DIVÓRCIO SEM O CONSENTIMENTO DO OUTRO CÔNJUGE
DEVER DE FIDELIDADE
SEPARAÇÃO DE FACTO
ABUSO DO DIREITO
DIREITO A ALIMENTOS
Sumário

I - A recusa de um dos cônjuges em manter relações sexuais não exime o outro cônjuge do dever de fidelidade.
II - No modelo de divórcio rutura ou constatação, a lei pretende evitar que, independentemente da violação de deveres conjugais, qualquer um dos cônjuges permaneça casado contra a sua vontade.
III - A separação de facto (causa objetiva do divórcio) verifica-se quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges.
IV - Esta separação de facto é compaginável com a co-habitação sob o mesmo teto, que pode ocorrer por motivos de natureza prática e económica, em nada contrariando a efetiva rutura do casal e a verdade afetiva do mesmo.
V - A circunstância de a A. ter deixado decorrer vários anos sem propor ação de divórcio, não lhe retira, a possibilidade de o vir fazer, já que o decurso do tempo, por si só, não integra abuso do direito, podendo o titular do direito ao divórcio exercê-lo no momento que, para si, é o adequado.
VI - Em caso de divórcio cada um dos ex-cônjuges deve prover à sua subsistência e apenas se a um deles tal não for possível assiste ao outro o direito a receber alimentos do ex-cônjuge que os possa prestar.

Texto Integral

Processo: 2625/23.7T8GDM.P1

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Sumário
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Relatora: Teresa Maria Fonseca
1.º adjunto: Carlos Gil
2.º adjunto: José Eusébio Almeida

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório
AA intentou a presente ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra BB, peticionando que se decrete o divórcio, dissolvendo-se o casamento celebrado entre ambos.
Citado o R., procedeu-se a tentativa de conciliação das partes, que se frustrou.
O R. contestou, impugnando o alegado e concluindo no sentido de não ser decretado o divórcio. Deduziu pedido reconvencional de alimentos cujo montante veio a quantificar e a ampliar em articulado superveniente.
A A. contestou, quer a reconvenção, quer a ampliação.
Dispensada a audiência prévia, proferiu-se despacho saneador, com indicação dos temas sobre os quais deveria incidir prova.
Houve lugar a julgamento, na sequência do qual foi proferida sentença que decretou o divórcio, dissolvendo o casamento celebrado entre A. e R. no dia 17 de agosto de 1991, fixou a data da separação de facto entre o casal em 31 de março de 2023 e condenou a A. reconvinda no pagamento de uma pensão de alimentos ao R. reconvinte no valor de € 250,00 mensais, a pagar em mensalidades iguais e sucessivas, a depositar em conta bancária do réu até ao dia 15 de cada mês, quantia que deverá ser atualizada de acordo com a taxa de inflação em janeiro de cada ano.
Foi proferido despacho a retificar o valor de € 200, 00 indicado na fundamentação jurídica para a quantia de € 250,00, referida na condenação.
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Inconformado, o R. interpôs o presente recurso que terminou da forma que se segue.
(…)
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A A. contra-alegou, finalizando como seguidamente se reproduz.
(…)
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A A. interpôs recurso, rematando como se segue.
A. Vem o presente recurso interposto da, aliás, douta sentença, a qual, no que ao pedido reconvencional diz respeito, decidiu condenar a Autora/Reconvinda (e não “reconvinte”, como por manifesto lapso refere a parte dispositiva/decisória da sentença) “no pagamento de uma pensão de alimentos ao réu/reconvinte no valor de € 250,00 mensais que será paga em mensalidades iguais e sucessivas, depositadas em conta bancária do réu até ao dia 15 de cada mês, quantia que deverá ser atualizada de acordo com a taxa de inflação em janeiro de cada ano”.
B. E vem interposto não apenas das questões de direito, isto é, invocando nulidades da sentença e, bem assim, do sentido da aplicação do direito ao caso sub judice, mas impugnando igualmente a decisão proferida relativamente à matéria de facto.
C. Entende a Apelante que a sentença agora em recurso é nula, uma vez que os fundamentos estão em oposição com a decisão e ocorre uma ambiguidade ou obscuridade que torna a decisão ininteligível.
D. Isto porque, quanto à reconvenção, sob a alínea B), em sede de fundamentação a fls. 58/62, é mencionado na sentença o seguinte: “Assim, mesmo que em tal não se conceda, a apreciação crítica da factualidade e apesar da natureza excecional do direito a alimentos entre ex-cônjuges, mas que aqui julgamos ser tendencialmente temporária, em razão da idade do réu/reconvinte, leva-nos a concluir que se verifica a necessidade elegível para a sua atribuição, de acordo com o disposto no artigo 2016º, nº2, e 2016º A do Código Civil, no montante que se fixa em € 200,00 mensais.”.
E. Não obstante ter sido fixada a pensão de alimentos em € 200,00, no ponto “V. Dispositivo:”, alínea c), de fls. 61/62 da sentença condena a Reconvinda no pagamento de uma pensão mensal de € 250,00.
F. Por este motivo, a sentença está ferida de uma nulidade, que aqui se suscita em conformidade com o disposto no art.º 615º, nºs 1, al. c) e nº 4, do C.P.C..
G. A Recorrente considera incorretamente julgados os seguintes pontos de facto considerados como assentes:
55) O réu auferiu em 2023 cerca de € 4.210,00 Euros, pelo que apenas auferiu o valor mensal de 351 Euros e em 2024 o montante de €1.800,00 (cfr. documento da AT de fls., 365 dos autos).
56) Com este valor mensal auferido em 2023 teria que fazer face às despesas mensais de alimentação no montante de €300, transportes de €60 e de vestuário no montante de €20, que totalizam €380 mensais.
57) A autora e réu contam com as seguintes despesas:
- €586,75 crédito de habitação da casa de morada de família;
- €60,00 de água;
- €130,00 de eletricidade e gás;
- €67,00 de Nos, tv, internet e telefone - inclui 2 telemóveis;
- €75,00 de condomínio;
- €132,96 seguro associado ao crédito da habitação
- €50,00 despesas médicas e medicamentosas;
- €100,00 de gasolina;
- €300,00 de alimentação - cfr., documentos de fls., 383 dos autos e fls.,
59) Por seu turno, o réu tem despesas mensais próprias de alimentação no montante de €300,00, de transportes de € 60,00, de vestuário de € 20,00 e ainda de saúde de €100,00, que totalizam o montante mensal de€ 480,00,a que acresce o valor de € 200,00 a título de prestação de alimentos à sua filha CC – cfr., documento de fls., 372 e 373 dos autos.
60) O réu necessita de tratamento dentário, pois tem pouca dentição e alguns focos de infeção gengival.
64) Durante o ano de 2023, o réu pouco ou nenhum dinheiro entregou à Autora, nomeadamente o dinheiro necessário para amortização do crédito obtido com a compra da casa, água, eletricidade, gás, pacote de televisão/net/telefone, tendo unicamente liquidado a despesa do condomínio, sendo frequente o réu pedir dinheiro à autora para comprar cigarros.
65) O réu realizava trabalhos não faturados e declarados, e, pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
66) Para além dos valores referidos em 62., de igual modo, a autora auferiu e aufere outros rendimentos não contabilizados.
H. Identificação dos meios de prova que impõem decisão de facto divergente da proferida pela Mmª Juiz a quo:
● Extratos do Banco 1..., SA, juntos a 10/06/2024 (já anteriormente enviados para os autos, mas nesta data numerados), como docs. 18º a 29º (ref.: 49156203, 49156213, 49156226 e 49156237).
● Primitiva contestação do Recorrido, enviada para os autos a 19-01-2024 (ref.: 47706599).
● ampliação do pedido reconvencional deduzida pelo Réu/Recorrido, a 16/05/2024 (ref.: 48922362).
● Requerimento enviado para os autos pela A. a 27-05-2024 (ref.: Citius 49031214), com relevância para o presente recurso, o mencionado nos pontos 67º e seguintes, em particular o alegado nos pontos 88º a 95º, desse requerimento.
● Requerimento da Autora/Reconvinda/Apelante, enviado para os autos a 15/06/2024 (ref.: 49208373) e o Doc. 1º desse requerimento, referente a cópia do requerimento mencionado na alínea anterior, agora com as referências aos documentos numerados, com as partes alteradas sublinhadas a amarelo, para mais fácil perceção e localização pelo Tribunal.
● Réplica (ref.: 48404196) 25-03-2024, que nos pontos 10º a 13º, remete e dá por reproduzido o requerimento apresentado nestes autos a 31-01-2024 (ref.: Citius 47827246) – em particular, neste requerimento, o alegado nos pontos 62º a 75º deste requerimento e docs. 1º a 5º aí juntos.
● Requerimento da Autora/Apelante, remetido a 09-02-2024 (ref.: 47929534) e documentos juntos com o mesmo.
● Requerimento enviado pelo Réu/Recorrido a 07-02-2025 e 6 documentos juntos ao mesmo.
● E-mail do Serviço de finanças Gondomar 2, datado de 24/01/2025 e notificado ao aqui signatário nessa mesma data (ref.: 468079422).
● Declarações de parte, prestadas a 27/11/2024, pelo Réu, BB, ficheiro de suporte áudio, Diligencia_2625-23.7T8GDM_2024-11-27_14-56-31, com tempo áudio de 01:36:59.
● Declarações de parte, prestadas a 21/01/2025, pela Autora, AA, ficheiro de suporte áudio, Diligencia_2625-23.7T8GDM_2025-01-21_10-39-34, com tempo áudio de 01:11:07
● Prova testemunhal gravada em sede de audiência de julgamento:
● depoimento da testemunha DD, prestado a 21/01/2025, ficheiro de suporte áudio, Diligencia_2625-23.7T8GDM_2025-01-21_14-25-07, com tempo áudio de 00:58:37.
● depoimento da testemunha EE, prestado a 21/01/2025, ficheiro de suporte áudio, Diligencia_2625-23.7T8GDM_2025-01-21_15-25-04, com tempo áudio de 00:31:41.
PONTOS DE FACTO QUE SE PRETENDE ALTERAR, COM RECURSO AOS REFERIDOS MEIOS DE PROVA:
I. Factos provados mencionados nos pontos 55º, 65º e 66º supra, que devem ser apreciados conjuntamente, uma vez que se trata de matéria de facto que está relacionada.
J. Entende a Apelante que o ponto 55º dos factos assentes deve ter a seguinte redação, uma vez que se refere a rendimentos declarados e não aos efetivamente auferidos: “Os rendimentos declarados do Réu no ano de 2023 foram € 4.210,00 e no ano de 2024 no valor de € 1.800,00”.
K. Quanto aos pontos 65º e 66º dos factos considerados como provados.
L. Ora, em primeiro lugar, em termos de fundamentação, aquilo que o Tribunal a quo conclui é grave, ofensivo e difamatório para duas classes profissionais, a dos Solicitadores e a dos Topógrafos, quando refere, generalizando, que a informalidade muitas vezes associada ao exercício de certas atividades torna a prova difícil, designadamente, quanto à prova dos rendimentos, afirmando, perigosamente generalizando, uma vez mais, “aliás, quer a profissão da autora como solicitadora, quer a profissão do réu como topógrafo ambos prestadores de serviços são propícios à não declaração dos rendimentos”?...
M. Em segundo lugar, a mesma sentença que condena a Reconvinda/Recorrente no pagamento de alimentos ao Reconvinte/Recorrido, refere algo admirável, quando diz “não temos dúvidas em afirmar que, se é verdade que não se apurou, de forma inequívoca, os reais rendimentos de ambas as partes”???
N. Então, como é possível condenar alguém no pagamento de alimentos, sem considerar provada, de forma inequívoca, quais os rendimentos de cada uma das partes, isto é, sem conseguir provar, de forma inequívoca, a necessidade de quem os pede e a possibilidade de os pagar, de quem é condenada a pagar???
O. Para justificar a decisão aqui em crise, a sentença defende-se da seguinte forma: “por existirem fortes indícios de que os mesmos o fazem sem faturação, e consideramos tal factualidade como provada, não pelas declarações prestadas de autora e réu a esse respeito, como também pela análise dos extratos do Banco 1..., SA, nos quais se constata a existência de quantias creditadas na conta bancária, em nome da autora”.
P. Em primeiro lugar, jamais a Recorrente, ao longo do processo ou nas suas declarações de parte, admite o que quer que seja a este respeito, isto é, de que não fatura tudo aquilo que recebe.
Q. Por outro lado, os extratos do Banco 1... SA, do período mencionado na sentença, anos de 2022e 2023, juntos pelo Recorrido a 10/06/2024 (já anteriormente enviados para os autos, mas nesta data numerados), como Docs. 18º a 29º (ref.: 49156203, 49156213, 49156226 e 49156237), são respeitantes a uma conta em nome e titulada por ambos, Recorrente e Recorrida – basta ler os extratos em questão, para verificar que se trata de extratos remetidos e em nome do Recorrido.
R. Sendo depositada nessa conta aqui em apreço, quer rendimentos auferidos pela Solicitadora, ora Recorrente, quer pelo Topógrafo, ora Recorrido, conforme ambos admitiram.
S. Sendo transferido e depositado nessa conta dinheiro proveniente do trabalho efetuado e faturado pela Autora/Recorrente, dinheiro proveniente de trabalho efetuado e muitas vezes não faturado pelo Réu/Recorrido.
T. Alguns dos depósitos em numerário eram de dinheiro auferido pelo Réu/Recorrido.
U. Nos extratos mencionados na sentença, constatamos que as transferências de AA, para a conta Banco 1..., são seguidas de pagamentos de despesas profissionais da Recorrente de valores em tudo idênticos a essas transferências efetuadas no dia ou nos dias seguintes
V. O dinheiro que é depositado na conta do Banco 1... não é apenas rendimento.
W. Refira-se ainda que os saldos mensais de valor elevado no ano de 2022 se deveram a uma quantia que a Recorrente recebeu de € 7.000,00, da herança do seu pai, facto esse que é do conhecimento do Recorrido.
X. Refira-se que muitas das quantias que eram transferidas para a conta conjunta do Banco 1... correspondiam ao rendimento efetivo do trabalho da Recorrente, faturação essa que foi junta aos autos referente aos anos de 2023 e inícios de 2024.
Y. Por outro lado, da prova testemunhal produzida resulta ainda o seguinte: apesar de reformado, o Recorrido continua a trabalhar.
Z. Apesar de o Tribunal considerar existir indícios de rendimentos não faturados e um rendimento superior ao declarado, a prova produzida, quanto ao padrão de vida da Recorrente, aponta no sentido contrário.
AA. Com base na abundante prova, carreada e produzida em julgamento, o ponto 65º da matéria assente deve ser alterado nos seguintes termos:
“65) O réu realizava e realiza ainda trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos”.
BB. Já o ponto 66º deve ser eliminado ou considerado como matéria não provada, dada a total ausência de indícios dos referidos factos.
CC. Factos provados mencionados nos pontos 56º, 57º, 59º e 60º, irão ser apreciados conjuntamente.
DD. Em primeiro lugar, quanto aos pontos 56º e 59º da matéria considerada como provada, há uma clara repetição e duplicação daquilo que é mencionado nestes dois pontos, sendo a única diferença a referente ao montante de € 100,00, mencionada no ponto 59º.
EE. Assim temos uma clara contradição, no que às despesas de saúde diz respeito, nos pontos 56º (Réu sem despesas de saúde), ponto 57º (€ 50,00 despesas médicas e medicamentosas conjuntas do casal) e ponto 59º (€ 100,00 despesas de saúde do Réu/Recorrido).
FF. Em termos de prova, concorda-se que não foi produzida prova quanto às despesas de saúde, com uma única exceção e que se prende com a liquidação de IRS dos rendimentos de 2023, junta pelo Réu/Recorrido a 07-02-2025, segundo a qual, o casal apresentou despesas de saúde de meros € 459,65, a que corresponde uma média mensal, de € 38,30, para os dois.
GG. Refere ainda o ponto 59º, na parte final, “a que acresce o valor de € 200,00 a título de prestação de alimentos à sua filha CC”.
HH. Não se entende como é que o Tribunal considerou este montante como uma despesa do Réu/Recorrido, ou qual a responsabilidade da Autora/Recorrente quanto a esta questão – o Réu pretende que a Autora lhe preste uma pensão de alimentos não só para si, para também para ela ajudara contribuir com as alimentos à filha dele que nasceu em consequência de uma relação adúltera?...
II. E não se entende, porque o Réu, na sua primitiva contestação, enviada para os autos a 19-01-2024 (ref.: 47706599), nada refere quanto aos alimentos da sua filha, com a mudança de mandatário, em sede de ampliação do pedido, no ponto 40º passa a referir, “A título de prestação de alimentos à sua filha menor CC, menor de 15 anos, o R. tem que despender a quantia de 300 euros mensais.”…
JJ. Incluindo o Tribunal, neste ponto 59º, in fine, a referência ao pagamento de € 200,00 mensais como uma despesa do Recorrido?
KK. Nenhuma prova foi feita de que o Recorrido tenha, ele próprio, efetuado alguma vez algum pagamento de alimentos à filha.
LL. Pelo contrário, de acordo com a prova testemunhal produzida em audiência, resultou claro que o Recorrido nunca quis saber da filha e nunca lhe enviou dinheiro, mesmo quando tinha uma atividade profissional estabilizada, já em Portugal, após 2016.
MM. Pelo exposto, entende a Apelante que, quanto à matéria de facto, o ponto 56º da matéria assente deve manter-se inalterado,
NN. o ponto 57º quando refere “€50,00 despesas médicas e medicamentosas”, deve ser alterado para o seguinte “€ 38,30 despesas médicas e medicamentosas”, uma vez que é a única evidência que temos.
OO. Já o ponto 59º, deve ser eliminado ou considerado como não provado.
PP. Por outro lado, o ponto 57º refere que “A autora e réu contam com as seguintes despesas:”.
QQ. Após a instauração dos presentes autos de divórcio, o Recorrido cessou por completo o pagamento das despesas comuns, com exceção do pagamento do condomínio daquela que foi/é a casa de morada de família (cfr. requerimento enviado pelo Recorrido a 07-02-2025, com a ref.: 51290846).
RR. O facto de pouco ou nada pagar relativamente às despesas comuns, incluindo despesas com o crédito à habitação e seguro da casa, após o divórcio ser instaurado, está expressamente admitido pelo Réu/Recorrido no ponto 72º da sua contestação.
SS. Isto é, só após o divórcio e sem nada que o justifique, para além do próprio pedido de divórcio, é que o Recorrido cessou por completo (exceção do condomínio), de contribuir para o pagamento das despesas de ambos.
TT. Apesar de estar a auferir uma pensão de reforma desde maio de 2024, ainda assim nada paga (exceção do condomínio).
UU. Esta questão é importante, uma vez que as quantias que têm vindo a ser pagas pela Recorrente após a instauração do divórcio, irão ser compensadas, no momento da partilha (ut 1697º do C.C.) e não podem ser consideradas, como foram, na sentença recorrida, para efeitos de determinação do valor dos alimentos.
VV. Assim, deve ser aditado um novo ponto à matéria dada como provada, com o seguinte teor: “As despesas mencionadas no ponto 57 da matéria assente, apesar de serem da responsabilidade da Autora e do Réu, posteriormente à instauração do divórcio têm vindo a ser pagas apenas pela Autora, com exceção das despesas do condomínio, que têm vindo a ser pagas pelo Réu.”.
WW. Entende a Recorrente que o ponto 60º deve ter apenas o seguinte teor: “O réu necessita de tratamento dentário, pois tem pouca dentição.”.
XX. Entende a Recorrente que o ponto 64, deve ter o seguinte teor: Durante o ano de 2023, o réu pouco ou nenhum dinheiro entregou à Autora, nomeadamente o dinheiro necessário para amortização do crédito obtido com a compra da casa, água, eletricidade, gás, pacote de televisão/net/telefone, tendo unicamente liquidado a despesa do condomínio sendo frequente o réu pedir dinheiro à autora para comprar cigarros, facto este que apenas aconteceu anteriormente ao divórcio dar entrada e em alturas em que este entregava o dinheiro que ganhava à Autora, isto é, o dinheiro que ele pedia para cigarros não era dinheiro da Autora, mas sim dinheiro que havia sido ganho por ele.
YY. Esta alteração afigura-se importante, uma vez que prova, não a entrega de dinheiro da Autora (ganho por ela) ao marido, mas sim a entrega de dinheiro que havia sido ganho por ele, o que é muito diferente.
ZZ. O princípio da livre apreciação da prova nunca atribui ao juiz “o poder arbitrário de julgar os factos contra as provas”! Quanto à análise critica dos depoimentos e da prova documental carreada para o processo, feita pelo tribunal a quo para fundamentar a formação da sua convicção, sempre diremos que a mesma, está completamente arredada da prova produzida, das regras da experiência comum, e muito para além, dos critérios para a livre apreciação da prova.
AAA. Resumindo, deve ser proferida decisão que altere os seguintes pontos da matéria de facto:
● o ponto 55º dos factos assentes deve ter a seguinte redação, uma vez que se refere a rendimentos declarados e não aos efetivamente auferidos: “Os rendimentos declarados do Réu no ano de 2023 foram € 4.210,00 e no ano de 2024 no valor de € 1.800,00”;
● O ponto 65º dos factos assentes deve ter a seguinte redação: “O réu realizava e realiza ainda trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.”;
● Já o ponto 66º deve ser eliminado ou considerado como matéria não provada, dada a total ausência de indícios dos referidos factos.
● O ponto 57º quando refere “€50,00 despesas médicas e medicamentosas” deve ser alterado para o seguinte “ 38,30 despesas médicas e medicamentosas”, uma vez que é a única evidência que temos.
● Já o ponto 59º, deve ser eliminado ou considerado como não provado, tanto mais que consta, parcialmente, do ponto 56º, quanto às despesas de saúde estão já mencionadas no ponto 57º, são de valores comprovadamente inferiores e, finalmente, não faz sentido a referência à prestação de alimentos à filha CC;
● Assim, deve ser aditado um novo ponto à matéria dada como provada, com o seguinte teor: “As despesas mencionadas no ponto 57 da matéria assente, apesar de serem da responsabilidade da Autora e do Réu, posteriormente à instauração do divórcio, têm vindo a ser pagas apenas pela Autora, com exceção das despesas do condomínio, que têm vindo a ser pagas pelo Réu.”;
● Entendendo a Recorrente que o ponto 60º deve ter apenas o seguinte teor: “O réu necessita de tratamento dentário, pois tem pouca dentição”;
● Entende, finalmente, a Recorrente que o ponto 64, deve ter o seguinte teor: “Durante o ano de 2023, o réu pouco ou nenhum dinheiro entregou à Autora, nomeadamente o dinheiro necessário para amortização do crédito obtido com a compra da casa, água, eletricidade, gás, pacote de televisão/net/telefone, tendo unicamente liquidado a despesa do condomínio, sendo frequente o réu pedir dinheiro à autora para comprar cigarros, facto este que apenas aconteceu anteriormente ao divórcio ser instaurado e em alturas em que este entregava o dinheiro que ganhava à Autora, isto é, o dinheiro que ele pedia para cigarros, não era dinheiro da Autora mas sim dinheiro que havia sido ganho por ele.
BBB. De todo o exposto, resulta claro, que o tribunal a quo, errou no julgamento da matéria de facto.
CCC. Não obstante ter sido fixada a pensão de alimentos em € 200,00, no ponto “V. Dispositivo:”, alínea c), de fls. 61/62 da sentença condena a Reconvinda no pagamento de uma pensão mensal de € 250,00.
DDD. Por este motivo, a sentença está ferida de uma nulidade, que aqui se suscita em conformidade com o disposto no art.º 615º, nºs 1, al. c) e nº 4, do C.P.C..
EEE. Por outro lado, na douta sentença aqui em recurso, o Tribunal considera matéria de facto como provada matéria repetida e contraditória, em clara contradição lógica ou de raciocínio, concretamente, quanto às despesas, efetivamente, suportadas pelo Recorrido, nos pontos 56º, 57º e 59º dos factos que considera como provados.
FFF. Tudo isto torna, salvo sempre o devido respeito por opinião contrária (que é muito!), a sentença é ambígua ou obscura e decisão ininteligível; configuram uma nulidade da mesma, conforme o disposto no art.º 615º, nº 1, al. c), do C.P.C..
GGG. Quanto à questão da necessidade do Reconvinte/Recorrido, que justifica a fixação de uma pensão de alimentos, tem necessariamente de ser declarada como não provada!
HHH. O Réu aufere atualmente uma pensão de reforma de € 431,92 (ponto 54º da matéria assente), acrescido de € 150,00 auferidos em média mensal em 2024 (ponto 55º da matéria assente), para além das quantias não faturadas (ponto 65º dos factos assentes) e auferindo quantias variáveis que em média rondam os € 250,00 (ponto 44º da matéria assente), sendo que, continua a trabalhar, não declarando muitas das quantias auferidas (pontos 55º e 65º, na nova redação pretendida).
III. Apresenta como despesas por si efetivamente suportadas as quantias de € 380,00 (ponto 56º da matéria assente), acrescido de € 75,00 do condomínio (ponto 57º da matéria assente), parte das despesas de saúde declaradas pelo casal no montante de € 38,30 (ponto 57º da matéria assente, na nova redação pretendida), num montante total de despesas comprovadas e efetivamente suportadas pelo Reconvinte/Recorrido (considerando metade das despesas médias atrás indicadas) de € 474,15.
JJJ. Assim, com um rendimento de € 431,92 (reforma), acrescido de € 150,00 auferidos em média mensal em 2024 (ponto 55º da matéria assente), para além das quantias não faturadas (ponto 65º dos factos assentes), é manifestamente suficiente para suportar as despesas efetivamente suportadas pelo Reconvinte/Recorrido de € 474,15!
KKK. Necessário se torna, igualmente, declarar a impossibilidade de a Reconvinte/Recorrente satisfazer a pensão de alimentos peticionada!
LLL. A Recorrente auferiu em 2024 um total anual de € 15.260,00, a que corresponde uma média mensal de € 1.271,67 (ponto 62º da matéria assente);
MMM. Suportando sozinha as despesas comprovadas, efetivamente suportadas e discriminadas nos pontos 57º (na nova redação pretendida e considerando metade das despesas médias atrás indicadas de € 38,30) e 58º da matéria assente, no montante total de € 1.461,86.
NNN. Assim, com um rendimento de € 1.271,67, e com despesas comprovadas, efetivamente suportadas é manifestamente suficiente para suportar as despesas efetivamente suportadas pela Recorrente no montante total de € 1.461,86, é manifestamente impossível e insuportável a Recorrente ver acrescido o pagamento de € 200,00/€ 250.00 fixado na sentença!
OOO. Por todo o exposto, o Tribunal a quo errou na apreciação da prova, no julgamento da matéria de facto e errou na interpretação das normas jurídicas aplicáveis, ao caso sub judice, com uma clara violação do disposto nos artigos 376º e 396º do Código Civil; 495º e seguintes (embora a prova testemunhal seja, por excelência, de livre apreciação, um erro que subverta completamente o teor de um depoimento crucial, ou a sua valoração ilógica face a outros elementos, pode ser questionado), 607º, nºs 3, 4 e 5; 615º nº 1 al. c), todos do Código do Processo Civil.
Deve ser, por V.ªs Ex.ªs, dado provimento ao presente recurso e, em consequência:
a) julgando-se procedentes as nulidades e irregularidades suscitadas, com as legais consequências;
b) revogando-se o douto decisório recorrido, decidindo-se pela total improcedência do pedido reconvencional.
*
O R. contra-alegou, terminando como segue:
1.-Odouto tribunal a quo condenou a A./Reconvinda “no pagamento de uma pensão de alimentos ao réu/reconvinte no valor de €250,00 mensais que será paga em mensalidades iguais e sucessivas, depositadas em conta bancária do réu até ao dia 15 de cada mês, quantia que deverá ser atualizada de acordo com a taxa de inflação em janeiro de cada ano.”
2.-A Recorrente-mulher levanta na conclusão D) a questão de a Mm.ª Juiz sob a alínea B), em sede de fundamentação a fls. 58/62, ter mencionado na sentença o seguinte:…que se verifica a necessidade elegível para a sua atribuição, de acordo com o disposto no artigo 2016º, nº2, e 2016º A do Código Civil, no montante que se fixa em € 200,00 mensais.”.
3.- E conclui erradamente que a sentença é nula.
4.- Ora, a referência a €200,00 é apenas um lapso de escrita na parte não decisória de sentença.
5.- A Recorrente-mulher bem interpretou que a pensão de alimentos foi fixada em €250.
6.- Ao contrário da Recorrente-mulher o contra-alegante considera corretamente julgada a matéria de facto constante dos pontos: 55), 56), 57), 59), 60), 65), 66).
7.- No respeitante ao ponto 55) o documento da AT de fls. 365 dos autos faz prova plena.
8.- Considera o contra-alegante bem julgada a matéria de facto referida no ponto 56) foram as despesas, no valor de € 380,00 que com o seu parco rendimento (€4214,00:12=€ 351,00 mensais) conseguia pagar com ajuda de familiares (facto provado 55).
9.- Considera, por isso corretamente julgado o ponto 57), isto é que a autora e réu contam com as seguintes despesas:
- €586,75 crédito de habitação da casa de morada de família;
- €60,00 de água;
- €130,00 de eletricidade e gás;
- €67,00 de Nos, tv, internet e telefone - inclui 2 telemóveis
- €75,00 de condomínio;
- €132,96 seguro associado ao crédito da habitação
- €50,00 despesas médicas e medicamentosas;
- €100,00 de gasolina;
- €300,00 de alimentação – cfr., documentos de fls., 383 dos autos e fls.,
10.- Considera o contra-alegante corretamente julgada a matéria de facto do ponto 59), isto é que o “… réu tem despesas mensais próprias de alimentação no montante de €300,00, de transportes de € 60,00, de vestuário de € 20,00 e ainda de saúde de € 100,00 o que totalizam o montante mensal de € 480,00, a que acresce o valor de € 200,00 a título de prestação de alimentos à sua filha CC – cfr., documento de fls., 372 e 373 dos autos.
11.- Considera também que não merece reparo o ponto 60), “0 réu necessita de tratamento dentário, pois tem pouca dentição e alguns focos de infeção gengival”, por ser desde logo um facto notário constatado diretamente pela Mm.ª Juiz conforme sentença.
12.- Considera o contra-alegante que está corretamente julgada a matéria de facto do ponto 65): O réu realizava trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
13.- Realizava, pois, neste momento pouco ou nenhum trabalho, também além da muita idade, quase 68 anos, pois encontra-se deprimido e desestabilizado com o abandono da mulher.
14.- Considera também corretamente provado o ponto 66) de que “Para além dos valores referidos em 62 (os rendimentos declarados da Autora este facto 62 não impugnado já presume existirem outros), de igual modo, a autora auferiu e aufere outros rendimentos não contabilizados. “
15.- Rendimentos esses que constam dos extratos bancários do Banco 1... e se situam em valor superior a €3.000,00, pois é esse o saldo médio mensal (ano 2022 e 2023 docs. 18 a 29 juntos com a ampliação do pedido).
16.-Rendimentosquea Douta sentença a fls25 bem discriminou e qualificou como sendo transferências efetuadas para pagamento do trabalho da Recorrente-mulher.
17.- A referir a despesa mensal não contabilizadas de €250.00 mensais que paga/transfere para o seu filho DD (constante nos extratos bancários de 2022 e 2023, docs. 18 a 29 e Doc. 3 que agora se junta), a renda do escritório e a Segurança Social dos Solicitadores, que provam que os seus rendimentos são muito superiores aos declarados.
18.- A factualidade dada como provada no ponto 16 da matéria dada como provada que “Em virtude de ter emigrado para Angola, o Réu viveu em Angola desacompanhado da autora e dos filhos, tendo a autora preferido permanecer em Portugal.” Inviabiliza a desconsideração da Recorrente-mulher que qualifica a filha menor do contra-alegante como nascendo de uma relação adúltera, para além do facto dado por provado de que a Recorrente-mulher se recusou e recusava, desde o nascimento do filho, desde abril de 1992 a manter relações sexuais com o contra-alegante (factos provados nºs 3 e 4) e bem sabia da existência dessa filha, desde pelo menos 2016 (facto provado nº22), tendo decidido manter o casamento.
19.- Um casamento, em termos legais, é um contrato social e jurídico entre duas pessoas, onde elas se comprometem a formar uma família, estabelecendo direitos e deveres mútuos.
20.- A Recorrente-mulher ouvida em declarações de parte (na sessão de 21 de janeiro de 2025 e que se mostra gravado de 10:39 a 11:50 no sistema “Citius”, como consta da respetiva ata).
10:22 Autora: “Nós sempre fomos colegas de casa e continuamos a ser colegas de casa…”
21.- Na perspetiva da Recorrente-mulher o casamento não é um contrato social e jurídico entre duas pessoas, onde elasse comprometem a formar uma família, uma vez que define expressamente o seu casamento como “nós sempre fomos colegas de casa”.
22.- A Recorrente-mulher reduz o casamento à questão económica; isto é; ele trabalha e ela gasta!
23.- A Recorrente-mulher vê no casamento a oportunidade de explorar economicamente o seu parceiro.
24.- Que durante os anos de casamento suportou as despesas de casa, e inclusive as da Recorrente-mulher como o ensino secundário num colégio privado como o curso superior numa universidade privada e também com as despesas com a universidade privada do filho.
25-Muito menos os depoimentos do filho (DD) e da nora EE) e reproduzidos pela Recorrente-mulher poderão ser tidos em consideração por falta de credibilidade, uma vez que têm interesse direto na causa; isto é, pretendem que o casal se divorcie, venda a casa e adquirirem com esse dinheiro uma casa para eles próprios, como resulta das declarações de parte do contra-alegante (inquirido na sessão de 27 de novembro de 2024 e que se mostra gravado de 14:56 - 16:33 no sistema “Citius”, como consta da respetiva ata), afirma aos 1:25m: “…aliás negócios entre a minha mulher e o meu filho assisti a muitas, desde estarem a decidir o que vão fazer à casa e vão vender e vão pôr em nome deste e daquele sem me consultar…coisas desse tipo há muitas“.
26.- No respeitante às conclusões HH, II, JJ, completamente carecidas de fundamento legal, porque qualquer A. ou R. podem ampliar o pedido, e foi o que foi efetuado.
27.-Ao contrário do referido o contra-alegante juntou aos autos no próprio decurso do julgamento prova documental, para além da prova testemunhal sobre o pagamento de pensão alimentar à filha menor.
28.- A matéria de facto, o ponto 56º da matéria assente deve manter-se inalterado.
28.- Deve manter-se inalterado o ponto 57º quando refere “€50,00 despesas médicas e medicamentosas”, deve ser alterado para o seguinte “€ 38,30 despesas médicas e medicamentosas”, uma vez que é a única evidência que temos.
29.- A Recorrente-mulher pretende que seja dado como provado que o contra-alegante desde a instauração do divórcio não paga as despesas comuns.
30.- Contudo não deixa tal situação de ser falsa, porque sempre pagou essas despesas de acordo com as suas possibilidades pois foi pagando as dívidas de condomínio (2023 rendimentos €4210,00:12= € 351,00 (facto provado 55) despesas: €380,00 (facto provado 56) 2024- rendimentos € 415,00 x 11 + €1800= 530,41; despesas: €680,00 (facto provado 56 e 59) + 75 (condomínio) = €755,00 (factos provados 57 e 64).
31.- Mais não podia pagar por manifesta carência!
32.- Acresce o facto superveniente de a Recorrente-mulher não pagar atualmente e desde a notificação da sentença (meados de abril) nenhuma despesa comum!
33.- E de ter arrendado um apartamento onde passou a residir desde o dia 31 de maio de 2025.
34.- Tendo, desde essa data, abandonado o domicílio conjugal!
35.- Foi o contra-alegante que teve de contrair até à data três empréstimos para pagamento das despesas comuns (Docs. 1 a 8).
36.- Razão pela qual não podem ser alterados os pontos 57, 60, e 64 da matéria assente, uma vez que a Recorrente-mulher nada paga, desde meados de abril de 2025 (desde a sentença de divórcio) qualquer dessas despesas.
37- O contributo do contra-alegante para a economia do casal e família durante os 32 anos de casamento foi gigantesco, tanto que se a Recorrente hoje é Solicitadora e deve-o e muito ao contra-alegante que com os rendimentos do seu trabalho e sacrifício ao emigrar para Angola custeou a sua educação e curso de Solicitadoria e estágio em escolas e universidade privada, sem que esta trabalhasse e também quem pagou um curso superior ao filho numa escola privada (factos provados nºs 6, 7, 8, 9, 10, 13, 16, 24, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 37, 40, 41, 46, 47).
38.- O contra- alegante enviou para Portugal durante 10 anos milhares de euros, alguns montantes durante alguns anos através da Banco 2..., por isso difícil de quantificar por serem levantados em dinheiro (factos provados nºs 28 e 30).
39.- A reforma do contra-alegante é baixa, de € 431,92 porque não foram pagas as contribuições à segurança social nos 10 anos que esteve em Angola, de 2006 até 2016 (facto provado nº 54), o que competia à Recorrente, que não administrou o dinheiro do casal e do marido condignamente e em benefício deste, como impõem os artigos 1681ºnº1 do Código Civil conjugado com o artigo 1678º nº 2 alínea a), não juntou dinheiro, não amortizou a dívida do imóvel do casal, ao invés disso administrou-o em benefício próprio, optando por estudar, ela o filho em escolas e universidades privadas, sem trabalhar durante anos, esbanjando o dinheiro e assim prolongando deliberadamente a sua estadia em Angola a pretexto de nunca existir dinheiro sempre que este vinha de Angola (como decorre dos factos provados nº 27 conjugado com o 13).
40.- A Recorrente-mulher contraiu unilateralmente dívidas que o marido ainda teve que vir ajudar a pagar (facto provado 34) em vez de ir trabalhar, para ir ajudar o seu marido, como refere a testemunha FF (inquirida na sessão 29/01/2025 e que se mostra gravado deste o minuto 16:07 até ao 17:01 no sistema “Citius”, como consta da respetiva ata),
Aos 10:10m:… “ele queixava-se muito disso, ele queixa-se que teve que vir para Portugal para resolver problemas graves de dívidas…de dívidas que apesar do bastante dinheiro que ele enviava nunca chegava para… e ele coitado quando chegou e só veio pagar dívidas, trabalhar para pagar dívidas…”
Aos 36:52m acerca da Alegante não trabalhar: “ Na verdade ela devia ter trabalhado, nós temos bracinhos é para trabalhar peço desculpa é a minha opinião… é a minha opinião, há muita gente que é trabalhador estudante…portanto se o dinheiro fazia falta…eram dois a estudar, cursos superiores pagos por ele e ninguém se dignava a trabalhar para conseguir ajudar?…
Aos 37:20m “Não, não trabalhou! … é assim tinha que ir trabalhar para ajudar o marido, para ajudá-lo”...
E ainda declarou: aos16:46.: “…as pessoas têm que ser generosas e amigas umas das outras, não é? E compreender que a generosidade não é só para um lado e que não se abandona uma pessoa que fez tanto por nós… honestamente sem é que me é permitido dizer isto não é? A única coisa que me choca aqui é como é que, como é que um homem que é o meu irmão que…como é que…depois de 10 anos com um esforço tremendo, proporciona que a esposa tirasse um curso superior a pagar muito bem porque é privado…é complicado, não é? E o filho também…deu um curso superior aos seus familiares e agora de repente já têm um curso superior então: agora podes-te ir embora que tu agora já não fazes falta que eu já me basto a mim própria ou a mim próprio. O filho e a mulher agora estão com alguma possibilidade económica para fazer a sua vida e ele agora é persona non grata na equação…”
41.- O contra-alegante hoje tem quase 68 anos (facto provado nº 64), foi assim desta forma descartado pela mulher, expressão usada no seu depoimento de parte ...” e a mim descartou-me não é? (sessão 21 de janeiro gravado no Citius dos 10:19 a 1038, conforme a ata) a qual abandona o domicílio conjugal a 31 de maio, deixando de lhe prestar qualquer assistência/alimentos, deixando de custear as despesas, deixando-o com um déficit económico mensal superior a €1200,00 (factos provados 54, 55,57,59 e 60 e Docs. 1 a 8 ora juntos).
42.- A Mm.ª Juiz ponderou devidamente a fixação de alimentos e do respetivo montante, tomando em consideração nos termos do artigo 2016- A. nº 1 do Código Civil: a duração do casamento, casaram em 1991 (facto provado 1); a gigantesca colaboração para a economia do casal do contra-alegante, sobretudo dos 10 anos em Angola onde trabalhou essencialmente no mato; a escassíssima colaboração da Recorrente mulher; a idade do contra-alegante (quase 68 e mais 9 anos que a sua mulher); a sua parca pensão de reforma (€431,82); o seu estado de saúde (desgastado e deprimido), as qualificações profissionais e as possibilidades de emprego de cada um dos cônjuges sendo muito escassas as do contra-alegante; circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos, como por exemplo o facto do contra-alegante ser pai tem uma filha menor, cuja mãe faleceu em dezembro de 2024, e que vive desacompanhada em Angola em casa de familiares e que depende economicamente do pai!
43.- O comportamento da Recorrente-mulher subsume-se na preterição do dever de assistência ao cônjuge, ao privá-lo não só de bens essenciais seja a nível alimentar seja a nível médico e habitacional com o único propósito de pressioná-lo e obrigá-lo a aceitar condições desumanas para o divórcio e deixando-o a viver sem a menor dignidade.
44.- A Recorrente-mulher chegou ao ponto de requerer o divórcio a 17 de agosto de 2023, ainda não auferia a sua reforma, pretendia, pois, abandoná-lo sem que este dispusesse de rendimentos para comer, pagar uma habitação, comprar medicamentos, etc.
45.- E agora, no dia 31 de maio de 2025, abandonou o lar conjugal colocando-o numa situação de incapacidade económica para cumprimento das suas obrigações, recorre da pensão de alimentos a que foi condenada, pressionando-o a vender o imóvel e assim privando-o de ter um teto para morar e de poder satisfazer as suas necessidades básicas destabilizando-o emocionalmente.
46.- Desestabilização que remonta ao início do casamento, há 32 anos ao ter recusado qualquer contacto físico ao contra-alegante! (factos provados 3, 4 e 5).
47.- O contra-alegante ama a sua mulher, tudo fez para manter o casamento e tem legítimas expectativas de uma reconciliação com sua esposa!
48.- Bem julgou o tribunal “a quo”, caso o divórcio venha a ser decretado, deve ser atribuída a pensão de alimentos ao contra-alegante nos termos exatamente definidos na douta sentença do tribunal “a quo”, não estando a referida sentença ferida de uma nulidade, que aqui se suscita em conformidade com o disposto no art.º 615º, nºs 1, al. c) e nº 4, do CPC.
49.- A douta sentença não é ambígua ou obscura e a decisão é inteligível, configuram uma nulidade da mesma, conforme o disposto no art.º 615º, nº 1, al. c), do CPC.
Nestes termos e nos mais de direito e com o mui douto suprimento de V.ªs Exas, em que deve ser mantida a douta sentença recorrida por inexistência dos invocados vícios de nulidade da sentença no respeitante ao pedido de alimentos, e assim se fará Justiça!
*
II - Questões a dirimir:
a - da prova ilegal através de documento;
b - da nulidade da sentença arguida pelo R.;
c - da nulidade da sentença arguida pela A.;
d - da reapreciação da matéria de facto invocada pelo R.;
e - da reapreciação da matéria de facto pedida pela A.;
f - se se verificam os pressupostos para decretar a dissolução do matrimónio contraído entre A. e R.;
g - se assiste ao R. o direito a receber alimentos da A..
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III - Fundamentação de facto
1) A Autora e o Réu contraíram um com o outro casamento católico, sem precedência de convenção antenupcial, no dia 17 de agosto de 1991, cf. certidão do assento de casamento junta com a petição inicial.
2) Do casamento sobreveio um filho, já maior, de nome DD.
3) Durante o casamento, a Autora padecia de enxaquecas constantes, o que passou a acontecer logo após o nascimento do único filho do casal em 1992.
4) Após o nascimento do filho do casal e em virtude das enxaquecas recusava-se e recusou ao longo do casamento manter relações sexuais com o Réu.
5) O Réu sempre respeitou tal situação, nunca impondo a sua vontade e conformando-se com a recusa da esposa.
6) Quando conheceu a Autora, o Réu exercia a profissão de desenhador técnico de arquitetura e topógrafo.
7) Atendendo à sua situação financeira, custeava na sua maior parte todas as despesas da família, concretamente, as despesas com a casa, os estudos da Autora, entre outras.
8) Quando o filho nasceu, a Autora trabalhava na A... como telefonista, o que ocorreu desde 1989 até 1996 e frequentou o Externato ... em 1989.
9) O Réu pagou à Autora o ensino secundário na escola privada Externato ..., por forma a que esta pudesse progredir profissionalmente.
10) Em 1996, a Autora terminou o contrato com a referida empresa e passou a fazer alguns trabalhos numa imobiliária (Predial Dimensão), como agente imobiliária, muitas vezes auxiliada pelo Réu devido às suas enxaquecas que a impediam de trabalhar.
11) Fazia parte do agregado familiar da Autora e Réu, igualmente GG, filha de um anterior casamento do Réu, que tendo ficado órfã de mãe, passou com 8 anos a residir com o casal, o que sucedeu logo após o casamento.
12) Em 2000, o Réu ficou sem emprego, arranjando apenas contratos de curta duração e de parcos rendimentos, em virtude de o seu empregador ter falecido.
13) Por esse motivo, em 2006 e com o objetivo de melhorarem a sua situação económica, Autora e Réu acordaram que ele iria trabalhar para Angola para juntarem dinheiro.
14) Em 2006 o Réu emigrou para Angola, ficando inicialmente a viver em casa do pai e, cerca de um ano depois, foi viver para a cidade ....
15) Mais tarde, o Réu foi trabalhar para B..., para a empresa “B...”.
16) Em virtude de ter emigrado para Angola, o Réu viveu em Angola desacompanhado da autora e dos filhos, tendo a autora preferido permanecer em Portugal.
17) Posteriormente, em 2008, o Réu foi trabalhar para uma outra empresa, na cidade ..., onde teve um caso amoroso com uma cidadã angolana de nome HH.
18) Na sequência desse relacionamento, nasceu CC, nascida em ../../2009, em ..., Angola (cfr. assento de nascimento de fls., 188 dos autos).
19) Em janeiro de 2007, a Autora quando foi à médica de família (comum ao casal), foi confrontada por esta, pelo facto de o Réu ter contraído uma doença sexualmente transmissível, de seu nome sífilis (cfr. doc. 1, fls. 3/3, teste positivo a VDRL, exames datados de 1-2007, conforme documentos de fls., 25 verso a 26 verso dos autos).
20) O Réu contraíra sífilis entre os anos de 88/91, em virtude de ter tido relações sexuais com outras mulheres (altura em que a autora esteve grávida) e por esse motivo também passou a recusar-se a ter relações sexuais com o réu.
21) Facto esse que o Réu admitiu perante a autora quando foi confrontado por esta.
22) Posteriormente, em novembro de 2016, o Réu veio definitivamente para Portugal e, desde logo, a Autora descobriu, na mala do seu marido, um assento de nascimento da menor CC.
23) Desde essa data e pelo mencionado motivo, começou a verificar-se um afastamento e distanciamento entre o casal, passando, nessa altura, a Autora a recolher-se cedo no seu quarto.
24) E desde 2019, altura em que começou a trabalhar como solicitadora no seu escritório, chegava a casa, apenas, ao fim do dia, recolhendo-se no quarto logo após o jantar, onde assistia à televisão.
25) Em virtude destes factos, não mais voltaram a dormir na mesma cama, passando o Réu a dormir, ininterruptamente até ao dia de hoje, num sofá na sala e a autora no quarto onde era costume ali assistir à televisão.
26) A Autora e Réu deixaram de ter interesses ou hobbies em comum.
27) Durante o período que o réu permaneceu em Angola, e nos primeiros anos da sua permanência em Angola, a Autora foi convencendo o Réu a permanecer em Angola ao longo dos anos, uma vez que sempre que vinha a Portugal a Autora afirmava que não havia dinheiro, pelo que teria que voltar para Angola.
28) Entre 2006 e 2010, o Réu enviava mensalmente para a Autora cerca de €2.500,00 que a Autora administrava livremente, valor que foi sofrendo pequenas oscilações em virtude da taxa cambial.
29) Sucede, porém, que por volta de 2015/2016 o governo angolano restringiu a saída de divisas, proibiu o recebimento em dólares e por isso essa quantia foi sendo, paulatinamente, reduzida para cerca de € 400,00 mensais.
30) Durante os anos em que esteve em Angola o Autor enviou para a Autora os valores monetários, discriminados da seguinte forma:
a. Em 25/9/2006 no valor de USD 2.480,00 = €1.945,16;
b. Em 14/11/2006 no valor de USD 3.000,00 = €2.323,49;
c. Em 20/12/2006 no valor USD 3.000,00 = €2.282,62;
d. Em 15/02/2007 no valor de USD 2.500,00 = €1.914,08;
e. Em 15/03/2007 no valor de USD 3.000,00 = €2.271,78;
g. Em 12/04/2012 no valor de USD 3.000,00 = €2.227,78;
h. Em 11/05/2007 no valor de USD 3.000,00 = €2.208,55;
i. Em 12/06/2007 no valor de USD 3.000,00 = €2.230,00;
j. Em 12/07/2007 no valor USD 3.000,00 = €2.188,66;
k. Em 14/08/2007 no valor USD 3.000,00 = €2.185,30;
l. Em 7/09/2007 no valor USD 3.000,00= €2.197,95;
m. Em 2/10/2007 no valor USD 2.500,00=€1.756,44;
n. Em 22/02/2008 no valor USD 600,00 =€400,00;
o. Em 14/03/2008 no valor USD 3.200,00 =€2.071,44;
p. Em 16/08/2008 no valor USD 2.792,06 = €1.762,89;
q. Em 14/05/2008 no valor USD 3.220,29 = €2.077,69;
r. Em 13/06/2008 no valor USD 3.120,53 = €2.002,25;
s. Em 16/07/2008 no valor USD 3.119,54 = €1.957,31;
t. Em 18/08/2008 no valor USD 3.122,42 = €2.085,21;
u. Em 17/08/2008 no valor USD 3.124,78 = €2.198,27;
v. Em 10/10/2008 no valor USD 3.126,39 =€2.275,64;
w. Em 18/11/2008 no valor USD 3.129,37 = €2.457,88;
x. Em 16/12/2008 no valor USD 3.160,00 =€2.380,5;
y. Em 27/02/2009 no valor USD 3.125,00 = €2.429,00;
z. Em 28/01/2009 no valor USD 3.140,00 = €2.443,09;
aa. Em 23/03/2009 no valor USD 3.128,24 = €2.306,16;
bb. Em 17/04/2009 no valor USD 3.127,53 =€2.353,97;
cc. Em 3/06/2009 no valor USD 3.125,70 = €2.186,08;
dd. Em 6/07/2009 no valor USD 2.475,00 = €1.746,77;
ee. Em 29/07/2009 no valor €1.997,00;
ff. Em 25/08/2009 no valor USD 2.960,00 = €2.066,64
gg. Em 05/05/2010 no valor de €351,00;
ii. Em 13/05/2010 no valor de €1.482,00;
jj. Em 11/06/2010, no valor de €1.916,00;
kk. Em 06/07/2010, no valor de €254,00;
ll. Em 14/07/2010, no valor de €1.669,00;
mm. Em 09/08/2010, no valor de €1.890,00;
nn. Em 09/09/2010, no valor de €723,00;
oo. Em 16/09/2010, no valor de €1.770,00;
pp. Em 13/10/2010, no valor de €728,00;
qq. Em 26/10/2010, no valor de €1.134,00;
rr. Em 3/12/2010, no valor de €1.200,00;
ss. Em 22/12/2010, no valor de €524,00;
uu. Em 17/01/2011, no valor de €1.450,00;
vv. Em 14/02/2011, no valor de €1.383,00;
xx. Em 15/03/2011, no valor de €1.349,00;
ww. Em 30/03/2011, no valor de €700,00;
yy. Em 11/04/2011, no valor de €1.578,00;
zz. Em 14/05/2011, no valor de €1.500,00;
aaa. Em 13/06/2011, no valor de €1.500,00;
bbb. Em 19/07/2011, no valor de €1.500,00;
ccc. Em 12/08/2011, no valor de €1.500,00;
ddd. Em 19/09/2011, no valor de €1.500,00;
eee. Em 24/10/2011, no valor de €1.500,00;
fff. Em 23/12/2011, no valor de €2.114,00;
ggg. Em 23/02/2012, no valor de €1.500,00;
hhh. Em 15/03/2012, no valor de €1.500,00;
iii. Em 10/04/2012, no valor de €1.528,00;
jjj. Em 21/05/2012, no valor de €1.773,00;
kkk. Em 15/06/2012, no valor de €1.500,00;
lll. Em 11/07/2012, no valor de €147,00;
mmm. Em 17/07/2012, no valor de €1.268,00;
nnn. Em 17/08/2012, no valor de €1.461,00;
ooo. Em 13/08/2012, no valor de €1.393,00;
ppp. Em 11/10/2012, no valor de €1.343,00 – cfr. extratos do Banco 1..., SA, de fls. 191 a 229 verso e a fls. 314 a 350 verso dos autos;
rrr. E os valores 1.587,89; 2.035,73; 303,15; 756,25; 465,45; 645,85 através da Banco 2... em data que não foi possível precisar, tendo enviado outros valores nos anos seguintes que não foi possível quantificar – cfr. fls., 191 a 229 verso.
31) A Autora sempre que falava com o Réu dizia-lhe que não havia dinheiro, sendo que as discussões do casal incidiam maioritariamente à volta de dinheiro.
32) O Réu regressou definitivamente para Portugal em 2016, não só devido às transformações políticas, como também porque os valores que enviava para Portugal eram menores e a autora não estava a conseguir pagar as despesas.
33) Enquanto esteve em Angola, o Réu teve um trabalho estável e rendimentos que lhe permitiam ter um bom nível de vida, à exceção dos últimos anos.
34) Cá chegado, deparou-se com dívidas por pagar, nomeadamente com dívidas ao Banco do crédito à habitação e a diversas pessoas contraídas pela autora, nomeadamente crédito para pagar o curso do filho DD, cujos valores não foi possível apurar.
35) Parte dos rendimentos do Réu auferidos em Angola serviram para suportar as despesas de educação da Autora, cujo curso superior foi efetuado em universidade privada.
36) Porém, com a diminuição dos valores enviados de Angola pelo Réu, a Autora, nos últimos anos em que o Réu permaneceu em Angola, recorreu a empréstimos de terceiros, cujos montantes não foram possíveis quantificar.
37) Enquanto a Autora esteve a tirar o curso de solicitadoria não trabalhou, tendo terminado o curso em 2013.
38) Ainda nessa sequência, em finais de 2013, a Autora trabalhou como comercial, numa imobiliária, onde prestava apoio jurídico, suportando também, e em parte, as despesas do agregado familiar, até conseguir abrir o escritório de solicitadoria em 2018.
39) Nos 10 anos em que o Réu permaneceu em Angola, este veio cerca de três vezes a Portugal.
40) O filho do casal, DD, estava na faculdade, na C..., cujo custo mensal era de aproximadamente €500,00 de mensalidade e material.
41) A Autora exerce a profissão de solicitadoria, com inscrição desde março de 2013.
42) Quando regressou a Portugal, em 2016, o réu não tinha trabalho, e ficou algum tempo desempregado.
43) Posteriormente, conseguiu um emprego numa empresa na área da construção civil onde auferia cerca de €800,00 mensais, tendo ficado novamente desempregado na altura da pandemia.
44) Desde 2020, o Réu elaborava alguns trabalhos de topografia, alguns deles, arranjados pela Autora e pelo filho do casal com os quais ganhava uma média de € 250,00.
45) Estes dinheiros eram depositados na conta titulada por ambos que a Autora administrava e destinavam-se a contribuir para o pagamento das despesas do casal.
46) Em 2019, o Réu acompanhou a Autora na compra de cortinados e outros itens para o escritório de solicitadoria da Autora.
47) O Réu ajudou a desmontar as paredes de pladur do referido escritório e ajudou a montar todo o escritório até este ficar operacional.
48) Quando regressou a Portugal em 2016, o filho DD e a namorada, EE, estavam a morar com a Autora.
49) Em 2022, a autora e o réu foram três dias à cidade de Setúbal.
50) Em março de 2023, a filha CC do Réu entrou em contacto, através do Facebook, com a Autora com o seu meio irmão DD e com a sua meia irmã GG, tendo ambos nessa altura tido conhecimento da existência de uma irmã, porque já não sabia do pai há algum tempo.
51) Nessa altura fizeram uma reunião familiar, em que estiveram presentes a Autora e o Réu, o filho DD e a sua irmã GG.
52) Dado que o filho já havia saído de casa de morada de família, que ocorreu em 2023, a autora fez uma reunião familiar em março de 2023, em que anuncia à família que se vai divorciar e alega como motivo a existência da filha do Réu de Angola.
53) Quer a Autora, quer o filho do casal, não querem qualquer envolvimento com a filha do Réu CC, de Angola, tendo a CC passado a enviar mensagens a partir daquela data.
54) O Réu tem, atualmente, 67 anos (nasceu a ../../1957) e aufere a pensão de reforma no valor de €415,00 desde abril de 2024, e atualmente no valor de €431,92 uma vez que de 2006 até 2016, não foram pagas as contribuições à Segurança Social (cfr. declaração da CNP de fls. 245 a 247 e 379).
55) O Réu auferiu em 2023 cerca de €4.210,00 Euros, pelo que apenas auferiu o valor mensal de 351 Euros e em 2024 o montante de €1.800,00 (cfr. documento da AT de fls., 365 dos autos).
56) Com este valor mensal auferido em 2023 teria que fazer face às despesas mensais de alimentação no montante de €300, transportes de €60 e de vestuário no montante de €20, que totalizam €380 mensais.
57) A Autora e Réu contam com as seguintes despesas:
- €586,75 crédito de habitação da casa de morada de família;
- €60,00 de água;
- €130,00 de eletricidade e gás;
- €67,00 de Nos, tv, internet e telefone - inclui 2 telemóveis
- €75,00 de condomínio;
- €132,96 seguro associado ao crédito da habitação
- €50,00 despesas médicas e medicamentosas;
- €100,00 de gasolina;
- €300,00 de alimentação – cfr. documentos de fls., 383 dos autos e fls., 37 a 42 dos autos e a fls. 44 a 49 dos autos.
58) Para além das despesas com o agregado familiar, a Autora conta com as seguintes despesas mensais com o seu escritório de solicitadoria:
- €25,00 – MEO;
- €26,00 – água;
- €15,00 – eletricidade.
59) Por seu turno, o Réu tem despesas mensais próprias de alimentação no montante de €300,00, de transportes de €60,00, de vestuário de €20,00 e ainda de saúde de €100,00 o que totalizam o montante mensal de €480,00, a que acresce o valor de €200,00 a título de prestação de alimentos à sua filha CC – cfr. documento de fls., 372 e 373 dos autos.
60) O Réu necessita de tratamento dentário, pois tem pouca dentição e alguns focos de infeção gengival.
61) Por seu turno, a Autora tem como fonte de rendimento o que lhe advém da profissão de solicitadora.
62) Os rendimentos declarados da Autora no ano de 2023 foram €19.085,74 e no ano de 2024 o valor de €15.260, 00 (cfr. docs. 2 e 3 e documento da AT de fls. 365 dos autos).
63) Autora e Réu despenderam os seguintes montantes, cf. demonstrações de liquidação de IRS - na parte designada por “deduções à coleta” – junto a fls. 383 dos autos, e relativo ao ano de 2023, o valor de €762,75, tendo apresentado como despesas gerais e familiares, o valor de €11.139,05; despesas de saúde e com seguros de saúde o valor de €459,65;
64) Durante o ano de 2023, o Réu pouco ou nenhum dinheiro entregou à Autora, nomeadamente o dinheiro necessário para amortização do crédito obtido com a compra da casa, água, eletricidade, gás, pacote de televisão/net/telefone, tendo unicamente liquidado a despesa do condomínio, sendo frequente o réu pedir dinheiro à autora para comprar cigarros.
65) O Réu realizava trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
66) Para além dos valores referidos em 62., de igual modo, a Autora auferiu e aufere outros rendimentos não contabilizados.
67) Em 03/12/2024, faleceu a mãe da filha do Réu CC - cf. certidão de óbito de fls. 359 dos autos.
*
Factos não provados:
a) Que a filha do réu, a GG, padece desde os 19 anos de leucemia mielóide crónica, não tendo podido acompanhar a filha nos momentos iniciais da doença.
b) Que a autora teve conhecimento do nascimento de CC em 2011, quando o réu veio passar férias, e com a intenção de não voltar para Angola.
c) Que em 2011 o Réu, em férias em Portugal foi obrigado a voltar para Angola contra a sua vontade.
d) Que o projeto de trabalho angolano era inicialmente apenas de um ano, pois seria apenas para adquirir um aparelho de topografia para o desempenho da sua atividade profissional por forma a poder estabelecer-se num negócio.
e) Que a autora compreendeu o comportamento do réu ao ter tido a relação amorosa com a mãe da CC, tendo-lhe perdoado;
f) Que a autora tinha as viagens pagas pela entidade patronal do réu em Angola apanhou malária e esteve em risco de vida.
g) Que quando o réu regressou definitivamente para Portugal, e após conseguir integrar-se no mercado de trabalho, os rendimentos obtidos foram maioritariamente para saldar dívidas contraídas pela autora.
h) Que o réu continua a dirigir à autora palavras de carinho e afeto, assim como a autora o faz, o que é reconhecido por todos os que convivem com o casal.
i) Que autora e réu mantêm interesse e hobbies em comum, que os animais domésticos (gato, peixes, pássaros, tartaruga) são de ambos, que tratam em comum, passam férias em comum o que aconteceu até à atualidade.
j) Que na reunião de família, a autora confessou que já sabia desde 2011 do nascimento da filha e que esteve estes anos todos à espera que o filho, saísse de casa para pedir o divórcio.
K) Que a autora tem também como fonte de rendimento a que lhe advêm da profissão de sócia de uma sociedade imobiliária.
l) Que a autora de 2006 até 2016 não pagou a Segurança Social do réu, não obstante o réu lhe ter pedido para o fazer, tendo-o prejudicado economicamente e comprometendo a sua sobrevivência no futuro.
m) Que o mesmo não aconteceu com a autora que não pagou a Segurança Social dela e o réu teve, a muito custo, que pagar.
n) Que no ano de 1998/99, altura em que o réu apanhou sífilis, a autora pela primeira vez informou o réu de que pretendia o divórcio.
o) Que devido à intervenção da mãe do Réu e da sua irmã, II, cunhada da Autora, estas convenceram a Autora a não se divorciar, sobretudo por causa das duas crianças, ainda pequenas à data.
p) Que desde essa altura, o Réu saía logo depois de jantar, deixando as duas crianças com a Autora e só regressando a altas horas da madrugada.
q) Que a autora adquiriu há cerca de dois meses o veículo automóvel de marca Opel com a matrícula .. .. LQ (Doc. 31).
r) Que foi a autora que pagou as suas despesas e ensino no Externato ... em 1989 na íntegra.
s) Que, quando a autora conheceu o Réu, este estava altamente endividado, tendo inclusive sido a autora, quem o ajudou a pagar as suas dívidas.
t) Que o réu quando esteve em Angola deixou mesmo de enviar qualquer valor para a autora.
u) Que nessa altura a autora se viu forçada a ter de suportar sozinha todas as despesas do casal e do agregado familiar.
v) Que o réu não vinha a Portugal, desculpando-se com a indicação de que o patrão não deixava.
w) Que mesmo quando esteve em B..., e quando ia ao fim de semana para o ..., a 800 km de distância, o réu mantinha sempre o telemóvel desligado.
x) Que quando o filho do casal, DD, estava na faculdade, na C..., a autora suportava a suas expensas um pagamento mensal de, aproximadamente, €500,00, mensalidade e material.
y) Que foram os pais e a tia da autora que emprestaram dinheiro para pagar a prestação da casa, que na altura rondava os € 800,00.
z) Que tais empréstimos efetuados ao casal ou para suprir as despesas da responsabilidade de ambos, ascendem, nesta data, a € 10.000,00 e que a autora e o réu nunca conseguiram pagar até hoje.
aa) Que nas férias em Setúbal, em 2022, dormiram separados.
bb) Que até finais de 2022, inícios de 2023, nunca o réu pretendeu coletar-se nas finanças nem efetuar descontos para a Segurança Social, por opção sua.
cc) Que quando regressou a Portugal em 2016, o réu não procurava trabalho e achava que não precisava de trabalhar, ficava o dia todo deitado no sofá.
dd) Que de maio de 2022 a Abril de 2023, a autora auferiu rendimentos nesse período no montante de €53.731,13 Euros.
ee) Desde o final do passado ano registou-se um decréscimo acentuado de trabalho e de faturação da autora fruto da conjuntura económica, não chegando a €1.000,00 mensais as quantias auferidas.

IV - Fundamentação jurídica
Do recurso interposto pelo R..
a - Da prova ilegal através de documento
Invoca o apelante R. que a A. encontrou análises do Recorrido, uma missiva privada dirigida ao Recorrente e que contém factos da vida privada deste e que A. utilizou abusivamente, sendo, portanto, esta prova ilegal nos termos do disposto no artigo 75º do Código Civil.
Dispõe o art.º 75.º/1 do C.C. que o destinatário de carta-missiva de natureza confidencial deve guardar reserva sobre o seu conteúdo, não lhe sendo lícito aproveitar os elementos de informação que ela tenha levado ao seu conhecimento.
A alegação do R. de que a A. tomou conhecimento da matéria através de carta não se encontra sustentada nos autos. A A. relatou que a médica de família lhe disse que ela devia ter sífilis e que lhe transmitiu que o R. padecia desta doença sexualmente transmissível. A alegação do R. em nada se prende com a fundamentação da matéria de facto, pelo que não tem cabimento. Pelo exposto, desatende-se a mesma.
*
b - Da nulidade da sentença arguida pelo R.
O R. alega que a sentença é nula nos termos do preceituado no art.º 615.º/1/d do C.P.C., por o tribunal ter conhecido questões de que não podia ter conhecimento. Invoca a violação do disposto no art.º 584.º/1 do C.P.C.. A norma aí contida prevê que só é admissível réplica para o autor deduzir toda a defesa quanto à matéria da reconvenção, não podendo a esta opor nova reconvenção.
O R. afirma que a A. excedeu o direito de resposta, pelo que existiria matéria que não podia ter sido levada aos factos assentes, e que o tribunal a quo conheceu de questões de que não podia ter tomado conhecimento.
O R. reporta matéria invocada em articulados, que, alegadamente, não o deveria ter sido.
Preceitua o art.º 615.º/1/d do C.P.C. que é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
A expressão questões sobre as quais o juiz não pode tomar conhecimento refere-se a assuntos ou matérias que não são da sua competência ou sobre os quais não devia pronunciar-se e não a factos indevidamente articulados.
Inexiste, assim, nulidade de que cumpra cuidar, improcedendo a arguição de nulidade com este fundamento.
*
O apelante aduz que a sentença é nula por condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir, por mais de um ano. Estaria vedada a fixação do início da separação de facto em março de 2023. Não se encontraria verificada a separação de facto prevista no art.º 1781.º/a) do Código Civil.
O n.º 2 do art.º 1789.º do C.C. dispõe o seguinte: Se a separação de facto entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode requerer que os efeitos do divórcio retroajam à data, que a sentença fixará, em que a separação tenha começado.
A alínea e) do art.º 615.º do C.P.C. prevê que é nula a sentença em que o juiz condena em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
As partes não requereram a fixação da data da separação de facto. A sentença excedeu quanto foi pedido, sendo, nessa medida, nula. Trata-se de nulidade de que o tribunal de recurso deve conhecer nos termos do art.º 665.º/1 do C.P.C..
Em conformidade, revoga-se a decisão na parte em que fixou a data da separação de facto.
*
Mais alega o R. que a decisão é nula por os fundamentos estarem em oposição com a decisão. Nos termos do disposto no art.º 615.º/1/c do C.P.C. é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
O apelante não esclarece o motivo ou motivos pelos quais se verificaria a apontada contradição, nem o tribunal os entrevê. Desatende-se, por isso, também esta nulidade.
Alega o apelante que o art.º 1672.º do C.C. é materialmente inconstitucional por violação do princípio da igualdade consagrado no art.º 13.º e o princípio da reserva da intimidade da vida privada e familiar consagrado no art.º 26.º/1 ambos da Constituição da República Portuguesa.
Sustenta o R. que foi a circunstância de a A. se ter recusado durante o casamento a consigo manter relações sexuais que causou direta e necessariamente o relacionamento sexual com outra mulher. A recusa da prática de relações sexuais pela A. com o R., sendo anterior aos factos praticados pelo R., anularia o seu comportamento de relacionamento sexual extraconjugal.
O art.º 1672.º prevê que os cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência.
A tese do R. é infundada. Desde logo, não decorre do direito civil vigente o propalado direito dos cônjuges ao relacionamento sexual. Já a fidelidade consta do elenco dos deveres do matrimónio. Assim, ao contrário do sustentado pelo R., a recusa da A. em consigo manter relações sexuais não o exime do dever de fidelidade.
O art.º 13.º/1 da Constituição da República Portuguesa prevê que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. Não se verifica violação do princípio da igualdade constitucionalmente consagrado na interpretação dada ao art.º 1672.º do C.C. na sentença porquanto o que vale para o R., vale também para a A.. A serem as posições de ambos invertidas, a solução jurídica seria precisamente a mesma.
Tampouco se verifica violação do direito à reserva da vida privada consagrado no art.º 26.º da C.R.P.. Foram as partes que trouxeram aos autos as questões assinaladas, só por essa razão tendo o tribunal tomado conhecimento e emitido o correspondente juízo jurídico, na estrita medida necessária à avaliação da existência de fundamento para o decretamento do divórcio.
Em suma, o tribunal não alcança em que medida a interpretação da norma possa ser inconstitucional, seja por violação do princípio da igualdade, seja por violação do princípio da reserva da intimidade da vida privada e familiar.
Desatende-se, em consequência, o pedido do R..
*
c - Da nulidade da sentença arguida pela A.
A A. considera que a sentença é nula nos termos da alínea c) do art.º 615.º do C.P.C. na parte em que a condenou a pagar pensão de alimentos ao R..
Alega que, não obstante a fixação da pensão de alimentos em € 200,00, foi condenada a pagar pensão mensal de € 250,00.
Nos termos do disposto no art.º 615.º/1/c do C.P.C. é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Foi proferido despacho a retificar o valor de € 200, 00 indicado na fundamentação jurídica como sendo aquele a fixar a título de alimentos para a quantia de € 250,00, referida na condenação.
Improcede, por isso, a arguição de nulidade.
*
A A. advoga a nulidade da sentença ainda com fundamento em ambiguidade, obscuridade e ininteligibilidade, porquanto o tribunal teria considerado matéria de facto como provada repetida e contraditória quanto às despesas suportadas pelo R., nos pontos 56.º, 57.º e 59.º dos factos provados.
Trata-se de nulidade suprível pelo tribunal. Uma vez que a apelante requer a apreciação desta factualidade no âmbito da impugnação da matéria de facto, a questão será apreciada nessa sede.
*
d - Da reapreciação da matéria de facto invocada pelo R.
O R. impugna o teor do facto provado n.º 19, que é o seguinte:
19) Em janeiro de 2007, a autora quando foi à médica de família (comum ao casal), foi confrontada por esta, pelo facto de o réu ter contraído uma doença sexualmente transmissível, de seu nome sífilis (cfr. doc. 1, fls. 3/3, teste positivo a VDRL, exames datados de 1-2007, conforme documentos de fls., 25 verso a 26 verso dos autos).
Esta matéria emerge do depoimento da A., tendo esta, porém, afirmado que a deslocação à médica de família ocorreu nos anos de 1998/1999 e que apesar de o R. já não ter a doença à data do exame carreado para os autos o resultado vem ainda positivo, por ter anticorpos. As declarações da A. afiguraram-se fidedignas e também o R. aceita ter contraído a doença. O doc. junto com a oposição à reconvenção, consistente em resultados de análises clínicas do R., dão o item VDRL (Venereal Disease Research Laboratory) como positivo. Trata-se de um exame de sangue utilizado para diagnosticar e monitorizar a sífilis, sendo o resultado suscetível de se manter positivo, mesmo após tratamento.
Assim, o ponto 19) passará a ter a seguinte redação:
19) Por volta dos anos de 1998/1999, a autora foi à médica de família (comum ao casal), tendo sido confrontada por esta com o facto de o réu ter contraído uma doença sexualmente transmissível, sífilis (cfr. doc. 1, fls. 3/3, teste positivo a VDRL, data da colheita de 9-1-2007).
O R. impugna o teor do ponto 20 dos factos assentes, segundo o qual o réu contraíra sífilis entre os anos de 88/91, em virtude de ter tido relações sexuais com outras mulheres, (altura em que a autora esteve grávida) e que por esse motivo também se passou a recusar a ter relações sexuais com o réu e o ponto 21), de acordo com o qual o Réu admitiu tal facto perante a autora quando foi confrontado por esta.
Da conjugação das declarações de A. e R. e do doc. aludido não é possível apurar quando terá o R. contraído sífilis, mas apenas que por volta de 1998/1999 já padeceria da doença. A A. depôs, todavia, no sentido de que o R., quando confrontado sobre se padecia da doença, negou que assim fosse. Tendo o R. reconhecido ter tido relações sexuais fora do casamento e tratando-se de enfermidade sexualmente transmissível de gravidade, decorre da normalidade da vida que o conhecimento pela A. da situação de doença possa ter integrado o núcleo de razões para que esta não estivesse disposta a manter relacionamento sexual com o R..
Pelo exposto, altera-se o ponto 20) dos factos assentes nos seguintes moldes:
20 - O R. contraiu sífilis no contexto de relacionamento sexual fora do casamento, em data não concretamente determinada, sendo que em 1998/1999 já teria sido infetado.
O facto 21, pelo motivo sobredito, é eliminado.
Relativamente ao facto 22) - Posteriormente, em novembro de 2016, o Réu veio definitivamente para Portugal e, desde logo, a Autora descobriu, na mala do seu marido, um assento de nascimento da menor, CC -, entende o R. que a A. já anteriormente tomara conhecimento do nascimento da filha do R. CC - afirma que a A. tomou conhecimento em 2011. Conjugadas as declarações de parte e os depoimentos das testemunhas, não é claro o modo como a A. apurou o nascimento de CC ou o momento em que o conhecimento se verificou.
Assim, altera-se o ponto 22, passando este a figurar nos seguintes termos:
22 - Em data não concretamente apurada, a A. teve conhecimento do nascimento de CC.
Pretende o R. que os factos 23, 24, 25, 26 e 31 não correspondem à realidade, por considerar que o casal se manteve em bons termos.
Estão em causa os seguintes factos:
23) Desde essa data e pelo mencionado motivo, começou a verificar-se um afastamento e distanciamento entre o casal, passando, nessa altura, a autora a recolher-se cedo no seu quarto.
24) E desde 2019, altura em que começou a trabalhar como solicitadora no seu escritório, chegava a casa, apenas, ao fim do dia, recolhendo-se no quarto logo após o jantar, onde assistia à televisão.
25) Em virtude destes factos, não mais voltaram a dormir na mesma cama, passando o Réu a dormir, ininterruptamente até ao dia de hoje, num sofá na sala e a autora no quarto onde era costume ali assistir à televisão.
26) A autora e réu deixaram de ter interesses ou hobbies em comum.
31) A autora sempre que falava com o réu dizia-lhe que não havia dinheiro, sendo que as discussões do casal incidiam maioritariamente à volta de dinheiro.
Pese embora os depoimentos elogiosos relativamente à vida em comum do casal da irmã e do cunhado do R., JJ e KK, respetivamente, as próprias declarações do R. e as declarações da A., do filho do casal e da namorada, bem como da irmã da A., FF deste são elucidativas do afastamento do casal, na senda, aliás, do que foi a respetiva convivência em comum desde o início do casamento. O próprio R. declara: de facto, ela depois do meu filho nascer, ela nunca mais quis saber de mim. Eu tentei, tentei com ela e nada. Disse ainda: Pago a minha alimentação visto que ela um dia me atirou em cara: ah, estou-te a sustentar, quer dizer uma pessoa que passa toda a vida a trabalhar para ela e depois ela tem a lata de me dizer: ai estou-te a sustentar, a partir daquele momento eu disse olha: nem mais um alimento vem para mim da tua mão!”. Mais afirmou o R.: esta AA que existe agora, eu não conheço. Talvez por causa da menopausa e de estar independente, tornou-se uma pessoa assim altamente importante e a mim descartou-me.
Está evidenciado que o relacionamento entre A. e R. não corresponde à relação de companheirismo e de amizade propalada pelo R..
Não se entrevê, assim, fundamento, para a alteração.
Entende o R. que existe contradição entre o facto provado 49) (Em 2022, a A. e o R. foram três dias à cidade de Setúbal) e a circunstância de ter sido dado como assente que deixaram de dormir juntos. Desconhece-se as circunstâncias em que A. e R. dormiram em Setúbal. De toda a maneira, a circunstância de um casal dormir junto durante três dias não contraria que a regra do dia-a-dia consistisse em dormirem separados. Inexiste contradição a apontar.
O R. sustenta que, para além de ter ido em passeio com a A. a Setúbal, houve lugar a outros passeios em comum. Desconhecendo-se que concretos passeios, a que locais e em que momentos, indefere-se a pretensão do R. de que seja dado como assente que estes ocorreram.
Defende o A. que o facto 64 não foi corretamente julgado.
Tem este o seguinte teor:
64) Durante o ano de 2023, o réu pouco ou nenhum dinheiro entregou à Autora, nomeadamente o dinheiro necessário para amortização do crédito obtido com a compra da casa, água, eletricidade, gás, pacote de televisão/net/telefone, tendo unicamente liquidado a despesa do condomínio, sendo frequente o réu pedir dinheiro à autora para comprar cigarros.
Não se vislumbra fundamento para alterar esta matéria. O próprio R. reconheceu que depois de a A. ter comunicado que pretendia divorciar-se ficou desorientado, com dificuldade em trabalhar e que os réus rendimentos eram diminutos.
Considera o R. que o tribunal a quo julgou incorretamente a seguinte matéria de facto dada como não provada:
b) Que a autora teve conhecimento do nascimento de CC em 2011, quando o réu veio passar férias, e com a intenção de não voltar para Angola.
e) Que a autora compreendeu o comportamento do réu ao ter tido a relação amorosa com a mãe da CC, tendo-o perdoado;
i) Que autora e réu mantêm interesse e hobbies em comum, que os animais domésticos (gato, peixes, pássaros, tartaruga) são de ambos, que tratam em comum, passam férias em comum, o que aconteceu até à atualidade.
h) Que o réu continua a dirigir à autora palavras de carinho e afeto, assim como a autora o faz, o que é reconhecido por todos os que convivem com o casal.
A propósito da alínea b) já nos pronunciámos, no sentido de não se ter apurado o momento em que a A. tomou conhecimento do nascimento de CC, pese embora a afirmação do R. de que tal se deu em 2011.
Relativamente às alíneas e), i) e h) transcritas, decorre da prova produzida, e até mesmo dos articulados do R. e das respetivas alegações, que a relação do casal, ao contrário do por si veiculado, se pautou por afastamento emocional, falta de confiança e descontentamento recíprocos, evidenciados pela ausência de vida e afetividade sexual, nojo manifestado pela A. relativamente ao R., relações extraconjugais do R., contração de doença sexualmente transmissível pelo R., nascimento de filha do R. fora do casamento, ocultação desse facto à A. e acusações do R. de que a A. se aproveitou de quanto aquele auferiu enquanto tal lhe foi benéfico e de que continua à espera de que a A. mude para a pessoa que deseja enquanto mulher ao fim de mais de 30 anos de casamento.
Indefere-se, assim, a alteração.
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e - Da reapreciação da matéria de facto pedida pela A.
A A. requer que o ponto 55.º dos factos assentes adote a seguinte redação, uma vez que se refere a rendimentos declarados e não aos efetivamente auferidos: “Os rendimentos declarados do Réu no ano de 2023 foram € 4.210,00 e no ano de 2024 no valor de € 1.800,00”.
O ponto 55 tem a seguinte redação:
55) O réu auferiu em 2023 cerca de € 4.210,00 Euros, pelo que apenas auferiu o valor mensal de 351 Euros e em 2024 o montante de €1.800,00 (cfr. documento da AT de fls., 365 dos autos).
Assiste razão à A. na sua afirmação de que estão apenas em causa os rendimentos declarados à autoridade tributária. Assim, a fim de que a questão fique clara, o ponto 55 passará a adotar a seguinte redação:
Os rendimentos declarados pelo R. referentes ao ano de 2023 foram de € 4.210,00 e no ano de 2024 de € 1 800,00”.
A A. pede que o ponto 65.º dos factos assentes adote a seguinte redação: O réu realizava e realiza ainda trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
A atual redação do ponto 65 é a seguinte:
65 - O réu realizava trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
Afigura-se que está em causa uma questão de precisão terminológica, já que não está em causa que o A. tenha deixado de realizar trabalhos no âmbito da sua atividade. O ponto 65 passará a ter a seguinte redação:
65 - O réu efetuou e continua a levar a cabo trabalhos não faturados e declarados e, pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
A A. requer que o ponto 66.º seja eliminado ou considerado como matéria não provada. Aduz que inexistem indícios do referido.
O facto 66 tem a seguinte redação: 66) Para além dos valores referidos em 62., de igual modo, a autora auferiu e aufere outros rendimentos não contabilizados.
Não é possível dizer com um mínimo de segurança que a A. aufira rendimentos não contabilizados, supondo-se que esta referência seja a rendimentos não declarados. Atende-se a pretensão da A. suprimindo-se o ponto 66.
A A. requer que onde no ponto 57 consta € 50,00 de despesas médicas e medicamentosas passe a constar 38,30 despesas médicas e medicamentosas por inexistir prova diversa.
A prova produzida a este respeito consiste na liquidação de IRS dos rendimentos de 2023, junta pelo R. em 7-2-2025, segundo a qual o casal apresentou despesas de saúde de € 459,65, a que corresponde uma média mensal, de € 38,30.
Defere-se a alteração, passando a integrar o ponto 57 a quantia de € 38,30 de despesas médicas e medicamentosas médias.
A A. requer que o ponto 59 seja eliminado, atento o que consta do ponto 56 quanto às despesas de saúde e porque não faz sentido a referência à prestação de alimentos à filha CC.
O ponto 59 tem o seguinte teor:
59 - Por seu turno, o réu tem despesas mensais próprias de alimentação no montante de € 300,00, de transportes de € 60,00, de vestuário de € 20,00 e ainda de saúde de €100,00, que totalizam o montante mensal de € 480,00, a que acresce o valor de € 200,00 a título de prestação de alimentos à sua filha CC - cfr. documento de fls. 372 e 373 dos autos.
Relativamente às despesas de saúde, atento o que se disse a propósito do ponto 57, existindo inclusivamente contradição entre o montante das despesas próprias do R. e das despesas totais do casal, elimina-se esta referência.
Quanto às despesas com alimentação, consta também da matéria assente que A. e R. têm despesas comuns com alimentação de € 300,00, pelo que a referência a despesas de alimentação do R. passará para a quantia de € 150,00, metade do valor correspondente à alimentação de A. e R..
No que se refere ao pagamento de alimentos à filha CC, o R. declarou que entrega uma média de € 200,00 mensais, que, em momento posterior do seu depoimento, fixou em € 250,00. Mais afirmou que é um amigo que leva o dinheiro em mão. Doutro passo, depôs no sentido de que a irmã e o próprio também transferem dinheiro para Angola. Mais afirmou que o pai, enquanto era vivo, ajudava e que a irmã também ajuda. A documentação carreada para os autos como comprovando a existência de transferências para o sustento de CC são duas transferências de LL para MM, a primeira de 8-11-2024 e a segunda de 23-12-2024, com a descrição para CC filha BB. Trata-se de elementos que não atestam as entregas à filha do R. ou a quem desta cuide, cuja identidade se desconhece.
Afigura-se-nos que não existe evidência de que o R. destine efetiva e regulamente parte dos seus rendimentos aos cuidados de sua filha residente em Angola. O R., aliás, afirma não dispor de meios para o efeito.
Tudo visto, o ponto 59 passará a adotar a seguinte redação:
59 - O réu tem despesas mensais próprias de alimentação no montante de € 150,00, de transportes de € 60,00 e de vestuário de € 20,00.
A A. requer que seja aditado um novo ponto à matéria dada como provada, com o seguinte teor: “As despesas mencionadas no ponto 57 da matéria assente, apesar de serem da responsabilidade da Autora e do Réu, posteriormente à instauração do divórcio, têm vindo a ser pagas apenas pela Autora, com exceção das despesas do condomínio, que têm vindo a ser pagas pelo Réu.”.
A A. aduz que esta matéria releva para efeitos de partilha. No que se refere à alegação de que o pagamento é da responsabilidade de A. e R. trata-se de conclusão de índole jurídica. No mais, está em causa matéria posterior à propositura da ação e irrelevante para efeitos dos presentes autos de divórcio.
Improcede a pretensão da A..
A A. entende que o ponto 60 deverá adotar a seguinte redação:
60 - O réu necessita de tratamento dentário, pois tem pouca dentição.
O ponto 60 tal como consta da sentença tem o seguinte teor:
60) O réu necessita de tratamento dentário, pois tem pouca dentição e alguns focos de infeção gengival.
Quer o R., quer o filho do casal depuseram no sentido de o R. precisar de tratamentos dentários.
O tribunal entende que a constatação direta em julgamento acerca do número de dentes e de infeção gengival não constitui meio de prova adequado para questão de índole médica. A referência a pouca dentição é de índole conclusiva. Por isso, altera-se o ponto 60, que passará a adotar a seguinte redação:
60 - O réu necessita de tratamentos dentários.
A A. requer que o ponto 64 passe a adotar o seguinte teor:
Durante o ano de 2023, o Réu pouco ou nenhum dinheiro entregou à Autora, nomeadamente o dinheiro necessário para amortização do crédito obtido com a compra da casa, água, eletricidade, gás, pacote de televisão/net/telefone, tendo unicamente liquidado a despesa do condomínio, sendo frequente o réu pedir dinheiro à autora para comprar cigarros, facto este que apenas aconteceu anteriormente ao divórcio ser instaurado e em alturas em que este entregava o dinheiro que ganhava à Autora, isto é, o dinheiro que ele pedia para cigarros, não era dinheiro da Autora, mas sim dinheiro que havia sido ganho por ele.
O atual ponto 64 tem o seguinte teor:
64) Durante o ano de 2023, o Réu pouco ou nenhum dinheiro entregou à Autora, nomeadamente o dinheiro necessário para amortização do crédito obtido com a compra da casa, água, eletricidade, gás, pacote de televisão/net/telefone, tendo unicamente liquidado a despesa do condomínio, sendo frequente o réu pedir dinheiro à autora para comprar cigarros.
O acrescento consiste no seguinte: facto este que apenas aconteceu anteriormente ao divórcio ser instaurado e em alturas em que este entregava o dinheiro que ganhava à Autora, isto é, o dinheiro que ele pedia para cigarros não era dinheiro da Autora, mas sim dinheiro que havia sido ganho por ele.
O pedido do R. integra uma conclusão, refere factos posteriores aos articulados e é confuso nos seus próprios termos, já que, se o R. entregava algum dinheiro à A., sempre se poderá entender que o dinheiro entregue pela A. ao R. para a aquisição de cigarros era o próprio dinheiro que este lhe tinha entregue.
Em face do exposto, indefere-se o requerido.
A A. requer que o ponto 65.º da matéria assente seja alterado nos seguintes termos:
65) O réu realizava e realiza ainda trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
O atual ponto 65 tem o seguinte teor:
65) O réu realizava trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
Ainda que a A. pareça entender que a introdução da expressão realiza altera o sentido do ponto 65, entende-se que a referência ao exercício da sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos contempla a pretensão daquela. Efetivamente, está abrangida a continuidade da atividade profissional do A.. De toda a maneira, para que a questão fique clara, introduz-se a seguinte redação:
65) O réu realizava e continua a realizar trabalhos não faturados e declarados, e pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
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f - Se se verificam os pressupostos para decretar a dissolução do matrimónio contraído entre A. e R..
Dispõe o art.º 1577.º do Código Civil que casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida.
Nos termos do disposto no art.º 1781.º do C.C., constituem fundamento do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges, assinaladamente:
a) A separação de facto por um ano consecutivo;
d) Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a rutura definitiva do casamento.
A extinção da comunhão de vida pode ocorrer por causas objetivas cuja relevância é independente de violação dos deveres conjugais que eventualmente lhes seja subjacente e é justificada pela situação de rutura da relação matrimonial por elas originada.
Decorrido o lapso de tempo de um ano, presume-se que a crise do casamento é irreversível.
Por separação de facto entende a lei a inexistência de comunhão de vida entre os cônjuges desde que haja da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer (art.º 1782.º do C.C.).
A separação de facto (causa objetiva do divórcio) verifica-se quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges: o casal não conversa, não partilha as refeições, não dorme na mesma cama, não partilha as incumbências e tarefas domésticas, não mantém projetos em comum. À causa objetiva do divórcio há a acrescer a intenção, de um ou de ambos os cônjuges, de não reatamento.
Não restam, assim, dúvidas de que a lei pretende evitar que qualquer um dos cônjuges se mantenha casado contra a sua vontade.
Verificada a separação, qualquer dos cônjuges tem o direito de pôr termo ao matrimónio, detendo legitimidade para intentar a competente ação (art.º 1785.º/1 C.C.).
Escreve Pereira Coelho (Divórcio e separação judicial de pessoas e bens na reforma do Código Civil, 1981, 37): o dever de coabitação reveste-se de grande plasticidade. Tudo depende das circunstâncias e há uma grande variedade de situações. Pode haver residências separadas - o art.º 1673 permite-o - e, todavia, haver comunhão de vida (v.g., o caso dos emigrantes). Ao elemento objetivo, que é a matéria da separação de facto, há de pois, acrescer um elemento subjetivo, que anima essa matéria e lhe dá forma e sentido; consiste ele numa disposição interior: o propósito, como diz o artigo, da parte de ambos os cônjuges ou de um deles de não restabelecer a comunhão de vida matrimonial.
Está em causa a mudança do paradigma de divórcio sanção para divórcio fundado em razões objetivas. O legislador adotou um modelo de divórcio fundado em causas objetivas e já não subjetivas, fundado na rutura definitiva da vida afetiva e familiar, por contraponto ao modelo de divórcio que sanciona o incumprimento dos deveres advenientes do casamento.
Lê-se no ac. do S.T.J., de 9-2-2012 (proc. 819/09.7TMPRT.P1.S1, Hélder Roque, consultável in http://www.dgsi.pt/, tal como os demais acórdãos que vierem a ser nomeados, salvo indicação diversa): é agora a conceção do divórcio unilateral e potestativo, em que um dos cônjuges pode por termo ao casamento, por simples declaração de vontade singular, sem que haja lugar à apreciação da culpa ou à aplicação de sanções, o que acaba por significar que o fundamento da rutura se traduz na inexistência de uma plena comunhão de vida entre os cônjuges, a que alude o artigo 1577º, do CC, isto é, numa expressão mais redutora, quando a «affectio conjugalis» e a cumplicidade entre os cônjuges baixou ao grau zero de satisfação para um deles, e em que a lei não pode sobrepor-se ou substituir-se à vontade do cônjuge que pretende a dissolução do seu casamento.
Trata-se, afinal, do direito ao casamento e do direito ao divórcio como duas faces inseparáveis da mesma moeda, expressão do princípio da autonomia da vontade, que, na hipótese do divórcio, pode ainda ser decretado, em consequência da vontade unilateral de um dos cônjuges, nos casos e termos previstos na lei, atento o estipulado pelos artigos 406º, nº 1 e 1781º, do CC, na sequência do entendimento que reconduz o casamento a um contrato dissolúvel pela vontade das partes, porque celebrado com vista à sua felicidade.
Com efeito, o chamado divórcio-rutura, em contraposição ao divórcio-sanção, funda-se em causas objetivas, designadamente a separação de facto, reconhecendo-se que o vínculo matrimonial se pode perder independentemente da causa do fracasso da vida conjugal. E, se para a separação de facto o legislador estipulou um prazo mínimo de um ano para a obtenção do desiderato de dissolução do vínculo matrimonial, consagrou ao mesmo tempo uma cláusula geral de dissolução do matrimónio, independente de culpa e sem qualquer dependência de prazo, constante da alínea d), ou seja, consagrou como fundamento do divórcio “quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a rutura definitiva do casamento”.
No caso sub judice está provado que o relacionamento entre A. e R. foi incipiente desde o início do matrimónio, que A. e R. não mantêm relacionamento íntimo, não conversam, não saem juntos e não fazem vida social em comum e que o afeto, pelo menos da parte da A. não está contemplado.
Pelo menos desde o regresso do R. a Portugal, vindo de Angola, que se verifica afastamento e distanciamento entre o casal, passando a A. a recolher-se cedo ao seu quarto. Desde 2019 que a A. chegava a casa apenas ao fim do dia, recolhendo-se no quarto logo após o jantar. A. e R. não mais voltaram a dormir na mesma cama, passando o R. a dormir, ininterruptamente num sofá na sala e a A. no quarto. A. e R. deixaram de ter interesses ou hobbies em comum. Mais se apurou que a A. não tem propósito de restabelecer a vida conjugal.
Em suma, ao contrário do veiculado pelo R., a vida do casal pauta-se por afastamento emocional, falta de confiança e descontentamento recíprocos, evidenciados pela ausência de vida e afetividade sexual, nojo manifestado pela A. relativamente ao R., relações extraconjugais do R., contração de doença sexualmente transmissível pelo R., nascimento de filha do R. fora do casamento, ocultação desse facto à A. e acusações do R. de que a A. se aproveitou de quanto aquele auferiu enquanto tal lhe foi benéfico e de que continua à espera de que a A. mude para a pessoa que deseja enquanto mulher ao fim de mais de 30 anos de casamento.
Tudo isto, é certo, apesar de A. e R. terem continuado a habitar sob o mesmo teto (ainda que com notícia de que a partir de 31 de maio de 2025 a A. se terá mudado para um apartamento), sendo que os autos não evidenciam o motivo, ou os motivos, pelo qual, ou pelos quais, tal se verifica.
Como é do conhecimento comum, os cônjuges e até os ex-cônjuges continuam não raro a habitar a mesma casa por questões de ordem prática ou económica. Tal não significa que vivam efetivamente juntos, ou seja, em comunhão de vida. À semelhança de estranhos e meros conhecidos que partilham a mesma casa, também os cônjuges desavindos o podem fazer. Assim, a realidade reportada de habitação na mesma morada em nada contraria a efetiva rutura do casal e a verdade afetiva do mesmo. Trata-se de questão que não constitui obstáculo ao divórcio.
Em súmula, a A. pretende fazer cessar o seu casamento com o R., com quem deixou de ter a convivência própria dos cônjuges, sob qualquer dos enfoques normalmente apontados, seja a intimidade, seja a afetividade. A A. está determinada em não retomar a vida em comum com o R..
Os factos enunciados são expressivos da separação de facto mantida há bem mais do que um ano, deixando intuir a manifesta irreversibilidade da incompatibilidade do casal para a vida a dois.
A circunstância de a A. ter deixado decorrer vários anos sem propor ação de divórcio depois de saber que o R. contraiu doença sexualmente transmissível e de que este teve uma filha de outra mulher não lhe retira a possibilidade de agora o vir fazer. Não se verifica, ao contrário do pugnado pelo R., abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium. O decurso do tempo, por si só, não integra abuso do direito, podendo o titular do direito ao divórcio exercê-lo no momento que para si é o adequado. A lei confere à A. a liberdade de decidir se quer ou não permanecer casada, independentemente daquilo que o R. a esse propósito possa entender.
A pretensão do R. de ver a decisão que decretou o divórcio revogada não pode deixar de improceder.
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g - Do direito do R. a perceber alimentos da A..
De acordo com o n.º 1 do art.º 2003.º do Código Civil, por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário.
O art.º 2004.º do mesmo Código define a medida dos alimentos, determinando que os mesmos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los e que na sua fixação concreta se atenderá à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 2009.º do C.C., estão vinculados à prestação de alimentos o cônjuge e o ex-cônjuge.
Por referência ao divórcio e à separação judicial de pessoas e bens, preceitua o art.º 2016.º/1 do C.C. que cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio, o n.º 2 que qualquer dos cônjuges tem direito a alimentos, independentemente do tipo de divórcio e o n.º 3, que por razões manifestas de equidade, o direito a alimentos pode ser negado.
O n.º 1 do art.º 2016.º-A define critérios para a definição do montante da prestação alimentar na sequência do divórcio ou da separação de bens nos seguintes termos: na fixação do montante dos alimentos deve o tribunal tomar em conta a duração do casamento, a colaboração prestada à economia do casal, a idade e estado de saúde dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, o tempo que terão de dedicar, eventualmente, à criação de filhos comuns, os seus rendimentos e proventos, um novo casamento ou união de facto e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades do cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do que os presta.
Nos termos do n.º 3 do normativo citado, o cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio.
Da leitura destes preceitos decorre que só na eventualidade de o ex-cônjuge não conseguir prover à sua subsistência e de o outro cônjuge reunir condições económicas, deverá ser decretada a pensão de alimentos, quantificada esta de acordo com os critérios enunciados no n.º 1 do art.º 2016.º-A.
A lei acentua ainda o seu caráter restritivo nos seguintes moldes: o ex-cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio e por razões de manifesta equidade pode ser negado o direito a alimentos.
O sentido da obrigação de prestação de alimentos não consiste em garantir um nível de vida ao alimentando superior ao do alimentante, mas sim, e apenas, o de garantir a sua subsistência. Conforme se retira do já citado art.º 2016.º-A/3 do C.C., não assiste sequer ao alimentando o direito a manter o mesmo nível de vida.
Por outra parte, nos termos do preceituado no art.º 2019.º, sob a epígrafe cessação da obrigação alimentar, em todos os casos referidos nos artigos anteriores, cessa o direito a alimentos se o alimentado contrair novo casamento, iniciar união de facto ou se tornar indigno do benefício pelo seu comportamento moral.
E segundo o art.º 2012.º (alteração dos alimentos fixados), se, depois de fixados os alimentos pelo tribunal ou por acordo dos interessados, as circunstâncias determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos taxados ser reduzidos ou aumentados, conforme os casos, ou podem outras pessoas ser obrigadas a prestá-los.
O regime a reter consiste em que em caso de divórcio cada um dos ex-cônjuges deve prover à sua subsistência. Apenas se a um deles tal não for possível, assiste ao outro o direito a receber alimentos do cônjuge que os possa prestar. Trata-se ainda de um direito mutável, em função das circunstâncias da vida de alimentante e alimentado.
Note-se ainda que a Lei nº 61/2008, de 31/10, que introduziu alterações no regime dos alimentos entre ex-cônjuges, foi claramente num sentido restritivo. O legislador aderiu ao princípio da autossuficiência, tornando o direito a alimentos entre ex-cônjuges subsidiário e temporário.
Escreve Tomé de Almeida Ramião (in O divórcio e questões conexas, Quid iuris, p. 92): o direito a alimentos não deve perdurar para sempre, competindo ao ex-cônjuge providenciar e esforçar-se pela angariação de meios de subsistência e não ficar dependente do outro cônjuge e este, por sua vez, eternamente vinculado a essa obrigação assumindo a natureza temporária, com vista a permitir ao cônjuge que deles careça a satisfação das suas necessidades básicas nos primeiros tempos subsequentes ao divórcio, de modo a permitir-lhe o mínimo de condições para regularizar a sua vida.
Como consequência da adoção do sistema de divórcio constatação da rutura, por via do que a nossa lei consagra atualmente o princípio da autossuficiência, decorre o carácter temporário da obrigação a favor dos ex-cônjuges (cf. artigo 2016.º do C. Civil), isto é, a regra geral, em matéria de alimentos entre ex-cônjuge, depois do divórcio ou da separação judicial de pessoas e bens, é a de que cada cônjuge deve prover à sua subsistência, constituindo exceção o direito a alimentos, a que qualquer dos cônjuges tem direito independentemente do tipo de divórcio, sendo que, por razões manifestas de equidade, o direito a alimentos pode ser-lhe negado; sendo fundada a dita obrigação num dever de solidariedade pós conjugal, a sua constituição depende da necessidade do credor e das possibilidades do devedor; de carácter essencialmente alimentar, a prestação fica sujeita a alterações nos termos do artigo 2102º do Código Civil e cessa tão logo o titular do direito seja capaz de prover à sua subsistência ou o devedor fique sem recursos que lhe permitem continuar a suportá-la (cfr. artigos 2012º e 2013º ainda do mesmo C.Civil) (in ac. Relação de Coimbra de 19-12-2018, 1676/19.0T8VIS-B.C1, Luís Cravo, consultável in www.dgsi.pt).
No caso dos autos, a A. foi condenada a pagar ao R. pensão de alimentos no montante de € 250,00 mensais.
É esta situação que a A. pretende reverter, considerando infundado que fique adstrita ao pagamento de prestação de alimentos ao ex-cônjuge, por este deles não carecer e por ela não os poder prestar.
Sumariemos a situação económica de um e de outro dos cônjuges.
No que se refere aos rendimentos, a A. tem como meios de vida os que lhe advêm da profissão de solicitadora. Os seus rendimentos declarados em 2023 foram de €19085,74 e em 2024 de €15260,00.
No que concerne ao R., este aufere pensão de reforma no valor de € 431,92. Os rendimentos declarados pelo R. referentes ao ano de 2023 foram de € 4210,00 e no ano de 2024 de € 1800,00. Pontualmente, exerce a sua atividade profissional por conta própria, daí auferindo proventos variáveis e incertos.
Vêm enunciadas enquanto despesas comuns as seguintes:
- €586,75 de crédito de habitação da casa de morada de família;
- €60,00 de água;
- €130,00 de eletricidade e gás;
- €67,00 de Nos, tv, internet e telefone - incluindo 2 telemóveis;
- €75,00 de condomínio;
- €132,96 de seguro associado ao crédito da habitação
- €38,30 de despesas médicas e medicamentosas médias.
- €100,00 de gasolina;
- €300,00 de alimentação.
O montante total das despesas comuns é € 1 490,00. A dividir pelos dois cônjuges equivale a € 745, 00 para cada um.
Enquanto despesas próprias da A. vêm enunciadas as seguintes, com o seu escritório de solicitadoria:
- €25,00 – MEO;
- €26,00 – água;
- €15,00 – eletricidade.
Enquanto despesas próprias do R. constam despesas de transportes de € 60 e de vestuário de € 20.
Em súmula, quanto às despesas, as despesas comuns ascendem a € 1490,00, as despesas próprias da A. a € 81,00 e as do R. a € 80,00. É certo, porém, que também a A., embora estas não venham reportadas, terá forçosamente despesas com vestuário.
Por referência ao ano de 2023, os rendimentos da A. correspondem a € 1590, 47 mensais. Por referência ao ano de 2024, os rendimentos da A. correspondem a € 1271,66 mensais.
Os rendimentos do R., reportados ao ano de 2023, correspondem a € 782,75 (€ 431,92 + 350,83 (€ 4210,00: 12 = 350,83).
Os rendimentos do R., reportados ao ano de 2024, correspondem a € 581,92 (€ 431,92 + 150,00 (€ 1800,00: 12 = 150,00)).
A questão a dilucidar não incide propriamente na análise precisa e específica de cada item de ganhos e de despesas, pois, quer uma, quer a outra parte se podem colocar em situação de trabalhar mais ou menos, auferir quantia mais ou menos vultuosa e, sobretudo, podem incorrer em gastos maiores ou menores. Nenhuma das partes poderá ser qualificada de rica ou abonada, mas, ao cabo e ao resto, quer o A., quer a R. têm rendimentos condizentes com o habitual para sua situação económica e social no contexto do país.
Não tem o tribunal como aquilatar se A. e R. poderão trabalhar mais horas, de forma mais lucrativa, ou se as suas condições de saúde o permitem.
Vimos já que o montante de € 1490,00 (montante das despesas comuns) a dividir por dois equivale a € 745,00. Será forçoso concluir que o R., em princípio, não disporá de meios suficientes para acudir às suas despesas, isto se suportar metade das despesas comuns.
A maior dificuldade consiste na circunstância de as despesas comuns corresponderem à maior parcela das despesas. Ora não é possível concluir que as despesas reportadas se manterão. Pelo contrário, é previsível que cada um dos cônjuges passe a ter despesas autónomas. Existe inclusivamente já notícia de que a A. não vive na casa de morada de família. Tampouco é possível descortinar quem suporta atualmente as despesas e que despesas são e serão suportadas por cada um dos cônjuges após a separação.
Em suma, atento o facto de a generalidade das despesas ter sido indicada como comum, visto que os cônjuges se mantinham debaixo do mesmo teto, as despesas que doravante venham a suportar não se mostram apuradas. Inexiste, assim, prova da necessidade de alimentos do R. para fazer face à sua subsistência e da capacidade da A. de os prestar.
Deve, em consequência, ser revogada a sentença na parte em que condenou a A. a prestar alimentos ao R..
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V - Dispositivo
Pelos fundamentos sobreditos, acorda-se:
- em julgar o recurso interposto pelo R. improcedente, mantendo-se a decisão recorrida na parte em que decretou o divórcio, revogando-se, porém, na parte em que fixou a data da separação de facto e
- em julgar o recurso interposto pela A. inteiramente procedente, revogando-se a decisão que a condenou a prestar alimentos ao R..
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Custas pelo R., quer no que se refere ao recurso por si interposto, quer no que respeita ao recurso interposto pela A., atento o decaimento, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário (art.º 527.º/1/2 do C.P.C.).
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Porto, 10-11-2025
Teresa Fonseca
Carlos Gil
José Eusébio Almeida