e porque a companheira do mesmo cozinhava para as menores… - o Recorrido BB, inquirido na sessão de julgamento de 28 de novembro de 2024, das 16:26:00 às 17: 12 às com a duração de 00:00:00 até 00:45:43 demonstrou que, a residência alternada, que foi definida em termos provisórios, funcionou de forma mais pacífica, sentindo que tinha tempo de qualidade com as filhas coisa que, com o regime de guarda a cargo da Recorrente não era exequível porque apenas via as filhas de manhã num contexto prévio da escola e de forma mais corrida; manifestou que adequou a sua carga horária para estar com as filhas, manifestou que a residência alternada é aquela que permite o estreitar e a efetiva ligação com as menores pois não pretende ser um “pai de fim-de-semana”. - A testemunha FF, avô paterno das menores, inquirido na sessão de julgamento de 08 de janeiro de 2025, das 15:30 às 15:46, com duração de 00:00:00 até 00:16:28 disse que quer a Recorrente quer o Recorrido, na constância do casamento, eram responsáveis e cuidavam das filhas. xxx. Assim, os factos constantes das alíneas b), c), d) e e) foram devidamente dados como não provados, pelo que inexiste qualquer erro de julgamento por parte do Tribunal recorrido. xxxi. A Recorrente não nega que o Recorrido é um bom pai e que gosta das filhas, como igual comentário tece o recorrido em relação à Recorrente. xxxii. Assim, estando assente que: - Recorrente e Recorrido apresentam condições habitacionais para que as crianças estejam junto de si e inexistem evidências concretas que não reúnam condições parentais para o efeito; - O Recorrido pretende um regime de residência alternada, não havendo qualquer impossibilidade para este efeito; - O Recorrido é um pai preocupado e presente; - nunca a Recorrente e o Recorrido acordaram que, no momento da separação do casal, as menores permaneceriam a residir com a Recorrente; - A residência das menores junto de ambos os progenitores permitirá que a relação parental com ambos os progenitores seja equilibrada. Deverá ser mantida a atribuição da residência alternada. xxxiii. O processo de regulação das responsabilidades parentais tem por objeto decidir da fixação da residência dos filhos, fixar os alimentos devidos, forma da respetiva prestação e ainda fixar o regime de visitas no tocante ao progenitor que não tem a seu cargo as crianças – artigo 1906º do Código Civil. xxxiv. E as responsabilidades parentais englobam o conjunto de poderes e deveres destinados a assegurar o bem-estar moral e material dos filhos, designadamente tomando conta da pessoa dos filhos, mantendo relações pessoais com eles, assegurando a sua educação, o seu sustento, a sua representação legal e a administração dos seus bens. Tal facto implica a responsabilidade de garantir que as crianças têm uma residência, alimentação e vestuário, bem como a responsabilidade pela sua educação, incluindo ainda a responsabilidade de acautelar os bens materiais das crianças, quando existam, e o direito de as representar legalmente. xxxv. Nos termos do artigo 1906.º, n.º 8, do Código Civil, o Tribunal deve decidir sempre em função do superior interesse do menor, promovendo ampla proximidade com ambos os progenitores. xxxvi. O regime de residência alternada é reconhecido como a solução que melhor garante a igualdade parental e o desenvolvimento harmonioso da criança. xxxvii. No caso em apreço, a proximidade geográfica das residências, a disponibilidade de ambos os progenitores e a rede familiar de apoio permitem assegurar estabilidade e continuidade, sem prejuízo da adaptação progressiva das menores. xxxviii. A lei tem em vista que, em caso de dissolução familiar, o regime a fixar possa garantir uma grande proximidade da criança com ambos os progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões suscetíveis de favorecer amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades. xxxix. O conceito de “residência” do filho deverá ser determinado “de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro” – nº 5 do artigo 1906º do CC. xl. Ora, decorre do n º 1 do artigo 1906º do Código Civil, que a regra é a da atribuição a ambos os progenitores do exercício das responsabilidades parentais (denominada guarda conjunta), salvo os casos em que essa atribuição não salvaguarda o interesse do filho, hipótese em que, por decisão fundamentada, o tribunal deve determinar qual dos progenitores assegurará o exercício dos poderes-deveres que integram as responsabilidades parentais - nº 2 do preceito. xli. A “guarda conjunta ou compartilhada” exige e pressupõe uma convivência entre ambos os progenitores e a possibilidade de tomada de decisões em comum e que os antagonismos entre os progenitores sejam eliminados ou minimizados, colocando os interesses da criança acima dos mesmos. xlii. O Ac. TRC de 24.10.2017 (Pº 273/13.9RBCTB-A.C1), considerou que mesmo não existindo acordo dos pais, a alternância de residências é uma solução adequada ao exercício conjunto das responsabilidades parentais, salvo se o desacordo se fundamentar em razões factuais relevantes ou se mostrar que a medida não promove os interesses do filho. xliii. Ora, o Tribunal a quo fez uma correta ponderação. xliv. Note-se que, o principal critério orientador que deve guiar o julgador em qualquer decisão relativa ao exercício das responsabilidades parentais é o superior interesse da criança. xlv. Importa, portanto, encontrar a solução que melhor favoreça um equilibrado e são desenvolvimento da criança e não a solução que mais agrade a um ou aos dois progenitores. xlvi. A residência alternada é mais benéfica para as menores que a residência exclusiva com um dos progenitores, porquanto aquela será a que está mais próxima da que existia quando os pais viviam na mesma casa, já que as crianças continuarão a estar com ambos os pais por períodos prolongados e equivalentes, com ambos estabelecendo relações de maior intimidade. xlvii. Com efeito, as menores sentirão que pertencem aos dois lares em igualdade de circunstâncias e não se sentirão uma “visita” quando estão com o outro progenitor e restantes pessoas do seu agregado familiar, mantendo em ambos os lares um «espaço» próprio para si e não um espaço sentido por elas como «provisório» ou considerado como tal pelos outros elementos do agregado familiar. xlviii. Acresce que a igualização dos direitos e responsabilidades dos pais diminui a conflitualidade e encoraja a cooperação entre estes, uma vez deixa de haver um perdedor e um vencedor, o que reduz a tentativa de denegrir a imagem um do outro através de acusações mútuas. Por outro lado, mesmo que num período inicial subsista alguma conflitualidade entre os pais estes tendem, com a passagem do tempo, a ultrapassarem os seus conflitos, adaptando-se à nova situação e relacionando-se de uma forma pragmática. xlix. Ademais, o estabelecimento de uma residência única constitui uma violação do princípio da igualdade entre os cônjuges consagrada no artigo 36º nº 3 da Constituição da República Portuguesa, visto que na residência singular ou exclusiva o papel secundário que é reservado ao progenitor com quem a criança não reside, não promove a igualdade de direitos e as responsabilidades entre os pais. É igualmente causador da quebra das relações familiares, impeditiva de um convívio estreito e saudável com ambos os progenitores, que pode gerar prejuízos irreparáveis e potencia a disputa entre os pais, com todas as consequências negativas que daí decorrem para a criança. l. Pelo contrário, na residência alternada estabelece-se uma relação próxima das crianças com ambos os progenitores, sendo unanimemente aceite que a vinculação afetiva se constrói no dia-a-dia. Entre os pais e a criança tem de existir uma proximidade física que possibilite uma interligação afetiva real e consistente, sob pena de os laços já existentes se desvanecerem e os ainda inexistentes nunca chegarem a acontecer. li. A residência alternada e a proximidade dos pais com os filhos, após a separação, é mais suscetível de minimizar os efeitos negativos da separação e pode constituir um fator inibidor de que o progenitor não residente se acomode e delegue no outro progenitor a responsabilidade pela educação e acompanhamento dos filhos, mesmo que o exercício das responsabilidades parentais seja conjunto. E, através da diminuição do sentimento de perda na sequência dessa separação pode, com grande probabilidade, levar a uma diminuição da conflitualidade entre os progenitores. lii. Este regime tem, pois, como vantagens a maior proximidade entre a criança e cada um dos pais e o facto de a criança não ter de escolher um pai em detrimento do outro, para além de que os pais também não se sentem privados dos seus direitos, permitindo a continuação das responsabilidades de ambos, suscetível de criar um forte vínculo emocional de pais e filhos e o bom desenvolvimento da criança, já que a segurança nas crianças está ligada à resposta imediata em situações de stress, com carinho e envolvimento, pelo que a capacidade de manter padrões de comportamento faz crescer nas crianças sentimentos de respeito, maturidade e autoestima positiva. liii. Ademais, permite que os pais continuem a dividir atribuições, responsabilidades e tomadas de decisões em iguais condições, reconhecendo as suas diferenças e limitações bem como o valor do papel de cada para com a criança. Esta diferença clara e coerente de papéis materno e paterno é fundamental para o saudável crescimento das menores pois permite uma estruturante identificação aos modelos parentais, fundamental para um normal desenvolvimento da sua identidade pessoal. liv. Considera-se ser hoje pacífico o entendimento que a figura tradicional do “pai de fim de semana” já não é aceite pelos progenitores, que exigem uma participação na vida dos filhos em igualdade de circunstâncias com a mãe. lv. O regime de residência alternada, a par da fixação da residência com apenas um dos progenitores tem, atualmente de ser equacionado como uma das opções a ter em conta quando ocorre a separação do casal com filhos menores. lvi. Este regime da residência alternada é o que melhor salvaguarda os interesses da criança, na medida em que permite que a mesma mantenha com ambos os progenitores um relacionamento o mais próximo possível do existente no período de vivência em comum. lvii. Para a implementação de qualquer regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais devem ser tidos em conta os pressupostos gerais transversais aos diferentes contextos da parentalidade, tais como as competências pessoais dos progenitores para responder às necessidades das crianças, quer em termos de cuidados básicos, quer em relação ao seu desenvolvimento cognitivo e emocional, em suma, as competências relevantes para o exercício da parentalidade. lviii. No caso deverá manter-se o regime da residência alternada porquanto permite: a) Garantir às menores a possibilidade de desfrutar da presença de ambos os progenitores em circunstâncias semelhantes às que existiam antes da rutura, evitando os traumas decorrentes da separação. b) Evitar sentimentos negativos das menores, como o medo do abandono, sentimento de lealdade, sentimento de culpa ou sentimentos de negação. c) Fomentar uma atitude mais aberta das filhas em face da separação e maior aceitação do novo contexto, evitando situações de manipulação; d) Aceitar a importância do significativo envolvimento da figura paterna e materna na vida das crianças, quer na partilha de momentos lúdicos, quer na gestão do quotidiano e das suas dificuldades. e) Continuarem os pais a exercer em pleno os seus direitos e obrigações relativos às responsabilidades parentais e de participar, em condições de igualdade, no desenvolvimento e crescimento dos filhos, evitando sentimentos de perda por parte do progenitor com quem a criança não ficou a viver e a desmotivação decorrente de considerar que apenas serve para pagar a pensão de alimentos, além de criar uma maior consciencialização de que ambos têm que contribuir para os gastos dos filhos. lix. A residência alternada: 1. Preserva a relação da criança com ambos os pais. 2. Preserva a relação dos pais com a criança. 3. Diminui o conflito parental e previne a violência na família. 4. Respeita as preferências da criança e a opinião da mesma acerca das suas necessidades e superior interesse. 5. Respeita as preferências dos pais e a opinião dos mesmos acerca das necessidades e superior interesse da criança. 6. Reflete o esquema de cuidados parentais praticado antes do divórcio; 7. Potencia a qualidade da relação progenitor/criança; 8. Reduz a atenção parental centrada na “matematização do tempo” e diminui a litigância; 9. Incentiva a negociação e a mediação interparental e o desenvolvimento de acordos do exercício das responsabilidades parentais; 10. Proporciona guidelines claras e consistentes para a tomada de decisão judicial; 11. Reduz o risco e a incidência da “alienação parental”, 12. Permite a execução dos regimes de exercício das responsabilidades parentais, pela maior probabilidade de cumprimento voluntário pelos pais. 13. Considera os imperativos de justiça social relativos aos direitos da criança; 14. Considera os imperativos de justiça social relativos à autoridade parental, à autonomia, à igualdade, direitos e responsabilidades; 15. O modelo “interesse superior da criança/guarda e exercício unilateral” não tem suporte empírico; 16. A presunção legal de igualdade na guarda e exercício das responsabilidades tem suporte empírico. lx. O Recorrido é idóneo para cuidar das menores, não se verificam qualquer das situações previstas no artigo 1906º-A do CC. lxi. A regra deve ser a concessão a cada um dos progenitores de igual tempo de contacto ou residência com o filho, e a atribuição da titularidade do exercício de todas as responsabilidades parentais a cada um dos progenitores que estiver, pois: 1) É um modo de tentar dar à criança dois pais em vez de um só ou de um meio. 2) É uma forma de organização que contribui para criar uma cultura autêntica de partilha das responsabilidades entre os pais. 3) É a modalidade que satisfaz o princípio da igualdade dos progenitores, imposto pelos artigos 36º, nº5 e 13º, da CRP e pelo artigo 18º da Convenção Sobre os Direitos da Criança. 4) É a forma de organização que melhor se adequa ao princípio de que os filhos não devem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles (art. 36º, nº6, da CRP). lxii. Verifica-se, assim que existe: i) Uma relação afetiva da CC, DD e EE com cada um dos pais; ii) Disponibilidade de cada um dos progenitores para prestar à CC, DD e EE os cuidados necessários à sua saúde, alimentação e educação social, cultural e moral e gozam ambos de competências para o efeito; iii) O pai da CC, DD e EE goza do apoio da família alargada, nomeadamente dos respetivos ascendentes, sendo importante a convivência das crianças com os avós paternos, os quais constituem, em geral, figuras de relevo, não os afastando do convívio das crianças, cuja afetividade é essencial para a sua segurança na vida futura e lembranças, porquanto este convívio dará uma melhor relação de continuidade com a família mais alargada, proporcionando um desenvolvimento mais harmonioso das crianças e essencial para o seu equilíbrio psíquico e psicológico. iv) Condições socioeconómicas dos progenitores (ambos residem numa casa na mesma Rua onde as menores dispõem de um espaço adequado às suas idades). v) A idade das crianças e as necessidades próprias de uma criança no seu estado etário, levam a considerar ser do interesse das meninas a continuidade das relações afetivas, quer com a mãe, quer com o pai e respetivos avós paternos. vi) A distância da residência dos progenitores entre si e a escola que as menores frequentam é diminuta, tornando exequível o funcionamento do regime, e permitindo que as menores mantenham o espaço que frequentam. vii) Não foi reportada nos autos, quer nas alegações iniciais dos progenitores a existência de violência no seio familiar. lxiii. Ademais, e ao contrário do referido pela Recorrente “o manifesto desacordo entre os progenitores e o seu difícil relacionamento não constituem um pressuposto para a não fixação do regime de residência alternada, já que a fixação deste regime de residência alternada terá, segundo se supõe, a virtualidade de pacificar a situação de conflitualidade existente entre os progenitores, que decorre da guarda exclusiva atribuída à mãe, atenuando esse antagonismo, na medida em que nenhum deles se sente preterido ou com o seu papel desvalorizado no que respeita ao filho”. lxiv. Termos em que, a decisão proferida pelo Tribunal a quo não padece de qualquer vício, devendo manter-se por ser a única que acautela o interesse das menores., fazendo-se, assim, Justiça!»
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O Ministério Público apresentou igualmente contra-alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES:
«1. Não se verifica qualquer factualidade que demande a fixação de efeito suspensivo ao recurso; 2. Inexiste na douta sentença escrutinada qualquer erro de julgamento; 3. De igual forma, a decisão perscrutada não é nula nos termos do artº 615º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil, tendo o tribunal a quo modelarmente analisado a factualidade carreada para os autos e transmitido com absoluta clareza o percurso lógico percorrido para cristalizar os factos dados como provados (e não provados), que assim deverão permanecer face ao seu evidente acerto; 4. A alteração da matéria de facto dada como não provada nos termos do artº 662º, nº 1, do Código de Processo Civil, tal como ambicionado pela apelante, porque não determinaria raciocínio diferente, traduzir-se-ia na prática de um acto inútil, proibido por lei como preceituado no artº 130º do mesmo diploma legal; 5. O tribunal a quo apreciou e desmontou com minúcia os argumentos que, segundo a apelante, deveriam previamente ter sido considerados para fixar a residência das crianças exclusivamente junto de si: o facto de ser a figura de referência das filhas (1), a conflitualidade existente entre si e o apelado, pai daquelas (2), a idade (3) e a sua vontade em ficarem consigo (4); 6. Com base em extensa análise doutrinária e jurisprudencial, todos foram devidamente analisados e sustentadamente afastados, como forma de comprometer a fixação da residência alternada das crianças, regime regra que é fomentado pela legislação nacional, e instrumentos internacionais, a não ser que circunstâncias efectivamente existentes e demonstráveis o desaconselhem; 7. Não só tal não ocorreu como, antes pelo contrário, o circunstancialismo apurado aponta inexoravelmente naquele sentido, como forma de bem agasalhar o interesse das crianças; 8. Não foram violados quaisquer preceitos legais. Termos em que se conclui no sentido supra exposto, julgando-se o recurso improcedente como é de toda a JUSTIÇA!»
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O Sr. Juiz a quo pronunciou-se no sentido da inexistência da invocada nulidade.
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Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
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II. DO MÉRITO DO RECURSO
1. Delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cf. artigos 635.º, n.º 4, 637.º, n.º 2, 1ª parte e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (doravante CPC) – sendo que o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de apreciar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Porque assim é, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela recorrente, são as seguintes as questões a decidir no presente recurso:
I. Se a decisão recorrida enferma do vício de nulidade previsto na al. b) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC – não especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão;
II. Se deve ser apreciada por este Tribunal ad quem a impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
III. Se deve ser estabelecido o regime de residência alternada das crianças, como pretende o progenitor, ou se deve ser mantido o regime de residência única junto da progenitora, tal como decidido na sentença sob censura, nesta segunda hipótese, com a consequente regulação do exercício das responsabilidades parentais; do estabelecimento de um regime de convívio com o progenitor não residente e da fixação da pensão de alimentos a pagar pelo progenitor não residente.
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2. Da (alegada) nulidade da sentença recorrida por não especificar os fundamentos de facto que justificam a decisão
Advoga a recorrente, na motivação de recurso, que «na decisão do Tribunal é imprescindível que se especifiquem os fundamentos que foram decisivos para a formação da sua convicção, pelo que, neste caso, deveriam ser indicadas as razões jurídicas em que se fundamentou a decisão proferida, dando dessa forma cumprimento ao dever de fundamentação da decisão judicial, o que não sucedeu» e, nesse sentido, «a decisão recorrida é nula por vício de fundamentação, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º e artigo 154.º do Código de Processo Civil, uma vez que não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão».
Nas conclusões do recurso alega que «[a] decisão recorrida não especifica os fundamentos de facto e de direito que a sustentam, limitando-se a apresentar uma conclusão sem a indicação das premissas ou da base argumentativa que a justificam» e que «[a] ausência de fundamentação impede a parte recorrente de conhecer os motivos que levaram à decisão, frustrando a possibilidade de reação eficaz por via do recurso e impedindo o Tribunal ad quem de exercer cabalmente o seu dever de reapreciação».
O recorrido sustenta, por sua vez, que «a sentença recorrida encontra-se amplamente fundamentada, com extensa apreciação da prova testemunhal, documental e declarações de parte, bem como com enquadramento jurídico detalhado, não padecendo de qualquer vício de forma».
No mesmo sentido, sustenta o Ministério Público que «[a]penas uma análise descuidada da douta decisão perscrutada poderá descortinar alguma falta de fundamentação. Não só tal não existe como, muito pelo contrário, o meritíssimo juiz a quo soube modelarmente analisar os factos em apreço, fazer a sua escalpelização ao pormenor e, após, decidir em absoluta harmonia com as realidades mundana e processual, não se verificando qualquer nulidade da douta sentença sindicada nos termos do artº 615º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil. Na verdade, a fundamentação do tribunal a quo é, “apenas”, brilhante, intuindo-se aquela alegação como de desespero face à delicadeza do assunto em apreço. Ademais, tal suposta nulidade por falta de fundamentação não se mostra minimamente concretizada, pelo que também ao Ministério Público não cumpre estar a divagar obre qual pretensão da apelante».
O Sr. Juiz a quo pronunciou-se no sentido da inexistência da invocada nulidade, porquanto «[t]em sido entendimento pacífico que essa nulidade apenas se verifica nos casos de absoluta falta de fundamentação; já não nos casos em que a fundamentação seja alegadamente insuficiente, e ainda menos nas situações em que a parte considere errada a decisão» e «[a] sentença recorrida está, como parece manifesto, suficientemente fundamentada, quer de facto, quer de direito, razão pela qual se desatende a arguição de nulidade».
Vejamos então.
As nulidades da sentença, taxativamente enunciadas no artigo 615.º do CPC, «reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de actividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal; trata-se de vícios de formação ou actividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afectam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito»[1], e diferem dos erros de julgamento (error in iudicando), os quais contendem com erros ocorridos ao nível do julgamento da matéria de facto ou ao nível da decisão de mérito proferida na decisão recorrida decorrentes de uma distorção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error iuris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa.
Prescreve o citado artigo 615.º que:
“1- É nula a sentença quando:
(…)
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
(…)”.
A nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando plasmado no n.º 3 do artigo 607.º do CPC, segundo o qual, deve “o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final”.
É entendimento dominante, quer na doutrina, quer na jurisprudência, que a causa de nulidade prevista na alínea b) do citado artigo 615.º respeita apenas à falta absoluta de fundamentação, entendendo-se como tal a total ausência de fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão. Não abrange a fundamentação deficiente, incompleta ou insuficiente, errada e/ou não convincente, que configura apenas uma causa de recurso por erro de julgamento, de facto ou de direito, que afeta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, se este for admissível, mas não constitui causa de nulidade da sentença.[2]
Como ensinava Alberto dos Reis, «[h]á que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade (…)»[3].
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02.03.2021 decidiu-se que «[s]ó a absoluta falta de fundamentação - e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação - integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil»[4].
Ora, conforme resulta da mera análise da sentença recorrida, o Tribunal a quo discriminou os factos que resultaram provados e os que resultaram não provados; justificou a sua decisão de facto, analisando, ainda que perfuntoriamente, a globalidade da prova produzida nos autos, e indicou, interpretou e aplicou as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
Por conseguinte, e contrariamente ao que advoga a recorrente, a sentença recorrida não enferma do vício da falta de fundamentação de facto e de direito.
Conclui-se, assim, que não está verificada a nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação prevista na alínea b) do n.º 1 do citado artigo 615.º.
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3. Recurso da decisão sobre a matéria de facto 3.1. Factualidade considerada provada na sentença O Tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1. A requerente e o requerido contraíram entre si casamento no dia ../../2012.
2. Esse casamento foi dissolvido por sentença datada de 10 de outubro de 2024, proferida no processo de divórcio sem consentimento do outro cônjuge que correu termos neste Juízo sob o n.º 3318/23.0T8BCL.
3. CC, nascida a ../../2013, DD, nascida a ../../2016, e EE, nascida a ../../2020, são filhas da requerente e do requerido.
4. Depois da separação do casal, ocorrida no mês de setembro de 2023, a requerente continuou a residir com as filhas na casa que era até então a morada da família, passando o requerido a residir numa outra casa que se localiza na mesma rua, situação que ainda se mantém.
5. Na constância do casamento e enquanto viveram juntos a rotina do requerido durante a semana consistia em sair de casa de manhã cedo para ir trabalhar, deixando o seu local de trabalho, habitualmente, por volta das 19:00 horas.
6. Em alguns dias da semana, no fim do trabalho, o requerido ia para o ginásio treinar, chegando a casa já depois de a requerente e as crianças terem tomado o jantar, estando estas por vezes já a dormir e noutras preparadas para irem para a cama.
7. Durante o casamento e enquanto mantiveram a coabitação era a requerente quem habitualmente acordava as crianças e as ajudava a levantar, lhes preparava e dava o pequeno-almoço e as restantes refeições do dia, as preparava para dormir e as deitava, lhes dava banho, as penteava e vestia, as levava ao médico quando estavam doentes, as ajudava a fazer os trabalhos de casa, e ia às reuniões com os educadores e professores.
8. A requerente pugnou, sempre, por ser presença constante na vida das filhas, participando nas festividades escolares, nas reuniões com os professores, na ajuda nos trabalhos de casa.
9. A requerente foi sempre o progenitor com quem as crianças privaram mais tempo, desenvolvendo com ela uma forte vinculação afetiva.
10. A requerente é uma mãe carinhosa, preocupada e que zela pela saúde das suas filhas.
11. O requerido tem isenção de horário, podendo ajustar as horas de trabalho em função das necessidades das filhas, tendo disponibilidade para as acompanhar em qualquer situação que seja preciso.
12. O requerido beneficia do apoio da família alargada, nomeadamente dos avós paternos das crianças, e principalmente da avó materna que ainda hoje, tal como durante a coabitação da requerente e do requerido, está disponível para ajudar ou substituir o pai ou a mãe quando é necessário para tomar conta das netas ou transportá-las a algum local.
13. Os avós paternos das crianças vivem numa freguesia vizinha daquela onde se situa a sua atual residência, convivendo com regularidade e mantendo todos uma relação de grande proximidade e afeto.
14. A requerente é enfermeira de profissão, trabalhado em ... numa empresa de medicina no trabalho, cumprindo o horário das 8:30 às 18:00 horas, de segunda a sexta-feira.
15. Como retribuição desse trabalho aufere uma remuneração mensal líquida de € 1.230,00, que compreende já os duodécimos dos subsídios de férias e de Natal.
16. O requerido trabalha como diretor-geral numa empresa de metalomecânica pertença do seu pai, auferindo a remuneração mensal líquida de € 1.800,00, catorze vezes por ano.
17. Possui o 12º de escolaridade como habilitações literárias.
18. Apesar de beneficiar de isenção de horário, o horário que cumpre habitualmente é entre as 9:00 e as 19:00 horas, de segunda a sexta-feira.
19. As duas moradias unifamiliares em que a requerente e o requerido residem na atualidade estão-lhes cedidas, gratuitamente, pelo avô paterno das crianças, proprietário dos imóveis, apenas suportando aqueles os gastos habituais com eletricidade, água e saneamento, comunicações.
20. A requerente e o requerido mantêm uma relação conflituosa, apenas comunicando entre si por escrito, através de mensagens de telemóvel ou de e-mail, dificilmente chegando a consenso sobre assuntos relevantes para a vida das filhas, nomeadamente quanto à psicóloga que as deve acompanhar, ou à natureza privada ou pública do estabelecimento de ensino que devam frequentar.
21. O requerido não sabe cozinhar, sendo as refeições que as crianças tomam quando estão na sua companhia, com exceção do pequeno-almoço, preparadas por outras pessoas.
22. Aquando da sua audição a CC e a DD manifestaram vontade de continuar a residir na companhia da mãe e passar fins-de-semana com o pai, dizendo que gostam mais dessa rotina do que quando estiveram duramente alguns meses a residir com o pai e com a mãe em semanas alternadas.
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Considerando as questões a resolver no presente recurso, julga-se indispensável a ampliação da matéria de facto, em consonância com as declarações prestadas pelos progenitores e a vontade manifestada pelas crianças GG e DD em sede de audiência final, por forma a aditar os seguintes factos ao elenco dos factos provados, ao abrigo do previsto nos artigos 662.º, n.º 2, al. c) e 986.º, n.º 2 (ex vi artigo 12.º do RGPTC), ambos do CPC:
23. Nas declarações que prestaram em audiência final, os progenitores manifestaram o seu desagrado relativamente ao convívio semanal das crianças com o progenitor, fixado por decisão de 23.05.2024, por reduzir o tempo de descanso daquelas e não permitir, num contexto prévio da escola e com horários a cumprir, que as mesmas usufruam de um tempo de qualidade com o progenitor. O progenitor manifestou ainda o seu desejo de jantar com as filhas durante a semana.
24. Aquando da sua audição, as crianças CC e DD expressaram igualmente o seu desagrado por terem de acordar tão cedo, nos dias em que vão tomar o pequeno-almoço com o pai.
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3.2. Factualidade considerada não provada na sentença
O Tribunal de 1ª instância considerou que não se provaram outros quaisquer factos com relevo para a decisão para além dos acima descritos e, designadamente, que:
a) Aquando do nascimento da CC a requerente abandonou a sua atividade profissional para cuidar e se dedicar a tempo inteiro à sua filha.
b) Em maio de 2021 a requerente mudou de emprego para ter menos carga horária e não pressionar o requerido com horários de cuidados com as suas filhas.
c) Em janeiro de 2023 a requerente foi uma vez mais forçada a abdicar da sua carreira profissional em virtude de o requerido não conseguir lidar com a pressão de cuidar das crianças de manhã e da rotina de horários a que as mesmas obrigavam.
d) Aos fins-de-semana o requerido trabalhava aos sábados até às 16:00 horas e de seguida ia para o ginásio, aparecendo em casa só por volta das 20:00/21:00 horas.
e) O requerido apenas passava tempo com as filhas aos domingos à tarde.
f) A requerente é uma pessoa instável, que muda constantemente de emprego, não criando, nem mantendo vínculos laborais.
g) A requerente apenas deixou de trabalhar no período compreendido entre janeiro e agosto de 2023, por iniciativa própria e por querer passar os fins-de-semana com as menores, pois até essa data trabalhava aos fins-de-semana num lar.
h) Sempre foi e é o requerido quem leva as menores à escola, às explicações, consultas, quem fazia e faz os trabalhos de casa com as filhas.
i) O requerido participou sempre nas festividades escolares, nas reuniões com professores e na ajuda dos trabalhos de casa.
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3.3. Da utilidade da apreciação da (alegada) existência de erro de julgamento na decisão proferida me matéria de facto
Nas suas alegações recursivas, a recorrente veio requerer a reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, com fundamento na existência de factos incorretamente dados como não provados.
Concretamente, pretende a recorrente a inclusão no elenco dos factos provados dos seguintes factos dados como não provados:
“b) Em maio de 2021 a requerente mudou de emprego para ter menos carga horária e não pressionar o requerido com horários de cuidados com as suas filhas.
c) Em janeiro de 2023 a requerente foi uma vez mais forçada a abdicar da sua carreira profissional em virtude de o requerido não conseguir lidar com a pressão de cuidar das crianças de manhã e da rotina de horários a que as mesmas obrigavam.
d) Aos fins-de-semana o requerido trabalhava aos sábados até às 16:00 horas e de seguida ia para o ginásio, aparecendo em casa só por volta das 20:00/21:00 horas.
e) O requerido apenas passava tempo com as filhas aos domingos à tarde.”
O artigo 640.º, do CPC, estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, mais precisamente, o dever de especificar, sob pena de rejeição, os pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios de prova, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre essas questões de facto.
O artigo 662.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, estatui, por sua vez, que “[a] Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Conforme salienta António Santos Abrantes Geraldes[5], pretendeu-se, com a redação do art.º 662.º, «que, sem embargo da correção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afetam a decisão da matéria de facto (v.g. contradição) e também sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que está concretizado nos termos previstos no art.º 640.º, quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência.»
Através do n.º 1, do citado artigo 662.º, fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia[6], e, desse modo, alterar a matéria de facto, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, nos casos em que os elementos constantes dos autos imponham inequivocamente (em termos de convicção autónoma) uma decisão diversa da que foi dada pela 1ª instância.
No caso vertente, a recorrente cumpriu satisfatoriamente o ónus de impugnação da matéria de facto, encontrando-se reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto estabelecidos no citado artigo 640.º.
Não obstante, coloca-se, desde logo, a questão de saber qual o efetivo relevo das aludidas proposições factuais para a decisão da causa.
Com efeito, vem sendo entendido que a impugnação da decisão de facto não se justifica a se, de forma independente e autónoma da decisão de mérito, assumindo antes um caráter instrumental face à mesma, pelo que essa impugnação só deve ser conhecida pelo tribunal superior se os factos que o impugnante pretende ver alterados assumirem, em face do regime substantivo e das regras do ónus da prova aplicáveis ao caso, algum interesse real e efetivo, no sentido de poder alterar a própria decisão jurídica do litígio no sentido defendido pelo recorrente, pois que se, por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, for irrelevante para a decisão a proferir, torna-se inútil e inconsequente a atividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, por não resultar de tal atividade jurisdicional qualquer efeito útil para o processo.
Como se enfatiza no acórdão da Relação de Coimbra de 24.04.2012, «[a] impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, consagrada no artigo 685.º-B, visa, em primeira linha, modificar o julgamento feito sobre os factos que se consideram incorrectamente julgados. Mas, este instrumento processual tem por fim último possibilitar alterar a matéria de facto que o tribunal a quo considerou provada, para, face à nova realidade a que por esse caminho se chegou, se possa concluir que afinal existe o direito que foi invocado, ou que não se verifica um outro cuja existência se reconheceu; ou seja, que o enquadramento jurídico dos factos agora tidos por provados conduz a decisão diferente da anteriormente alcançada. O seu efectivo objectivo é conceder à parte uma ferramenta processual que lhe permita modificar a matéria de facto considerada provada ou não provada, de modo a que, por essa via, obtenha um efeito juridicamente útil ou relevante. Se, por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação for, "segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito", irrelevante para a decisão a proferir, então torna-se inútil a actividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, pois, nesse caso, mesmo que, em conformidade com a pretensão do recorrente, se modifique o juízo anteriormente formulado, sempre o facto que agora se considerou provado ou não provado continua a ser juridicamente inócuo ou insuficiente. Quer isto dizer que não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objecto da impugnação não for susceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, antemão, ser inconsequente, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual consagrados nos artigos 2.º n.º 1, 137.º e 138.º»[7].
No caso que nos ocupa, as questões a dirimir prendem-se, desde logo, com a fixação da residência das crianças, o exercício das responsabilidades parentais, o regime de convívio com o progenitor não residente e a pensão de alimentos a pagar pelo progenitor não residente.
O critério que deve presidir à definição do regime das responsabilidades parentais é, sempre, o do interesse das crianças.
Porque assim é, da pretendida alteração do sentido decisório referente aos concretos pontos de facto impugnados, constantes da al. b) e da primeira parte da al. c) do elenco dos factos não provados, atinentes aos interesses da progenitora, não se extrai qualquer consequência jurídica com reflexo na decisão das concretas questões que delimitam objetivamente o âmbito do presente recurso, ponderando as diferentes soluções plausíveis de direito, esgrimidas pelas partes, sendo a mesma inócua, porquanto, mesmo que, em conformidade com a pretensão da recorrente, se modifique o juízo anteriormente formulado, sempre os factos que agora se consideraram provados, continuam a ser juridicamente irrelevantes, por não contribuírem para a boa decisão da causa.
E o mesmo sucede relativamente aos concretos pontos de facto impugnados, constantes da segunda parte da al. c) e das als. d) e e) do elenco dos factos não provados, reportados a uma situação pretérita, e a uma altura em que requerente e requerido estavam ainda casados, tendo o seu casamento sido dissolvido por sentença datada de 10 de outubro de 2024. Acresce o facto, dado como provado, de o requerido ter isenção de horário, podendo ajustar as horas de trabalho em função das necessidades das filhas.
Por conseguinte, não deve este Tribunal ad quem reapreciar a matéria de facto em causa, sob pena de levar a cabo uma atividade processual inconsequente e inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual, e lhe está legalmente vedada (cf. artigo 130.º do CPC), não havendo, assim, que dela conhecer nesta instância, atento o indiscutido caracter instrumental da impugnação da decisão de facto no contexto do recurso interposto pela parte vencida na decisão proferida pelo Tribunal de 1ª instância e que tem em vista a sua revogação, como pretende a recorrente.
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3.4. Da regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente às crianças CC, DD e EE
Está em causa a regulação do exercício das responsabilidades parentais de três crianças, com 5, 9 e 11 anos de idade, que abrange a questão da fixação da residência das crianças; o exercício das responsabilidades parentais; o regime de convívio das crianças com o progenitor não residente e a questão da pensão de alimentos a pagar pelo progenitor não residente.
A norma do artigo 1878.º, n.º 1, do Código Civil (doravante CC), define, em linhas gerais, o conteúdo das responsabilidades parentais, ao estatuir que “Compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens”.
Como salienta Maria Clara Sottomayor, «[a] norma sublinha a característica mais típica do instituto das responsabilidades parentais, que é a de o seu objectivo consistir na realização do interesse dos filhos e não do interesse dos pais. Trata-se da dimensão altruística do instituto, que implica uma dissociação entre o titular do direito-dever e o beneficiário do seu exercício. Este conjunto de direitos-deveres assume assim a natureza jurídica de “poderes funcionais”, pois o seu titular não os pode exercer como queira (…). Pelo contrário é obrigado a exercê-los; e é obrigado a exercê-los de certo modo, do modo que for exigido pela função do direito, pelo interesse que este serve (…). Os pais não podem exercer as funções que integram as responsabilidades parentais de forma livre e discricionária. O exercício das responsabilidades parentais está funcionalizado ao interesse dos filhos»[8].
Mas, como acrescenta a autora, «[a] natureza das responsabilidades parentais como poderes funcionais é compatível com a afirmação de que, respeitada a prossecução dos interesses e direitos dos filhos, o instituto promove também os interesses dos pais na realização da sua personalidade, enquanto educadores e partes numa relação afetiva significativa com os filhos, como reconhece a Constituição ao afirmar no art. 36º/5 o direito e o dever dos pais a educar os filhos»[9].
O regime legal substantivo e adjetivo relativo ao exercício das responsabilidades parentais está consagrado nos artigos 1901.º e seguintes do CC e no RGPTC.
O presente processo tem a natureza de jurisdição voluntária (cf. artigo 12.º do RGPTC), o que significa que o juiz não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo adotar antes, em cada caso, a solução que julgue mais conveniente e oportuna (cf. artigo 987.º do CPC).
O regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio encontra-se regulado nos artigos 1906.º e seguintes do CC.
Dispõe o artigo 1906.º o seguinte:
“1- As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
2 - Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.
3 - O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente.
4 - O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.
5 - O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.
6 - Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos.
7 - Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho.
8 - O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.
9 - O tribunal procede à audição da criança, nos termos previstos nos artigos 4.º e 5.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.”
No caso vertente, a requerente progenitora pretende (o exercício conjunto das responsabilidades parentais com) o estabelecimento de um regime de guarda única, ou seja, que a guarda das crianças lhe seja confiada.
Já o requerido progenitor pretende (o exercício conjunto das responsabilidades parentais com) o estabelecimento de um regime de residência alternada[10], ou seja, de um regime em que as crianças fiquem a residir alternadamente com cada um dos progenitores por períodos idênticos.
O Tribunal a quo fundamentou a sua opção pela residência alternada, em suma, nos seguintes termos:
«Descendo de novo ao caso concreto, importa então apurar se se verifica algum facto ou circunstância que obstaculizem à adopção dum regime de residência alternada entre pai e mãe, por não ser, na situação destas crianças e da sua família, a solução que melhor promova os superiores interesses da CC, da DD e da EE. Ora, analisados que sejam os factos provados e os não provados, somos levados a concluir que não se identifica neles qualquer razão que, logo à partida, coloque de parte a possibilidade duma residência alternada. Nenhum dos progenitores apresenta condições psicossociais, económicas, de saúde, habitacionais, etc. que o tornem manifestamente inapto para o exercício duma parentalidade responsável – bem pelo contrário. Não há também nos factos provados notícia que tenham existido no passado, ou que existam agora, situações de violência doméstica entre os progenitores, e que tivessem impactado, directamente ou não, a vivência das crianças, ou degradado a relação de confiança e de afecto que inequivocamente mantêm com os seus ascendentes. Na actualidade, pai e mãe têm residências próximas - na mesma rua, aliás – e apesar de nos últimos meses (depois do trânsito em julgado do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães que modificou o regime provisório fixado por este Juízo) ter deixado de vigorar a residência alternada, as crianças continuam a ter todos os dias – ou quase todos os dias – contactos com o progenitor, tomando com ele o pequeno almoço e depois sendo conduzidas aos transportes que as levam aos respectivos estabelecimentos educativos. Como resulta das declarações que os progenitores prestaram na conferência de pais realizada a 7 de Fevereiro de 2024, esse contacto diário das crianças com o progenitor era já rotina praticada antes da instauração do processo. As crianças têm onze (a CC), oito (a DD) e 5 anos de idade (a EE), encontrando-se num estado de desenvolvimento e de autonomia que já não exige a todo tempo os cuidados maternos. Com essas idades afigura-se também que todas as três crianças conseguirão, com o passar do tempo e a ajuda responsável dos pais, adaptar-se a um quotidiano diferente daquele que vivenciam agora, enfrentando e ultrapassando com sucesso os desafios que necessariamente decorrem do facto de virem a ter não uma, mas duas casas. Esses desafios – ou instabilidade, queira-se - foi de resto trazida para a vida das crianças logo que os pais se separaram, sendo efeito inerente à generalidade dos processos de dissociação familiar. A instabilidade é consequência da própria desagregação familiar, com a qual as crianças têm de conviver após a separação dos progenitores. Nada leva a concluir que uma solução de residência única defendida pela progenitora proteja em absoluto as crianças da instabilidade, dos desafios, das alterações no seu quotidiano que estão obrigadas a enfrentar em virtude de terem deixado de partilhar com os dois pais a mesma habitação. As crianças nestas idades, se bem orientadas por progenitores responsáveis e que saibam priorizar os interesses dos filhos, têm uma capacidade de se adaptar a novas rotinas que surpreende e que não raras vezes supera a dos adultos. Não se considera, pois, que o facto de as crianças passarem a residir em alternância com o pai e com a mãe será gerador de um grau de instabilidade, ou duma perturbação nas suas rotinas que inviabilize a residência partilhada. Muito menos numa situação em que, como aqui ocorre, as casas dos dois progenitores distam apenas uns metros uma da outra, e em que pai e mãe continuam a beneficiar do apoio e da retaguarda dos avós paternos das menores, também residentes nas cercanias.
(…) Dos factos provados resulta que a requerente e o requerido mantêm uma relação conflituosa – nada que não fosse de esperar numa situação como a presente, em que um dos progenitores pugna por uma residência alternada e o outro não mostra abertura para aceitar uma solução dessa natureza. Surpreenderia, sim, o contrário, isto é, que apesar da pendência deste processo pai e mãe conseguissem relacionar-se com normalidade e soubessem colocar os interesses das filhas acima das suas mágoas, certamente relacionadas com as razões que levaram à ruptura da relação conjugal – mas que nada têm a ver, nem devem ter, com a relação parental que os dois terão sempre com as suas filhas. Ora, como várias decisões dos nossos tribunais superiores chamaram já à atenção, não está demonstrado que a opção por um modelo de residência única ou exclusiva em detrimento dum regime de residência alternada tenha o condão de apaziguar divergências e reduza o nível de conflitualidade inter-parental – que sempre acabará por afectar negativamente as crianças. Estou em crer, pelo contrário, que num caso como o presente, uma decisão como a defendida pela mãe, que acabaria por afastar o progenitor do exercício da co-parentalidade que deseja praticamente desde a data da separação do casal, acabaria por trazer mais prejuízos que benefícios. Fazendo um exercício de prognose, e ainda que com algum optimismo, acredito que, uma vez findo este processo, duas pessoas com as capacidades, as competências parentais, o amor e a preocupação que manifestam em proporcionar às suas filhas tudo o que seja necessário para o seu são desenvolvimento, esses dois progenitores saberão, por certo, priorizar os interesses das filhas, chegar a entendimentos acerca das questões mais relevantes para a vida e para a educação delas, e não deixar que os motivos que conduziram à ruptura da sua relação como adultos continuem a contaminar a sua relação com as crianças e as prevalentes responsabilidades que, como pai e mãe, têm para com elas. Poder-se-ia objectar à decisão para que se caminha com a alegação, mais do que comprovada, que durante a coabitação a requerente/progenitora foi sempre a principal cuidadora das crianças, aquela que passou mais tempo com as filhas, que habitualmente as acordava e deitava, lhes dava banho, as vestia, lhes preparava e dava as refeições, as acompanhava ao médico, as ajudava a fazer os trabalhos de casa, e acompanhava mais de perto o seu percurso escolar. A materialidade apurada não deixa dúvidas que a requerente era – e será ainda neste momento - a figura primária de referência para as crianças, a “primary caretaker”, e, por isso mesmo, aquele dos progenitores com quem as menores terão estabelecido uma relação e uma vinculação mais estreita. Mas também aqui se entende que a essa realidade, que foi, não pode atribuir-se uma relevância tal que condicione inexoravelmente o que irá ser, o que está para vir. Isto é, não ser crê que o facto de a requerente ter assumido antes da separação o papel de principal cuidadora das filhas deva agora afastar a opção por um modelo de residência alternada, como propugnado pelo requerido.
(…) É perfeitamente normal que durante a coabitação os progenitores definam certas rotinas, diferentes papéis ou tarefas para um e outro no dia-a-dia da vivência familiar, nomeadamente na prestação de cuidados aos filhos. Mas não pode ignorar-se que a desagregação familiar, o divórcio ou a separação, traz consigo uma nova realidade, implica necessariamente alterações nas relações entre os progenitores e entre estes e os filhos. Essa nova realidade pode levar a que um dos progenitores procure novos equilíbrios, novas prioridades, queira assumir novas funções, designadamente nos cuidados que, no futuro, pretender dispensar aos filhos. Aplicando estes ensinamentos ao caso concreto, dir-se-á o que foi já dito: a requerente foi a principal cuidadora das filhas e será para elas a figura primária de referência. Será também neste momento a mãe a pessoa mais habilitada a prestar os cuidados básicos às crianças no dia-a-dia. Mas isso não significa que o requerido não esteja capaz para adquirir e melhorar essas competências, e que possa assumir um papel mais presente na vida das filhas, partilhando com a mãe não só o tempo, mas também as responsabilidades inerentes à parentalidade – solução que, como se viu, a lei vigente privilegia (cfr. o nº 8 do artigo 1906º do Código Civil, na sua actual redacção). No assumir desse novo papel – digamos assim – contará o progenitor, por certo, como conta ainda a progenitora, com o apoio e a retaguarda dos avós paternos das crianças, como ficou provado que vem sucedendo apesar de as partes estarem a fazer vidas separadas há mais de ano e meio. Na decisão que agora cumpre proferir - e desde logo no que tange à residência das crianças, claro está – não pode deixar de ponderar-se aquilo que resultou da audição da CC e da DD.
(…) A CC e a DD foram ouvidas nestes autos no dia 17 de Janeiro de 2025, com a assistência de uma Sra. Técnica da equipa multidisciplinar da Segurança Social. Nessa data a CC tinha onze anos de idade – que acabara de completar cerca de um mês antes, a 19.12.2024 – e a DD tinha oito anos de idade. Apesar de não se identificarem indícios de que as declarações e a vontade manifestada pelas crianças estivessem condicionadas por qualquer um dos progenitores, no decurso da sua audição ficou claro que ambas atribuem à figura paterna a responsabilidade pela separação dos pais. Perante essa atribuição de “culpa” ao pai, e consequente lealdade à mãe, aliada ao facto de, como se disse, a progenitora ter sido sempre a principal cuidadora das crianças, não surpreendeu que ambas dissessem que preferiam continuar a viver com mãe e visitar o pai aos fins de semana; e que gostaram mais desta rotina do que quando estiveram, durante alguns meses, a viver com a mãe e com o pai em semanas alternadas. Não obstante ser essa a vontade manifestada pelas duas crianças que foram ouvidas, ponderadas todas as circunstâncias do caso concreto e que acima foram sendo enunciadas, entende-se que o superior interesse delas e da EE não é coincidente com a preferência declarada pelas menores. Crê-se que duas crianças com 8 anos e 11 anos de idade acabados de fazer não têm – não demonstraram ter - ainda o grau de maturidade suficiente para compreender e valorar todas as implicações decorrentes duma residência única ou duma residência alternada, e das vantagens e desvantagens que um modelo ou outro poderá ter para o seu desenvolvimento integral e para a formação da sua personalidade. Apensar da preferência expressada pela CC e pela DD, e face a tudo quanto acima se expôs, continua a entender-se que a residência alternada é, no caso concreto - e pensando não apenas no agora, mas também no que há-de vir - , o modelo que melhor serve o superior interesse destas crianças. O modelo que lhes proporcionará dois pais implicados e co-responsáveis pela sua educação e pela estruturação das suas personalidades (e não apenas um), dois progenitores presentes nas suas vidas durante mais tempo, e não um deles com o papel de pai de fim-de-semana e de férias, um modelo que permitirá a estas crianças manterem o menos alteradas possível as suas relações de afecto mais significativas, nomeadamente com os seus avós paternos.»
O Ministério Público defendeu a decisão proferida.
Vejamos então.
Na determinação da residência do filho e dos direitos de visita, o artigo 1906.º do CC remete para o conceito de interesse da criança[11], tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.
Helena Bolieiro e Paulo Guerra definem o interesse superior da criança[12] como o «interesse que se sobrepõe a qualquer outro interesse legítimo, seja o dos pais, seja o dos adultos terceiros, devendo ser densificado e concretizado através de uma rigorosa avaliação casuística, numa perspectiva global e sistémica, de natureza interdisciplinar e interinstitucional, visando a satisfação da premente necessidade da criança de crescer harmoniosamente, em ambiente de amor, aceitação e bem-estar, promovendo-se a criação de ligações afectivas estáveis e gratificantes.» [13].
Para Almiro Simões Rodrigues, o interesse superior da criança constitui «o direito do menor ao desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade».[14]
Maria Clara Sottomayor sublinha que o interesse da criança é um conceito indeterminado «que deve ser concretizado pelo juiz de acordo com as orientações legais sobre o conteúdo das responsabilidades parentais: a) a segurança e saúde da criança, o seu sustento, educação e autonomia (art. 1878°); b) o desenvolvimento físico, intelectual e moral da criança (art. 1885, n° l); c) a opinião da criança78 (arts. 1878°, n° 2 e 1901°, n" l)»[15].
A autora elenca uma série de fatores, que resultam da análise da jurisprudência e que servem de fundamento à determinação do interesse da criança, os quais podem ser divididos em fatores relativos à criança e fatores relativos aos pais.
Assim, «[o]s primeiros englobariam as necessidades físicas, afetivas, intelectuais e materiais da criança, a sua idade, sexo e grau de desenvolvimento físico e psíquico, a continuidade das relações afetivas da criança, a adaptação da criança ao ambiente extrafamiliar de origem (escola, comunidade, amigos, atividades não escolares), assim como os efeitos de uma eventual mudança de residência causados por uma rutura com este ambiente, o seu comportamento social e a preferência por ela manifestada. Os segundos abrangem a capacidade dos pais para satisfazer as necessidades dos/as filhos/as, o tempo disponível para cuidar destes, a saúde física e mental dos pais, o sexo destes (a preferência maternal ou o princípio da atribuição da guarda ao progenitor que tem o mesmo sexo da criança), a continuidade da relação de cada um dos pais com a criança, o afeto que cada um dos pais sente pela criança, e a estabilidade do ambiente que cada um pode facultar aos/às filhos/as».
A mesma autora expressa o entendimento de que «as condições financeiras dos pais, ou seja, a capacidade destes para satisfazer as necessidades materiais da criança, não devem ser utilizadas como fator de atribuição da guarda, pois tal implicaria uma discriminação das mulheres que recebem geralmente salários mais baixos do que os homens ou que estão em desvantagem pelo facto de terem ficado em casa a cuidar dos filhos/as ou de terem apenas trabalhado em tempo parcial. A relação afetiva deve prevalecer sobre os critérios financeiros. Para proteger os interesses materiais da criança existe um outro mecanismo - a obrigação de alimentos - mais adequado do que atribuir a guarda ao progenitor com mais possibilidades económicas».[16]
Refere, ainda, a existência de outros fatores que contribuem para a decisão final, mas que nada têm a ver com o interesse da criança, de que são exemplo, as condições geográficas, como a proximidade da casa de cada um dos pais da escola dos filhos/as, as condições materiais, como as características físicas de cada casa, pese embora a autora discordar com este critério, argumentando que «se o progenitor que carece de uma casa com condições para acolher a criança tem uma melhor relação afetiva com esta, estas insuficiências económicas devem ser supridas de outra forma que não a entrega da guarda ao outro progenitor», sendo que «[j]á poderão ser relevantes, do ponto de vista do interesse da criança, a companhia dos outros irmãos e a assistência prestada a um dos pais por outros membros da família, por exemplo, os avós».
Como judiciosamente se escreve no acórdão da Relação do Porto de 10.02.2022[17], «[a]s crianças têm o direito que lhe sejam proporcionadas condições para o normal desenvolvimento da sua personalidade e a aquisição de competências para o seu futuro, dentro do seu contexto e envolvência familiar e social. O seu interesse, que a ordem jurídica eleva à categoria de verdadeiro direito subjectivo, é o de congregar e beneficiar da participação responsável, motivada e coordenada dos progenitores na criação de uma vida familiar gratificante que lhe permita aspirar, em condições de dignidade e liberdade, ao desenvolvimento emocional, físico e cívico no contexto material, pessoal e social em que se insere. Muito embora todas as crianças tenham as mesmas necessidades, a sua concretização pode ser e é diferente consoante ascircunstâncias do meio envolvente em que se inserem e a fase de desenvolvimento em que se encontram.
(…) Sublinhe-se que na definição concreta do que convém ao superior interesse da criança o julgador não goza de discricionariedade, nem o seu juízo pode ser arbitrário; o julgador deve em qualquer caso guiar-se por critérios sustentáveis racionalmente e ancorados nas circunstâncias objectivas com que se depara. Não se pode ignorar que como em geral o termo interesse superior descreve o bem-estar da criança e as possibilidades de ela ver concretizados os seus direitos, a tendência dos adultos é para entender que as suas acções para com as crianças consideram o interesse superior das mesmas, confundindo o bem que lhes fazem com o bem mais elevado a que elas podem aspirar e a que têm direito. Todavia, o conceito de interesse superior da criança está associado a muitas variáveis e pode entrar em conflito com outros interesses, designadamente o dos progenitores enquanto adultos com liberdade de actuação e decisão. O interesse superior da criança não é um facto objectivo, apreensível, e a sua definição e determinação depende de critérios rigorosos».
Para Maria Clara Sottomayor, a) «A posição mais consensual nesta matéria é a de que, havendo litígio entre os pais, a guarda da criança deve ser confiada ao progenitor que dela cuidou, em termos predominantes, na constância do casamento, a chamada pessoa de referência da criança ou Primary Caretaker, na expressão anglo-saxónica. b) A pessoa de referência é o progenitor que cuida, no dia-a-dia, do planeamento das refeições e do vestuário da criança, que lhe presta cuidados de higiene e de saúde, que deita a criança à noite, que se levanta a meio da noite para a atender e que a acorda e a veste de manhã, que lhe presta assistência na doença, que organiza a sua interação social com amigos depois da escola ou as suas atividades lúdicas ou desportivas; que organiza os cuidados alternativos, p. ex., babysitting; que lhe ensina boas maneiras e hábitos de cuidados pessoais; que trata da sua educação religiosa, moral, social e cultural, etc.; que treina com a criança as capacidades elementares de ler, escrever e contar; e que, quando a criança é mais velha, acompanha o seu desenvolvimento e melhor conhece as suas necessidades sociais e intelectuais, que tem mais capacidade de diálogo e de empatia com ela, que a apoia emocionalmente, etc. c) O critério da figura primária de referência está de acordo com as orientações da lei acerca do conteúdo das responsabilidades parentais e do poder-dever de educação – promoção do desenvolvimento físico, moral e intelectual da criança (art. 1885º); proteção da segurança, da saúde, da formação moral e da educação da criança (art. 1918º) – e com todas as normas que consideram a vontade da criança como um elemento decisivo na resolução de questões que dizem respeito à sua vida (art. 1878º/2 e 1901º/3). (…) e) Apesar de os pais tenderem a partilhar os cuidados às crianças mais do que nas gerações anteriores, os casos de igualdade de facto na educação quotidiana dos filhos são raros, havendo, na maioria das famílias, um dos progenitores, normalmente a mãe, a exercer estas responsabilidades em termos principais. A regra, contudo, é neutra em relação ao sexo, não privilegiando, à partida, nenhum dos pais na disputa como sucedia com a preferência maternal para crianças de tenra idade»[18].
Ainda assim, a regra da figura primária de referência, só por si, pode não ser suficiente para se decidir pela fixação da residência da criança junto de um ou de outro progenitor, designadamente quando as tarefas concretas prestadas à criança, no quotidiano, foram partilhadas por ambos os pais.
O exercício conjunto das responsabilidades parentais com residência alternada apresenta-se, em abstrato, como uma solução viável para o futuro da criança – quando há uma relação de boa colaboração e compromisso entre os pais no que respeita aos assuntos da vida do filho e vinculação afetiva forte entre este e os seus progenitores – desde logo, por possibilitar uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, fortalecendo os laços afetivos entre o filho e os pais, e permitir que a criança beneficie do envolvimento igualitário e equilibrado dos seus progenitores na sua educação e desenvolvimento pessoal, tendo dois progenitores de pleno direito no exercício das responsabilidades parentais[19].
O regime de residência da criança deverá, no entanto, ser determinado tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, decidindo o tribunal sempre de harmonia com o interesse daquela criança concreta, tendo-se sempre em vista o desenvolvimento harmonioso da sua personalidade, de forma que o seu crescimento aconteça numa atmosfera de afeto e segurança moral e material.
A solução legal não reflete qualquer presunção legal de residência alternada ou preferência legislativa nesse sentido, mas uma mera possibilidade de o julgador aplicar a residência alternada, independentemente de acordo dos pais, mediante a prova de que a residência alternada promove o interesse da criança, determinado de forma casuística, e a ponderação de todas as circunstâncias relevantes, como, por exemplo, «a idade da criança, o seu temperamento, a sua vontade; a sua saúde e necessidades físicas, psíquicas, emocionais, educativas e sociais; a relação afetiva da criança com cada um dos pais e a disponibilidade destes para cuidar dela; divisão de tarefas entre os pais tendencialmente paritária durante a constância do casamento e da união de facto; capacidade de cooperação dos pais e de criarem um espaço livre de conflitos para a criança; que cada um deles confie no outro como pai ou como mãe; proximidade de residências»[20].
Como salienta Tomé D´Almeida Ramião, o estabelecimento de um regime de residência alternada, «não pode prescindir da existência de capacidade de diálogo, entendimento, cooperação e respeito mútuo por banda dos pais, da partilha de um projeto de vida e de educação comum em relação ao filho (…)»[21].
O próprio recorrido reconhece, nas suas contra-alegações, que «[a] “guarda conjunta ou compartilhada” exige e pressupõe uma convivência entre ambos os progenitores e a possibilidade de tomada de decisões em comum e que os antagonismos entre os progenitores sejam eliminados ou minimizados, colocando os interesses da criança acima dos mesmos» (ponto 77 da motivação do recurso e ponto xli das conclusões do recurso), e que «para se aferir o modelo que melhor favoreça o bom desenvolvimento da criança não pode deixar de se tomar em conta as características concretas de ambos os pais e da própria criança, endógenas e exógenas, não podendo deixar de ser ponderado o relacionamento e a capacidade de diálogo que os progenitores conseguem manter, não obstante se encontrarem separados» (ponto 84 da motivação do recurso).
A existência de litigiosidade entre os progenitores não constitui um obstáculo per si à residência da criança com ambos os progenitores em regime de alternância, mas apenas uma das circunstâncias a considerar na decisão[22], não sendo todo e qualquer conflito que obsta a essa decisão, pois «[s]e assim não fosse, estaria na mão do progenitor que tivesse a residência da criança na sua companhia a suscitação gratuita de conflitos a fim de impedir a implementação da residência alternada» [23].
Mas se os progenitores persistem em apresentar elevada conflituosidade e incapacidade comunicacional, a residência alternada poderá ser, então, considerada contrária ao interesse da criança.
Como enfatiza Susana Santos Silva, «o regime do exercício das responsabilidades parentais, com residência alternada, no qual o exercício de todas as responsabilidades parentais, quer as relativas às questões de particular importância, quer as relativas aos atos da vida corrente, são exercidas em comum e em conjunto por ambos os progenitores, pressupõe que os pais tenham, pelo menos, uma previsível capacidade de diálogo no que tange aos interesses dos filhos e um interesse sério e genuíno em promover o sucesso deste tipo regime em prol do bem-estar e estabilidade da criança, assegurando-lhe um ambiente estável e seguro e garantindo-lhe todas as condições para o seu desenvolvimento integral e harmonioso. A persistência de problemas de comunicação entre os progenitores e um nível elevado de conflito leva a concluir pela inexistência de capacidade de concertação entre si que lhes permita definirem linhas comuns de orientação na educação da criança de forma a garantir que, não obstante a alternância de residência, se manteria desejável e necessária a sua estabilidade. De outro passo, tal solução pode de todo não ser a mais adequada se, em consequência do conflito parental, a criança evidenciar já desequilíbrio emocional ou evidenciar insegurança face à possibilidade de fixação do regime de residência alternada, caso em que a fixação de um sistema de residência alternada seria suscetível de potenciar a situação de instabilidade emocional que a criança experiencia, caso em que seria em absoluto contrária ao seu interesse»[24].
A jurisprudência vem entendendo que «[a] residência alternada pode ainda justificar-se quando a conflitualidade entre os progenitores se centre essencialmente no facto de a progenitora se opor à pretensão do progenitor à residência alternada entre ambos os pais, sem que tal inviabilize o contacto e o diálogo entre os progenitores» [25].
Mas já não se justifica a residência alternada se o nível de litigiosidade inviabiliza o diálogo, entendimento e cooperação entre os progenitores e a partilha,relativamente ao menor, de um projeto de vida e de educação comuns, mormente quando estão em causa crianças muito pequenas.
Escreve-se no sumário do acórdão da Relação do Porto de 28.06.2016[26] que: «[e]ntre os 4 e os 10 anos, a “residência alternada” apenas deve ser adotada, nos casos em que não há conflito parental e em que cada um dos pais pode e deve confiar no outro como progenitor».
No mesmo sentido, escreve-se no sumário do acórdão da Relação de Coimbra de 10.07.2019[27], o seguinte:
«VII - A fixação da guarda conjunta (de exercício das responsabilidades parentais) com residências alternadas é admissível desde que se faça um juízo de prognose favorável quanto ao que será a vida do menor, suportada em elementos de facto evidenciados no processo, afigurando-se-nos que, em regra, a fixação desse regime só é compatível com uma situação em que se verifica uma particular interacção entre os progenitores, um relacionamento amistoso entre ambos, bem como uma razoável proximidade entre os locais onde os progenitores habitam.
(…) IX - O regime de residência alternada não é, normalmente, o mais adequado no caso de conflito acentuado entre os progenitores e em que estejam em causa crianças muito pequenas.
(…) XII – Contudo, a solução da residência alternada pode ser adotada se os pais, acordando nesse sentido, mostrarem uma inequívoca vontade de cooperar e de pôr de parte os seus diferendos pessoais. XII - Assim, apoiados em tais entendimentos e tendo em conta que a M... ainda só conta 6 anos de idade, que sempre viveu com a mãe, que a zela, cuida, educa e dela toma totalmente conta desde que nasceu, existindo laços afetivos fortes entre ambas, e que é manifesto a elevada animosidade existente entre os progenitores, bem retratada nos presentes autos, nada, mas mesmo nada aconselha ou recomenda que se altere a residência atual e habitual da menor, tanto mais que só este ano letivo iniciou a sua vida escolar, pelo que mais se acentua a necessidade de a criança ter rotinas adequadas e certas, de não estar sujeita a frequentes e absolutamente desnecessárias mudas de casa».
Ainda no mesmo sentido, escreve-se no sumário do acórdão da Relação do Porto de 08.06.2022[28] o seguinte:
«III- Tratando-se de crianças de pouca idade [3 e 5 anos, respetivamente], a residência alternada com ambos os progenitores só deve ser determinada pelo tribunal se entre os progenitores existir capacidade de diálogo, entendimento e cooperação e se entre eles se verificar também a partilha, relativamente aos menores, de um projeto de vida e de educação comuns. IV - Se entre os progenitores há um clima de conflitualidade, marcado pela recíproca falta de respeito e confiança, e se o regime de residência única com a progenitora vigora desde a separação do casal há cerca de três anos, não se justifica o estabelecimento de um regime de residência alternada».
Salienta-se, na fundamentação do mesmo aresto, que «se existe entre os progenitores um manifesto clima de conflito e animosidade e se estamos perante crianças de tenra idade (3 e 5 anos, respetivamente), a opção pela residência alternada, que implica uma guarda partilhada, implicará uma exposição muito acentuada destas aos conflitos entre os progenitores com todos os inconvenientes que daí poderão advir para a sua estabilidade e para a sua saúde física e psíquica. Deste modo, afigura-se-nos razoável o entendimento em que se preconiza que entre os 4 e 10 anos de idade a residência alternada apenas deve ser adotada nos casos em que não há conflito parental e em que cada um dos pais pode e deve confiar no outro como progenitor. Acima de tudo, o que se impõe é a preservação da criança dos focos de conflituosidade que possam existir entre os progenitores. Neste contexto, consideramos que o regime de residência alternada não pode ser encarado como o único que serve o superior interesse da criança, sendo que este interesse pode também ser eficazmente prosseguido através da fixação da residência do menor com um dos progenitores, acompanhada pelo estabelecimento de um alargado regime de visitas em favor do outro progenitor».
A fixação de um regime de residência alternada e guarda conjunta dos pais relativamente a um filho (como vem sendo preconizado, com idade compreendida entre os 4 e os 10 anos) deve passar por um elevado critério de exigência, em que, não sendo imprescindível o acordo dos progenitores nesse sentido, à luz do art.º 1906.º, n.º 6, do CC, raramente dele se abdicará, sempre num quadro de grande entendimento e proximidade afetiva e de residências que não deixe dúvidas sobre a vantagem que resultará para a criança, apesar de passar a ter a sua vida dividida por dois polos residenciais diferentes em vez de apenas um ponto central da sua vida, uma única residência principal, onde concentra a reserva dos seus interesses e intimidade, como é devido e normal acontecer com a generalidade das pessoas e das crianças.
É que, como se enfatiza no Parecer do CSMP sobre a Petição n.º 530/XIII/3ª em prol da presunção jurídica da residência alternada para crianças de pais e mães separados ou divorciados, enviado à Assembleia da República em outubro de 2018[29], «a residência alternada é suscetível de colocar na prática uma panóplia de problemas, na certeza de que reclama, em maior ou menor grau, uma organização mais complexa do que a pressuposta na vida em comum dos progenitores, exigindo destes uma relação de nível aceitável capaz de permitir uma boa comunicação e uma boa dose de respeito mútuo apta a gerar consensos em matéria educativa e orientações comuns visando a estabilidade dos filhos».
Isto posto e revertendo ao caso em apreço, cumpre, antes de mais, determinar a residência das crianças CC, DD e EE, tendo em consideração todas as circunstâncias relevantes, tendo sempre em atenção que, na definição concreta do que convém ao superior interesse da criança, o julgador deve guiar-se por «critérios sustentáveis racionalmente e ancorados nas circunstâncias objectivas com que se depara».
Resulta do quadro factual apurado que a requerente foi sempre a figura primária de referência das crianças, porquanto, durante o casamento e enquanto a requerente e o requerido mantiveram a coabitação, era a requerente quem habitualmente acordava as crianças e as ajudava a levantar, lhes preparava e dava o pequeno-almoço e as restantes refeições do dia, as preparava para dormir e as deitava, lhes dava banho, as penteava e vestia, as levava ao médico quando estavam doentes, as ajudava a fazer os trabalhos de casa, e ia às reuniões com os educadores e professores, e foi sempre o progenitor com quem as crianças privaram mais tempo, desenvolvendo com ela uma forte vinculação afetiva.
Requerente e requerido residem próximo um do outro, na mesma rua, e ambos dispõem de condições habitacionais (residem em moradias unifamiliares cedidas gratuitamente pelo avô paterno das crianças, proprietário dos imóveis, apenas suportando aqueles os gastos habituais com eletricidade, água e saneamento, comunicações) e financeiras para a educação e necessidades das filhas e beneficiam do apoio da família alargada, nomeadamente dos avós.
Não obstante, verifica-se que a requerente e o requerido mantêm uma relação conflituosa, apenas comunicando entre si por escrito, através de mensagens de telemóvel ou de e-mail, dificilmente chegando a consenso sobre assuntos relevantes para a vida das filhas, nomeadamente quanto à psicóloga que as deve acompanhar, ou à natureza privada ou pública do estabelecimento de ensino que devam frequentar, o que evidencia uma falta de interação e cooperação entre os progenitores necessária para gerar os necessários «consensos em matéria educativa e orientações comuns» visando a estabilidade das filhas.
A CC e a DD, na altura com onze e oito anos de idade respetivamente, foram ouvidas e manifestaram vontade de continuar a residir na companhia da mãe e passar fins de semana com o pai, dizendo que gostam mais dessa rotina do que quando estiveram, durante alguns meses, a residir com o pai e com a mãe em semanas alternadas, revelando, assim, inteira adesão à manutenção da situação atual.
Conforme se refere na sentença sob censura, não se identificaram indícios de que as declarações e a vontade manifestada pelas crianças estivessem condicionadas por qualquer um dos progenitores.
É certo que o tribunal não está vinculado a decidir de acordo com a opinião das crianças, tendo antes de avaliar todas as circunstâncias do caso e determinar se o que as menores entendem que é o melhor para si é efetivamente o que promove a defesa do seu superior interesse.
Não obstante, conforme se refere no acórdão do tribunal da Relação de Lisboa de 11.03.2021, acima referido, «[s]e o objectivo legal, como se referiu supra, é cimentar o contacto, tão próximo quanto possível, do filho com ambos os progenitores, de modo a que este possa usufruir em pleno, e em termos paritários, do afecto, apoio e segurança que cada um deles lhe proporcionará, tal objectivo nunca será atingido se for imposto à criança um regime com o qual ela não se identifique e não se sinta confortável. Por outro lado, o estabelecimento e aprofundamento das ações afectivas, entre pais e filhos, em termos paritários, de igualdade entre pai e mãe, não pressupõe uma divisão milimetricamente igualitária do tempo passado com um e com outro. Importa mais a qualidade do tempo investido na relação do que a respectiva quantidade».
Acresce que a EE conta apenas cinco anos de idade, o que de acordo com a jurisprudência suprarreferida desaconselha a residência alternada com ambos os progenitores, quando entre eles existe uma elevada animosidade.
A não separação dos irmãos tem sido, de resto, um critério aplicado pela jurisprudência para determinar o interesse das crianças.
A este propósito, pode ler-se na fundamentação do acórdão desta Relação de 27.09.2018[30] que «[t]em vindo a falar-se no princípio da não separação de irmãos, frequentemente invocado nas decisões sobre a atribuição da guarda dos filhos, sobretudo nos casos em que as crianças viviam juntas antes da separação dos pais, como consequência da necessidade da criança na continuidade das suas relações sociais e afectivas. O fundamento de tal princípio reside na ideia de que os filhos de pais divorciados ou separados judicialmente, já traumatizados com o afastamento de um dos pais, ainda sofreriam mais com a separação dos irmãos, o que afectaria negativamente o seu desenvolvimento (cfr. acórdãos da RC de 12/10/2004, proc. nº. 2265/04 e de 2/06/2009, proc. nº. 810/08.0TBCTB; da RP de 29/04/2014, proc. nº. 26/12.1TMMTS-A e da RG de 9/01/2017, proc. nº. 776/12.2TBEPS-C, todos acessíveis em www.dgsi.pt; Maria Clara Sottomayor, in Exercício do Poder Paternal, Publicações Universidade Católica, Porto, 2003, pág. 123 a 125). Assim, só casos verdadeiramente excepcionais, motivados por razões extremamente ponderosas, poderão justificar que se separem os irmãos uns dos outros, situação de excepção essa que, como facilmente se extrai da matéria fáctica dada como assente, não ocorre no caso presente. Tanto a jurisprudência como a doutrina, partem da máxima de que as relações entre os irmãos devem ser estimuladas de maneira a não obstar a sua convivência diária e o seu amparo recíproco. E a conveniência de não separar os irmãos também possui esteio na intenção de se manter unido o que resta da família. Se os irmãos são unidos e sempre viveram juntos, é imperioso que o juiz, sustentado no princípio de que os interesses das crianças são superiores aos interesses dos pais e que são apenas eles que devem constituir o critério da decisão, procure a todo o custo não separá-los (…)».
Ora, considerando todas as circunstâncias relevantes: o facto de a requerente ter sido sempre «o progenitor com quem as crianças privaram mais tempo, desenvolvendo com ela uma forte vinculação afectiva» (ponto 9 dos factos provados), sendo, como sempre foi, a figura primária de referência das crianças, que sempre viveram juntas; o nível de conflituosidade existente entre os progenitores, que inviabiliza a interação e cooperação entre os mesmos e a partilha de um projeto de vida e de educação comuns em relação às filhas (fatores absolutamente necessários para que o regime pretendido pelo progenitor seja bem-sucedido); a vontade manifestada pelas crianças CC e DD, genuinamente sua, alicerçada na experiência de terem estado, durante alguns meses, a residir com o pai e com a mãe em semanas alternadas, sem descurar que a imposição de um regime de residência alternada, contra a vontade das crianças, pode igualmente conduzir a uma instabilidade psicológica das mesmas, com todos os inconvenientes que daí poderão advir para a sua estabilidade e saúde física e psíquica, julgamos não ser aconselhável, ou recomendável, por contrário ao superior interesse das crianças, o estabelecimento, neste momento, de um regime de residência alternada no âmbito do exercício conjunto das responsabilidades parentais.
Outrossim, afigura-se-nos que a fixação da residência das crianças com a progenitora é, neste momento, a solução que melhor salvaguarda o superior interesse das mesmas, por ser a progenitora, no caso, aquele dos progenitores que está em melhores condições de assegurar às crianças um desenvolvimento são e normal no plano físico, psíquico, afetivo, moral e social, e uma correta estruturação da sua personalidade, sem prejuízo de vir a ser viável no futuro o estabelecimento do regime almejado pelo requerido, se os progenitores mostrarem uma inequívoca vontade de cooperar e de pôr de parte os seus diferendos pessoais para alcançar decisões em relação às filhas.
Sustenta o recorrido (no ponto 92 das suas contra-alegações e no ponto xlix das conclusões de recurso), que «o estabelecimento de uma residência única constitui uma violação do princípio da igualdade entre os cônjuges consagrada no artigo 36º nº 3 da Constituição da República Portuguesa, visto que na residência singular ou exclusiva o papel secundário que é reservado ao progenitor com quem a criança não reside, não promove a igualdade de direitos e as responsabilidades entre os pais. É igualmente causador da quebra das relações familiares, impeditiva de um convívio estreito e saudável com ambos os progenitores, que pode gerar prejuízos irreparáveis e potencia a disputa entre os pais, com todas as consequências negativas que daí decorrem para a criança».
O critério que deve presidir à definição do regime das responsabilidades parentais e, por conseguinte, à determinação da residência das crianças com cada um dos progenitores é, no entanto, o do superior interesse das mesmas, critério este que, ponderadas todas as circunstâncias relevantes, se sobrepõe aos direitos e interesses dos pais quando estes sejam conflituantes com os daquelas[31].
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.02.2020, «[p]or mais que aceitemos a existência de um “direito subjetivo” dos pais a terem os filhos consigo, é no entanto o denominado “interesse superior da criança” - conceito abstrato a preencher face a cada caso concreto - que deve estar acima de tudo. Se esse “interesse subjetivo” dos pais não coincide com o “interesse superior” da criança, não há outro remédio senão seguir este último interesse»[32].
A residência das crianças com a progenitora não se nos afigura, em todo o caso, suscetível de causar uma quebra das relações familiares, dada a grande proximidade de residências dos progenitores, nem impede um contacto alargado entre as crianças e o progenitor ou com os avós paternos das crianças que vivem numa freguesia vizinha daquela onde se situa a sua atual residência e com os quais convivem com regularidade mantendo uma relação de grande proximidade e afeto.
Os modernos meios de comunicação, de que são exemplo o telefone e a internet, permitem, de resto, com toda a facilidade, um diálogo diário entre o progenitor e as filhas.
Isto posto, cumpre agora determinar o exercício das responsabilidades parentais; o regime de convívio das crianças com o progenitor não residente e a questão da pensão de alimentos a pagar pelo progenitor não residente.
Relativamente ao exercício das responsabilidades parentais, o legislador distinguiu entre atos da vida corrente e questões de particular importância. O exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem este reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontre temporariamente, nos termos do n.º 3 do citado artigo 1906.º. Já no que respeita às questões de particular importância, impõe-se, por regra, o exercício conjunto das responsabilidades parentais, salvo situações de urgência, em que qualquer dos pais pode atuar sozinho, desde que informe de imediato o outro, ou quando o tribunal entender que este regime é contrário aos interesses do filho, conforme flui dos n.ºs 1 e 2 do citado art.º 1906.º.
São atos de particular importância, por força da lei, a propositura de ações em representação da criança (artigo 16.º, n.º 2, do CPC), a autorização para o casamento de menor de dezoito anos e maior de dezasseis (artigo 1612.º, n.º 1, do CC) e a autorização para a interrupção voluntária da gravidez de filha menor de dezasseis anos (artigo 142.º, n.º 5 do Código Penal).
A doutrina e a jurisprudência vêm entendendo que constituem questões de particular importância, entre outras, o batismo e a educação religiosa da criança, até aos 16 anos; a decisão sobre as intervenções cirúrgicas das quais possam resultar riscos acrescidos para a vida ou integridade física da criança; a prática de atividades desportivas que impliquem risco para a vida, saúde ou integridade física da criança; a mudança de escola e a escolha do estabelecimento de ensino (escola pública ou privada) a frequentar pela criança – caso o progenitor não residente «alegue e prove que a escola que a mãe escolheu não é adequada às crianças, devido, por exemplo, à distância entre a residência e a escola, aos custos envolvidos (se for particular), ou a outras razões ponderosas relacionadas com o ambiente ou a qualidade de ensino que envolvam uma situação de perigo para a educação ou desenvolvimento das crianças»[33]; as decisões de administração que envolvam oneração ou alienação de bens ou direitos da criança; a participação em programas de televisão e/ou outros espetáculos; a perfilhação; a obtenção de licença de condução de ciclomotores e de carta de condução de motociclos de cilindrada não superior a 125 cm3; o exercício de uma atividade laboral por parte da criança; a saída da criança para o estrangeiro sem ser em viagem de turismo, assim como a deslocação da criança para países em conflito armado e a mudança de residência da criança para local distinto da do progenitor a quem foi confiado[34].
Já não serão atos de particular importância, mas da vida corrente, a frequência de atividades extracurriculares por parte das crianças, bem como as consultas médicas, colocação de próteses, definição de dieta alimentar, aquisição de medicamentos e material escolar necessário para os filhos, acompanhamento dos trabalhos de casa, etc.[35].
No caso vertente, ficando as crianças a residir com a progenitora, incumbirá a esta o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente das filhas, nos termos do n.º 3 do citado artigo 1906.º, sem prejuízo da intervenção do progenitor não residente (pai) durante o período de tempo em que as filhas consigo se encontrem temporariamente, intervenção esta que, contudo, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes definidas pela progenitora, como, por exemplo, escolha do estabelecimento de ensino a frequentar; métodos educativos sem castigos físicos ou psíquicos; programas de televisão a que a criança está proibida de assistir; cuidados de saúde e ingestão de medicamentos, etc.[36].
As responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida das crianças serão exercidas por ambos os progenitores, sendo que cada um dos progenitores deverá dar conhecimento ao outro de todas as circunstâncias e acontecimentos de importância relevante para a vida, educação e saúde das filhas.
O direito de convívio, sendo uma das concretizações ao artigo 36.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), segundo a qual os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial, e encontrando-se referido no citado artigo 1906.º, n.ºs 5 e 8, consiste no direito que o progenitor sem a guarda dos filhos tem de se relacionar e conviver com estes. Na determinação do conteúdo do direito de convívio, deve atender-se às prerrogativas do guardião, ao interesse do titular do direito de visita e ao interesse da criança na manutenção da relação, prevalecendo, em caso de conflito, este último interesse.
Conforme se refere no acórdão da Relação do Porto de 15.12.2020[37], «[n]o contexto do divórcio o direito de visita significa a possibilidade de o progenitor sem a guarda e a criança se relacionarem e conviverem entre si, uma vez que tais relações não podem desenvolver-se de forma normal, no dia-a-dia, em virtude da falta de coabitação. Assim, o direito de visita substitui o convívio diário entre este progenitor e os seus filhos, tal como existia antes do divórcio. O direito de visita tem pois uma forte componente humana e subjazem-lhe realidades afetivas que o direito não pode ignorar. O seu exercício por parte do progenitor não guardião funciona como um meio de este manifestar a sua afetividade pela criança, de ambos se conhecerem reciprocamente e partilharem os seus sentimentos de amizade, as suas emoções, ideias e valores mais íntimos. O direito de visita não representa uma faculdade, um direito subjetivo do parente do menor, ainda que baseado na afeição e nos sentimentos de amizade que normalmente existem entre consanguíneos, mas antes um direito a que estão associados deveres, nomeadamente, o dever de se relacionar com os filhos, com regularidade, em ordem a promover o seu desenvolvimento, físico e psíquico, e o dever de colaborar com o progenitor guardião no cuidado dos menores e na assistência que aos mesmos é prestada. Por outro lado, existe o direito do menor em manter relações pessoais e contactos diretos regulares com os pais, salvo se tal se mostrar contrário aos seus superiores interesses, em conformidade com o estipulado pelo artigo 9º, nº 3, da Convenção sobre os Direitos da Criança. Em suma: o direito de visita desdobra-se em três facetas, ou seja, num poder-dever do progenitor não guardião, numa obrigação do titular do exercício do poder paternal e ainda num direito subjetivo do menor».
Voltando ao caso vertente, verifica-se que, por decisão proferida por este Tribunal, com data de 23.05.2024, foi determinado, além do mais, que «[a] apelante entregará as menores, de segunda a sexta-feira, pelas 7,10 horas, ao apelado, em casa deste, já prontas, onde tomarão o pequeno-almoço com este, após o que o mesmo deixará a CC no autocarro e levará a DD e a EE na carrinha da escola que se desloca à fábrica onde o apelado trabalha, cabendo a recolha das mesmas à mãe».
Nas declarações que prestaram na audiência final, os progenitores manifestaram o seu desagrado relativamente ao convívio semanal das crianças com o progenitor, fixado por decisão de 23.05.2024,por reduzir o tempo de descanso daquelas e não permitir, num contexto prévio da escola e com horários a cumprir, que as mesmas usufruam de um tempo de qualidade com o progenitor. O progenitor manifestou ainda o seu desejo de jantar com as filhas durante a semana.
A CC e a DD, ouvidas na audiência final, expressaram igualmente o seu desagrado por terem de acordar tão cedo, nos dias em que vão tomar o pequeno-almoço com o pai.
Isto posto, considerando o regime de convívios proposto pela progenitora e o facto de o regime provisório em vigor não estar a assegurar, na prática, o superior interesse das crianças, no que respeita ao convívio semanal com o progenitor, tendo ainda em atenção a vontade manifestada pelo progenitor e o disposto no n.º 8 do citado artigo 1906.º (“[o] tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos …”), determina-se o seguinte regime de convívios:
1.1. Quinzenalmente, as crianças passarão o fim-de-semana com o progenitor, que as recolherá na escola na sexta-feira respetiva indo a progenitora recolhê-las à escola na segunda-feira imediata.
1.2. As crianças jantarão duas vezes por semana com o progenitor, às terças e quintas-feiras, nos moldes a combinar entre os progenitores, sem prejuízo do período de descanso daquelas.
1.3. O Dia do Pai, o dia de aniversário do pai, o Dia da Mãe e o dia de aniversário da mãe serão passados pelas crianças na companhia do progenitor ao qual diz respeito o dia festivo, sem prejuízo das obrigações escolares e do período de descanso daquelas.
1.4. O aniversário das crianças será passado na companhia de ambos os progenitores, fazendo aquelas uma refeição (almoço/lanche ou jantar) com cada um,nos moldes a combinar entre ambos, sem prejuízo das atividades escolares e do período de descanso das crianças.
Em caso de desacordo, nos anos pares prevalecerá a opção do pai e, nos anos ímpares, a opção da mãe.
1.5. Nas férias escolares de verão, o progenitor poderá ter as crianças consigo durante o período de uma quinzena, em data a combinar com a progenitora até ao final do mês de maio, cabendo a recolha e entrega das crianças ao pai.
Em caso de desacordo, nos anos pares prevalecerá a opção do pai e, nos anos ímpares, a opção da mãe.
1.6. A véspera de Natal e o dia de Natal, assim como a véspera de Ano Novo e o dia de Ano Novo, serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos progenitores, cabendo o próximo dia 24 de dezembro à mãe, o dia 25 de dezembro ao pai, o dia 31 de dezembro ao pai e o dia 1 de janeiro à mãe.
1.7. Os domingos de Páscoa serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos progenitores, cabendo o próximo à mãe, sendo a segunda-feira seguinte passada pelas crianças na companhia do outro progenitor.
Quantos aos alimentos devidos, há que ter em consideração que ambos os progenitores estão vinculados à obrigação de alimentos – cf. artigo 36.º, n.º 5, da CRP (que estabelece que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos) e artigos 1874.º, n.º 1 (“[p]ais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência”) e 1878.º (“[c]ompete aos pais, no interesse dos filhos, … prover ao seu sustento …”), ambos do CC.
A obrigação de prestar alimentos a favor dos filhos insere-se naquele conjunto de direitos-deveres anteriormente referido, que os progenitores exercem no interesse dos filhos, designadamente no dever geral de assistência e sustento.
A obrigação de prover ao sustento dos filhos e de assegurar as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação cessa logo que aqueles estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, aqueles encargos (artigo 1879.º do CC); ou mantem-se para além do momento em que os mesmos atinjam a maioridade ou forem emancipados, desde que não tenham ainda completado a respetiva formação profissional, e na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento, se bem que apenas pelo tempo normalmente requerido para que aquela se complete (artigo 1880.º do CC).
Entende-se por alimentos, de acordo com a noção dada pelo artigo 2003.º, n.º 1, do CC, “tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário”, sendo que “[o]s alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor”, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito.
A obrigação de sustento dos pais para com os menores é mais vasta do que aquela que resultaria do n.º 1 do artigo 2003, na medida em que abrange as despesas relativas “a instrução e educação” (artigo 1885.º), assim como as que decorrem do cumprimento dos deveres integrados nas responsabilidades parentais (artigo 1878.º).
Com efeito, a obrigação de sustento dos pais não se afere pelo estritamente necessário à satisfação das necessidades básicas dos filhos, compreendendo o indispensável à promoção adequada do desenvolvimento físico, intelectual e moral dos mesmos.
O artigo 2004.º do CC dispõe, no seu n.º 1, que “[o]s alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los”.
Os critérios legais, assentes em conceitos indeterminados ou relativos, para o cálculo da obrigação de alimentos, são, assim, os meios do alimentante – por regra, é com base nos rendimentos que o alimentante aufere reiteradamente (periodicamente ou não) do trabalho ou do capital que se determina o montante dos seus meios ou recursos – a necessidade do alimentando – para o que releva o custo de vida em geral; a idade dos filhos, sendo que quanto mais velha é a criança mais avultados são os encargos com a sua educação, vestuário, alimentação, vida social e atividades extracurriculares; a sua saúde; a sua situação social; o nível de vida anterior à rutura de convivência entre os pais – e a possibilidade de o alimentando proceder à sua subsistência.
A medida da contribuição de cada progenitor para a prestação alimentar «deve encontrar-se na capacidade económica de cada um para prover às necessidades do filho, sendo certo que estas necessidades sobrelevam a disponibilidade económica dos pais, no sentido de que o conteúdo da obrigação de alimentos que lhes compete cumprir não se restringe à prestação mínima e residual de dar aos filhos um pouco do que lhes sobra, mas antes no de que se lhes exige que assegurem as necessidades dos filhos menores com prioridade sobre as próprias e se esforcem em obter meios de propiciar aos filhos menores as condições económicas adequadas ao seu sadio, harmonioso e equilibrado crescimento»[38].
Vigora nesta matéria (como aliás nas demais relativas às responsabilidades parentais) o princípio de igualdade de deveres de ambos os progenitores na manutenção dos filhos (cf. artigo 36.º, n.º 3, da CRP).
Com este princípio não pretende a lei que cada progenitor contribua com metade do necessário à manutenção dos filhos, antes se visa que sobre cada um deles impenda a responsabilidade de assegurar, na medida das suas possibilidades, o que for necessário ao sustento, habitação e vestuário (alimentos naturais), bem como à instrução e educação dos menores (alimentos civis).
Aliás, como refere Maria Amália Pereira dos Santos[39], «se os menores ficarem apenas a cargo da mãe (ou do pai), a quem passaram a ser exigidos todos os cuidados, tarefas e sacrifícios com a assistência e o acompanhamento diários daqueles, sempre se justifica, por regra, que a contribuição do progenitor que não detém a guarda, seja de montante substancialmente superior à do outro».
O direito a alimentos é um direito atual, pelo que os alimentos têm que corresponder às possibilidades do obrigado e às necessidades do menor no momento em que a ponderação do seu quantitativo é efetuada.
Os alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias mensais, salvo se houver acordo ou disposição legal em contrário ou se ocorrerem motivos que justifiquem medidas de exceção (artigo 2005.º, n.º 1, do CC).
Porém, se “aquele que for obrigado aos alimentos mostrar que os não pode prestar como pensão, mas tão-somente em sua casa e companhia, assim poderão ser decretados” (n.º 2 do mesmo preceito), contanto não contrarie o decidido quanto à residência das crianças e aos convívios com o progenitor não residente.
Assim, e em regra, os alimentos deverão ser satisfeitos mediante a entrega de uma quantia pecuniária e com periodicidade mensal, só excecionalmente se admitindo uma solução diferente.
Revertendo ao caso em apreço, resulta do quadro factual apurado que a requerente é enfermeira de profissão e trabalha numa empresa de medicina no trabalho, onde aufere uma remuneração mensal líquida de € 1.230,00, que compreende já os duodécimos dos subsídios de férias e de Natal. Já o requerido trabalha como diretor-geral numa empresa de metalomecânica pertença do seu pai, auferindo a remuneração mensal líquida de € 1.800,00, catorze vezes por ano.
Ambos residem em moradias unifamiliares cedidas, gratuitamente, pelo avô paterno das crianças, proprietário dos imóveis, apenas suportando, requerente e requerido, os gastos habituais com eletricidade, água, saneamento e comunicações.
Ora, na ponderação que tem de ser efetuada, tendo por referência tudo o que anteriormente se referiu, considera-se ajustado, em termos de equidade, que o requerido comparticipe para o sustento das filhas com a quantia mensal de € 200,00 (duzentos euros), para cada filha.
Ainda que assim não fosse, conquanto a concreta situação económica do requerido progenitor possa exigir a redução de encargos, gastos, despesas e obrigações, a verdade é que tal redução terá sempre de ser encontrada em obrigação diversa da alimentícia, na medida em que esta última respeita ao que é absolutamente indispensável ao desenvolvimento das suas filhas menores.
Conforme suprarreferido, e de acordo com a jurisprudência pacífica dos nossos Tribunais Superiores, a natureza da obrigação alimentícia dos progenitores para com os filhos menores, enquanto responsabilidade parental, impõe que se considere que as necessidades dos filhos sobrelevam a disponibilidade económica dos pais. Trata-se de uma responsabilidade que impõe ao progenitor assegurar as necessidades dos filhos de forma prioritária relativamente às suas, designadamente, no que concerne àquelas que não sejam inerentes ao estritamente necessário para uma digna existência humana.
Realmente, como também anteriormente referido, o conteúdo da obrigação de alimentos a prestar pelos pais aos filhos não se restringe à prestação mínima e residual de lhes dar um pouco do que lhes sobra.
O que a lei exige aos progenitores é que assegurem as necessidades dos filhos menores com prioridade sobre as dos próprios e que se esforcem em obter meios de propiciar aos filhos menores as condições económicas adequadas ao seu crescimento sadio e equilibrado e ao seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral e social, a que todas as crianças têm direito.
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As pensões alimentares são devidas desde a data da propositura da ação (cf. artigo 2006.º do CC), deduzidas das já liquidadas em cumprimento do regime provisório.
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O modo de pagamento efetuar-se-á por transferência bancária para conta bancária titulada pela progenitora, até ao dia 8 de cada mês.
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As pensões alimentares serão atualizadas anualmente, em janeiro, de acordo com o índice de aumento de preços publicado pelo I.N.E (Instituto Nacional de Estatísticas) reportado ao ano imediatamente anterior, o que garante «uma correspondência mínima entre o valor actualizado da prestação de alimentos e o custo de vida» e «torna mais justa e proporcionada essa actualização para o obrigado a alimentos»[40].
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As despesas de saúde que não sejam comparticipadas pelo SNS ou pelo seguro de saúde das crianças, incluindo o custo deste seguro, bem como as despesas com educação e com atividades extracurriculares (v.g. explicações ou centros de estudos), com a frequência de ATL ou com atividades desportivas ou lúdicas (v.g. natação, dança, visitas de estudo), estas últimas (atividades extracurriculares, frequência de ATL e atividades desportivas ou lúdicas) desde que previamente decididas em conjunto, serão suportadas pelos progenitores na proporção de 60% para o progenitor e 40% para a progenitora.
O progenitor que suportar as despesas remeterá o documento comprovativo ao outro (com indicação do NIF da criança) até final do mês em que foi realizada, ficando o que recebeu o documento obrigado a pagar a parte que lhe compete até ao final do mês seguinte, também por transferência bancária.
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III. DECISÃO:
Pelos fundamentos acima expostos, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a apelação procedente e, em consequência, revogam a sentença recorrida e determinam o seguinte regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais:
1. Residência e exercício das responsabilidades parentais: 1.1. As crianças ficam confiados à guarda e cuidados da sua progenitora, fixando-se a residência das mesmas junto desta. 1.2. As responsabilidades parentais relativas a atos da vida corrente das crianças serão exercidas pela progenitora, sem prejuízo da intervenção do progenitor não residente (pai) durante o período de tempo em que as filhas consigo se encontrem temporariamente, intervenção esta que, contudo, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes da mãe. 1.3. As responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida das menores serão exercidas por ambos os progenitores. 1.4. Cada um dos progenitores deverá dar conhecimento ao outro de todas as circunstâncias e acontecimentos de importância relevante para a vida, educação e saúde das filhas.
2. Regime de convívios: 2.1. Quinzenalmente, as crianças passarão o fim-de-semana com o progenitor, que as recolherá na escola na sexta-feira respetiva indo a progenitora recolhê-las à escola na segunda-feira imediata. 2.2. As crianças jantarão duas vezes por semana com o progenitor, às terças e quintas-feiras, nos moldes a combinar entre os progenitores, sem prejuízo do período de descanso daquelas. 2.3. O Dia do Pai, o dia de aniversário do pai, o Dia da Mãe e o dia de aniversário da mãe serão passados pelas crianças na companhia do progenitor ao qual diz respeito o dia festivo, sem prejuízo das obrigações escolares e do período de descanso daquelas. 2.4. O aniversário das crianças será passado na companhia de ambos os progenitores, fazendo aquelas uma refeição (almoço/lanche ou jantar) com cada um, nos moldes a combinar entre ambos, sem prejuízo das atividades escolares e do período de descanso das crianças.
Em caso de desacordo, nos anos pares prevalecerá a opção do pai e, nos anos ímpares, a opção da mãe. 2.5. Nas férias escolares de verão, o progenitor poderá ter as crianças consigo durante o período de uma quinzena, em data a combinar com a progenitora até ao final do mês de maio, cabendo a recolha e entrega das menores ao pai.
Em caso de desacordo, nos anos pares prevalecerá a opção do pai e, nos anos ímpares, a opção da mãe. 2.6. A véspera de Natal e o dia de Natal, assim como a véspera de Ano Novo e o dia de Ano Novo, serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos seus progenitores, cabendo o próximo dia 24 de dezembro à mãe, o dia 25 de dezembro ao pai, o dia 31 de dezembro ao pai e o dia 1 de janeiro à mãe. 2.7. Os domingos de Páscoa serão passados pelas crianças alternadamente com cada um dos seus progenitores, cabendo o próximo à mãe, sendo a segunda-feira seguinte passada pelas crianças na companhia do outro progenitor.
3.Regime de alimentos: 3.1. A título de alimentos devidos às crianças, o progenitor pagará à progenitora, a quantia mensal de € 200,00 (duzentos euros), por cada filha, através de transferência bancária, até ao dia 8 de cada mês, por transferência para conta bancária titulada pela progenitora. 3.2. As pensões alimentares são devidas desde a data da propositura da ação, deduzidas das já liquidadas em cumprimento do regime provisório e serão atualizadas anualmente, em janeiro, de acordo com o índice de aumento de preços publicado pelo I.N.E (Instituto Nacional de Estatísticas) reportado ao ano imediatamente anterior. 3.3. O pai suportará ainda 60% das despesas de saúde das filhas que não sejam comparticipadas pelo SNS ou pelo seguro de saúde das crianças, incluindo o custo deste seguro, bem como 60% das despesas com educação e com atividades extracurriculares das filhas (v.g. explicações ou centros de estudos), com a frequência de ATL ou com atividades desportivas ou lúdicas (v.g. natação, dança, visitas de estudo), estas últimas (atividades extracurriculares, frequência de ATL e atividades desportivas ou lúdicas) desde que previamente decididas em conjunto. 3.4. O progenitor que suportar as despesas referidas nos parágrafos anteriores remeterá o documento comprovativo ao outro (com indicação do NIF da criança) até final do mês em que foi realizada, ficando o que recebeu o documento obrigado a pagar a parte que lhe compete até ao final do mês seguinte, também por transferência bancária.
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Custas a cargo do recorrido (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
Notifique e, oportunamente, comunique à Conservatória do Registo Civil (artigo 78.º do Código do Registo Civil).
Guimarães, 4 de novembro de 2025
Susana Raquel Sousa Pereira – Relatora
Fernando Manuel Barroso Cabanelas – 1º Adjunto
Gonçalo Oliveira Magalhães – 2º Adjunto
[1] Veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.03.2021 (processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1). [2] Assim, ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, reimpressão, Coimbra Editora, LIM., 1984, p. 140; ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO NORA, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2.ª edição, 1985, p. 687 e s.; JACINTO RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, III, p. 194; MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o Processo Civil, p. 221, e MANUEL TOMÉ SOARES GOMES, «Da Sentença Cível», O Novo Processo Civil, Textos e Jurisprudência, Centro de Estudos Judiciários, setembro de 2015, p. 368.
Na jurisprudência, vejam-se, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15.05.2019 (processo n.º 835/15.0T8LRA.C3.S1) e de 02.03.2021 (processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1), e desta Relação de 17.11.2004 (processo n.º 1887/04-1). [3] Obra citada, p. 140. [4] Processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1. [5]Recursos em Processo Civil, 2022, 7.ª Edição atualizada, Almedina, p. 333. [6] Assim, autor e obra citados, p. 334. [7] Processo n.º 219/10.6T2VGS.C1. No mesmo sentido, entre outros, os acórdãos desta Relação de 13.02.2014 (processo n.º 3949/12.4TBGMR.G1), de 15.12.2016 (processo n.º 86/14.0T8AMR.G1) e de 29.02.2024 (processo n.º 249/19.2T8PVL.G1), da Relação do Porto de 27.01.2022 (processo n.º 504/19.1T8PVZ.P2), de 04.05.2022 (processo n.º 40/18.3T8PVZ.P1) e de 22.04.2024 (processos n.º 4644/21.9T8MTS.P1), da Relação de Coimbra de 27.05.2014 (processo n.º 1024/12) e de 16.02.2017 (processo n.º 52/12.0TBMBR.C1), da Relação de Lisboa de 14.03.2013 (processo n.º 933/11.9TVLSB-A.L1-2) e de 26.09.2019 (processo n.º 144/15.4T8MTJ.L1-2), e do STJ de 17.05.2017 (processo n.º 4111/13.4TBBRG.G1.S1) e de 14.07.2021 (processo n.º 65/18.9T8EPS.G1.S1). [8]Código Civil, Livro IV – Direito da Família Anotado, 2024, 2ª edição, reimpressão, Almedina, pp. 857-858, nota 5. [9] Obra citada, p. 858, nota 6. [10] Como sublinha TOMÉ D´ALMEIDA RAMIÃO, Regime Geral do Processo Tutelar Cível anotado e comentado, 4.ª edição, Quid Juris, p. 114, «[o] exercício conjunto das responsabilidades parentais com residência alternada não se confunde com a chamada guarda alternada. Este conceito consiste em a criança passar alternadamente períodos de tempo com cada um dos progenitores, isto é, durante certo período de tempo, alternadamente, a criança ficar à guarda de cada um dos pais, sendo que nesse período cada um deles exerce em exclusivo o exercício das responsabilidades parentais». [11] Afirmado no artigo 7.º da Declaração dos Direitos da Criança, proclamada pela Resolução da Assembleia Geral da ONU n.º 1386 (XIV), de 20.11.1959; no artigo 3.º, n.º 1, da Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 20/90, de 12.09, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 49/90, de 12-09 e no artigo 6.º, al. a), da Convenção Europeia Sobre o Exercício dos Direitos da Criança, adotada em Estrasburgo, a 25.01.1996, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 7/2014, de 27.01 e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 3/2014, de 27.01; subjacente ao artigo 69.º da Constituição da República Portuguesa e também consagrado no artigo 4.º, al. a), da Lei de Proteção das Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º 147/99, de 1 de setembro), sendo ainda um princípio orientador da regulação do exercício das responsabilidades parentais, por força dos artigos 3.º, al. c), e 4.º do RGPTC. [12] «Interesse do menor, contributo para uma definição», Revista Infância e Juventude, n.º 1, 1985, pp. 18 e 19. [13]A Criança e a Família – Uma questão de Direitos, Coimbra Editora, 2009, p. 322. [14] «Interesse do Menor, contributo para uma definição», Revista Infância e Juventude, n.º 1, 1985, pp. 7 e ss. [15]Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio, 2022, 8.ª Edição – Reimpressão revista, aumentada e atualizada, Almedina, pp. 63. [16]Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio citada, pp. 65-66. [17] Processo n.º 3323/18.9T8VFR-A.P1. [18]Código Civil, Livro IV – Direito da Família Anotado, 2024, 2ª edição, reimpressão, Almedina, p. 928, nota 7.4. [19] Cf. HUGO CUNHA LANÇA, «A residência alternada dos filhos do divórcio: entre o paradigma e o paradoxo», https://revistas.ulusofona.pt/index.php/jurismat/article/view/8862/5268.
Vejam-se, entre outros, os acórdãos desta Relação de 02.12.2021 (processo n.º 506/21.8T8CHV-B.G1), de 13.07.2022 (processo n.º 831/17.2T8VCT-B.G1) e de 26.06.2025 (processo n.º 3761/23.5T8GMR.G1), da Relação do Porto de 21.01.2019 (processo n.º 1092/14.0T8VNG-D.P1) e de 27.01.2025 (processo n.º 3063/20.9T8VFR-D.P1), da Relação de Coimbra de 27.04.2017 (processo n.º 4147/16.3T8PBL-A.C1), de 12.06.2018 (processo n.º 261/17.6T8VIS-A.C1), de 14.12.2020 (processo n.º 360/17.4TBFIG-C.C1) e de 30.05.2023 (processo n.º 1362/18.9T8CLD-A.C1), da Relação de Lisboa de 23.06.2022 (processo n.º 25154/19.9T8LSB.L1-2), de 29.04.2025 (processo n.º 1960/19.3T8VFX-B.L1-7) e de 05.06.2025 (processo n.º 1572/21.1T8SXL.L1-8) e da Relação de Évora de 07.06.2018 (processo n.º 4505/11.0TBPTM.E1), de 23.05.2024 (processo n.º 1292/21.7T8PTM.E1) e de 30.01.2025 (processo n.º 1790/22.5T8TMR.E1). [20] Assim, MARIA CLARA SOTTOMAYOR, Código Civil, citado, p. 933. [21] Obra citada, p. 118 e acórdão da Relação de Évora de 22.03.2018 (processo n.º 297/15.1T8PTM-C.E1). [22] Veja-se o acórdão da Relação do Porto de 23.11.2023 (processo n.º 3063/20.9T8VFR-G.P1). [23] Vejam-se, entre outros, o acórdão da Relação do Porto de 27.01.2025 (processo n.º 3063/20.9T8VFR-D.P1) e o acórdão da Relação de Lisboa de 05.06.2025 anteriormente citado. [24] «Critérios para a Fixação da Residência da Criança na Regulação das Responsabilidades Parentais», Julgar Online, junho de 2024, pp. 14-15. [25] Veja-se o acórdão da Relação de Coimbra de 30.05.2023 (processo n.º 1362/18.9T8CLD-AC1). [26] Processo n.º 3850/11.9TBSTS-A.P1. [27] Processo n.º 958/17.0T8VIS-A.C1. [28] Processo n.º 2139/21.0T8MTS-B.P1. No mesmo sentido, pronunciou-se o acórdão da Relação de Lisboa de 09.06.2022 (Processo n.º 78/18.0T8SXL.L1-8). [29] Disponível no seguinte endereço eletrónico: https://app.parlamento.pt/webutils/docs/doc.pdf?path=6148523063446f764c324679626d56304c334e706447567a4c31684a53556c4d5a5763765130394e4c7a464451554e45544563765247396a6457316c626e52766331426c64476c6a595738764d5445774e7a6c6a5a5467745a6a45314e5330304d7a64684c546c6a595759744d7a426b4e5451795a54466c5a5464684c6e426b5a673d3d&fich=11079ce8-f155-437a-9caf-30d542e1ee7a.pdf&Inline=true, p. 11. [30] Processo n.º 1814/17.8T8CHV-A.G2. [31] Veja-se o acórdão desta Relação de 02.12.2021 (processo n.º 506/21.8T8CHV-B.G1). [32] Processo n.º 1110/05.3TBSCD.C2.P1. [33] Veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.10.2020 (processo n.º 9527/18.7T8LSB-C.L1.S1). [34] Assim, MARIA DE FÁTIMA ESTUDANTE MORGADO SILVA, «Reflexões sobre implicações da vacinação contra SARS CoV-2 na Jurisdição de Família e Crianças», Julgar Online, abril de 2021, p. 31; Maria Clara Sottomayor, Código Civil cit., p. 904, nota 8 e HUGO CUNHA LANÇA, A residência alternada cit., pp. 7-8. Veja-se ainda o acórdão da Relação de Lisboa de 02.05.2017 (processo n.º 897/12.1T2AMD-F.L1-1). [35] Veja-se o acórdão da Relação do Porto de 08.03.2018 (processo n.º 419/17.8T8AVR.P1). [36] Assim, MARIA CLARA SOTTOMAYOR, Código Civil citado, p. 931, nota 10. [37] Processo n.º 2148/15.8T8GDM-D.P2. [38] Assim, MARIA AMÁLIA PEREIRA DOS SANTOS, «O dever (judicial) de fixação de alimentos a menores», Julgar online – 2014, p. 18. Vejam-se ainda os acórdãos da Relação do Porto de 14.06.2010 (processo n.º 148/09.6TBPFR.P1) e de 28.09.2010 (processo n.º 3234/08.6TBVCD.P1). [39] Obra citada, p. 20. [40] Veja-se o acórdão desta Relação de 28.09.2023 (processo n.º 4828/19.0T8VNF.G1).