MEDIDAS DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO DE MENORES
REVISIBILIDADE
CASO JULGADO
RELAÇÃO COM O PROGENITOR NÃO GUARDIÃO
DISTÂNCIA GEOGRÁFICA
IDADE DAS CRIANÇAS
Sumário

I – A aplicação das medidas tutelares está sujeita ao princípio da atualidade e a revisão das medidas pode ocorrer antes de decorrido o período acordado para a sua aplicação, desde que haja razões que o justifiquem, sem que tal signifique violação de caso julgado.
II – Os filhos têm direito a manter relações de grande proximidade com o progenitor a quem não estejam confiados, ainda que este, durante algum tempo, tenha estado afastado das suas vidas.
III – A necessidade de percorrer, em fins de semana alternados, uma distância de cerca de 260 km, em cerca de 2h30m, quase sempre em autoestrada, não implica demasiado cansaço para as crianças, que as impeça de estar com o progenitor, ainda que tenham apenas três e cinco anos de idade.
(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral


Recorrentes/

Avó materna e Progenitora            AA

                                                   BB

Recorrido                                    CC

Crianças                             DD

                                                  EE

        

Juiz Desembargador Relator: Anabela Marques Ferreira

Juízes Desembargadores Adjuntos: Chandra Gracias

                                               Paulo Correia

Sumário (da responsabilidade do Relator – artº 663º, nº 7, do Código de Processo Civil)

(…).

Acordam os juízes que nestes autos integram o coletivo da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:



I – Relatório

Nos autos de processo de promoção e proteção, relativo às crianças DD, nascida em ../../2020, e EE, nascida a ../../2022, em que são requeridos os seus progenitores, BB e CC, que correm termos no Juízo de Família e Menores de Coimbra - Juiz 3, o Ministério Público deu início ao processo na sequência do envio para Tribunal do processo de promoção e proteção que corria termos na CPCJ ....

As menores encontram-se confiadas à avó materna, tendo convívios regulares com o progenitor.

A 26 de Junho de 2025, foi proferida decisão no sentido do alargamento dos convívios das menores com o progenitor, nos seguintes termos:

- O pai deverá ir buscar as crianças à sexta feira, à escola, no final das atividades e deverá entregar as crianças na escola, na segunda feira, no início das atividades, com a tolerância decorrente do período inerente à deslocação e sendo período não letivo, preferencialmente a começar no dia de amanhã (27 de junho), com entrega a 30 de junho. Caso não seja possível por uma questão logística, o pai deverá ir buscar as meninas na 6.ª feira, 4 de julho, nos mesmos moldes, entregando-as a 7 de julho;

- Este regime repetir-se-á catorze dias depois;

- Vinte e oito dias depois do primeiro fim-de-semana e concretizado o segundo fim-de-semana, o pai deverá ir buscar as crianças à sexta feira, à escola, no final das atividades letivas e deverá entregá-las na segunda-feira, às 19h00, em casa da avó materna;

- Este regime repetir-se-á catorze dias depois e durante o período não letivo;

- Caso a avaliação não seja efetuada até ao início do próximo ano letivo, a alternância de fins-de-semana regressará ao modelo inicial, ou seja, o pai vai buscar as crianças à sexta feira, à escola, no final das atividades letivas e entrega as crianças na escola, na segunda feira, no início das atividades letivas.

Nestes períodos o pai deve realizar videochamadas com a avó materna, fomentando o contacto das meninas com a avó.

Caso a mãe o deseje poderá contactar com as filhas, devendo o pai fomentar este contacto.

         A Recorrente avó materna AA interpôs recurso dessa decisão, concluindo, nas suas alegações, que:

(…).

A Recorrente progenitora BB (Apenso H, apensado a este) interpôs recurso da mesma decisão, concluindo, nas suas alegações, que:

(…).

            O Recorrido progenitor CC respondeu ao recurso apresentado pela avó materna AA, concluindo, nas suas alegações, que:

         (…).

         O Recorrido progenitor CC respondeu igualmente ao recurso apresentado pela progenitora BB, concluindo, nas suas alegações, que:

         (…).

O Ministério Público respondeu aos recursos apresentados pela avó materna AA e pela progenitora BB, concluindo, nas suas alegações, que:

(…).



II – Objeto do processo


Colhidos os vistos legais, prestados contributos e sugestões pelos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos e realizada conferência, cumpre decidir.

Antes de mais, consigna-se que o recurso é admissível – artº 123º, nº 1, 124º, nº 1, 1 126º, todos da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo.

Da conjugação do disposto nos artºs 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 1 e 639º, todos do Código de Processo Civil, resulta que são as conclusões do recurso que delimitam os termos do recurso (sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso - artº 608º, nº 2, ex vi artº 663º, nº2, ambos do mesmo diploma legal), não vinculando, porém, o Tribunal ad quem às soluções jurídicas preconizadas pelas partes (artº 5º, º 3, do Código de Processo Civil). Assim:

Questões a decidir:

1) Da nulidade da decisão

2) Do alargamento dos convívios com o progenitor

3) Da distância, barreira da língua e outros constrangimentos



III – Fundamentação


1) Da nulidade da decisão


         As Recorrentes invocaram a nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação e por violação do caso julgado.

         O Juiz a quo não se pronunciou nos termos do disposto no artº 617º, nº 1, do Código de Processo Civil, mas não se vislumbra a necessidade de tal apreciação.

Dispõe o artº 615º, nº 1, als. b) e d), e nº 4, do Código de Processo Civil, que:

1 - É nula a sentença quando:

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.

Falta de fundamentação

Entendem as Recorrentes que a sentença recorrida não está fundamentada de facto e de direito.

Compulsada a sentença, verificamos que, ao contrário do alegado, o Tribunal a quo fundamentou a decisão, quer de facto, quer de Direito.

Como nos diz António Santos Abrantes Geraldes, “Código de Processo Civil Anotado”, volume I, 2ª edição, Almedina, 2021, pág. 763:

6. Acresce ainda uma frequente confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação
insuficiente ou
divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronúncia
(relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso.
(sublinhado nosso)

É o que acontece no caso em apreço, em que o raciocínio do Tribunal é claro, mas apenas diferente do elaborado pelas Recorrentes. Vejamos.

No que toca à fundamentação de facto, diz-se:

Em ordem a apreciar o interesse das crianças em conviver com o pai, importa considerar a seguinte factualidade, resultante de atos processuais e de informações e relatórios sociais, incluindo o elaborado pelas Autoridades Espanholas e o regime criminal do pai, juntos a estes autos e ao apenso C.

Embora efetivamente bastante sumária, a fundamentação é suficiente para ser compreensível e sindicável.

Já no que concerne à fundamentação de Direito, vemos que o raciocínio que ficou expresso na decisão é longo, completo e escorreito, não podendo ser acusado de qualquer omissão.

Assim, neste ponto, a questão da discordância das Recorrentes terá de ser abordada ao nível dos demais pontos do recurso e não aqui.



            Violação do caso julgado

            Entendem as Recorrentes que a decisão recorrida violou o caso julgado, na medida em que alterou a medida que havia sido acordada para vigorar pelo período de seis meses, sem que tal prazo tivesse já decorrido.

         Contudo, também aqui sem razão.

         Resulta do disposto nos artºs 4º, al. e) e 62º, nº 2, da Lei de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, que a aplicação das medidas tutelares está sujeita ao princípio da atualidade e que a revisão das medidas pode ocorrer antes de decorrido o período acordado para a sua aplicação, desde que haja razões que o justifiquem.

         Foi o que aconteceu in casu, em que se considerou que a forma como decorreram os convívios com o progenitor justifica o seu imediato alargamento.

Assim, também aqui a questão da discordância das Recorrentes terá de ser abordada ao nível dos demais pontos do recurso e não aqui.

         E não se fale igualmente em violação do contraditório ou surpresa da decisão, uma vez que as partes foram, através do despacho de 12 de Junho, advertidas para a possibilidade desta decisão vier a ocorrer.

         Concluímos, assim, que a decisão recorrida não padece de qualquer nulidade.



A) De facto

       Factos julgados provados na decisão recorrida:

- DD está registada como sendo filha de BB e de CC e como tendo nascido a ../../2020;

- EE está registada como sendo filha de BB e de CC e como tendo nascido a ../../2022;

- Em 22 de novembro de 2022 foram reguladas as responsabilidades parentais relativamente a DD e EE, não estando ainda averbada a respetiva paternidade, tendo sido fixada a residência junto da avó materna AA, a quem foram também atribuídas as responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância;

- Em 22 de novembro de 2024, no âmbito do apenso C, foram reguladas provisoriamente as responsabilidades parentais relativamente às crianças DD e EE, na sequência de acordo celebrado entre o pai e a avó materna, passando as crianças a conviver com o pai, uma vez por semana, em convívios acompanhados nas instalações da Segurança Social ...;

- Entre ../../2024 e ../../2025 foram realizados sete convívios supervisionados, sendo que, a partir do terceiro, o pai passou a fazer-se acompanhar da sua mulher, de nome FF, e da filha comum, à data com 6 meses de idade;

- Desde o primeiro momento de convívio com o pai, as crianças manifestaram total adaptação ao contexto de sala, nomeadamente ao espaço disponível para convívios, evidenciando um estado emocional muito confortável, sempre sorridentes e satisfeitas e sem dificuldades de interagir com o progenitor, também ele, manifestando uma postura afetiva junto das filhas;

- No final dos convívios, por mais que uma vez, DD fez saber, junto dos Técnicos e da avó materna, que gostaria de ficar durante mais tempo no convívio com o pai;

- Quanto ao pai, o seu comportamento dentro de sala pautou-se por uma atitude pró-ativa na interação com as filhas, procurando transmitir-lhes uma sensação de tranquilidade e segurança, utilizando de forma contínua os objetos lúdicos e uma linguagem adequada, incentivando as crianças ao convívio;

- Entre 11 de fevereiro e 25 de março de 2025 foram realizados seis convívios supervisionados;

- À chegada à sala de convívio, DD habitualmente correu para o pai e abraçou-o de forma espontânea, sendo o pai igualmente afetuoso com a filha, recebendo-a de braços abertos. EE seguiu atrás da irmã, também para os braços do pai;

- O pai foi acolhedor, preparou conjuntamente com a companheira FF o espaço do convívio, sentaram-se numa manta no chão, onde ambas as crianças se sentaram e estabeleceram diálogo fluido e brincaram com jogos do próprio espaço família e outros trazidos pelo pai e companheira, que tentaram perceber os interesses de cada criança e adequaram as brincadeiras nesse sentido;

- DD procurou frequentemente sentar-se no colo do pai e EE dedicou-se a brincar com a companheira do pai que a envolveu em diferentes jogos;

- As crianças intercalavam, à vez, entre o colo do pai e da sua companheira;

- Ambos corresponderam à chamada das crianças com afeto e sempre que necessário, corrigindo os seus comportamentos;

- O pai e companheira trouxeram a sua filha bebé e, no tapete, conseguiram gerir as três crianças em diferentes atividades;

- DD tentou prolongar os momentos de convívio com o pai;

- Em 22 de abril de 2025 foi estabelecido, em acordo de promoção e proteção subscrito pelo SATT, pelos pais e pela avó materna, além do mais, que o pai conviveria com as crianças às terças feiras, indo busca-las ao equipamento educativo entre as 10.30h e as 11.00h, e entregando-as no mesmo dia no mesmo local pelas 15.30 horas, mais efetuaria videochamadas com as filhas, conforme o que for acordado e respeitando os tempos das crianças;

- Na sequência deste acordo foram, pelo menos, realizados convívios a 6 de maio, 13 de maio e 3 de junho;

- Aquando da chegada do pai e sua companheira, as crianças de imediato reconheceram-nos e DD correu para os abraçar e EE seguiu caminhando em direção a estes sorrindo;

- No regresso à escola, as crianças encontravam-se alegres, bem-dispostas, entusiasmadas, DD ansiosa por contar o que tinham feito, onde tinham ido;

- Despediram-se do pai e companheira com abraços e beijos, de forma espontânea;

- O pai solicitou às educadoras reunião para se inteirar acerca do desenvolvimento das crianças;

- No que diz respeito ao contacto direito com as crianças, pai e companheira são adequados ao chegar e no acolhimento às crianças que, de imediato, se dirigem a eles, com abraços/beijos e colo. Bem como no regresso à escola, tentando trazê-las com tranquilidade e despedindo-se com alegria e sem tentar prolongar o momento, para permitir um regresso bem-disposto;

- No final de todos os convívios as crianças vinham bem cuidadas, em termos de alimentação e bem-estar;

- Num dos convívios esteve a irmã consanguínea e o filho da companheira do pai;

- Em relação às crianças, DD mais expansiva e entusiasta, de manhã conta a todos os adultos com quem se cruza que é dia de ir passear com o pai e ao chegar quer contar o que fez e onde foi;

- Mostra-se feliz nestes contactos com o pai e sua companheira, nos relatos da criança esta é uma figura afetiva e vista como parte integrante da família;

- EE menos faladora, apresenta-se junto do pai alegre e satisfeita, procura e aprecia o colo, quer do pai quer da sua companheira;

- Não são conhecidos ilícitos criminais praticados pelo pai nos últimos 10 anos;

- Não são conhecidos ilícitos criminais praticados pelo pai que envolvam crianças ou condicionem a sua capacidade para o exercício da parentalidade;

- O pai vive na R/ ... nº..., ..., com a sua mulher FF, o filho dela GG e a filha de ambos HH;

- Vivem num apartamento espaçoso com três quartos, duas casas de banho, uma sala de estar e uma cozinha. Dispõem de um pátio comum com relvado e bem cuidado. Um dos quartos tem um berço que seria para a filha mais pequena e têm a intenção de comprar uma cama para a maior e que durmam as duas juntas. O quarto está decorado e preparado para as meninas, com jogos e alguns equipamentos básicos. Outro quarto é para o filho de 17 anos e o terceiro quarto é para o casal e a bebé que tem o seu próprio berço. Todo o apartamento está bem conservado e mobilado, com boas condições de habitabilidade. Têm vários animais de estimação, dois gatos e um cão pequeno, mas existe uma higiene adequada em toda a casa. O apartamento situa-se numa zona urbana com boas comunicações e com recursos e serviços básicos no meio envolvente;

- O pai está a trabalhar como operário para uma empresa de automóveis e aufere uma remuneração de 1500 euros/mês de salário;

- FF está a receber um subsídio de desemprego de 812,70 euros de 23/11/2024 a 22/05/2025 e está em processo de candidatura para administrativa de justiça;

- Não têm despesas de habitação e referem que a maior despesa que têm atualmente é a deslocação semanal para visitar as filhas, dada a distância até Coimbra.

B) De Direito

2) Do alargamento dos convívios com o progenitor

Como ponto prévio, cumpre assinalar que não foi apresentado recurso da matéria de facto fixada, pelo que teremos de raciocinar com os factos tal como descritos na decisão recorrida.

Ainda que, pontualmente, as Recorrentes façam referência a alguma discordância quanto ao que ficou consignado, fazem-no em simultâneo com a análise de Direito e sem cumprir minimamente o disposto no artº 640º, do Código de Processo Civil.

Apurou-se que os convívios das crianças com o progenitor correram bem e de forma gratificante para as menores, que anseiam pelo momento em que estarão com o pai, descrevendo-o posteriormente com alegria.

 Apurou-se igualmente que o progenitor apresenta competências parentais, relacionamento adequado com as filhas e condições materiais para as acolher.

Assim, não se pode deixar de concluir pela conveniência do alargamento dos convívios para fins de semana completos e alternados em casa do progenitor.

Como se diz nas contra-alegações apresentadas pelo Ministério Público, com o que se concorda:

9. Mercê da ausência do pai da vida das crianças e das informações sobre o seu passado veiculadas pela mãe, o tribunal tem sido cauteloso na fixação dos convívios das crianças com o pai, exigindo que os mesmos se dessem inicialmente com estreita supervisão Técnica.

10. O pai tem aceite e cumprido todos os desafios, desde logo a vinda regular da sua residência, em Espanha, a Coimbra, para os convívios supervisionados com as crianças.

11. E superou as expetativas, interagindo com as crianças com cuidado e atenção e sem falhas, comparecendo com regularidade aos compromissos assumidos.

12. As crianças, por seu turno, também têm aceitado muito bem o pai (…).

13. Ao longo do acompanhamento feito, verificou-se que as crianças mostraram proximidade com pai e restante família, o quem aceitam e a quem procuram prazerosamente em cada convívio, percebendo-se a boa aceitação das crianças, a sua alegria na aproximação ao pai, bem como a adequação do pai no respeito por uma aproximação gradual e no estabelecimento de um vínculo seguro com as filhas.

14. Os períodos de convívio não foram poucos, pois além das saídas (4), as crianças estiveram com o pai em diversos momentos, em contexto vigiado (mais de 13 convívios).

15. O pai tem-se mostrado figura presente, cuidadora, interessada e preocupada com as necessidades das filhas, o que já resultava do relatório anterior do SATT e se manteve no decorrer das saídas com as crianças.

16. São igualmente conhecidas as condições habitacionais do pai e a existência, na mesma habitação de um espaço preparado para as crianças.

17. Tais elementos foram colhidos através da competente entidade da área de residência do pai, que fez visita domiciliária e deu conta da situação socioeconómica e habitacional do pai.

Há sim que manter a continuidade das relações psicológicas profundas já estabelecidas entre pai e filhas – artº 4º, al. g), da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo.

Não se entende a posição da Recorrente avó quando fala em privilegiar a família biológica, na necessidade de adotar medidas menos restritivas ou do exercício abusivo da autoridade na família.

Estará a avó a esquecer certamente que o Recorrido é o progenitor das menores, portanto, também a sua família próxima, com quem devem ter contactos privilegiados e de quem deve ser uma figura da referência.

Acresce que o que está em causa é apenas o alargamento das visitas, para fins de semanas completos alternados, e não a alteração da guarda das menores, como parece transparecer da expressão usada “a separação abrupta das crianças da avó guardiã”.

Como também se diz nas contra-alegações apresentadas pelo Ministério Público, com o que novamente se concorda:

1. Os filhos têm direito a manter relações de grande proximidade com o progenitor a quem não estejam confiados - art. 9° n.ª 3 da Convenção dos Direitos da Criança e n.º 7 do art. 1905° do Código Civil, a não ser que o interesse da criança o desaconselhe.

2. Tal direito, é, no fundo, uma concretização da norma do art. 369, n.º 6 da nossa Constituição.

3. Na determinação do conteúdo do direito de visita haverá que dar primazia ao interesse da criança na manutenção daquela relação, em detrimento das prorrogativas do guardião e do interesse do titular do direito da visita.

Como não se compreende a alegação da Recorrente progenitora quando diz “ter sido excluída da vida das filhas”, o que certamente pode/deve ser tratado noutra sede que não esta, em que se apurou das competências do progenitor e da conveniência de estimular o seu convívio com as filhas, o que certamente não afasta a possibilidade de progenitora também manter convívios com as filhas.

3) Da distância, barreira da língua e outros constrangimentos

Insurgem-se ainda as Recorrentes contra o facto de a residência do progenitor se situar a uma grande distância da residência das menores, bem como de a deslocação matinal das crianças às segundas feiras, ser muito cansativa e prejudicial para as menores.

Estamos a falar de cerca de 260 km, que demoram 2h30m a percorrer, quase sempre em autoestrada[1], o que, convenhamos, não implica demasiado cansaço, sendo uma distância comummente percorrida por outras crianças em idêntica situação, ainda que os mais residam ambos em território nacional.

E não esqueçamos que a própria mãe pretende – cfr. apenso F – que as menores passem fins de semana consigo em ..., o que implicaria também uma viagem relativamente longa e praticamente idêntica à da deslocação para a residência do progenitor, mas mais curta em cerca de 90 km[2].

Também não se vê inconveniente na deslocação matinal das crianças, que podem dormir no trajeto, com o benefício de alargar o período de descanso desde a viagem anterior, ao que acresce que as crianças, atenta a sua idade, ainda não têm obrigações escolares.

Insurgem-se também quanto à necessidade de ter em conta a barreira linguística, uma vez que o progenitor é espanhol; contudo, não resulta minimamente dos autos, bem pelo contrário, que o pai não tenha sido capaz de comunicar adequadamente com as filhas.

Refere ainda a Recorrente progenitora que o pai esteve injustificadamente ausente da vida das filhas e que tem um passado de ilícitos criminais.

No que toca ao primeiro ponto, ainda que tal atitude seja censurável, não pode determinar mais prejuízo para crianças, privando-as da figura essencial do progenitor nas suas vidas, num momento que este revela ter capacidade para exercer as competências parentais.

Também a progenitora acordou em entregar a guarda das filhas à avó e foi viver para França, mas não pode, por isso, ser privada dos contactos com as mesmas, nem estas de terem uma mãe nas suas vidas.

No que concerne aos antecedentes criminais, diz-se na sentença recorrida:

- Não são conhecidos ilícitos criminais praticados pelo pai nos últimos 10 anos;

- Não são conhecidos ilícitos criminais praticados pelo pai que envolvam crianças ou condicionem a sua capacidade para o exercício da parentalidade;

Assim, já não faz sentido continuar a falar das situações do passado, havendo antes de garantir às menores um adequado e são convívio com toda a sua família.

Deste modo, cumpre julgar improcedente o presente recurso.

IV - Decisão

Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida.

Custas pelas Apelantes – artºs 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, todos do Código de Processo Civil.

         Coimbra, 14 de Outubro de 2025

         Com assinatura digital:

         Anabela Marques Ferreira

         Chandra Gracias

         Paulo Correia


[1] www.maps.google.com
[2] Segundo a mesma fonte