SERVIDÃO POR DESTINAÇÃO DE PAI DE FAMÍLIA
SEPARAÇÃO PREDIAL
SINAIS VISÍVEIS E PERMANENTES
Sumário

I – A necessidade (absoluta ou relativa) de uma servidão e da utilidade por ela proporcionada não constitui pressuposto legal da constituição de uma servidão por destinação de pai de família, pelo que a circunstância de uma fracção do prédio (entretanto separada das demais em relação ao domínio) ter acesso directo à via pública não obsta à constituição de uma servidão de passagem por destinação de pai de família.
II – A constituição de uma servidão por destinação de pai de família em caso de separação (em relação ao domínio) de dois prédios ou de duas ou mais fracções do mesmo prédio pressupõe, no entanto, a existência de sinais visíveis e permanentes que evidenciem e revelem uma relação de serventia de um dos prédios em relação a outro ou de uma fracção do prédio em relação a outra.
III – Ainda que seja sinal visível e permanente da passagem que por aí é efectuada, a existência de uma faixa de terreno bem delimitada e em terra batida apenas constitui, só por si, sinal visível e permanente de uma relação de serventia em benefício de uma outra fracção do mesmo prédio que tem acesso directo à via pública se e na medida em que essa faixa de terreno não possa ter outra explicação ou finalidade que não seja a de permitir e facultar o acesso a essa fracção.
IV – Não sendo esse o caso – na medida em que a referida faixa de terreno serve (sempre serviu) para aceder, não só ao interior da fracção onde está inserida, mas também a outra fracção do prédio que não tem outro acesso à via pública –, apenas se poderia ter como constituída (por destinação de pai de família) uma servidão de passagem a favor e em benefício da dita fracção com acesso directo à via pública e se na medida em que existissem outros sinais que evidenciassem, de forma inequívoca, que aquela faixa de terreno se destinava também a assegurar essa utilidade em benefício dessa fracção.
(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I.

A..., Lda, com sede na Rua ..., ..., ..., ...; AA, residente na Rua ..., no lugar de ..., ..., ..., e BB, residente na Rua ..., ..., no lugar de ..., ..., ..., instauraram acção declarativa, com processo comum, contra CC e marido, DD, residentes na Rua ..., ..., ..., alegando, em resumo:

- Que cada um dos Autores é proprietário de um prédio urbano melhor descrito na petição inicial, sendo a Ré proprietária de outro prédio urbano também ali identificado;

- Que, no âmbito da partilha – onde os referidos prédios foram adjudicados aos Autores BB e AA e à Ré CC – e após solicitação de um levantamento topográfico, todos os interessados procederam por acordo à colocação de marcos nos locais assinalados no referido levantamento e com vista a delimitar os aludidos prédios;

- Que, entretanto, a Ré começou a implantar um muro de delimitação do seu prédio sem respeitar as estremas que haviam sido acordadas – obra que prosseguiu apesar de embargo extrajudicial que lhe foi notificado e que veio a ser judicialmente ratificado – ocupando a totalidade dos marcos delimitadores dos prédios (fazendo coincidir a face exterior do muro com a face exterior do marco) e ocupando, dessa forma, a área pertencente aos prédios dos Autores que está identificada na petição inicial.

Com esses fundamentos, concluem pedindo que os Réus sejam condenados a:

«a) Reconhecerem que os limites exteriores dos prédios em questão é fixado pela linha reta que une o eixo de cada um dos marcos ao eixo do marco que lhe está mais próximo.

b) Destruir todas as construções por eles feitas no espaço que excede a linha reta que une o eixo de cada um dos marcos implantados, os quais se mostram devidamente sinalizados no levantamento topográfico, ocupando o terreno pertencente aos Autores.

c) Fechar todas as aberturas deixadas nos muros confinantes com os prédios dos Autores, tapando essas aberturas com respeito da linha reta entre os eixos dos marcos delimitadores dos prédios».

Em contestação, os Réus – depois de procederem a alguns esclarecimentos aos factos alegados pelos Autores – negam que o muro que construíram tenha ocupado qualquer parcela de terreno dos prédios dos Autores, tendo em conta que os marcos colocados na delimitação poente foram colocados pelos Réus no limite da sua propriedade (mas do lado de dentro) no sentido de respeitar a distância de dois metros até à parede da casa onde existia uma porta e janelas, o que foi feito por acordo de todos os interessados e até por sugestão do Autor AA.

Invocam ainda a existência de uma servidão de passagem – constituída por destinação de pai de família – que ocupa uma faixa de terreno entre o seu prédio e os prédios dos AA. AA e BB, com inicio junto à berma da E.N. ..., em direcção a Norte, com cerca de 4 metros de largura e 30 metros de comprimento, a qual se evidencia através do leito de um caminho em terra batida e pedras soltas em consequência da passagem de pessoas a pé, carros de vacas, tratores e veículos automóveis de passageiros e de mercadorias e pela qual os seus pais (anteriores proprietários dos prédios dos Autores e da Ré que, à data, era um único prédio) sempre acederam ao prédio hoje da Ré, sendo que, à data da divisão, todos os interessados concordaram que assim continuaria

Com esses fundamentos, concluem pela improcedência da acção e pedindo, em reconvenção, que os Autores sejam condenados:

«A. Reconhecerem que aos RR. assiste o direito de praticarem o acesso de ou para o seu prédio melhor identificado no Artº 21º - a) desta Contestação, a pé, de carro de bois ou de veículos automóveis de passageiros e de mercadorias, pelo caminho melhor identificado nos Artº 78º a 80º desta Contestação;

B. A absterem-se de praticar qualquer facto que possa impedir, limitar ou por qualquer outra forma restringir o direito dos RR. ao uso normal dessa servidão constituída por destinação de pai de família».

Os Autores replicaram, negando, em resumo, a existência de qualquer servidão de passagem que, além do mais, não se justificaria, tendo em conta que o prédio da Ré confronta em toda a sua largura com a Estrada Nacional.

Concluem pela improcedência do pedido reconvencional.

Foi realizada a audiência prévia no âmbito da qual: foi admitida a reconvenção, foi proferido despacho saneador, foi fixado o objecto do litígio e foram delimitados os temas da prova.

Na sequência dos demais trâmites processuais e após realização do julgamento, foi proferida sentença onde se decidiu nos seguintes termos:

“1. Julgar procedente a ação e, em consequência, condenar os Réus a:

a) Reconhecerem que os limites exteriores dos prédios em questão é fixado pela linha reta que une o eixo de cada um dos marcos ao eixo do marco que lhe está mais próximo.

b) Destruir todas as construções por eles feitas no espaço que excede a linha reta que une o eixo de cada um dos marcos implantados, os quais se mostram devidamente sinalizados no levantamnto topográfico, ocupando o terreno pertencente aos Autores.

c) Fechar todas as aberturas deixadas nos muros confinantes com os prédios dos Autores, tapando essas aberturas com respeito da linha reta entre os eixos dos marcos delimitadores dos prédios.

2. Julgar a reconvenção improcedente, absolvendo os Autores dos pedidos nela formulados pelos Réus”.

Em desacordo com essa decisão, os Réus vieram interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

(…).

Os Autores responderam ao recurso, formulando as seguintes conclusões:

(…).


/////

II.

Questões a apreciar:

Atendendo às conclusões das alegações dos Apelantes – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir:

· Saber se deve ou não ser alterada a decisão proferida em relação aos pontos de facto impugnados;

· Saber se estão ou não verificados os pressupostos legais de que depende a constituição, por destinação de pai de família, da servidão de passagem que é invocada pelos Réus/Apelantes.


/////

III.

MATÉRIA DE FACTO

(…).


**

A matéria de facto provada (consolidada) será, então, a seguinte:

1. Os AA. AA e BB e a Ré CC foram interessados, juntamente com outros, no inventário aberto por óbito de seus pais, EE e FF, que correu termos sob o n.º 969/09.... no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Instância Local de Alcobaça, Secção Cível, J1.

2. Nesse inventário, em sede de conferência de interessados, realizada em 07/01/2016: à interessada CC, foi adjudicada a verba 2 da relação de bens, com a seguinte descrição: prédio urbano, sito na E.N. ..., no lugar da ..., composto de casa de cave para arrecadação e rés-do-chão para habitação, a confrontar do Norte, Sul e Poente com herdeiros de EE e do Nascente com E.N. ..., inscrito na matriz sob o artigo ...23, (…), não descrito na Conservatória do Registo Predial ....

3. (…): ao interessado AA foi adjudicada a verba 10 da relação de bens, com a seguinte descrição: prédio urbano, sito em E.N. ..., ..., composto de arrecadação e arrumos, a confrontar do Norte com GG e BB, Nascente com BB, serventia e CC, do Sul com «A..., Lda.» e Poente com herdeiros de HH, inscrito na matriz sob o artigo ...03, (…).

4. (…): ao interessado BB foi adjudicada a verba 11 da relação de bens, com a seguinte descrição: prédio urbano, sito em ... ou ..., composto de casa para habitação, a confrontar do Norte com GG, Sul com E.N. ... e serventia, Nascente com ... e Poente com serventia e outro, inscrito na matriz sob o artigo ...04, (…).

5. Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...22, freguesia ..., o prédio urbano situado em E.N. ..., ..., com a área total de 289 m2 (sendo 120 m2 de área coberta e 169 m2 de área descoberta), composto de casa de cave para arrecadação e rés-do-chão para habitação com logradouro, a confrontar do Norte com serventia e outro, do Sul com E.N. ..., do Nascente com serventia e do Poente com «A..., Lda.», inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...23.

6. A aquisição de tal prédio mostra-se definitivamente inscrita no registo a favor de CC, por partilha da herança de EE e FF – apresentação n.º 2880 de 29/01/2018.

7. Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...94, freguesia ..., o prédio urbano situado em ... ou ..., E.N. ..., com a área total de 1685 m2 (sendo 223,30 m2 de área coberta e 1.461,70 m2 de área descoberta), composto de arrecadação e arrumos, com logradouro, a confrontar do Norte com GG e BB, do Sul com «A..., Lda.», do Nascente com BB, serventia e CC, e do Poente com herdeiros de HH, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...03.

8. A aquisição de tal prédio mostra-se definitivamente inscrita no registo a favor de AA, por partilha da herança de EE e FF – apresentação n.º 710 de 07/10/2019.

9. Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...21, freguesia ..., o prédio urbano situado em ... ou ..., com a área total de 1681 m2 (sendo 349,30 m2 de área coberta e 1.331,70 m2 de área descoberta), composto de casa de habitação de 2 pisos com logradouro, a confrontar do Norte com GG, do Sul com E.N. ... e serventia, do Nascente com ... e do Poente com serventia e outro, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...04.

10. A aquisição de tal prédio mostra-se definitivamente inscrita no registo a favor de BB, por partilha da herança de EE e FF – apresentação n.º 3046 de 29/01/2018.

11. Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...01, freguesia ..., o prédio urbano situado em ..., E.N. ..., com a área total de 160 m2 (sendo 120 m2 de área coberta e 40 m2 de área descoberta), composto de casa para habitação de rés-do-chão e sótão com logradouro, a confrontar do Norte com II, do Sul com HH, do Nascente com E.N. ... e do Poente com GG, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...70.

12. A aquisição de tal prédio, por aumento de capital por entrada em espécie de FF e JJ mostra-se definitivamente inscrita no registo a favor de «A..., LDA.» – apresentação n.º 2675 de 15/05/2012 – tendo sido anteriormente doada “verbalmente” ao referido JJ por EE e mulher FF, em 1982, e justificada a sua aquisição por usucapião por escritura de 09/11/2011.

13. Para efeitos da citada partilha, os interessados solicitaram a realização de um levantamento topográfico – junto sob os docs. 3 e 4 no proc. cautelar - no qual se mostram delimitados, com linhas a vermelho, os prédios pertencentes aos Autores e Réus, com a configuração e áreas nele indicadas, aí assinaladas sob as letras A, B e C, sendo: - Área A (2.191,00 m2) - AA (norte) e «A..., LDA.» (sul); - Área B (1.858,00 m2) - BB; - Área C (289,00 m2) - CC.

14. Antes da partilha, e para a delimitação dos prédios, todos os interessados procederam à colocação de marcos em cimento nos locais por eles acordados, assinalados no levantamento topográfico com um símbolo em forma de quadrado, cujo interior tem no seu meio uma intersecção de duas linhas rectas em forma de cruz.

15. Após a partilha, foram alteradas na matriz as confrontações dos prédios correspondentes às verbas 2, 10 e 11, e assim registadas na respectiva Conservatória do Registo Predial.

16. Uma vez que a orientação do prédio dos Réus (verba 2, Área C) é oblíqua em relação aos pontos cardeais principais, com eles formando ângulos de cerca de 45 graus, recorrendo aos pontos cardeais secundários, o prédio dos Réus confronta com os prédios dos Autores, da seguinte forma: - Do Nordeste, com BB; - Do Noroeste, com AA; - Do Sudeste, com E.N. ...; - Do Sudoeste, com «A..., Lda.».

17. Ao prédio do Autor BB (verba 11, área B) é feito o acesso a partir da E.N. ....

18. Ao prédio do Autor AA (verba 10, Área A – norte) só é possível o acesso de e para a via pública (E.N. ...) através do prédio adjudicado ao Autor BB.

19. No prédio dos Réus (verba 2), aquando do referido em 14, foram colocados 4 marcos, identificados na imagem da página 2 do relatório da verificação não judicial qualificada como M1, M2, M3 e M4: um no vértice Poente (a Oeste), dois a Norte e outro a Nascente (a Este), este no alinhamento de um ponto fixo (pilar) pré-existente, identificado como P1 naquela mesma imagem.

20. Em data anterior à instauração do procedimento cautelar apenso, os Réus colocaram areia e blocos de cimento (tijolos) no logradouro do seu prédio, fizeram escavações e começaram a implantar um muro de delimitação do seu prédio.

21. Com as construções iniciadas, os Réus ultrapassaram as delimitações do seu prédio, nos limites que por todos haviam sido definidos, ocupando espaços pertencentes aos prédios dos Autores.

22. Tal ocupação resulta por os Réus não terem implantado o muro em cima da metade do marco que lhes pertence, tendo antes implantado os blocos aplicados por cima da metade dos marcos pertencente aos confinantes, ocupando a totalidade do espaço de implantação dos marcos, fazendo coincidir a face exterior do muro com a face exterior do marco.

23. Também não respeitaram a linha reta que deve existir entre dois marcos delimitadores, implantando os blocos de cimento, a norte do seu terreno, fazendo uma curva sobre o terreno do BB, ocupando espaço que pertencia ao prédio que a este foi atribuído.

24. E ao longo do muro os Réus deixaram espaços abertos, iniciadores da sua pretensão de aceder ao seu prédio através do prédio do BB, com ele confinante.

25. Os Autores, em 15/10/2019, procederam ao embago extrajudicial das obras, notificando extrajudicialmente os Réus que as obras que estavam a realizar ficavam embargadas e que não as poderiam continuar.

26. Os Réus continuaram com as obras de construção do muro, desrespeitando o embargo.

27. Em 20/10/2019, os Autores instauraram procedimento cautelar de embargo de obra nova (ratificação judicial), solicitando a ratificação do embargo extrajudicial efectuado, a realização do respectivo auto, e a destruição de todas as construções realizadas após a realização do embargo extrajudicial.

28. Por sentença de 21/09/2020, transitada em julgado, proferida nos autos de procedimento cautelar apensos, foi ratificado o embargo extrajudicial efectuado pelos Autores.

29. A ocupação dos prédios dos Autores consistiu no seguinte: a) Em relação à «A..., LDA.»: - Ocupou a metade, pertencente a esta autora, do marco divisório (12cm X 12cm) que fixa a estrema poente do prédio dos réus com a estrema nascente do prédio da autora, em toda a sua extensão até à E.N. ..., que será de aproximadamente 22,00 metros lineares. b) Em relação a AA: - Ocupou a área da metade dos marcos, pertencente ao autor, em toda a distância entre os dois marcos delimitadores da estrema poente do prédio dos réus com a estrema nascente do prédio do autor, na distância de 11,50 metros lineares. c) Em relação a BB: - Ocupou a área da metade dos marcos delimitadores, pertencente ao autor, situados na parte poente e norte do prédio dos réus e, entre os dois marcos, começou a implantar o muro em redondo (e não em linha reta e a partir do meio do marco), colocando os blocos totalmente em cima do prédio do autor. - Entre os dois marcos delimitadores da estrema norte/nascente do seu prédio, os réus ocuparam a área correspondente à metade dos marcos pertencente ao autor, numa distância de 9,00 metros lineares. - Entre esses dois marcos da estrema norte/nascente do seu prédio, os réus deixaram uma abertura sem colocar blocos, indiciadora da pretensão de abrir uma porta onerando o prédio do autor com a sua passagem. - Entre o marco colocado na estrema norte/nascente mais próximo da Estrada Nacional e o pilar pré-existente da parede junto à Estrada Nacional, os réus não fizeram o muro em linha recta, antes ocupando o terreno do autor em toda a extensão, com cerca de 5,00 metros lineares, derivando no final para junto do seu pilar, mas ainda assim, para além deste e em cima do terreno pertencente ao autor.

30. Os prédios descritos em 5, 7, 9 e 11, resultam da divisão de um terreno que antes era pertença de EE e mulher, primeiro pela doação verbal de uma parcela ao filho JJ, onde este veio a realizar uma construção que posteriormente legalizou e mais tarde transferiu para a Autora A..., Lda. (Área A, sul).

31. Da parte remanescente, na sequência do inventário por óbito de EE e mulher, os interessados na herança procederam à sua divisão, constituindo os prédios que foram adjudicados aos Autores AA e BB e à Ré CC, no modo referido em 2, 3 e 4.

32. O prédio original compunha-se de construções, designadamente uma casa na parte adjudicada ao Autor BB, onde o falecido casal habitava antes de ter construído a casa descrita na verba 2 (agora da Ré CC) em 1980, uma adega e outras construções, onde guardavam os seus equipamentos agrícolas e haveres, e maioritariamente por parte não construída, onde cultivavam e criavam animais (na parte adjudicada ao A. AA).

33. O prédio que actualmente pertence à Ré CC, na parte da frente, onde tem a entrada e a cave destinada a arrecadações ou garagem, confina, em toda a sua largura, com a E.N. ... e encontra-se ao mesmo nível desta.

34. A parte traseira do prédio da Ré CC, tal como os prédios pertencentes aos Autores, encontram-se a uma cota mais elevada;

35. O EE, a partir da E.N. ..., acedia às construções existentes e ao terreno situado no lado oposto à E.N. ... e nas traseiras do prédio pertença da Ré CC, através das partes não construídas do seu prédio.

36. Fruto dessa passagem, a pé, de tractor, e de veículos automóveis de passageiros e de mercadorias, há mais de 40 anos, efectuada pelo EE para aceder à casa que actualmente pertence ao BB e às construções que integram o prédio do AA, existe uma faixa de terreno em terra batida, pedras soltas e ervas, com cerca de 4 metros de largura e 30 metros de comprimento, agora ocupada, à volta do prédio dos Réus, pelo muro por eles construído, com início na berma da E.N. ..., em direcção a Norte, fletindo para a esquerda na esquina que dá para a traseira da casa “nova” pertença da Ré CC, que desemboca junto à edificação da garagem do prédio do AA e ao início do prédio da A. A..., Lda..

37. Era por essa faixa de terreno que quer a Ré CC, enquanto viveu com os pais na casa “nova” correspondente à verba 2 até há cerca de mais de 30 anos trás, quer o seu irmão GG até cerca de alguns anos após aquela deixar de lá viver, acediam à parte traseira da casa, por umas escadas junto à porta da parede que tem entrada directa para a cozinha nela existente, bem como a CC após lhe ser adjudicada, para descarregar e carregar mercadorias do e para o interior da casa.

38. Era também por essa faixa de terreno, correspondente à parte não construída do terreno que era pertença dos pais dos Autores BB, AA, CC/ avô do legal representante da A..., Lda. que estes acediam, após a respectiva construção, àquela parte da casa “nova”, onde apenas pernoitavam, fazendo a sua vida na casa “velha”, agora pertença do A. BB.


*

Não resultaram provados os seguintes factos:

a) Aquando do referido em 19, na sequência do acordo referido em 14, os Réus colocaram os marcos delimitadores do seu prédio para aquém do seu interior (lado de dentro), conforme acordado entre todos e de modo a respeitar a distância de 2 metros da parede da casa (do lado poente);

b) A parte do muro arredondada não ocupa o terreno do prédio do BB;

c) Aquando da divisão dos prédios e colocação de marcos delimitadores, todos os interessados concordaram que a serventia continuaria a servir todos os prédios.

d) O marco 1 está indevidamente colocado a 1,92 metros da parede do lado poente do prédio dos Réus (e não a 2 metros como o marco 2), por erro de medição de todos os interessados na altura da sua colocação e/ou por a sua localização ter sido alterada pelos AA. em detrimento do prédio dos Réus.


/////

 IV.

DIREITO

Entrando na apreciação jurídica, importa referir, antes de mais, que o objecto do presente recurso está limitado – conforme resulta, aliás, da parte final da conclusão 16.ª das alegações – ao segmento da decisão que julgou improcedente o pedido reconvencional e ao segmento da decisão que condenou os Réus/Apelantes a fechar todas as aberturas deixadas nos muros confinantes com os prédios dos Autores. Está em causa, portanto, o segmento da decisão que se relaciona com a servidão de passagem que os Réus pretendem ver reconhecida a favor do seu prédio e que alegam ter sido constituída por destinação de pai de família.

A sentença recorrida não reconheceu a existência dessa servidão – razão pela qual julgou improcedente a reconvenção e condenou os Réus/Apelantes a tapar as aberturas que deixaram no muro –, argumentando, no essencial:

- Que não existem vestígios – ou seja, sinais visíveis e permanentes – de qualquer serventia/caminho em benefício do prédio da Ré, sendo certo que os vestígios existentes (a faixa de terreno) apenas evidenciam o acesso à casa que pertence ao Autor BB e às construções que no presente integram o prédio do Autor e não ao prédio dos Réus;

- Que a servidão por destinação de pai de família aplica-se apenas para preservar uma situação de facto pré-existente que beneficie algum prédio, o que, no caso, como já referido, não sucede;

- Que os Réus não têm necessidade de qualquer passagem do lado exterior do muro, porque têm acesso direto à via pública, não resultando dos autos, nem sendo alegado, que não têm acesso pelo interior do muro à parte traseira da sua casa, aludindo-se, a propósito, ao princípio da necessidade da servidão, também consignado no art.º 1550º C Civil;

- Que, não precisando de passar pela dita faixa de terreno para aceder ao seu prédio, o facto de os Réus pretenderem com esta acção o reconhecimento dessa servidão apenas para prejudicar os seus irmãos ou satisfazer uma comodidade, não pode deixar de configurar manifesto abuso de direito (cfr. art.º 334.º CC).

Em desacordo com a decisão, sustentam os Apelantes:

- Tendo em conta a matéria de facto provada, foi efectivamente constituída, por destinação de pai de família, uma servidão de passagem em favor do seu prédio;

- Que tal servidão não pode extinguir-se por desnecessidade, salvo quando o próprio pai de família ainda em vida dela dispusesse de forma diferente por forma a poder concluir-se pela sua inexistência, o que na situação em apreço de modo algum se verifica;

- Que, além do mais, a extinção da servidão por desnecessidade ou abuso de direito não poderia ter sido decretada pelo Tribunal uma vez que os Autores não formularam qualquer pedido nesse sentido;

- Que, também não existe qualquer abuso de direito, na medida em que a R. CC não pretende, por qualquer forma, prejudicar os AA., ou satisfazer uma mera comodidade no uso dessa servidão.

Em face dessa argumentação – utilizada pela sentença recorrida e pelos Apelantes – caberá dizer, em primeiro lugar, que são desajustadas as questões colocadas pelos Apelantes a propósito da extinção da servidão por desnecessidade (mais concretamente, a questão de saber se tal servidão poderia extinguir-se por desnecessidade e a questão de saber se, por não ter sido pedida, tal extinção podia ser decretada pelo Tribunal). E tais questões são desajustadas porque a sentença recorrida não julgou extinta a servidão (fosse por desnecessidade ou por qualquer outra razão); o que se considerou na sentença recorrida – e conduziu à improcedência da pretensão dos Apelantes – é que tal servidão (que era alegada e invocada pelos Réus/Apelantes) não se havia constituído. Quando a sentença alude ao princípio da necessidade no âmbito das servidões prediais e ao facto de a servidão em causa ser desnecessária à normal fruição do prédio dos Réus, fê-lo apenas – bem ou mal – com o propósito de concluir que ela não se havia constituído por destinação de pai de família e não com o propósito de concluir pela sua extinção por desnecessidade.

Assim sendo, o que releva saber – é essa a questão relevante a apreciar no recurso – é se foi (ou não) constituída, por destinação de pai de família, a servidão de passagem que é invocada pelos Apelantes. É esse – e sempre foi – o objecto dos autos e foi essa questão que foi apreciada pela sentença recorrida onde, não obstante a alusão feita à sua desnecessidade, se considerou que ela não havia sido constituída e, portanto, não existia.

Analisemos, então, essa questão.

Relativamente à constituição de servidões por destinação de pai de família, o art.º 1549.º do CC dispõe nos seguintes termos:

Se em dois prédios do mesmo dono, ou em duas fracções de um só prédio, houver sinal ou sinais visíveis e permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para com outro, serão esses sinais havidos como prova da servidão quando, em relação ao domínio, os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio, vierem a separar-se, salvo se ao tempo da separação outra coisa se houver declarado no respectivo documento”.

Em face do disposto na norma citada, é fácil constatar que os pressupostos necessários à constituição de uma servidão por destinação de pai de família são os seguintes:

i. A existência de dois prédios pertencentes ao mesmo proprietário ou de duas fracções do mesmo prédio;

ii. A existência de sinais visíveis e permanentes que revelem serventia de um prédio para outro prédio (pertencente ao mesmo dono) ou de uma fracção de um prédio para outra fracção do mesmo prédio;

iii. A posterior separação (em relação ao domínio) dos dois prédios ou das duas fracções do mesmo prédio (passando, portanto, cada um dos prédios ou fracções a pertencer a donos/proprietários diferentes);

iv. A inexistência de qualquer declaração no documento que titule a separação do domínio dos prédios ou fracções no sentido de afastar ou excluir a existência de servidão.

Significa isso, portanto, e desde logo, que a efectiva e real necessidade da servidão não é pressuposto da sua constituição e da sua existência e, como tal, é totalmente irrelevante – para efeitos de reconhecimento da servidão em causa nos autos (constituída por destinação do pai de família) – que os Réus tenham acesso directo ao seu prédio a partir da via pública.  

Importa referir, aliás, que, em conformidade com o disposto no art.º 1569.º do CC, tem vindo a ser entendido, de forma claramente maioritária, que as servidões constituídas por destinação de pai de família (ao contrário do que acontece com as servidões legais e com as servidões constituídas por usucapião) nem sequer se podem extinguir por desnecessidade[1], correspondendo a servidões que têm na base um facto voluntário e que, como tal, podem ser constituídas mesmo que não se mostrem estritamente necessárias sem que possam ser extintas por desnecessidade[2].

A efectiva necessidade (seja ela absoluta ou relativa) da servidão não corresponde, portanto, a um pressuposto exigível para a constituição de uma servidão por destinação de pai de família.

Isso não significa, no entanto, que não tenha que proporcionar alguma utilidade ou proveito ao prédio dominante sob pena de não se poder, sequer, falar de uma servidão predial, tendo em conta que esta pressupõe sempre (cfr. art.º 1544.º do CC) a possibilidade de fruição de concretas utilidades, ainda que futuras ou eventuais, susceptíveis de ser gozadas por intermédio do prédio serviente e em benefício ou proveito do prédio dominante.

No caso, pensamos ser claro e evidente – em face da matéria de facto provada – que a pretensa servidão é susceptível de proporcionar determinada utilidade ao prédio dos Réus, na medida em que permitiria aceder directamente à traseira do prédio, sendo irrelevante saber se ela é efectivamente necessária em virtude de essa utilidade não poder ser proporcionada através do acesso directo do prédio à via pública por não ser possível – ou por ser bem mais difícil (designadamente por implicar a subida de uma escadaria com muitos degraus) – aceder a esse local a partir desse acesso directo à via pública, já que, conforme referimos, a constituição de uma servidão por destinação de pai de família não exige a efectiva e real necessidade da servidão, ou seja, não exige que a utilidade por ela proporcionada não possa ser alcançada e usufruída de outro modo e sem necessidade de onerar outro prédio.

Assim e para efeitos de constituição da referida servidão, é irrelevante que os Réus não tenham real necessidade de passar pela referida faixa de terreno, por terem acesso directo à via pública. Tal circunstância não obsta – conforme se referiu – à constituição e subsequente reconhecimento da servidão e tão pouco era susceptível de conduzir à sua extinção por desnecessidade.

Dito isto e passando a analisar os efectivos pressupostos legais da constituição de uma servidão por destinação de pai de família (acima enunciados), temos como inquestionável a verificação daqueles que se enunciaram sob as alíneas i., iii. e iv., uma vez que estamos perante prédios que correspondem a fracções daquele que, outrora, foi um único prédio pertencente ao mesmo proprietário e que, em resultado da divisão deste prédio, se separaram, passando a pertencer a proprietários diferentes, sem que, aquando dessa divisão/separação, tivesse existido qualquer declaração no sentido de afastar ou excluir a existência de servidão.

Mas, como se disse, para que se possa ter como constituída uma servidão por destinação de pai de família é ainda necessário que existam sinais visíveis e permanentes que revelem a serventia de uma fracção do prédio para outra fracção e é esse pressuposto que, no caso, não podemos ter como verificado.

 A constituição da servidão por destinação do pai de família encontra o seu fundamento numa situação criada entre os dois prédios – ou duas fracções do mesmo prédio –, durante o período de tempo em que eles pertenceram ao mesmo dono[3], por via da qual um dos prédios ou fracções era utilizado em proveito do outro prédio ou fracção, mediante a prestação de determinada utilidade, seja ela de passagem, de aqueduto, de vistas, ou outra. E é essa afectação e utilização, com carácter de estabilidade, que terá que ser revelada por sinais aí existentes que sejam visíveis e permanentes. Conforme referem Pires de Lima e Antunes Varela[4], estão em causa sinais que “... hão-de revelar a serventia de um prédio para o outro…” e que “… hão-de ter sido postos ou deixados com a intenção de assegurar certa utilidade a um, à custa ou por intermédio do outro”. É necessário que esses sinais sejam visíveis, ou seja, que estejam à vista de modo a poderem ser percepcionados pelo observador (assim se garantindo que esses sinais não são clandestinos) e é necessário que eles sejam permanentes, evidenciando uma situação de estabilidade (de forma a deixar claro que não se trata de um sinal colocado a título precário, mas sim de um encargo preciso, de carácter estável ou duradouro)[5].

No caso dos autos, é certa a existência de uma faixa de terreno em terra batida, pedras soltas e ervas, com cerca de 4 metros de largura e 30 metros de comprimento, com início na berma da E.N. ..., em direcção a Norte, flectindo para a esquerda na esquina que dá para a traseira da casa “nova” pertença da Ré CC, que desemboca junto à edificação da garagem do prédio do AA e ao início do prédio da A. A..., Ld.ª (cfr. ponto 36 da matéria de facto). E é indiscutível que essa faixa de terreno corresponde a um sinal visível e permanente de uma passagem por ali exercida, a pé e com veículos, de modo estável e duradouro.

Todavia, sabendo-se que essa faixa de terreno – situada na fracção (hoje prédio autónomo) pertencente ao Autor BB – serve (como sempre serviu) para aceder, a partir da EN, à casa do Autor BB que fica mais recuada e serve (como sempre serviu) para aceder à fracção (hoje prédio autónomo) do Autor AA que, conforme resulta do ponto 18 da matéria de facto, não tem outro acesso a partir da EN, a verdade é que não existem quaisquer sinais visíveis e permanentes de que tal passagem também se destinasse a assegurar a passagem à fracção (hoje prédio autónomo) da Ré a partir da EN.

É certo que – conforme resultou provado – o pai dos Autores e da Ré usava essa faixa de terreno para aceder à globalidade do prédio, mas usava essa faixa de terreno como poderia usar qualquer outra, já que, sendo proprietário de todo o prédio, usava-o e circulava – naturalmente – por todo ele conforme melhor lhe conviesse.

O uso assim efectuado pelo anterior proprietário não é, só por si, relevante para o efeito de determinar a constituição de uma servidão por destinação de pai de família. Para que tal aconteça é necessário – conforme se referiu – que tenham sido colocados ou deixados sinais visíveis e permanentes da afectação, com carácter de estabilidade, de determinado local à passagem (no caso é essa a utilidade ou proveito que está em causa) em benefício ou proveito de determinadas e concretas fracções do prédio que, entretanto, se venham a separar e autonomizar em relação ao domínio.

Ora, se é certo que uma faixa de terreno bem delimitada – como a que está em causa nos autos – corresponde a sinal visível e permanente de uma servidão de passagem (constituída por destinação de pai de família) a favor de fracção do prédio (entretanto autonomizada em relação ao domínio) à qual sempre se acedeu por essa faixa e que não tenha outro acesso à via pública (como acontece com a fracção que agora pertence ao Autor AA), tal já não acontece em relação a outra fracção do mesmo prédio que tenha acesso directo à via pública (como acontece com a fracção que agora corresponde ao prédio da Ré, que confina, em toda a sua largura, com a Estrada Nacional), uma vez que, não obstante o facto de tal passagem também ser utilizada pelo anterior proprietário (que usava a integralidade do prédio de forma indistinta), ela não constitui, só por si, qualquer evidência inequívoca de assegurar essa utilidade ao referido prédio.

Esclareça-se que o que acabamos de dizer nada tem a ver com o facto de essa utilidade ser ou não necessária (em termos absolutos ou relativos) à normal fruição do prédio, uma vez que, conforme dissemos, essa necessidade não é pressuposto da constituição da servidão por destinação do pai de família, mas sim com o facto de os sinais existentes (a aludida faixa de terreno) não serem, só por si, reveladores da serventia em benefício desse prédio em concreto.

Com efeito, ainda que não fosse necessária – em virtude de o prédio ter acesso directo à via pública – a servidão considerar-se-ia constituída se, por exemplo, a fracção hoje pertencente à Ré estivesse delimitada daquela faixa por um muro onde existissem aberturas para a referida faixa de terreno – caso em que essas aberturas evidenciavam a afectação da passagem à entrada no prédio através dessas aberturas – ou se existisse qualquer outra obra ou sinal que evidenciasse essa afectação e que deixasse claro que a faixa de terreno em questão havia sido colocada e deixada, não só em benefício das outras fracções do prédio, mas também daquela que hoje pertence à Ré.

A verdade é que não resultou provado qualquer sinal visível e permanente nesse sentido.

Com efeito, se é certo que os Réus construíram um muro a delimitar o seu prédio da referida faixa de terreno onde deixaram aberturas para a dita faixa, não resultou provado – nem sequer foi alegado – que, antes disso, também existisse algum muro com aberturas que evidenciassem a utilização da faixa de terreno para nelas entrar. Nem sequer resultou provado – também não foi alegado – que a casa da Ré tivesse qualquer porta que deitasse directamente para aquela faixa de terreno em termos que evidenciassem que o uso da porta implicava necessariamente o uso da faixa de terreno em questão para lhe aceder (as fotografias juntas aos autos demonstram, aliás, que a casa da Ré não confina directamente com aquela faixa de terreno, existindo ainda de permeio um espaço de terreno através do qual é possível aceder à frente da casa e daí à via pública, nos termos que resultam do ponto 33 da matéria de facto) e também não resultou provada – nem foi alegada – a existência de qualquer outra obra que evidencie, de forma inequívoca, a afectação daquela utilidade (passagem) à fracção que agora corresponde ao prédio da Ré.

Na verdade, o único sinal visível e permanente de uma serventia corresponde, conforme mencionado, à referida faixa de terreno. Mas, para que esse sinal constituísse, só por si, sinal revelador de uma serventia em benefício do prédio da Ré era necessário que ele não tivesse outra explicação ou finalidade; não sendo esse o caso – como, de facto não é, tendo em conta que a referida faixa de terreno serve (sempre serviu) para aceder à parte interior da fracção do prédio que hoje pertence ao Autor BB e para aceder à fracção do prédio que hoje pertence ao Autor AA – era necessário que existissem outros sinais que evidenciassem, de forma inequívoca, que aquela faixa de terreno se destinava também a assegurar essa utilidade em benefício da fracção que hoje corresponde ao prédio da Ré e, conforme referimos, tais sinais não existem.

Em consequência, não poderá ser reconhecida a constituição da aludida servidão em benefício do prédio da Ré.

Em razão do exposto, improcede o recurso e confirma-se a decisão recorrida.


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SUMÁRIO (elaborado em obediência ao disposto no art. 663º, nº 7 do Código de Processo Civil, na sua actual redacção):

(…).


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V.
Pelo exposto, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
Custas a cargo dos Apelantes.
Notifique.

                              Coimbra,

                                             (Maria Catarina Gonçalves)

                                             (Anabela Marques Ferreira)

                                                   (Paulo Correia) 


[1] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2.ª edição revista e actualizada, págs. 676 e 677 e Rui Pinto e Cláudia Trindade, Código Civil Anotado, Coord. Ana Prata, Vol. II, 2017, pág. 418, podendo ver-se na jurisprudência, designadamente, os Acórdãos do STJ de 10/04/2018 (processo n.º 3546/15.2T8LOU.P1.S1), de 14.05.2009 (processo n.º 09A0661), de 20.05.2010 (processo n.º 1671/05.7TBVCT.G1.S1) e de 31.01.2012 (277/05.5TBBCL.G1.S1). Essa posição, apesar de maioritária, não é, apesar de tudo, consensual na nossa jurisprudência, como se pode ver pelos Acórdãos da Relação de Coimbra de 25/02/2025 (processo n.º 135/19.6T8TND.C1) e de 13.11.2012 (processo n.º 472/10.5TBTND.C1), todos disponíveis em https://www.dgsi.pt.

[2]   Refira-se que já foi suscitada a inconstitucionalidade dessa norma, pretensão que foi negada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 484/2010 de 09/10/2010 (proferido no processo n.º 535/10), disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt.
[3] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, 2.ª edição revista e actualizada (Reimpressão), pág. 632.
[4] Ob. cit., pág. 634.
[5] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 630.