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ANULAÇÃO DE DELIBERAÇÃO DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
OBRAS DE CONSERVAÇÃO EXTRAORDINÁRIA
PRÉVIA OBTENÇÃO DE TRÊS ORÇAMENTOS
Sumário
Sumário1: I. A impugnação da decisão sobre matéria de facto que se reporte a factos insuscetíveis de conduzir à alteração da decisão sobre o mérito da causa constitui numa atividade processual inútil, pelo que deve o Tribunal da Relação rejeitá-la (art. 130º do CPC). II. A impugnação da decisão sobre matéria de facto não pode conduzir ao aditamento ao elenco de factos provados de factos não alegados pelas partes nos articulados, exceto se estiverem em causa factos instrumentais, complementares ou concretizadores, ou ainda se se tratar de factos notórios ou de que o Tribunal tenha conhecimento por virtude do exercício das suas funções, e se relativamente a estes for observado o princípio do contraditório, (arts. 5º, nºs 1 e 2 e 3º, nº 3 do CPC). III. A aprovação, em assembleia de condóminos, de uma deliberação que determine a realização de obras de conservação extraordinária do edifício depende da prévia obtenção de pelo menos três orçamentos (art. 1436º, nº 2 do Código Civil2). IV. A formalidade referida em III. só pode ser preterida se o regulamento do condomínio estipular em sentido diverso ou se a assembleia de condóminos deliberar dispensá-la (idem). V. Tendo a assembleia de condóminos aprovado obras de conservação extraordinária sem prévia obtenção de três orçamentos que contemplassem todos os trabalhos a executar, não se apurando a existência de regulamento de condomínio que dispusesse em sentido diverso, e não tendo sido provado que a assembleia de condóminos tenha deliberado dispensar a prévia obtenção de três orçamentos, as deliberações da mesma assembleia que aprovaram a realização de tais obras e determinaram a repartição dos respetivos encargos são anuláveis (art. 1433º, nº 1 do CC).
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
1. Relatório3
AA4 intentou a apresente ação declarativa constitutiva sob a forma comum, contra Condomínio do prédio sito na Rua 15, BB6, CC7, DD8, e EE9, pedindo que:
a. seja declarada a anulação da deliberação tomada na assembleia de condóminos do prédio sito na Rua 2, realizada em 22 de Maio de 2022, que aprovou o orçamento apresentado pela firma FF F. B., incluindo a alteração da coluna de água e esgotos assim como pintura interior das zonas comuns, no valor global de 79.740,09 €.
b. seja declarada nula a deliberação que aprovou o contributo extraordinário a prestar por cada condómino no montante de 15.948,02 € e a forma e os prazos de pagamento do mesmo.
Para tanto alegou, em síntese, que:
• vem sendo representada nas assembleias de condóminos por GG e que tal também sucedeu na assembleia realizada em 22.05.2022, não tendo todavia sido admitida a participação do seu representante por não ter apresentado procuração;
• na assembleia de 22 de Maio de 2022, sem considerar o voto contra expresso pelo procurador da autora, foi aprovado por unanimidade orçamento da firma FF F. B., incluindo a alteração da coluna de água e esgotos assim como pintura interior das zonas comuns, no valor global de 79.740,09 €;
• estes trabalhos que não coincidiam com os orçamentos que haviam sido solicitados a outras empresas, inexistindo caderno de encargos que lhe tenha servido de base.
Os réus contestaram, invocando a exceção de abuso do direito e impugnando a factualidade invocada na petição inicial, sustentando que:
• o representante da autora foi autorizado a participar na assembleia de condóminos e a aí exprimir o seu voto, comprometendo-se a enviar à administração a procuração outorgada pela autora, o que não fez, nem a autora ratificou o ato, motivo pelo qual não foi a autora considerada como representada;
• o condomínio enviou à autora a carta registada com aviso de receção dando-lhe conhecimento da deliberação realizada nessa assembleia;
• duas das empresas contactadas apresentaram orçamentos dos mesmos trabalhos. e a assembleia dispensou a administração do terceiro orçamento.
A autora pronunciou-se quanto à exceção invocada.
Realizou-se a audiência prévia na qual foi proferido despacho saneador, julgando improcedente a exceção de abuso de direito. Na mesma decisão foi delimitado o objeto do litígio, elencados os factos assentes, e enunciados os temas da prova.
Realizada audiência final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Em face do exposto, na integral procedência da acção que HH instaurou contra Condomínio do prédio sito na Rua 1, representado pelo II, BB, e CC, JJ, e KK, decide-se anular as seguintes deliberações tomadas na assembleia realizada no dia 22 de Maio de 2022, constante da Acta Nº10:
(i) a execução de obras contidas no orçamento apresentado pela firma FF F. B., incluindo a alteração da coluna de água e esgotos assim como pintura interior das zonas comuns, no valor global de 79.740,09 €;
(ii) a contribuição extraordinária a prestar por cada condómino no montante de 15.948,02 € cada, a pagar 30% ( 4.784,41 €) do seu valor imediatamente para a adjudicação da obra, 20% (3.189,60 €) no final do segundo mês, 20% (3.189,60 €) no final do terceiro mês, 20% (3.189,60 €) no final do quarto mês e 10% (1.594,80 €) com a finalização dos trabalhos, conforme acta n.º 10 da assembleia de 22 de Maio de 2022.
Custas pelos réus.”
Inconformados com tal decisão, os réus interpuseram recurso de apelação, cuja motivação sintetizaram nas seguintes conclusões:
“
1.º O Tribunal a quo deu como não provados os factos constantes nos pontos 2.2.2. a 2.2.5. dos factos não provados, porque não adquiriu “convicção positiva mercê da ausência de prova desta factualidade”.
2.º Ocorre que, das declarações prestadas pelo Réu BB resultou PROVADO, de forma absolutamente inequívoca, que, apesar de não ter procuração outorgada pela Autora, GG foi autorizado a participar na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio e a exprimir o seu voto, bem assim que se comprometeu a enviar a procuração passada pela autora para o primeiro réu, mas tal não veio a suceder – Vide as suas declarações gravadas no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-0318.mp3, com início às 10.03.19 horas e fim às 10.26.56 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:05:12 ao minuto 00:08:44.
3.º A Ré CC esclareceu, de forma inequívoco e objetiva, que, apesar de não ter procuração outorgada pela Autora, GG foi autorizado a participar na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio e a exprimir o seu voto – Vide o excerto das suas declarações gravadas no ficheiro Diligencia_1806322.6T8LSB_2025-01-22_10-27-47.mp3, com início às 10.27.48 horas e fim às 10.41.54 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:05:57 ao minuto 00:09:12.
4.º Das declarações prestadas pelo Réu JJ resultou tal-qualmente PROVADO que, apesar de não ter procuração outorgada pela Autora, GG foi autorizado a participar na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio e a exprimir o seu voto, bem assim que se comprometeu a enviar a procuração passada pela autora para o primeiro réu, mas tal não veio a suceder – Vide as suas declarações gravadas no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-42-56.mp3, com início às 10.42.57 horas e fim às 10.54.25 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:05:21 ao minuto 00:06:24.
5.º No mesmo sentido, a Ré KK esclareceu, de forma inequívoca e sem
quaisquer hesitações, que GG foi autorizado a participar na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio apesar de não ter procuração e a participar nas respetivas deliberações – Vide as suas declarações gravadas no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-55-19.mp3, com início às 10.55.21 horas e fim às 11.03.59 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:01:09 ao minuto 00:02:34.
6.º Por fim, a testemunha GG esclareceu, de forma absolutamente perentória (apesar da flagrante parcialidade do seu depoimento e do seu interesse direto no desfecho da lide, na medida em resultou das declarações prestadas pela Autora que o apartamento apenas se encontra no seu nome, sendo a testemunha quem paga e gere tudo a que ao mesmo se refere (uma espécie de “testa de ferro”), que, apesar de não se ter feito acompanhar de procuração na terceira reunião de condóminos (22 de maio de 2022), pode participar e exprimir o seu voto.
7.º Mais esclareceu que não enviou a procuração ao administrador do condomínio porque a mesma não iria alterar o sentido da deliberação, visto que foi o único a votar contra – Vide o seu depoimento gravado no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_11-04-59.mp3, com início às 11.05 horas e fim às 12.03.08 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:03:22 ao 00:04:33, do minuto 00:07:51 ao minuto 00:08:26, do minuto 00:09:53 ao minuto 00:10:03, e do minuto 00:23:29 ao minuto 00:23:59.
8.º Não obstante a ligeireza e parcialidade das declarações de parte prestadas pela Autora HH, gravadas no ficheiro Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-02-27_14-13-26.mp3, com início às 14.13.28 horas e fim às 14.26.08 horas, conforme ACTA DE AUDIÊNCIA FINAL de 25 de fevereiro de 2025, do minuto 00:01:21 ao minuto 00:11:24, a qual procurou sempre fazer-se de desentendida e/ou esquecida, resultou evidente que GG, apesar de não ter consigo a procuração da Autora, foi autorizado a participar e a exprimir o seu voto na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio de 2022, mas não enviou, posteriormente, essa procuração para o II do condomínio porque o seu voto não iria alterar o sentido da deliberação, motivo pelo qual também não ratificou o seu voto.
9.º Das declarações prestadas pelo Réu BB gravadas, no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-03-18.mp3, com início às 10.03.19 horas e fim às 10.26.56 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:08:44 ao minuto 00:09:10, resulta igualmente que a Autora não ratificou o voto expresso por GG.
10.º Resulta, assim, que o Tribunal ad quem deve revogar a sentença proferida pelo Tribunal a quo quanto aos pontos 2.2.2., 2.2.3 e 2.24 dos factos não provados e, consequentemente, aditar à matéria assente os seguintes factos:
“2.2.2. Não obstante o facto indicado em i) GG foi autorizado a participar e a exprimir o seu voto. (2.))
2.2.3. Tendo-se comprometido a enviar a procuração passada pela autora para o primeiro réu, mas tal não veio a suceder. (3.))
2.2.4. Não tendo a autora ratificado perante o 1.º réu o voto expresso por GG. (4.)).
11.º No que concerne ao ponto 2.2.5. dos factos não provados pelo Tribunal a quo, impõe-se clarificar que do teor da ata da assembleia de condóminos de 22 de maio de 2022 efetivamente não resulta qualquer alusão à dispensa do administrador do condomínio em obter um terceiro orçamento, no entanto, tal dispensa resultou evidente das declarações de parte prestadas por qualquer um dos Réus.
12.º O Réu BB questionado pelo Tribunal a quo sobre se o condomínio o dispensou da apresentação de um terceiro orçamento, esclareceu que pediu orçamentos a, pelo menos, nove empresa diferentes, sendo que apenas conseguiu obter orçamento de quatro empresas.
13.º Mais expôs que das quatro empresas que apresentaram orçamento, apenas a empresa LL apresentou um valor fixo para as obras referentes às condutas das águas e dos esgotos e a empresa ECOLIS apresentou um valor, mas sujeito a alterações no decorrer da obras.
14.º Todas as demais empresas por si consultadas recusaram-se a apresentar orçamento para as condutas das águas e dos esgotos, porque alegavam que era impossível fazer uma estimativa dos custos da obras considerando que as condutas atuais têm mais de 100 anos e são construídas em grés e chumbo, sendo necessário demolir para verificar em primeiro lugar o estado de degradação das condutas existentes.
15.º O Réu BB explicou que a execução das obras se afigurava urgente, na medida em que existia risco de queda da fachada para a via pública e existiam infiltrações muito graves no interior das frações e, por isso, decidiram avançar com a aprovação do orçamento apresentado pela empresa LL e com a execução das obras urgentes - Vide as suas declarações gravadas no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-03-18.mp3, com início às 10.03.19 horas e fim às 10.26.56 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:09:31 ao minuto 00:15:20.
16.º Por seu turno, a Ré CC esclareceu que ela própria, uma vizinha (referindo-se à Ré KK) e o Réu MM solicitaram orçamentos a várias empresas, no entanto, após verificarem o elevado estado de degradação em que o prédio se encontrava, as empresas acabavam por desistir da obra e não mandavam orçamentos.
17.º A Ré CC explicou que se deslocou à obra com cerca de quatro/ cinco empreiteiros que se comprometeram a enviar orçamento, mas nunca o fizeram, sendo que apenas lograram obter quatro orçamentos e apenas dois desse orçamentos apresentavam valores para a coluna de água e de esgotos.
18.º Questionada pelo Tribunal a quo “se os condóminos dispensaram a obtenção de um terceiro orçamento para a coluna de água e de esgotos”, a Ré CC elucidou o seguinte: “Sim, dispensámos. Nós ficamos satisfeitos com o que tínhamos à frente”.
19.º Mais esclareceu que a realização das obras era muito urgente, pois que, quando chovia, a infiltrações de águas chegavam ao segundo andar, apresentado a fração do 4.º Andar buracos no teto causados pelas infiltrações de água, a fração do 3.º Andar, onde vivia uma senhora com 90 anos, era um mar de bolor, e a sua fração (2.º Andar) apresentava a tinta toda a rebentar – Vide as suas declarações gravadas no ficheiro Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-27-47.mp3, com início às 10.27.48 horas e fim às 10.41.54 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:02:28 ao minuto 00:04:31 e do minuto 00:09:15 ao minuto 00:11:35.
20.º O Réu JJ quando questionado pelo Tribunal a quo sobre se os condóminos dispensaram a obtenção de um terceiro orçamento para a coluna de águas e esgotos, esclareceu que tiveram dificuldade em obter orçamentos porque houve várias empresas que “não se dignaram a apresentar-nos o orçamento” e, por isso, decidiram aprovar o orçamento do Sr. LL porque era aquele que “nos dava mais garantias de sucesso nas obras e, em termos de valor, digamos que era um dos mais exequíveis, para além de que contemplava a necessidade das obras que tínhamos que fazer no prédio, para evitar que ele se degradasse mais e havia uma certa urgência nisso”.
21.º O Réu JJ explicou que decidiram aprovar o orçamento do Sr. LL, apesar do mesmo ser o único que apresentava um valor fixo/certo para a conduta de águas e esgotos, porque “Foi aquele que havia maior consenso e de todos aqueles que foram apresentados, era, realmente, aquele que daria maior consenso e que nos dava mais garantias de sucesso e das coisas bem feitas dentro do valor do orçamento apresentado” – Vide as suas declarações gravadas no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-42-56.mp3, com início às 10.42.57 horas e fim às 10.54.25 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:02:14 ao minuto 00:05:21.
22.º No mesmo sentido, a Ré KK explicou que solicitaram orçamentos a várias empresa, sendo que apenas lograram obter orçamento de quatro empresas, pois as outras recusaram-se a apresentar orçamento porque era impossível quantificar os custos sem efetuar a demolição da conduta de água e esgotos.
23.º Nesse conspecto, os condóminos optaram por aprovar o orçamento da empresa LL, porque era o mais detalhado e apresentava melhor relação entre preço e qualidade. Ademais, existia muita urgência na execução das obras, pois que já tinha caído uma parte do teto da casa de banho da Ré KK, existiam muitas infiltrações no interior das frações e a platibanda estava a cair aos pedaços – Vide as suas declarações gravadas no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-55-19.mp3, com início às 10.55.21 horas e fim às 11.03.59 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:04:14 ao minuto 00:08:27.
24.º Das declarações de parte dos Réus, do depoimento de parte da Autora e das declarações prestadas pela testemunha NN supracitadas resulta, de forma incontestável, que todos os condóminos estiveram presentes na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio de 2022.
25.º Não obstante, a Autora não se encontrava regularmente representada, na medida em que GG não tinha procuração, pelo que o seu voto não foi considerado na ata.
26.º Mais resultou evidente que todos os condóminos, presentes e/ou regularmente representados, na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio de 2022 estavam perfeitamente cientes que apenas uns dos orçamentos (LL) apresentava um valor fixo para as obras na conduta de águas e esgotos e que apenas outro orçamento apresentava valores para essa obra, mas sujeito a revisão no decurso dos trabalhos.
27.º Não obstante, face à enorme dificuldade em obter orçamentos, vistos que quase todas as empresas consultadas pelo administrador do condomínio e diretamente pelos próprios condóminos se recusaram a orçamentar os trabalhos referentes à conduta da águas e esgotos e também relativamente às demais obras, e perante a urgência na execução das obras atento as graves infiltrações de água existentes no interior das frações, a degradação do telhado / cobertura e da fachada exterior (que estava cair em pedaços para o chão), decidiram, por unanimidade, aprovar o orçamento da empresa LL, pois que era aquele que lhe apresentava melhor detalhe, preço e garantias.
28.º Os condóminos estavam, pois, perfeitamente cientes da inexistência de um terceiro orçamento relativamente à conduta de água e de esgotos e, não obstante isso, decidiram, por unanimidade, aprovar o orçamento da empresa LL, dispensado o administrador do condomínio da apresentação de outros orçamentos e avançar, de imediato, com a execução das obras urgentes.
29.º De modo que, o Tribunal ad quem deverá revogar a decisão proferira pelo Tribunal a quo quanto ao ponto 2.2.5 dos factos não provado e, consequentemente, dar como assente que “Os condóminos presentes na assembleia de 22 de Maio de 2022, dispensaram o 1.º da obtenção de um terceiro orçamento”.
30.º O administrador do condomínio não violou o disposto no artigo 1436.º, n.º 2 do CPC, pois que, embora, apenas tenha logrado obter dois orçamentos para a execução das obras da coluna de água e de esgotos do prédio sito na Rua 2, os condóminos decidiram, por unanimidade, dispensá-lo da apresentação de um terceiro orçamento relativamente a essa matéria, pois estavam perfeitamente cientes da dificuldade/impossibilidade em obtê-lo face à sistemática recusa dos múltiplos empreiteiros consultados em orçamentar tais trabalhos e todos tinham urgência na execução das obras, na medida em que a fachada do prédio apresentava um elevado perigo de derrocada para a via pública e a frações do quatro e do terceiro andares já não apresentavam condições mínimas de habitabilidade face à gravidade das infiltrações de águas existentes no seu interior (“chovia lá dentro”), conforme se pode verificar pela análise do relatório de inspeção e diagnóstico técnico junto aos autos com a contestação sob o documento n.º 16.
31.º Ademais, a conduta do administrador do condomínio e de todos os outros Réus que aprovaram, por unanimidade, o orçamento sempre estaria a coberto do disposto no artigo 1427.º do Código Civil, o qual estatui o seguinte:
“1 - As reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício podem ser levadas a efeito, na falta ou impedimento do administrador, por iniciativa de qualquer condómino. 2 - São indispensáveis e urgentes as reparações necessárias à eliminação, num curto prazo, de vícios ou patologias existentes nas partes comuns que possam, a qualquer momento, causar ou agravar danos no edifício ou conjunto de edifícios, ou em bens, ou colocar em risco a segurança das pessoas”.
32.º A urgência na execução das obras resulta da análise do relatório de inspeção e diagnóstico técnico junto aos autos com a contestação sob o documento n.º 16, do documento n.º 12 junto aos autos com a contestação, bem assim do depoimento prestado pela testemunha OO gravado no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_12-04-07.mp3, com início às 12.04.09 horas e fim às 12.22.26 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, do minuto 00:01:08 ao minuto 00:09:46.
33.º Face ao teor das declarações/depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento, ao teor do relatório de inspeção e diagnóstico técnico (documento n.º 16) e das fotografias juntas com a contestação sob o documento n.º 12, o Tribunal ad quem deverá dar como provado que a fachada principal do prédio e as telhas da cobertura se estavam a desfazer todas, bem assim que a mansarda e as caleiras em zinco estavam todas podres.
34.º Mais deverá dar como provado que tais anomalias estavam a pôr em perigo a vida dos condóminos e demais pessoas que circulavam na imediações do prédio face ao risco iminente de queda de partes da fachada principal para a via pública e ao risco de cedência da estrutura de madeira do telhado (mansarda) atento a existência de infiltrações profundas.
35.º Considerando o risco iminente de queda de partes da fachada principal para a via pública, o risco de cedência da estrutura de madeira do telhado (mansarda) e, bem assim, as profundas infiltrações de água existentes no interior das fração autónomas (2.º, 3.º e 4.º andar), os Réus decidiram aprovar o orçamento apresentado empresa LL e executar as respetivas obras, com exceção das obras referentes às colunas de água e esgotos que não puderam ser executadas porque a Autora não pagou a sua quota-parte da contribuição extraordinária.
36.º O Tribunal ad quem deverá, assim, alterar a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, aditando os seguintes factos à matéria assente:
2.2.6. A fachada principal e as telhas da cobertura do prédio sito na Rua 1 estavam a desfazer na sua totalidade;
2.2.7. A mansarda e as caleiras em zinco do prédio sito na Rua 1 estavam todas podres;
2.2.8. Existia risco iminente de queda da fachada principal para a via pública, bem assim risco iminente de cedência da estrutura de madeira do telhado (mansarda) atento a existência de infiltrações profundas;
2.2.9. As frações do 2.º, 3.º e 4.º Andar do prédio sito na Rua 1, apresentavam inúmeras infiltrações no seu interior advenientes do escorrimento de água através das paredes adveniente das caleiras e da mansarda pobres;
2.2.10. A empresa FF F. B. executou as obras de reparação e restruturação constantes do orçamento junto aos autos sob os documentos n.º 13 a 15, exceto as referentes à alteração da coluna de água de abastecimento, no valor de €5.670,00, e à alteração das colunas de esgotos, no valor de €5.140,00.
37.º Neste conspecto, o Tribunal ad quem deve revogar a sentença recorrida, mantendo as deliberações tomadas na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio de 2022, constante da ata n.º 10, por força da aplicação do disposto nos artigos 1436.º, n.º 2 e 1427.º do Código Civil:
(ii) a execução de obras contidas no orçamento apresentado pela firma FF F. B., incluindo a alteração da coluna de água e esgotos assim como pintura interior das zonas comuns, no valor global de 79.740,09€;
(ii) a contribuição extraordinária a prestar por cada condómino no montante de €15.948,02 cada, a pagar 30% (4.784,41 €) do seu valor imediatamente para a adjudicação da obra, 20% (3.189,60 €) no final do segundo mês, 20% (3.189,60 €) no final do terceiro mês, 20% (3.189,60 €) no final do quarto mês e 10% (1.594,80 €) com a finalização dos trabalhos, conforme ata n.º 10 da assembleia de 22 de Maio de 2022.
38.º O Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 1436.º, n.º 2 e 1427.º do Código Civil.
39.º Caso assim se não entenda – o que não se concede –, então, por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que a haver anulação das deliberações tomadas na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio de 2022, tal anulação apenas poderá ser parcial, isto é, limitada à parte referente à alteração da coluna de água e da coluna de esgotos.
40.º Mantendo-se a validade das deliberações no que concerne à aprovação da execução das demais obras contidas no orçamento apresentado pela firma FF F. B., no valor global de €68.930,09.
41.º Note-se que a alteração da coluna de água e da coluna esgotos foi orçamentada separadamente e de forma opcional nos seguintes termos, conforme documentos n.º 13 a 15 junto aos autos com a contestação apresentada pelos Réus:
- Alteração da coluna de água de abastecimento - €5.670,00
- Alteração das colunas de esgotos - €5.140,00.
42.º O administrador de condomínio logrou obter QUATRO orçamentos para a execução da totalidade das obras, exceto quanto à coluna de água e à coluna de esgotos face à dificuldade em orçamentar esses trabalhos sem prévia demolição das condutas/canalizações existentes – pontos 2.1.4 e 2.1.11 dos factos provados.
43.º Atento à matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo nos ponto 2.1.4 e 2.1.11, a deliberação de aprovação do orçamento da empresa PP F. B. (com exceção da parte respeitante às obras da coluna de água e de esgotos do prédio sito na Rua 3) jamais poderia ter sido anulada com fundamento na aplicação do disposto no artigo 1436.º, n.º 2 do Código Civil, PORQUANTO, EXISTIAM QUATRO ORÇAMENTOS PARA ESSAS OBRAS!
44.º Note-se que as obras da coluna de água e da coluna de esgotos do prédio sito na Rua 4
Portugal, n.º 89, Lisboa não foram executadas, porque, se, por um lado, não revestiam a natureza absolutamente urgente das demais obras, atento o risco iminente de derrocada da fachada e da cobertura/telhado para a via pública, bem assim às profundas infiltrações de água existentes no interior dos apartamentos do 2.º, 3.º e 4.º andares, por outro lado, as demais obras tiveram de ser executadas face à premência da intervenção.
45.º Neste conspecto, o Tribunal ad quem – no limite – deverá revogar a sentença recorrida, declarando as deliberações tomadas na assembleia de condóminos de 22 de maio de 2022 anuláveis apenas na parte referente à aprovação da alteração da coluna de água e de esgotos e, consequentemente, declarar a VALIDADE das deliberações tomadas na assembleia de condóminos de 22 de maio de 2022, nos seguintes termos:
(i) a execução de obras contidas no orçamento apresentado pela firma FF F. B., com exclusão a alteração da coluna de água e esgotos, no valor global de €68.930,09€;
(ii) a contribuição extraordinária a prestar por cada condómino no montante de €13.786,02 cada, a pagar 30% (4.135,80€) do seu valor imediatamente para a adjudicação da obra, 20% (2.757,20€) no final do segundo mês, 20% (2.757,20€) no final do terceiro mês, 20% (2.757,20€) no final do quarto mês e 10% (1.378,60€) com a finalização dos trabalhos.
Nestes termos, e nos demais de direito aplicáveis, que com douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se a decisão posta em crise e determinada a prolação de nova sentença, que julgue totalmente improcedente a ação proposta e, consequentemente:
1) declare a validade das deliberações tomadas na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio de 2022, constante da ata n.º 10, nos seguintes termos:
(i) a execução das obras contidas no orçamento apresentado pela firma FF F. B., incluindo a alteração da coluna de água e esgotos assim como pintura interior das zonas comuns, no valor global de 79.740,09€;
(ii) a contribuição extraordinária a prestar por cada condómino no montante de €15.948,02 cada, a pagar 30% (4.784,41 €) do seu valor imediatamente para a adjudicação da obra, 20% (3.189,60 €) no final do segundo mês, 20% (3.189,60 €) no final do terceiro mês, 20% (3.189,60 €) no final do quarto mês e 10% (1.594,80 €) com a finalização dos trabalhos, conforme ata n.º 10 da assembleia de 22 de maio de 2022. 2) ou, caso assim se não entenda, declare a validade das deliberações tomadas na assembleia de condóminos de 22 de maio de 2022, salvo quanto à parte referente à aprovação da alteração da coluna de água e de esgoto, nos seguintes termos:
(i) a execução de obras contidas no orçamento apresentado pela firma FF F.
B., com exclusão a alteração da coluna de água e esgotos, no valor global de
€68.930,09€;
(ii) a contribuição extraordinária a prestar por cada condómino no montante de €13.786,02 cada, a pagar 30% (4.135,80€) do seu valor imediatamente para a adjudicação da obra, 20% (2.757,20€) no final do segundo mês, 20% (2.757,20€) no final do terceiro mês, 20% (2.757,20€) no final do quarto mês e 10% (1.378,60€) com a finalização dos trabalhos.
A apelada contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:
“
A. O presente recurso assenta na impugnação da matéria de facto com vista a que os factos indicados sob os números 2.2.2, 2.2.3, 2.2.4 e 2.2.5, que foram julgados como não provados sejam julgados como provados.
B. Quanto ao facto indicado sob o n.º 2.2.2 - “Não obstante o facto indicado em i) GG foi autorizado a participar na reunião e a exprimir o seu voto” a motivação da douta sentença recorrida sustentou-se na circunstância de “(…) ouvidos os réus nenhum deles confirmou ter NN participado na deliberação da assembleia de 22.05.2022, conforme evidencia a acta junta a fls. 71v, ainda que a sua presença tenha sido autorizada pelo administrador do condomínio (…)”.
C. A questão não é somente a de saber se QQ debateu a questão, se teve o direito a manifestar-se ou se exteriorizou que estava contra as obras que estavam em discussão, mas participar na deliberação impunha que a sua presença e o seu sentido de voto tivessem ficado devidamente registados em ata, ainda que fosse para ali se deixar consignado que por falta de poderes de representação o seu voto não era válido.
D. A ata constitui o único meio de prova das decisões tomadas em assembleia de condóminos, pois é um documento que relata por escrito e regista fielmente o que se passou em qualquer assembleia - cfr. artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de outubro.
E. O que resultou provado foi que QQ esteve presente, não se fazendo acompanhar de procuração (facto provado 2.1.9) e a sua participação na deliberação não se demonstrou, nem pode resultar como provada, porque efetivamente não ficou sequer a constar em ata a sua presença, elaborando-se uma ata totalmente omissa no que concerne à sua presença e à sua alegada participação – ata, esta, que terá sido o elemento fulcral para julgar como não provado o facto agora em apreciação.
F. Quanto ao facto não provado indicado sob o n.º 2.2.3 – “Tendo-se comprometido a enviar a procuração passada pela autora para o primeiro réu, mas tal não veio a suceder” – os RR. põem a tónica nas suas próprias declarações, mas a verdade é que apesar de as transcreverem exaustivamente nenhum deles declarou que QQ se tinha comprometido a enviar a procuração para o primeiro réu, pelo que, tal facto nunca poderia ter sido dado como provado.
G. Relativamente ao facto não provado indicado sob o n.º 2.2.4. - “Não tendo a Autora ratificado perante o 1.º R. o voto expresso por GG” – é manifesto que dado como não provado que QQ tenha participado na deliberação, por maioria de razão o Tribunal a quo não podia dar como provada a retificação ou não de um voto que não se provou que tenha sido prestado.
H. Insurgem-se os recorrentes contra o julgamento da matéria de facto, nomeadamente sobre o facto de não se ter provado inequivocamente que a assembleia de condóminos tenha dispensado a apresentação de mais que os dois orçamentos obtidos para as obras da coluna de água e esgotos, invocando que as suas declarações de parte demonstram o contrário, o que, s.m.o., não se demonstra em tais declarações.
I. Dos factos provados resulta que na assembleia de condóminos realizada em 15 de janeiro de 2022 foi discutida a questão das obras no prédio e os orçamentos que poderiam ter sido do conhecimento dos condóminos nessa assembleia eram os das empresas 3D View e Ecolis, únicos orçamentos enviados ao administrador, respetivamente, em 10/01/2022 e 14/01/2022, ou seja, antes da realização dessa assembleia.
J. Conforme resulta do documento 6 junto com a P.I. (ata da assembleia de 15 de janeiro de 25 2022) a questão das obras na coluna de água e esgotos foi sugerida pelo representante da A., o que bem contraria a afirmação dos RR. de que este está sempre contra tudo e vota contra tudo.
K. Só após essa assembleia as obras nas colunas de água e esgotos foram consideradas e nada resulta nos autos que demonstre que o administrador procurou obter orçamentos que contemplassem essa vertente, por forma a reunir o número de orçamentos que permitissem aos condóminos uma avaliação ponderada, que possibilitasse a comparação entre as várias propostas e sem qualquer pressão que levasse à aprovação de um orçamento por não haver outros que pudessem ser avaliados.
L. Posteriormente a esta assembleia, mais concretamente em 04/02/2022 (vide doc. 10 da PI) foi enviado ao administrador o orçamento da empresa FF F. B., esse sim prevendo as obras a realizar na coluna de água e esgotos.
M. Para além deste orçamento, o administrador obteve por parte da empresa Ecolis um orçamento que previa as obras a realizar nas colunas de água e esgotos, mas, na verdade não se provou que este orçamento tenha sequer sido enviado aos condóminos, razão pela qual, só resultou provado que a Ecolis comtemplou no orçamento que enviou ao primeiro réu os trabalhos nas colunas de água e esgotos.
N. Das declarações de parte do recorrente MM gravadas no ficheiro audio diligência_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_10-03-18.mp3, com início às 10.03.19 horas e fim às 10.26.56 horas, conforme Ata de Audiência final de 22 de janeiro de 2025, resulta que o mesmo deu a conhecer a todos os condóminos todos os orçamentos antes da assembleia de 5 de fevereiro de 2022.
O. Das declarações de parte do Recorrente MM resulta também que confrontado com o facto de que o único orçamento, para além do que foi aprovado, que previa trabalhos nas colunas da água e esgotos, que era o da Ecolis, lhe tinha sido enviado após essa assembleia não conseguiu explicar como, nem quando, o tinha dado a conhecer aos demais condóminos – nas suas declarações o R. faltou à verdade!
P. O único documento junto aos autos e o único facto que resultou provado quanto a este respeito, consiste que a Ecolis enviou ao R. MM tal orçamento, e não há qualquer outro documento que demonstre o envio de tal orçamento aos restantes condóminos.
Q. Não resultando provado esse envio, necessariamente se conclui que não é possível dar como demonstrado que os condóminos tenham tido conhecimento do mesmo, e o único orçamento que foi dado a conhecer que previa as obras da coluna de água e gás foi o orçamento que veio a ser aprovado.
R. Por outro lado, em momento absolutamente nenhum das suas declarações o recorrente MM declarou que os restantes condóminos o dispensaram de obter mais orçamentos.
S. Também os restantes RR. não prestaram essa declaração, somente a R. RR, de forma pouco credível e sem isenção, declarou que “(…) dispensámos. Nós ficámos satisfeitos com o que tinhamos em frente (…)”, já os restantes, e pese embora tenham sido instados nesse sentido, não declararam que tal dispensa tenha sido prestada ao administrador.
T. Quanto a esta questão a testemunha QQ, cujo depoimento em nada foi contestado no presente recurso, prestou declarações, que se encontram gravadas no ficheiro audio diligência_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_11-04-59.mp3, com início às 11.05 horas e fim às 12.03.08 horas, conforme Ata de Audiência final de 22 de janeiro de 2025 e instado sobre a alegada dispensa declarou claramente que não e que a assembleia se resumiu a uma chantagem do administrador que ou aprovavam ou se demitia.
U. Do depoimento da testemunha QQ não só na assembleia que aprovou as obras não houve qualquer discussão sobre a dispensa ao administrador de outros orçamentos, como na verdade o único orçamento que foi objeto de discussão nessa assembleia foi o que veio a ser aprovado.
V. Da prova documental resultou ainda provado que de fevereiro a maio, ou seja, durante três meses, não se obteve mais nenhum orçamento, apresentando-se em maio aos condóminos o orçamento, já obtido em 04/02/2022, que veio a ser aprovado como o único que foi possível obter.
W. Durante os três meses que decorreram entre a assembleia de fevereiro e a de maio o recorrente MM somente diligenciou pela obtenção de um relatório que viesse a ser coincidente com o orçamento já obtido, sem demonstrar qualquer outro esforço para conseguir outras propostas que pudessem ser avaliadas e comparadas com o dito orçamento.
X. Os recorrentes invocam a legalidade das deliberações tomadas com o fundamento na 27 dificuldade e impossibilidade em obter mais orçamentos e que essa alegada dificuldade / impossibilidade terá dispensado o administrador do condomínio em apresentar mais orçamentos, porém, tal argumento jamais poderá proceder porque nem sequer foi invocado em sede de contestação, não constituiu objeto do litígio, nem tema da prova, nem matéria de facto a ser julgada, logo, nunca poderá um facto que não foi alegado, nem objeto de apreciação e julgamento pelo Tribunal ser o fundamento para demonstrar uma suposta dispensa de uma obrigação legal que incumbe ao administrador.
Y. Na decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal tem em conta os factos alegados pelas partes nos seus articulados e os factos novos que a parte não fez oportunamente uso no processo, não podem ser trazidos por ela aos autos apenas em sede de recurso – vide neste sentido Ac. do Tribunal da Relação do Porto, Proc. 9375/22.0T8VNG.P1, disponível em www.dgsi.pt.
Z. O disposto no n.º 2 do art.º 1436.º do CC impõe ao administrador em caso de obras de conservação extraordinária a obrigação de apresentar pelo menos três orçamentos diferentes e só fica dispensado dessa obrigação caso o regulamento do condomínio ou a assembleia de condóminos disponha de forma diferente.
AA. No caso dos autos resultou inequivocamente provado que as obras de conservação extraordinária deliberadas na assembleia de condóminos realizada no dia 22 de maio de 2022, foram aprovadas mediante a apresentação de um só orçamento, único que foi dado a conhecer aos condóminos, que incluia trabalhos nas colunas de águas e esgotos, pelo que, não existindo regulamento do condomínio que disponha de forma diferente, nem se provando a deliberação expressa dos condóminos no sentido da dispensa dessa apresentação, que, aliás, nem resulta da ata, necessariamente se concluiu que tais deliberações padecem de ilegalidade e consequentemente devem ser anuladas.
BB. Conclui-se, pois, que a douta sentença recorrida não merece qualquer censura, pelo que, deve a mesma ser inteiramente confirmada.
CC. Os recorrentes pugnam também pela legalidade das deliberações com o fundamento que o orçamento aprovado sempre estaria coberto pelo disposto no art.º 1427.º do CC, norma que dispõe que reparações urgentes, no impedimento do administrador, podem ser levadas a cabo por qualquer condómino – argumento que procuram sustentar no relatório técnico junto aos autos com a contestação como documento 16 e pelo depoimento da testemunha SS, empreiteiro que apresentou o orçamento aprovado.
DD. Novamente pretendem os recorrentes que as deliberações tomadas sejam declaradas legais com factos que não alegaram na contestação, porque a urgência dessas obras não foi alegada, não constituiu objeto do litígio, nem tema da prova e nem foi inserida na base instrutória – a urgência ou não da obra não foi apreciada e julgada pelo Tribunal a quo.
EE. De igual forma não foi apreciada nem julgada a adequação ou a necessidade dos trabalhos orçamentados, no sentido de serem os adequados ou os necessários para fazer as reparações a realizar.
FF. Para além dos factos alegados pelas partes, na decisão da matéria de facto podem ser considerados factos instrumentais e complementares com interesse para a decisão, desde que relativamente a estes tenha sido observado o contraditório.
GG. Como resulta claramente dos autos, o objeto do processo centrou-se na apreciação da legalidade da deliberação pela falta da apresentação pelo administrador de três orçamentos que previssem as obras que foram deliberadas realizar no prédio, sendo que, nada foi discutido em sede de matéria factual quanto à alegada urgência das obras e quanto à adequação para as reparações previstas no orçamento.
HH. Nem ao longo do processo a A. exerceu qualquer contraditório quanto a essas questões, pelo que, os argumentos agora aduzidos pelos RR., relativos a uma alegada urgência nas obras têm, necessariamente, de improceder.
II. E ainda que assim não fosse, o que aqui se discute é a aprovação pela assembleia de condóminos de um orçamento e não a decisão tomada pelo administrador ou por condóminos de realizar obras sem deliberação da assembleia com o fundamento em obras urgentes.
JJ. A norma do art.º 1427.º do CC não tem qualquer aplicação ao presente caso, porque o que aqui se julga é a legalidade de uma deliberação que aprovou um orçamento para obras e não uma decisão que ordenou, sem qualquer deliberação, a realização de obras por alegadamente serem urgentes.
KK. Por outro lado, e ao contrário do que alegam os RR., o depoimento da testemunha SS não é bastante para provar o que agora invocam, até porque tal depoimento não foi credível e isento.
LL. Das declarações prestadas pela testemunha SS, gravadas no ficheiro áudio Diligencia_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_12-04-07.mp3, com início às 12.04.09 horas e fim às 12.22.26 horas, conforme ATA DE AUDIÊNCIA FINAL de 22 de janeiro de 2025, resulta que primeiro declarou que a fachada estava toda a desfazer-se, que havia infiltrações de água que entravam pelas caleiras rotas, a instâncias da Ilustre mandatária os RR. declarou ser necessário picar a fachada toda, a instância da Mandatária da Autora declarou ser possível fazer reparações nas fissuras, e confrontado com as fotografias do edifício colocou a tónica nas caleiras, no estado das telhas e referiu que junto à caleira havia um pouco de fachada que se tinha desagregado, ou seja, a razão das infiltrações era proveniente do telhado – não se retira das suas declarações qualquer urgência de obras na fachada no prédio.
MM. Relativamente às patologias a reparar e ao estado do edifício a testemunha QQ também prestou depoimento, conforme declarações gravadas no ficheiro audio diligência_18063-22.6T8LSB_2025-01-22_11-04-59.mp3, com início às 11.05 horas e fim às 12.03.08 horas, conforme Ata de Audiência final de 22 de janeiro de 2025, tendo declarado que a fachada não tinha nada a ver com as infiltrações de água que vinham do telhado, que o telhado e a cobertura necessitavam de reparação, bem como os cerca de 50 centímetros de faixa situados junto ao telhado e que a fachada tinha uma ou outra fissuras que eram reparáveis.
NN. A testemunha QQ foi exaustivamente instado pela ilustre Mandatária dos recorrentes, que o confrontou com diversas fotos constantes no relatório, e pese embora o enorme esforço interrogativo para que a testemunha reconhecesse grandes patologias na fachada, as respostas, sempre prontas e sem qualquer hesitação, eram a de que as fotos exibidas como fachada correspondiam a patologias do telhado.
OO. Por seu lado, e como se demonstra claramente nas declarações que prestou, a testemunha SS faltou à verdade ao declarar que tinha elaborado o orçamento (datado de 04.02.2002) após o relatório técnico (datado de março de 2022), o que se demonstrou não ser possível, pelo que, tal evidência, que muito se lamenta atenta a gravidade de prestar falsas declarações, afeta em absoluto a credibilidade da testemunha e a isenção com que prestou depoimento.
PP. Resulta, pois, que a questão da alegada urgência, que só agora em sede de recurso é alegada, para além de não ter sido julgada, muito menos pode resultar demonstrada com base no depoimento de uma testemunha que não é credível.
QQ. Acresce, que a norma do art.º 1427.º do CC não tem qualquer aplicação ao presente caso, porque o objeto do processo consiste na apreciação da legalidade de uma deliberação que aprovou um orçamento para obras e não de uma decisão que ordenou, sem qualquer deliberação, a realização de obras por alegadamente serem urgentes.
RR. Já quanto ao requerido aditamento da matéria de facto dada como provada, tem a mesma de improceder porque em sede de recurso da matéria de facto só se aditam aos factos provados os factos instrumentais ou complementares que sejam indispensáveis à decisão – al. c) do n.º 2 do artigo 662.º do Código de Processo Civil.
SS. Face à delimitação do objeto do processo – apreciação da legalidade de deliberação tomada em assembleia de condóminos – os factos que os RR. pretendem agora aditar, que se prendem com uma alegada urgência na realização das obras, que nem sequer foram alegados em sede de contestação, nem contraditados pela A., não constituem factos instrumentais ou complementares do objeto do litígio, nem são indispensáveis à decisão.
TT. Uma situação é o administrador ou um condómino decidir, sem deliberação da assembleia, avançar com a realização de obras porque as considera urgentes e outra bem diferente é ter havido uma deliberação para realizar obras e apontar-se a essa deliberação um vício que determinada a sua anulação – só os factos que possam ser indispensáveis á tomada de decisão sobre o vício da deliberação é que podem ser instrumentais ou complementares, o que manifestamente não é o caso dos factos agora pretendidos aditar pelos RR.
UU. Desta forma, conclui-se que quanto ao pretendido aditamento à matéria de facto improcede o recurso por manifesta falta de base legal para tal aditamento.
VV. Os recorrentes pugnam ainda pela anulação parcial da decisão invocando que a aprovação das obras contidas no orçamento aprovado, à exceção das relativas à coluna de água e esgotos, constituem obras para as quais existiam quatro orçamentos.
WW. Tal pretensão não tem qualquer viabilidade legal porque a deliberação em causa foi tomada como um todo, como uma única e só deliberação, o que, aliás, nunca foi sequer colocado em causa pelos recorrentes, que pugnaram pela sua legalidade, inclusive, com argumentos bem distintos dos que trazem ao presente recurso.
XX. A própria ata que contém a deliberação anulada demonstra que a mesma foi tomada como 31 uma única e só deliberação, logo, sendo uma só deliberação ou a mesma está ferida de um vício ou não está, não sendo legalmente possível anulá-la parcialmente, improcedendo, por isso, o recurso também no que concerne a este particular.
YY. De tudo o que antecede, conclui-se que não merece qualquer censura a douta Sentença recorrida, devendo manter-se a decisão que anulou a deliberação tomada na assembleia de condóminos do prédio sito na Rua 2, realizada em 22 de maio de 2022, que aprovou o orçamento apresentado pela firma FF F. B., incluindo a alteração da coluna de água e esgotos assim como pintura interior das zonas comuns, no valor global de 79.740,09 €.
ZZ. De igual forma, se deve manter a douta decisão que anulou a deliberação que aprovou o contributo extraordinário a prestar por cada condómino no montante de 15.948,02 € e a forma e os prazos de pagamento do mesmo.”
2. Objeto do recurso
Conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam10. Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art. 5º n.º 3 do CPC).
Não obstante, a este Tribunal está vedado apreciar questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas11.
Neste particular, importa desde já assinalar que ao contrário do pretendido pelos réus e ora apelantes em caso algum este Tribunal declarará a validade (total ou parcial) das deliberações da assembleia geral de condóminos de 22-05-2022, porquanto não tendo a ré e ora apelante deduzido reconvenção, tal pronúncia redundaria na apreciação de questões novas.
Assim sendo, as questões a apreciar e decidir são as seguintes:
1. Impugnação da decisão sobre matéria de facto – arts. 1º a 36º das conclusões;
2. Invalidade das deliberações da assembleia de condóminos de 22-05-202 – arts. 37º a 45º das conclusões.
3. Fundamentação
3.1. Os factos
3.1.1. Factos provados
1. Desde 2001 que a autora é legítima proprietária da fração autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão do prédio sito na Rua 1 constituído em regime de propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número ..., freguesia de Santa Isabel.
2. Os réus são legítimos proprietários das seguintes frações autónomas do citado prédio sito na Rua 1, sendo:
• o 2.º da fração “B” correspondente ao primeiro andar;
• a 3.ª da fração “C” correspondente ao segundo andar;
• o 4.º da fração “D” correspondente ao terceiro andar, qualidade que lhe adveio por herança aberta por óbito do seu pai, TT;
• a 5.º da fração “E” correspondente ao 4.º quarto andar.
3. Na assembleia de condóminos do prédio urbano sito na Rua 1, realizada em 15 de Janeiro de 2022 foi discutido o tema das obras a executar nas partes comuns do prédio, conforme consta da acta nº8 que constitui o documento nº6, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
4. As empresas 3D View, Ecolis e Lemonsafe, enviaram os seus orçamentos, respetivamente, em 10/01/2022, 14/01/2022 e 19/01/2022 (Documentos 7, 8 e 9) e a empresa a FF F. B., enviou orçamento no dia 04/02/2022 (Doc. 10), incluindo este os trabalhos nas colunas de água e esgotos.
5. Na assembleia de condóminos realizada em 22 de Maio de 2022 a autora não consta como presente na ata.
6. Na assembleia de condóminos realizada em 22 de Maio de 2022 foi aprovado por unanimidade, o orçamento apresentado pela firma FF F. B., incluindo a alteração da coluna de água e esgotos assim como pintura interior das zonas comuns, no valor global de 79.740,09 €.
7. Foi ainda aprovado o contributo extraordinário a prestar por cada condómino no montante de 15.948,02 € cada, a pagar 30% ( 4.784,41 €) do seu valor imediatamente para a adjudicação da obra, 20% (3.189,60 €) no final do segundo mês, 20% (3.189,60 €) no final do terceiro mês, 20% (3.189,60 €) no final do quarto mês e 10% (1.594,80 €) com a finalização dos trabalhos, conforme acta n.º 10 da assembleia de 22 de Maio de 2022, que se junta como documento 11 e que se aqui se dá por integralmente reproduzida.
8. A autora não se opõe à realização de obras de conservação no prédio, considerando que os orçamentos deveriam ter sido precedidos da elaboração de caderno de encargos, a fim de inteirar os condóminos sobre os materiais e técnicas construtivas a usar na execução das obras.
9. Na assembleia realizada em 22 de Maio de 2022, GG esteve presente não tendo em seu poder procuração outorgada pela autora.
10. O 1º réu procedeu à comunicação à autora, por carta registada com aviso de receção, dentro do prazo de 30 dias, a deliberação tomada na assembleia geral de condóminos do prédio sito na Rua 1, realizada no dia 22 de Maio de 2022 (doc.n.º 11).
11. A Ecolis contemplou no orçamento que enviou ao primeiro réu os trabalhos nas colunas de água e esgotos.
3.1.2. Factos não provados
1. E apesar de o procurador da autora garantir ao administrador, aqui 2.º Réu, que lhe faria chegar a procuração, aquele não aceitou e não permitiu que o mesmo exprimisse o voto da sua representada.
2. Não obstante o facto indicado em 9, GG foi autorizado a participar e a exprimir o seu voto.
3. Tendo-se comprometido a enviar a procuração passada pela autora para o primeiro réu, mas tal não veio a suceder.
4. Não tendo a autora ratificado perante o 1º réu o voto expresso por GG.
5. Os condóminos presentes na assembleia de 22 de Maio de 2022, dispensaram o 1º da obtenção de um terceiro orçamento.
3.2. Os factos e o Direito
3.2.1. Da impugnação da decisão sobre matéria de facto 3.2.1.1. Considerações gerais
Dispõe o art. 662º n.º 1 do CPC2013 que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou documento/s superveniente/s, impuserem decisão diversa.
Nos termos do art. 640º n.º 1 do mesmo código, quando seja impugnada a matéria de facto deve o recorrente especificar, sob pena de rejeição, os concretos factos que considera incorretamente julgados; os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
O n.º 2 do mesmo preceito concretiza que, quanto aos meios probatórios invocados incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o recurso, podendo transcrever os excertos tidos por relevantes.
A lei impõe assim ao apelante específicos ónus de impugnação da decisão de facto, sendo o primeiro o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida, o qual implica a análise crítica da valoração da prova feita em primeira instância, tendo como ponto de partida a totalidade da prova produzida.
Sumariando todos os ónus impostos pelo citado preceito, ensina ABRANTES GERALDES12:
“(…) podemos sintetizar da seguinte forma o sistema que agora vigora sempre que o recurso de apelação envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso, e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente aos pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) (…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação13, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente;
f) (…).”
Nos termos do disposto no art. 640.º, n.º 2, al. b) do CPC, a inobservância deste ónus tem como consequência “a imediata rejeição do recurso na respetiva parte”.
Já quanto à metodologia e ao critério decisório, como ensina ANA LUÍSA GERALDES14, compete ao Tribunal da Relação apreciar a matéria de facto impugnada, fazendo sobre ela uma nova apreciação, um novo julgamento, após verificar a fundamentação do Tribunal a quo, os elementos e argumentos apresentados no recurso e a sua própria perceção perante a totalidade da prova produzida, continuando a ter presentes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova.
Isto sem esquecer que, como sublinhou o ac. RG 15-12-2016 (Mª João Matos), p. 86/14.0T8AMR.G1 “o julgamento humano se guia por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta”, pelo que “o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
Por outras palavras, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância”.
Nessa medida como assinala ANA LUÍSA GERALDES15, “em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte”.
No fundo, como sublinha MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA16, o Tribunal da Relação deve nortear-se por “um critério de razoabilidade ou de aceitabilidade dessa decisão. Este critério conduz a confirmar a decisão recorrida, não apenas quando for indiscutível que a mesma é correcta, mas também quando aquela se situar numa margem de razoabilidade ou de aceitabilidade reconhecida pela Relação”. 3.2.1.2. O caso dos autos
No caso em apreço, a apelante impugnou a decisão sobre matéria de facto:
a. no tocante aos pontos 2 a 5 dos factos não provados, sustentando que a factualidade neles vertida deve considerar-se provada17;
b. pugnando pelo aditamento de cinco novos pontos de facto, a incluir no elenco de factos provados 18.
Ao fazê-lo observou os ónus impugnatórios enunciados na secção que antecede.
3.2.1.2.1. Pontos 2 a 4 dos factos não provados
Os pontos 2 a 4 do elenco de factos não provados têm a seguinte redação:
2. Não obstante o facto indicado em 9, GG foi autorizado a participar e a exprimir o seu voto.
3. Tendo-se comprometido a enviar a procuração passada pela autora para o primeiro réu, mas tal não veio a suceder.
4. Não tendo a autora ratificado perante o 1º réu o voto expresso por GG.”
Os apelantes consideram que estes factos devem considerar-se provados, invocando, para tanto, as declarações prestadas pelos réus MM, UU, VV, WW, NN, e as declarações prestadas pela autora.
Cumpriria, assim, aferir se a prova produzida, nomeadamente os meios de prova invocados pelos apelantes justificam a alteração da decisão probatória, no sentido de considerar estes factos provados.
Sucede, contudo, que a doutrina e a jurisprudência vêm entendendo, de forma pacífica, que sempre que se verifique que a alteração da decisão sobre matéria de facto pretendida pelo apelante é manifestamente insuscetível de, por si mesma, conduzir à alteração da decisão quanto ao fundo da causa, deve concluir-se que a impugnação da decisão sobre matéria de facto contraria os princípios da celeridade e economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do CPC), constituindo um ato inútil, e como tal proibido (art. 130º), razão pelo qual deve o Tribunal da Relação rejeitá-la.
Conforme refere Carlota Spínola19 «(...) o TR20 está eximido do exercício do dever de modificabilidade da decisão de facto nas situações de irrelevância processual que ficam, por conseguinte, excluídas do campo de aplicação do art. 662.º. Esta constatação lapalissiana baseia-se no princípio da limitação dos atos expressamente previsto no art. 130.º, enquanto manifestação do princípio da celeridade e da economia processual, acolhidos nos arts. 2.º/1 e 6.º/1.
Como é aludido nos acs. do TR de Guimarães (TRG) de 20/102016 (proc. n.º 2967/2012, ID 369508) e de 26/11/2018 (proc. n.º 272/2017, ID 400002), a Relação não deve reapreciar a matéria factual quando os concretos factos objecto da impugnação forem insuscetíveis, “face às circunstâncias próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito”, de ter “relevância jurídica”, sob pena de executar uma atividade processual que já previamente sabia ser “inútil” ou “inconsequente”. Por outras palavras, o exercício dos poderes-deveres de investigação pela Relação só é admissível se recair sobre factos com interesse para o recurso, i. e., factos que a serem demonstrados, modificados ou dados como provados alteram a solução ou o enquadramento jurídico do objeto recursório.».
No mesmo sentido afirma Henrique Antunes21 que «de harmonia com o princípio da utilidade a que estão submetidos todos os actos processuais, o exercício dos poderes de controlo da Relação sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância, seja qual for a modalidade considerada, só é admissível se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa (artº 130 do nCPC).
Se o facto ou factos cujo julgamento é impugnado não forem relevantes para nenhuma das soluções plausíveis de direito da causa é de todo inútil a reponderação da decisão correspondente da 1ª instância, a anulação da decisão ou o reenvio do processo para essa instância para que seja fundamentada, a renovação ou a produção de novas provas. Isso sucederá sempre que, por exemplo, mesmo com a substituição da decisão da matéria de facto impugnada, a solução ou enquadramento jurídico do objecto da causa permanecer inalterado, porque, v.g., mesmo com a modificação, os factos adquiridos são insuficientes ou inidóneos para modificar a decisão de procedência ou de improcedência, da acção ou da excepção, contida no despacho ou na sentença recorrida.
Portanto, a actuação dos apontados poderes de controlo só deve incidir sobre os factos que sejam relevantes para a decisão da causa, segundo qualquer das soluções plausíveis da questão de direito, i.e., segundo todos os enquadramentos jurídicos possíveis do objecto da acção.».
Neste sentido cfr. tb. acs. das Relações: • RP 19-05-2014 (Carlos Gil), p. 2344/12.0TBVNG-A.P1; • RC 27-05-2014 (Moreira do Carmo), p. nº 1024/12.0T2AVR.C1;~ • RG 15-12-2016 (Mª João Matos), p. 86/14.0T8AMR.G1; • RC 16-02-2017 (Moreira do Carmo), p. 52/12.0TBMBR.C1; • RG 11-07-2017 (Maria João Matos), p. 5527/16.0T8GMR.G1; • RG 02-11-2017 (Maria João Matos), p. 501/12.8TBCBC.G1; • RG 08-02-2018 (Maria Amália Santos), p. 96/14.8TBAMR.G1; • RL 17-04-2018 (Torres Vouga), p. 3830/15.5T8LRA.L1-1; • RC 16-10-2018 (Moreira do Carmo), p. 1467/15.8T8CBR-A.C1; • RL 26-09-2019 (Carlos Castelo Branco), p. 144/15.4T8MTJ.L1-2; • RL 24-09-2020 (Inês Moura), p. 35708/19.8YIPRT.L1-2; • RG 02-03-2023 (Jorge Teixeira), p. 189/20.2T8ALJ.G1; • RL 14-03-2023 (Alexandra Castro Rocha), proc. 176/17.8TNLSB.L1; • RP 22-05-2023 (Miguel Baldaia Morais), p. 3602/14.4TBMAI-B.P1.
… bem como os seguintes ac. do STJ: • STJ 17-05-2017 (Fernanda Isabel Pereira), p. 4111/13.4TBBRG.G1.S1; • STJ 13-07-2017 (Fonseca Ramos), p. 442/15.7T8PVZ.P1.S1..;
• STJ 23-01-2020 (), p. 4172/16. • STJ 30-06-2020 (Graça Amaral), p. 4420/18.6T8GMR-B.G2.S1; • STJ 09-02-2021 (Mª João Vaz Tomé), p. 26069/18.3T8PRT.P1.S1; • STJ 19-05-2021 (Júlio Gomes), p. 1429/18.3T8VLG.P1.S1..
Ora no caso vertente, a sentença apelada anulou as deliberações impugnadas pela autora com fundamento a preterição do art. 1436º, nº 2 do CC, que estabelece que “ sempre que estiver em causa deliberação da Assembleia de condóminos relativamente a obras de conservação extraordinária ou constituam inovação a realizar no edifício ou no conjunto de edifícios o administrador está obrigado a apresentar pelo menos 3 orçamentos de diferentes proveniências para a execução das mesmas desde que o regulamento condomínio Assembleia de condóminos não disponha de forma diferente”.
A esta luz, é absolutamente irrelevante para a decisão da causa saber se o senhor NN foi autorizado a participar e exprimir o seu voto na Assembleia de condóminos visada; se nessa ocasião se comprometeu a enviar a procuração outorgada pela autora e se a entregou ou se a autora não ratificou o voto expresso por NN.
Com efeito é inequívoco que a eventual demonstração destes factos em nada contribuirá para alteração ou revogação da sentença apelada.
Daqui resulta que a apreciação da impugnação da decisão sobre matéria de facto quanto a estres pontos sempre constituiria uma atividade processual inútil.
Assim sendo, decide-se não apreciar a impugnação da decisão sobre matéria de facto quanto aos pontos 2 a 4 do elenco de factos não provados.
3.2.1.2.2. Ponto 5 dos factos não provados
O ponto 5 dos factos não provados tem o seguinte teor:
5. Os condóminos presentes na Assembleia de 22/05/2022 dispensaram o primeiro da obtenção de um terceiro orçamento.
O Tribunal a quo justificou a sua decisão no sentido de considerar este facto não provado nos seguintes termos:
“Ademais o documento junto a fls. 71v – acta da assembleia de condóminos de 22.05.2022 – não evidencia a presença da testemunha NN. Não resultando inequivocamente do mesmo documento que a assembleia de condóminos tenha dispensado a apresentação de mais que os dois orçamentos obtidos para as obras da coluna de água e esgotos, nem esta factualidade foi confirmada por qualquer outro meio de prova.”
Os apelantes discordam deste entendimento, invocando para tanto as declarações prestadas pelos réus MM, XX, VV, WW, e o depoimento da testemunha SS.
Transcreveram os seguintes trechos de tais depoimentos:
Declarações do réu MM
“[00:09:31] Meritíssima Juiz: Na assembleia de 22 de maio, os condóminos, que são poucos, portanto, são…
[00:09:42] MM: Sim, sim. São cinco frações… [00:09:44] Meritíssima Juiz: …são cinco frações, não é?
[00:09:44] MM: Exatamente.
[00:09:45] Meritíssima Juiz: Destes quatro Réus e da Autora?
[00:09:47] MM: Exatamente.
[00:09:55] Meritíssima Juiz: Dispensaram o condomínio da apresentação de um terceiro… da obtenção de um terceiro orçamento para as obras? [00:10:02] MM: Nós tínhamos quatro orçamentos…
[00:10:03] Meritíssima Juiz: Sim.
[00:10:03] MM: …para as obras, quatro. Para a conduta de esgoto e águas, é que só tivemos dois. Toda a gente se recusou a dar um orçamento. Mas recusaram-se, porque disseram que era impossível fazer uma previsão, segundo eles, era impossível…
[00:10:17] Meritíssima Juiz: Só para a conduta das águas e dos esgotos?
[00:10:21] MM: E a conduta geral de esgoto e a substituição da tubagem de água de dentro do prédio, era as duas coisas. E, naturalmente…
[00:10:30] Meritíssima Juiz: E para estas duas obras, teve três orçamentos?
[00:10:32] MM: Não. Para essas, tive dois.
[00:10:33] Meritíssima Juiz: Dois.
[00:10:35] MM: Mas para as restantes obras, tive quatro. Sabendo que nós pedimos orçamentos, pelo menos, a nove empreiteiros. Só que muita gente não queria fazer obras naquele prédio. Estamos a falar de um prédio de 1723, com problemas estruturais graves naquela altura, muito graves, com infiltrações muito sérias e com partes do prédio em risco de cair para a via pública.
[00:11:07] Meritíssima Juiz: E porque é que não obteve o terceiro orçamento?
[00:11:11] MM: Porque os empreiteiros que nos deram o orçamento para as obras recusaramse, porque disseram que era impossível prever…
[00:11:16] Meritíssima Juiz: Mas houve dois que sim…
[00:11:18] MM: Houve um deles que deu valores absolutos, e outro deu um valor aproximado. Disse que, depois, com a obra, poderia ser diferente. Mas outros disseram que só vendo, só partindo e indo… foi o que os outros disseram. Por isso, não temos um valor exato, mas tínhamos quatro orçamentos para a obra principal…
[00:11:37] Meritíssima Juiz: Mas essa obra já foi feita?
[00:11:39] MM: A obra principal já foi feita, exterior, sim.
[00:11:41] Meritíssima Juiz: Ah, exterior. A das condutas, não?
[00:11:45] MM: Não, porque falta-nos o dinheiro da do rés do chão. A fração do rés do chão não pagou, então, não consegui fazer as obras todas. A totalidade da obra, nós não conseguimos avançar. Mas a outra obra, nós tínhamos de avançar com urgência.
[00:11:57] Meritíssima Juiz: Mas qual era o valor da obra das colunas e de esgoto e de água? [00:12:04] MM: À volta de 15 mil e qualquer coisa euros. Na prática, era um quinto do valor da obra. Nós tivemos de avançar com urgência para aquilo que punha em causa a estrutura do prédio, e ficámos à espera de receber o dinheiro da condómina YY, para podermos fazer a restante obra, que também é urgente, mas pelo menos não punha em causa, portanto, a própria Administração do condomínio, uma vez que, se caísse alguma parte do prédio em cima de alguém, era a Administração do condomínio que era responsável. Existem fotografias que comprovam aquilo que eu estou a dizer, naturalmente. Existe um estudo feito por um engenheiro, que nós… que também foi solicitado por mim, portanto, para validar também isto que eu estou a dizer. O engenheiro civil foi contratado, portanto, para fazer um estudo sobre o estado de degradação em que o prédio se encontrava.
[00:13:18] Meritíssima Juiz: Pergunta-se se a Ecolis contemplou no orçamento que enviou ao primeiro Réu os trabalhos nas colunas de água e esgotos?
[00:13:25] MM: Sim, contemplou. Mas era um valor, portanto, sujeito a alterações. Não era um valor fixo, era um valor sujeito a alterações.
[00:13:43] Meritíssima Juiz: Então, mas, neste caso, houve três orçamentos…
[00:13:46] MM: Da conduta de esgoto…
[00:13:47] Meritíssima Juiz: Sim.
[00:13:49] MM: …e [impercetível] não, era só da Ecolis e do LL. Os outros dois recusaram-se a dar um valor, portanto, preciso para isso. Disseram que faziam, mas que tinham de fazer à vista. E nós teríamos de ir pagando à medida que eles iam vendo os custos. Não conseguiam estimar o custo. A conduta de esgoto deste prédio é em grés. Portanto, é muito antiga. Estamos a falar de uma conduta com mais de 100 anos, a conduta de esgoto. E a tubagem de águas é em chumbo. Portanto, é óbvio que são duas coisas que têm de ser substituídas com urgência, mas, portanto, entre reparar… entre pôr em risco a estrutura do prédio e as pessoas que passavam ao lado do prédio, e essa…
[00:14:52] Meritíssima Juiz: Claro.
[00:14:53] MM: Nós tivemos de tomar uma decisão.
[00:14:55] Meritíssima Juiz: Senhora doutora, algum esclarecimento adicional?
[00:14:57] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Sim. Só esclarecer, porque a pergunta foi feita e acabou por não responder diretamente, no meu entendimento. Se os condóminos presentes concordaram em avançar com o orçamento aprovado no LL, não obstante não existirem três orçamentos para a coluna de esgoto e águas?
[00:15:16] Meritíssima Juiz: Mas isso não está questionado, senhora doutora. Não faz parte dos temas da prova, essa parte.”
Declarações da ré XX
““[00:02:28] M.ª RR: Nós pedimos também orçamentos para o arranjo da coluna de água e da coluna de esgoto.
[00:02:40] Meritíssima Juiz: E foram apresentados orçamentos para todo este conjunto de obras? [00:02:47] …: Não. As várias… eu, por exemplo, fui lá com vários empreiteiros. O que é que acontecia? Desculpe só de falar assim mais ou menos, porque as datas são um bocado confusas. Os empreiteiros que iam lá… eu fui com alguns, uma vizinha também foi com alguns, e o Dr. AAA também. Os empreiteiros que chegavam ao prédio diziam: “Ah, está bem assim, a gente vai arranjar o telhado”, e aceitavam a obra. E depois, nunca mais diziam nada, não diziam, não… portanto, concretamente, não mandavam papéis e, aparentemente, desistiam do trabalho, porque o prédio estava em muito mau estado, estava péssimo. Entretanto, houve quatro empresas que apresentaram orçamentos, mas só duas das empresas é que apresentaram orçamentos para… aprovaram, aceitaram fazer trabalho para a coluna de água e de esgoto. Mas uma dessas empresas, que era a Ecolis, acho eu, não deu a quantia correta. Disse: “Ah, só quando a gente partir o esgoto e a coluna de água é que podemos saber quanto é que isto custa”. Houve apenas uma firma, que foi o Sr. LL – acho que é assim – que apresentou em concreto as despesas para o orçamento que ele quis fazer para as obras do prédio. Mas houve imensos que foram lá, só eu fui lá com não sei quantos, quatro ou cinco.
[00:04:27] Meritíssima Juiz: Então, e quando é que foi deliberado que faziam…?
[00:04:31] M.ª RR: Foi aprovado em maio.
(…)
[00:09:15] Meritíssima Juiz: Quais foram os orçamentos que estavam em cima da mesa?
[00:09:15] M.ª RR: Havia quatro orçamentos, dois deles tinham coluna de água e esgoto, mas um dizia que só quando partisse…
[00:09:22] Meritíssima Juiz: Outros dois não tinham?
[00:09:22] M.ª RR: Outros dois não tinham.
[00:09:23] Meritíssima Juiz: Pronto.
[00:09:24] M.ª RR: As obras eram urgentíssimas, portanto, não havia hipótese.
[00:09:27] Meritíssima Juiz: Sim, sim?
[00:09:29] M.ª RR: Estava mesmo tudo… eu sou do 2.º andar, portanto, o 4.º andar estava infiltrado com buracos no teto, o 3.º andar, mora lá uma senhora de 90 anos que vivia completamente num mar de bolor. E eu sou do 2.º andar, já tinha a fachada da frente, dentro de casa, toda com a tinta a rebentar, porque a água chegava até à minha casa, que é o 2.º andar. Quando chovia, a água vinha até ao 2.º andar. Mas o que é que eu estava a dizer? Portanto… ah! Que havia aqueles quatro orçamentos, dois tinham a coluna que nós queríamos, dois não tinham, estavam de parte. Um não dava o preço certo do arranjo, e nós resolvemos votar num dos orçamentos, que era o que nos pareceu melhor e que dava já a totalidade da obra feita. Ele foi contra essa votação. Agora, se a doutora me está a perguntar se ele foi contra a votação especificamente da coluna ou do esgoto, eu não sei dizer. Eu sei que ele foi contra aquela votação. Foi a única pessoa que foi contra. Mas ele… já se sabe, não é? Ele não estava representado legalmente. Ele não tinha procuração para estar naquela reunião. Nós estávamos presentes, todos os outros proprietários. Essa senhora, a D. YY, não conheço, eu comprei aquela casa há 15 anos, e eu nunca vi essa senhora, nunca vi. E, dessa vez, aquela pessoa não estava representada, não se fez representar, não levou a procuração. O administrador ainda disse: “Veja lá se quer ir a casa buscar a procuração”, e ele não foi, e nunca apresentou a procuração.
Portanto, ele estava presente fisicamente, mas, legalmente, não estava ali.
[00:11:13] Meritíssima Juiz: E qual foi a decisão relativamente ao orçamento das obras?
[00:11:20] M.ª RR: Foi aprovada por…
[00:11:21] Meritíssima Juiz: Não, das obras da coluna.
[00:11:22] M.ª RR: Estava tudo englobado, senhora doutora.
[00:11:22] Meritíssima Juiz: Sim? Então, aqui pergunta-se…
[00:11:25] M.ª RR: Havia um orçamento. Os orçamentos eram totais.
[00:11:27] Meritíssima Juiz: Pergunta-se se os condomínios…
[00:11:28] M.ª RR: Diga?
[00:11:29] Meritíssima Juiz: Pergunta-se aqui se os condóminos dispensaram a obtenção de um terceiro orçamento para a coluna de água e de esgoto?
[00:11:35] M.ª RR: Sim, dispensámos. Nós ficámos satisfeitos com o que tínhamos em
frente.”
Declarações de parte do réu VV
“[00:02:14] Meritíssima Juiz: O senhor esteve presente?
[00:02:14] VV: Eu estive presencialmente em todas.
[00:02:19] Meritíssima Juiz: Olhe, relativamente ao orçamento para as obras, como é que decorreu essa situação? Quando é que teve conhecimento dos orçamentos?
[00:02:32] VV: Senhora doutora, eu tive conhecimento, não me recordo exatamente em qual das assembleias é que foi. Sei que foram apresentados vários orçamentos, e optámos por aquele que nos dava mais garantias de sucesso nas obras e, em termos de valor, digamos que era um dos mais exequíveis, para além de que contemplava a necessidade das obras que tínhamos que fazer no prédio, para evitar que ele se degradasse mais, e havia uma certa urgência nisso.
[00:03:01] Meritíssima Juiz: E dispensaram a obtenção de um terceiro orçamento?
[00:03:05] VV: Foram apresentados, se bem me recordo, quatro. Embora tivéssemos tentado obter mais, mas houve algumas empresas que não se dignaram a apresentar-nos o orçamento. [00:03:18] Meritíssima Juiz: E recorda-se quais é que apresentaram o orçamento? As obras eram um conjunto de obras, não é?
[00:03:26] VV: Era um conjunto de obras variadas, portanto, para recuperar o prédio na sua essência. E aquela empresa, pela qual optámos, foi aquela que nos apresentou o orçamento mais justo, mais completo e que nos dava mais garantias de sucesso no seu final.
[00:03:42] Meritíssima Juiz: Senhora doutora, algum esclarecimento mais?
[00:03:45] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Sim, apenas relativamente à questão da coluna de esgotos e de água, se os quatro orçamentos contemplavam esta questão, se isso foi discutido e o que é que deliberaram, relativamente a esta?
[00:03:57] VV: O que foi deliberado é que este orçamento, de facto, também contemplava essas obras, também estavam, só que não se puderam realizar, porque… pronto, o dinheiro faltou, devido a um dos condóminos não ter comparticipado como os outros todos comparticiparam, e que era seu dever tê-lo feito, e não fez.
[00:04:20] Meritíssima Juiz: Mais alguma coisa?
[00:04:24] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Se os outros orçamentos também contemplavam a coluna de água e esgotos, ou se era só apenas o que foi aprovado?
[00:04:31] VV: Senhora doutora, para ser sincero, eu acho que havia um mais que fazia, mas tinha um senão. Segundo julgo recordar-me, esse outro orçamento, efetivamente, poderia contemplar, mas eles só conseguiriam dar um orçamento depois de abrir, para ver o que é que estava ali, qual era o problema que decorria dali. E só conseguiam fazer o orçamento depois de verificar o que é que precisavam de fazer.
[00:05:00] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): E se, então, nesse contexto, decidiram aprovar este do Sr. LL, mesmo sendo o único concreto nessa matéria?
[00:05:06] VV: Exatamente. Foi aquele que havia maior consenso e de todos aqueles que foram apresentados, era, realmente, aquele que daria maior consenso e que nos dava mais garantias de sucesso e das coisas bem feitas, dentro do valor do orçamento apresentado”.
Declarações de parte da ré WW
“[00:04:14] Meritíssima Juiz: E que orçamentos eram esses?
[00:04:17] WW: Eram orçamentos de… nós recebemos orçamentos de quatro empresas.
Embora tivessem sido vários empreiteiros, muitos mais empreiteiros que foram ver as obras, alguns…
[00:04:33] Meritíssima Juiz: Mas aqueles que não foram… que não apresentaram, não nos interessa.
Houve quatro que apresentaram?
[00:04:39] WW: Houve quatro que apresentaram. Não tenho de cor os nomes das empresas. [00:04:42] Meritíssima Juiz: Sim. E era relativamente às obras todas?
[00:04:45] WW: Era relativamente às obras do prédio, do prédio, fachadas. Tinha caído o teto da minha casa de banho, havia muitas infiltrações. A platibanda já tinha caído uns pedaços, portanto, eram obras relativamente a toda a estrutura e também relativamente às condutas de água e esgotos e pintura interior do prédio.
[00:05:13] Meritíssima Juiz: E essas obras das colunas de água e de esgotos, estavam em todos os orçamentos? Nesses quatro?
[00:05:22] WW: Não estavam em todos os orçamentos. Não estavam em todos.
[00:05:29] Meritíssima Juiz: Estavam em quantos?
[00:05:31] WW: Estavam em dois orçamentos, mas num não estava detalhado. O que estava detalhado nem foi adjudicado. E os outros disseram que não faziam, não… [00:05:47] Meritíssima Juiz: Mas aqueles foram aprovados, foi aprovado um?
[00:05:51] WW: Foi aprovado um, sim.
[00:06:00] Meritíssima Juiz: Não se recorda qual?
[00:06:01] WW: Foi aprovado o que foi adjudicado, da empresa LL.
[00:06:11] Meritíssima Juiz: E porque é que escolheram esse?
[00:06:13] WW: Escolhemos este porque era o mais detalhado, nos pareceu adequado a tudo o que estava e a relação entre o preço e a qualidade – vamos lá – e pela descrição que tinha, era o mais económico e adequado às necessidades, do nosso ponto de vista.
[00:06:40] Meritíssima Juiz: E houve algum outro orçamento, já disse, esse outro não tinha detalhe do preço da obra? Nem dos trabalhos a realizar?
[00:06:50] WW: Houve um, recordo-me que havia um que não estava nada detalhado, um outro que era bastante mais caro e o outro também não tinha assim detalhe suficiente que se justificasse, do que me recordo, na altura, ter analisado.
[00:07:33] Meritíssima Juiz: Senhora doutora algum esclarecimento?
[00:07:37] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Apenas esclarecer, se apesar de terem só esse orçamento relativamente àquela última questão que referiu, a coluna das águas e dos esgotos, se prescindiram de outros orçamentos nessa matéria e…?
[00:07:51] Meritíssima Juiz: Ó senhora doutora, a senhora já explicou que não foi propriamente prescindir, foi os outros não apresentaram o orçamento detalhado como este. E outros nem sequer apresentaram.
[00:08:04] WW: Não apresentaram, foi-lhes solicitado apresentar, mas a resposta terá sido que o prédio é muito antigo e não sabiam, não conseguiriam quantificar como é que podiam fazer isso porque só depois de abrirem é que podiam ver o que é que iam encontrar”
Depoimento da testemunha SS
[00:01:08] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Recorda-se se elaborou algum orçamento para o prédio sito na Rua 3?
[00:01:16] SS: Sim, sim.
[00:01:18] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Fez um orçamento. E já agora quem é que lhe solicitou a elaboração deste orçamento?
[00:01:21] SS: Foi, portanto, o administrador do condómino, o Sr. MM.
[00:01:25] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Muito bem. O senhor recorda-se ter ido ao local para fazer o orçamento?
[00:01:29] SS: Sim, fui ao local.
[00:01:31] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Foi ao local. E consegue-me, se recordar, suponho que sim, consegue descrever um pouco em que estado é que se encontrava o prédio e quais é que eram as intervenções mais urgentes?
[00:01:41] SS: Portanto o prédio encontrava-se… portanto, o prédio tem muitos anos, e encontrava-se com vários problemas a nível da fachada principal, principalmente, da fachada principal.
[00:01:53] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Que problemas é que tinha a fachada principal?
[00:01:55] SS: Fissuras e estava-se a desfazer tudo aquilo como a gente o farelo, portanto, aquelas argamassas antigas que se estavam a começar a desfazer pela fachada abaixo, portanto, da própria fachada.
[00:02:06] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Mas esse desfazer, desculpe-me por interrompê-lo, era apenas na parte de baixo?
[00:02:11] SS: Era um pouco por toda a fachada do prédio.
[00:02:14] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Ok. Um pouco por todo o lado?
[00:02:17] SS: Um pouco por toda a fachada do prédio principal. E era a nível da cobertura também que tinha… as telhas estavam-se a desfazer todas, portanto, já pelo nível da idade e dos anos da telha, telhas, das caleiras em si, e mesmo aquela mansarda, que era toda composta por madeira, essa própria madeira mansarda estava-se a abrir e a desfazer, portanto, pela idade que tem, que já tinha.
[00:02:39] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Recorda-se, na altura, existiam infiltrações para o interior das frações?
[00:02:43] SS: Existia, existia.
[00:02:44] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Queda de água direta?
[00:02:45] SS: Existia, principalmente, em uma das janelas da fachada principal e até a tardoz, onde passavam aquelas caleiras, portanto, era, inclusivamente, nessa zona que existiam as infiltrações.
[00:02:55] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Mas existia algum buraco, em alguma fração, pelo qual caísse água?
[00:02:57] SS: Não, não era buraco. Portanto, infiltrações em que entrava água pelas paredes, portanto.
[00:03:01] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): OK, muito bem.
[00:03:03] SS: Aquilo vinha das caleiras rotas, já. Aquilo era zinco, zinco velho.
[00:03:08] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Para além dessa questão, que eu suponho que tenha orçamentado, orçamentou mais alguma questão em específico?
[00:03:14] SS: Sim, orçamentámos a cobertura, a fachada principal e a coluna de água no interior do prédio, também.
[00:03:21] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Em relação à coluna de água no interior do prédio, e suponho que também os esgotos, o senhor recorda-se se apresentou um valor fixo?
[00:03:29] SS: Apresentei um valor, sim, para fazer o trabalho, sim. No total.
[00:03:36] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Foi aqui referido que a fachada estava impecável e que não necessitava de intervenção?
[00:03:42] SS: Não, até porque eu segui, houve uma perícia de um engenheiro técnico, foi ao local, fez o relatório, e eu segui todos os trabalhos, mediante essa perícia técnica.
[00:03:55] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): E o senhor concordou com os trabalhos que estavam identificados nessa perícia?
[00:03:58] SS: Sim, sim.
[00:03:59] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Faziam sentido?
[00:04:00] SS: Fazem todo o sentido.
[00:04:02] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): De acordo com as regras de arte e do
ofício?
[00:04:04] SS: Exatamente, com métodos construtivos, métodos construtivos faz sentido o trabalho.
[00:04:08] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Falou-se aqui na picagem da fachada. Era necessário picar toda a fachada ou o trabalho podia ser executado apenas em algumas zonas? [00:04:16] SS: Não, ela tinha que ser toda picada porque a gente a começar a fazer a intervenção, a outra própria massa antiga vai-se desfazer e vai cair. Portanto, aquilo vai ser um desencadear de trabalho, porque ela vai-se começar a desfazer toda…
[00:04:27] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Começa a desfazer, é isso?
[00:04:29] SS: Vai-se desfazer toda, pronto. Tem de ser toda picada, de alto a baixo. [00:04:40] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Em relação a esta questão do desfazer, se fosse possível confrontar a testemunha com o relatório técnico, apenas para ver aqui uma fotografia. É na página 10. O documento número 16…
[00:04:57] Meritíssima Juiz: É mais à frente do que deste. Foi aqui nos últimos [impercetível]. Mais à frente. Mais, mais, mais…
[00:05:12] Funcionário Judicial: Disse que era o 16?
[00:05:14] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Sim. Sim. É a partir daí, sim. Já agora, pode confirmar se é este o edifício que estamos…?
[00:05:20] SS: Sim.
[00:05:23] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Foi aqui que fez a intervenção?
[00:05:24] SS: Exatamente, sim.
[00:05:25] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Muito bem.
[00:05:26] SS: Lá está a mansarda, lá em cima, que eu referi há pouco.
[00:05:29] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Muito bem. Se puder passar para a página 10, que é a seguir… mais um bocadinho em baixo. Aqui. É isto que o senhor referiu há pouco? Que a parede…
[00:06:26] SS: Dentro… portanto, onde está o dedo – dá para reparar aqui – lá por dentro, desfaz-se. Está tudo a desfazer-se. Portanto, as intervenções tinham de ser feitas, a partir, tem que se picar tudo, porque ela depois vai-se desfazendo em todas as fissuras que tinha o prédio. Começa a picar, o resto desfaz-se e vem atrás.
[00:06:43] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): E isto verificou-se, não apenas na parte de baixo da fachada?
[00:06:46] SS: Em vários pontos ao longo da fachada.
[00:06:49] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Estava neste estado?
[00:06:51] SS: Sim.
[00:06:53] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Muito bem. Já agora peço desculpa se fosse possível confrontar só com as fotografias. É o documento número 12. Sim, 12. O documento número 12 na íntegra. É anterior, anterior.
[00:07:07] Meritíssima Juiz: Mais para trás.
[00:07:09] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): O documento 12.
[00:07:12] Meritíssima Juiz: É o outro documento.
[00:07:14] Funcionário Judicial: [impercetível].
[00:07:16] Meritíssima Juiz: Não, é o outro documento.
[00:07:18] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Não é a página, é o outro documento, o número 12. Peço desculpa.
[00:07:24] Meritíssima Juiz: É isto senhora doutora?
[00:07:27] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Sim. Isto aqui diz-lhe já alguma coisa? [00:07:31] SS: Isto é a caleira antiga de zinco, estava toda deteriorada e rota. Está aí a prova mesmo, que a caleira de zinco que existia no prédio antigamente. Fazia… apanhava das águas do telhado [impercetível].
[00:07:44] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Isto causava infiltrações interiores? [00:07:45] SS: Esta caleira de zinco toda rota causava infiltrações pelas paredes abaixo da fachada, exatamente.
[00:07:50] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Agora, a página seguinte deste mesmo documento. Isto era?
[00:08:00] SS: Isto é a madeira que estava na mansarda. Estava toda rota também – como há de reparar – a água infiltrava-se toda por baixo daquela calha que já estava completamente danificada. Toda esta madeira. Isto é a zona da mansarda que foi toda substituída esta madeira. Estava toda podre.
[00:08:13] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Aquele bocadinho, para mim ali, é a parede. Para o senhor é a parede, é a fachada, ou…?
[00:08:17] SS: Tabique.
[00:08:19] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Tabique.
[00:08:21] SS: É uma parede de tabique. Aquela parede.
[00:08:23] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): A página seguinte. Consegue identificar? [00:08:33] SS: Sim, sim. Isto é na cobertura também. Há a caleira junto à mansarda que vem apanhar as águas cá para baixo para a outra caleira principal, que estava [impercetível] há bocado.
[00:08:41] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): Muito bem. As páginas seguintes do mesmo documento. Isto era então?
[00:08:53] SS: O estado das telhas.
[00:08:55] Mandatária dos Réus (Dra. ZZ): O estado das telhas. Pronto. Face a estas fotografias que viu e também ao conhecimento que tem da análise da obra que fez, havia algum perigo designadamente para as pessoas que habitavam o prédio e também para as pessoas que passavam no exterior, decorrente do estado em que o prédio se encontrava?
[00:09:12] SS: Sim, até porque já na fachada principal, se for ver lá em cima, junto à caleira, já havia vários bocados daquela fachada, já se tinha desagregado, já tinha caído. E até passaram uma fotografia que dava perfeitamente para ver que nessa zona já estava a cair para a fachada. Seja para o interior, para o interior também, a estrutura em si já estava a pedir mesmo revisão geral, como as telhas, [impercetível] entrava água e eventualmente até podia esta estrutura de madeira, com tanta água, acabar por ceder, partir, pronto, ou seja, os barrotes da estrutura
A apelada discorda desta pretensão, sustentando que a ata da assembleia de condóminos em apreço não documenta qualquer deliberação neste sentido.
Vejamos então.
Estabelece o art. 1º, nº 1 do DL nº 268/94, de 25-10 que as deliberações das assembleias gerais de condóminos devem ser documentadas em ata assinada por todos os condóminos participantes.
À luz deste preceito, a doutrina e jurisprudência dominantes têm entendido que se trata de formalidade ad probationem.
Neste sentido se pronunciaram, no campo da doutrina, REMÉDIO MARQUES22 FERNANDO PEREIRA RODRIGUES23, LEBRE DE FREITAS24 e ELIZABETH FERNANDEZ25; na jurisprudência, acórdão da Relação de Lisboa de 26.04.2017 (processo nº 18591/15.0T8SNT.l1-7) e acórdão desta Relação de 23.04.2018 (processo nº 482/17.1T8VNG.P1), acessíveis em www.dgsi.pt.
Este entendimento foi igualmente adotado nos seguintes arestos:
• RL 26-04-2017 (), p. 18591/15.0T8SNT.L1-7;
• RP 23-04-2018 (), p. 482/17.1T8VNG.P1; • RP 03-10-2025 (Miguel Baldaia de Morais), p. 3366/23.0T8PRT.P1..
Não obstante, assumindo a ata da assembleia de condóminos natureza de documento particular (cfr. art. 363º, nº 2, in fine do CC), tendo sido assinada pelos condóminos que ali são referidos como tendo participado na mesma, e não tendo sido impugnadas tais assinaturas, nos termos do disposto no art. 376º, nº 1 do CC faz prova plena das deliberações nela documentadas.
Tal significa que no tocante ao teor da deliberações tomadas em tal assembleia não é admissível prova testemunhal em contrário – art. 393º, nº 2 do CC:
Tanto bastaria para concluir pela improcedência da impugnação da decisão sobre matéria de facto quanto a este ponto 5 do elenco de factos não provados.
Mas ainda que assim se não entendesse, sempre chegaríamos à mesma conclusão.
Com efeito, o mencionado ponto 5 dos factos não provados deve ser interpretado e considerado à luz do já citado art. 1436º, nº 2 do CC, do qual resulta que a exigência da obtenção de três orçamentos que contemplem a execução de obras de conservação extraordinária ou com caráter inovador só pode ser preterida quando o regulamento do condomínio disponha de modo diferente ou quando a assembleia de condóminos assim decida.
À luz deste preceito a dispensa da obtenção de três orçamentos por decisão da assembleia de condóminos implica que esta profira deliberação válida e eficaz nesse sentido.
Ora, dos depoimentos invocados não resulta, de forma alguma que a assembleia de condóminos tenha efetivamente deliberado, de forma clara, expressa e inequívoca sobre esta matéria. Com efeito, não só a ata da assembleia de condóminos de 22-05-202226 é absolutamente omissa quanto a uma tal deliberação como nenhum dos depoentes declarou que uma tal deliberação foi aprovada.
Os depoimentos invocados pelos apelantes indiciam quando muito que alguns dos participantes da assembleia de condóminos interpretaram as deliberações aprovadas em tal reunião como contendo uma implícita dispensa da obtenção de um terceiro orçamento; mas de modo algum permitem concluir que na referida assembleia os condóminos presentes decidiram dispensar tal formalidade.
Aliás, da análise global de tais depoimentos o que parece resultar é que essa questão nem sequer foi colocada, muito embora a ata da assembleia de condóminos de 15-01-202227 indicie que os réus tinham consciência da necessidade de obtenção de três orçamentos que contemplassem as mesmas obras, visto que ali consta que “está solicitado um caderno de encargos aos diferentes empreiteiros e será feito um esforço adicional para se conseguir obter um terceiro orçamento. Será também solicitado aos diferentes empreiteiros a necessidade de orçamentar também a substituição da coluna de esgoto.”
Termos em que improcede a impugnação da decisão sobre matéria de facto quanto a este ponto 5 dos factos não provados.
3.2.1.2.3. Aditamento de novos pontos de facto
Pugnaram os apelantes pelo aditamento de novos pontos de facto ao elenco de factos provados, com o seguinte teor28:
2.2.6. A fachada principal e as telhas da cobertura do prédio sito na Rua 1 estavam a desfazer na sua totalidade;
2.2.7. A mansarda e as caleiras em zinco do prédio sito na Rua 1 estavam todas podres;
2.2.8. Existia risco iminente de queda da fachada principal para a via pública, bem assim risco iminente de cedência da estrutura de madeira do telhado (mansarda) atento a existência de infiltrações profundas;
2.2.9. As frações do 2.º, 3.º e 4.º Andar do prédio sito na Rua 1, apresentavam inúmeras infiltrações no seu interior advenientes do escorrimento de água através das paredes adveniente das caleiras e da mansarda pobres;
2.2.10. A empresa FF F. B. executou as obras de reparação e restruturação constantes do orçamento junto aos autos sob os documentos n.º 13 a 15, exceto as referentes à alteração da coluna de água de abastecimento, no valor de €5.670,00, e à alteração das colunas de esgotos, no valor de €5.140,00.
Sucede, contudo que nenhum dos factos que os apelantes pretendem ver aditados ao elenco de factos provados foi alegado por qualquer das partes seja na petição inicial, seja na contestação, seja no articulado em que a autora se pronunciou sobre matéria de exceção.
Ora, como é sabido, em matéria de alegação factual, o princípio dominante no processo civil português é o do dispositivo. Tal princípio encontra-se plasmado no art. 5º, nº 1 do CPC, que estabelece que “Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas.”
O mesmo princípio encontra ainda concretização nos arts. 552º, nº 1, al. d) que estabelece que “Na petição, com que propõe a ação, deve o autor (…) Expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir (…)”; e no art. 572º, al. c) do mesmo código, nos termo do qual “Na contestação deve o réu (…) Expor os factos essenciais em que se baseiam as exceções deduzidas, especificando-as separadamente(…).”
Contudo, a rigidez de um tal princípio é atenuada por alguns mecanismos que lhe conferem alguma elasticidade, e se acham consagrados no nº 2 do mesmo preceito.
Dispõe este que “Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz:
a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;
c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.”
A interpretação desta disposição legal passa pela densificação dos conceitos de factos instrumentais, factos complementares, factos concretizadores, factos notórios, e factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.
Sobre esta matéria, refere LEBRE DE FREITAS29 que factos principais são “os que integram a causa de pedir e os que fundam as exceções”. O mesmo autor acrescenta ainda que “A revisão de 1995-1996 tornou também possível a consideração de factos principais que, completando os alegados nos articulados, se tornem patentes na instrução da causa, mas tão-pouco na introdução destes novos factos pode o juiz substituir-se às partes: a parte neles interessada, isto é, aquela que, a serem os factos verdadeiros, beneficia com o efeito constitutivo, impeditivo, modificativo ou extintivo que deles decorra, deverá manifestar a vontade de deles se aproveitar, alegando-os (hoje 5-2-b)”.
Portanto, para este autor, os factos complementares ou concretizadores são factos principais, e o seu conhecimento depende de uma manifestação de vontade da parte a quem os mesmos aproveitam, bem como da concessão à parte contrária da possibilidade de os contraditar.
Em sentido idêntico se pronunciou MARIANA FRANÇA GOUVEIA30.
Também MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA considera que os factos complementares ou concretizadores são factos essenciais31, o que igualmente colhe a adesão de PAIS DE AMARAL32 e de PAULO PIMENTA33. Este último explica que “têm a categoria de factos complementares ou concretizadores os que, embora necessários para a procedência das pretensões deduzidas (daí serem essenciais), não cumprem uma função individualizadora do tipo legal”. Distingue assim estes factos essenciais, dos factos essenciais nucleares, os quais “constituem o núcleo primordial da causa de pedir ou da exceção, desempenhando uma função individualizadora ou identificadora, a ponto de a respetiva omissão implicar a ineptidão da petição inicial ou a nulidade da excepção”.
Porém, afastando-se do entendimento perfilhado por TEIXEIRA DE SOUSA e MARIANA FRANÇA GOUVEIA, diz PAULO PIMENTA que «acerca da consideração dos factos complementares ou concretizadores prevista no art. 5º 2.b) importa sublinhar que o juiz pode e deve conhecer de tais factos quando “resultem da instrução da causa” e “desde que sobre eles as partes tenham tido a oportunidade de se pronunciar”. Quer isto dizer que, agora e nos termos da lei, o conhecimento desses factos passa a ser oficioso e deixa de estar dependente da vontade do interessado, ao contrário do que sucedia antes do CPC de 2013».
Também neste sentido se pronunciaram PAULO RAMOS DE FARIA e ANA LUÍSA LOUREIRO34.
Esta tese do conhecimento oficioso dos factos complementares ou concretizadores, ainda que subordinado à observância do contraditório logrou aprovação na jurisprudência: cfr, entre outros os acs. RC 23-02-2016 (António Carvalho Martins), p. 2316/12.4TBPBL.C1, e RG 20-09-2018 (Jorge Teixeira), p. 1349/13.8TBVRL.G1..
Segundo TEIXEIRA DE SOUSA35:
“- Os factos complementares são aqueles que concretizam ou complementam os factos que integram a causa de pedir (…) e que asseguram a concludência da alegação da parte (…)
- os factos instrumentais são os que indiciam, através de presunções legais ou judiciais (…) os factos que constituem a causa de pedir ou os factos complementares (…) “.
Para PAULO PIMENTA36, os factos complementares e concretizadores são, a par dos factos nucleares (referidos no nº 1 do art. 5º do CPC), modalidades de factos essenciais.
Para este autor os factos complementares “são os completadores de uma causa de pedir (ou de uma excepção) complexa, ou seja, uma causa de pedir (ou uma excepção) aglutinadora de diversos elementos, uns constitutivos do seu núcleo primordial, outros complementando aquele”. Já os factos concretizadores “têm por função pormenorizar ou explicitar o quadro fáctico exposto, sendo exactamente essa pormenorização dos factos anteriormente alegados que se torna fundamental para a procedência da acção (ou excepção)”.
Quanto à forma como deve se facultada às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre os factos complementares ou concretizadores não alegados, detetamos na jurisprudência entendimentos diversos.
Com efeito, no ac. RC 17-01-2017 (Vítor Amaral), p. 3161/12.2TBLRA-A.C1 entendeu-se que tal requisito se deve considerar verificado se os factos não alegados resultam de depoimentos de testemunha que as partes puderam contra-interrogar.
Próximos deste entendimento parecem colocar-se PAULO RAMOS FARIA e ANA LUÍSA LOUREIRO37, que advogam que “para que a parte tenha a possibilidade de se pronunciar, não é necessário que o juiz despache no sentido de lhe ser dada a palavra para o efeito”.
Diversamente, argumentam ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA, e LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA38 que consideram “(…) mais consentânea com os princípios processuais e designadamente com a proibição de decisões-surpresa a posição que defende que o juiz deve anunciar às partes, antes do encerramento da audiência, que está a equacionar utilizar este mecanismo de ampliação da matéria de facto”.
Louvam-se estes autores do exposto no já mencionado ac. RP 30-04-2015 (Aristides Rodrigues de Almeida), p. 5800/13.9TBMTS.P1, onde se afirmou: “Trata-se no fundo de salvaguardar a confiança que é necessário ter quanto ao conteúdo dos actos do processo e de não impor aos mandatários graus de diligência e atenção absolutos, exigindo-lhes que a todo o momento prevejam todas as hipóteses e levem o esforço probatório aos limites apenas para evitar que se o tribunal vier a considerar relevantes outros factos os mesmos resultem provados ou não provados. Só perante esse alerta se poderão imputar às partes as consequências do esforço probatório que entenderam produzir e a responsabilidade por não terem levado esse esforço ao ponto que seria eventualmente necessário.”
Foi igualmente este o entendimento consagrado no ac. STJ 07-02-2017 (Pinto de Almeida), p. 1758/10.4TBPRD.P1.S1, no qual se expendeu o que segue:
“Admitir-se que o juiz possa, sem mais (isto é, apenas com a exigência de audiência contraditória na produção do meio de prova), considerar o facto novo, essencial (complementar ou concretizador), corresponderia a exigir ao mandatário da parte interessada um grau de atenção e diligência incomum, dirigida não só à produção e valoração da prova que fosse sendo realizada, mas também, antecipando o juízo valorativo do tribunal, à possibilidade de vir a ser retirado desse meio de prova e considerado provado um novo facto nele mencionado.
Crê-se que a disciplina prevista no art. 5º, nº 2, al. b), do CPC exige que o tribunal se pronuncie expressamente sobre a possibilidade de ampliar a matéria de facto com os factos referidos, disso dando conhecimento às partes antes do encerramento da discussão. Só depois poderá considerar esses factos (mesmo que sem requerimento das partes nesse sentido)”.
No mesmo sentido apontaram os acs.: • RE 06-04-2017 (Isabel Peixoto Imaginário), p. 137/15.1T8SSB.E1; • RC 09-08-2018 (Moreira Carmo), p. 825/15.2T8LRA.C1; • RP 07-06-2021 (Eugénia Cunha), p. 358/19.9T8VLG.P1..
Reportando-se ao conceito de factos de que o Tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, refere PAIS DE AMARAL39:
“Além desses [factos notórios], também não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções. Quando deles se socorra, o tribunal deve fazer juntar ao processo documento que os comprove - art.º 412.°, n°2.
Embora o preceito dispense a alegação do facto, não prescinde da sua prova. Esta é feita documentalmente, visto que o facto de que o juiz tem conhecimento consta de outro processo em que teve intervenção, no exercício das suas funções jurisdicionais.”
Por seu turno, refere JOSÉ LEBRE DE FREITAS40:
“Não é pacífico o entendimento do que seja o facto de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.
Na melhor interpretação, o art. 412-2 constitui uma manifestação do princípio geral da eficácia do caso julgado (art. 619-1) ou do valor extraprocessual das provas (art. 421). Se no mesmo tribunal tiver corrido um processo do qual o atual constitui repetição (art. 580-1), o juiz deve servir-se desse facto, de que tem conhecimento funcional, para julgar verificada a exceção do caso julgado (art. 577-i); mas já não pode introduzir no processo o facto de aquela causa ter corrido noutro tribunal, no que está sujeito à alegação das partes.
(...)
Constitui, além disso, facto de conhecimento oficioso o da pendência de outro processo no mesmo tribunal, que poderá fundar a verificação da litispendência (arts. 577-i, 579 e 580-1) ou justificar a suspensão da causa por prejudicialidade (art. 272-1).
Em todos os casos, deve o juiz juntar ao processo documento que comprove o facto funcionalmente conhecido (art 412-2).”
Trata-se, portanto, de factos de que o juiz toma conhecimento no âmbito de outros processos, e de conhecimento oficioso.
Recapitulando diremos, pois, que em sede de impugnação da decisão sobre matéria de facto não podem as partes pugnar pelo aditamento de factos não alegados, exceto se demonstrarem inequivocamente que os mesmos constituem factos instrumentais, complementares, ou concretizadores, ou factos de que o Triubunal teve conhecimento por virtude do exercício das suas funções e se mostrar devidamente observado o princípio do contraditório.
Neste sentido cfr. acs.: • RG 14-03-2024 (José Carlos Duarte), p. 172/20.8T8VVD.G1; • RP 12-05-2024 (Carlos Portela), p. 9375/22.0T8VNG.P1; • RE 13-03-2025 (Filipe César Osório), p. 207/22.0T8SSB.E1; • STJ 11-03-2023 (Mário Belo Morgado), p. 835/15.0T8LRA.C4.S1..
No caso em apreço nenhuma das partes alegou nos articulados qualquer dos factos que os apelantes pretendem agra ver aditados ao elenco de factos provados.
Por outro lado, nada indicia que os factos em questão tenham natureza instrumental, complementar ou concretizadora, ou que o Tribunal a quo deles tenha tido conhecimento por virtude do exercício das suas funções, sendo certo que a ata da audiência final também não permite considerar que tais factos tenham sido objeto do necessário contraditório.
Assim sendo, conclui-se que os mesmos não podem ser atendidos na decisão da presente causa, razão pela qual improcede a pretensão dos apelantes no sentido de tais factos serem aditados ao elenco de factos provados.
3.2.1.2.4. Síntese conclusiva
Face ao supra exposto, conclui-se que nada há a alterar na decisão sobre matéria de facto.
3.2.2. Da anulabilidade das deliberações aprovadas na assembleia de condóminos, relativas à realização de obras de conservação extraordinária do edifício
A única questão a apreciar relativamente ao mérito da causa reside em determinar se as deliberações aprovadas na assembleia de condóminos a que se reportam os presentes autos são anuláveis, por violação do disposto no art. 1436, nº 2º do CC.
Vejamos então.
Estabelece esta disposição legal, na redação que lhe foi conferida pela Lei nº 8/2022, de 10-01 que “2 - Sempre que estiver em causa deliberação da assembleia de condóminos relativamente a obras de conservação extraordinária ou que constituam inovação, a realizar no edifício ou no conjunto de edifícios, o administrador está obrigado a apresentar pelo menos três orçamentos de diferentes proveniências para a execução das mesmas, desde que o regulamento de condomínio ou a assembleia de condóminos não disponha de forma diferente.”
O conceito de obras de conservação extraordinária que consta deste preceito deve ser interpretado como reportado aos trabalhos de reparação que pela sua dimensão e custos, não possam considerar-se reparações indispensáveis e urgentes, as quais podem ser levadas a cabo pelo administrador ou, na falta ou impedimento deste, por qualquer condómino (art. 1427º, nº 1 do CC). Estas são definidas como “as reparações necessárias à eliminação, num curto prazo, de vícios ou patologias existentes nas partes comuns que possam, a qualquer momento, causar ou agravar danos no edifício ou conjunto de edifícios, ou em bens, ou colocar em risco a segurança das pessoas” (nº 2 do mesmo preceito).
No caso vertente resulta da factualidade provada que na assembleia de condóminos realizada em 22-05-2022 foi aprovada, por unanimidade, uma deliberação no sentido de levar a cabo obras de conservação do edifício que incluíam a alteração da coluna de água e esgotos, bem como a pintura interior das zonas comuns, no valor global de € 79.740,09, bem como uma outra, detalhando os montantes das contribuições extraordinárias que cada condómino deveria suportar relativamente a tal encargo. 41
Atenta a sua dimensão e a duração provável da sua execução, bem como a circunstância de a factualidade provada não integrar quaisquer factos que permitam qualificar tais obras como obrasurgentes as mesmas integram indubitavelmente o conceito de obras de conservação extraordinária, pelo que, nos termos previstos no art. 1436º, nº 2 do CC a sua aprovação dependia da prévia obtenção de três orçamentos, exceto se o regulamento do condomínio dispensasse tal formalidade ou a assembleia de condóminos tivesse deliberado tal dispensa (parte final do mesmo preceito).
No caso em apreço resulta da factualidade provada que previamente à realização da assembleia de condóminos em apreço o sr. Administrador obteve apenas dois orçamentos que contemplavam os trabalhos nas colunas de água e esgotos42, sendo certo que não consta que estivesse em vigor qualquer regulamento do condomínio que dispensasse a obtenção de três orçamentos, e que não resultou provado que na mesma assembleia de condóminos ou em qualquer outra tenha sido deliberado dispensar a obtenção de um terceiro orçamento que contemplasse aqueles trabalhos.43
É por isso inegável que as deliberações tomadas na assembleia de condóminos de 22-05-2022 que determinaram a realização de obras de conservação das colunas de água e esgotos e demais trabalhos previstos no orçamento aprovado violam o disposto no art. 1436º, nº 2 do CC.
Ora, estabelece o art. 1433º, nº 1 do CC que “As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado.”
No caso em apreço, não tendo a autora votado tais deliberações, as mesmas são anuláveis.
Sustentaram, contudo, os apelantes que na eventualidade de se concluir por tal anulabilidade, os efeitos desse vício se devem limitar às obras de reparação das colunas de água e esgotos, argumentando que os demais trabalhos previstos no orçamento aprovado constavam também de três outros orçamentos previamente obtidos pelo que quanto a esses trabalhos não teria ocorrido violação do disposto no art. 1436º, nº 2 do CPC.
Sucede, contudo, que a factualidade provada não permite alcançar tal conclusão, na medida em que muito embora no ponto 4 dos factos provados se aluda a quatro orçamentos, em nenhum dos pontos que constituem o elenco de factos provados se discrimina os concretos trabalhos previstos em cada um deles, e muito menos que tais orçamentos tenham discriminado preços parcelares para cada um dos concretos trabalhos a efetuar. Aliás, a factualidade provada também não permite concluir que nalgum momento o administrador do condomínio tenha dado conhecimento de tais orçamentos a casa um dos/as condóminos/as.
Tanto basta para concluir que a anulabilidade das deliberações tem forçosamente que incidir sobre a totalidade das obras adjudicadas, não podendo reduzir-se a parte dos trabalhos previstos no orçamento aprovado.
Termos em que se conclui pela total improcedência da presente apelação.
3.2.3. Das custas
Nos termos do disposto no art. 527º, nº 1 do CPC, “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.”
A interpretação desta disposição legal, no contexto dos recursos, deve atender ao elemento sistemático da interpretação.
Com efeito, o conceito de custas comporta um sentido amplo e um sentido restrito.
No sentido amplo, as custas tal conceito inclui a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (cf. arts. 529º, nº1, do CPC e 3º, nº1, do RCP).
Já em sentido restrito, as custas são sinónimo de taxa de justiça, sendo esta devida pelo impulso do processo, seja em que instância for (arts. 529º, nº 2 e 642º, do CPC e 1º, nº 1, e 6º, nºs 2, 5 e 6 do RCP).
O pagamento da taxa de justiça não se correlaciona com o decaimento da parte, mas sim com o impulso do processo (vd. arts. 529º, nº 2, e 530º, nº 1, do CPC). Por isso é devido quer na 1ª instância, quer na Relação, quer no STJ.
Assim sendo, a condenação em custas a que se reportam os arts. 527º, 607º, nº 6, e 663º, nº 2, do CPC, só respeita aos encargos, quando devidos (arts. 532º do CPC e 16º, 20º e 24º, nº 2, do RCP), e às custas de parte (arts. 533º do CPC e 25º e 26º do RCP).
Tecidas estas considerações, resta aplicar o preceito supracitado.
No caso vertente, face à total improcedência da presente apelação, as custas deverão ser suportadas pelos apelantes.
4. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes nesta 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar a presente apelação totalmente improcedente, assim confirmando a decisão recorrida.
Custas pelos apelantes.
Lisboa, 21 de outubro de 2025 44
Diogo Ravara
Edgar Taborda Lopes
Ana Rodrigues da Silva
____________________________________________
1. Da responsabilidade do relator - art.º 663º nº 7 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26-06, e adiante designado pela sigla “CPC”.
2. Adiante designado pela sigla “CC”.
3. Seguimos de muito perto a redação do relatório da decisão recorrida, a que acrescentámos as incidências subsequentes.↩︎
4. Titular do nº de identificação civil 09554592, e do nº de identificação fiscal ....
5. Titular do nº de pessoa coletiva ....
6. Titular do nº de identificação fiscal ....
7. Titular do nº de identificação fiscal ....
8. Titular do nº de identificação fiscal ....
9. Titular do nº de identificação fiscal ....
10. Neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-116.
11. Vd. Abrantes Geraldes, ob. cit., p. 116.
12. “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Edição, Almedina, 2018, pp. 165-166.
13. Confirmando este entendimento, vd. ac. STJ nº 12/2023, que uniformizou jurisprudência nos seguintes termos: “Nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa.”
14. “Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto”, in Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Vol. I, Coimbra Editora, 2013, pp. 589 ss., em especial p. 609. Este estudo encontra-se também no seguinte endereço:http://www.cjlp.org/materias/Ana_Luisa_Geraldes_Impugnacao_e_Reapreciacao_da_Decisao_da_Materia_de_Facto.pdf
15. Ob. e lug. cits., p. 609.
16. Blog do IPPC, 19/05/2017, Jurisprudência (623), em anotação ao Acórdão da Relação de Coimbra de 07/02/2017, disponível em: https://blogippc.blogspot.com/2017/05/jurisprudencia-623.html
17. Ponto VIII (2º) da motivação do recurso, e arts. 1º a 29º das conclusões.
18. Arts. 30º a 36º das conclusões.
19. “O segundo grau de jurisdição em matéria de facto no processo civil português”, AAFDL Editora, 2022, pp. 44-45.
20. Tribunal da Relação.
21. “Recurso de apelação e controlo da decisão da questão de facto”, pp. 44-45, in http://www.stj.pt (Consultado em 17.01.2023).
22. “A aquisição e a valoração probatória de factos (des)favoráveis ao depoente ou à parte”, in Julgar, nº 16, págs. 168 e seguintes
23. “Os meios de prova em Processo Civil”, 2ª ed., pp. 72 ss.
24. “A ação declarativa comum – à luz do Código de Processo Civil de 2013”, 2ª ed., p. 278.
25. “Nemo debet esse testis in propria causa? Sobre a (in)coerência do sistema processual a este propósito”, in Julgar Especial, Prova Difícil, 2014, pp. 27 ss.
26. Doc. nº 11 junto com a p.i.
27. Doc. nº 6 junto com a p.i.
28. Art. 36º das conclusões.
29. “Introdução ao Processo Civil – Conceito e princípios gerais à luz do novo código”, 4ª ed., Gestlegal, 2017, p. 168.
30. “O princípio dispositivo e a alegação de factos em processo civil”, Revista da Ordem dos Advogados, 2013 II/III, pp. 612-615, disponível em https://portal.oa.pt/upl/%7Bede93150-b3ab-4e3d-baa3-34dd7e85a6ef%7D.pdf.
31. “Algumas questões sobre o ónus de alegação e de impugnação em processo civil”, Scientia Iuridica, Tomo LXII n.º 332, mai-ago 2013. Sobre a mesma matéria e do mesmo autor (com CASTRO MENDES), vd. “Manual de processo civil”, vol. I, AAFDL, 2022, pp. 87-91.
32. “Direito processual civil”, 12ª ed., Almedina, 2015, pp. 300 - 303.
33. “Processo civil declaratório”, 2ª ed., reimpressão, 2018, p. 21.
34. “Primeiras notas ao Código de Processo Civil”, Vol. I, 2ª ed., pp. 39-41.
35. Ob. e lug. cits., pp. 396-397.
36. Ob. cit., p. 22.
37. Ob. e vol. cits., p. 4 e 521.
38. “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, Almedina, 2018, p. 29.
39. Ob cit., p. 289.
40. “Introdução ao Processo Civil”, 4ª ed., Gestlegal, 2017, p. 174
41. Pontos 6 e 7 dos factos provados.
42. Pontos 6 e 11 dos factos provados.
43. Ponto 5 dos factos provados.
44. Acórdão assinado digitalmente – cfr. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.