Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA
BENS COMUNS
CÔNJUGE MEEIRO
Sumário
I. A causa de nulidade prevista na alínea b) do artigo 615.º do Código de Processo Civil respeita apenas à falta absoluta de fundamentação, entendendo-se como tal a total ausência de fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão. Não abrange a fundamentação deficiente, incompleta ou insuficiente, errada e/ou não convincente, que configura apenas uma causa de recurso por erro de julgamento, de facto ou de direito, que afeta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, se este for admissível, mas não constitui causa de nulidade da sentença; II. A nulidade da decisão por omissão de pronúncia só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões cuja apreciação lhe foi colocada ou que devesse apreciar oficiosamente. O acerto ou desacerto da decisão jurídica proferida, podendo reconduzir-se a um erro de julgamento, não determina a nulidade da sentença por omissão de pronúncia. III. Sendo decretada unicamente a insolvência de um dos cônjuges (ou de ex-cônjuges que ainda não tenham procedido à partilha dos bens comuns do casal), devem ser apreendidos (e vendidos) todos os bens do insolvente, neles se incluindo não só os bens próprios do cônjuge/insolvente, mas também os próprios bens comuns do casal, que respondem pela totalidade dos créditos reclamados tratando-se de dívidas comuns, ou até ao valor da meação, no caso de dívidas da responsabilidade pessoal do insolvente.
Texto Integral
Acordam os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte: I- RELATÓRIO
AA, cabeça de casal nos autos de inventário (apenso G) para partilha do património comum do casal que foi constituído pela autora e por BB, propôs ação especial de prestação de contas contra Massa Insolvente de BB, com sede na Rua ..., ... ..., CC, viúva, residente na Rua ..., ..., ..., ... ..., DD, divorciada, residente na Rua ..., Edifício ..., ..., ..., ... ..., EE, divorciada, residente na Av. Barcara ..., ..., ..., ......, ... ..., FF, casado, residente na Rua ... – Bairro ..., ..., Cep. ...75-240, GG, casado, residente na Rua ..., ..., ..., HH, casada, residente na Rua ..., Bairro ..., ... ..., II, solteira, residente na Rua ... ..., ..., ..., Cep. ...00-000l e BB, solteiro, residente na Rua ..., ..., ..., ... ..., pedindo que sejam consideradas prestadas as contas pela cabeça de casal até 31 de dezembro de 2019.
Alegou, em síntese, que convencionou com o inventariado, no ano de 2013, em data anterior a 1 de agosto desse ano, que “a administração e exploração do bem comum, designado por “Hotel ... ...” (…) ficará a cargo única e exclusivamente da segunda outorgante [a ora autora e cabeça de casal], podendo a mesma administrar e explorar o referido estabelecimento comercial diretamente ou indicando outra pessoa ou sociedade para que o faça” – cf. cláusula segunda do Acordo junto aos autos.
Na cláusula terceira do mesmo Acordo estipularam as partes que “[a] cedência total da referida administração e exploração à Segunda Outorgante é totalmente gratuita, não implicando o pagamento de qualquer valor ou contrapartida ao Primeiro Outorgante, tendo início em 01 de Dezembro de 2013 e terminando com a efectivação da partilha judicial ou extrajudicial dos bens comuns do dissolvido casal, aqui Primeiro e Segunda Outorgantes”.
Tal convenção foi concretizada entre os inventariados e aceite pelos interessados JJ, EE, GG e BB.
A cabeça de casal passou a administrar o dito Hotel no âmbito de um direito próprio, nos termos da fruição exclusiva que lhe foi conferida pelo inventariado, até à partilha, pelo que não tem qualquer dever de prestar contas da administração deste concreto bem.
Por tal razão, os valores por si auferidos pela cessão de exploração do Hotel ..., que atualmente se cifram na quantia mensal de € 2.653,02 + € 610,19 (IVA), no total de € 3.263,21, não constam das receitas e despesas indicadas na conta corrente da prestação de contas que apresenta.
Citados os requeridos, contestou a ré Massa Insolvente de BB (Herança aberta por óbito de), por impugnação e por exceção.
Alegou, além do mais, que do Acordo invocado pela autora, celebrado entre esta e o falecido insolvente, não resulta que os frutos/receitas (e até eventuais encargos/despesas) decorrentes da administração do bem comum do dissolvido casal não integram o património comum, limitando-se o acordo a atribuir à cabeça de casal a administração do bem comum (função que é inerente ao próprio cargo) e que essa administração é gratuita (característica que resulta da própria lei), pelo que não assiste qualquer fundamento e/ou razão à cabeça de casal quando afirma que não tem qualquer dever de prestar contas da administração desse bem.
Excecionou ainda a caducidade daquele Acordo com o trânsito em julgado da sentença que declarou a insolvência de BB, nos termos do artigo 110.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE).
Concluiu que, ainda que a cabeça de casal tenha celebrado o contrato de cessão de exploração do bem comum do dissolvido casal, designado de Hotel ..., com a sociedade comercial EMP01... Hotéis e Empreendimentos Turísticos, Lda., em 16 de julho de 2015, desconhecendo que o acordo celebrado havia caducado, daí resultaram receitas para o património comum do dissolvido casal, devendo a cabeça de casal prestar as respetivas contas.
Realizou-se a audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador tabelar, identificou-se o objeto do litígio e elencaram-se os temas de prova.
Por requerimento datado de 06.07.2023, vieram as partes informar sobre a matéria de facto fixada por acordo.
Realizou-se a audiência final, e veio a ser proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
«Por todo o exposto, decide-se: a) Julgar bem prestadas as contas prestadas pela A., no âmbito da administração, entre 01-07-2010 a 31-12-2019, do património comum do dissolvido casal constituído por aquela e BB. b) Condenar a R. Massa Insolvente de BB nas custas do processo, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.».
*
Não se conformando com o assim decidido, a ré Massa Insolvente de BB (Herança aberta por óbito de) interpôs o presente recurso e apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES:
«I. Nos presentes autos de prestação de contas a Autora, Cabeça de Casal, prestou contas relativamente aos bens que compõem o património comum do dissolvido casal constituído por aquela e (agora) pela aqui Interessada Massa Insolvente de BB (herança aberta por óbito de), ora Recorrente, excluindo dessa prestação de contas as rendas de um imóvel, devidamente identificado nos presentes autos como “Hotel ... ...”. II. Sustentou a Autora, Cabeça de Casal, tal exclusão no facto de considerar estar em exercício de um direito próprio, exercício que na versão da Autora lhe foi conferido por documento subscrito por esta e por BB (insolvente) intitulado de “Acordo”, constante a fls. 1418 dos autos principais de Inventário (apenso G), através do qual lhe foi cedido gratuitamente a administração e exploração de tal bem até efectiva partilha judicial ou extrajudicial do património comum do dissolvido casal. III. A aqui Recorrente em sede de contestação veio impugnar essa não inclusão de receitas pela Cabeça de Casal, invocando que por um lado tal administração e/ou exploração não era realizada no exercício de um direito próprio por o documento não lhe conferir esse alcance, mas antes enquanto direito comum do dissolvido casal, e, por outro lado, porque com a declaração de insolvência de BB o “Acordo” caducou, nos termos e para os efeitos do artigo 110º nºs 1 e 4 do CIRE. IV. Impunha-se ao tribunal a quo proceder ao enquadramento jurídico do documento intitulado de “Acordo”, determinando a natureza do negócio jurídico celebrado pelas partes, pois que tal enquadramento é essencial para se conhecer o regime jurídico aplicável e consequentemente da validade e os efeitos jurídicos do negócio celebrado, quais sejam a criação, modificação ou extinção de direitos e obrigações. V. BB foi declarado insolvente em 09/06/2015, por sentença transitada em julgado, e que o mesmo veio a falecer em ../../2016 – cfr. pontos 8 e 9 dos factos provados, respectivamente, da douta Sentença ora em crise. VI. Era essencial que o tribunal a quo determinasse e/ou enquadrasse o negócio jurídico que as partes pretenderam celebrar e a que deram o nome de “Acordo”, porquanto é sabido que dependendo do negócio jurídico em análise a morte de um dos outorgantes determina “ope legis” a caducidade do mesmo, sendo essa causa de extinção de conhecimento oficioso. VII. Na douta Sentença ora em crise não é identificado pelo tribunal a quo qual, segundo as regras de interpretação dos contratos, o negócio jurídico que consta do documento de fls. 1418. VIII. Saber qual o negócio jurídico que o tribunal a quo considera estar em causa faz parte do concreto objecto do processo, porquanto está em causa a inclusão de receita e despesa relativamente a um bem que integra o património comum do casal, IX. Não existindo qualquer pronúncia do tribunal a quo sobre esta concreta parte do objecto do processo. X. Era (e é) essencial saber qual o enquadramento jurídico que o tribunal a quo fez do documento de fls. 1418 intitulado de “Acordo”, pois que a cedência total e de forma gratuita da administração e exploração de um bem que integra o património comum de um dissolvido casal pode enquadrar-se em diferentes figuras jurídicas dependendo da intenção manifestada e da forma do acordo, qual seja, e a título de exemplo, uma cessão, um mandato, um usufruto, entre outras figuras jurídicas. XI. Consoante o enquadramento jurídico determinado pelo tribunal a quo podemos ter efeitos jurídicos diferentes com relevância para o objecto do processo. XII. Admitindo (porque não resulta da douta Sentença) que o tribunal a quo considerou que estávamos perante um contrato de mandato ou de gestão – até porque a aqui Recorrente invocou a caducidade nos termos previstos no artigo 110º do CIRE, que prevê a caducidade de contratos de mandato e de gestão com a declaração de insolvência – considerou então também que o objectivo do “Acordo” foi a mera administração do imóvel (bem comum) em nome do cedente (entretanto falecido), sem que a outra parte passe a deter qualquer direito próprio sobre a exploração do bem, onde o mandatário (ou gestor) gere o imóvel sem adquirir direitos definitivos sobre ele. XIII. Nesse caso, não restam então dúvidas que o mandato caduca por morte do mandante ou do mandatário nos termos do artigo 1174º do Código Civil (doravante abreviadamente CC). XIV. Sendo de conhecimento oficioso que a morte pode ser causa de caducidade de um contrato, evidente se torna que era (e é) essencial determinar que tipo de contrato foi considerado pelo tribunal a quo, uma vez que da Sentença não consta qualquer identificação do regime jurídico ao qual o tribunal submeteu o negócio jurídico celebrado entre as partes. XV. Para uma correcta apreciação das questões a que o tribunal a quo é chamado a pronunciar-se (o thema decidendum) devia (e deve) ser efectuado o enquadramento jurídico do documento de fls. 1418, com a identificação do negócio jurídico que o tribunal a quo considera ser a mais adequada segundo as regras de interpretação de negócios jurídicos, para lhe poder atribuir os correctos efeitos jurídicos, o que foi inteiramente omitido pelo tribunal a quo. XVI. A omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, a ausência de posição ou decisão do tribunal sobre matérias e/ou questões em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. Tais questões são aquelas que os sujeitos processuais interessados submetam à apreciação do tribunal e as que sejam de conhecimento oficioso que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual – vide Acórdão do STJ de 15/12/2011, Relator Raúl Borges, disponível em www.dgsi.pt XVII. Atente-se ainda ao Acórdão do STJ de 10/03/2022, Relatora Catarina Serra, disponível em www.dgsi.pt onde pode ler-se: «O cometimento do vício de omissão de pronúncia supõe que a questão cujo conhecimento se omitiu seja relevante para composição da lide, o que exclui a relevância de argumentos e de matérias despiciendas para aquele propósito ou cujo conhecimento se tenha por prejudicado pela solução dada ao litígio.» XVIII. A douta Sentença ora em crise enferma de insanável nulidade (não só, mas também) por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615º nº 1 alíneas b) e d) do CPC, e que expressamente se invoca para os devidos efeitos legais. XIX. O tribunal a quo considerou que a declaração de insolvência de BB não afetou a eficácia do “Acordo” objecto de análise nos presentes autos, XX. Considerando que pese embora nos termos do artigo 110º do CIRE «(…) os contratos pelos quais o insolvente tenha confiado a outrem a gestão de assuntos patrimoniais cessam com a declaração de insolvência, tal efeito encontra-se reservado, unicamente, para negócios que tenham por objecto os bens que integram a massa insolvente», e como não houve ainda partilha do património comum do dissolvido casal, existindo apenas uma meação, a aplicabilidade de tal preceito legal fica afastada no caso aqui em apreço. XXI. Nos termos do artigo 46º do CIRE a massa insolvente é constituída por todos os bens, direitos e relações jurídicas patrimoniais pertencentes ao devedor à data da declaração de insolvência, onde se incluem as quotas comuns (meações e/ou quotas ideais) decorrentes de dissolução do casamento por divórcio sem partilha, por as mesmas constituírem um direito patrimonial. XXII. Na senda do artigo 110º do mesmo diploma legal, para que ocorra a ineficácia por via da caducidade de certos actos ou negócios jurídicos celebrados antes da declaração de insolvência, não é necessário que os bens objecto de tais actos ou negócios integrem efectivamente a massa insolvente, ou seja, que estejam efectivamente apreendidos, bastando que sejam susceptíveis de a integrar ou de ser para ela apreendidos, XXIII. Posição doutrinária defendida por Alexandre Soveral Martins que afirma, como bem referido na douta Sentença ora em crise, que «o art.º 110º preocupa-se com os casos em que o insolvente é mandante. E não abrange sequer todos esses, uma vez que só é aplicável àqueles que não se mostre serem estranhos à massa insolvente. Serão estranhos à massa insolvente, por exemplo, os contratos de mandato quanto a bens não integráveis nessa massa» - sublinhado e negrito nossos. XXIV. No caso dos presentes autos, o “Acordo” que representa um acto ou negócio jurídico celebrado antes da declaração de insolvência tem por objecto um bem que, embora não integrado, é integrável na massa insolvente, porquanto constituía o património do insolvente BB à data da declaração de insolvência, XXV. Fazendo o mesmo parte da relação de bens constante do processo de Inventário aos quais os presentes autos correm por apenso, ainda que o insolvente tenha uma meação e/ou quota ideal sobre esse mesmo bem. XXVI. A Sentença ora em crise, não fundamenta a conclusão a que chega de o artigo 110º do CIRE se encontrar «reservado, unicamente, para os negócios que tenham por objecto os bens que integram a massa insolvente», nem se consegue perceber qual o raciocínio adoptado para considerar que o bem/direito objecto de tal negócio (que não é identificado pelo tribunal a quo) não integra a massa insolvente. XXVII. Tendo neste caso em concreto o julgador conhecimento funcional de que o bem aqui em causa faz parte da relação de bens comuns do dissolvido casal junta nos autos de Inventário, e como tal é um bem integrável (ainda que, até à partilha, em abstracto) na massa insolvente, por ser um bem também pertencente ao insolvente aquando da sua declaração de insolvência. XXVIII. No que concerne à análise sobre a (in)aplicabilidade do artigo 110º do CIRE efectuada pelo tribunal a quo, ocorre uma falta absoluta de fundamentação, ou pelo menos gravemente insuficiente, de tal forma que não permite ao destinatário a percepção das razões de facto e de direito da decisão relativamente a esta matéria com influência directa no sentido da decisão proferida, sendo ininteligível o silogismo judiciário a que o juiz está obrigado – vide Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 23/05/2024, Relatora Manuela Machado, o Ac. da Relação do Porto de 11/12/2024, Relator Carlos Gil, ambos disponíveis em www.dgsi.pt XXIX. Padecendo a douta Sentença do vício de falta de fundamentação, nos termos do artigo 615º nº 1 alínea a) do CPC, o que expressamente se invoca para os devidos efeitos legais. XXX. Sem prejuízo das nulidades invocadas, do que supra fica exposto e argumentado resulta ainda evidente que se impunha então também que o tribunal a quo tivesse decidido de forma diversa quanto às consequências, quer da declaração de insolvência, quer do óbito de BB, sobre o “Acordo” em causa neste processo – pois que, por força ou de ambas, ou de uma, ou pelo menos do outro, operou-se sempre e em qualquer dos casos a respectiva caducidade ex vi artigo 110º do CIRE e/ou artigo 1174º do CC, que deveria ter sido declarada pelo tribunal a quo e deverá ser agora considerada em sede de recurso, XXXI. Resultando inevitavelmente que as contas prestadas pela Cabeça de Casal não foram na sua totalidade validamente prestadas, faltando incluir nas respectivas receitas todas as rendas descritas nos factos provados 3., 4. e 5., o que deveria ter sido assim decidido na douta Sentença recorrida e cuja revogação e alteração deve ser agora ordenada em consonância. Termos em que, bem como nos melhores de direito, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao presente Recurso interposto pelo ora Recorrente e, consequentemente, ser a douta Sentença de primeira instância revogada e substituída por outra que decida nos termos das conclusões ora apresentadas.
Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!».
*
Não foram apresentadas contra-alegações.
*
A 1ª Instância admitiu o recurso como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo, o que não foi alvo de modificação no tribunal ad quem.
No despacho de admissão do recurso, o Sr. Juiz a quo entendeu que a sentença proferida não padece das nulidades invocadas pela ré/recorrente.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II- DO MÉRITO DO RECURSO
1. Definição do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cf. artigos 635.º, n.º 4, 637.º, n.º 2, 1ª parte e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (doravante CPC) – sendo que o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de apreciar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Por outro lado, não pode o Tribunal de recurso conhecer de questões novas, estranhas aos fundamentos da ação e da defesa e à decisão recorrida, delimitadora do objeto do recurso, com exceção das que sejam do conhecimento oficioso (cf. artigos 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, ambos do CPC), uma vez que os recursos visam reapreciar decisões proferidas e não analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes.
Porque assim é, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela recorrente, são as seguintes as questões solvendas:
. determinar se a decisão recorrida enferma do vício de nulidade previsto na al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC – não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
. determinar se a decisão recorrida enferma do vício de nulidade previsto na al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC – o juiz ter deixado de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar;
. determinar se operou a caducidade do ajuizado “Acordo”.
***
2. Da (alegada) nulidade da sentença recorrida por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão
Advoga a recorrente que a sentença recorrida padece de nulidade porquanto não foi suficientemente fundamentada a matéria de facto.
Alega, para o efeito e em síntese, o seguinte:
«IV. Impunha-se ao tribunal a quo proceder ao enquadramento jurídico do documento intitulado de “Acordo”, determinando a natureza do negócio jurídico celebrado pelas partes, pois que tal enquadramento é essencial para se conhecer o regime jurídico aplicável e consequentemente da validade e os efeitos jurídicos do negócio celebrado, quais sejam a criação, modificação ou extinção de direitos e obrigações. V. BB foi declarado insolvente em 09/06/2015, por sentença transitada em julgado, e que o mesmo veio a falecer em ../../2016 – cfr. pontos 8 e 9 dos factos provados, respectivamente, da douta Sentença ora em crise. VI. Era essencial que o tribunal a quo determinasse e/ou enquadrasse o negócio jurídico que as partes pretenderam celebrar e a que deram o nome de “Acordo”, porquanto é sabido que dependendo do negócio jurídico em análise a morte de um dos outorgantes determina “ope legis” a caducidade do mesmo, sendo essa causa de extinção de conhecimento oficioso. VII. Na douta Sentença ora em crise não é identificado pelo tribunal a quo qual, segundo as regras de interpretação dos contratos, o negócio jurídico que consta do documento de fls. 1418. VIII. Saber qual o negócio jurídico que o tribunal a quo considera estar em causa faz parte do concreto objecto do processo, porquanto está em causa a inclusão de receita e despesa relativamente a um bem que integra o património comum do casal, IX. Não existindo qualquer pronúncia do tribunal a quo sobre esta concreta parte do objecto do processo. X. Era (e é) essencial saber qual o enquadramento jurídico que o tribunal a quo fez do documento de fls. 1418 intitulado de “Acordo”, pois que a cedência total e de forma gratuita da administração e exploração de um bem que integra o património comum de um dissolvido casal pode enquadrar-se em diferentes figuras jurídicas dependendo da intenção manifestada e da forma do acordo, qual seja, e a título de exemplo, uma cessão, um mandato, um usufruto, entre outras figuras jurídicas. XI. Consoante o enquadramento jurídico determinado pelo tribunal a quo podemos ter efeitos jurídicos diferentes com relevância para o objecto do processo.
(…) XIV. Sendo de conhecimento oficioso que a morte pode ser causa de caducidade de um contrato, evidente se torna que era (e é) essencial determinar que tipo de contrato foi considerado pelo tribunal a quo, uma vez que da Sentença não consta qualquer identificação do regime jurídico ao qual o tribunal submeteu o negócio jurídico celebrado entre as partes.
(…) A Sentença ora em crise, não fundamenta a conclusão a que chega de o artigo 110º do CIRE se encontrar «reservado, unicamente, para os negócios que tenham por objecto os bens que integram a massa insolvente», nem se consegue perceber qual o raciocínio adoptado para considerar que o bem/direito objecto de tal negócio (que não é identificado pelo tribunal a quo) não integra a massa insolvente. XXVII. Tendo neste caso em concreto o julgador conhecimento funcional de que o bem aqui em causa faz parte da relação de bens comuns do dissolvido casal junta nos autos de Inventário, e como tal é um bem integrável (ainda que, até à partilha, em abstracto) na massa insolvente, por ser um bem também pertencente ao insolvente aquando da sua declaração de insolvência. XXVIII. No que concerne à análise sobre a (in)aplicabilidade do artigo 110º do CIRE efectuada pelo tribunal a quo, ocorre uma falta absoluta de fundamentação, ou pelo menos gravemente insuficiente, de tal forma que não permite ao destinatário a percepção das razões de facto e de direito da decisão relativamente a esta matéria com influência directa no sentido da decisão proferida, sendo ininteligível o silogismo judiciário a que o juiz está obrigado – vide Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 23/05/2024, Relatora Manuela Machado, o Ac. da Relação do Porto de 11/12/2024, Relator Carlos Gil, ambos disponíveis em www.dgsi.pt».
O Sr. Juiz a quo considerou que «a alegação de que a sentença proferida padece de nulidade por falta de fundamentação carece de qualquer sustentação, uma vez que do acto decisório são absolutamente perceptíveis os fundamentos de facto e de direito que enformam a decisão proferida, bem como os argumentos legislativos e doutrinais que guiaram o raciocínio ali explanado.
Elucidativo de tal circunstância é, aliás, o segmento que se transcreve:
“No presente caso, a Massa Insolvente de BB salienta – e acertadamente – que, nos termos do artigo 110º, n.º 1 do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, “os contratos de mandato, incluindo os de comissão, que não se mostre serem estranhos à massa insolvente, caducam com a declaração de insolvência do mandante, ainda que o mandato tenha sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, sem que o mandatário tenha direito a indemnização pelo dano sofrido”, acrescentando o n.º 4 do mesmo normativo que, “o disposto nos números anteriores é aplicável, com as devidas adaptações, a quaisquer outros contratos pelos quais o insolvente tenha confiado a outrem a gestão de assuntos patrimoniais, com um mínimo de autonomia, nomeadamente a contratos de gestão de carteiras e de gestão do património”. Nesta sede, afiguram-se pertinentes as considerações de Soveral Martins, quando afirma que “o art.º 110º preocupa-se com os casos em que o insolvente é o mandante. E não abrange sequer todos esses, uma vez que só é aplicável àqueles que não se mostre serem estranhos à massa insolvente. Serão estranhos à massa insolvente, por exemplo, os contratos de mandato quanto a bens não integráveis nessa massa”. Sendo certo que, nos termos dos normativos transcritos, os contratos pelos quais o insolvente tenha confiado a outrem a gestão de assuntos patrimoniais cessam com a declaração de insolvência, tal efeito encontra-se reservado, unicamente, para os negócios que tenham por objecto os bens que integrem a massa insolvente. Uma vez que, no presente caso, não houve ainda partilha do património comum, não assistindo a nenhum dos ex-cônjuges qualquer direito próprio que incida sobre os concretos bens que integram a referida propriedade colectiva (mas apenas a meação em tal património), afastada se encontra a asserção de que o acordo descrito nos autos incidiu sobre bem que integra a massa insolvente de BB. Em consequência, cumpre concluir pela inaplicabilidade, in casu, do n.º 4 do artigo 110º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, pelas razões que atrás se deixam exaradas”.
(…)».
Vejamos então.
As nulidades da sentença, taxativamente enunciadas no artigo 615.º do CPC, «reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de actividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal; trata-se de vícios de formação ou actividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afectam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito»[1], e diferem dos erros de julgamento (error in iudicando), os quais contendem com erros ocorridos ao nível do julgamento da matéria de facto ou ao nível da decisão de mérito proferida na decisão recorrida decorrentes de uma distorção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error iuris), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa.
Prescreve o citado artigo 615.º que:
“1- É nula a sentença quando:
(…)
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
(…)”.
A imposição de fundamentação, cuja falta integra a causa de nulidade prevista na alínea b), do mencionado preceito, está consagrada no artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual, “[a]s decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.
Na lei adjetiva, a obrigação geral de fundamentação, imposta no n.º 1 do artigo 154.º, do CPC, segundo o qual “[a]s decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, encontra-se especificamente regulamentada no artigo 607.º, do mesmo diploma, que impõe a obrigação de fundamentar a decisão, de facto e de direito, respetivamente no seu n.º 4, segundo o qual, “[n]a fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”, e no seu n.º 3, segundo o qual, deve “o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final”.
A necessidade de fundamentação das decisões judiciais constitui uma condição da sua própria legitimação e da verificação de um processo equitativo (exigência esta que decorre, a nível constitucional, do estipulado no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa).
Como escreve José Lebre de Freitas[2], «[a] exigência de fundamentação exerce a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao ato jurisdicional».
É entendimento dominante, quer na doutrina, quer na jurisprudência, que a causa de nulidade prevista na alínea b) do citado artigo 615.º respeita apenas à falta absoluta de fundamentação, entendendo-se como tal a total ausência de fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão. Não abrange a fundamentação deficiente, incompleta ou insuficiente, errada e/ou não convincente, que configura apenas uma causa de recurso por erro de julgamento, de facto ou de direito, que afeta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, se este for admissível, mas não constitui causa de nulidade da sentença.[3]
Como ensinava Alberto dos Reis[4], «[h]á que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade (…)».
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02.03.2021[5] decidiu-se que «[s]ó a absoluta falta de fundamentação - e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação - integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil».
Ora, conforme resulta da mera análise da sentença recorrida, o Tribunal a quo discriminou os factos que resultaram provados, bem como justificou/motivou a respetiva decisão de facto, e realizou a subsunção jurídica daquela factualidade relativamente às questões que lhe incumbia decidir, que eram as de aferir das contas prestadas pela autora no âmbito da administração dos bens que integram o património comum do dissolvido casal constituído por esta e BB, no período compreendido entre 01.07.2010 e 31.12.2019, e apreciar se operou a caducidade do ajuizado “Acordo e, por conseguinte, se deverão incluir-se no leque de receitas resultantes da administração dos bens que integram o património comum do dissolvido casal constituído pela autora e BB, no período compreendido entre 01.07.2010 e 31.12.2019, todos os proveitos decorrentes da exploração do Hotel ..., descritos nos pontos 3.º, 4.º e 5.º dos fatos provados.
A recorrente invoca falta de fundamentação por entender que o tribunal a quo deveria ter procedido ao enquadramento jurídico do documento intitulado de “Acordo”, determinando a natureza do negócio jurídico celebrado pelas partes, pois que a cedência total e de forma gratuita da administração e exploração de um bem que integra o património comum de um dissolvido casal pode enquadrar-se em diferentes figuras jurídicas, dependendo da intenção manifestada e da forma do acordo, qual seja, a título de exemplo, uma cessão, um mandato, um usufruto, entre outras figuras jurídicas, e consoante o enquadramento jurídico determinado pelo tribunal a quo podemos ter efeitos jurídicos diferentes com relevância para o objeto do processo. Acrescenta, ainda, que a sentença ora em crise não fundamenta a conclusão a que chega de o artigo 110.º do CIRE se encontrar «reservado, unicamente, para os negócios que tenham por objecto os bens que integram a massa insolvente», nem se consegue perceber qual o raciocínio adotado para considerar que o bem/direito objeto de tal negócio (que não é identificado pelo tribunal a quo) não integra a massa insolvente.
Estas alegações não configuram, no entanto, uma situação de absoluta falta de indicação dos fundamentos de direito, mas um eventual erro de julgamento, insuscetível de integrar o vício formal de nulidade da sentença, previsto no n.º 1, alínea b), do citado artigo 615.º.
Conclui-se, assim, que não está verificada a invocada nulidade da decisão recorrida por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
*
3. Da (alegada) nulidade da sentença recorrida por o juiz ter deixado de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar
Advoga a recorrente que a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia.
Alega, para o efeito e em síntese, o seguinte:
«IV. Impunha-se ao tribunal a quo proceder ao enquadramento jurídico do documento intitulado de “Acordo”, determinando a natureza do negócio jurídico celebrado pelas partes, pois que tal enquadramento é essencial para se conhecer o regime jurídico aplicável e consequentemente da validade e os efeitos jurídicos do negócio celebrado, quais sejam a criação, modificação ou extinção de direitos e obrigações. V. BB foi declarado insolvente em 09/06/2015, por sentença transitada em julgado, e que o mesmo veio a falecer em ../../2016 – cfr. pontos 8 e 9 dos factos provados, respectivamente, da douta Sentença ora em crise. VI. Era essencial que o tribunal a quo determinasse e/ou enquadrasse o negócio jurídico que as partes pretenderam celebrar e a que deram o nome de “Acordo”, porquanto é sabido que dependendo do negócio jurídico em análise a morte de um dos outorgantes determina “ope legis” a caducidade do mesmo, sendo essa causa de extinção de conhecimento oficioso. VII. Na douta Sentença ora em crise não é identificado pelo tribunal a quo qual, segundo as regras de interpretação dos contratos, o negócio jurídico que consta do documento de fls. 1418. VIII. Saber qual o negócio jurídico que o tribunal a quo considera estar em causa faz parte do concreto objecto do processo, porquanto está em causa a inclusão de receita e despesa relativamente a um bem que integra o património comum do casal, IX. Não existindo qualquer pronúncia do tribunal a quo sobre esta concreta parte do objecto do processo.
(…) XV. Para uma correcta apreciação das questões a que o tribunal a quo é chamado a pronunciar-se (o thema decidendum) devia (e deve) ser efectuado o enquadramento jurídico do documento de fls. 1418, com a identificação do negócio jurídico que o tribunal a quo considera ser a mais adequada segundo as regras de interpretação de negócios jurídicos, para lhe poder atribuir os correctos efeitos jurídicos, o que foi inteiramente omitido pelo tribunal a quo. XVI. A omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, a ausência de posição ou decisão do tribunal sobre matérias e/ou questões em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. Tais questões são aquelas que os sujeitos processuais interessados submetam à apreciação do tribunal e as que sejam de conhecimento oficioso que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual – vide Acórdão do STJ de 15/12/2011, Relator Raúl Borges, disponível em www.dgsi.pt».
O Sr. Juiz a quo pronunciou-se no sentido da não verificação da invocada nulidade, nos seguintes termos:
«Nas palavras de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, “para além da falta de assinatura do juiz (suprível oficiosamente em qualquer altura), é nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito ou que se caracterize pela sua ininteligibilidade, previsões que a jurisprudência tem vindo a interpretar de forma uniforme, de modo a incluir apenas a absoluta falta de fundamentação e não a fundamentação alegadamente insuficiente e ainda menos o putativo desacerto da decisão”1. Acrescentam, ainda, os mesmos autores que, no que concerne à alínea d) do transcrito normativo, “é pacífica a jurisprudência de que o dever de decidir tem por referência as questões suscitadas e bem assim as questões de conhecimento oficioso, mas que não obriga a que se incida sobre todos os argumentos, pois que estes não se confundem com “questões”2. Revertendo, agora, aos presentes autos, verificamos constituir objecto dos mesmos o apuramento e aprovação das receitas obtidas e das despesas realizadas por quem administra o património do dissolvido casal constituído por AA e BB, tendo sido, em concreto, peticionado que “sejam consideradas prestadas as contas pela cabeça de casal até 31 de Dezembro de 2019”. Apenas este foi o pedido formulado. Por sentença datada de 26-04-2025, proferiu o tribunal decisão sobre o aludido pedido, pelo que inexiste, em concreto, qualquer omissão de pronúncia sobre as questões (suscitadas ou de conhecimento oficioso) que o tribunal devesse apreciar. Na verdade, in casu, sobre o tribunal não recai o ónus de proferir decisão sobre o enquadramento jurídico de qualquer negócio, mas, unicamente, apreciar as contas apresentadas pela A. e decidir em conformidade, pelo que a alegação de que a decisão recorrida padece do vício a que alude a alínea d), do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil encontra-se, necessariamente, votada ao insucesso. Ainda assim, não deve ser escamoteado que a afirmação de que o tribunal não procedeu ao enquadramento jurídico do documento intitulado “Acordo”, celebrado entre BB e a Cabeça de Casal é reveladora de uma incorrecta e insuficiente análise, por parte da recorrente, do acto decisório, uma vez que tal labor foi, efectivamente, levado a cabo e devidamente explanado.»
Prescreve o citado artigo 615.º do CPC que:
“1 - É nula a sentença quando:
(…)
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…)”.
A nulidade em causa substancia uma omissão de pronúncia que decorre da violação do dever imposto pelo artigo 608.º, n.º 2, do CPC, segundo o qual “[o] juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.
Sobre a interpretação desta causa de nulidade, na vertente «omissão de pronúncia», ensinava Alberto dos Reis[6] que: «(…) são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão (…)».
Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[7]enfatizam que, “(…) devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (608-2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da sentença, que as partes hajam invocado (…)».
Seguindo o mesmo entendimento, Ferreira de Almeida[8] sublinha que as «questões» são todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas, integrando «esta causa de nulidade a omissão do conhecimento (total ou parcial) do pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão (não a fundamentação jurídica adrede invocada por qualquer das partes). Não confundir, porém, questões com razões, argumentos ou motivos invocados pelas partes para sustentarem e fazerem vigar as suas posições (jurídico processuais); só a omissão da abordagem de uma qualquer questão temática central integra vício invalidante da sentença, que não a falta de consideração de qualquer elemento de retórica argumentativa produzida pelas partes».
Na Jurisprudência, decidiu-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.10.2017[9] que «II - A nulidade consistente na omissão de pronúncia ou no desrespeito pelo objecto do recurso, em directa conexão com os comandos ínsitos nos arts. 608.º e 609.º do CPC, só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada. III - A expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem à apreciação do tribunal e as respectivas causas de pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição ou controvérsia.».
No mesmo sentido, escreveu-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.11.2020[10] que «[a]penas existe omissão de pronúncia quando o Tribunal deixe de apreciar questões submetidas pelas partes à sua apreciação, mas já não quando deixe de apreciar os argumentos invocados a favor da posição por si sustentada, não sendo de confundir o conceito de «questões» com o de «argumentos» ou «razões». Constitui igualmente entendimento pacífico, tanto na doutrina como na jurisprudência, que a noção de «questões» em torno das quais gravita a referida infração processual se reporta aos fundamentos convocados pelas partes na enunciação da causa de pedir e/ou nas exceções e, também, aos pedidos formulados.».
Ora, no caso vertente, decorre da exegese da decisão sob censura que o Tribunal a quo não deixou de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
Com efeito, as questões sobre as quais o Tribunal a quo devia pronunciar-se e que foram decididas, eram as de aferir das contas prestadas pela autora no âmbito da administração dos bens que integram o património comum do dissolvido casal constituído por esta e BB, no período compreendido entre 01.07.2010 e 31.12.2019, e se é de incluir, do leque de receitas resultantes dessa administração, todos os proveitos decorrentes da exploração do Hotel ..., descritos nos pontos 3.º, 4.º e 5.º dos fatos provados, atenta a caducidade do Acordo firmado entre a autora e o seu ex-cônjuge, com a declaração de insolvência deste, nos termos do artigo 110.º, n.ºs 1 e 4, do CIRE, como advoga a ré na sua contestação.
Atendendo a que resulta assente o conjunto de receitas e despesas incorridas pela autora, no âmbito da administração do património comum do dissolvido casal, entre 01.07.2010 e 31.12.2022, na sequência do requerimento apresentado pelas partes datado de 06.07.2023, impunha-se ao tribunal apreciar apenas a questão excecionada pela ré na sua contestação, de saber se deverão incluir-se, no leque de receitas resultantes da administração por parte da autora dos bens que integram o património comum do dissolvido casal, naquele período de tempo, os proveitos decorrentes da exploração do Hotel ..., por ter caducado o acordo firmado pela autora com o seu ex-cônjuge.
Tal questão foi apreciada pelo Tribunal a quo nos seguintes termos:
«(…) impõe-se subsumir o acordo descrito no âmbito das prerrogativas próprias dos elementos do dissolvido casal em definir, quanto à utilização dos bens que integram o património comum, um regime diverso do supletivamente previsto, possibilidade concedida pelas disposições conjugadas dos artigos 406º e 1404º a 1406º do Código Civil. Por sua vez, se a validade do referido acordo se afigura evidente (e que não é, sequer, aqui contestado), é, também, patente, que nem mesmo o óbito de BB teve a virtualidade de fazer cessar os efeitos próprios do aludido negócio, dado não estar em causa relação jurídica que se deva extinguir por morte do respectivo titular (cf. artigo 2025º do Código Civil). Resta, portanto, aferir do impacto da declaração de insolvência de BB no negócio descrito nos autos. No presente caso, a Massa Insolvente de BB salienta – e acertadamente – que, nos termos do artigo 110º, n.º 1 do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, “os contratos de mandato, incluindo os de comissão, que não se mostre serem estranhos à massa insolvente, caducam com a declaração de insolvência do mandante, ainda que o mandato tenha sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, sem que o mandatário tenha direito a indemnização pelo dano sofrido”, acrescentando o n.º 4 do mesmo normativo que, “o disposto nos números anteriores é aplicável, com as devidas adaptações, a quaisquer outros contratos pelos quais o insolvente tenha confiado a outrem a gestão de assuntos patrimoniais, com um mínimo de autonomia, nomeadamente a contratos de gestão de carteiras e de gestão do património”. Neste sede, afiguram-se pertinentes as considerações de Soveral Martins, quando afirma que “o art.º 110º preocupa-se com os casos em que o insolvente é o mandante. E não abrange sequer todos esses, uma vez que só é aplicável àqueles que não se mostre serem estranhos à massa insolvente. Serão estranhos à massa insolvente, por exemplo, os contratos de mandato quanto a bens não integráveis nessa massa”7. Sendo certo que, nos termos dos normativos transcritos, os contratos pelos quais o insolvente tenha confiado a outrem a gestão de assuntos patrimoniais cessam com a declaração de insolvência, tal efeito encontra-se reservado, unicamente, para os negócios que tenham por objecto os bens que integrem a massa insolvente. Uma vez que, no presente caso, não houve ainda partilha do património comum, não assistindo a nenhum dos ex-cônjuges qualquer direito próprio que incida sobre os concretos bens que integram a referida propriedade colectiva (mas apenas a meação em tal património), afastada se encontra a asserção de que o acordo descrito nos autos incidiu sobre bem que integra a massa insolvente de BB. Em consequência, cumpre concluir pela inaplicabilidade, in casu, do n.º 4 do artigo 110º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, pelas razões que atrás se deixam exaradas. Como tal, é de considerar válido e eficaz o acordo celebrado entre BB e AA no que à administração e exploração do Hotel ... concerne, bem como excluído do âmbito da presente prestação de contas as receitas e encargos daí decorrentes.».
Isto posto, concluindo o Tribunal a quo pela inaplicabilidade, no caso, do n.º 4 do artigo 110.º do CIRE, pelas razões que exarou, tornou-se despiciendo discorrer sobre a natureza do Acordo celebrado entre a autora e o seu ex-marido, do que se conclui que não ficou qualquer questão por conhecer.
A nulidade da decisão por omissão de pronúncia só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões cuja apreciação lhe foi colocada ou que devesse apreciar oficiosamente. O acerto ou desacerto da decisão jurídica proferida, podendo reconduzir-se a um erro de julgamento, não determina a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Conclui-se, assim, que não está verificada a invocada nulidade da decisão recorrida por o juiz ter deixado de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar.
***
4. Fundamentação de facto O Tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto, devidamente ordenada segundo uma sequência logica e cronológica dos factos:
1. Por sentença proferida em 08.01.2009, já transitada em julgado, foi decretada a dissolução, por divórcio, do casamento celebrado em ../../1956 entre BB e AA.
2. Em data não concretamente apurada, mas posterior a 08.01.2009 e anterior a 1 de dezembro de 2013, BB (na qualidade de primeiro outorgante) e AA (na qualidade de segundo outorgante) subscreveram escrito intitulado Acordo, do qual constam as seguintes cláusulas: a. “PRIMEIRO O Primeiro Outorgante foi casado com a Segunda Outorgante, em primeiras núpcias, já encontrando-se desta divorciado, estando a correr termos o subsequente processo de partilhas no tribunal de ..., no qual a Segunda Outorgante foi nomeada cabeça de casal, cabendo-lhe a si a administração dos bens comuns. SEGUNDO Pelo presente acordo, o Primeiro Outorgante e a Segunda Outorgante acordam que a administração e exploração do bem comum, designado “Hotel ... ...”, estabelecimento comercial de hotelaria que se encontra instalado e a funcionar no prédio urbano, composto de 12 pisos, destinado a hotel, sito na Avenida ..., ..., ... ou ..., freguesia ..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...79 e descrito na Conservatória de Registo Predial ... da referida freguesia sob o n.º ...40, ficará a cargo única e exclusivamente da Segunda Outorgante, podendo a mesma administrar e explorar o referido estabelecimento comercial directamente ou indicando outra pessoa ou sociedade que o faça. TERCEIRO A cedência total da referida administração e exploração à Segunda Outorgante é totalmente gratuita, não implicando o pagamento de qualquer valor ou contrapartida ao Primeiro Outorgante, tendo início no dia 01 de Dezembro de 2013 e terminando com a efectivação da partilha judicial ou extrajudicial dos bens comuns do dissolvido casal, aqui Primeiro e Segunda Outorgantes”.
3. Entre 01.07.2010 e 31.12.2022, a cabeça de casal recebeu e pagou os montantes descritos no mapa de movimentos apresentado com o requerimento com Ref.ª ...21.
4. Para além das receitas descritas no mapa de movimentos referido em 2., a cabeça de casal recebeu, em 16 de julho de 2015, a quantia de € 115,077,10 (cento e quinze mil, setenta e sete euros e dez cêntimos) a título de rendas pagas pela sociedade EMP01...., Lda. (atualmente EMP02..., Lda.), relativas aos meses de setembro de 2015 a maio de 2019 no âmbito do contrato de cessão de exploração do Hotel ....
5. Foram faturadas pela cabeça de casal, mas não pagas pela sociedade EMP02..., Lda., as rendas referentes ao mesmo contrato relativas aos meses de junho de 2019 a março de 2020 no valor total, sem IVA, de € 26.689,38 (vinte e seis mil, seiscentos e oitenta e nove euros e trinta e oito cêntimos).
6. Não foram faturadas pela cabeça de casal nem pagas pela sociedade EMP02..., Lda. as rendas referentes ao mesmo contrato relativas aos meses de abril de 2020 a julho de 2023 no valor total, sem IVA, de € 111.364,00 (cento e onze mil, trezentos e sessenta e quatro euros).
7. Por sentença proferida em 09.06.2015, já transitada em julgado, foi BB declarado insolvente.
8. BB faleceu em ../../2016.
9. Nos autos de inventário destinados à partilha dos bens que integram o património comum do dissolvido casal não foi, ainda, proferida sentença homologatória da partilha.
***
5. Fundamentos de Direito
Sustenta a recorrente que se impunha que o tribunal a quo tivesse decidido de forma diversa quanto às consequências, quer da declaração de insolvência, quer do óbito de BB, sobre o Acordo em causa neste processo – pois que, por força ou de ambas, de uma ou do outro, operou-se sempre e em qualquer dos casos a respetiva caducidade ex vi artigo 110.º do CIRE e/ou artigo 1174.º do Código Civil (doravante CC), que deveria ter sido declarada pelo tribunal a quo, daí resultando inevitavelmente que as contas prestadas pela cabeça de casal não foram na sua totalidade validamente prestadas, faltando incluir nas respetivas receitas todas as rendas descritas nos pontos 3.º, 4.º e 5.º (ora 4.º, 5.º e 6.º) dos factos provados.
Esta última questão suscitada pela recorrente – caducidade do ajuizado Acordo por força do óbito de BB à luz do disposto no artigo 1174.º do CC – constitui, porém, uma questão nova, que não foi suscitada perante o Tribunal a quo e, como tal, não foi objeto de apreciação na decisão recorrida.
Ora, é entendimento pacífico, quer na doutrina[11], quer na jurisprudência[12] dos nossos tribunais superiores, que os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, salvo quando estas sejam de conhecimento oficioso e o processo contenha os elementos imprescindíveis.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28.05.2009[13], «(…) sendo os recursos meios de impugnação das decisões judiciais, destinados à reapreciação ou reponderação das matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal a quo (…), ou seja, visando os recursos apenas a modificação das decisões relativas a questões apreciadas pelo tribunal recorrido (confirmando-as, revogando-as ou anulando-as) e não criar decisões sobre matéria nova, salvo em sede de matéria indisponível, a novidade de uma questão, relativamente à anteriormente proposta e apreciada pelo tribunal recorrido, tem inerente a consequência de encontrar vedada a respectiva apreciação pelo Tribunal ad quem (art. 676º CPC )».
Isto posto, sendo o presente recurso ordinário de reponderação da decisão recorrida, que visa reapreciar questões já conhecidas pelo Tribunal a quo, não pode este Tribunal ad quem apreciar a questão da caducidade do ajuizado Acordo por força do óbito de BB, ao abrigo do disposto no artigo 1174.º do CC, ora suscitada pela recorrente, sob pena de cometimento de uma nulidade por excesso de pronúncia.
Cumpre, assim, apreciar, apenas e tão só, a questão de saber se ocorreu a invocada caducidade do ajuizado Acordo por força da declaração de insolvência de BB, ao abrigo do disposto no artigo 110.º do CIRE.
Resulta do elenco dos factos provados que:
Por sentença proferida em 08.01.2009, já transitada em julgado, foi decretada a dissolução, por divórcio, do casamento celebrado em ../../1956 entre BB e AA.
Em data não concretamente apurada, mas posterior a 08.01.2009 e anterior a 01.12.2013, BB (na qualidade de primeiro outorgante) e AA (na qualidade de segundo outorgante) subscreveram escrito intitulado Acordo, do qual constam as seguintes cláusulas: a. “PRIMEIRO O Primeiro Outorgante foi casado com a Segunda Outorgante, em primeiras núpcias, já encontrando-se desta divorciado, estando a correr termos o subsequente processo de partilhas no tribunal de ..., no qual a Segunda Outorgante foi nomeada cabeça de casal, cabendo-lhe a si a administração dos bens comuns. SEGUNDO Pelo presente acordo, o Primeiro Outorgante e a Segunda Outorgante acordam que a administração e exploração do bem comum, designado “Hotel ... ...”, estabelecimento comercial de hotelaria que se encontra instalado e a funcionar no prédio urbano, composto de 12 pisos, destinado a hotel, sito na Avenida ..., ..., ... ou ..., freguesia ..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...79 e descrito na Conservatória de Registo Predial ... da referida freguesia sob o n.º ...40, ficará a cargo única e exclusivamente da Segunda Outorgante, podendo a mesma administrar e explorar o referido estabelecimento comercial directamente ou indicando outra pessoa ou sociedade que o faça. TERCEIRO A cedência total da referida administração e exploração à Segunda Outorgante é totalmente gratuita, não implicando o pagamento de qualquer valor ou contrapartida ao Primeiro Outorgante, tendo início no dia 01 de Dezembro de 2013 e terminando com a efectivação da partilha judicial ou extrajudicial dos bens comuns do dissolvido casal, aqui Primeiro e Segunda Outorgantes”.
Sucedeu que, por sentença proferida em 09.06.2015, já transitada em julgado, BB foi declarado insolvente.
Prevê o artigo 110.º, sob a epígrafe “Contratos de mandato e de gestão”, o seguinte:
“1 – Os contratos de mandato, incluindo os de comissão, que não se mostre serem estranhos à massa insolvente, caducam com a declaração de insolvência do mandante, ainda que o mandato tenha sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro, sem que o mandatário tenha direito a indemnização pelo dano sofrido.
(…)
4 - O disposto nos números anteriores é aplicável, com as devidas adaptações, a quaisquer outros contratos pelos quais o insolvente tenha confiado a outrem a gestão de assuntos patrimoniais, comum mínimo de autonomia, nomeadamente a contratos de gestão de carteiras e de gestão do património.”
Como sublinha Alexandre de Soveral Martins, «[o] art. 110.º preocupa-se com os casos em que o insolvente é o mandante. E não abrange sequer todos esses, uma vez que só é aplicável àqueles que não se mostre serem estranhos à massa insolvente. Serão estranhos à massa insolvente, por exemplo, os contratos de mandato quanto a bens não integráveis nessa massa».[14]
O ajuizado Acordo – mediante o qual BB e a autora, sua ex-mulher, convencionaram que a administração e exploração do bem comum designado “Hotel ... ...”, estabelecimento comercial de hotelaria instalado e a funcionar no prédio urbano, composto de 12 pisos, destinado a hotel, sito na Avenida ..., ..., ... ou ..., freguesia ..., ficaria a cargo única e exclusivamente da segunda outorgante, podendo a mesma administrar e explorar o referido estabelecimento comercial diretamente ou indicando outra pessoa ou sociedade que o faça, terminando a cedência total da referida administração e exploração com a efetivação da partilha judicial ou extrajudicial dos bens comuns do dissolvido casal – traduz-se num contrato pelo qual o insolvente confiou a outrem, com autonomia, a gestão de assuntos patrimoniais, respeitantes a um bem comum do dissolvido casal, incluindo-se, por isso, nos contratos a que alude o n.º 4 do artigo 110.º do CIRE.
O Sr. Juiz a quo discorreu sobre o impacto da declaração de insolvência de BB no referido Acordo, nos seguintes termos:
«Sendo certo que, nos termos dos normativos transcritos, os contratos pelos quais o insolvente tenha confiado a outrem a gestão de assuntos patrimoniais cessam com a declaração de insolvência, tal efeito encontra-se reservado, unicamente, para os negócios que tenham por objecto os bens que integrem a massa insolvente. Uma vez que, no presente caso, não houve ainda partilha do património comum, não assistindo a nenhum dos ex-cônjuges qualquer direito próprio que incida sobre os concretos bens que integram a referida propriedade colectiva (mas apenas a meação em tal património), afastada se encontra a asserção de que o acordo descrito nos autos incidiu sobre bem que integra a massa insolvente de BB. Em consequência, cumpre concluir pela inaplicabilidade, in casu, do n.º 4 do artigo 110º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, pelas razões que atrás se deixam exaradas.»
Conclui, assim, que «é de considerar válido e eficaz o acordo celebrado entre BB e AA no que à administração e exploração do Hotel ... concerne, bem como excluído do âmbito da presente prestação de contas as receitas e encargos daí decorrentes. Encontram-se, assim, bem prestadas as contas apresentadas pela cabeça-de-casal, impondo-se que se decida em conformidade».
Adiantamos, desde já, que não acompanhamos tal entendimento, desde logo, no segmento «afastada se encontra a asserção de que o acordo descrito nos autos incidiu sobre bem que integra a massa insolvente de BB», pelas razões que passamos a expor.
A doutrina qualifica o património comum dos cônjuges casados sob o regime da comunhão como uma propriedade coletiva (correspondente à chamada propriedade de mão comum), objeto de um único direito de propriedade em bloco, que não comporta divisão, nem mesmo ideal, como sucede na compropriedade.
Como ensinam Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, «os bens comuns constituem uma massa patrimonial a que, em vista da sua especial afetação, a lei concede certo grau de autonomia, e que pertence aos dois cônjuges, mas em bloco, podendo dizer -se que os cônjuges são, os dois, titulares de um único direito sobre ela. Aderimos assim à doutrina da propriedade coletiva que é a mais divulgada entre nós. O património coletivo é um património que pertence em comum a várias pessoas, mas sem se repartir entre elas por quotas ideais, como na compropriedade. Enquanto, pois, esta é uma comunhão por quotas aquela é uma comunhão sem quotas. Os vários titulares do património coletivo são sujeitos de um único direito, e de um direito uno, o qual não comporta divisão, mesmo ideal. Não tem, pois, cada um deles algum direito de que possa dispor ou que lhe seja permitido realizar através da divisão do património comum»[15].
Pires de Lima e Antunes Varela[16] referem, no mesmo sentido, que, na comunhão conjugal de bens há, como na compropriedade, um único direito sobre o património, mas não há uma divisão de quotas (ideais) desse direito entre os cônjuges, titulares do património. «Não há quotas pertencentes a cada um dos cônjuges, porque o património comum pertence em bloco a ambos eles. É, hoc sensu, uma propriedade de casal, uma propriedade colectiva.»
Com a dissolução do casamento (nomeadamente por divórcio), cessam as relações patrimoniais entre os cônjuges (cf. artigo 1688.º do CC), e cessando as relações patrimoniais entre os cônjuges, pela partilha, recebem os mesmos os seus bens próprios e a sua meação no património comum (cf. artigo 1689.º, n.º 1 do CC).
Até à partilha, subsiste, no entanto, a natureza comum do património que emerge do regime de bens do casamento, e, até que aquela ocorra, mantém a natureza de património coletivo de afetação[17].
Por outras palavras, os bens comuns do casal mantêm-se nessa qualidade até à sua divisão e partilha.
Ora, como resulta do artigo 46.º, n.º 1, do CIRE, “[a] massa insolvente destina-se à satisfação dos credores da insolvência, depois de pagas as suas próprias dívidas, e, salvo disposição em contrário, abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo”.
E estatui o artigo 159.º, do mesmo diploma, sob a epígrafe Contitularidade e indivisão, que “[v]erificado o direito de restituição ou separação de bens indivisos ou apurada a existência de bens de que o insolvente seja contitular, só se liquida no processo de insolvência o direito que o insolvente tenha sobre esses bens”.
A natureza comum do património conjugal e o teor literal dos referidos normativos sugerem que só podem ser apreendidos e liquidados no processo de insolvência bens pertencentes ao devedor, e sendo o mesmo contitular de um bem, só o direito à meação deve ser apreendido e liquidado.
A leitura dos referidos normativos não deve, no entanto, em nosso entender, ser feita de forma meramente literal, mas em consonância com o espírito da lei.[18]
Vejamos.
O artigo 1.º, n.º 1, do CIRE, sob a epígrafe Finalidade, prevê que “[o] processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores”.
O processo de insolvência é um processo de execução universal porque abrange praticamente todo o património do devedor[19].
Em regra, a sentença de declaração de insolvência decreta “a apreensão, para imediata entrega ao administrador da insolvência, dos elementos de contabilidade do devedor e de todos os seus bens, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos e sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 150.º” (artigo 36.º, al. g)).
O artigo 149.º, n.º 1, precisa a extensão da operação de apreensão ao determinar que são apreendidos todos os bens, ainda que arrestados, penhorados, apreendidos, detidos ou objeto de cessão aos credores, excetuando-se apenas os bens apreendidos por virtude de infração, quer de caráter criminal ou de mera ordenação social.
Mas, como acrescenta Catarina Serra[20], «[f]icam ainda, naturalmente, excluídos todos os casos de bens insuscetíveis de penhora nos termos gerais (cfr. arts. 736.º e s. do CPC) – com a reserva, contudo, do disposto no n.º 2 do art. 46.º - e os que resultam implicitamente da lei da insolvência, relativos aos meios de subsistência que o devedor angarie pelo seu trabalho e ao (eventual) subsídio de alimentos (cfr. art. 84.º, n.º 1)».
Apreendidos os bens do devedor, forma-se a massa insolvente, composta de todos os bens e direitos integrantes do património do devedor à data da declaração de insolvência e de todos os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo (cf. artigo 46.º, n.º 1).
O processo de insolvência é, ainda, um processo de execução concursal, a que são chamados os credores do insolvente, os quais, durante a pendência do processo, só poderão exercer os seus direitos em conformidade com o disposto no CIRE (cf. artigo 90.º).
Como se explicita no acórdão da Relação de Lisboa de 23.03.2021, trata-se de uma execução concursal porque «conforme arts. 90º, 128º e 146º, visando a liquidação do passivo global do devedor, procede-se para o efeito à citação de todos os credores do devedor para concorrerem ao produto que resulte da liquidação dos bens que integram o património do devedor, na medida das forças deste e em função da hierarquia/graduação dos créditos de acordo com a respetiva natureza».
Acrescenta-se no mesmo aresto que, «da natureza universal e concursal da insolvência decorre que por ela se procede à liquidação de todo o ativo e de todo o passivo do devedor, incluindo no primeiro o direito sobre os bens em contitularidade e, no segundo, todo o passivo da responsabilidade do insolvente, no que se incluem as dívidas por ele contraídas e não comunicáveis ao outro cônjuge, as dívidas comunicáveis contraídas pelo outro, e as dívidas contraídas por ambos (e, igualmente, as dívidas do insolvente na qualidade de garante de terceiros)»[21].
No mesmo sentido, escreve-se no acórdão da Relação de Coimbra de 09.05.2017[22], que «[o] nº1 do artigo 46º do CIRE – segundo o qual a massa insolvente abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo –, terá de ser interpretado no sentido de que a esta massa pertencerão aqueles bens que, por determinação substantiva, possam ser chamados a responder pelas suas dívidas (artigo 601º do CC). Sendo o insolvente casado num dos regimes de comunhão, ou, sendo divorciado, não tenha havido lugar à partilha, a par dos seus bens próprios existe uma massa de bens comuns afeta ao cumprimento de determinadas obrigações. E se no processo foi declarada unicamente a declaração de um dos cônjuges, tratando-se de um processo concursal, a declaração de insolvência chamará ao processo todos os seus credores – não só detentores de garantia real, mas também os credores comuns, e não só por créditos da exclusiva responsabilidade do insolvente, mas igualmente por créditos de responsabilidade comum do casal. A massa ativa deverá, assim, incluir os bens comuns, uma vez que estes responderão sempre pelos créditos reclamados: na sua totalidade tratando-se de dívidas comuns, ou até ao valor da sua meação, no caso de dívidas da responsabilidade pessoal do insolvente.
(…) A insolvência de um dos cônjuges casado num dos regimes de comunhão (ou, sendo divorciado, não tenha sido ainda efetuada a partilha dos bens comuns do casal) envolverá, assim, a apreensão de todos os bens do insolvente, neles se incluindo não só os bens próprios do cônjuge/insolvente, mas também os próprios bens comuns do casal»[23].
Em suma, sendo decretada unicamente a insolvência de um dos cônjuges (ou de ex-cônjuges que ainda não tenham procedido à partilha dos bens comuns do casal), devem ser apreendidos (e vendidos) todos os bens do insolvente, neles se incluindo não só os bens próprios do cônjuge/insolvente, mas também os próprios bens comuns do casal, que respondem pela totalidade dos créditos reclamados tratando-se de dívidas comuns, ou até ao valor da meação, no caso de dívidas da responsabilidade pessoal do insolvente.
Tal posição, que vem sendo preferencialmente defendida na jurisprudência[24] e que igualmente sufragamos, é a que melhor se adequa com o espírito da lei.
Revertendo ao caso em apreço, sendo de apreender para a massa insolvente todos os bens do insolvente, divorciado, entretanto falecido, que não efetuou a partilha dos bens comuns do casal, neles se incluindo não só os seus bens próprios, mas também os bens comuns do casal (cf. artigo 1724.º, al. b), do CC), tendo em vista a finalidade do processo de insolvência, não poderemos deixar de concluir que o contrato celebrado entre a autora e o seu ex-marido, mediante o qual este confiou àquela a administração e exploração, com autonomia, de um bem comum do casal, tem por objeto um bem que integra, ou deve integrar, a massa insolvente.
Como tal, é de aplicar, no caso, a regra geral da caducidade do mandato, em consequência da insolvência do mandante, por força do n.º 4 do artigo 110.º do CIRE, tendo aquele contrato caducado com a declaração de insolvência de BB.
Destarte, resulta que as contas prestadas pela cabeça de casal não o foram na sua totalidade, como advoga a recorrente, faltando incluir nas respetivas receitas todas as rendas descritas nos pontos 4.º, 5.º e 6.º dos factos provados, impondo-se a revogação e alteração da sentença em conformidade.
***
III- DISPOSITIVO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes Desembargadores da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar a apelação procedente e, em consequência, revogam a sentença recorrida, no segmento em que conclui pela exclusão, do âmbito da presente prestação de contas, das receitas decorrentes da administração e exploração do Hotel ..., considerando agora incluídos, no leque de receitas resultantes da administração dos bens que integram o património comum do dissolvido casal, constituído pela autora e BB, no período compreendido entre 01.07.2010 e 31.12.2019, os proveitos descritos nos pontos 4.º, 5.º e 6.º dos fatos acima provados.
***
Custas da ação e do recurso pela recorrente (cf. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Notifique.
Guimarães, 23 de outubro de 2025
Susana Raquel Sousa Pereira – Relatora
José Alberto Martins Moreira Dias – 1º Adjunto
João Peres Coelho – 2º Adjunto
[1] Vd. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.03.2021 (processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1, relatado por Leonor Cruz Rodrigues). [2]A Ação Declarativa Comum à Luz do Códigode Processo Civil de 2013, 3ª edição, p. 317. [3] Assim, ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, reimpressão, Coimbra Editora, LIM., 1984, p. 140; ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO NORA, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2.ª edição, 1985, p. 687 e s.; JACINTO RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, III, p. 194; MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o Processo Civil, p. 221, e TOMÉ GOMES, Da Sentença Cível, p. 39.
Na jurisprudência, vejam-se, entre ouros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15.05.2019 (processo n.º 835/15.0T8LRA.C3.S1, relatado por Ribeiro Cardoso) e de 02.03.2021 (processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1, relatado por Leonor Cruz Rodrigues), e desta Relação de 17.11.2004 (processo n.º 1887/04-1, relatado por Vieira e Cunha). [4] Obra citada, p. 140. [5] Processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1, relatado por Leonor Cruz Rodrigues. [6]Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, 1984, p. 143. [7]Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3ª edição, Almedina 2017, p. 737. [8]Direito de Processo Civil, Vol. II, Almedina, 2015, p. 371. [9] Processo n.º 2200/10.6TVLSB.P1.S1, relatado por Alexandre Reis, acessível no endereço eletrónico: https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2017.pdf. [10] Processo n.º 2057/16.3T8PNF.P1.S1, relatado por Maria João Vaz Tomé. [11] Cf., designadamente, LOPES DO REGO, Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2.ª Edição, p. 566; AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª Edição, pp. 153-158 e ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, 2022, 7.ª Edição Atualizada, p. 139-142. [12] Vejam-se, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 07.07.2009 (processo n.º 1145/05.6TAMAI.C1, relatado por Fernando Fróis) e de 28.05.2009 (processo n.º 160/09.5YFLSB, relatado por Oliveira Rocha) e, mais recentemente, de 07.07.2016 (processo n.º 156/12.0TTCSC.L1.S1, relatado por Gonçalves Rocha), de 29.09.2016 (processo n.º 291/12.4TTLRA.C1.S2, relatado por Ribeiro Cardoso) e de 07.10.2021 (processo n.º 235/14.9T8PVZ.P1.S1, relatado por Jorge Dias). [13] Processo n.º 160/09.5YFLSB, relatado por Oliveira Rocha. [14]Um Curso de Direito da Insolvência, 2016, 2.ª Edição Revista e Atualizada, Almedina, p. 203. [15]Curso de Direito da Família, Volume I, 5.ª edição, Imprensa da Universidade de Coimbra, p. 596. [16]Código Civil anotado, Volume IV, 2.ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, Limitada, 1992, p. 437. [17] Vd. o acórdão da Relação de Lisboa de 23.02.2021 (processo n.º 8952/17.5T8LSB-F.L1-1, relatado por Amélia Sofia Rebelo). [18] Assim, DIANA RAPOSO, «Património indiviso após divórcio – apreensão e liquidação em processo de insolvência (com menção à questão da graduação dos créditos hipotecários)», Julgar n.º 31, 2017, p. 80. [19] Assim, ALEXANDRE DE SOVERAL MARTINS, obra citada, p. 41. [20]Lições de Direito da Insolvência, 2021, 2ª Edição, Almedina, p. 259. [21] Processo n.º 8952/17.5T8LSB-F.L1-1), relatado por Amélia Sofia Ribeiro. [22] Processo n.º 965/16.0T8LRA-D.C1, relatado por Maria João Areias. [23] No mesmo sentido, vejam-se, entre outros, os acórdãos desta Relação de 28.01.2016 (processo n.º 524/14.2T8VRL-B.G1, relatado por Anabela Tenreiro) e de 10.07.2018 (processo n.º 93/16.9T8MNC.G1, relatado por Raquel Tavares); da Relação do Porto de 11.01.2022 (processo n.º 4299/20.8T8MTS.P1, relatado por Anabela Dias da Silva); da Relação de Lisboa de 19.02.2019 (processo n.º 17/14.8TJLSB-E.L1, relatado por Maria da Conceição Savedra), de 30.06.2020 (processo n.º 13100/19.4T8SNT-D.L1-1, relatado por Maria Adelaide Domingos), de 17.06.2021 (processo n.º 234/20.1T8VPV.L1-2, relatado por Laurinda Gemas), de 25.01.2022 (processo n.º 3016/17.4T8SNT-D.L1-1, relatado por Isabel Fonseca) e de 29.10.2024 (processo n.º 10358/22.5T8LSB-D.L1-1, relatado por Susana Santos Silva) e do Supremo Tribunal de Justiça de 15.03.2023 (processo n.º 2862/11.7TBFUN-C.L1.S1, relatado por Ana Resende). [24] Na doutrina, no sentido de que o que é objeto de apreensão são os bens comuns do casal e não a meação do insolvente nos bens comuns, JOSÉ LEBRE DE FREITAS, “Apreensão, separação, restituição em venda” / I Congresso de Direito da Insolvência, coord. Catarina Serra, Almedina, Coimbra, 2013, p. 237. Em sentido contrário, LUÍS TELES DE MENEZES LEITÃO, Direito da Insolvência, 6.ª Edição, 2015, Almedina, p. 90, e Jorge Duarte Pinheiro, “Efeitos Pessoais da Declaração de Insolvência”, Estudos em Memória do Prof. Dr. José Dias Marques, Almedina, 2007, p. 219.