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AÇÃO NÃO CONTESTADA
DIREITO DE REGRESSO
MEIOS DE PROVA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário
I - O exercício do direito de regresso da seguradora, previsto na al. c) do n.º 1 do art. 27º do Dec. Lei n.º 291/2007, de 21/08, nos termos da doutrina estabelecida no AUJ do STJ n.º 10/2024, de 15 de Julho (DR n.º 135/2014, Série I de 15/7/24), pressupõe a alegação e prova, por parte da seguradora, «de que o condutor conduzia sob influência de substâncias psicotrópicas, diminuindo a aptidão física e mental do condutor para exercer a atividade da condução em condições de segurança”, sendo que esse “estado de influenciação” deve ser demonstrado através de exame médico e/ou pericial. II - Ao omitir pronúncia sobre a admissibilidade, adequação e valoração do meio de prova requerido - exame de sangue efetuado ao Réu na sequência do sinistro - e retirando efeitos de não ter sido feita prova de que o réu conduzia em “estado de influenciação”, mostra-se postergado o direito à prova e a sentença impugnada é prematura por referência ao estado do processo em que foi proferida.
Texto Integral
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
I. Relatório
EMP01... - Companhia de Seguros, S.A propôs ação declarativa[1], sob a forma de processo comum, contra AA, peticionando a condenação deste a pagar-lhe a quantia de €47.316,50, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde 25/11/2024, até efectivo e integral pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que a autora no exercício da sua actividade seguradora celebrou com a sociedade EMP02..., Lda um contrato de seguro do ramo Acidentes de trabalho, titulado pela apólice n.º ...65; no âmbito da referida apólice, encontravam-se segurados os trabalhadores BB e CC, DD, espalhadores de betuminoso; CC auferia uma retribuição anual de € 9 374,9 e DD uma retribuição anual de €9362,47; nos termos do referido contrato, a autora assumiu a responsabilidade do tomador do seguro pelos encargos obrigatórios provenientes de acidentes de trabalho em relação aos seus trabalhadores BB e CC; ainda no exercício da sua actividade, celebrou com a referida EMP02..., Lda um contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, titulado pela apólice n.º ...55, relativo ao veículo automóvel de marca ..., modelo ... e com a matrícula ..-JL-.. (JL), por via do qual assumiu a responsabilidade civil por danos emergentes da circulação da referida viatura; no dia 13/03/2021, a referida viatura esteve envolvida num acidente de viação que desencadeou o acionamento da apólice de seguro mencionada; o referido sinistro ocorreu na ..., União de Freguesias ..., ... e ..., concelho ...; a viatura de matrícula JL era conduzida pelo réu, igualmente trabalhador da EMP02..., Lda e foi a única interveniente no referido acidente de viação; eram ocupantes da referida viatura DD, ... e CC; todos os ocupantes da viatura deslocavam-se das instalações da entidade patronal para as suas casas; a via por onde circulava a viatura JL configura uma recta, composta por duas via para cada um dos sentidos de trânsito, divididas por um separador central; a referida avenida, no sentido Sul/Norte, tem 7 metros de largura, existindo ainda à sua direita, atento o referido sentido de trânsito, uma berma com 2 metros de largura e um passeio também com 2 metros de largura, ladeadas por um muro de gabião feito de pedras dentro de gaiola de aço, utilizado como contenção de encosta; imediatamente antes do local do sinistro existe uma curva à esquerda atento o sentido de trânsito Sul/Norte; a velocidade máxima de circulação era de 70Km/h; o sinistro ocorreu de dia; o local tinha boa visibilidade, na medida em que era possível avistar toda a faixa de rodagem numa extensão de pelo menos 50 metros; não chovia e o piso estava seco e limpo; nas circunstâncias atrás descritas, a viatura de matrícula JL circulava na referida Avª ..., no sentido Sul/Norte, quando o réu, que conduzia a viatura de matrícula JL, perdeu o seu controlo, entrando em despiste, flectindo o sentido de marcha para a direita e embatendo com a frente e lateral frente direita do JL em muro de gabião existente à sua direita atento o sentido de trânsito sul/norte, local onde ficou imobilizado; o réu foi conduzido para o Hospital ..., local onde foi submetido ao teste de despiste de substâncias psicotrópicas, tendo vindo a acusar que circulava com canabinóides, cocaína e opiáceos no sangue; considera que, com a sua conduta, o réu violou os arts 3º, n.º 2, 11º, n.º 1 e 2, 13º, n.º 1, 18º, 31º, n.º 1 al a) e 81º do Cód. da Estrada; o trabalhador CC sofreu uma fratura da rotula esquerda, tendo ficado incapacitado para o trabalho entre 14/03/2021 e ../../2022, tendo a autora pago ao mesmo a quantia de €9046,20 a título de indemnização temporárias por perdas salariais, no período durante o qual o sinistrado esteve impedido de trabalhar, €1,65 relativo a acerto salarial e € 17.722,60 a título de pensão anual e vitalícia desde ../../2023 por conta da incapacidade permanente de que o sinistrado ficou portador, por conta do seguro de acidentes de trabalho; suportou ainda as quantias referentes ao acompanhamento clínico do sinistrado, por conta de consultas, internamentos, cirurgia, exames, nomeadamente o valor de €3504,73 à Unidade Local de Saúde ..., €5542,15 à EMP03..., S.A e todos os custos de deslocação do sinistrado a consultas, tratamentos e exames, tendo pago o valor de €293,74 à EMP04..., S.A e €938,20 diretamente ao sinistrado; procedeu ainda ao pagamento da quantia de €370,62 diretamente ao sinistrato relativo aos medicamentos necessários aos tratamentos do sinistrado; por fim, a averiguação do processo de acidente de trabalho e com o respetivo processo judicial de acidentes de trabalho a autora procedeu ao pagamento do valor de €269,10, dos quais €61,50 foram pagos ao gabinete de peritagem EMP05... e €267,69 com despesas judiciais; relativamente ao trabalhador DD, sofreu lesões na fratura anterior da L4 sem recuo do muro e sem critérios de instabilidade; foi transportado para o Hospital ... e ficou incapacitado para o trabalho entre 14/03/2021 e 26/03/2021; a autora procedeu ao acompanhamento do processo clínico do sinistrado, tendo-lhe pago a quantia de €227,74 a título de indemnização temporárias por perdas salariais, no período durante o qual o sinistrado esteve impedido de trabalhar; suportou ainda as quantias referentes ao acompanhamento clínico do sinistrado, por conta de consultas, internamentos, exames, nomeadamente o valor de €740,82 ao Hospital ..., EPE e €1203,26 à EMP03..., S.A, bem como todos os custos de deslocação do sinistrado a consultas, tratamentos e exames, tendo pago o valor de €12,24; pagou também a quantia de €26,80 diretamente ao sinistrado relativo aos medicamentos necessários aos tratamentos do sinistrado; por fim, a averiguação do processo de acidente de trabalho e com o respetivo processo judicial de acidentes de trabalho a Autora procedeu ao pagamento do valor de €196,80 ao gabinete de peritagem EMP05...; a regularização os presentes processos de acidente de trabalho mantém-se pelo que a autora tem vindo a despender ainda mais quantias relativas ao acompanhamento clínico dos sinistrados, as quais importaram ainda o pagamento de €7158,35; por conta da apólice de seguro de acidentes de trabalho n.º ...65 celebrada com a EMP02..., Lda, a autora suportou, até ao momento, a quantia de €47.316,50; o acidente em discussão foi causado exclusivamente pelo réu e a autora considera-se sub-rogada nos direitos dos lesados contra o réu, ao abrigo do disposto no art 17º, n.º 1 e n.º 4 da Lei n.º 98/2009 de 04/09 e art 27º, n.º 1, al. c) do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08; o autor foi interpelado para proceder ao pagamento da quantia em causa por carta datada de 25/11/2024.
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Regularmente citado para contestar com a advertência da legal cominação, contudo o Réu não apresentou contestação nem constituiu mandatário judicial.
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Por despacho de 2/06/2025, foram considerados confessados os factos articulados pelo Autor na petição inicial (ref.ª ...85).
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Tendo sido dado cumprimento ao disposto no art. 567º, n.º 2, do Cód. de Proc. Civil, a Autora não apresentou por escrito as suas alegações.
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Posteriormente, o Mm.º Julgador “a quo” proferiu sentença (ref.ª ...52), nos termos da qual julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo o réu do peticionado.
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Inconformada, a autora interpôs recurso da sentença (ref.ª ...96) e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem):
«A. Entende a ora Recorrente que o Tribunal a quo apreciou de forma incorreta os factos considerandos como provados, e em concreto a subsunção do direito aos mesmos. B. Ora, inicia a fundamentação de direito a sentença recorrida analisar os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos estabelecidos no artigo 483.º do Código Civil, tendo considero como verificado: (i) d existência de um facto voluntário – considerando que a condução de uma viatura automóvel constituiu um facto voluntário – (ii) que a contudo do Réu é ilícita, “em virtude de ter ofendido o corpo e saúde de terceiros” (iii) que existe culpa porquanto o Réu “estava a conduzir sob o efeito de substâncias psicotrópicas e o mesmo violou várias regras de circulação rodoviária, em concreto em concreto, os arts 3º, n.º 2, 11º, n.º 1 e 2, 13º, n.º 1, 18º, 31º, n.º 1 al a) e 81º do Cód da Estrada e art 292º, n.º 1 do Cód Penal” e (iv) que a conduta do Réu “provocou danos nos demais ocupantes do veículo, nos termos melhor discriminados no relatório no valor global de € 47.316,50 e que estes se devem à conduta do réu, porquanto se não fosse a mesma os mesmos não se teriam produzido (art. 563º do Cod Civil)”. C. Contudo, julgou o Tribunal a quo não verificada a existência de um nexo de causalidade entre o facto e o dano, nomeadamente entre a influência das substâncias psicotrópicas na condução e que tal tenha provocado a ocorrência do sinistro em apreço nos autos, por ausência de ausência de realização de exame de sangue onde se determine que o Réu tinha a sua capacidade perturbada para o exercício da condução. D. Ora, nunca poderia o Tribunal a quo concluir neste sentido, considerando em primeiro lugar os factos alegados pela Apelante, que não tendo sido objeto de impugnação pelo Réu, deveria ter sido considerado como provados, nos termos do disposto no número 1 do artigo 567.º do Código de Processo Civil, nomeadamente o alegado nos artigos 37º e 38º da petição inicial, em concreto: “37º O Réu foi conduzido para o Hospital ...,” e “38º onde veio a ser submetido ao teste de substâncias psicotrópicas através de análise sanguínea dados como provados, nomeadamente”. E. Ora, por se tratar de um documento clínico relativo ao Réu, e face à proteção de dados sensíveis, foi negado à Apelante o acesso ao teor do relatório resultante do aludido exame de sangue. Pelo que a Apelante requereu, no ponto B. do seu requerimento de prova, a notificação do Hospital ... EPE para que viesse juntar nos autos o relatório ao exame de sangue efetuado ao Réu AA na sequência do sinistro ocorrido em 13.03.2021, nos termos do disposto nos artigos 7.º, n.º 4, 417.º e 432.º do CPC. F. Encontrava-se o Tribunal a quo obrigado a pronuncia-se sobre a prova requerida pela a Apelante e a ordenar o ofício da referida Unidade Hospitalar obtenção do elemento de prova e nunca proferir sentença sem que o referido elemento de prova constasse dos autos – já que o mesmo permitiria confirmar o quantitativo de substâncias psicotrópicas de que o Réu era portada no momento do sinistro e por conseguinte, permitir à Apelante fazer prova de que o mesmo se encontrava com as suas capacidades alteradas para efeitos de condução de veículos automóveis – sendo assim, essencial para a descoberta da verdade. G. Nos termos do princípio do inquisitório, consagra-se o poder-dever do tribunal, de ordenar a produção de todas as provas necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, quer a requerimento das partes, quer oficiosamente, sendo que o tribunal apenas pode indeferir a produção de meios de prova quando estes não se adequem ao objeto do processo ou se mostrem inúteis, atuando em conformidade com o princípio do inquisitório. H. Ora, o relatório do exame de sangue efetuado ao Ré na sequência do acidente seria elemento de prova preponderante para apurar se o mesmo se encontra a sua capacidade perturbada para o exercício da condução. O referido elemento de prova afigura-se essencial para a descoberta da verdade material, encontrando-se o Tribunal a quo vinculado a ordenar a obtenção do mesmo, nunca podendo proferir decisão se que o mesmo se encontrasse nos autos para valorização. I. Apenas através do acesso ao aludido exame de sangue efetuado ao Réu após o acidente seria possível comprovar se se encontra comprovado os pressupostos estabelecidos no acórdão invocado pela sentença ora em crise para suportar a sua tese, nomeadamente do Supremo Tribunal de Justiça de 15.07.2024 e proferido no âmbito do processo n.º 3489/17.5 T8STR.E1-A. J. Veja-se nesse sentido o douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29.01.20525 proferido no âmbito do processo n.º 460/23.1GAVCD.P1 e o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22.10.2024 proferido no âmbito do processo n.º 8/23.8T8MFR.L1-8 passíveis de consulta em www.dgsi.pt. K. Na realidade, andou mal a sentença recorrida ao absolver o Réu do pedido. Ora, o Tribunal a quo com os elementos trazidos ao processo pela Apelante, o que deveria ter feito era permitir a produção de prova, por forma a aferir a veracidade do alegado pelas partes e não, como fez, proferir uma decisão de mérito precipitada e injusta. L. A sentença recorrida, que julgou a ação improcedente, é uma verdadeira decisão surpresa, e qual enferma do vício da nulidade., nos termos do disposto na al. d) do número 1 do artigo 615.º do CPC. Devendo, pois, ser revogada e ordenada a descida do processo para que seja oficiado a referida Unidade Hospitalar para vir aos autos juntos o relatório do exame de sangue efetuado ao Réu AA em 13.03.2021, na sequência do sinistro em apreço nos autos. M. A sentença ora em crise também falha na aplicação no direito aos factos quando considera que não se faz prova do nexo de causalidade entre a condução sob o efeito de substâncias psicotrópicas e o acidente, não sendo o Réu responsável pelo ressarcimento do valor peticionado pela Autora nos termos do disposto nos números 1 e 4 do artigo 17.º da LAT (Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro. N. Ora, conforme consta provado nos autos, a Apelante celebrou com a sociedade EMP02..., Lda um contrato de seguro de acidentes de trabalho, titulado pela apólice n.º ...65, sendo que no âmbito desta apólice encontravam-se segurados os trabalhadores daquela sociedade BB, EE, DD. O. Também se encontra provado nos autos que, em 13.03.2021, estes trabalhadores seguiam no veículo de matrícula ..-JL-.., o qual era conduzido pelo Réu AA, os quais se deslocavam do seus local de trabalho para as suas residências, quanto o Réu perdeu o controlo do veículo, entrou em despiste, fletiu o sentido de marcha para a direita e embateu com a frente e lateral direita do veículo automóvel em muro de gabião existente à direita, atento o sentido de trânsito do veículo. P. Resultou igualmente provado que o Réu conduzia sob o efeito de substâncias psicotrópicas. Q. Conforme refere a própria sentença recorrida “Por outro lado, centrando-nos na questão da culpa, na medida em que resulta dos factos provados que o requerido estava a conduzir sob o efeito de substâncias psicotrópicas, o mesmo violou várias regras de circulação rodoviária, em concreto, os arts 3º, n.º 2, 11º, n.º 1 e 2, 13º, n.º 1, 18º, 31º, n.º 1 al a) e 81º do Cód da Estrada e art 292º, n.º 1 do Cód Penal, pelo que Tribunal considera que o mesmo agiu culposamente (art. 487º, n.º 2 do Cód Civil). R. Resultou, ainda, provado que a Apelante por força das lesões sofridas pelos ocupantes do veículo acidentado, despendeu a totalidade de € 47.316,50, valores pagos por força da apólice de seguros de acidentes de trabalho. S. Ora, nesta medida, encontrou-se demonstrada e provada a culpa do Réu pela ocorrência do sinistro em apreço nos autos. T. Para que tal aconteça devem encontrar-se verificados os pressuposta da responsabilidade civil, estatuídos no artigo 483.º do Código Civil. Desta forma, e conforme refere o Tribunal a quo (i) encontra-se provado o facto voluntário – nomeadamente a condução do veículo ..-JL-.. pelo Réu (ii) a ilicitude de tal facto – com a sua conduta o Réu ofendeu o corpo e a saúde de terceiros (iii) culpa do Réu – violação de diversas normais de circulação rodoviária - arts 3º, n.º 2, 11º, n.º 1 e 2, 13º, n.º 1, 18º, 31º, n.º 1 al a) e 81º do Cód da Estrada e art 292º, n.º 1 do Cód Penal (iv) dano – as lesões sofridas pelos demais ocupantes do veículo e cuja reparação importou o pagamento de € 47.316,50 pela Apelante. U. Por seu turno, e ao contrário do que refere a sentença ora em crise, também se encontra verificado o nexo de causalidade entre e o facto e dano. Já que foi a atuação culposa do Réu que originou como consequência direta as lesões sofridas pelos demais ocupante do veículo. V. Nos termos do disposto no número 1 do artigo 17.º da Lei n.º 98/2009 de 4 de setembro “Quando o acidente for causado por outro trabalhador ou por terceiro, o direito à reparação devida pelo empregador não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos gerais.” W. Acrescenta o número 4 do mesmo normativo “O empregador ou a sua seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente pode sub-rogar-se no direito do lesado contra os responsáveis referidos no n.º 1 se o sinistrado não lhes tiver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente.” X. Ora, tendo a Apelante, por força da apólice de seguro de acidentes de trabalho, despendido o valor de € 47.316,50, conforme se encontra provado, encontra-se sub-rogada nos direitos que os sinistrados detinham contra o aqui Réu. Y. Ora, salvo melhor entendimento a culpa do Réu pela ocorrência do sinistro, não resulta unicamente e exclusivamente da condução sob o efeito de substâncias psicotrópicas, não obstante se encontrar provada que conduzia sob a influencia das mesmas. Com a sua conduta o Réu violou diversas normas estradais, o que determinou a eclosão do acidente, por conta do qual sofreram lesões os diversos sinistrados cobertos pela apólice de seguro de acidentes de trabalho e cujas lesões foram reparadas pela aqui Apelante. Z. Por outro lado, os referidos sinistrados, caso não tivessem sido indemnizados pela aqui Apelante, tinham legitimidade efetiva para exigir ao Réu o pagamento dos valores necessários à reparação das lesões sofridas. Não o tendo feito, e a reparação dos danos sido suportada pela Apelante encontra-se esta sub-rogada nos direitos dos mesmos e contra os responsáveis civis pelo acidente. AA. Na realidade, o Réu tinha o comando efetivo do veículo sinistrado; o sinistro ocorreu quanto o Réu perdeu o controlo do veículo, entrou em despiste, fletiu o sentido de marcha para a sua direita e embateu com a frente e lateral frente direita do veículo em muro aí existente. Ora, com esta conduta, só por si, o Réu violou diversas normas estradais – nomeadamente o disposto nos artigos 3.º, n.º 2, 11.º, n.º 1 e 2, 18.º, 31.º. al a) todos do Código da Estrada. A esta atuação culposa concorria igualmente o facto de conduzir sob o efeito de substâncias psicotrópicas, o que também determinou a violação do artigo 81.º do Código da Estrada. O Réu foi único e exclusivo culpado pela eclosão do acidente e por esse motivo é o responsável civil pela eclosão do mesmo. Encontrando-se verificada a existência de um nexo de causalidade entre a conduta do Réu e os danos sofridos pelos passageiros do veículo sinistrado. BB. O nexo de causalidade, em aqui em causa, é independente da taxa das referidas substâncias no sangue de que o Réu era portador, ou se houve ou não alteração da aptidão física ou mental do Réu para a condução. Tal circunstância não retira do Réu o facto de ser o responsável pela eclosão do acidente e como tal ser o responsável civil pelo mesmo, nos termos do estatuído pelo artigo 17.º da LAT. CC. No que concerne ao direito de reembolso da Apelante nos termos do disposto na Lei dos Acidentes de Trabalho, não é só determinante o facto do Réu conduzir o veículo sinistrado sob o efeito de substâncias psicotrópicas. Mas que tenha tido culpa pela eclosão do acidente. E teve-o, conforme se encontra provado por violação das normas estradais já supra indicadas e da sua conduta ter despoletado o acidente que causou lesões aos demais ocupantes do veículo. DD. Ora, a aqui Apelante para além da apólice de seguro de acidentes de trabalho, também tinha para si transferida a responsabilidade pela circulação do veículo ..-JL-.. por via de apólice de responsabilidade civil automóvel obrigatória, facto que, determina que o seu direito de crédito sobre o Ré possa advir quer do disposto na al. c) do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, enquanto direito de regresso, e do artigo 17.º da LAT, enquanto sub-rogação legal dos direitos dos sinistrados. EE. Considerando o disposto no artigo 17.º da LAT, e encontrando-se demonstrados todos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual encontrava-se o Tribunal a quo obrigado a julgar a ação procedente, não podendo por essa via considerar que não foi feita prova quanto ao risco acrescido da condução sob o efeito de substâncias psicotrópicas e se estas coartaram as capacidades do Réu. FF. A Apelante encontra-se sub-rogada nos direitos dos lesados cujas indemnizações suportou por via do contrato de seguro de acidentes de trabalho, sendo que o seu direito de crédito sobre o Réu não depende da demonstração de um estado de influenciação das substâncias psicotrópicas do Réu no momento da condução, ao contrário do que poderá ser exigível no âmbito do direito de regresso da seguradora ao disposto do disposto no artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 291/2007 de 21 de agosto. GG. Pelo que face ao exposto e à prova produzida nos autos, apenas resta deixar à sempre justa decisão de V. Exas., a análise e valoração do ora alegado, revogando a sentença recorrida e substituindo-a por outra que se adeque aos factos, ao direito e à equidade que devem prevalecer, na certeza de que farão V. Exas. a costumada e necessária JUSTIÇA!».
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (ref.ª ...11).
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Delimitação do objeto do recurso
Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do(a) recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal consistem em saber:
i) - Da nulidade da sentença;
ii) - Dos pressupostos do direito de regresso da Autora nos termos do disposto no art. 27.º, n.º 1, al. c), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto;
iii) - Dos pressupostos do direito de sub-rogação da Autora, nos termos do disposto no art. 17.º, n.ºs 1 e 4, da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro.
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III. Fundamentos
IV. Fundamentação de facto.
A sentença recorrida deu como assentes os factos resumidos no relatório.
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V. Fundamentação de direito.
1. Nulidade da decisão recorrida (art. 615º, n.º 1, al. d), do CPC)/Dos pressupostos do direito de regresso da Autora nos termos do disposto no art. 27.º, n.º 1, al. c), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto.
1.1. Como é consabido, é através da sentença, conhecendo das pretensões das partes – pedido e causa de pedir –, que o juiz diz o direito do caso concreto (arts. 152º, n.º 2 e 607º, ambos do CPC).
Pode, porém, a sentença estar viciada em termos que obstem à eficácia ou validade do pretendido dizer do direito.
Assim, por um lado, nos casos em que ocorra erro no julgamento dos factos e do direito, do que decorrerá como consequência a sua revogação, e, por outro, enquanto ato jurisdicional que é, se atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou ainda contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, caso este em que se torna, então sim, passível do vício da nulidade nos termos do art. 615.º do CPC[2].
As nulidades de decisão são, pois, vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in iudicando), seja em matéria de facto, seja em matéria de direito[3].
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão (art. 613º, n.º 3 do CPC) são as que vêm taxativamente enumeradas no n.º 1 do art. 615º do CPC.
Nos termos da al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC, a sentença é nula, entre o mais, quando: d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Como vício de limites, a nulidade de sentença/decisão enunciada no citado normativo divide-se em dois segmentos, sendo o primeiro atinente à omissão de pronúncia e o segundo relativo ao excesso de pronúncia ou de pronúncia indevida. O juiz conhece de menos na primeira hipótese e conhece de mais do que lhe era permitido na segunda.
Verifica-se a omissão de pronúncia quando o juiz deixe de conhecer, sem prejudicialidade, de todas as questões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada[4].
Esta causa de nulidade decorre da exigência prescrita no n.º 2 do art. 608.º do CPC, nos termos do qual o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.
Por sua vez, o excesso de pronúncia gerador da nulidade «só tem lugar quando o juiz conhece de pedidos, causas de pedir ou exceções de que não podia tomar conhecimento»[5].
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1.2. Defende a recorrente que a sentença recorrida, que julgou a acção improcedente, é uma verdadeira decisão surpresa, enfermando do vício da nulidade, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC.
Para tanto refere que, com os elementos trazidos ao processo pela apelante, o Tribunal “a quo” deveria ter permitido a produção de prova, por forma a aferir a veracidade do alegado pelas partes e não, como fez, proferir uma decisão de mérito precipitada e injusta.
Pugna, pois, pela sua revogação e descida do processo, para que seja oficiado à Unidade Hospitalar para vir aos autos juntos o relatório do exame de sangue efetuado ao Réu AA em 13.03.2021, na sequência do sinistro em apreço nos autos.
Vejamos.
A sentença impugnada julgou a acção totalmente improcedente e absolveu o réu do pedido por considerar como não provado o nexo de causalidade entre a condução sob o efeito de substâncias psicotrópicas e o acidente em apreço nos autos, posto não se encontrarem reunidos os pressupostos do direito de regresso da Autora nos termos do disposto na al. c) do n.º 1 do art. 27.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, nem os pressupostos do direito de sub-rogação da Autora, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 4 do art. 17.º da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro.
Na fundamentação de direito da sentença recorrida o Mm.º Julgador “a quo” iniciou a sua análise pela verificação dos pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos estabelecidos no art. 483.º do Código Civil (CC), tendo julgado como verificados os pressupostos (i) da existência de um facto voluntário – considerando que a condução de uma viatura automóvel constituiu um facto voluntário; (ii) da ilicitude da conduta do Réu, “em virtude de ter ofendido o corpo e saúde de terceiros”; (iii) da culpa, porquanto o Réu “estava a conduzir sob o efeito de substâncias psicotrópicas e o mesmo violou várias regras de circulação rodoviária, em concreto em concreto, os arts 3º, n.º 2, 11º, n.º 1 e 2, 13º, n.º 1, 18º, 31º, n.º 1 al a) e 81º do Cód da Estrada e art 292º, n.º 1 do Cód Penal” e (iv) que a conduta do Réu “provocou danos nos demais ocupantes do veículo, nos termos melhor discriminados no relatório no valor global de € 47.316,50 e que estes se devem à conduta do réu, porquanto se não fosse a mesma os mesmos não se teriam produzido(art. 563º do Cod Civil)”.
Mais considerou não resultarem dúvidas de que o Réu “circulava sob a influência de substâncias psicotrópicas, em concreto, canabinóides, cocaína e opiáceos no sangue”.
Contudo, o Tribunal “a quo” julgou não verificada a existência de um nexo de causalidade entre a influência das substâncias psicotrópicas na condução e que tal tenha provocado a ocorrência do sinistro objeto dos autos. Diz para o efeito não resultar “dos factos provados que o exame se tenha pronunciado sobre a afectação da capacidade de conduzir do réu, i.e: (a) se conduzia com os reflexos e sentidos tolhidos pelo consumo de estupefacientes, (b) se em consequência daquelas substâncias psicotrópicas, os reflexos e discernimento do réu se encontravam diminuídos e afectados e (c) se influenciaram a condução do réu.
Funda tal conclusão na ausência de prova, posto que “a mera detecção de substâncias estupefacientes em exame de sangue não é suficiente para que se possa concluir pela diminuição efetiva da capacidade e aptidão física ou psíquica, o que apenas é viável com recurso a relatório médico e/ou pericial”.
Consequentemente, considerou que não se encontravam preenchidos os pressupostos do direito de regresso previstos no art. 27º, n.º 1, al. c) do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08.
Sob a epígrafe “Direito de regresso da empresa de seguros”, o citado normativo prescreve: “1 - Satisfeita a indemnização, a empresa de seguros apenas tem direito de regresso: (…) c) Contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, ou acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos”.
Dispõe o art. 81.º, n.º 5, do Cód. da Estrada que “considera-se sob influência de substâncias legalmente consideradas como estupefacientes ou psicotrópicas o condutor que, após exame realizado nos termos do presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico ou perícia”.
Nesta matéria, importa atender particularmente à jurisprudência firmada pelo acórdão uniformizador do Supremo Tribunal de Justiça n.º 10/2024, de 15 de Julho (DR n.º 135/2014, Série I de 15/7/24):
«Nos termos do artigo 27.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, para que seja reconhecido o direito de regresso à seguradora que satisfez a indemnização ao lesado, terá a mesma de alegar e provar que o condutor conduzia sob influência de substâncias psicotrópicas, diminuindo a aptidão física e mental do condutor para exercer a atividade da condução em condições de segurança, devendo tal “estado de influenciação” ser demonstrado através de exame médico e/ou pericial».
Da fundamentação do mencionado AUJ, consta, para além do mais, o seguinte: (…) [P]ermitimo-nos concluir, (…), que inexiste, ainda, na nossa comunidade científica e, por consequência, na nossa Ordem Jurídica, consenso quanto ao valor ou quantidade de substâncias psicotrópicas no sangue a partir do qual é possível afirmar ou presumir a verificação de um “estado de influenciação”, sendo que, (…), à luz dos conhecimentos científicos disponíveis nesta matéria, nem sempre a presença de tais substâncias psicotrópicas no sangue do condutor quer significar um consumo recente de produtos estupefacientes ou sequer um consumo relevante para efeitos de criação do mencionado estado de influenciação. Ora, se é certo que da Portaria em vigor (Portaria n.º 902-B/2007, de 13-08) resulta o limite a partir do qual o exame de urina deve considerar-se positivo, menos certo não é que dela não resulta qualquer menção ao valor mínimo de concentração de substâncias psicotrópicas exigível para que se considere o exame de sangue positivo (exame de confirmação). Dito de uma forma mais clara e mais directa, o legislador português não estabeleceu (ainda) limites mínimos no sangue para as substâncias psicotrópicas, não adoptou a regra do “limiar mínimo” de onde se possa extrair que o condutor conduzia sob influência daquelas, em “estado de influenciação”, acabando esta patente indefinição por impedir, como é evidente, repetindo e enfatizando, a determinação concreta de um limite mínimo (como se verifica na condução sob o efeito do álcool) a partir do qual seja possível presumir uma diminuição da capacidade para o exercício da condução, ficando esta determinação dependente da avaliação casuística, médica ou pericial, a realizar caso a caso. Ora, sabendo nós que o direito de regresso pressupõe um juízo acerca do risco acrescido de uma determinada conduta imputada ao lesante, resulta evidente que a mera detecção de substâncias psicotrópicas não é suficiente para permitir concluir no sentido da existência de um acréscimo ao risco normal de circulação de veículos, até porque, como vimos, nem todas as substâncias psicotrópicas presentes no organismo humano implicam alterações na aptidão física e mental do condutor para o exercício do acto da condução. Entendimento contrário equivaleria a consagrar um regime “cego” ou de “tolerância zero” (adoptado por Espanha) e a possibilidade de exercício do direito de regresso ao mínimo vestígio de substância estupefaciente, que pode suceder com consumidores passivos, só pelo simples facto de os condutores terem frequentado um local onde outros consumiam substâncias psicotrópicas, sem que tal consumo passivo de tais substâncias pudesse ter qualquer influência na atividade da condução, porque não houve consumo no sentido activo que se exige. Um regime de “tolerância zero” que o legislador, manifestamente, não pretendeu adoptar, sendo certo que o propósito do legislador não assenta em critérios de ordem moral. O importante e decisivo é que da realização do exame de sangue (de confirmação) possa resultar a sua positividade, mercê da revelação de que a presença de qualquer das substâncias psicotrópicas previstas no quadro n.º 1 do anexo V ou de outra substância ou produto, com efeito análogo, tenha sido determinantemente perturbadora da capacidade física, mental ou psicológica do examinado condutor e para o exercício da condução de veículo a motor com segurança. Como é evidente, na falta de fixação do tal limiar mínimo pelo legislador e tratando-se tal “estado de influenciação”, ao fim de contas, de um juízo científico, apenas podendo ser formulado por quem tenha, neste particular, competências técnico-científicas para o efeito, bem se compreende a exigência de realização de exame médico e/ou perícia (cf. art. 25.º da Portaria n.º 902-B/2007, de 13-04). Só assim será possível garantir que a condução foi levada a cabo sob influência de substâncias psicotrópicas e que, por esse motivo, comportou um risco acrescido não previsto aquando da contração do seguro, justificando o exercício do direito de regresso. (…) Resulta, assim, evidente, no respeito pelos estudos científicos referenciados, que a mera deteção de estupefacientes no exame de sangue não é suficiente para fundar o direito de regresso da seguradora, sendo, antes, necessário que esta demonstre, através de exame médico e/ou pericial, tal como determina o art. 81.º, n.º 5, do Código da Estrada, que os níveis de concentração de substâncias psicotrópicas são, face às variáveis presentes no caso concreto, susceptíveis de diminuir a capacidade de condução. Isto porque, como se compreenderá, apenas através de um exame de sangue e correspondente relatório médico e/ou pericial, elaborado à luz dos conhecimentos científicos existentes sobre a matéria e com consideração às especiais características do condutor concreto, é possível demonstrar essa diminuição da capacidade para levar a cabo o ato da condução. Pelas razões enunciadas, em concordância com a posição de princípio assumida pelo Acórdão fundamento, haverá que concluir que, nos termos do artigo 27.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, para que seja reconhecido o direito de regresso à seguradora que satisfez a indemnização ao lesado, terá a mesma de alegar e provar que a condução fora exercida sob influência de substâncias psicotrópicas, diminuindo a aptidão física e mental do condutor para exercer a atividade da condução em condições de segurança, devendo tal “estado de influenciação” ser demonstrado através de exame médico e/ou pericial. (…)”.
Em suma:
- Não basta o consumo de estupefacientes (acusado pela sua presença no organismo do condutor) para se verificar o direito de regresso contra o condutor, sendo necessário que se prove que esse consumo teve uma influência negativa na capacidade para o exercício da condução.
- Pressupostos do direito de regresso da seguradora contra o condutor são, para além da satisfação da indemnização, que (i) o condutor tenha dado causa ao acidente, (ii) o consumo de estupefacientes em medida suficiente para não permitir a condução em condições de segurança, (iii) a ligação entre uma coisa e outra, ou seja, o nexo de causalidade[6] e (iv) tal “estado de influenciação” deve ser demonstrado através de exame médico e/ou pericial.
Ora, no caso concreto, a autora alegou nos arts. 37º e 38º da petição inicial que: “37º O Réu foi conduzido para o Hospital ..., 38º onde veio a ser submetido ao teste de substâncias psicotrópicas através de análise sanguínea, 39.º os quais vieram a demonstrar que o Réu circulava com canabinóides, cocaína e opiáceos no sangue, conforme documento n.º 3”.
Mais alegou, nos arts. 48º a 51º do mesmo articulado, que: “48.º Como acima referido, ao Réu foram detetadas substâncias psicotrópicas no sangue, nomeadamente, canabinóides, cocaína e opiáceos, conforme documento n.º 3. Ora, 49.º Tal facto causou uma alteração anormal no estado físico e psíquico do Réu, 50.º dando origem à ocorrência do sinistro acima descrito. 51.º De facto, é de conhecimento público que o consumo de substâncias psicotrópicas causa no utilizador, entre outros efeitos, uma alteração das capacidades visuais e auditivas, diminuição da coordenação motora, diminuição da capacidade de raciocínio e atenção do utilizador e diminuição geral dos reflexos do mesmo”.
E, em sede de requerimento probatório indicado no final da petição inicial, a autora requereu, no ponto B, “a notificação do Hospital ... EPE, com sede na R. das ..., ... ..., para vir aos autos juntar o relatório ao exame de sangue efetuado ao Réu AA na sequência do sinistro ocorrido em 13.03.2021, para prova do alegado no artigo 39º da petição inicial e nos termos do disposto nos artigos 7.º, n.º 4, 417.º e 432.º do CPC”.
Pois bem, mostra-se plausível a alegação de que, por se tratar de um documento clínico relativo ao Réu e face à proteção de dados sensíveis, foi negado à Autora o acesso ao teor do relatório resultante do aludido exame de sangue, sendo que o mesmo poderá ser relevante para determinar o quantitativo de substâncias psicotrópicas de que o Réu era portador no momento do acidente em discussão nos autos, bem como se o valor detetado no exame de sangue era em grau suficiente para diminuir a aptidão física e mental do condutor para exercer a atividade da condução em condições de segurança.
Como resulta da fundamentação do AUJ, a demonstração de tal “estado de influenciação” será essencial ao sucesso da presente acção de regresso, competindo à seguradora a prova de que o Réu, condutor do veículo segurado, deu causa ao acidente e que acusava, à data do acidente, consumo de substância estupefaciente com características, propriedades e em quantidade suscetíveis de influir na sua capacidade e aptidão física ou psíquica para o exercício da condução, o que, nos termos da legislação em vigor, apenas poderá ser feito através de exame e médico e/ou pericial e subsequente demonstração médica e/ou pericial nesse sentido.
Sucede que, sem que o referido elemento de prova constasse dos autos e sem que sequer se tenha pronunciado sobre a admissibilidade e/ou pertinência daquele requerido meio de prova, o Tribunal recorrido optou por prolatar de imediato sentença, na qual considerou não verificada a existência de um nexo de causalidade entre a condução sob a influência das substâncias psicotrópicas e a ocorrência do sinistro objeto dos autos. Ou seja, afirmou não poder concluir-se que a condução automóvel do Réu era feita sob influência de substâncias psicotrópicas.
Certo é que o propósito visado com o meio de prova requerido era o de permitir provar/confirmar o quantitativo de substâncias psicotrópicas de que o Réu era portador no momento do sinistro e de que o mesmo se encontrava com as suas capacidades físicas e psíquicas alteradas/diminuídas para o exercício da condução de veículos automóveis, o que influenciou essa concreta atividade.
Ou seja, tal meio de prova seria relevante para poder demonstrar que o Réu/condutor conduzia em “estado de influenciação” pelo consumo daquelas substâncias psicotrópicas (canabinóides, cocaína e opiáceos),
Ao omitir pronúncia sobre a admissibilidade, adequação e valoração de requerido meio de prova e retirando efeitos de não ter sido feita prova de que o réu conduzia em “estado de influenciação”, é de concluir que foi postergado o direito à prova e que a sentença impugnada é prematura por referência ao estado do processo em que foi proferida.
Seja no sentido da corroboração do juízo decisório de improcedência da acção ou, ao invés, da sua infirmação, entendemos que aquele juízo conclusivo em que assentou a decisão de improcedência da acção apenas poderá ser legitimamente efetuado numa fase ulterior, designadamente após a produção (e valoração) do enunciado meio prova, por tal se revelar pertinente e necessário.
Isto porque não está excluída a possibilidade da autora/recorrente lograr fazer prova dos factos conducentes à demonstração de que o condutor conduzia em “estado de influenciação” pelo consumo das apuradas substâncias psicotrópicas mediante o meio de prova por si indicado/requerido.
Será, porém, imprescindível que lhe seja permitido produzir esse meio de prova.
Assiste, assim, razão à recorrente quando aduz que o requerido meio probatório – relatório do exame de sangue efetuado ao Réu na sequência do acidente – seria elemento de prova preponderante para poder apurar se consumo das substâncias psicotrópicas teve uma influência negativa na capacidade para o exercício da condução. Afigurando-se essencial para a descoberta da verdade material, o Tribunal “a quo” encontrava-se vinculado a ordenar a obtenção do mencionado elemento de prova, nunca podendo proferir decisão sem que o mesmo se encontrasse nos autos para valorização.
O que significa que, aquando da elaboração da sentença, na qual concluiu que à seguradora não assiste o direito de regresso que a mesma pretende exercer na acção, os autos não reuniam ainda as necessárias condições com vista a determinar o preenchimento, ou não, do disposto no art. 27.º, n.º 1, al. c), do Dec. Lei n.º 291/2007, de 21-08.
Aquela omissão de pronúncia sobre o requerido meio de prova consubstancia uma nulidade nos termos do art. 195º, n.º 1, do CPC, a qual, todavia, é absorvida pela nulidade decisória a que se reporta o art. 615º, n.º 1, al. d), do CPC[7].
Termos em que se conclui que a decisão impugnada é nula, porquanto o Mm.º Juiz “a quo” se pronunciou sobre questão de que não podia ter tomado conhecimento sem prévia pronúncia sobre a admissibilidade do requerido meio de prova.
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2. Dos pressupostos do direito de sub-rogação da Autora, nos termos do disposto no art. 17.º, n.ºs 1 e 4, da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro.
Sustenta ainda a recorrente que a sentença recorrida também falha na aplicação do direito aos factos quando considera não ser o Réu responsável pelo ressarcimento do valor peticionado pela Autora nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 4 do art. 17.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro (LAT).
Isto porque, defende, está demonstrada e provada a culpa do Réu pela ocorrência do sinistro em apreço nos autos que vitimou os demais colegas de trabalho, bem como o nexo de causalidade entre o facto e os danos, designadamente os pressupostos da responsabilidade civil estatuídos no art. 483.º do Código Civil.
Acrescenta a Autora que, por força da apólice de seguro de acidentes de trabalho, tendo despendido o valor de € 47.316,50 por conta dos valores pagos para ressarcimento das lesões sofridas pelos ocupantes do veículo acidentado, encontra-se sub-rogada nos direitos que os sinistrados detinham contra o Réu, nos termos do n.º 4 do art. 17.º da Lei n.º 98/2009, sendo que esse seu direito de crédito não depende da demonstração de um estado de influenciação das substâncias psicotrópicas do Réu no momento da condução, ao contrário do que poderá ser exigível no âmbito do direito de regresso da seguradora ao disposto do disposto no artigo 27.º do Dec.-Lei n.º 291/2007.
O art. 17º, n.ºs 1 e 4, da Lei n.º 98/2009[8] estipula:
«1 - Quando o acidente for causado por outro trabalhador ou por terceiro, o direito à reparação devida pelo empregador não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos gerais. (…) 4 - O empregador ou a sua seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente pode sub-rogar-se no direito do lesado contra os responsáveis referidos no n.º 1 se o sinistrado não lhes tiver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente».
O regime invocado remete-nos para as situações imputáveis a terceiros, sejam eles trabalhadores da empresa ou pessoas a ela estranhas. Exemplo típico destes casos são os acidentes de viação simultaneamente de trabalho e de viação.
Em caso de acidente simultaneamente de viação e de trabalho, a responsabilidade em 1ª linha será do responsável pelo acidente de viação (ou sua seguradora); a responsabilidade primacial e definitiva é a que incide sobre o responsável civil, quer com fundamento na culpa, quer com base no risco; a responsabilidade por acidente de trabalho tem uma natureza meramente complementar, quase que de “garantia[9].
Daí o direito de regresso concedido à entidade empregadora ou respetiva seguradora, em relação aos responsáveis pelo acidente de viação, de forma a repercutir aquilo que, a título de responsável objetivo pelo acidente laboral, tenha pago ao sinistrado (pois, no âmbito da responsabilidade meramente objetiva, garantem ao sinistrado o recebimento das prestações que lhe são reconhecidas pela legislação laboral)[10].
Se o dano sofrido pelo trabalhador foi causado por outro trabalhador ou por terceiro, o lesado pode diretamente demandar o responsável, nos termos gerais da responsabilidade extracontratual, como prescreve o n.º 1 do art. 17º da LAT.
Pode, porém, suceder que o trabalhador lesado não demande o terceiro responsável pela ocorrência do acidente, designadamente por se encontrar já ressarcido pelo empregador (ou pela seguradora para a qual foi transferida a responsabilidade emergente de acidente de trabalho); nesse caso, cabe então ao empregador – ou à seguradora, como sucede no presente caso –, demandar o terceiro (ou a seguradora para a qual foi transferida a responsabilidade civil), exigindo-lhe o que deveria ter pago ao trabalhador (art. 17º, n.º 4, da LAT). Outrora qualificado como direito de regresso é, agora, qualificado como sub-rogação[11].
Importa, porém, fazer uma diferença entre estranhos à empresa e os colegas de trabalho, pois quanto a estes a responsabilidade deve ser igualmente aferida dentro dos pressupostos da reparação de acidentes de trabalho. Deste modo, só se deverá entender que existe responsabilidade dos colegas de trabalho que tenham, sem causa justificativa, violado condições de segurança estabelecidas pela entidade patronal ou que, com dolo ou negligência grosseira, tenham atuado de modo a causar danos a um trabalhador da empresa; as atuações negligentes devidas à habitualidade de realização da actividade não conformam responsabilidade civil[12].
Assim sendo, e ao invés do propugnado na apelação, dir-se-á que a mera verificação da violação de diversas regras estradais, nomeadamente o disposto nos arts. 3.º, n.º 2, 11.º, n.º 1 e 2, 18.º, 31.º. al. a) e 81º do Código da Estrada e art. 292º, n.º 1, do Cód. Penal – sem entrarmos em linha de consideração com a demonstraçãode o réu conduzir o veículo sinistrado sob influência de substâncias psicotrópicas, com diminuição/alteração da aptidão física e mental para exercer a atividade da condução em condições de segurança, o que será relevante para efeitos da verificação do invocado direito de regresso da seguradora ao abrigo do disposto do disposto no art. 27.º do Decreto-Lei n.º 291/2007 –, consubstanciadora duma actuação negligente do réu no exercício da condução, imputável a título de culpa, é, em princípio, por si só insuficiente para fazer operar a sub-rogação prevista no art. 17º, n.º 4, da LAT.
Em tese, admite-se, porém, que a determinação da taxa das substâncias psicotrópicas de que o réu acusava, à data do acidente, independentemente da demonstração de que a mesma influiu negativamente na sua capacidade e aptidão física ou psíquica para a condução, possa assumir relevância para aferir se o referido condutor deve ser considerado responsável civil causador do acidente para os efeitos previstos no art. 17º, n.º 1, da LAT.
Serve isto para concluir que, ainda que o requerido exame de sangue venha a revelar-se insuficiente para habilitar o Tribunal a concluir que o condutor conduzia sob influência das referidas substâncias psicotrópicas, em “estado de influenciação”,não é liminarmente de excluir que o mesmo não possa ter significância para aferir o grau de negligência da conduta do réu, o qual, apesar de acusar consumo daquelas substâncias, conduzia o veículo automóvel nas circunstâncias apuradas, tendo dado causa ao acidente, o que poderá ter relevo para a eventual verificação dos requisitos da sub-rogação legal.
Assim, embora se encontrem demonstrados todos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual no sentido de a eclosão do acidente ser imputável ao réu, a título de culpa (na modalidade de negligência), a verdade é que os elementos fácticos apurados não permitem desde já concluir pela verificação dos pressupostos do art. 17.º da LAT conducentes à procedência da acção. Como vimos, no caso de o terceiro causador do sinistro ser um colega de trabalho do sinistrado, a mera demonstração dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual pode ser insuficiente à atribuição da sub-rogação estabelecida no citado normativo. Veja-se que, não havendo descaraterização do acidente de trabalho (art. 14.º da LAT[13]), e não estando excluída a reparação pelo dano emergente do acidente de trabalho (in itinere) de que também poderá ser titular o ora recorrido/ réu, não seria curial que este ficasse civilmente responsável pelo ressarcimento dos valores indemnizatórios pagos aos demais colegas de trabalho decorrentes do sinistro laboral em causa.
Com vista a aquilatar do preenchimento dos requisitos previstos no art. 17.º da LAT torna-se, porém, também indispensável determinar as características, propriedades e quantidade das substâncias estupefacientes que o réu/condutor havia consumido e que acusava à data do sinistro e se estas coartaram as suas capacidades e aptidão física ou psíquica para a condução.
O que igualmente nos leva a concluir pela prematuridade da sentença proferida nos autos, posto que os autos não reuniam ainda os elementos necessários para a prolação de uma decisão conscienciosa sobre o mérito da acção.
Termos em que procede parcialmente a apelação.
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Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 527º do CPC, a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte que lhes tiver dado causa, presumindo-se que lhes deu causa a parte vencida, na respetiva proporção.
Como a recorrente teve êxito no recurso (pois a decisão recorrida foi anulada), e o recorrido é por ele negativamente afetado, esta é a parte vencida e, consequentemente, deu causa as custas concernentes, conforme a referida presunção.
Em consequência, o recorrido, porque vencido no recurso, apesar de não ter contestado nem contra-alegado, é o responsável pelo pagamento das custas respetivas, pelo que se impõe a sua condenação.
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VII. DECISÃO
Perante o exposto acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência, declara-se nula a sentença recorrida, determinando-se que o Tribunal “a quo” oficie ao Hospital ... EPE para vir aos autos juntar o relatório ao exame de sangue efetuado ao Réu AA na sequência do sinistro ocorrido em 13.03.2021,
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Custas da apelação a cargo do apelado (art. 527º do CPC).
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Guimarães, 30 de outubro de 2025
Alcides Rodrigues (relator)
Carla Maria da Silva Sousa Oliveira (1ª adjunta)
Raquel Baptista Tavares (2ª adjunta)
[1] Tribunal de origem: Juízo Local Cível de Braga - Juiz ... - do Tribunal Judicial da Comarca de Braga. [2] Cfr. FF e GG, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, vol. I, 2ª ed., 2014, Almedina, pp. 598/601. [3] Cfr. Ac. do STJ de 17/10/2017 (relator HH), Acs. da R... de 4/10/2018 (relatora II) e de 5/04/2018 (relatora II), todos disponíveis in www.dgsi.pt. e Ac. do STJ de 1/4/2014 (relator JJ), Processo 360/09, Sumários, Abril/2014, p. 215, https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/sumarios-civel-2014.pdf. [4] Cfr. Ac. do STJ de 28/02/2013 (relator KK), in www.dgsi.pt. [5] Cfr. Ac. do STJ de 6/12/2012 (relator KK), in www.dgsi.pt. [6]Cfr. Ac. da RL de 15/09/2022 (relator LL), in www.dgsi.pt. [7] Cfr. Acs. da R... de 22/11/2022 (relator MM) e de 19/12/2024 (relatora NN), in www.dgsi.pt. [8] Diploma que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, incluindo a reabilitação e reintegração profissionais, nos termos do artigo 284.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. [9]Cfr. OO, in Nótula sobre o tratamento Jurisprudencial dos Acidentes que merecem a qualificação simultaneamente de acidentes de trabalho e de acidentes de viação, Revista Julgar, n.º 46, Janeiro-Abril 2022, pp. 248-249. [10]Cfr. Ac. da RC de 29/04/2025 (relator PP), in www.dgsi.pt. [11] Cfr. sobre o tema, QQ, Direito do Trabalho, 2015 - 7ª ed., Almedina, pp. 883/885. [12] Cfr. QQ, obra citada, p. 884 (nota 1922). [13]Ocorre descaracterização do acidente de trabalho quando o acidente, embora mantendo as características de um acidente de trabalho, não dá lugar à sua reparação, pretendendo-se sancionar as faltas consideradas indesculpáveis de quem trabalha.
Em relação à descaracterização do acidente, dispõe o art. 14.º da LAT:
«1 - O empregador não tem de reparar os danos decorrentes do acidente que:
a) For dolosamente provocado pelo sinistrado ou provier de seu acto ou omissão, que importe violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pelo empregador ou previstas na lei;
b) Provier exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado;
c) Resultar da privação permanente ou acidental do uso da razão do sinistrado, nos termos do Código Civil, salvo se tal privação derivar da própria prestação do trabalho, for independente da vontade do sinistrado ou se o empregador ou o seu representante, conhecendo o estado do sinistrado, consentir na prestação.
2 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, considera-se que existe causa justificativa da violação das condições de segurança se o acidente de trabalho resultar de incumprimento de norma legal ou estabelecida pelo empregador da qual o trabalhador, face ao seu grau de instrução ou de acesso à informação, dificilmente teria conhecimento ou, tendo-o, lhe fosse manifestamente difícil entendê-la.
3 - Entende-se por negligência grosseira o comportamento temerário em alto e relevante grau, que não se consubstancie em acto ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da confiança na experiência profissional ou dos usos da profissão».